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“Estudos sobre a histeria”

- O mecanismo psíquico dos fenômenos histéricos


- O caso Anna O.

Prof. Dr. Rodrigo Jorge Salles

rodrigo.salles@saojudas.br

Profa. Dra. Fabiana Coelho Fernandes

fabiana.fernandes@saojudas.br
A Histeria
• Afecção bastante difundida no fim do século XIX -> Indagava-se sobre sua origem: orgânica ou psíquica?

• Eram chamadas: “pessoas com problemas nervosos”.

• O quadro histérico se exprime de maneira teatral e sob a forma de simbolizações, através de sintomas
corporais transitórios/rápidos (ataques ou convulsões de aparência epiléptica) ou duradouros (paralisias,
contraturas, cegueira, afasias, distúrbios da memória). Quadros fóbicos. (Roudinesco & Plon, 1998).

• Derivada da palavra grega hystera (matriz, útero), a histeria é uma neurose caracterizada por quadros
clínicos variados.

• Teses da antiguidade: foi associada às doenças do aparelho genital feminino, sua cura passava pela
combinação de várias terapias que podia culminar com a extirpação do útero (Laplanche & Pontalis,
2001).
Jean Martin Charcot (1825-1893)
• Médico e professor de medicina, foi nomeado em 1862 como chefe de serviço na
Salpêtrière.

• Considerado o maior neurologista de seu tempo.

• Em 1870, começou a estudar a histeria, estendendo suas pesquisas ao hipnotismo em


1878. Hipnotismo  demonstrava que não era apenas uma “simulação”.

• Abandona a tese uterina sobre a histeria  “devolve a dignidade a histeria”.

• Charcot observou que a hipnose permitia a evocação do sintoma histérico sob um estado de
alteração de consciência.

• Empregava a hipnose mais para fins demonstrativos do que terapêuticos.


Freud trabalhou em Salpêtrière, em Paris de outubro de 1885 a fevereiro de 1886.
Hippolyte Bernheim (1837-1919)
• Médico com grande reputação graças as suas pesquisas sobre febre
tifoide, doenças do coração e pulmão.

• Posteriormente, abandonou a hipnose sustentando que os mesmos


efeitos poderiam ser obtidos em estado de vigília: método que a Escola
de Nancy designou de “psicoterapia”.

• A hipnose era uma sugestão que passava antes de tudo pela palavra.

• Em 1889, Freud foi à escola de Nancy e passou algumas semanas com


Bernheim.

• Bernheim foi, em 1990, considerado o mais eminente psicoterapeuta da


Europa.
Sobre a Hipnose
 Charcot empregada a hipnose em pacientes histéricas com fins demonstrativos, mas
não como tratamento.

 O interesse de Freud pela hipnose associada ao método catártico (transe hipnótico +


a fala) surge após ouvir os relatos de Josef Breuer (1842-1925) sobre os êxitos
obtidos no tratamento via hipnose de sintomas histéricos de uma jovem paciente,
Anna O.

 Breuer percebeu que os sintomas histéricos desapareciam quando a paciente, em um


estado de transe, relatava em detalhes as lembranças do momento da primeira
aparição do sintoma.
Estudos Sobre a
Histeria
Estudos Sobre a Histeria (1893-1895)
• Sobre o mecanismo psíquico dos fenômenos histéricos (Breuer e Freud)
Casos Clínicos
Caso Anna O. (Breuer)
Srta. Elisabeth von R. (Freud)
Sra Emmy von N. (Freud)
Miss Lucy R. (Freud)
Katharina (Freud)
• Considerações teóricas (Breuer)
• Psicoterapia da histeria (Freud)
O Mecanismo Psíquico dos Fenômenos
Histéricos
O Mecanismo Psíquico dos Fenômenos Histéricos
Breuer e Freud
 Diferentemente da visão vigente na época, apresentam uma concepção
psicológica sobre a histeria.
 A histeria é fruto de um conflito que se dá no interior da mente do paciente ->
“As doenças podem ser causadas por ideias”

 Uma ideia recalcada incompatível é a fonte das manifestações dos sintomas


histéricos -> Com isso, a ideia ou afeto inadmissível é expulso da consciência.
 O sintoma histérico é produto desta impossibilidade de dar vazão a um afeto.
Freud -> “As histéricas sofrem de reminiscências ”.
A Formação do Sintoma Histérico
• Recalque: Processo psíquico UNIVERSAL – origem da constituição do inconsciente.

• Recalque-> Processo inconsciente pelo qual existe uma remoção de representações


indesejadas da esfera consciente para o inconsciente.

• Representações: pensamentos, imagens, recordações traumáticas.

Separação -> Afeto - Representação.

“Dissociação do consciente”
(Laplanche & Pontalis, 2001)
A Formação do Sintoma Histérico
Recalque

Valores morais
Desejo Ics

(pensamento, ideia, recordação, etc)


NA HISTERIA
“quantum de
afeto” -
descarregado no
Sintoma corpo
A Formação do Sintoma Histérico
RETORNO DO RECALCADO
1. Caráter indestrutível dos conteúdos inconscientes.
2. Impulso/desejo intolerável continua a existir no inconsciente.
3. Tendem incessantemente a reaparecer.
4. Sintomas  Efetua-se por meio de “formações de compromisso”.

(Laplanche & Pontalis, 2001)


O Mecanismo Psíquico dos Fenômenos Histéricos
 A nova concepção etiológica sobre a histeria leva a organização da primeira proposta de
tratamento destes quadros: “O Método Catártico”.

 Sob Hipnose (afrouxamento das defesas psíquicas) -> Sintomas desapareciam após a
evocação da lembrança traumática e vivência da emoção originária ligada ao
acontecimento “esquecido” (recalcado).

 Visa uma “Ab-Reação” (catarse): “Descarga emocional pela qual o indivíduo se liberta do
afeto que acompanha uma recordação de um acontecimento traumático.”
 Descarga normalmente acompanhada de choro, ansiedade, tensão.

Freud: “Uma lembrança livre de toda carga afetiva é quase sempre totalmente ineficaz”.
O caso Anna O.
O Caso Ana O.
• Caso Publicado em “Estudos sobre a Histeria” (1893-1895).

• Tratada de 1880 a 1882 por Josef Breuer.

• Caso que, para muitos, inaugura a Psicanálise.

• Jovem de 21 anos

• Altos dotes intelectuais


• Educação rígida.
• Ao cuidar com extremo zelo de seu pai,
descuidou de sua própria saúde.
• Seu pai adoeceu em julho de 1880 e veio a
falecer em abril de 1881.
• Tratada entre 1880 e 1882 por Breuer.
O Caso Anna O.
Sintomas

• Paralisia do braço direito.

• Perturbação dos movimentos oculares e alterações da visão.

• Tosse nervosa intensa.

• Impossibilidade de beber água durante várias semanas, apesar de uma sede martirizante.

• Redução da faculdade de expressão verbal que chegou a impedi-la de falar a língua materna (alemão), só
falava inglês.

• Estados de ausência (alteração da personalidade acompanhada de confusão), delírio. Ficava “travessa”,


ofensiva, jogava travesseiro nas pessoas, arrancava os botões -> dissociação histérica.
O Caso Anna O.
O método Catártico

1. Breuer observava momentos de ausência: Ana O. dizia palavras durante a ausência -> auto-hipnose ou estado
hipnóide.

2. Breuer anotava as palavras e repeti-as para a paciente em transe hipnótico para incitá-la a falar mais sobre esses
conteúdos.

3. Breuer passou a hipnotiza-la: pedia para concentrar-se nos sintomas que estavam tratando no momento – tentar
lembrar as ocasiões em que surgiram.

4. Percebeu-se que os sintomas remontavam à época em que cuidava do pai doente, portanto uma fase com grandes
cargas afetivas.

5. Estando sob hipnose, ao retomar o momento em que os sintomas apareceram, ocorria uma exteriorização afetiva,
conduzindo ao desaparecimento dos sintomas.

6. Ao extravasar os sentimentos, ao acordar, o sintoma havia desaparecido e não tornava a aparecer.

7. Cura pela palavra – “Talking cure” ; Limpeza de chaminé “Chimney sweeping”.


Sob hipnose refere-se a dama de companhia inglesa,
de quem não gostava e contou com repugnância que,
tendo ido ao quarto dessa senhora viu, bebendo
num copo, o seu cãozinho, um animal nojento.
Depois de exteriorizar energicamente a cólera
retida, pediu para beber, bebeu sem embaraço
grande quantidade de água e despertou na hipnose
com o copo nos lábios. A perturbação desapareceu.
Sobre as perturbações visuais:

1) Estando com os olhos marejados ela forçou a vista,


aproximando os olhos do relógio, cujo mostrador lhe pareceu
muito grande. Esforçou-se para que enfermo não visse suas
lágrimas.

http://significantess.blogspot.com.br/2009/01/anna-o.html
2) Colocou o braço direito sobre as costas da cadeira. Caiu
em estado de semi-sono (devaneio) e viu, como se visse da
parede, uma cobra que se aproximava do seu pai para
mordê-lo.

Ela quis afastá-la (provavelmente com a mão direita), mas


estava como que paralisada, seu braço direito achava-se
adormecido.

Quando a cobra desapareceu, aterrorizada, quis rezar, mas


não achou palavras em idioma algum, até que, lembrando-se
de uma poesia infantil em inglês, pôde pensar e rezar nessa
língua.

A reconstituição dessa cena permitiu remoção da paralisia


do braço direito, que existia desde o começo da moléstia e o
tratamento teve fim.
O Caso Anna O.
a) Na situação com o cão da dama de companhia – não demonstrou a aversão por ser socialmente
indesejável.

b) Velando à cabeceira do pai - não expressou emoção para que o pai doente não percebesse a
ansiedade e a penosa depressão.

• Em síntese: Anna O. não se permitiu experimentar as verdadeiras emoções, não podendo dar a elas
vazão por meio de palavras ou ações.

• Na impossibilidade de sentir as emoções  seu destino era a via somática (sintomas histéricos).

• A hipnose permitia à paciente Ab-reagir seus afetos -> recordar a experiência com toda a emoção
associada, emoção que fora bloqueada e que conduzira a formação do sintoma.
O Caso Anna O.
1. Biógrafos discutem a real “cura” de Anna O.

2. Histórico de internações psiquiátricas.

3. Bertha Pappenheim se tornou a primeira assiste social da Alemanha


dedicando-se a acolher jovens judias pobres e inúmeras órfãs que eram
levadas a prostituição  tornou-se uma figura importante para o
movimento feminista europeu.
Síntese do Tratamento Inicial da
Histeria
Contribuições do Caso Anna O.
• O caso Anna O. foi um marco importante para o nascimento da
Psicanálise e do método Psicanalítico.

• Posteriormente, Breuer e Freud passaram a apresentar diferenças na


compreensão da etiologia do quadro histérico.

• Freud começa a levantar hipóteses sobre o papel da sexualidade


recalcada na composição do sintoma histérico  Posterior ruptura com
Breuer.

• Gradualmente, Freud também irá abandonar o emprego da Hipnose


passando a usar a “Associação Livre”.
Referências
• Freud, S. (1996). Cinco lições de Psicanálise. In: Edições Brasileiras das Obras Completas
de S. Freud. Volume XI. Rio de Janeiro: Imago. (Original publicado em 1910).

• Freud, S. (1996). Estudos sobre a histeria. In: Edições Brasileiras das Obras Completas de
S. Freud. Volume XVIII. Rio de Janeiro: Imago. (Original publicado em 1895).

• Laplanche, J., & Pontalis, J.-B. (2001). Vocabulário da psicanálise (10a ed.). São Paulo:
Martins Fontes.

• Roudinesco, E., & Plon, M. (1998). Dicionário de psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.

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