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A Hora da Estrela (1985)

Sabemos que a adaptação de um livro para os cinemas é uma tarefa complexa e Suzana
Amaral encarou esse desafio em seu longa de estreia ao adaptar a obra de Clarice
Lispector, cuja escrita é muito intimista e abre espaço para milhares de
interpretações nas entrelinhas de suas histórias. A diretora faz jus ao livro, mas
ficou faltando um pouco da genialidade da Clarice no filme.
O filme tem as suas limitações em nível de composição, mesmo de tecnologia
cinematográfica – e possui muitos cortes abruptos de passagem de tempo, o que me
confundiu ao tentar entender quanto tempo um acontecimento antecedeu o outro.
Contudo, assim como no livro o narrador diz que não irá rebuscar a forma do romance
e que a estrutura da sua narração será simples, humilde, como a sua heroína, a
simplicidade compositiva, que aqui não é proposital como é no livro, não se torna
um defeito em a Hora da Estrela, mas ajuda a construir a essência melancólica e
poética principalmente sobre a morte e a vida deprimente da protagonista.
A obra conta a história da ingênua Macabéa (Marcelia Cartaxo), imigrante nordestina
que se muda pra cidade grande. Macabéa vive uma vida simples e trabalha como
datilógrafa numa pequena firma recebendo menos que o salário mínimo e assim vivendo
numa pensão miserável onde divide o quarto com mais três mulheres. Começa um
relacionamento duvidoso com o operário Olímpico (José Dumont), também nordestino,
mas ao contrário da protagonista não tem nada de ingênuo. Após ser passada para
trás por Glória (Tamara Taxman), sua bonita colega de trabalho, Macabéa procura uma
cartomante (Fernanda Montenegro), que prevê seu encontro com um estrangeiro bonito
e rico.
Em alguns momentos da história, senti empatia, pena e irritação por Macabéa não
reagir ao que acontece ao seu redor, mas então entendi que ela não tem os recursos
para essa reação. Macabéa, é sem graça, sem expressão nem vaidade e come todos os
dias cachorro-quente com coca-cola. Não reclama de sua condição e nada faz para
mudá-la, afinal, não entende a felicidade nem tão pouco se entende enquanto gente.
As situações que poderiam levar Macabéa a um final feliz sempre tomam rumos
negativos: O namoro com Olímpico, que só a humilha e despreza; a amizade com Glória,
que não a leva a sério e rouba o seu namorado e as promissoras previsões da
cartomante que não se concretizam e levam ao triste fim de sua vida. Sua morte acaba
sendo o único fato de grande proporção em sua existência, a sua “hora da estrela”,
o único momento em que todos param para olhá-la, “pois na hora da morte a pessoa se
torna brilhante estrela de cinema, é o instante de glória de cada um”. Pode-se
dizer, assim, que a cartomante não estava totalmente errada em suas previsões. De
certa forma, a morte foi a primeira vez que Macabéa brilhou.

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