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ÍNDICE
1. Saúde Mental 03

a. Psicoses 05

b. Bipolaridade 07

c.O aspecto neurótico do processo 06

2. Contra indicações e 08
interações medicamentosas

3. Pluralidade de perspectivas
e integração 09

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SAÚDE
MENTAL
A Saúde Mental é uma questão de fundamental importância, que invaria-
velmente está presente e precisa ser observada com atenção em todos os nossos
centros. Neste momento estamos iniciando um trabalho preliminar de montagem
de um grupo da ICEFLU que assessore as igrejas para fazer face a estas demandas de
emergência espiritual. Nosso objetivo é levantar e convocar, em cada igreja, traba-
lhadores na área de cura e também congregar psicólogos, psiquiatras, enfermeiros
e a todos os fardados que trabalhem em áreas afins. A partir, daí realizar reuniões
e oferecer capacitação para um trabalho de carácter permanente para prevenção e
tratamento em Saúde Mental.

Com isso, será possível estabelecermos condutas homogêneas nas interven-


ções dentro e fora do setting espiritual, bem como na condução e prevenção de
episódios de descontrole e desequilíbrio mental e/ou comportamental. Posto que
a qualquer hora e em qualquer centro pode haver uma emergência, é necessário
que todos os chefes de centro encontrem em nosso Departamento aconselhamen-
to pronto e consistente, e que sejam elaboradas diretrizes oficiais da ICEFLU para
recepção de pessoas e anamnese, a serem padronizadas e seguidas por todos os
grupos associados.

Importante mencionar que na clínica psiquiátrica a inconstância e o inespe-


rado estão sempre presentes. A hereditariedade e a genética também concorrem
para que diferentes pessoas tenham diferentes experiências, de modo que a priori
não existem regras de como prever quem terá ou não alguma complicação psíquica
dentro de um trabalho de Santo Daime. Surtos psicóticos, agravações neuróticas,
abuso de substâncias, entre outras intercorrências, acontecem em qualquer ida-
de e sociedade, independentemente do consumo do Santo Daime pelos grupos
humanos.

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Todos esses fenômenos podem ocorrer com pessoas fardadas recentemente
ou com pessoas com décadas de experiência. Também podem ser precipitados in-
discriminadamente entre os que fazem ou não psicoterapia e entre os que usam (ou
não) psicofármacos prescritos por psiquiatras. Desta feita, nosso problema é saber
lidar de forma qualificada com as emergências espirituais, e ter condições de evi-
tar condutas indesejáveis e minimizar os resultados disruptivos e desagregadores
oriundos dos efeitos de colapso mental.

O Departamento Técnico científico se mostra o locus adequado para integrar


essa importante discussão no âmbito da ICEFLU e ser também um mediador junto
às igrejas locais, para prevenção e atendimento de casos pontuais. Pois considera-
mos que a religião e ciência podem e devem andar juntas.

Passamos em seguida a fazer uma breve síntese das ocorrências de saúde


mental mais significativas e corriqueiras.

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A) Psicoses
Embora seja um instrumento relevante, uma boa anamnese não será capaz de
avaliar os múltiplos casos de psicose que podem ocorrer sob a influência do Santo
Daime. Tendo sublinhado suas limitações, podemos dizer que ela será fundamental
para a prevenção de quadros menos graves, e nos desequilíbrios mentais menores.
Na população brasileira, cerca de 20% das pessoas possui algum tipo de transtorno
mental, e 10% apresenta quadro de transtorno de ansiedade. Na população mun-
dial, 4 % dos indivíduos são bipolares (PMD), o que significa que, dentre aqueles
que procuram o Santo Daime, com certeza haverá um contingente de pessoas com
vulnerabilidade para transtornos mais graves. Os episódios psicóticos provocados
durante ou após ingestão de SD, podem ser de natureza bastante variada. Podem
ser súbitos, ocorrerem após doses muito altas ou frequência exagerada de despa-
chos, bem como anos após o início da jornada espiritual. Esses episódios podem ser
recorrentes e de diferentes intensidades. Na grande maioria dos casos, senão na sua
totalidade, eles decorrem de um núcleo psicótico pré-existente.

É necessário também diferenciar um quadro de surto de outras ocorrências


aparentemente similares, mas que fazem parte da cura do Santo Daime. Estes pe-
quenos “mini surtos” normalmente se findam ao final do trabalho ou algum tempo
depois e normalmente são aprendizados importantes para serem incorporados no
processo de autoconhecimento.

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B) Bipolaridade
Há um amplo espectro de problemas ligados à saúde mental que estão pre-
sentes na irmandade, e que variam de gravidade. A condição de bipolaridade, por
exemplo, merece especial atenção pela inconstância, instabilidade e no comporta-
mento grandiloquente e de difícil trato. Regra básica e geral é de que a qualquer
sinal de desalinho psíquico, ou de comportamento não condizente com um estado
mental aceitável, deva ser suspensa imediatamente a bebida, até que a situação
seja reavaliada pelo núcleo de saúde local e a direção espiritual da casa, em contato
com o Departamento Técnico Científico, se for o caso. Nessas situações, a prudência
é uma boa conselheira, e os possíveis benefícios de ministrar o Santo Daime para
pessoas mentalmente desequilibradas nem sempre compensam os riscos. Mas
nestes casos a busca de vínculo e acolhimento pela corrente espiritual da casa sem-
pre é um elemento importante para ajudar a quem está em crise e desorientação
mental.

C) O aspecto neurótico do processo


Ao iniciar a vida espiritual dentro da Doutrina do Santo Daime, inicia-se ao
mesmo tempo um trabalho lento e gradual de conscientização dos aspectos infan-
tis do comportamento. No ponto de vista da saúde mental, isso pode ser identifica-
do com o caráter oral do desenvolvimento humano¹ , princípio de todo esse grande
e extenso mergulho no si mesmo, com todos os obstáculos pertinentes. Essa ora-
lidade pode ser caracterizada como uma incansável busca em uma falta sentida
e desconhecida, com abastecimento exterior, e se não for sublimada e superada
gradativamente pode gerar compulsões e sofrimento posterior.

Logo, a oralidade é a primeira etapa a ser vencida, para que o ingresso ao


trabalho espiritual possa acontecer de forma mais satisfatória. Ego inflado, mitoma-
nias, busca obsessiva da iluminação, autopromoção, avaliação delirante da própria
competência e ênfase no lucro econômico com a espiritualidade (materialismo es-
piritual), podem ser considerados exemplos da neurose oral, sob o ponto de vista
analítico.

1- Tal conceito é primeiramente formulado pelo médico austríaco Sigmundo Freud, que identificou no caráter oral do desenvolvimento
humano como uma etapa de natureza infantil importante no desenvolvimento da personalidade e da construção de referenciais de segurança física e
psíquica, e que se não for bem desenvolvida leva a comportamentos nocivos por parte do indivíduo adulto. Ver Freud, S. (1996). Três ensaios sobre a
teoria da sexualidade. In J. Strachey (Ed. e Trad.). Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud (Vol. 7, pp. 117-231).
Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1905).

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Nesse sentido, é importante que a direção de nossas igrejas e centros espíritas
tenham consciência de que estão sujeitas a receber todos os tipos de quadros de
neurose, e tem a responsabilidade de, quando for necessário, dar a eles orientação,
sustentação, limite e aconselhamento.

Especial atenção deve ser tomada em relação ao abuso de substâncias psicoa-


tivas. Álcool, cannabis e rapés são utilizados com frequência por vários adeptos da
doutrina, muitas vezes de uma forma compulsiva. Sabemos que há uso social e es-
piritual de uma ou mais dessas substâncias, bem como da revelação e consagração
da Santa Maria recebida pelo Padrinho Sebastião. Isto deve ser resguardado com a
devida deferência, na medida que é uma linha espiritual de grande valor, mesmo
que não possa ser assumida institucionalmente devido a sua falta de status legal.
Entretanto, faz-se mister que o abuso e a banalização no consumo sejam desesti-
mulados e que as igrejas não se furtem de exercer conscientização e até mesmo
controle social sobre essas práticas, naquilo que entra no território da saúde mental
e até mesmo mais graves, como é o caso do tráfico, por exemplo.

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CONTRA
INDICAÇÕES E
INTERAÇÕES
MEDICAMENTOSAS
Genericamente falando, é contra indicado o uso do Santo Daime em condições
de instabilidade mental, com ou sem delírios e alucinações. Quadros de depressão,
ansiedade, fobias ou pânico também devem ser acompanhados de perto. Na vigência
de sinais e sintomas, as pessoas devem ser preparadas, diagnosticadas, medicadas
quando necessário e principalmente encaminhadas à psicoterapia e ao grupo de
apoio em Saúde Mental da Instituição. Para que possa então usufruir de forma plena e
segura desse tão importante trabalho de reforma interior e aquisição de virtudes que
essa Santa Bebida nos possibilita. O setor de trabalho mediúnico dos centros locais
também pode ter um importante papel complementar nesses casos.

Nunca se deve servir Santo Daime a uma pessoa visivelmente desequilibrada ou


sob efeito de álcool ou de uso problemático de outras drogas. A prática médica orien-
ta ainda que o acompanhamento das passagens mais difíceis das pessoas que to-
mam a bebida deve ser realizado com cautela, observância, pertinência e compaixão.

Por outro lado, não há evidência de quaisquer interações medicamentosas com


complicações na administração de qualquer substância médica com o Santo Dai-
me. Incluindo aí antidepressivos, ansiolíticos, anticonvulsivantes ou neurolépticos.
De modo que as tão propaladas listas de medicamentos proscritos para consumo
concomitante com o Santo Daime servem, quando muito, como orientação geral de
observação do estado mental dos adeptos, não havendo ainda uma comprovação
empírica e clínica que exija uma normatização rígida, nem que esta lista seja um guia
definitivo de quem pode ou não tomar a bebida. De qualquer maneira, cada caso
deve ser avaliado de perto pelos responsáveis, com acompanhamento constante das
possíveis alterações comportamentais das pessoas que continuarem a frequentar os
trabalhos espirituais utilizando algum tipo de medicação.
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PLURALIDADE DE
PERSPECTIVAS E
INTEGRAÇÃO
As ciências da saúde, conquanto muito importantes para a prevenção e o tra-
tamento de questões de saúde mental na irmandade, não estão em oposição à di-
mensão espiritual da vida religiosa e às perspectivas tradicionais da cura espiritual,
xamânica e ao contexto mediúnico, onde, em alguns casos, elas se desenvolvem.
Todas estas instâncias contribuem para a compreensão e a cura do sofrimento,
seja ele espiritual, físico, emocional ou mental. Longe de serem excludentes, essas
perspectivas são complementares. O corpo de médiuns de um centro, a sabedoria
dos anciãos, a importância do papel terapêutico da experiência visionária conti-
da nas mirações e a própria interpretação individual de cada membro sobre seu
próprio processo, permanecem com um papel importante no entendimento e na
compreensão da saúde holística do ser humano e dos comportamentos desviantes
do padrão ou tidos como problemáticos. Trata-se de linguagens diferentes, abor-
dagens diferentes e metodologias diferentes para lidar com o mesmo fenômeno.

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Entendendo-se que “no Santo Daime tudo se soma”, é importante, contudo, res-
guardar um lugar importante para a clínica médica e a abordagem científica da
saúde mental, que pode e deve ser melhor aproveitada, aprofundada, padronizada
e organizada no âmbito das igrejas, tanto para prevenção e tratamento de surtos
quanto também para a garantia legal do uso de nosso sacramento no contexto
religioso daimista. Sendo assim, é importante que todos os centros e seus respec-
tivos dirigentes se sensibilizem para a necessidade de formação e/ou reativação
de equipes de saúde locais, ao mesmo tempo em que o setor de saúde mental da
instituição se disponha também ao diálogo interdisciplinar e às salutares trocas de
experiências e à integração junto aos representantes de nossos centros associados

Este documento pretende ser uma proposta base para iniciar um debate pela
formação do nosso setor de Saúde Mental. Convidamos a todos que queiram par-
ticipar e contribuir.

Atenciosamente,

GT provisório em Saúde Mental - ICEFLU

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