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NEOLIBERALISMO: UM SISTEMA PARA POUCOS

Rafael Parente Ferreira Dias


Professor de Filosofia da UERR

O sistema político no qual estamos inseridos e que define o nosso tempo – o


neoliberalismo – persegue a maximização do lucro e o consumo crescente; penaliza os
mais frágeis e premia os mais poderosos, que dentro dessa dinâmica, tem lugar de
honra. O sistema, assim delineado, transforma-se no paraíso do individualismo e do
consumismo, pois endossa a lógica da pilhagem, substituindo a cooperação pela
competição, lançando nossa sociedade em uma terrível contradição interna.

Na prática, o que vemos é um conjunto de políticas que privilegiam um número


relativamente pequeno de interesses particulares a fim de manter e controlar os rumos
econômicos da sociedade. Atualmente, os defensores desse sistema, ao discursarem
sobre os benefícios do mesmo, emitem uma aura quase sagrada ao redor de suas ideias.
No limite de nossa tolerância, somos surpreendidos por defensores efusivos deste
modelo de sociedade materialista e totalmente focado no lucro e na produtividade.

De acordo com o Relatório de Desigualdade Mundial 1, divulgado em 2021, os


10% mais ricos da população global controlam 76% da riqueza que existe no mundo.
Em contraste, os 50% mais pobres possuem apenas 2%. Defender acriticamente um
modelo tão perverso como este é no mínimo constrangedor; os pobres e a classe média
estão competindo por um punhado limitado de recursos, gerando grande desigualdade –
este é o enredo perfeito para gerarmos uma sociedade da exaustão.
A mídia empresarial, as grandes corporações, o mercado financeiro e até mesmo
uma grande parte da cultura intelectual, ou seja, os jogadores mais poderosos do
tabuleiro estão todos afinados num mesmo tom. Existe uma indústria cultural destinada
a criar o “jogo das necessidades”, o “banquete do consumo”, de modo a convencer as
massas de que essa situação deplorável, na verdade, é “normal” e “necessária”.

Por meio de uma ampla gama de mecanismos disruptivos, eles dilaceram qualquer
tentativa de inversão da lógica capitalista. A dominação ideológica acontece desde os
mais altos cumes da institucionalidade política, até redes capilares e informais de

1
A matéria completa sobre a desigualdade social pode ser consultada em:
https://www.cnnbrasil.com.br/business/10-mais-ricos-controlam-76-da-riqueza-global-50-mais-pobres-
ficam-com-2/#:~:text=Riqueza%20global%20e%20lacunas%20de,sua%20vez%2C%20possuem
%2022%25.
comunicação com a sociedade. Por todos os lados vemos instrumentos disciplinadores,
engrenagens de dominação, mensagens subliminares cujo efeito sobre o psiquismo
humano é extremamente forte. As propagandas na TV, internet, e nos diversos outros
meios de comunicação lançam rajadas de informação a todo instante, a maioria
esmagadora delas está contaminada pela lógica consumista. “Compre!” “Consuma!”
“Enriqueça!” Estes são os “mantras” principais da ideologia neoliberal. Perceba que
todo o movimento está dirigido para fora, o interesse está unicamente no lucro, e para
isso acontecer precisa haver mercadorias, compradores, estímulo constante, pois se não
for assim o sistema quebra, ele foi inventado para servir como uma engrenagem
contínua, não pode parar.

O sistema forma pessoas competitivas, avarentas, individualistas, sem empatia e


altamente egocêntricas. Esses estados psíquicos são setas que apontam para um mundo
pouco fraterno e com marcada tendência ao stress coletivo. Sim, o homem está exausto!
Asfixiado pela constante competição, com a alma sufocada pelas fatigantes
responsabilidades sociais, a vida tornou-se extremamente complexa, a lógica capitalista
transformou “o outro” em “competidor”, a existência dele é uma ameaça a minha
sobrevivência – cada passo, cada movimento pode significar a minha própria extinção,
meus sonhos, meus desejos, tudo depende do trabalho, do suor, porém, a dinâmica
social nos ensina que a qualquer momento podemos ser descartados, o jogo do capital
tem os seus próprios interesses, a qualquer instante posso ser uma carta fora do
baralho, e em meu lugar colocam outra pessoa, mexem no tabuleiro como se fossemos
simples mercadorias, totalmente descartáveis – hoje temos um emprego e um bom
salário, amanhã somos demitidos e não servimos mais.
Nosso papel é questionar as bases desse sistema opressor, de modo a reinventá-lo,
retirando os aspectos negativos (vinculados a frieza do capital) que reforçam o
individualismo, o consumismo, e agregando outras qualidades vinculadas à cooperação,
à humanização das relações, ao autoconhecimento etc. Portanto, nossa luta não é apenas
por justiça social, senão por um ideal de sociedade que reforce a dignidade humana,
garantindo mais felicidade e fraternidade nas relações.

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