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Urgência e emergência em saúde mental

Alice Medeiros Lima

Descrição

O conceito de crise em saúde mental e a importância de cuidados articulados em situações de urgência e


emergência.

Propósito

Conhecer o conceito de crise e as situações de urgência e emergência em saúde mental é importante para a
promoção de um cuidado integral, acolhendo o sujeito e realizando um trabalho compartilhado e
colaborativo em uma rede de atenção à saúde articulada, em um contexto de reconhecimento da relevância
do cuidado em liberdade e fortalecimento dos serviços territoriais extra-hospitalares.

Objetivos
Módulo 1

Urgência e emergência em saúde mental


Identificar situações de urgência e emergência e os desafios para o manejo da crise em saúde mental.

Módulo 2

Atuação interprofissional saúde mental


Reconhecer a importância da atuação interprofissional no manejo da crise em saúde mental e a
relevância da articulação em rede para o contorno da crise.
meeting_room
Introdução
Este conteúdo contribuirá para que sua atuação como futuro profissional de saúde seja pautada em um
cuidado respeitoso, ancorado na busca pela dignidade e integralidade de pessoas que se encontram em
sofrimento psíquico, nos momentos de crise, em que o pedido por ajuda pode aparecer de diversas formas.

Dedicar-se a este estudo possibilitará maior sensibilidade para você perceber sinais e sintomas de crise em
saúde mental, assim como para que reconheça que o trabalho em rede, realizado de maneira colaborativa,
contribui para sustentar os aspectos preconizados pela Reforma Psiquiátrica e os princípios doutrinários do
Sistema Único de Saúde: equidade, integralidade e universalidade.

Para conhecermos melhor sobre urgência e emergência em saúde mental, dividimos este material em duas
partes. Em cada uma delas, teremos um estudo de caso para promover discussões sobre os principais
pontos da temática. Vamos lá!
1 - Urgência e emergência em saúde mental
Ao final deste módulo, você será capaz de identificar situações de urgência e emergência e os
desafios para o manejo da crise em saúde mental.

Quem é normal?
O que é considerado normal? Qual o limite entre o que é aceitável e o que é desviante? Seria simples
responder a essas reflexões com base em todos os manuais existentes de diagnósticos em psiquiatria, que
atualmente oferecem um grande leque de opções diagnósticas.

Sem dúvidas, o avanço na área da psicopatologia foi e é essencial para romper com questões históricas no
campo da psiquiatria, como o olhar para as questões psíquicas atribuindo origem e causa de cunho
espiritual ou as práticas violentas sem embasamento científico e terapêutico direcionadas para a clientela
que apresentava sofrimento psíquico. Mas reduzir as respostas dessas reflexões a classificações
nosológicas é reduzir o sujeito ao olhar meramente biologicista, e não é essa a proposta da saúde mental e
da atenção psicossocial.

“E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não
podiam escutar a música.”

Essa é uma frase conhecida, atribuída ao filósofo Friedrich Nietzsche (1844-1900), cuja autoria não foi
confirmada, mas que ajuda a nos introduzir no campo reflexivo sobre diagnósticos psicopatológicos. Não
temos aqui uma resposta definitiva para os questionamentos apontados, podemos apenas deixar que essas
inquietações nos acompanhem durante a atuação e a formação na área da atenção psicossocial.
Ao longo deste material, discutiremos questões importantes sobre o conceito de crise em saúde mental: o
que é crise? Toda crise faz barulho e é facilmente notada? Como o profissional deve atuar diante de um
agravamento no quadro de um usuário de saúde mental?

Vamos conversar sobre o conceito de crise, para que possamos identificar sinais e sintomas de
agravamento do sofrimento psíquico, considerando que cada sujeito sente de uma forma, ou seja,
considerando sempre a singularidade de cada acompanhamento feito, para, a partir disso, traçarmos o
plano de cuidados necessário.

Antes de entrarmos nesses pontos, convidamos você a conhecer a história de Paulo.

A história de Paulo
Paulo tem 38 anos, frequenta o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) do tipo II do seu bairro, ou seja, o
CAPS de que ele é usuário funciona durante os dias úteis da semana, até às 18h. O Projeto Terapêutico
Singular (PTS) construído para Paulo prevê uma frequência intensiva no serviço, dessa maneira, todos os
dias ele vai ao CAPS.

No CAPS, Paulo tem como profissionais de referência a enfermeira Lívia e o médico psiquiatra Renato. Duas
vezes na semana, ele é atendido por Lívia no consultório, para contar suas questões e, uma vez por mês,
passa por consulta com Renato.

Paulo participa da oficina de passeio, da oficina de literatura e da oficina de cinema. Faz duas refeições
diárias no CAPS, café da manhã e almoço, e retira a medicação prescrita pelo seu médico no próprio serviço
uma vez por semana.
Paulo tem o diagnóstico de transtorno bipolar tipo I, porém, com o acompanhamento do CAPS, seu quadro
permanece estável por bastante tempo. Na rotina do serviço, costuma dizer que contribui com a
organização, comunicando horário de almoço e das oficinas e fazendo lista de presença para ambos, e a
equipe entendeu que tal reconhecimento é importante para ele. Por muitas vezes, diz que precisa estar no
CAPS para se tratar e para cuidar dos demais usuários, e isso o organiza psiquicamente.

Paulo mora com seu irmão Roberto, com quem possui uma relação conflituosa. Roberto assumiu os
cuidados de Paulo, pois é mais velho. Porém, na mesma medida que se preocupa e cuida do irmão, Roberto
faz constantes ameaças a Paulo sobre internação psiquiátrica, caso não se comporte.

Todos os dias, Roberto liga para o CAPS para reclamar e dar notícias de Paulo, mas, muitas vezes, fala dele
mesmo. O CAPS incluiu tal rotina no PTS de Paulo, pois não basta cuidar do usuário, é preciso incluir a
família. Ouvir Roberto é também cuidar de Paulo.

Por mais complexa que seja a relação dos irmãos, a convivência de ambos é intensa, sendo raros os
momentos em que se afastam. Basicamente, esse afastamento só ocorre quando Paulo está no CAPS. Em
determinado momento, Roberto foi convidado para trabalhar em outra cidade por uma semana e precisou
aceitar, pois o valor a ser pago daria para organizar as contas do mês. Diante de tal fato, o CAPS começou a
ajudar na organização para essa semana em que Roberto estaria ausente.

Paulo passaria mais tempo durante todos os dias da semana no CAPS e, durante a noite, teria uma
cuidadora já conhecida, contratada por Roberto, para ajudar com as medicações e refeições. Tudo parecia
fluir bem, até que a data da viagem se aproximou.

Dois dias antes de Roberto viajar, Paulo ligou para o CAPS comunicando que não iria, pois se sentia “muito
bem para se tratar em um CAPS” e acrescentou que “descobriu ser filho do dono da maior empresa de
televisão brasileira”. Lívia, a enfermeira que atende Paulo, percebeu que seu discurso estava diferente e
insistiu que ele fosse ao serviço, porém não obteve sucesso. Sendo assim, o CAPS organizou uma visita
domiciliar no mesmo dia para avaliar a situação.

Na casa de Paulo, os profissionais puderam notar que ele se encontrava exaltado, hostil e com fala
acelerada, demonstrando um fluxo incessante de pensamentos. Roberto contou que Paulo estava sem
dormir há dois dias. Paulo apresentava delírio de grandeza, dizendo ser dono do país e que não deixaria
ninguém encostar nele.
Foi preciso acionar o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) e levá-lo para o serviço de
emergência da região. Os profissionais do CAPS acompanharam esse percurso, junto com o irmão.

No serviço de emergência, após avaliação da equipe do local e conversa com Roberto e profissionais do
CAPS, foi decidido que Paulo permaneceria em observação. Após muitas horas, com o quadro um pouco
menos instável, Paulo pede que todos o ajudem a suportar ficar longe do seu irmão. Dessa maneira, nos
dois dias em que ficou no serviço de emergência, a equipe do CAPS se fez presente, assim como a
cuidadora que havia sido contratada. Quando teve alta, Paulo sentiu-se mais seguro para lidar com os dias
de ausência de Roberto.

Nesse pequeno recorte da história de Paulo, você consegue perceber o quanto é importante um trabalho
articulado para sustentar o cuidado no território, incluindo a atenção à crise? Consegue perceber a
delicadeza das relações e o quanto é importante conhecer a dinâmica familiar dos usuários, podendo
acolher de maneira singular cada caso?

Na situação de Paulo, por mais conturbada que fosse a relação com Roberto, o CAPS precisava, além de
fazer intervenções nas dificuldades, dar lugar ao que foi construído entre os irmãos. Se os profissionais do
CAPS entrassem numa posição de separar os irmãos em função dos conflitos existentes, imagine o quão
drástico isso seria para Paulo!

A atenção psicossocial
Pensando na história de Paulo, conseguimos identificar o momento em que ele entrou em crise,
considerando sua história de vida e os sintomas apresentados no momento.

Nosso caminho nesse estudo é na direção da atenção psicossocial, ou seja, entendemos que a crise não se
reduz a sinais e sintomas, como pressupõe o modelo médico, e sim tem forte relação com fatores
determinantes no âmbito psicossocial que podem desencadear um agravamento psíquico.

Se, por acaso, algum dia, você conhecer ou atuar em algum serviço de urgência e emergência, pensando nas
questões da saúde mental, você vai perceber a dificuldade de romper com o modelo da psiquiatria
tradicional, ainda vigente fortemente nesses espaços que exigem intervenção imediata, com predomínio da
lógica biologicista, com forte conduta medicamentosa. Para Bonfada e colaboradores:

Mesmo diante de tantas limitações, historicamente, a assistência individual e


curativista assumiu o papel de protagonista da produção dos serviços de
saúde. Tal situação ganha força na atualidade pela existência de uma série de
determinantes. Um deles seria a formação profissional ainda embasada em
referências que não dão suporte para a realização da assistência que tenha
como eixo estruturante a integralidade da atenção à saúde e que, sobretudo,
esteja voltada para a transformação da realidade de saúde dos mais diversos
espaços sociais. Outro determinante é a influência mercadológica capitalista
que, sob a influência das grandes empresas em saúde, principais privilegiadas
por essa organização, aponta a atenção curativa como sendo rentável e a
saúde como uma mercadoria a ser consumida e negociada.

(BONFADA et al., 2012, p. 557)


Então a medicação e o diagnóstico não são
importantes?
Claro que são! Como dissemos, o avanço na psicofarmacologia e nos estudos da psicopatologia têm
grande relevância, principalmente quando olhamos para a história da loucura, com predomínio de condutas
extremamente violentas e empíricas por séculos. A chegada do olhar científico possibilitou o rompimento
com práticas equivocadas e punitivas.

Comentário

Ao mesmo tempo, o uso banalizado da medicação e o excesso de diagnósticos psiquiátricos podem


contribuir para uma tutela de pessoas consideradas desviantes, configurando também uma violência, porém
velada. É preciso incluir a medicação e o diagnóstico dentro do cuidado como ferramentas importantes,
mas não exclusivas.

Como agir dentro de serviços de urgência e


emergência?
Perceba que, neste conteúdo, falaremos de urgência e emergência num aspecto maior, muito além de
serviços; de momentos de agudização de sintomas psíquicos que precisam ser acolhidos nos mais diversos
espaços do SUS e do território, desde a atenção primária até os serviços de urgência e emergência, como
Unidades de Pronto Atendimento (UPA) e pronto-socorro. Ou seja, olharemos para esse tema na perspectiva
da integralidade.

Atenção!

É importante entendermos que nem toda crise necessita de internação e que não se trata somente de
intervenção do profissional médico.

Muitas vezes, a crise é uma tentativa de saída e busca de resolução para alguma questão conflituosa.
Lembrando-se da história do Paulo, você consegue perceber que a separação do irmão era grave para ele e
que depois de todo um conjunto de ações, com diferentes atores, ele conseguiu pedir ajuda para suportar?
Emergência, urgência e crise em saúde mental
Antes de prosseguirmos, é importante compreender as diferenças entre emergência e urgência na área de
saúde, pois muitas vezes os conceitos são utilizados de maneira equivocada.

Emergência

Significa risco iminente de vida, sendo necessária a intervenção o mais breve possível.

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Urgência

Significa agudização de uma questão clínica, sem risco iminente de vida.

Trazendo para a saúde mental, essa linha tênue entre os conceitos fica mais complexa ainda de diferenciar
no contexto de crise.

Mas o que seria crise em saúde mental?


Quando buscamos nos mais diversos dicionários da língua portuguesa, vemos definições variadas, mas
trazendo para o viés da saúde mental, conseguimos encontrar: “alteração súbita”; “momento decisivo”;
“estado emocional de súbito desequilíbrio”; “manifestação de sofrimento com maior intensidade”.

No Caderno de Atenção Básica nº 34, de 2013, temos a seguinte definição de crise:


A palavra crise vem do grego krísis, que significava, na sua origem, momento
de decisão, de mudança súbita; separar, decidir, julgar. Na história da Medicina,
segundo antigas concepções, constituía um momento decisivo para evolução
de uma doença para cura ou para morte. Para os chineses significa, ao mesmo
tempo, risco e oportunidade.

(BRASIL, 2013, p. 100)

Existem diversas linhas de entendimento e de intervenção na atenção à crise, mas predomina o consenso
que há o reconhecimento que o sujeito está em uma situação grave e aguda. Para Dias, Ferigato e
Fernandes:

A crise em saúde mental corresponde a casos psiquiátricos considerados


agudos, com referência na intensidade, frequência e gravidade de sintomas em
uma correspondência histórica entre gravidade, periculosidade e internação
psiquiátrica. Esta perspectiva é hegemônica ainda no meio biomédico. Neste
sentido, o caráter agudo, a noção de risco, necessidade de intervenção
imediata e gravidade definem o espaço institucional de cuidado. A maior parte
dos quadros entendidos hoje como crise era classificada como referência
médica, como urgência ou emergências psiquiátricas. Entretanto, há
divergências entre esses termos. Atualmente, predomina o referencial de que
nem toda crise é uma urgência ou emergência psiquiátrica e não pode ser
manejada de forma acrítica com as mesmas tecnologias de cuidado.

(DIAS; FERIGATO; FERNANDES, 2020, p. 596)

É importante que você saiba que, embora a crise seja uma agudização e um agravamento de um quadro
psíquico, quando estamos diante de uma abordagem da psiquiatria tradicional, a conduta é baseada na
intervenção medicamentosa, com foco em remissão de sintomas, em um ambiente mais recluso, protocolar
e no modelo médico centrado. Já na abordagem psicossocial, segundo a qual nos orientamos neste
material, considera-se a singularidade de cada situação, pensando em inclusão, acolhimento dos sintomas e
sofrimento, organização de pontos estratégicos de apoio na comunidade/no território e
corresponsabilização do cuidado.
Trazemos aqui pontos descritos por Dell'Acqua e Mezzina (1991) que contribuem para avaliar situações de
crise. Mesmo sendo do início da década de 1990, essa concepção ainda é atual, sendo preciso identificar
pelo menos três entre as cinco questões definidas:

Grave sintomatologia psiquiátrica aguda.

Grave ruptura de relação no plano familiar e/ou social.

Recusa dos tratamentos por afirmação da não necessidade do tratamento, embora aceite o
contato.
Recusa obstinada do contato propriamente dito.

Situações de alarme no contexto familiar e/ou social com incapacidade pessoal de


contorná-las.

A crise em saúde mental escancara a dificuldade de alguns espaços em sustentarem os princípios da


Reforma Psiquiátrica no cotidiano, fazendo intervenções verticais e invasivas. Por isso, é essencial
aprofundar os estudos e as práticas formativas que visem ao reconhecimento da rede extra-hospitalar como
estratégia potente para acompanhar o usuário, inclusive nos momentos mais difíceis.

Comentário
É crucial também que haja fortalecimento das políticas públicas na área da saúde mental, da Rede de
Atenção Psicossocial (RAPS), com maior investimento nos serviços e dispositivos territoriais. Muitas vezes,
a precarização da rede extra-hospitalar ocasiona uma maior presença de usuários em crise em ambiente
hospitalar.

Tecnologias leves do cuidado


Você já deve ter ouvido falar em tecnologias leves do cuidado. Caso não conheça, apresentaremos uma
breve definição para prosseguirmos. Segundo Merhy (2003), tecnologias leves do cuidado são: produção de
vínculo, acolhimento, escuta, estímulo da autonomia. Agora, responda a uma pergunta:

Você acha que, para atuar em situações de crise, é possível lançar mão das tecnologias leves?

Resposta

Sem dúvidas! Muitas vezes, esses recursos citados são os que possibilitam contornar a crise.

Quando falamos em acolhimento, não estamos falando em triagem. Infelizmente, nos dias atuais, muitos
utilizam esses conceitos como sinônimos, mas não são! Pense em acolhimento como postura e respeito à
dignidade. O usuário precisa sair melhor que chegou, mesmo que receba uma notícia complexa, é
necessário que o profissional tenha promovido conforto e escuta para o acolhimento acontecer.

E em relação ao vínculo? Como podemos produzir vínculo? Sabemos que para isso acontecer, é preciso
deixar o afeto circular. Muitos estudantes e profissionais da área da saúde ainda acreditam que demonstrar
sensibilidade e emoções pode ser prejudicial.

Grande engano! Situações de urgência e emergência podem ser melhor contornadas a partir do vínculo, pois
ele possibilita o protagonismo dos usuários e a corresponsabilização do cuidado.

É muito comum, no cotidiano dos CAPS, quando algum usuário chega em crise, a presença de um
profissional que transmita confiança e que possibilite organizar e acalmar momentos de angústia e
insegurança. Uma atividade proposta nesse momento, uma presença silenciosa, uma escuta são
ferramentas potentes para evitar intervenções invasivas muitas vezes. Ou seja, a partir de um vínculo
construído cuidadosamente, podemos acolher a crise no território.

A importância de reconhecer sinais e sintomas


Como você imagina alguém em crise? Lembrando que todos nós temos momentos de crise, podemos até
recuperar alguma lembrança de um momento mais complexo em nossas vidas. Mas na área da saúde
mental e atenção psicossocial, a crise muitas vezes é vista somente como agitação. Possivelmente, você
imaginou alguém agitado quando perguntamos. Mas, sem dúvidas, crise não se reduz à agitação. Vamos
falar um pouco de sinais e sintomas!

Começando pela questão da agitação no momento de crise, os usuários que se encontram agitados
raramente reconhecem que precisam de ajuda e normalmente não chegam desacompanhados aos
serviços. Ou seja, muitas vezes, nesse quadro, os pacientes não possuem consciência de morbidade!

Podem também estar auto ou heteroagressivos, portanto, colocando a própria integridade ou de terceiros
em risco.

Atenção!

Em quadros de agitação, é crucial que os profissionais descartem questões clínicas como possíveis
causadoras, como hipóxia, hipertermia, hipotermia, hipoglicemia, doenças que afetam a tireoide, entre
outras. É necessário também investigar se houve uso abusivo de substâncias psicoativas ou se tem relação
com síndrome de abstinência. Direções que apontam para causas clínicas muitas vezes são: início
repentino, idade superior a 40 anos, sem histórico de adoecimento psíquico anterior, confusão mental,
desorientação, alucinações visuais, alucinações cenestésicas e alucinações olfativas.

Agora, vamos analisar um caso de atendimento:

O caso de Maria expand_more

Um casal chega ao CAPS de um grande bairro do município do Rio de Janeiro. Quem busca ajuda é
Pedro, pois Maria, sua esposa, encontra-se visivelmente confusa e desorganizada. Rapidamente,
uma dupla de profissionais do serviço, que estava escalada para fazer acolhimento e atendimentos
de primeira vez naquele turno, dispôs-se a atendê-los. Quando a enfermeira do serviço os convida a
sentar nas cadeiras, Maria tira sua vestimenta. Então Pedro disse: “Ela começou a ficar assim de
repente, tem uma semana! Peço para pentear o cabelo, ela deita. Peço para comer, ela canta. Ela era
normal”.
Tal relato chamou a atenção da enfermeira e do psicólogo, que, durante o atendimento, pediram
dados da história de Maria e não perceberam nenhum relato que apontasse para um adoecimento
psíquico anterior.

Em determinado momento, a enfermeira perguntou se Maria estava fazendo uso de alguma


medicação, pois parecia estar com alguma alteração clínica. Pedro respondeu que, há doze dias, ela
começou a usar medicação, pois descobriu diabetes do tipo II. Diante dessa informação, a
enfermeira verificou a glicemia de Maria e viu que ela apresentava grave hipoglicemia.

Pedro disse que não receberam orientação sobre o diagnóstico e a medicação, contando que foram
em uma clínica com preço mais acessível para Maria ser atendida. Nesse momento, a enfermeira fez
as condutas clínicas necessárias, orientou sobre o diabetes tipo II e a medicação. O psicólogo entrou
em contato com a Estratégia de Saúde da Família (ESF) da área de referência de Pedro e Maria e
explicou a situação, deixando combinado com o enfermeiro da ESF que os dois iriam até lá para
começar um acompanhamento mais de perto. Os profissionais esclareceram para o casal a
importância da Atenção Básica na prevenção de agravos e na promoção de saúde, em questões
como diabetes.

Nesse pequeno relato, você conseguiu perceber o quanto são importantes o olhar atento e a escuta
cuidadosa dos profissionais? A percepção sobre a história de Maria, a avaliação do estado da condição
clínica dela e a posterior articulação com a rede de saúde foram essenciais para o sucesso do caso. Uma
crise psíquica foi descartada, e uma questão clínica foi cuidada.

Não se esqueça de que, normalmente, um agravo clínico tem início súbito e evolui
rapidamente, enquanto uma crise de saúde mental tem início mais lento e evolução
gradual e contínua, com história prévia, mesmo que sejam detalhes minuciosos!

Outras questões podem significar crise, por exemplo, em diversos casos de síndromes depressivas e
também de ideação e/ou comportamento suicida, não necessariamente o usuário vai apresentar agitação e
agressividade.
Muitas vezes, o sujeito encontra-se mais recluso, com predomínio de muitos pensamentos de conteúdo
negativo, apresentando retração social. A crise nem sempre faz barulho e frequentemente não é simples
identificar um pedido de ajuda que vem do outro.

Atendimento e manejo da crise


Lembra a primeira vez que você entrou em uma sala de aula? Uma mistura de sentimentos acontece com a
maior parte das pessoas nesse momento. Muitos se sentem observados, isolados e deslocados. Se você
teve a sorte de alguém se apresentar e te acolher, sem dúvidas, isso fez toda a diferença para a sua
chegada.

Agora imagine uma situação de crise em saúde mental. Como os usuários devem ser recebidos?

É muito importante, para os usuários em crise que chegam pela primeira vez no serviço, a apresentação de
cada profissional envolvido no atendimento, dizendo nome e ocupação profissional. A maneira como a
entrevista/consulta é conduzida pode determinar todo o seguimento das condutas, ou seja, é preciso
acolher e ser flexível, demonstrando empatia e atenção.

Atenção!

É primordial o atendimento em equipe na situação de crise, pois, dessa maneira, evita-se o agravamento do
quadro de pacientes paranoides e promove-se maior segurança para todos os envolvidos na cena de
agitação e/ou outros tipos de sofrimentos psíquicos intensos.
Os usuários que apresentam agitação psicomotora, hostilidade ou qualquer outro sintoma que seja
considerado mais crítico devem ser atendidos em um local com maior privacidade. Outro aspecto a que se
deve ter atenção é evitar que o usuário seja exposto a fatores que aumentam o estresse e que sejam
reconhecidamente gatilhos para aumento do sofrimento, como a interação com um familiar com quem
tenha uma relação conturbada ou outra pessoa que o usuário dê notícias de um delírio persecutório e/ou
desconfiança e desconforto.

Durante o atendimento numa situação de crise, é importante demonstrar parceria e acolhimento, evitando
fazer muitas anotações ou olhar o celular e relógio, por exemplo.

Imagine a seguinte situação: um usuário que apresenta alteração no conteúdo do pensamento, com delírio
de cunho persecutório, chega ao serviço de saúde mental e diz que está sendo monitorado pela Nasa,
acreditando ter um chip implantado na axila, com câmeras por todo o ambiente. Se, nesse momento, o
profissional preocupa-se somente em anotar ou olha frequentemente para o celular, tal postura pode servir
para intensificar o quadro delirante do usuário. Se o profissional se preocupa em escutar, cuidando para não
ser invasivo e não emitir julgamentos, traçando junto com o usuário uma conversa para acompanhar seu
discurso, temos maiores chances de uma assistência mais resolutiva e humanizada.

Durante situações de crise, é importante evitar fazer anotações.

Ao encontro dos pontos acima, resumiremos os apontamentos feitos por Paulo Dalgalarrondo (2019), em
seu livro Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais, em que ressalta algumas atitudes que o
profissional deve evitar em uma entrevista com o paciente e algumas formas adequadas de intervenção:

01

Posturas rígidas estereotipadas: deve buscar uma atitude flexível, que seja adequada à personalidade do
doente, aos sintomas que apresenta no momento, à sua bagagem cultural, aos seus valores e à sua
linguagem.

02
Atitude excessivamente neutra ou fria: transmite ao paciente a sensação de distância e desprezo.

03

Reações exageradamente emocionais: criar um clima de confiança, uma atitude receptiva e calorosa, mas
discreta e de respeito e consideração pelo paciente é o ideal para a primeira entrevista.

04

Evitar emitir julgamento ou comentários valorativos

05

Evitar reações emocionais intensas de pena ou compaixão: o paciente se beneficia de um profissional que
acolha seu sofrimento de forma empática, mas que não se desespere com ele.

06

Evitar responder com hostilidade ou agressão às investidas agressivas ou hostis de alguns pacientes.

07

Entrevistas excessivamente prolixas: o entrevistador deve conduzir a entrevista para pontos mais
significativos, interrompendo a fala do paciente quando achar necessário.

08
Evitar fazer muitas anotações durante a entrevista.

A contenção mecânica
Saiba que toda essa reflexão e orientação teórica o ajudará bastante na prática do cuidado na área da
atenção psicossocial, mas a rotina nos serviços contribui bastante para o aprimoramento das intervenções.
Para encerrar este módulo, falaremos sobre contenção mecânica.

Lembra-se de quando você estudou a história da loucura e aprendeu que os loucos eram amordaçados e
acorrentados? Com o passar do tempo, veio a camisa de força, que hoje também já é considerada um
método violento e equivocado.

Atualmente, utilizamos a contenção mecânica como última ferramenta terapêutica, quando todas as outras
tentativas não mostraram eficácia na proteção ao usuário e aos demais. Normalmente, os materiais
utilizados são: compressas de gaze ou algodão ortopédico, ataduras de crepom e esparadrapo, utilizadas
nos membros superiores e inferiores.

Antes de chegar nesse ponto, é preciso apostar na presença, na palavra, na escuta, ou seja, nas tecnologias
leves do cuidado de que falamos anteriormente. Se houver vínculo com o usuário, melhor ainda. Esses
recursos potentes podem funcionar como contenção para um momento de alteração aguda do estado
mental. Quando essa aposta ainda não é suficiente, o profissional médico prescreve a contenção química,
ou seja, recorre à medicação de emergência para tentar contornar a crise. Quando, ainda assim, não temos
uma melhora no quadro e os riscos à vida do usuário ou dos demais ainda estão em jogo, recorremos à
contenção mecânica.

Pontos fundamentais: toda a equipe deve ser sensibilizada quanto à função da contenção mecânica, que
tem o intuito de proteção à vida em situações extremas e jamais deve ser utilizada como punição! Seu uso
nunca pode ser banalizado e nem pode virar rotina em um serviço! É importante que outros membros da
equipe estejam na cena de contenção e não somente as equipes de enfermagem e médica, mesmo que
sejam esses a conduzir tecnicamente o procedimento.

É de grande relevância que a contenção seja feita em local discreto, com preservação da privacidade do
usuário, que já se encontra vulnerável!

Atenção!

A contenção mecânica pode causar lesões graves, com risco de trauma e restrição de fluxo sanguíneo. O
usuário que está nessa situação precisa ter os sinais vitais monitorados e deve ser acompanhado durante
todo o tempo!

Existem muitos mecanismos menos invasivos de proteger o usuário em momentos de alterações agudas do
estado mental. Precisamos apostar em estratégias de manejo da crise que preservem o sujeito e promovam
respeito e acolhimento, para assim sustentarmos os pilares da Reforma Psiquiátrica em todos os espaços e
contextos!

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Atendimento e manejo da crise
Neste vídeo, o especialista fala sobre o uso prioritário de tecnologias leves do cuidado em contraposição a
intervenções invasivas, destacando o uso oportuno da contenção mecânica.
Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

A crise em saúde mental, muitas vezes, é uma tentativa do sujeito de resolução de conflitos, ou seja, um
recurso para lidar com determinado fator ou um conjunto de fatores considerados problemáticos. Em
relação à atenção à crise dentro da perspectiva da atenção psicossocial, marque a alternativa correta:

Na abordagem psicossocial, é importante a intervenção imediata na sintomatologia


A
apresentada, buscando remissão total.

Na abordagem psicossocial, nem sempre crise significa urgência e emergência, sendo


B
necessário considerar o fortalecimento do trabalho no território para maior suporte.

Dentro da perspectiva psicossocial, o modelo preconizado é médico centrado nas


C
situações de crise, sendo primordial o protagonismo do médico.

Em situações de crise em saúde mental, a perspectiva da atenção psicossocial prioriza


D
a intervenção medicamentosa imediata para interromper o quadro.

Na abordagem psicossocial, diante de uma situação de crise, é fundamental atuar em


E
ambiente fora do território, com uso prioritário de contenção mecânica.

Parabéns! A alternativa B está correta.

Na perspectiva da atenção psicossocial, a crise não representa sempre um quadro de urgência e


emergência em que seja preconizada a internação e a conduta focada em remissão de sintomas, e sim
um fortalecimento da rede no território para o cuidado. A alternativa A está incorreta porque nessa
abordagem não se considera a intervenção imediata na sintomatologia buscando remissão, e sim é
priorizado o cuidado ao sujeito, acolhendo seu sofrimento. A alternativa C está incorreta, já que o
modelo de cuidado à crise na perspectiva psicossocial é interprofissional, e não médico centrado. A
alternativa D está incorreta, visto que na abordagem psicossocial não é prioridade recorrer
imediatamente à medicação, que deve ser utilizada como mais uma ferramenta no cuidado, quando
outras tentativas de escuta e presença não foram suficientes. A alternativa E está incorreta, dado que
na atenção psicossocial o acolhimento à crise também passa pelo território, tendo a contenção
mecânica como última opção.

Questão 2
Em momentos de alteração aguda do estado mental de um usuário, existem estratégias para lidar com
o manejo da crise apresentada, principalmente em quadros de agitação psicomotora. Marque a
alternativa correta em relação ao uso dessas estratégias:

É importante apostar na escuta, no vínculo e na palavra quando o usuário chega em


A
crise, pois, muitas vezes, essas tecnologias leves funcionam como contenção.

É primordial lançar mão da contenção química como primeira opção de intervenção


B
nessas situações, para depois apostar em escuta e presença.

A contenção mecânica deve anteceder a contenção química e a escuta, pois em


C
momentos de alteração aguda do estado mental não existe outra possibilidade.

A contenção mecânica deve ser atribuição somente da equipe de enfermagem,


D
retirando os demais membros da equipe do contexto de intervenção.

A contenção mecânica é realizada atualmente com camisa de força, pois assim o


E
usuário pode circular sem movimentar os braços.

Parabéns! A alternativa A está correta.

Em situações de crise, ao ofertar escuta e presença, com vínculo estabelecido, o usuário pode sentir
uma espécie de contenção para o que o desorganiza e agita naquele momento. A alternativa B está
incorreta, visto que a contenção química deve acontecer após a oferta de escuta, e não antes. A
alternativa C está incorreta, uma vez que a contenção mecânica deve ser a última opção nos momentos
de crise com agitação, após tentativa de escuta, conversa e intervenção medicamentosa. A alternativa
D está incorreta porque não é possível deixar a equipe de enfermagem sem apoio e presença dos
demais membros da equipe multiprofissional no momento da contenção. A alternativa E está errada, já
que a camisa de força não é mais utilizada em função dos diversos tipos de acidentes envolvidos e da
violência imposta por essa ferramenta.
2 - Atuação interprofissional saúde mental
Ao final deste módulo, você será capaz de reconhecer a importância da atuação
interprofissional no manejo da crise em saúde mental e a relevância da articulação em rede
para o contorno da crise.

A história de Wesley
Neste módulo, conversaremos sobre acolhimento da crise no território; o papel do CAPS no acolhimento à
crise; as emergências hospitalares e a crise em saúde mental; e a articulação em rede diante da crise. Antes
de entrarmos nesses pontos, convidamos você a conhecer a história de Wesley.

Wesley tem 40 anos, é usuário do CAPS AD tipo III do seu bairro de referência há 10 anos. A história de vida
dele é marcada por abandono, barreiras sociais e grande vulnerabilidade. Vamos começar pela infância dele
até chegar à idade adulta, quando precisou do CAPS.

Quando nasceu, Wesley e seus dois irmãos foram abandonados pelos pais, que, segundo informações do
usuário, faziam uso abusivo de drogas. Diante disso, ele e seus irmãos permaneceram por um tempo nas
ruas, até que foram separados quando os direcionaram para instituições diferentes voltadas para o público
infantojuvenil.
Wesley sofria muito com a saudade que sentia de seus irmãos e dizia que sonhava com o dia em que
ficariam juntos novamente.

Os anos foram passando e, no início da idade adulta, ele começou a sentir dificuldade com a rotina rígida do
abrigo em que morava, começando a passar mais horas diárias nas ruas. Por desobedecer frequentemente
à rotina do abrigo, foi expulso da instituição, passando a permanecer nas ruas.

Tudo parecia ficar mais difícil nessa condição, pois não conseguia trabalho e lugar para morar. Depois de
muita recusa e barreiras para acessar necessidades humanas básicas, Wesley começou a fazer uso
inalatório de um solvente de tinta que possibilitava que ele se desconectasse da fome e do abandono que
causavam tanta dor.

A situação ia ficando mais grave: miséria social, solidão, uso abusivo de drogas, fome.

Wesley chegou ao CAPS AD III, em 2011, por meio da recomendação de amigos da igreja que frequentava
naquele período para tentar abandonar o vício das drogas. Ele dizia que buscava um milagre naquela igreja:
queria trabalhar, parar de usar drogas, casar e ter filhos. Apesar de não ter sustentado esse desejo por muito
tempo, foi essencial para a chegada do jovem no CAPS, a partir da articulação de amigos que conheceu
naquele espaço.

No CAPS, Wesley conheceu uma moça que dizia ter o mesmo problema e que gostaria de parar de usar
drogas. Os dois decidiram morar juntos depois de um breve tempo de namoro. O casal ia para o CAPS
diariamente. No serviço, participavam de oficinas, tinham atendimento individual, atendimento
medicamentoso e faziam as refeições.
Foi possível garantir o direito de ambos ao benefício da assistência social, o que possibilitou que cuidassem
melhor da casa em que moravam e também acessar questões básicas, como alimentação, água e energia
elétrica.

Mesmo com essa estrutura alcançada, as dificuldades eram grandes. Quando Wesley tinha uma “recaída”,
como chamava, e usava muitas drogas, sua companheira também acompanhava esse movimento. E um
detalhe mais complexo: ele também tinha diagnóstico de esquizofrenia paranoide. Em função disso, o CAPS
AD III entrou em contato com o CAPS II da região e começaram a fazer contato constante para discussão do
caso.

Em determinado momento, Wesley pediu para sair do CAPS AD III e ir para o CAPS II, pois lá não ouviria
tanto dos outros usuários sobre drogas. Depois de muitas discussões, os dois CAPS decidiram que ele
deveria ter referência em ambos os serviços, o que foi muito positivo para o acompanhamento.

Quando entrava em crise, Wesley chegava com agitação psicomotora e heteroagressividade no CAPS,
dificultando qualquer abordagem, pois ficava muito hostil, dizendo que todos ali queriam interná-lo. Em um
desses episódios de crise, ele pediu para ser atendido pela enfermeira do local, pois estava sentindo dor no
peito.

Em função do vínculo construído com essa profissional, foi possível contornar momentos de crise diversas
vezes.

Acontecia assim: quando estava em crise, Wesley sempre chegava gritando e atirando objetos que estavam
ao redor. A enfermeira, que é diarista, já se aproximava e dizia que precisava verificar seus sinais vitais, pois
considerava que ele estava muito preocupado. Enquanto fazia minuciosamente o exame físico nele, ele ia
contando o motivo que o levava a estar daquele jeito: frequentemente, era o uso abusivo de drogas; outras
vezes, era a impossibilidade de pagar as contas em virtude desse uso abusivo. A enfermeira seguia ouvindo
e acolhendo, ao mesmo tempo que fazia o exame físico. Dessa forma, Wesley não se sentia pressionado e
podia conversar.

Outro ponto importante: Wesley e sua companheira contavam muito com a equipe de Estratégia de Saúde
da Família (ESF) do seu território, que constantemente entrava em contato com o CAPS para discussão do
caso e compartilhamento de ações.

Dessa forma, ele segue com períodos mais conturbados e outros menos pesados. Consegue suporte na sua
igreja, na padaria de sua rua, com uma vizinha que sempre está disposta a ajudar, e na rede de saúde, tendo
somente dificuldade nos serviços de urgência e emergência, relatando que sempre é visto como um
“incômodo” nesses espaços.

Após ler a história de Wesley, você consegue perceber a importância de uma rede de saúde articulada?
Consegue visualizar a potência de contar com outros dispositivos no território, além dos serviços de saúde?
Percebe a relevância do CAPS no acolhimento à crise? Vamos discutir esses pontos a seguir.

A Rede de Atenção Psicossocial


A Portaria nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011, institui a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) para
pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e
outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Quando revisitamos a história, vemos que essa
portaria representa um grande avanço, sendo resultado de muitas lutas sociais em busca de um sistema
inclusivo e universal.

Mas o que é a RAPS?


Resposta
A RAPS é a estratégia que visa articular, integrar e alinhar os mais diversos pontos de atenção para acolher
as pessoas que apresentam sofrimento psíquico ou transtorno mental e as pessoas que fazem uso
prejudicial de drogas. A RAPS também deve criar e ampliar pontos de atenção, ou seja, essa rede busca
fazer com que todos os seus componentes possam funcionar de maneira que atendam às necessidades
dessa clientela.

Como muitos estudiosos da área gostam de exemplificar: para imaginar a RAPS, pense numa rede de pesca.
Cada nó representa um serviço ou uma ação, que vão se interligando e fazendo as mais diversas conexões.
Assim é o desenho que guia o funcionamento dessa rede, que vai acontecendo entre serviços, ações e
pessoas que circulam pelos territórios.

A Portaria nº 3.088/2011 traz algumas diretrizes para que a RAPS aconteça na prática do cotidiano, tanto na
assistência quanto na gestão em saúde. Vamos conhecê-las?

Diretrizes segundo a Portaria nº 3.088/2011 expand_more

I. Respeito aos direitos humanos, garantindo a autonomia e a liberdade das pessoas.


II. Promoção da equidade, reconhecendo os determinantes sociais da saúde.
III. Combate a estigmas e preconceitos.
IV. Garantia do acesso e da qualidade dos serviços, ofertando cuidado integral e assistência
multiprofissional, sob a lógica interdisciplinar.
V. Atenção humanizada e centrada nas necessidades das pessoas.
VI. Diversificação das estratégias de cuidado.
VII. Desenvolvimento de atividades no território, que favoreça a inclusão social com vistas à
promoção de autonomia e ao exercício da cidadania.
VIII. Desenvolvimento de estratégias de Redução de Danos.
IX. Ênfase em serviços de base territorial e comunitária, com participação e controle social dos
usuários e de seus familiares.
X. Organização dos serviços em rede de atenção à saúde regionalizada, com estabelecimento de
ações intersetoriais para garantir a integralidade do cuidado.
XI. Promoção de estratégias de educação permanente.
XII. Desenvolvimento da lógica do cuidado para pessoas com transtornos mentais e com
necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, tendo como eixo central a
construção do projeto terapêutico singular.

Todas essas diretrizes visam transformar as relações no que diz respeito à loucura, fazendo muito mais do
que simplesmente fechar manicômios, promovendo mudanças no imaginário social a partir do momento
que objetivam combater o estigma e o preconceito.
E quais seriam os componentes da RAPS? Será que podemos limitar
aos CAPS e Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT)?
Sem dúvida, não! Se lembrarmos das propostas da Reforma Psiquiátrica, entenderemos que é preciso muito
mais que só os serviços específicos de saúde mental. Podemos também pensar na história de Wesley e na
importância de diversos pontos em seu acompanhamento.

Voltando à pergunta, os componentes da RAPS, segundo a Portaria nº 3.088/2011, são:

I - Atenção básica em saúde, formada pelos seguintes pontos de atenção

a. Unidade Básica de Saúde.


b. Equipe de atenção básica para populações específicas:
1. Equipe de Consultório na Rua; e
2. Equipe de apoio aos serviços do componente Atenção Residencial de Caráter
Transitório.
c. Centros de Convivência.

II - Atenção psicossocial especializada, formada pelos seguintes pontos de


atenção

Centros de Atenção Psicossocial, nas suas diferentes modalidades.


III - Atenção de urgência e emergência, formada pelos seguintes pontos de
atenção

a. SAMU 192;
b. Sala de Estabilização;
c. UPA 24 horas;
d. Portas hospitalares de atenção à urgência/pronto-socorro; e
e. Unidades Básicas de Saúde, entre outros.

IV - Atenção residencial de caráter transitório, formada pelos seguintes pontos de


atenção

a. Unidade de Acolhimento; e
b. Serviços de Atenção em Regime Residencial.

V - Atenção hospitalar, formada pelos seguintes pontos de atenção

a. Enfermaria especializada em Hospital Geral; e


b. Serviço Hospitalar de Referência para atenção às pessoas com sofrimento ou transtorno
mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas.

VI - Estratégias de desinstitucionalização, formada pelo seguinte ponto de


atenção

a. Serviços Residenciais Terapêuticos.


VII - Reabilitação psicossocial

Notou quantos componentes estão estruturados na portaria? E no cotidiano temos muito mais, pois são
aqueles que entram a partir de cada história, de cada território, como escolas, padarias, bancas de jornal,
entre tantos outros. Você pode estar pensando: e a crise em saúde mental nesse contexto? Na sequência,
abordaremos esse assunto.

A crise em saúde mental no território e a atuação do


CAPS
Muitos ainda acreditam que um usuário em crise deve ser imediatamente encaminhado para um ambiente
hospitalar, como um serviço de emergência. Pela nossa discussão até aqui, você já deve estar percebendo
que o objetivo da área da atenção psicossocial é fortalecer os dispositivos extra-hospitalares para contornar
a crise. E trazendo um pouco do foco aqui nessa parte do conteúdo para o CAPS, é crucial que você saiba
que o CAPS pode e deve acolher situações de crise.

Você já estudou, em outros conteúdos, que a proposta do CAPS é ser um serviço substitutivo de atenção
diária, ou seja, o hospital psiquiátrico deve deixar de existir e o CAPS vira o ordenador da rede, com o
cuidado pautado na liberdade e funcionando conforme a lógica do território.
Atendimento em hospitais psiquiátricos.

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Atendimento no CAPS.

É importante que você conheça na íntegra a Portaria nº 336, de 19 de fevereiro de 2002, que estabelece as
modalidades de CAPS e seu funcionamento. Na portaria, as seguintes atividades são citadas como parte da
assistência no serviço:

Atendimento individual (medicamentoso, psicoterápico, de orientação, entre outros).


Atendimento em grupos (psicoterapia, grupo operativo, atividades de suporte social, entre
outras).

Atendimento em oficinas terapêuticas executadas por profissional de nível superior ou nível


médio.

Visitas domiciliares e atendimento à família.

Atividades comunitárias enfocando a integração na comunidade e inserção familiar e


social.
Refeições diárias de acordo com o projeto de cada um.

Com tantas propostas, mesmo em contexto de crise, o CAPS possui um grande leque de possibilidades de
atuação nesse contexto mais crítico. O que dificulta esse acolhimento à crise, algumas vezes, tem muito
mais relação com o sucateamento da rede de saúde mental que vem ocorrendo nos últimos anos. É
importante que tenha mais investimento e aporte financeiro para os CAPS, a fim de superar desafios para o
melhor funcionamento possível acontecer. Como principais melhorias que os CAPS precisam, podemos
destacar melhorias na infraestrutura, maior investimento em recursos humanos, garantia de remuneração
digna e em dia para os profissionais e manutenção de medicações necessárias para os usuários.

Para você entender um pouco melhor, daremos mais um breve exemplo de acolhimento à crise no CAPS:

Márcia tem 25 anos e chegou ao CAPS II do seu território após tentativa de suicídio. Ela contava que sentia
vontade constante de morrer e que não conseguia se proteger do impulso de tentar colocar fim à própria
vida quando vinha essa sensação.

Diante disso, antes de chegar ao CAPS, muitos profissionais com os quais a jovem tentou se cuidar no meio
privado a encaminhavam prontamente para internação, alegando que ela era impulsiva e precisava de
vigilância constante.

A equipe do CAPS entendeu que o caso dela era grave e, assim, começou uma forte parceria com a equipe
da ESF de que Márcia era usuária. No Projeto Terapêutico Singular (PTS) dela, a frequência estabelecida era
assim: no CAPS, deveria ser diária; e, na ESF, duas vezes na semana.
Todos os dias, Márcia ia contar sobre essa vontade repentina de morrer que sentia. Os meses foram
passando e ela conseguiu contar sobre sua infância difícil e sobre sua adolescência conturbada, passando
por um abandono materno, tendo somente um pai distante que fazia uso abusivo de álcool e desaparecia
por dias.

Perceba que o acompanhamento de Márcia foi uma costura entre CAPS e ESF, com o vínculo sendo
construído aos poucos, tendo acolhimento e escuta da equipe e também o desafio de suportar o sofrimento
que a jovem trazia sem querer responder com uma conduta que visava cercear sua liberdade.

As equipes envolvidas demonstraram interesse e Márcia pôde se sentir acolhida. Atualmente, ela consegue
identificar os momentos de crise e procura os serviços imediatamente quando sua situação se agrava, para
pedir ajuda. Não age mais impulsivamente, mesmo quando a vontade vem, pois sabe que tem suporte no
seu entorno.

Após esse breve relato da história de Márcia e todos os outros exemplos, você consegue perceber que se
houver investimento no CAPS e no território, é possível sustentar também situações de crise em saúde
mental? Temos equipes altamente qualificadas, capazes de tocar a Reforma Psiquiátrica no cotidiano!

Os serviços de urgência e emergência


Precisamos dar um destaque neste conteúdo para os serviços que fazem atendimentos voltados para
questões de urgência e emergência, pois, nesses espaços, os desafios de seguir os preceitos da Reforma
Psiquiátrica se tornam mais cruciais.

Em artigo científico que discute a questão da atenção à crise em saúde mental, Cruz e colaboradores fazem
uma colocação muito pertinente:
A questão aqui levantada é se o cuidado ofertado nos momentos traduzidos
como situações de crise ainda é marcado pela institucionalização e por
medidas involuntárias como principal resposta. Infere-se que são nesses
momentos em que mais frequentemente se recorre a procedimentos típicos do
chamado modelo asilar, que incluem contenção física, medicalização
excessiva, tutela, controle e violência contra as pessoas em sofrimento mental
intenso. A crise representa, portanto, um aspecto analisador para a discussão
acerca da reorientação do modelo de atenção em saúde mental que se busca
implantar no Brasil desde o período da redemocratização.

(CRUZ et al., 2019, p. 119)

Como discutimos, existem modelos antagônicos, ou seja, que têm grandes diferenças na maneira de
encarar a questão da loucura, principalmente quando se trata de situações de crise em saúde mental. Você
deve se lembrar da diferença que fizemos entre o modelo de atenção psicossocial e o modelo da psiquiatria
clássica na conduta direcionada para situações de urgência e emergência, certo?

O ambiente hospitalar é historicamente um ambiente médico centrado, principalmente a partir do período


da Idade Moderna (1453- 1789), quando a ciência ganha mais espaço, superando o domínio religioso, que
inclusive tinha nos hospitais verdadeiros espaços de redenção, em que o objetivo era fazer caridade para
remissão dos pecados.

Ilustração de 1868 representando o hospital Saint Anne, Paris.

Porém, com o Renascimento e as mudanças na sociedade correspondentes, os espaços hospitalares se


transformaram em locais de estudo e com função terapêutica no enfrentamento de doenças, com a
profissão médica como detentora do saber científico.

Mas lembremos quando os hospitais psiquiátricos passaram a inserir os considerados desviantes em locais
isolados da sociedade, com objetivo de remissão de sintomas e cura. A ideia do tratamento moral imposto
no século XVIII ainda permeia alguns espaços, ou seja, o usuário fica retirado do convívio até se adequar e
poder estar em liberdade.
Temos, nos serviços de emergência e urgência, este grande desafio: como agir em situações de agitação,
com risco de vida para o próprio usuário e terceiros, sem condutas mais invasivas, que precisam ser
imediatas?

Segundo Cruz, é oportuno salientar que:

[...] Os serviços de emergência são conduzidos por protocolos, com condutas e


procedimentos bem definidos, as equipes geralmente passam por
treinamentos para que esses protocolos sejam executados com a devida
sincronia entre os membros da equipe e no tempo certo. Isso se deve ao fato
de que, em muitos casos, poucos minutos podem representar risco de morte
para o paciente em atendimento. Entretanto, quando se trata de uma crise de
saúde mental, essa lógica é pouco aplicada. Lidar com a subjetividade humana
e com o sofrimento mental não parece fazer parte das habilidades dos
profissionais de saúde.

(CRUZ et al., 2019, p. 127)

Ao que se sabe, há muitos estigmas e preconceitos relacionados à loucura. E um dos principais pontos,
tidos como parte de falsa concepção, é de que pessoas adoecidas psiquicamente são tidas como
perigosas.

Reflexão

Vamos pensar juntos: se esse pensamento não se modifica, os espaços que isolam e fazem intervenções
opostas às ideias da Reforma Psiquiátrica conseguem sustentação para permanecer existindo com a
concepção equivocada de que é necessário isolar pessoas em intenso sofrimento psíquico, transferindo
todo o poder sobre esses sujeitos para a equipe que atua nesses espaços.

Outro ponto importante: em espaços de urgência e emergência, as pessoas portadoras de transtornos


mentais, muitas vezes, encontram sérias barreiras para um olhar integral, como se a loucura anulasse
qualquer outra forma de sofrimento ou adoecimento clínico que não seja mental. Lembra-se da história do
Wesley? Ao final, comentamos sobre a dificuldade que ele enfrenta nesse sentido.

São muitas reflexões sobre as possíveis formas de romper com essa lógica de intervenção à crise.
Buscando responder a essa questão, finalizaremos este módulo com o ponto que fala da articulação da
rede e os desafios e avanços para enfrentar a crise.
Desafios da articulação em rede para contorno da crise
Ao longo deste conteúdo, trabalhamos a questão da atenção à crise de diversas formas. Sabemos que é um
assunto muito complexo e que exige muitas mudanças, tanto a nível de gestão quanto a nível das práticas
de cuidado prestadas na assistência.

Como podemos enfrentar a dificuldade de atenção à crise, rompendo


com práticas ainda manicomiais, em espaços que segregam os
sujeitos?
Uma boa resposta é o fortalecimento de serviços 24h que se encontram presentes na RAPS! Vamos pensar:
se alguém está em crise, não dá para aguardar o serviço que fecha às 18h abrir no dia seguinte. Não é
possível dizer para o usuário: “Segura aí, amanhã você volta e continua em sofrimento!”. Imagine a violência
que seria esse tipo de conduta. Infelizmente, temos um número ainda insuficiente de serviços 24h, por isso,
muitas vezes, entram em cena instituições de internação e emergência psiquiátrica, que não deveriam
compor a RAPS.

É preciso maior investimento em CAPS do tipo III, que são serviços que ficam abertos 24h durante toda a
semana, inclusive em feriados. É preciso também maior preparo das equipes das Unidades de Pronto
Atendimento (UPA) para acolher a clientela que sofre psiquicamente.

São necessárias ações constantes de educação permanente com os serviços da Atenção Básica para
sensibilização do atendimento no território a pessoas que apresentam sofrimento e transtornos mentais, ou
seja, potencializar o matriciamento em saúde mental.

É primordial também construir e atualizar protocolos, como já foi feito, com o Serviço de Atendimento Móvel
(SAMU), para atuação que mantenha a dignidade de pessoas que se encontram em crise e necessitem do
serviço.
Outro ponto é fortalecer e aprimorar a questão dos leitos de saúde mental em hospitais gerais, reforçando a
ideia de um olhar ampliado para os sujeitos que adoecem e entendendo que, quando precisam de
internação psiquiátrica, é o último recurso e deve ocorrer de maneira breve.

Com toda essa discussão, você provavelmente percebeu que são muitos os desafios que envolvem a
atenção à crise e que as situações de urgência e emergência podem ser cuidadas em liberdade, contanto
que tenhamos redes de saúde fortalecidas, a fim de preservar a dignidade de todos que adoecem
psiquicamente, dando conforto e suporte em todos os momentos, inclusive nos mais difíceis. Sigamos
lutando por uma saúde mental fortalecida e acolhedora!

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Recomendações para lidar com os desafios da
articulação em rede para contorno da crise
Neste vídeo, o especialista propõe uma reflexão sobre como podemos enfrentar a dificuldade de atenção à
crise, rompendo com práticas ainda manicomiais, em espaços que segregam os sujeitos.
Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

Muitos dispositivos podem ser considerados pontos estratégicos de atenção à crise em saúde mental.
Marque a alternativa que traz um dispositivo que atualmente é considerado incoerente com os
princípios da Reforma Psiquiátrica para atuação na crise:

A UPA
B ESF

C CAPS

D Hospital psiquiátrico

E SAMU

Parabéns! A alternativa D está correta.

O hospital psiquiátrico é considerado um recurso obsoleto dentro do que preconiza a Reforma


Psiquiátrica. As demais opções estão todas corretas, pois trazem dispositivos que são considerados
componentes da RAPS.

Questão 2

Os CAPS são serviços substitutivos, que surgiram com intuito de promover um cuidado em liberdade.
Sobre a crise em saúde mental e CAPS, marque a alternativa correta:

As crises que trazem a tentativa de suicídio como principal consequência devem ser
A
direcionadas para espaços hospitalares.

As crises em saúde mental devem ter o CAPS como principal dispositivo de cuidado,
B
incluindo todos os demais serviços da rede extra-hospitalar na atenção.

Um usuário que apresenta quadro de agitação psicomotora não deve permanecer em


C
liberdade, cabendo ao CAPS transferi-lo para um hospital.
D As crises psicóticas precisam ser atendidas em emergências e hospitais psiquiátricos,
pois os sintomas positivos da esquizofrenia exigem isolamento.

Usuários em fase de mania, do transtorno bipolar do humor, devem rapidamente ser


E
internados em enfermarias de hospitais psiquiátricos.

Parabéns! A alternativa B está correta.

A Reforma Psiquiátrica preconiza que o CAPS seja o ordenador da rede, devendo acolher crise. A
alternativa A está incorreta porque pessoas com ideação suicida também devem ser acolhidas no
CAPS e no território. A alternativa C está incorreta, visto que a agitação psicomotora não deve ser
encarada como um sintoma para isolamento, e sim para um olhar cuidadoso e próximo do CAPS. A
alternativa D está incorreta, uma vez que as crises psicóticas acontecem com frequência no território e
o CAPS está incumbido de cuidar dessas questões. A alternativa E está incorreta, pois usuários em fase
de mania podem e devem ser atendidos nos CAPS.

Considerações finais
Neste conteúdo, exploramos o conceito de crise, as formas de atenção à crise e as divergências de cuidado
entre o modelo de atenção psicossocial e o modelo da psiquiatria tradicional. Discutimos também alguns
sinais e sintomas característicos de momentos de crise em saúde mental e o manejo deles em situações de
urgência e emergência. Ao final, falamos sobre a importância de uma rede articulada para contorno da crise
e acolhimento do usuário.

Aprofundar o estudo nessa área vai ajudá-lo a ter uma atuação mais humanizada e resolutiva, lembrando
que cada pessoa tem uma relação com seu sofrimento e que não é possível engessar práticas baseadas em
sintomas. Precisamos olhar sempre para o usuário com respeito e singularidade para a Reforma
Psiquiátrica acontecer!

headset
Podcast
Antes de encerrarmos, o especialista propõe uma reflexão sobre a questão social da loucura na história do
Ocidente e os atuais dispositivos de atenção à saúde mental no Brasil.

Referências
BONFADA, D. et al. A integralidade da atenção à saúde como eixo da organização tecnológica nos
serviços. Ciência & Saúde Coletiva [on-line], v. 17, n. 2, p. 555-560, 2012. Consultado na internet em: 15 nov.
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para dispor sobre a organização do Sistema Único de Saúde - SUS, o planejamento da saúde, a assistência à
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Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. Cadernos de Atenção Básica nº 34. Brasília, 2013.

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BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011. Institui a Rede de Atenção


Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso
de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Consultado na internet em: 17
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BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 4.279, de 30 de dezembro de 2010. Estabelece diretrizes para a


organização da Rede de Atenção à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Consultado na
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CRUZ, K. D. F. da et al. Atenção à crise em saúde mental: um desafio para a reforma psiquiátrica brasileira.
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DALGALARRONDO, P. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. 3. ed. Porto Alegre: Artmed,
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DELL'ACQUA, G.; MEZZINA, R. Resposta à crise. In: DELGADO, J. (org.). A loucura na sala de jantar. São
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DIAS, M. K.; FERIGATO, S. H.; FERNANDES, A. D. S. A. Atenção à crise em saúde mental: centralização e
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MERHY, E. E.; FRANCO, T. B. Por uma composição técnica do trabalho centrada nas tecnologias leves e no
campo relacional. Saúde em Debate, ano XXVII, v. 27, n. 65, set./dez. 2003.

Explore +
Leia o artigo Articulação de redes de cuidado entre Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) e Enfermaria
de Saúde Mental em Hospital Geral, de Michelle Chanchetti Silva e Sabrina Helena Ferigato, publicado na
revista Interface - Comunicação, Saúde, Educação, v. 24, 2020.

Leia a Resolução do Conselho Federal de Enfermagem nº 427/2012, para conhecer mais sobre as
orientações que preservam a dignidade do usuário nesse contexto.

Assista às partes 1 e 2 do documentário “Doenças Psiquiátricas Graves”, produzido por , disponíveis no


YouTube.
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