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A GEOGRAFIA CULTURAL EUROPEIA DE QUATROCENTOS E QUINHENTOS

Principais centros culturais de produção e difusão de sínteses e inovações

A Época Moderna inicia-se em meados do século XV, caracterizada pelo dinamismo


económico, cultural e de mentalidades na Europa. As cidades europeias, recuperadas da fome,
da peste e da guerra, reanimam-se. Há uma abertura de novas rotas transcontinentais com a
descoberta das rotas do Cabo e das Américas. Revolucionam-se os conhecimentos com o
descobrimento de novas técnicas naúticas e cartográficas, bem como a descoberta da
imprensa e a utilização de armas de fogo e da pólvora. Assim, permite a expansão cultural, o
intercâmbio de ideias e a difusão de notícias.

Neste contexto, o Renascimento expande-se, acontecimento que marcou a história europeia


dos séculos XV e XVI, invocando o legado greco-latino (Antiguidade Clássica). O Renascimento
nasceu em Itália, fruto da riqueza das suas cidades. No século XV (Quatrocentos), destacou-se
a cidade de Florença, governada pela família Médicis, assumiu-se como o “farol” da nova
cultura renascentista. Conhecida por ter albergado figuras extraordinárias como Picodella
Mirandola, Brunelleschi, Donatello, Leonardo da Vinci. No século XVI (Cinquecentos), Roma
emergiu como um grande centro cultural renascentista. Deveu-o ao mecenato dos papas Júlio
II e Leão X, bem como a artistas como Rafael e Miguel Ângelo. A República de Veneza também
teve um papel importante no panorama cultural renascentista, tal brilho que se deve graças à
pintura dos irmãos Bellini, de Giorgione, Tintoretto, Veronese ou Ticiano.

O Renascimento espalhou-se pela Europa, criando novas sínteses e reinterpretações, juntando


as novas ideias com as tradições locais:

 Países Baixos – viram a pintura atingir um elevado grau de aperfeiçoamento técnico.


Desenvolveram a pintura a óleo, em temáticas religiosas, burguesas ou populares (Van
Eyck, Van Der Weiden, Van der Goes). Erasmo de Roterdão, filósofo e moralista, é
considerado o melhor representante do ideal humanista, serviu-se do seu domínio do
latim e do grego para revelar a pureza original dos textos bíblicos.
 França – Mecenato de Francisco I. Impulsionou os estudos humanistas ao fundar, em
1530, o Colégio de França e favoreceu a aplicação de uma decoração classicizante nos
castelos.
 Alemanha – Destacam-se os pintores Durer e Holbein. Surgem cidades universitárias e
centros de imprensa.
 Inglaterra – Destacou-se John Colet e Thomas More, bem como as universidades de
Oxford e Cambridge.
 Penínsulas Ibérica – Destacam-se as universidades de Alcalá de Henares e o Colégio
das Artes e Humanidades (Coimbra) como importantes focos do Humanismo. Ainda se
destacaram as cortes de Matias Corvino, da Hungria, e de Casimiro IV, da Polónia.

O cosmopolitismo das cidades Hispânicas – importância de Lisboa e Sevilha


A participação da Península Ibérica na Europa do Renascimento revestiu-se do afluxo das
mercadorias ultramarinas, pelos conhecimentos geográficos e pelo saber técnico forjado na
experiência dos mares que os reinos ibéricos se projectaram na Europa do tempo.

Lisboa:

 Porto de Lisboa, onde se cruzavam as tripulações armadas, os soldados, missionários,


mercadores e aventureiros;
 Estaleiros da Ribeira das Naus, onde calafates construíam e reparavam muitos dos
navios portugueses que percorriam o Globo;
 Bazares da Rua Nova dos Mercadores, ou Casa da Guiné e Índia, abarrotavam de
marfim e outro africanos, de sedas, porcelanas, tapetes, pérolas, rubis e diamantes
orientais;
 Considerada metrópole política;
 Paço da Ribeira, nova morada de D. Manuel I de forma a organizar os tráficos
ultramarinos pela via do monopólio régio.
 Reconstrução urbanística de Lisboa, com Paço da Ribeira, a Alfândega Nova, o
Mosteiro dos Jerónimos, Torre de Belém – época áurea dos Descobrimentos.

Sevilha:

 Cristóvão Colombo, conduziu Espanha à glória da descoberta da América;


 Carreira das Índias, onde se efetuava a articulação entre a Espanha e os territórios
americanos;
 Vera Cruz, no México, onde afluíam carregamentos de pérolas e especiarias das
Filipinas e Cartagena das Índias, na Colômbia; Portos que recebiam as riquezas da
América Central e do Sul: o ouro e a prata, o açúcar, os couros, as plantas tintureiras;
 Cidade que sofria com as ligeiras infetadas, a fragilidade da sua ponte das barcas
sujeita a acidente, fomes, cheias do rio e terramotos que a assolavam.

O ALARGAMENTO DO CONHECIMENTO DO MUNDO

O contributo português

Nos séculos XV e XVI, os Descobrimentos marítimos proporcionaram a Portugal saberes


técnicos e científicos. Foi pela inovação na náutica e na cartografia, bem como pela observação
e descrição da Natureza, que Portugal contribuiu para o alargamento do conhecimento do
Mundo e para o progresso da civilização renascentista.

Náutica:

 Navegação à bolina, faziam sucessivas inclinações oblíquas de velas, numa espécie de


ziguezagues;
 Surge um novo tipo de barco, a caravela, dotados de velas triangulares ou latinas, mais
manobráveis;
 Mais tarde surgem as naus e galeões, mais resistentes e de maior porte, que à vela
latina associavam a vela redonda;
 Surge a navegação astronómica com a simplificação do astrolábio e o quadrante e a
criação da balestilha;
 Utilização das tábuas solares e de regimentos dos astros, elaborados por matemáticos
e astronómicos.

Cartografia:

 Cartografia medieval mostrou-se primitiva e simplista, com raras excepções;


 Planisférios T-0, a terra apresentava-se como um disco plano, constituído por três
continentes e rodeado de oceano;
 Em voga no século XV, derivavam da obra do geógrafo grego Ptolomeu;
 Henricus Martellus, fazendo eco da viagem de Bartolomeu Dias, produziu um
planisfério onde representou o cabo da Boa Esperança;
 Cantino publica um novo planisfério em 1502, um dos mapas da coleção das cartas
portuguesas de Quinhentos;
 Os portugueses resolveram o problema de determinar a latitude e os seus cartógrafos
eram os mais aptos para traduzir com rigor o mundo conhecido;
 Mercator (1569) desenvolve um novo sistema de projeção cilíndrica mais rigoroso.

As descobertas iniciadas pelos portugueses substituíram a visão limitada do mundo


mediterrânico por uma visão global do planeta. Baseados na observação, contrariaram muitas
ideias preconcebidas sobre os mares, continentes, terras, faunas e flora de regiões pouco
conhecidas ou mesmo desconhecidas. Trata-se de uma atitude pré-científica, resulta do
conhecimento empírico, de vivências experimentadas, da realidade observada, tem o nome de
experiencialismo.

Contributo de alguns homens:

 Duarte Pacheco Pereira – é o primeiro a valorizar a experiência no contexto da


observação empírica;
 D. João de Castro – autor de três Roteiros que contêm observações rigorosas sobre a
hidrografia de baías e portos, a determinação de latitudes e o magnetismo terrestre;
 Tomé Pires, Amato Lusitano, Garcia de Orta e Cristóvão da Costa – informações sobre
a botânica e a farmacopeia orientais.

O saber português do século XV e XVI contribuiu para o exercício do espírito crítico que se
encontra nas raízes do pensamento moderno. Os novos conhecimentos, derivados do
experiencialismo, resumiram-se, na maior parte dos casos, a observações e descrições da
Natureza.

O conhecimento científico da Natureza

A conjugação da valorização da experiência e da matemática está na origem do método


experimental (método científico). O verdadeiro conhecimento científico apenas surgiu no
século XVII, quando as observações e descrições da Natureza desencadearam hipóteses que
vieram a ser demonstradas matematicamente.

Leonardo da Vinci teve um papel precursor na afirmação de uma nova mentalidade científica.

O Homem renascentista revelou uma mentalidade quantitativa ao recorrer à utilização de


números (romana substituída pela árabe), dando uma transformação das estruturas mentais.
Recorria aos números em diversas atividades, como navegador, para calcular distâncias,
latitudes; como mercador ou banqueiro, para avaliar lucros e perdas; bem como funcionário
do Estado, para calcular impostos e receitas das alfândegas.

Contributo com notáveis progressos matemáticos, nos campos da álgebra e da geometria –


Frei Luca Pacioli, Tartaglia, Cardan, Stevin e Pedro Nunes.

No inicio do Renascimento, a teoria geocêntrica era a conceção cosmológica dominante.


Derivava dos trabalhos de Aristóteles e Ptolomeu, que afirmava que a Terra, completamente
imóvel e formada por terra, ar, fogo e água, ocupava o centro do universo finito. À sua volta
moviam-se os corpos celestes, de formas imaculadas e incorruptíveis.

Nicolau Copérnico negou Ptolomeu e expôs a sua teoria na obra “De Revolutionbus Orbium
Coelestium”. Defende que o Sol está no centro do universo (teoria heliocêntrica) e todas as
esferas celestes, incluindo a Terra, giram ao seu redor, num movimento chamado translação,
tal como giram em torno do próprio centro, num movimento de rotação.

As repercussões culturais das conclusões de Copérnico não foram sentidas. No entanto, outros
continuaram o caminho iniciado por ele. Outros sábios, com as suas teorias explicativas e os
seus dados experimentais, abalaram o universo geocêntrico de Ptolomeu e a doutrina da
Igreja. Inicia-se uma verdadeira revolução das conceções cosmológicas.

Contributo de diversos sábios:

 Giordano Bruno – frade italiano, defendeu a teoria de um universo infinito, com


inúmeras estrelas que eram o centro de outros sistemas planetários. A Inquisição
condenou-o à morte na fogueira.
 Ticho Brahe – astrónomo dinamarquês, pensou um novo sistema planetário que
conciliava a teoria heliocêntrica e geocêntrica.
 Johannes Kepler – formulou as leis do movimento dos planetas.
 Galileu Galilei – aperfeiçoou o telescópio.

Estas novas descobertas foram perseguidas pela Inquisição e muitas das obras publicadas que
defendiam as teorias heliocêntricas foram colocadas no Índex (lista de livros publicada pela
Igreja Católica, cuja leitura era proibida aos católicos).
A PRODUÇÃO CULTURAL

Distinção social e mecenato

A prosperidade material e o progresso do conhecimento durante o Renascimento fizeram-se


acompanhar de atitudes socioculturais. As elites cortesãs e burguesas, as próprias Cortes,
apostaram no embelezamento dos palácios e no apoio aos artistas e intelectuais como símbolo
de afirmação social.

Os séculos XV e XVI foram conhecidos por um grande crescimento económico. As elites sociais,
ou cortesãs, onde se misturavam nobres e burgueses ligados ao comércio e à finança,
enriqueceram. Desenvolvem formas de exteriorizar a sua riqueza e ascensão social: luxo,
conforto, festas. As elites rodeavam-se de luxo e ostentação, com vestes sumptuosas, ricos
palácios e solares, banquetes faustosos. Praticavam o mecenato (proteção da arte e da
cultura) ao investir na aquisição de obras de arte e no reforço das suas bibliotecas.

Às elites se deve a criação de famosas cortes, como a dos Médicis em Florença ou a dos
duques de Urbino. As cortes constituíram um circulo privilegiado da cultura e da sociabilidade
renascentistas. Fomentaram a erudição humanista e os talentos artísticos, pelo que se
converteram em focos de poderoso mecenato.

Nelas se destacou a figura do cortesão, considerado a imagem perfeita e ideal do Homem


Renascentista, apresentava-se como modelo de talentos físicos e intelectuais, de qualidades
morais e boas maneiras.

A vida quotidiana das elites cortesãs era condicionada por exigentes regras de comportamento
social conhecidas por civilidade. Instruíam sobre o modo como se deveria comer, vestir,
cumprimentar, falar, estar e, ainda, sobre preceitos de higiene pessoal.

Nobres, burgueses, monarcas e membros do clero solicitavam aos intelectuais manuscritos


antigos, originais ou copiados, e obras literárias que exibiam nas suas bibliotecas. Procuravam
através da prática do mecenato, das obras que patrocinavam, imortalizar o nome das elites.

O estatuto social do artista e do intelectual torna-se mais importante, vistos com prestígio e
consideração por parte do Renascentismo.

Alguns conhecidos: Erasmo, cognominado de “príncipe das letras”; Leonardo da Vinci,


qualificado de “admirável e celeste” e Miguel Ângelo, alvo de um verdadeiro culto após a
morte. Os artistas passam a assinar as suas obras, distinguindo-se do anonimato dos artistas
medievais.
A corte régia não ficou para trás em sobressair no panorama da sociabilidade e da cultura
renascentistas. O mecenato, de D. João II, D. Manuel I e seu filho D. João III (conhecido pela
fundação do Colégio das Artes, em Coimbra), não se poupou nas despesas para acolher
humanistas estrangeiros, bem como para custear bolsas a estudantes portugueses na Itália, na
França e nos Países Baixos.

Patrocinaram grandes obras arquitectónicas, levadas a cabo nos mosteiros da Batalha e dos
Jerónimos, na Torre de Belém ou no Convento de Cristo em Tomar.

Quanto às festas realizadas, ficou famosa a boda celebrada em Évora, em 1490, do príncipe D.
Afonso, filho de D. João II, com a princesa D. Isabel, filha dos Reis Católicos.

Os caminhos abertos pelos humanistas

Conhecidos como Humanistas, os artistas e intelectuais do Renascentismo abriram novos


caminhos para a arte e a cultura. Defendiam a excelência do ser humano, que consideravam u
ser bom e responsável, tal que, desenvolveram e aprofundaram os ideais do antropocentrismo
e individualismo.

Pico Della Mirandola foi um dos primeiros humanistas, conhecido por ter escrito uma das mais
belas páginas sobre a dignidade do Homem.

Uma das características fundamentais dos humanistas é a inspiração na Antiguidade,


admirando autores como Homero, Platão, Tucídides, Heródoto, Virgílio, entre outros. A ideia
não é imitar os antigos mas inspirar-se na cultura clássica para inovar, recriar e transformar. O
estudo dos clássicos não é um fim mas um instrumento para ajudar os humanistas a
desenvolverem a sua modernidade.

Os humanistas procuraram manuscritos antigos em bibliotecas e mosteiros; estudaram o


grego e o latim para puderem estudar os autores clássicos. Desta forma, recuperaram as
Sagradas Escrituras, com os seus conhecimentos de grego, leram o Novo Testamento e o
Antigo Testamento (hebraico) e corrigiram os erros das traduções medievais (a Vulgata).

O ensino fomentou o conhecimento da Antiguidade, com o estudo do Latim, do Grego, do


Hebraico, da Literatura em prosa e em verso, da História e Filosofia antigas, consideradas áreas
de estudo fundamentais para a formação moral do ser humano, receberam o nome de studia
humanitatis, ou “humanidades”.
Para além da pesquisa, tradução e divulgação dos textos clássicos, os humanistas criaram
obras onde imitavam os autores greco-latinos, o seu estilo, os géneros literários e as temáticas,
como a mitologia.

Em Portugal, Luís de Camões cantou, em Lusíadas, a glórias dos feitos heróicos portugueses,
tal como, Virgílio fizera, na Eneida, com o povo romano. Verificou-se um movimento de
afirmação das línguas nacionais, que adquiriram regras gramaticais mais precisas,
uniformidade ortográfica e um vocabulário elegante.

Os humanistas escreveram grande parte da sua obra nas respetivas línguas nacionais, o que
permitiu que mais pessoas lessem as suas obras.

Esta consciência da modernidade levou aos humanistas a entenderem o estudo dos clássicos
não como um fim, mas antes como um instrumento formativo que possibilita ao indivíduo o
desenvolvimento das suas capacidades intelectuais e morais e o auxilia a conhecer-se a si
próprio e ao mundo.

Valorizados da excelência do ser humano (antropocentrismo), os humanistas consideravam


que o individuo se distinguia e afirmava no mundo pelo uso da Razão. Desta forma, os homens
do Renascimento adotaram uma mentalidade racionalista. Extremamente atentos ao mundo
que o rodeava, os humanistas procuraram torná-lo melhor e mais perfeito mas é fazendo uso
do espírito crítico e da razão, que denunciaram comportamentos indignos e imaginaram
sociedades ideais – as utopias.

Erasmo de Roterdão, criticando a sociedade da época propõe o regresso ao cristianismo


primitivo e recuperar os valores da humildade, caridade, fraternidade e tolerância. No livro,
“Elogio da Loucura”, Erasmo critica o Papa e a corrupção do clero, abrindo à reforma da Igreja.

A crítica social conduziu à construção de utopias. Alguns humanistas imaginam mundos


prefeitos onde os homens viviam em paz e felizes. Uma das utopias mais conhecidas é o livro
chamado “Utopia” da autoria de Thomas More, onde imaginou um mundo radical, onde existia
igualdade, fraternidade e tolerância. Critica a tolerância, o abuso do poder dos monarcas, o
luxo do clero e a corrupção da sociedade.

A reinvenção das formas artísticas – a imitação e superação dos modelos da Antiguidade

O Renascimento assistiu a uma autêntica revolução no campo da arte. A nova estética irradiou
da Itália e apresentou-se marcada pelo classicismo.

O artista já não é o artesão medieval anónimo, mas um intelectual reconhecido. Imitar as


formas e as temáticas clássicas tornou-se corrente entre os artistas renascentistas, que, na
arte greco-romana, viam exemplo de harmonia, proporção e suprema beleza.

Os artistas demonstravam uma capacidade técnica ao conceberem espaços perspectivados e


ao pintarem a óleo, bem como ultrapassavam os clássicos com o seu naturalismo na
representação de seres humanos, animais e paisagens. Devia, assim, estudar geometria,
perspectiva, aritmética, gramática, filosofia, história, astronomia, medicina, anatomia de modo
a poderem expressar bem a sua arte.

A pintura

A pintura renascentista comungou da paixão pelos clássicos, presente no gosto pela


representação da figura humana, quer se tratasse de temas profanos (Antiguidade Clássica),
quer de assuntos religiosos (Antigo e no Novo Testamento).

A pintura renascentista é uma arte racional, científica e uma imitação intelectualizada e


tecnicista da Natureza. Assim, o que mais vinca é a sua originalidade e criatividade, com a
existência de um novo espaço pictórico, para o que contribuiu diversos progressos e
inovações.

Na Flandres, século XV, Jan van Eyck inventa a técnica do óleo. Realizada sobre madeira ou
tela, a pintura de óleo conheceu uma grande aceitação, não só pela sua durabilidade e
possibilidades de retoque, mas também na possibilidade de realizar velaturas (transparências),
empates (grande espessura de tinta), gradações cromáticas e a elaboração de modelados
(técnica para obter, por meio de gradações cromáticas, a ilusão de volume).

A descoberta da terceira dimensão ficou a dever-se aos estudos matemáticos sobre a


perspectiva dos arquitectos Brunelleschi e L. B. Alberti e do pintor Piero della Francesca. O
campo de visão do observador é estruturado por linhas que tendem a unificar-se no horizonte,
confluindo no ponto de fuga. Esta técnica permite construir o espaço pictórico segundo as leis
da ótica, das proporções geométricas, da exatidão matemática e do tratamento da luz de
forma coerente. Todas as linhas convergem para um pinto para o qual o olhar é atraído e tudo
é ritmado segundo valores matemáticos.

No século XVI, Leonardo da Vinci tornou-se um grande teórico da perspectiva aérea, onde
utilizava igualmente o sfumato, gradação ou esbatimento da luz e da cor.

Relacionado com o novo olhar que a Humanidade tinha do Mundo, a perspectiva representou
uma autêntica desmontagem do conceito medieval de espaço.

Para a composição das cenas, os pintores renascentistas adotaram formas geométricas, com
preferência pela piramidal. Considera-se que perspectiva e geometria foram os grandes
fundamentos da composição artística no Renascimento.
A procura da proporção entre as dimensões preocupava. A verdade é que só no Renascimento
o espaço pictórico foi construído com um rigor matemático, indo-se ao ponto de o projetar a
partir de uma medida-padrão (módulo), que servia de referência para as diferentes dimensões.

As representações naturalistas enquadram-se no movimento de descoberta da Natureza e de


valorização do real, numa época em que despontava uma nova conceção de Homem. O artista
alcançou várias conquistas pictóricas:

 A expressividade dos rostos, com a capacidade de exprimir sentimentos e estados de


alma (alegria, tristeza, ternura) e de refletir os traços da personalidade (firmeza,
doçura, bondade);
 A espontaneidade dos gestos e a verosimilhança das vestes e dos cenários, que eram
de casas e paisagens da época, em lugar dos fundos dourados das pinturas gótica;
 Rigor anatómico, graças às pesquisas e dissecações de cadáveres;
 Conhecimento experimental do mundo envolvente, permitiu fazer da paisagem um
elemento essencial da composição pictórica.

A escultura

No Renascimento, a escultura recuperou a grandeza alcançada na Antiguidade Clássica. Como


acontecia na Época Medieval, a escultura ganhou autonomia e naturalidade, tal que, o corpo
nu readquiriu a dignidade perdida e a estátua equestre voltou a triunfar na praça pública. Os
próprios túmulos tornaram-se local de exaltação dos feitos e da superioridade do Homem.

Humanismo e naturalismo são as grandes características da escultura do Renascimento, que


teve uma forte base de dinamização em Florença. Inspirados na Bíblia, na mitologia ou nos
seus contemporâneos, os escultores renascentistas interessaram-se pela figura humana, pelo
indivíduo dotado de ossos, músculos e personalidade.

As formas rígidas da escultura medieval deram lugar à espontaneidade e à ondulação das


linhas. O equilíbrio e a racionalidade marcaram a escultura renascentista. Acrescentamos,
ainda, o elevado aperfeiçoamento técnico de que os escultores do Renascimento mostraram
ser capazes.

Entre os grandes escultores do Renascimento, devemos citar: Lorenzo Ghiberti, Donatello,


Bernardo Rossellino, Andrea del Verrocchio e Miguel Ângelo.

A arquitetura

Foi na Itália, primeiro em Florença, depois em Roma e em Veneza, que arquitetura


renascentista se afirmou e definiu as suas principais características.
De costas para o estilo gótico e influenciada pela Antiguidade, a arquitetura procedeu a uma
simplificação e racionalização da estrutura dos edifícios. Com efeito:

 Procurou-se a simetria absoluta, que Filippo Brunelleschi considerava ser a


responsável pela harmonia e pela beleza das construções dos Antigos (Clássicos). O
gosto pela simetria levou o arquiteto Leon Battista Alberti a defender a planta circular
ou derivada do círculo (quadrada, hexagonal, octogonal). Adeptos da planta central
vieram a ser Bramante e Miguel Ângelo.
 Verificou-se uma matematização rigorosa do espaço arquitetónico a partir de
múltiplos de uma unidade-padrão. As relações proporcionais estabelecidas entre as
várias partes do edifício estenderam-se às suas medidas principais: altura, largura e
profundidade (comprimento). Cubos e paralelepípedos eram as formas ideias para
integração das estruturas arquitetónicas.
 Aplicou-se a perspectiva linear, segundo a qual os edifícios ou o espaço se
assemelham a uma pirâmide visual, em cuja base se encontra o observador e em cujo
vértice está o ponto para onde se deve olhar. Brunelleschi foi o grande teorizador da
perspectiva e o seu primeiro praticante. Na arquitetura o espaço surge concebido em
função do observador, que ocupa um lugar central na perceção da obra.
 Retomaram-se as linhas e os ângulos retos, característicos da estética clássica, tal
como o predomínio da horizontalidade dos edifícios, numa clara oposição à
verticalidade do estilo gótico.
 Preferiram-se as abóbadas de berço e de arestas.
 Fez-se da cúpula, símbolo do Cosmos, tomando como fonte de inspiração a grande
cúpula do Panteão de Roma. Novas soluções foram ensaiadas na construção das
novas cúpulas, cabendo a Brunelleschi projetar a primeira cúpula renascentista, na
Catedral de Santa Maria das Flores, em Florença.
 Utilizou-se o arco de volta perfeita, visto a sua forma depender apenas do raio,
facilmente ligado com relações geométricas ao resto da construção.

Para além dos aspetos estruturais, a influência da Antiguidade fez-se também sentir na adoção
da gramática decorativa greco-romana:

 Empregaram-se as colunas e os entablamentos das ordens clássicas, com preferência


pela coríntia e compósita.
 Retomaram-se os frontões triangulares, a coroas fachadas ou simplesmente janelas.
 Utilizaram-se os grotescos, ornamentação parietal inspirada na de monumentos da
época imperial romana.

Para além de igrejas, o Renascimento construiu palácios e villae, habitações destinadas ao


conforto terreno de nobres e da rica classe de mercadorias. Um dos tipos mais frequentes de
palácio tem no seu interior um grande pátio central, em torno do qual se distribuem as
dependências. A villae era uma casa de campo caracterizada pela simetria das fachadas, a que
não faltava um toque de classicismo.

Pela Europa fora, os palácios italianos serviram de modelo a reis, príncipes e elites sociais. Em
França, por exemplo, o castelo do Vale do Loire, erguidos nas primeiras décadas do século XVI,
testemunham o gosto francês pela arte italiana.

Adeptos da perfeição, harmonia e proporção, os intelectuais e artistas do Renascimento


conceberam projetos de mundos e cidades ideais e racionalizados. Falou-se de utopias, criação
dos humanistas, locais onde o bem, a virtude, a beleza e a justiça guiavam as relações sociais,
económicas, políticas e religiosas. Um urbanismo regular e racionalizado caiu no génio de
artistas e arquitetos do Renascimento, a quem repugnava a desordem e assimetria da cidade
medieval. Projetaram planos urbanísticos retilíneos, submetidos a regras de higiene,
funcionalidade e beleza. Leonardo da Vinci mostrou-se favorável ao levantamento de várias
praças públicas, todas dotadas de fontes, concebeu esgotos e desviou carroças e coches da
parte alta das cidades. As poucas obras realizadas ficaram-se pela abertura de ruas novas, mais
largas e retilíneas, e de praças de traçado geométrico.

A arte em Portugal: o gótico manuelino e a afirmação das novas tendências renascentistas

A força artística do Renascimento ultrapassou as fronteiras de Itália. Na Espanha, o


renascimento artístico começou por se manifestar numa decoração exuberante, conhecida por
plateresco, na qual a folhagem fantasista, os medalhões e os arabescos preenchem as
superfícies arquitetónicas.

Em Portugal, entre a última década do século XV e o primeiro quartel do século XVI, a


arquitetura gótica renovou-se e multiplicou os motivos ornamentais, dando origem a um estilo
denominado Manuelino.

Desde o século XIX, o Manuelino foi considerado um estilo artístico vincadamente português,
com fortes ligações às Descobertas marítimas. O Manuelino é uma arte heterogénea e
manifesta-se na arquitetura e na decoração arquitectónica e nele se misturam:

 O gótico final, o plateresco e o mudéjar hispânico;


 O naturalismo;
 O exotismo das colunas e colunelos torsos ou espiralados;
 A heráldica régia de D. Manuel I;
 A simbólica cristã.

Do ponto de vista estrutural, o estilo gótico foi mantido, embora se introduzissem algumas
alterações. Os arcos quebrados associam-se a uma profusão de arcos de carena ou conopiais,
de asa de cesto, abatidos, tri e polilobados, de ferradura, redondos. As abóbadas apresentam
redes complexas de nervuras, algumas delas curvas, denominadas “combados”. A abóbada
rebaixada surge como um avanço tecnológico relativamente ao Gótico, estando na origem da
chamada igreja-salão, que se espalhará pelo século XVI. João de Castilho deixou-nos um
exemplar na Igreja do Mosteiro dos Jerónimos.

Quanto à decoração, o Manuelino caracteriza-se pela exuberância das formas naturalistas, em


que os motivos marinhos se conjugam com a vegetação terrestre. Embora o Manuelino esteja
maioritariamente representado na arquitetura religiosa de Portugal continental, ilhas
atlânticas, não devemos esquecer os progressos verificados na arquitetura civil. Quer os paços
régios, quer os solares nobres apresentam-se como belos exemplares da decoração
manuelina.

A arquitetura civil manuelina legou-nos fortalezas defensivas e ofensivas, de que o exemplo


mais belo e original é a Torre de Belém. Entre os arquitetos da arte manuelina, devemos citar:
Mateus Fernandes, Diogo Boutaca, os irmãos Diogo e Francisco de Arruda e João de Castilho.

A estética clássica só se manifestou em Portugal a partir do reinado de D. João III. O austero


espírito do monarca e a contração de despesas régias levaram ao abandono da exuberância
manuelina, substituída pela maior simplicidade das linhas clássicas. Podem considerar-se
manifestações do Classicismo na arquitetura portuguesa:

 A simplificação das nervuras das abóbadas de cruzaria;


 A utilização de abóbadas de berço redondo e das coberturas planas de madeira;
 A substituição de contrafortes por pilastras laterais;
 A delimitação das naves por arcadas redondas, assentes em colunas toscanas;
 A multiplicação dos frontões, das colunas e dos capitéis clássicos, assim como dos
respetivos entablamentos;
 A expansão do modelo de igreja-salão;
 O aparecimento da planta centrada.

Quanto à arquitetura civil, destacamos a Casa dos Bicos, em Lisboa, e o Palácio da Quinta da
Bacalhoa, em Azeitão. João de Castilho, seu irmão Diogo de Castilho, Miguel de Arruda e Diogo
de Torralva contam-se entre os arquitetos que mais se esforçaram por aplicar o Classicismo
entre nós.

Entre fins do século XV e a primeira metade do século XVI, fala-se num surto escultório, seja na
decoração de púlpitos, pias batismais, seja na estatuária de túmulos, portais e altares. A artista
nacionais e estrangeiros devemos uma obra multifacetada, de crescente capacidade técnica,
onde o Gótico, o Manuelino e o Classicismo se fundem harmoniosamente. Nomes famosos da
escultura foram os de:
 Diogo Pires, o Moço;
 João de Castilho e Diogo de Arruda;
 Nicolau Chanterenne, João de Ruão e Filipe Hodarte, os três de nacionalidade
francesa.

Entre meados do século XV e a primeira metade do século XVI, verifica-se uma renovação na
pintura portuguesa, que se aproxima do Renascimento europeu. A tal facto não foram alheios
os contactos culturais, patrocinados pela dinastia de Avis, com a Flandres, a Itália e a
Alemanha.

Nuno Gonçalves e a sua oficina destacaram-se, no século XV, pela aplicação dos valores
renascentistas na pintura portuguesa. Pintor régio de D. Afonso V, a sua atividade estendeu-se
ao longo da segunda metade de Quatrocentos. Os famosos Painéis de S. Vicente testemunham
a abertura da nossa abertura da nossa pintura à inovação pictórica do tempo.

No panorama da pintura portuguesa do século XVI, sobressaíram várias escolas ou oficinas.


Destacamos:

 Em Coimbra, a oficina do Mestre do Sardoal;


 Em Lisboa, as oficinas do Mestre da Lourinhã e de Jorge Afonso. Entre os seus
discípulos mais famosos contam-se Gregório Lopes e Cristóvão de Figueiredo;
 Em Évora, a oficina de Francisco Henriques, de onde se conhece Frei Carlos;
 Em Viseu, a oficina de Vasco Fernandes, conhecido por Grão-Vasco, autor dos
retábulos das sés de Viseu e de Lamego, da Igreja Matriz de Freixo de Espadas à Cinta
e das capelas colaterais da Sé de Viseu.
A RENOVAÇÃO DA ESPIRITUALIDADE E DA RELIGIOSIDADE
A reforma protestante

Nos fins da época medieval, a radicalização de posições levou à rutura teológica de Lutero e
Calvino. As grandes calamidades dos séculos XIV e XV (fomes, guerras e pestes) desenvolveram
nas pessoas um clima de pessimismo. Acreditava-se na presença de um Deus castigador dos
pecados dos homens.

Para agravar a situação, a Igreja está dividida. Entre 1378 e 1417, o Cisma do Ocidente
manteve a Cristandade dividida na obediência a dois papas: um em Roma e outro em Avinhão
(cidade francesa). Os papas renascentistas levavam uma vida um pouco condizente com as
ideias cristãs, tal que não foram modelos de virtudes nem de discórdia. Os maus exemplos
abundavam em toda a hierarquia católica. Na igreja abundava o abandono espiritual dos fiéis,
o absentismo do clero e a dissolução dos costumes.

Serve de exemplo, Júlio II imiscuiu-se nas guerras de Itália, desejoso de aumentar o poderio
temporal no Vaticano e Leão X escandalizou com o luxo da sua corte.

Desde o século XIV, começam a surgir críticas à Igreja Católica.

As práticas religiosas

Por um lado, desenvolvem-se práticas supersticiosas e fanáticas, como a feitiçaria e as


procissões de flagelantes, aquando da Peste Negra.

Por outro lado, protagonizaram práticas de novas formas de piedade mais intimistas e
individualistas, como a Devotio Moderna, nos Países Baixos, que defendia uma vida humilde,
de devoção a Deus e a prática da solidariedade. Na obra “Imitação de Cristo”, escrita em língua
vulgar, o monge alemão, Thomas Kempis defende os princípios da Devotio Moderna. Exerceu
uma forte influência no individualismo religioso do século XV.

As críticas à Igreja

As críticas à Igreja começaram por assumir uma faceta herética. John Wiclif, professor em
Oxford, põe em dúvida a utilidade do clero e a validade dos sacramentos. Apelou ao estudo
direto da Bíblia que considerava a única fonte de Fé e, assim, associada a esta heresia, esteve o
movimento dos lolardos, padre pobres que se associavam aos camponeses na sua luta contra
os senhores.

Jan Huss, reitor da Universidade de Praga, apoiou as ideias de Wiclif e ainda defendeu a
criação de uma Igreja Nacional, desligada da obediência ao Papa. Savonarola, monge italiano,
denunciou os vícios do clero e do Papa Alexandre VI, bem como instigou à revolta contra a
família Médicis. Muitos destes homens foram condenados pelo tribunal da Inquisição e
morreram na fogueira.
Muitos humanistas, como Erasmo de Roterdão, criticaram as práticas da Igreja, a corrupção e a
hipocrisia do clero em geral. Todas estas polémicas e contestações abriram caminho à
Reforma.

A questão das indulgências

A Reforma da Igreja concretizou-se no século XVI devido à ação de Martinho Lutero, monge
agostinho, dotado de elevada espiritualidade e desejoso do contacto próximo com Deus,
colocava a si próprio permanentemente a questão: “Como pode alguém levar uma vida
perfeita perante Deus?”.

Surge uma verdadeira rutura teológica no seio do cristianismo, tal ficou conhecido por
Reforma Protestante e foi despoletada pela Questão das Indulgências. Em 1515, o Papa Leão
X, na necessidade de dinheiro para obras na Basílica de São Pedro (Vaticanos), autorizou a
pregação de venda de indulgências.

Contra isto se revoltou Lutero quando, no dia 31 de Outubro de 1517, afixou na porta da
Catedral de Wittenberg as “85 Teses Contra as Indulgências”, onde acusava o papa e os
dogmas da Igreja, pois afirmava que a salvação depende da Fé e não de boas obras.

A Igreja considerou estas novas ideias uma heresia e, em 1521, Lutero foi excomungado e
expulso do Império. No entanto, reuniu forças e impôs uma doutrina – o Luteranismo.

A justificação pela Fé e a doutrina de Peregrinação

A justificação pela Fé é a grande base doutrinária da reforma praticada por Lutero,


equivalendo a uma nova doutrina da salvação. Considerava o Homem um ser
irremediavelmente inclinado para o pecado, sem livre-arbítrio, pelo que as suas obras seriam
sempre maculadas e não o poderiam salvar. Só Deus predestinava uns homens para a salvação
e outros para a condenação. O Luteranismo abriu caminho à teoria da predestinação.

O Luteranismo

 Lutero considerava a Bíblia como única fonte de Fé e autoridade doutrinal, rejeitando


as obras dos Padres da Igreja e as decisões dos concílios que considerava meras
palavras humanas e por isso sujeitas à crítica e à revisão.
 Negou o monopólio papal na interpretação da Bíblia, afirmando que qualquer crente
podia ler as Escrituras sem intervenção do Clero.
 Lutero advogou que a missa em latim desse lugar a uma cerimónia na língua vulgar,
com orações, cânticos e sermões acompanhados da Comunhão em lembrança da
Santa Ceia.
 Os cultos da Virgem e dos Santos foi abandonado, pois nenhum mediador entre Deus
e os Homens é necessário.
 Proclamou-se o sacerdócio universal.
 O celibato e as ordens religiosas foram abandonados.
 Defendeu a renúncia da Igreja sobre os bens materiais, que passariam para a posse
dos fiéis luteranos.
 Negou o primado do Papa, que considerava submetido à autoridade da Escritura.
 O Chefe da Igreja reformada passa a ser o Chefe de Estado.
 Surgem as Igrejas Nacionais Evangélicas.
 Só reconheceu dois Sacramentos: Batismo e Eucaristia (comunhão), rejeitou a
transubstanciação, ou seja, o milagre de transformar o pão e o vinho na carne e
sangue de Cristo. Propôs a consubstanciação, ou seja, o sangue e o corpo de Cristo
coexistem com o vinho e o pão.
 A prática cristã define-se pela relação pessoal do crente com Deus e não pelas regras,
leis e ritos estabelecidos pelos Homens.
 A vida religiosa é uma ação de amor a Deus.

O Luteranismo expandiu-se rapidamente na Alemanha. Foi apoiado pelos burgueses, príncipes


e pequena nobreza que ficaram com os bens da Igreja Católica e por isso aderiram à nova
Igreja, e os camponeses que esperavam obter alguns desses bens.

A imprensa, invenção alemã, contribuiu para a divulgação da nova Fé. Muitos humanistas
justificaram as ideias luteranas, como o teólogo Philipp Melacnhton que redigiu o credo
protestante conhecido por “Confissão de Augsburgo”. Artistas, como Durer ou os Carnach,
colocaram os seus talentos ao serviço da propaganda luterana.

O imperador Carlos V, católico, hesitou entre a liberdade religiosa e a obrigatoriedade de


obedecerem ao Papa, no entanto, em 1555, aceitou a Paz de Augsburgo, na qual se declarava
a liberdade de credo na Alemanha.

O calvinismo

Em 1536, João Calvino fixou-se em Genebra, onde publicou a tradução francesa de “Da
instituição da religião cristã”, onde defende a sua doutrina, o calvinismo.

Calvino baseava o cristianismo na justificação pela Fé, no sacerdócio universal e na autoridade


exclusiva da Bíblia. Para ele, a predestinação é absoluta ao afirmar que o ser humano jamais
perderia a “graça da Fé”, se nascesse com ela. Já Lutero, considerava que se a pessoa perdesse
a Fé, não teria salvação garantida. Da predestinação absoluta de Calvino resultou numa grande
intolerância para com as outras doutrinas. Os calvinistas faziam parte de um grupo de eleitos
(os predestinados). Se um homem tinha, por exemplo, êxito nos negócios, era um
predestinado.

Quanto ao papel da Bíblia como única fonte de Fé, Calvino defendeu só a ele competir
interpretação do Evangelho. Quanto aos sacramentos, reconheceu o Batismo e a Eucaristia,
esta com simples presença espiritual de Cristo.
Não aceitou a ideia de Lutero da chefia da Igreja ser entregue aos chefes de Estado, pelo
contrário, defendeu a supremacia da Igreja sobre o Estado. Assim, levou a transformar
Genebra numa sociedade teocrática dirigida por um consistório eclesiástico, através do qual
perseguia católicos e protestantes.

O Calvinismo difundiu-se na França, Alemanha, Países Baixos, Hungria, Polónia, Inglaterra e


Escócia. Obteve o apoio de nobres, burgueses, homens do ofício e eruditos.

O Anglicanismo

O rei inglês, Henrique VIII solicitou ao Papa Clemente VII a anulação do matrimónio, que este
recusou. Face à recusa, o monarca proclamou o Ato da Supremacia (1534) que o tornou o
chefe supremo da Igreja Inglesa. Henrique autorizou a tradução da Bíblia e secularizou os bens
das ordens religiosas mas manteve-se fiel à doutrina católica.

No reinado do seu filho, Eduardo VI, a igreja inglesa identificou-se com o calvinismo, ao
contemplar apenas os sacramentos do Batismo e da Eucaristia (com presença espiritual de
Cristo), ao proibir o culto das imagens e suprimir os altares.

No reinado de Maria Tudor, a Inglaterra voltou ao catolicismo e perseguiu os protestantes.

No reinado de Isabel I, consolidou-se a Igreja Anglicana, num compromisso entre o catolicismo


e o calvinismo. Em 1571, publicou os “A Declaração dos Trinta e Nove Artigos”, que serviu de
base doutrinal da Igreja Anglicana. O Anglicanismo é um compromisso entre o catolicismo e o
calvinismo:

 Defendia a justificação pela fé, mas não aceitava a predestinação absoluta;


 Reconheciam a autoridade absoluta da Bíblia
 Só reconheciam como Sacramentos, o Batismo e a Eucaristia, com a presença
espiritual de Cristo.
 Negava o culto dos santos, imagens e relíquias.
 Aboliram o celibato dos padres mas mantiveram uma hierarquia semelhante aos
católicos.

A Inglaterra passou, em termos religiosos por termos conturbados. Os católicos levaram o


Papa a excomungar Isabel I e os calvinistas queixava-se da Igreja anglicana que aos seus olhos
era igual a uma igreja católica. O seu rigor doutrinal valeu-lhes o nome de puritanos. Isabel I,
assim, perseguiu católicos e puritanos e fez da reforma religiosa uma arma de reforço da
autoridade real, bem como promoveu o desenvolvimento marítimo e colonial da Inglaterra,
elevando-a à categoria de grande potência europeia.

Contrarreforma e Reforma católica

A resposta da Igreja Católica à rutura protestante chamou-se contrarreforma (efetuou um


combate doutrinário, ideológico e repressivo ao protestantismo) e reforma católica (procurou
responder às expectativas dos crentes, renovando-se e restaurando o catolicismo).
Concílio de Trento, a criação da Companhia de Jesus (proselitismo de novas congregações
religiosas), a reativação da Inquisição e do Índex foram alguns instrumentos utilizados pela
Igreja Católica.

O Concílio do Trento

Em 1545, reuniu-se o Concílio de Trento, convocado pelo Papa Paulo III, que pretendia debelar
a crise da Cristandade. Terminou os seus trabalhos em 1563, com uma condenação inequívoca
do protestantismo.

Principais medidas tomadas:

 Condenação dos princípios da predestinação e da justificação pela Fé, reafirmando-se


o papel das obras humanas na Salvação das almas;
 Confirma-se a existência do Purgatório, onde as almas cumpririam as penas devidas
pelo perdão dos pecados;
 Manteve-se a Bíblia em latim, rejeitando-se a língua vulgar, que era reservada para
sermões e pregações;
 A par da Bíblia, proclamou-se o valor sagrado da tradição como fonte de Fé;
 Opuseram-se os Sete Sacramentos (Batismo dos recém-nascidos, Confissão auricular,
Eucaristia, Crisma, Matrimónio, Penitência e Extrema-Unção;
 Reforçou-se o poder do Papa relativamente aos concílios;
 Manteve-se o culto dos Santos e da Virgem Maria

O Concílio de Trento pôs em prática uma reforma disciplinar. Para o efeito decretou:

 Proibição da acumulação de benefícios eclesiásticos;


 A residência obrigatória dos padres e bispos nas paróquias e dioceses;
 As visitas pastorais dos bispos às paróquias das dioceses;
 Manutenção do celibato eclesiástico;
 Proibição da ordenação de sacerdotes e bispos com idades inferiores a 25 e 30 anos;
 Criação de seminários para a formação dos futuros clérigos.

Pio V, Gregório XIII e Sisto V foram três grandes papas reformadores a quem coube a
implementação das decisões do Concílio. Entre as medidas tomadas, publicou-se um
Catecismo, com a compilação dos princípios doutrinais decididos em Trento, de um breviário e
de um missal, destinados a regular a oração e o culto.

O Índex

Os fiéis católicos deveriam ser afastados das heresias e por isso deveriam ser proibidos de ler
os livros que colocavam a Fé católica em causa. Obras dos escritos dos reformados e de
conteúdo humanístico e científico deveriam passar pela prevenção e vigilância intelectual da
Cristandade.

Em 1543, foi criada a Congregação do Índex para elaborar a lista das obras consideradas
perigosas para a ortodoxia católica, esta conhecida pelo nome de Índex. Esta lista teve
consequências culturais perniciosas para o desenvolvimento cultural dos países do espaço
católico, e fomentaram o atraso em relação ao mundo protestante. Muitos dos livros que
foram colocados no Índex diziam respeito a publicações filosóficas e científicas, de autores
como Galileu, Descartes, Newton e Leibniz.

A Inquisição

A Inquisição (Santo Ofício) tinha sido criada em 1231, passava de um tribunal religioso criado
para combater as heresias que assolavam a Europa católica. A sua reativação foi considerada
uma forma de combater o protestantismo.

Em 1542, o Papa Paulo III, ordenou a reorganização do tribunal da Inquisição. Assim,


encarregou o cardeal Caraffa (futuro Papa Paulo IV) de organizar, em Roma, o Tribunal da
Inquisição. Nos países católicos onde o Tribunal da Inquisição se instalou moveu uma
perseguição a protestantes, cristãos-novos, filósofos, cientistas, feiticeiros, etc. Instruía
processos com bases em denúncias anónimas e usava a tortura como forma de obter
confissões. Decretava a prisão para os arrependidos e reconciliados com a fé católica e
entregava à justiça civil os impenitentes, para que os condenasse à morte na fogueira.
Confiscava os bens dos culpados.

O proselitismo das novas congregações: a Companhia de Jesus

A Companhia de Jesus foi uma das muitas congregações religiosas que, surgidas no contexto
da Contrarreforma, contribuíram para a renovação do catolicismo.

Nasceu em Paris, em 1534, por iniciativa de Inácio de Loyola. O seu proselitismo contribuiu
para a expansão do catolicismo. A Companhia de Jesus funcionava como uma organização
militar, era dirigida por um general ou geral, que superintendia nas províncias. Submetidos a
uma rigorosa disciplina, os jesuítas eram considerados “Soldados de Cristo”, acrescentando
aos três votos tradicionalmente mencionados (pobreza, castidade, obediência ao superior),
proclamavam, ainda, a obediência incondicional ao Papa.

Senhores de uma grande preparação intelectual, nomeadamente no âmbito da teologia e da


oratória, e vestidos como seculares, os jesuítas viveram no meio da população.

Como missionários, chegaram aos confins da Ásia, América e da África. Como professores, os
jesuítas distinguiram-se pela sua rede de colégios que forneciam um excelente ensino
secundário e uma sólida formação civil, o que permitiu uma ascendência sobre a juventude.
Como pregadores, desenvolveram a arte da oratória nos seus sermões.
O Concílio de Trento e a Companhia de Jesus

Portugal integrou-se completamente no movimento da Contrarreforma e da Reforma católica.


O Concílio de Trento contou com a presença de distintos membros da Igreja portuguesa, os
quais, regressados ao país, se apressaram a cumprir os ditames aprovados. Os bispos passaram
a residir nas dioceses e a supervisionar, em visitas pastorais periódicas, a religiosidade, a moral
e os costumes da população.

O clero português, melhor instruído e disciplinado, soube responder às dúvidas e inquietudes


das populações e aproximá-las de Deus. No reinado de D. João III, chamou a Companhia de
Jesus para Portugal quando o Papa aprovou os seus estatutos. A missionação do Oriente e do
Brasil foi o grande campo de intervenção dos jesuítas no nosso país, ficando célebres os nomes
de Francisco Xavier, Manuel de Nóbrega e António Vieira.

A Inquisição e o Índex

Na segunda metade de Quinhentos, o clima de intolerância religiosa desenvolve-se em


Portugal originando o recuo das ideias humanistas e do espírito de livre crítica. O Tribunal de
Inquisição foi introduzido, em Portugal, em 1536, e instituiu a censura prévia em 1540 e, em
1547, foi publicado o primeiro Índex, estabelecendo a lista dos livros proibidos. Os indexes
portugueses revelaram-se de grande rigor e violência: atingia obras e autores, bem como
impressores, livreiros ou simples possuidores de livros proibidos. Humanistas como Damião de
Góis e os professores do Colégio das Artes foram acusados de simpatia por Erasmo (este,
apesar das críticas à Igreja, tinha permanecido católico).

Para além das acusações de heresia protestante, a bruxaria, a bigamia, a sodomia e a


blasfémia constituíram motivos fortes para se incorrer na ira da Inquisição. O Tribunal da
Inquisição estará em vigor, em Portugal, entre 1536 e 1821, contam-se entre os cristãos-novos
(judeus que se tinham convertido ao cristianismo) foram o alvo preferido da Inquisição. A
Inquisição portuguesa utilizou todos os métodos à sua disposição: tortura para obter
confissões, condenações à morta na fogueira, em auto de fé, etc.

Muitos cristãos-novos abandonaram o país pois receavam ser ultrapassados no acesso às


ordens militares, à docência universitária, aos benefícios eclesiásticos, aos governos
municipais.

Portugal via-se mergulhado na inveja, denúncia e intriga. A Inquisição deixou marcas terríveis
na sociedade portuguesa contribuindo para o atraso do país. Impôs severos padrões morais e
doutrinais, que modelaram as consciências e os comportamentos. Inculcou um angustiante
sentimento de pecado e da culpa. Instalou o medo da punição, terrestre e divina.

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