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1. O Espaço Físico
Exterior
Conclusão:
O espaço físico exterior acompanha o percurso da personagem central e é motivo para a representação
de atributos inerentes ao espaço social.
Os espaços interiores estão de acordo com a escola realista / naturalista: interacção entre o homem e o
ambiente que o rodeia.
1.1. O Ramalhete
“(...) e o Ramalhete possuía apenas, ao fundo de um terraço de tijolo, um pobre quintal inculto,
abandonado às ervas bravas, com um cipreste, um cedro, uma cascatazinha seca, um tanque entulhado, e uma
estátua de mármore (onde Monsenhor reconheceu logo Vénus Citereia) enegrecendo a um canto na lenta
humidade das ramagens silvestres.” [Cap. I]
“De resto, não desgostava do Ramalhete (...) e gostava até do seu quintalejo. Não era decerto o jardim
de Santa Olávia: mas tinha o ar simpático, com os seus girassóis perfilados ao pé dos degraus do terraço, o
cipreste e o cedro envelhecendo juntos como dois amigos tristes, e a Vénus Citereia parecendo agora, no seu
tom claro de estátua de parque, ter chegado de Versalhes, do fundo do Grande Século... E desde que a água
abundava, a cascatazinha era deliciosa, dentro do nicho de conchas, com os seus três pedregulhos arranjados
em despenhadeiro bucólico, melancolizando aquele fundo de quintal soalheiro com um pranto de náiade
doméstica, esfiado gota a gota na bacia de mármore.” [Cap. I]
“Todos os móveis do escritório do avô desapareciam sob os largos sudários brancos.” [Cap. XVIII]
“Ega sentara-se também no parapeito, ambos se esqueceram num silêncio. Em baixo o jardim bem
areado, limpo e frio na sua nudez de Inverno, tinha a melancolia de um retiro esquecido, que já ninguém ama:
uma ferrugem verde, de humidade, cobria os grossos membros da Vénus Citereia; o cipreste e o cedro
envelheciam juntos, como dois amigos num ermo; e mais lento corria o prantozinho da cascata, esfiado
saudosamente, gota a gota, na bacia de mármore.” [Cap. XVIII]
O percurso da família Maia encontra-se estampado nas alterações por que passou o Ramalhete.
Desde o início, desabitado, quando Afonso vive no retiro campestre de St.ª Olávia, o Ramalhete não
tem vida; em seguida, habitado, preparado para receber Carlos, torna-se símbolo da esperança e da vida: a
estátua e a cascata transformaram-se. É como que um renascimento. Finalmente, a tragédia abate-se sobre a
família e eis a cascata chorando e a estátua coberta de ferrugem. Tudo aponta para um carácter fúnebre, uma
espécie de cemitério areado e limpo, tendo como guardas o cipreste e o cedro – árvores que, pela sua
longevidade, simbolizam a vida e a morte –, testemunhas das várias gerações dos Maias, que já haviam partido.
Quanto à cascata, a água marca a passagem inexorável do tempo e acentua o implacável Destino dos
Maias, condenados ao desaparecimento, após a doçura ilusória de um “instante” que durou 2 anos.
À “cadência saudosa de um sonho” sucede a saudade, o silêncio e a memória fugaz de um tempo,
outrora feliz.
Os móveis do escritório de Afonso estão cobertos de panos brancos que são comparados a
mortalhas com que se envolvem os cadáveres. A morte instala-se definitivamente nesta família.
Todo o recheio do mobiliário do Ramalhete, degradado e disposto numa anormal confusão, todos os
aposentos, melancólicos e frios, tudo deixa transparecer a realidade da destruição e da morte.
1.2. A Toca
“O melhor é baptizá-la definitivamente com o nome que nós lhe dávamos. Nós chamávamo-lhe Toca.”
[Cap. XIII]
“Era uma alcova recebendo a claridade de uma sala forrada de tapeçarias, onde desmaiavam, na trama
da lã, os amores de Vénus e Marte.” [Cap. XIII]
“Mas Maria Eduarda não gostou destes amarelos excessivos. Depois impressionou-se, ao reparar num
painel antigo, (...) onde apenas se distinguia uma cabeça degolada, lívida, gelada no seu sangue, dentro de um
prato de cobre.” [Cap. XIII]
“Enchendo quase a parede do fundo, o famoso armário, o “móvel divino” do Craft, (...) luxuoso e
sombrio, tinha uma majestade arquitectural: na base quatro guerreiros, armados como Marte, (...); depois, na
cornija, erguia-se um troféu agrícola com molhos de espigas, foices, cachos de uvas e rabiças de arados; e, à
sombra destas coisas de labor e fartura, dois faunos, recostados em simetria, indiferentes aos heróis e aos
santos, tocavam, num desafio bucólico, a frauta de quatro tubos.” [Cap. XIII]
“Era ao centro, sobre uma larga peanha, um ídolo japonês de bronze, um deus bestial, nu, pelado,
obeso, de papeira, faceto e banhado de riso, com o ventre ovante.” [Cap. XIII]
Toca é o nome dado à habitação de certos animais, o que, desde logo, parece simbolizar o carácter
animalesco deste relacionamento amoroso. Carlos introduz a chave no portão da Toca com todo o prazer,
não só por essa atitude simbolizar um certo poder, mas também pelo prazer daquelas relações incestuosas.
A decoração dos aposentos simboliza já o carácter trágico daquela relação amorosa; a profanação das
leis humanas e cristãs; a sensualidade pagã e excessiva.
Os guerreiros simbolizam a heroicidade, os evangelistas, a religião e os troféus agrícolas, o trabalho:
qualidades que terão existido um dia nesta família (e no Portugal da Epopeia) e que agora estão completamente
arredadas.
Os dois faunos simbolizam os dois amantes numa atitude hedonista e desprezadora de tudo e de todos.
O ídolo japonês remete para a sensualidade exótica, heterodoxa, bestial desta ligação incestuosa.
2. Espaço Psicológico
Conclusão:
3. Espaço Social
Os espaços sociais aparecem construídos, na obra, quer através dos ambientes vividos pelas
personagens, em determinados momentos, quer através do percurso de personagens que tipificam um
determinado grupo social, caracterizando-o.
Vê-se em certos episódios da obra a preocupação do autor no sentido de evidenciar, de criticar
algumas das características mais flagrantes da sociedade lisboeta da época, quer a nível social, quer a nível
político, religioso e cultural. Estes episódios constituem um dos vectores estruturais da obra: a crónica de
costumes.
Simbologia das Cores
“Depois, daí a duas semanas, o Alencar, entrando em S. Carlos ao fim do primeiro acto do “Barbeiro”,
ficou assombrado ao ver Pedro da Maia instalado na frisa do Monforte (...) ao lado de Maria (Monforte), com uma
camélia escarlate na casaca.” [Cap. I]
“Maria, abrigada sob uma sombrinha escarlate, trazia um vestido cor-de-rosa cuja roda, toda em folhos,
quase cobria os joelhos de Pedro, sentado a seu lado; as fitas do seu chapéu (...) eram também cor-de-rosa: e a
sua face, grave e pura, como um mármore grego, aparecia realmente adorável, iluminada pelos olhos de um
azul sombrio, entre aqueles tons rosados.” [Cap. I]
“Logo nos primeiros dias, ao voltar à sala, Maria Eduarda tinha-se sentado na sua cadeira escarlate.”
[Cap. XI]
“(...) aparecia enfim uma casota de paredes enxovalhadas, com dois degraus de pedra à porta e
transparentes novos de um escarlate estridente.” [Cap. VI]
“(...) ela tomara de sobre a mesa, abria lentamente um grande leque negro pintado de flores
vermelhas.” [Cap. XI]
“era toda forrada, paredes e tecto, de um brocado amarelo, cor de botão-de-ouro.” [Cap. XIII]
“os seus olhos muito negros” [Cap. III] ; “a cabecinha de cabelos negros” [Cap. III]
“Era decerto um famoso e magnífico moço, alto, bem feito, de ombros largos, com uma testa de
mármore sob os anéis dos cabelos pretos, e os olhos dos Maias, aqueles irresistíveis olhos do pai, de um negro
líquido, ternos como os dele e mais graves.” [Cap. IV]
A cor vermelha tem um duplo significado: ora feminina e nocturna, ora masculina e divina. M.ª
Monforte e M.ª Eduarda são portadoras de um vermelho feminino, fogo que, por um lado, desencadeia a paixão,
despertando a sensibilidade à sua volta, mas que, por outro lado leva à morte. É que a paixão excessiva é
destruidora: provoca o suicídio em Pedro, a morte em Afonso e o desejo da morte em Carlos.
O vermelho da casa de Ega – a Vila Balzac – é tão intensivo que indica a dimensão essencialmente
carnal e efémera dos encontros de amor com Raquel Cohen.
O tom amarelo e dourado está também presente. O amarelo indica o carácter ardente da paixão.
Tanto simboliza a luz do ouro (da essência divina) como a luz da terra ( estações: Verão e Outono). No 1.º caso
é anunciadora da velhice, do Outono da vida e da proximidade da morte, simbolizada, naturalmente, pelo negro.
M.ª Monforte e M.ª Eduarda, mãe e filha, conjugam estas três cores: cabelos de ouro, olhos pretos e leque negro
pintado de flores vermelhas, sombrinha escarlate. Estas duas mulheres fatais (para Pedro e Carlos,
respectivamente) simbolizam simultaneamente a vida e a morte, o divino e o humano, a aparência e a realidade;
a força que se torna fraqueza.