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E apesar de agora a linguagem de Freire, ser simples e descomplicada, nem sempre foi
assim, uma vez que no início de sua trajetória, e isto ele relata em PE, como durante sua
passagem pelo SESI, falava aos pais de alunos quase como se estivesse dirigindo-se a alunos
da universidade. Destarte, sua fala era distante da realidade dos presentes, pois ainda partia
quase sempre de seu mundo. Era quase, porque Freire já começava a entender que haviam
diferenças de linguagem entre as sociedades, diferenças regionais, sociais e culturais. Mas isto
não se deu no vácuo, foi a partir de uma experiência vivida que ele percebeu a importância de
se entender a linguagem em sua totalidade, chegando à conclusão de que o educador deve ir
transformando o falar ao povo em falar com o povo, tendo em vista as suas experiências
(FREIRE, 2019). Partindo dos discursos tradicionais feitos aos ouvintes, para o debate e
diálogo com os participantes.
Percebendo assim, que só através das conversas com eles, aprenderia sua sintaxe e
semântica, sem as quais não poderia com eficácia trabalhar com eles. Cabendo-o, como aos
outros professores progressistas, o respeito a sua ingenuidade, mas sem jamais se acomodar a
essa visão de mundo. Partindo dessa forma, da aceitação à problematização.
Entretanto, entender a realidade pode levar à compreensão de mundo e a possibilidade
de mudança, porém, não significa que vá haver uma mudança de fato no mundo concreto.
Ainda assim, começava ali uma luta ideológica, na qual as classes populares ao analisar a sua
realidade percebiam que podiam falar, iniciando o que Freire chamava de “rompimento da
cultura do silêncio”. Visto que, os oprimidos ao perceberem que a realidade na qual estavam
inseridos não se tratava de uma vontade de Deus, saiam da aceitação e adentravam no
processo de refazer-se, aspirando algo diferente.
À vista disso, o papel da linguagem para Freire é de possibilitar o desenvolvimento das
classes populares, construindo uma língua que parta, e ao mesmo tempo, volte-se para a
realidade dos homens e das mulheres, que os ajude a seguir o caminho da invenção da
cidadania. Caminho esse que não é fácil, dado que não basta compreender a realidade para
que haja uma mudança no concreto, mas ter uma noção do mundo real viabiliza que as classes
populares lutem se posicionem e busquem uma realidade melhor.
Portanto, nesse cenário, a PE é considerada como complementar a PO na medida em
que para o oprimido reconhecer sua condição e lutar por seus direitos e por uma existência
mais significativa é necessário ter esperança, ou melhor, buscar a esperança dentro de si, já
que segundo Freire é uma característica ontológica ao ser humano. Sendo assim, ter esperança
é olhar de forma crítica a realidade e acreditar na mudança através da luta. Foi munido de
tamanha esperança crítica, de experiências transformadoras e de sua linguagem dialógica que
Paulo Freire constituiu-se no grande educador que foi e é, pois mesmo após sua morte seu
legado continua perpetuando entre educadores e educadoras.
Referências
______. Professora sim, Tia não: cartas a quem ousa ensinar [recurso eletrônico]. 24ª. ed.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015.