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Coordenação Geral
Cinara Maria Moreira Liberal
Subcoordenação Geral
Marcelo Carvalho Ferreira
Coordenação Didático-Pedagógica
Rita Rosa Nobre Mizerani
Coordenação Técnica
Luiz Fernando da Silva Leitão
Conteudista:
Isabella Franca Oliveira
Juliana Califf de Matos
Produção do Material:
Polícia Civil de Minas Gerais
Revisão e Edição:
Divisão Psicopedagógica - Academia de Polícia Civil de Minas Gerais
Reprodução Proibida
SUMÁRIO
1- INTRODUÇÃO............................................................................................. 5
3- GÊNERO ................................................................................................... 10
REFERÊNCIAS ............................................................................................... 60
1- INTRODUÇÃO
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) afirma que todo ser
humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos na
Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua,
religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza,
nascimento, ou qualquer outra condição.
A Constituição Federal de 1988 prevê que a República Federativa do Brasil
constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como um dos fundamentos a
dignidade da pessoa humana. São objetivos fundamentais trazidos na Carta Magna
construir uma sociedade livre, justa e solidária e promover o bem de todos, sem
preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação. Além disso, prevê que todos são iguais perante a lei, sem distinção
de qualquer natureza.
Apesar das normativas existentes, alguns grupos sociais sofrem
preconceitos e discriminações, tornando-os bastante vulneráveis, como ocorre com
a População LGBTQIA+.
Com o objetivo de proteger a População LGBTQIA+ e garantir a efetivação
de direitos, em 2006, no âmbito internacional, foi elaborado o documento Os
Princípios de Yogyakarta, que reconhece as violações de direitos por motivos de
orientação sexual ou identidade de gênero como violações de direitos humanos.
Observa-se que as pessoas LGBTQIA+ no Brasil sofrem um processo
histórico marcado por exclusão familiar, social, escolar e do mercado de trabalho,
resultando em que sua acentuada subalternização, com a privação de direitos
elementares que a toda população deveriam ser assegurados em um Estado
Constitucional Democrático de Direito.
Desta forma, é necessária a efetivação de políticas públicas afirmativas, com
o reconhecimento político e social de diversas identidades de gênero, com o
objetivo de garantir o acesso a direitos básicos à População LGBTQIA+.
Não há dúvidas que nos últimos anos tivemos várias conquistas
relacionadas aos direitos e garantias das pessoas LGBTQIA+, todavia, ainda há
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muito a ser conquistado, visto que o Brasil é um dos países mais perigosos do
mundo para a população trans, com o maior número de homicídios.
Além disso, a vida de grande parte da População LGBTQIA+ é marcada por
preconceito, discriminação e intolerâncias, que se inicia no ambiente familiar, e
perpassa pelos demais ambientes frequentados, como escola, vizinhança, saúde,
trabalho, dentre outros.
Neste contexto, este curso abordará conceitos básicos relacionados à
População LGBTQIA+ e apresentará direitos e garantias assegurados, permitindo
que os alunos desenvolvam uma visão crítica no contexto das demandas atuais,
desconstruindo preconceitos e identificando mecanismos para garantia e
promoção, bem como sua forma de utilização.
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2- CONCEITOS INICIAIS
O que significa a sigla LGBTQIA+? Como será uma sigla tratada durante
todo o curso, é importante compreender o significado de cada uma das letras.
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● I - Intersexo – pessoas cujo desenvolvimento sexual e corporal –
expressado em hormônios, genitais, cromossomos, e/ou outras
características biológicas – não se encaixa ao gênero feminino ou masculino
por ter nascido com os dois órgãos sexuais.
● A - Assexual - São pessoas que não sentem nenhuma atração sexual por
outras pessoas, independente de gênero ou da orientação sexual.
● Sinal + - contempla todas as diversas possibilidades e orientação sexual
e/ou de identidade de gênero que existam.
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Fazendo um breve comparativo com o corpo humano, costumamos dizer
que a identidade de gênero está na cabeça da pessoa, ou seja, é a maneira como
ela se enxerga, isto é, o gênero com o qual ela se sente parte. Já a orientação
sexual indica pelo que a pessoa sente atração, mostra para qual lado sua
sexualidade está “orientada”, seria demonstrada no corpo humano pelo coração. O
sexo biológico, por sua vez, seria as características físicas e cromossômicas, ou
seja, a genitália que a pessoa veio ao mundo.
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3- GÊNERO
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O Documento Proteção, promoção e reparação dos Direitos das Pessoas
LGBT e de identidade de gênero, traz a seguinte definição:
Por sua vez, o gênero diz respeito às construções sociais do que é ser
homem ou ser mulher, bem como às relações entre os grupos sociais que
preenchem de sentido o que é “masculino” e o que é “feminino”. O
conceito de gênero tem sido amplamente utilizado pelo feminismo como
categoria analítica útil para destacar esses papéis e as possibilidades das
mulheres para além de qualquer determinismo biológico. As críticas
feministas mostraram que gêneros masculino e feminino são construções
sociais assimétricas em que há dominação e desigualdades entre homens
e mulheres. Nesse sentido, o gênero é visto como a roupagem cultural que
se associa à natureza dos corpos. Nas sociedades ocidentais considera-
se, por exemplo, que a feminilidade está associada à delicadeza, à
fragilidade, ao cuidado e à vida doméstica no âmbito privado. A
masculinidade, por outro lado, é construída com referência à força, à
virilidade e à atuação na esfera pública. Essa divisão de estereótipos não
representa apenas uma descrição das relações existentes, mas é um
modo de normatizar os corpos: espera-se que homens e mulheres se
encaixem e se adequem a esses modelos do que é a masculinidade e a
feminilidade.
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algumas pessoas possuem a mesma expressão de gênero durante a vida toda e
outras podem mudar ao longo do tempo ou com base nas circunstâncias.
Reforça-se que a identidade de gênero não se confunde com a orientação
sexual, que será estudada no próximo capítulo com mais detalhes. As pessoas
transexuais podem ser heterossexuais, lésbicas, gays ou bissexuais, como ocorre
com as pessoas cisgênero, dependendo do gênero que adota e do gênero com
relação ao qual se atrai afetivo-sexualmente.
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Em resumo:
Atenção!!!
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4- ORIENTAÇÃO SEXUAL
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Em relação à orientação sexual, existem também os assexuais, que são as
pessoas que não se interessam sexualmente ou de forma afetiva por nenhum
gênero.
Vale mencionar que para os conceitos trazidos, leva-se em conta a
identidade de gênero e não o sexo biológico. Nada impede, claro, que a pessoa
se sinta atraída exclusivamente por pessoas cisgêneras.
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Não se deve utilizar a opção sexual, pois a sexualidade é inerente à
personalidade, ou seja, a pessoa não escolhe, ela é e se reconhece como
heterossexual, homossexual ou bissexual. A pessoa descobre-se ao longo de seu
desenvolvimento e, a partir daí, tem noção de sua atração por um ou mais gêneros.
Conclui-se que a sexualidade e o desejo sexual das pessoas são
direcionados internamente, não sendo uma opção por qual gênero sentirão atração
afetiva e sexual.
O vídeo produzido pelo Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT da
UFMG esclarece a razão do termo correto a ser utilizado é Orientação Sexual e
não Opção Sexual.
https://www.youtube.com/watch?v=zjUKJIzjU3Q&t=4s
MITOS E VERDADES
MITOS VERDADES
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Os bissexuais são indecisos ou Não, a bissexualidade é inerente à
curiosos pessoa e não deve ser confundida com
promiscuidade ou indecisão.
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5- CONTEXTO HISTÓRICO
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Na Alemanha, durante o nazismo, as pessoas homossexuais foram punidas,
com muitas mortes. Após a queda do nazismo, os homossexuais condenados
deixaram os campos de concentração mas continuaram a cumprir as penas
previstas.
Já em 1969, no dia 28 de junho, nos Estados Unidos, acontece um dos
principais marcos relacionados à População LGBTQIA+, considerado o marco zero
do movimento LGBT contemporâneo. Na referida data, gays, lésbicas, travestis e
drag queens enfrentam policiais e iniciam uma rebelião, denominada “Revolta de
Stonewall”, que durou uma semana e deu início ao movimento pelos direitos LGBT
nos Estados Unidos e no mundo.
Em razão deste acontecimento é comemorado mundialmente em 28 de
junho, Dia Internacional do Orgulho LGBT.
Vale mencionar que nos dias atuais ainda existem vários países que
criminalizam a homossexualidade e alguns tem a previsão de pena de morte,
conforme a ilustração acima.
De acordo com pesquisas recentes, 73 países criminalizam a
homossexualidade e 13 com pena de morte. Já os países que reconhecem o
casamento entre as pessoas homossexuais são cerca de 47 países.
O movimento LGBTQIA+ no Brasil iniciou com mais força durante a Ditadura
Militar, com publicações em jornais. O Jornal Lampião teve grande relevância,
surgindo no ano de 1978 e tinha um cunho homossexual, denunciando violências
contra a população LGBT.
Em 1981, foi fundado o jornal ChanacomChana por um grupo de lésbicas e
era vendido em um bar, porém foi proibido, ocorrendo uma manifestação que
resultou no fim da proibição da comercialização do ChanacomChana, e deu origem
ao Dia do Orgulho Lésbico em São Paulo.
No ano de 2006, em uma reunião realizada na Indonésia com
representantes de 25 países, foi elaborado o documento “Princípios de
Yogyakarta”, que reconhece as violações de direitos por motivos de orientação
sexual ou identidade de gênero como violações de direitos humanos. É um dos
documentos mais importantes no âmbito internacional relacionado à temática e
encontra-se disponível no material complementar.
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De acordo com o referido documento, a discriminação com base na
orientação sexual ou na identidade de gênero inclui qualquer distinção, exclusão,
restrição ou preferência baseada na orientação sexual ou identidade de gênero que
tenha o objetivo ou efeito de anular ou prejudicar a igualdade perante a lei ou
proteção igual da lei, ou ainda o reconhecimento, gozo ou exercício, em base
igualitária, de todos os direitos humanos e das liberdades fundamentais.
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6- CRIMINALIZAÇÃO DA HOMOFOBIA E TRANSFOBIA
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No julgamento a Ministra Carmem Lúcia, iniciou dizendo: “todo preconceito é
violência e causa sofrimento”, e continuou:
Nesses termos, estabeleceu que, até que sobrevenha uma lei emanada do
Congresso Nacional destinada a implementar os mandados de criminalização
definidos no artigo 5º, XLI e XLII, as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou
supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de
gênero de alguém, por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em
sua dimensão social, ajustam-se, por identidade de razão e mediante adequação
típica aos preceitos primários de incriminação definidos na Lei do Racismo,
constituindo também na hipótese de homicídio doloso, circunstância que o
qualifica, por configurar motivo torpe.
Neste julgamento, foi feita uma ressalva, com relação à liberdade religiosa.
Ainda hoje, é comum que algumas religiões não tolerem a união homoafetiva e
repudiam severamente esse tipo de conduta. Assim, neste julgado, foi estabelecida
a liberdade religiosa, independe da denominação confessional professada, a cujos
fiéis e ministros (sacerdotes, pastores, rabinos, mulás ou clérigos muçulmanos e
líderes ou celebrantes das religiões afro-brasileiras, etc.) é assegurado o direito de
pregar e de divulgar, livremente, pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro
meio, o seu pensamento de externar suas convicções de acordo com o que se
contiver em seus livros e códigos sagrados.
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Nessa linha, os fiéis e ministros podem ensinar segundo sua orientação
doutrinária e/ou teológica, podendo buscar e conquistar prosélitos e praticar os
fatos de culto e respectiva liturgia, independentemente do espaço, público ou
privado, de sua atuação individual ou coletiva, desde que tais manifestações não
configurem discurso de ódio, ou seja, aquelas exteriorizações que incitem a
discriminação, a hostilidade ou a violência contra pessoas em razão de sua
orientação sexual ou de identidade de gênero.
A decisão enfatizou que o conceito de racismo projeta-se para além de
aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos, pois resulta de uma construção de
índole histórico e cultural motivada pelo objetivo de justificar a desigualdade e
destinada ao controle ideológico, à denominação política, à subjugação social e à
negação da alteridade da dignidade e da humanidade daqueles que, por
integrarem grupo vulnerável e por não pertencerem ao estamento que detém
posição de hegemonia em uma dada estrutura social, são considerados estranhos
e diferentes, degradados à condição de marginais do ordenamento jurídico,
expostos, em consequência de odiosa inferiorização e de perversa estigmatização,
a uma injusta e lesiva situação de exclusão do sistema geral de proteção do direito.
No mesmo sentido foi a decisão do Mandado de Injunção 4733/DF, proposta
pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e transgêneros (ABGLT).
Assim, o plenário decidiu, por maioria de votos, que, até que se edite uma
norma regulamentando a matéria que versa sobre homofobia e transfobia, será
aplicada a Lei 7716/1989 (crimes contra o racismo). Resaltando que, nos cultos
religiosos, dada a liberdade religiosa, essa decisão não alcança nem restringe,
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desde que não incite discursos de ódio, seja em forma de discriminação ou
preconceito.
Essa criminalização da homofobia/transfobia pelo Supremo Tribunal Federal,
representou uma importante conquista para a Comunidade LGBTQIA+ pois tipificou
uma conduta criminosa envolvendo o gênero e orientação sexual das pessoas com
uma possível punição prevista na Lei 7716/1989. Enquanto isso, aguarda-se uma
legislação por parte do Congresso Nacional.
A Cartilha Direitos da População LGBT do MPPE traz alguns exemplos de
LGBTfobia, que ocorre quando a pessoa:
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7- DIREITOS CONQUISTADOS NOS ÚLTIMOS ANOS
7.1 Saúde
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Além disso, o SUS oferece terapia medicamentosa hormonal disponibilizada
mensalmente (estrógeno ou testosterona) e acompanhamento do usuário no
processo com uma equipe multiprofissional nas unidades de saúde e ambulatórios.
Em 2018 a Organização Mundial da Saúde (OMS) removeu da sua
classificação oficial de doenças, a CID-11, o chamado “transtorno de identidade de
gênero”, definição que considerava como doença mental a situação de pessoas
trans - indivíduos que não se identificam com o gênero que lhes foi atribuído no
nascimento.
Na nova edição da CID a transexualidade passa para o capítulo de
“condições relacionadas à saúde sexual” e é classificada como “incongruência de
gênero”.
Menciona-se que a identidade trans não é causada por qualquer condição
psiquiátrica, mas pessoas trans estão sujeitas a maiores taxas de adoecimentos
mentais como resultado de transfobia.
Em junho de 2021, o STF, em decisão monocrática de Gilmar Mendes,
determina adoção de medidas para garantir que pessoas transexuais e travestis
tenham acesso a todos os tipos de tratamento disponíveis no SUS
independentemente de sua identidade de gênero.
A ideia é que qualquer pessoa possa marcar consultas de qualquer
especialidade, inclusive as relacionadas especificamente aos órgãos do aparelho
reprodutor, como obstetrícia, ginecologia e urologia.
A decisão deve-se ao fato de que a alteração da identidade de gênero por
parte das pessoas transexuais pode dificultar o acesso a determinados serviços,
como no seguinte exemplo: um homem trans que ainda conserva órgãos
reprodutores femininos pode engravidar. E engravida. Mas quando essa pessoa
procura um pré-natal no hospital público, por exemplo, encontra uma série de
dificuldades por adotar o nome masculino.
Há ainda uma grande necessidade de capacitar médicos, psicólogos e
demais profissionais da área da saúde para atender a população LGBT, visando
impedir a utilização de instrumentos e técnicas que criem ou mantenham
preconceitos.
Atualmente, depois de mais de 10 anos da vigência da Portaria, o maior
desafio da população LGBTQIA + é vencer o preconceito e a discriminação de
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alguns gestores e profissionais da saúde. O profissional de saúde tem que se
atentar às particularidades dos pacientes que estão sendo atendidos, atuando com
respeito, ética e profissionalismo.
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Nessa decisão, foi enfatizada a proibição do preconceito por colidir com o
objetivo constitucional de promover o bem de todos e do princípio da dignidade da
pessoa humana, direito à autoestima e o direito à busca da felicidade. A decisão
enfatizou a Constituição da República de 1988 que confere à família, base da
sociedade, especial proteção do Estado e que família não significa casais
heteroafetivos ou pares homoafetivos. Com isso, foi declarada a ilegitimidade de
distinção de tratamento legal dispensada aos casais homossexuais.
Nesse mesmo ano, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo proferiu a
1ª decisão na 2ª Vara de Família e de Sucessões convertendo a União Estável em
Casamento entre um casal homossexual do sexo masculino que se declararam
viver em união estável por 08 (oito) anos, sendo publicado o edital e cumpridas
todas as formalidades legais para habilitação do casamento, exigidas para um
casal heterossexual.
Esse pedido, feito pelo casal, foi instruído com a declaração de duas
testemunhas no sentido de que os requerentes mantêm uma convivência pública,
contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. O
Ministério Público não se opôs ao pedido. O Juiz fundamentou sua decisão na
Constituição da República de 1988, que estabelece a promoção de todos, sem
preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação e que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza e que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações. Continuou
enfatizando que a família é a base da sociedade e tem especial proteção do
Estado.
A decisão do Magistrado, que por sinal foi muito acertada, citou a
Constituição da República de 1988 que reconhece a união estável como entidade
familiar, e que a Lei deve facilitar sua conversão em casamento e que os direitos e
deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e
pela mulher.
O Magistrado, em uma visão bem moderna e realista, fundamentou sua
decisão alegando que atualmente, milhares de pessoas do mesmo sexo
compartilham a vida juntos como casados fossem e que a ausência de respaldo
jurídico a tal realidade causou inúmeros prejuízos e injustiças, desde o não
reconhecimento do direito à sucessão, passando pela ausência da presunção legal
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de esforço comum no patrimônio constituído, até a ausência de direitos sociais,
como a pensão previdenciária por morte.
Outros Tribunais também já manifestaram no sentido de reconhecimento de
direitos de casais homossexuais, inclusive o Tribunal de Justiça de Minas Gerais,
no agravo de Instrumento 1.0024.13.170477-0/0010499310-23.2013.8.13.001,
julgado em 08 de outubro de 2013, possibilitando a inclusão de companheiro
homossexual como dependente para fins previdenciários e que não é necessário
demonstrar a dependência econômica do (a) companheiro (a) que visa sua
inclusão como dependente junto ao IPSEMG.
Diante das lacunas e incertezas na interpretação das decisões judiciais,
notadamente da decisão do STF, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), editou em
maio de 2013, a Resolução n. 175. Essa Resolução proíbe que as Autoridades dos
Cartórios recusem celebrar casamento civil e recusem converter União Estável em
casamento entre casais homossexuais.
Com a Resolução em vigor, os casais homossexuais podem escolher entre
os regimes de casamentos permitidos em lei para casais heterossexuais e a
procurar o Ministério Público ou Juiz Corregedor, caso seu pedido de casamento
ou conversão de União estável em casamento seja negado. Se isso ocorrer, as
autoridades responsáveis pela fiscalização dos Cartórios irão obrigá-lo a realizar o
casamento e, ainda, poderá vir a sofrer sanções de natureza administrativa.
Assim, os requisitos para casamento e conversão de União Estável em
casamento de casais homossexuais serão os mesmos exigidos para os casais
heterossexuais, estabelecendo, nestes termos, um casamento igualitário, sem
preconceitos, alargando os limites da democracia no Brasil.
Percebe-se que mesmo com esse avanço do casamento igualitário e
reconhecimento pelo Supremo Tribunal Federal, o casamento homoafetivo ainda
não foi concedido por lei. Em virtude das reiteradas decisões, direitos passaram a
ser deferidos em sede administrativa, como o pagamento do seguro DPVAT,
concessão pelo INSS de pensão por morte e auxílio reclusão, a inclusão do
companheiro como dependente do imposto de renda, dentre outros.
Acreditamos que, em breve, o Congresso Nacional irá regulamentar a
matéria e não existirá mais qualquer dúvida que verse sobre o tema, fazendo
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prevalecer direitos iguais aos cidadãos brasileiros, sem discriminações ou
preconceitos.
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Em 27 de janeiro de 2017 foi criado o Decreto 47.148 em Minas Gerais que
assegura o direito de uso do nome social e o reconhecimento da identidade de
gênero de pessoas travestis e transexuais no âmbito da administração pública
estadual.
Em 05 de fevereiro de 2018, mais uma conquista foi alcançada. Foi criado o
Decreto Federal 9278/2018 que assegura validade nacional às carteiras de
Identidade e regula sua expedição. Esse Decreto estabeleceu que algumas
informações poderão ser incluídas a pedido do interessado, dentre elas, o nome
social.
O nome social poderá ser incluído mediante requerimento escrito do
interessado com a expressão “nome social”, sem prejuízo da menção ao nome do
registro civil, no verso da Carteira de Identidade, e sem a exigência de
documentação comprobatória. O nome social também poderá ser excluído, se
assim o interessado desejar, mediante requerimento escrito.
No Sistema Único de Saúde, o respeito ao direito ao nome social e a
identidade de gênero do usuário do serviço está assegurado pela Portaria
1820/2009. E a Receita Federal expediu a Instrução Normativa 1718 autorizando a
inclusão do nome social no CPF do (a) contribuinte transexual ou travesti.
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7.3.1 Retificação de Registro Civil
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7.4 Uso do Banheiro
Uma questão que vem sendo discutida com muita polêmica e reações
adversas das mais variadas ordens é a utilização dos banheiros por parte das
pessoas transexuais. Existiria mesmo colisão de direitos por parte da pessoa trans
em utilizar o banheiro do gênero que se identifica com o direito da pessoa que se
identifica com seu sexo biológico de não dividir espaços íntimos com pessoas de
“outro sexo”?
Há quem defenda que as mulheres não estariam seguras compartilhando
banheiros com transexuais já que poderiam ser vítimas de abusos por parte delas e
até mesmo poderia ter homens se passando por transexuais para cometer esses
delitos dentro dos banheiros femininos.
Não há nenhum dado concreto que possa levar à afirmação de que as
mulheres estariam mais vulneráveis compartilhando o banheiro com pessoas trans,
muito pelo contrário, as pessoas transexuais que são cotidianamente humilhadas e
expulsas dos banheiros públicos em uma atitude totalmente preconceituosa por
parte das pessoas. E quanto à invasão do banheiro por homens se passando por
transexuais para cometer delitos, além de não ter nenhum dado concreto que isso
aconteceria, o agressor deverá ser punido com as penas do delito que vier a
cometer.
Existe um projeto de Lei 5008/2000 que proíbe a discriminação de banheiros
públicos de acordo com a identidade de gênero. Isso significa que, se a proposta
for aprovada pelos parlamentares, o uso desses espaços poderá ser feito de
acordo com a identidade de gênero com a qual a pessoa se identifica.
No ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) já é possível a escolha do
banheiro por travestis e transexuais e a utilização do banheiro de acordo com o
gênero com o qual se identificam.
Existe em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF) o Recurso
Extraordinário 845.779, com repercussão geral, que discute a reparação de danos
morais a transexual que teria sido constrangida por empregado de um shopping em
Florianópolis (SC) ao tentar utilizar banheiro feminino. Embora o recurso não tenha
sido finalizado, já existem diversas decisões que concedem o direito da pessoa
transexual de utilizar o banheiro público no qual se sentem confortáveis.
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Diante do exposto, percebe-se que não existem justificativas plausíveis para
não permitir o direito ao uso do banheiro por parte dos transexuais pautando em
situações totalmente hipotéticas e atentando contra os direitos da igualdade e
dignidade da pessoa humana.
7.6 - Adoção
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convivência tenha sido iniciado na constância do período de convivência e que seja
comprovada a existência de vínculos de afinidade e afetividade com aquele não
detentor da guarda, que justifiquem a excepcionalidade da concessão.
A legislação em vigor visa à proteção integral à Criança e ao Adolescente e
à proteção da vida e da saúde, sem preconceitos, preservando sempre o melhor
interesse deles.
Sendo assim, desde que preservados os direitos da criança e do
adolescente adotado, qualquer pessoa, independente do sexo biológico, orientação
sexual ou identidade de gênero, que preencher os requisitos, poderá adotar, sem
qualquer discriminação ou preconceito.
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Diante disso, o maior desafio dos casais homossexuais é enfrentar o
preconceito e a discriminação da sociedade que insiste em manter uma visão
machista e patriarcal e não uma família composta de amor à pessoa e respeito aos
filhos.
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7.7 Lei Maria da Penha
Há diversas decisões judiciais que aplicam a Lei Maria da Penha para coibir
a violência doméstica e familiar contra mulheres transexuais e travestis quando
baseada no gênero, independente de cirurgia de transgenitalização, alteração do
nome ou sexo no documento civil. Inclusive este é o entendimento da sexta turma
do Superior Tribunal de Justiça, que estabeleceu a aplicação da referida Lei às
mulheres trans, conforme trecho do relator ministro Rogerio Schietti Cruz a seguir:
37
Este julgamento versa sobre a vulnerabilidade de uma categoria de seres
humanos, que não pode ser resumida à objetividade de uma ciência exata.
As existências e as relações humanas são complexas, e o direito não se
deve alicerçar em discursos rasos, simplistas e reducionistas,
especialmente nestes tempos de naturalização de falas de ódio contra
minorias.
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8- DESAFIOS ENFRENTADOS PELA POPULAÇÃO LGBTQIA+
39
mercado formal de trabalho e deficiência na qualificação profissional causada pela
exclusão social. (BENEVIDES E NOGUEIRA, 2021)
8.2 Trabalho
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O vídeo a seguir traz alguns relatos de pessoas que viveram a transição de
gênero no mercado de trabalho.
8.3 Saúde
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processo transexualizador, que é o processo de transição de gênero, no SUS caiu
drasticamente: as cirurgias diminuíram em 70% e a terapia hormonal em 6,5% em
comparação com o ano anterior, segundo dados do DataSus até novembro de
2020.
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Sem conseguir empregos formais estáveis ou outras formas seguras de
geração de renda, a prostituição não raro se apresenta como a única forma de
subsistência, o que torna essa população mais vulnerável a redes de exploração
sexual.
Estima-se que 90% da população trans no Brasil tem a prostituição como
fonte de renda e única possibilidade de subsistência. Outra informação relevante é
de que 70% dos assassinados foram direcionados àquelas que são profissionais do
sexo, sendo que 55% deles aconteceram nas ruas.
8.5 Violência
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Estas são algumas manchetes de reportagens que noticiam graves
violências praticadas contra a população LGBTQIA+ em razão da sua orientação
sexual ou identidade de gênero.
Nos casos de violência por motivo de preconceito, discriminação ou
intolerância, observa-se uma crueldade por parte dos agressores, o que assusta a
população em todos os cantos do país.
Apesar dos diversos avanços conquistados ao longo dos anos, a
homotransfobia é uma triste realidade no Brasil e ocorre em diversos espaços: no
espaço público, no âmbito institucional, e principalmente no ambiente familiar e
doméstico.
Há uma dificuldade na constatação dos reais índices de violência contra a
População LGBTQIA+, devido a grande subnotificação destes casos e ainda,
mesmo quando notificados, os registros não são realizados de forma adequada,
com enquadramento das ocorrências na tipificação correta, dificultando a
verificação da real proporção da situação.
A ausência de dados concretos em relação à População LGBTQIA+ e em
relação às violências praticadas contra a mesma é um entrave na formulação de
políticas públicas que visam combater tais violações de direitos.
O Brasil ocupa uma posição nada confortável em relação à LGBTfobia. As
estatísticas apontam que é o país que mais mata pessoas transgêneras e travestis
do mundo.
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De acordo com o Dossiê Assassinatos e violências contra travestis e
transexuais brasileiras em 2021, a cada 10 assassinatos de pessoas trans no
mundo, quatro ocorreram no Brasil. E das 140 vítimas de homicídios em 2021, 135
eram travestis/mulheres trans, deixando nítido que a motivação, assim como a
própria escolha da vítima tem relação direta com a identidade de gênero (feminina)
expressa pelas vítimas, que representam 96% dos casos.
A figura abaixo, extraída da Cartilha A Violência LGBTQIA+ no Brasil,
mostra que a exclusão da População LGBTQIA+ inicia na família, no ambiente
doméstico, e posteriormente nos demais ambientes, quais sejam, educação,
trabalho, saúde e, criando um ciclo de exclusão que pode culminar em episódios de
violência mais grave.
Deve-se constar que a violência vivida pela população LGBTQIA+ não é
apenas física, mas também psicológica e caracterizada pelo não acolhimento desta
população em diversos espaços.
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O Dossiê Assassinatos e violências contra travestis e transexuais brasileiras
em 2021 traz os elementos comuns nos casos envolvendo os assassinatos que
foram analisados, quais sejam:
● A maior parte das vítimas é jovem, entre 13 e 29 anos;
● A maioria é negra, pobre e reivindica ou expressa o gênero feminino;
● Homens trans e pessoas transmasculinas são minoria em crimes de
assassinatos/ homicídio violentos;
● Entre as vítimas, a prostituição é a fonte de renda mais frequente;
● Estética e aparência não-normativas são fatores de alto risco;
● Uma pessoa trans que não fez a transição médica e não expressa
sua inconformidade de gênero não confronta a sociedade cis, e não
estará exposta as mesmas violências que as demais;
● Os crimes ocorrem principalmente nas ruas, principalmente em via
pública, ruas desertas e à noite;
● Os casos acontecem com uso excessivo de violência e requintes de
crueldade;
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● Os suspeitos não costumam ter relação direta, social ou afetiva com a
vítima;
● As práticas policiais e judiciais se caracterizam pela falta de rigor na
investigação, identificação e prisão dos suspeitos;
● É constante a ausência, precariedade e a deficiência de dados,
muitas vezes intencionalmente, usados para ocultar ou manipular a
ideia de uma diminuição dos casos em determinada região;
● Nos poucos casos em que a acusação é conduzida, os crimes,
geralmente, ficam impunes ou os assassinos são soltos, mesmo
tendo confessado, em diversos casos;
● A importância e a gravidade desses crimes tendem a ser minimizados
e explicados pela identidade de gênero, atribuindo-lhes
responsabilidade por suas próprias mortes;
● Há casos dados como "morte por causas naturais", o que prejudica a
implementação de um inquérito adequado para buscar as verdadeiras
causas da morte, destacando, em particular, a falta de inquérito sobre
as ações e envolvimento de forças policiais.
● Não há respeito à identidade de gênero das vítimas que se
encontravam em vulnerabilidade na condução dos casos e elas são
registradas como indivíduos do sexo masculino, o que aumenta a
subnotificação e dificulta a identificação dos casos para fins de
pesquisa;
● Os casos criminais são afetados pelos estigmas e preconceitos
negativos que pesam sobre as travestis e as mulheres trans;
● Cenário de políticas institucionais antitrans favorecem o assassinato;
● Associação de grupos fundamentalistas religiosos e de gênero
incentivam o ódio através de narrativas que impõem medo e estigma
sobre pessoas trans;
● O descrédito de suas vozes os coloca em posições desfavoráveis
como testemunhas e vítimas e, por sua vez, promove seus
agressores.
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● É comum a palavra dos assassinos ser utilizada para obstruir, ou
enfraquecer o indiciamento ou julgamento por se apresentarem como
“senhores de bem”;
● Travestis e mulheres trans são frequentemente recebidas mais como
suspeitas do que como queixosas ou testemunhas. Isso as
desencoraja de recorrer à Justiça ou às forças policiais,
particularmente no caso de pessoas envolvidas em prostituição. Nos
casos em que os autores fazem parte da força policial, isso também
coloca em risco a vida daqueles que tentam solucionar o crime
(Gilardi, comunicação pessoal, abril de 2016);
● A impunidade favorece o assassinato.
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Já a majorante do estupro corretivo abrange, em regra, crimes
contramulheres lésbicas, bissexuais e transexuais, no qual o abusador
quer "corrigir" a orientação sexual ou o gênero da vítima. A violação tem
requintes de crueldade e é motivada por ódio e preconceito, justificando a
nova causa de aumento. A violência é usada como um castigo pela
negação da mulher à masculinidade do homem. Uma espécie doentia de
‘cura’ por meio do ato sexual à força. A característica desta forma
criminosa é a pregação do agressor ao violentar a vítima. Os meios de
comunicação indicam casos em que os agressores chegam a incitar a
“penetração corretiva” em grupos das redes sociais e sites na internet (o
que, isoladamente, pode caracterizar o crime do art. 218-C – apologia ou
induzimento à prática do estupro – caso sejam veiculados fotografias ou
registros audiovisuais).
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9- ATENDIMENTOS E ACOLHIMENTO DA POPULAÇÃO LGBTQIA +
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• Trate a pessoa trans de acordo com o gênero no qual ela se reconhece;
na dúvida, pergunte a forma como ela quer ser tratada.
• Use artigos, adjetivos e pronomes de acordo com o gênero de
identificação da pessoa (ele, ela, o, a).
• Não faça perguntas sobre órgãos genitais, cirurgias e nomes de registro.
Pergunte apenas se for necessário para um atendimento jurídico, de saúde,
socioassistencial etc. ou se for se relacionar sexualmente com a pessoa.
• Escute a pessoa trans sem noções ou ideias preconcebidas. As pessoas
trans são diferentes umas das outras, nem todas são excessivamente femininas ou
masculinas ou querem realizar o tratamento com hormônios e/ou cirurgia etc.
• As pessoas trans podem ser homossexuais, heterossexuais, bissexuais
ou assexuais.
• Pessoas trans são como qualquer outra e não precisam ser tratadas com
estranhamento.
• Escutar, compreender e acolher as pessoas trans, no início ou logo após
a decisão da transição, são ótimas ações para ajudá-las.
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10- EQUIPAMENTOS EXISTENTES NA PROTEÇÃO
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Este serviço está vinculado ao Ministério da Mulher, Família e Direitos
Humanos e tem como objetivo receber e encaminhar denúncias para os órgãos
competentes para que assim seja devidamente investigado.
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No que se refere à sexualidade da vítima e a cor/raça, brancos foram 29%,
pardos 26%, pretos 11,9%, amarelos 1% e indígenas 0,5%. Os não informados
representam 30,6% do total de vítimas.
Sobre o sexo do suspeito, quase 76% desses são heterossexuais, 8,7% são
gays e bissexuais representam 3%. Os locais de violação com mais índices foram
na rua (32,32%), outros (23,49%) e casa da vítima (20,06%), o que demonstra que
parte das violências ocorrem no âmbito familiar.
Após o registro da denúncia, ela será encaminhada aos órgãos
responsáveis de acordo com a competência de cada um para averiguação e
investigação.
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Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG)
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e violência, grupos de apoio, atividades culturais e de lazer e espaços para
reuniões de articulação política dos coletivos de gays, lésbicas, bissexuais e
transsexuais.
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11- CONCLUSÃO
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REFERÊNCIAS
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Dossiê assassinatos e violências contra travestis e transexuais brasileiras em 2021
/ Bruna G. Benevides (Org). – Brasília: Distrito Drag, ANTRA, 2022
Site https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2019/junho/disque-100-registra-
quase-tres-mil-violacoes-contra-a-populacao-lgbt (acesso em 15/02/2022)
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