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POR QUE PITÁGORAS NÃO COMIA FALAFEL:

DEFICIÊNCIA DE GLICOSE-6-FOSFATO DESIDROGENASE


(G6PD)

FRANCINE VIVIANE ALVES RICCI


ENFERMAGEM – 1° SEMESTRE
BAURU/SP- 2022

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.........................................................................................................3
2 DEFICIÊNCIA DE GLICOSE-6-FOSFATO DESIDROGENASE............................4
2.1 DIAGNÓSTICO ....................................................................................................5
2.2 CLASSIFICAÇÃO.................................................................................................6
2.3 SINTOMAS...........................................................................................................7
2.4 TRATAMENTO......................................................................................................8
3 FAVISMO..................................................................................................................8
4 POR QUE PITÁGORAS NÃO COMIA FALAFEL?.................................................10
5 CONCLUSÃO...........................................................................................................10
REFERÊNCIAS...........................................................................................................11

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1 INTRODUÇÃO
A Glicose-6-fosfato desidrogenase (G6PD) é uma enzima citoplasmática
cuja função primordial é assegurar o potencial “redox” da célula. A glicose-6-fosfato
desidrogenase (G6PD) desempenha funções de extrema importância no
metabolismo eritrocitário, atuando tanto na obtenção de energia a partir da glicose,
quanto na sua proteção contra agentes oxidantes. Existe em todas as células do
organismo humano e em todos os organismos da cadeia evolutiva, desde os
protozoários às plantas e animais, o que pressupõe que a sua atividade seja fator
biológico indispensável. A necessidade da atividade de G6PD no glóbulo vermelho
para assegurar níveis suficientes de NADPH e glutatião reduzido fica provada pelo
fato de indivíduos portadores de variantes com atividade reduzida sofrerem
episódios de hemólise intravascular por ação de fatores oxidantes (favas, fármacos
e infecções) ou anemia hemolítica persistente.

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2 DEFICIÊNCIA DE GLICOSE-6-FOSFATO DESIDROGENASE
O déficit de G6PD é um erro inato do metabolismo que predispõe
à degradação dos glóbulos vermelhos, provavelmente a mutação clinica significativa
mais frequente a nível mundial, estimando se que existam mais de 400 milhões de
pessoas afetadas. A prevalência em Portugal é baixa (calculando-se ser de 0,51%).
A descoberta desta mutação ocorreu nos anos 50, quando se estudava o fenômeno
hemolítico decorrente da administração do antimalárico Primaquina. Inicialmente, foi
encontrada em África, mas posteriormente pode ser observada em todo o mundo.
A G6PD é uma enzima citoplasmática, existente em todas as células do
organismo humano. A deficiência de G6PD é uma eritroenzimopatia bastante
comum, sendo um distúrbio de origem hereditária, acometendo principalmente
indivíduos do sexo masculino e negros. A patologia leva a um quadro clínico
bastante heterogêneo, sendo sua principal manifestação a anemia hemolítica
decorrente da hemólise, devido ao consumo de certas substâncias com caráter
oxidante. Após um gatilho específico, podem ocorrer sintomas como pele
amarelada, urina escura, falta de ar e sensação de cansaço. A forma
enzimaticamente ativa da G6PD é um dímero ou um tetrâmero de uma só unidade
polipeptídica. O seu papel fundamental é a geração de NADPH e, embora a G6PD
ocorra em todas as células com atividade semelhante, ela desempenha um papel
fundamental para assegurar a estabilidade e a viabilidade do glóbulo vermelho (GV).
A sua função está relacionada com o glóbulo vermelho (GV), que realiza tarefas
biológicas relativamente simples num ambiente hostil. Foi estimado que, durante o
seu ciclo vital (120+/- 6 dias), cada GV percorre uma distância de cerca de 175
milhas, e é submetido a 1.7x105 ciclos circulatórios. Para lutar contra os perigos
internos (alta carga de oxigênio, produção constante de espécies oxidantes) e
externos (alterações do Ph, turbulência, destruição por outras células), o GV possui
um forte e simplificado metabolismo, adequado para cumprir as tarefas necessárias
e para defender as suas propriedades funcionais de agressores físicos e químicos. A
G6PD controla a oxidação celular.
O gene determinante da G6PD (Gd) está localizado no braço longo do
cromossoma X, e está intimamente ligado aos genes que codificam o Fator VIII, e
aos que codificam o pigmento da retina. A deficiência da enzima pode ocorrer por
deleções ou mutações. A localização do gene Gd tem duas consequências

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importantes, uma vez que as mutações do Gd mostram o comportamento típico da
herança ligada ao sexo e como resultado do fenômeno da inativação do
cromossoma X, as mulheres heterozigóticas, para dois diferentes alelos, exibem
variedade nas células somáticas: se um dos alelos apresenta deficiência enzimática,
existirão células G6PD+, e células G6PD- (as primeiras com atividade enzimática
normal, e as últimas com atividade enzimática deficiente). Os homens podem ser
normais (Gd+) ou hemizigóticos deficientes (Gd-), as mulheres podem ser normais
(Gd+/Gd-), deficientes homozigóticas (Gd-/Gd-) ou deficientes heterozigóticas
(Gd+/Gd-).6,7,8 Muitas variantes alélicas foram já descritas sendo que a sua
manifestação clínica depende da variante em causa. As mais frequentes são as
variantes Mediterrâneas (forma grave), as variantes Africanas A- (forma moderada)
e as variantes Mahidol (forma moderada) e Canton (forma grave) no sudeste
asiático.
As formas raras e mais graves da deficiência da G6PD existem em
associação com anemia hemolítica não esferocítica crônica.

2.1 DIAGNÓSTICO
(ver epidemiologia) O diagnóstico geralmente é suspeitado quando
pacientes de certos grupos étnicos desenvolvem anemia, icterícia e sintomas
de hemólise após desafios de qualquer uma das causas acima, especialmente
quando há uma história familiar positiva.
Geralmente, os testes incluirão:
 Hemograma completo e contagem de reticulócitos; na deficiência ativa de
G6PD, os corpos de Heinz podem ser vistos nas hemácias em um esfregaço
sanguíneo;
 Enzimas hepáticas (para excluir outras causas de icterícia);
 Lactato desidrogenase (elevado na hemólise e um marcador de gravidade
hemolítica)
 Haptoglobina (diminuída na hemólise);
 Um “teste direto de antiglobulina“ (teste de Coombs) - deve ser negativo, pois
a hemólise na G6PD não é imunomediada;

Quando houver motivos suficientes para suspeitar de G6PD, um teste direto


para G6PD é o “teste de mancha fluorescente Beutler“, que substituiu amplamente

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um teste mais antigo (o teste de descoloração com corante Motulsky). Outras
possibilidades são o teste direto de DNA e / ou o sequenciamento do gene G6PD.
O teste de ponto fluorescente Beutler é um teste rápido e barato que
identifica visualmente o NADPH produzido pelo G6PD sob luz ultravioleta. Quando a
mancha de sangue não apresenta fluorescência, o teste é positivo; pode ser
falsamente negativo em pacientes em hemólise ativa. Portanto, só pode ser feito 2–3
semanas após um episódio hemolítico.
Quando um macrófago no baço identifica um RBC com um corpo de Heinz,
ele remove o precipitado e um pequeno pedaço da membrana, levando a " células
de mordida " características . No entanto, se um grande número de corpos de Heinz
for produzido, como no caso da deficiência de G6PD, alguns corpos de Heinz ainda
serão visíveis ao observar hemácias que foram coradas com violeta cristal. Este
teste fácil e barato pode levar a uma presunção inicial de deficiência de G6PD, que
pode ser confirmada com os outros testes.

Testes durante e por muitas semanas após um episódio hemolítico levarão a


resultados falsos negativos, pois os eritrócitos deficientes em G6PD terão sido
excretados e os eritrócitos jovens (reticulócitos) ainda não serão deficientes em
G6PD. Resultados falso-negativos também serão prováveis após quaisquer
transfusões de sangue. Por esse motivo, muitos hospitais esperam 3 meses após
um episódio hemolítico antes de testar a deficiência de G6PD. As mulheres devem
ter sua atividade G6PD medida por ensaio quantitativo para evitar serem
classificadas incorretamente por testes de triagem.

2.2 CLASSIFICAÇÃO
A Organização Mundial de Saúde classificou as diferentes variantes da
G6PD de acordo com a atividade enzimática e a severidade da hemólise. A classe
IV e a classe V não têm significado clínico.
 Variante de Classe I caracteriza-se por uma atividade enzimática
extremamente baixa (inferior a 10% do normal), levando a anemia hemolítica
crônica.
 Variante de Classe II tem uma atividade enzimática baixa, mas apresentam
hemólise intermitente.

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 Variante de Classe III apresenta um déficit moderado da enzima (10 a 60% do
normal), com hemólise associada a infecções ou uso de drogas.
 Variante de Classe IV não apresenta deficiência enzimática e não se associa
a patologia.
 Variante de Classe V tem atividade enzimática aumentada e não se encontra
patologia associada.

O mecanismo de hemólise não é exatamente conhecido e é variável


consoante o estímulo desencadeante. A infecção é o desencadeante mais comum
de hemólise e afeta principalmente indivíduos com deficiência tipo A-. Os agentes
mais frequentemente implicados são os coliformes, salmonelas, estreptococos beta-
hemolíticos, Rickettsias, Vírus Influenza e, de um modo particularmente importante,
as hepatites virais. Pensa-se que os eritrónios deficientes em G6PD sejam menos
resistentes à hipertermia mantida e não suportem o aumento de oxidantes
produzidos pelos granulócitos durante a fagocitose.

2.3 SINTOMAS
A degradação dos glóbulos vermelhos (também conhecida como hemólise)
na deficiência de G6PD pode se manifestar de várias maneiras, incluindo as
seguintes:
 Icterícia neonatal  prolongada, possivelmente levando
ao kernicterus (indiscutivelmente a complicação mais séria da deficiência de
G6PD).
 Crises hemolíticas em resposta a:
o Doença (especialmente infecções)

o Certos medicamentos (veja abaixo)
o Certos alimentos, principalmente as favas, de onde deriva a
palavra favismo
o Certos produtos químicos

o Cetoacidose diabética
 Hemoglobinúria (urina vermelha ou marrom)

 Crises muito graves podem causar insuficiência renal aguda

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2.4 TRATAMENTO
A medida mais importante é a prevenção - evitar os medicamentos e
alimentos que causam hemólise. A vacinação contra alguns patógenos comuns (por
exemplo, hepatite A e hepatite B) pode prevenir ataques induzidos por infecção. Na
fase aguda da hemólise, podem ser necessárias transfusões de sangue ou
mesmo diálise na insuficiência renal aguda. A transfusão de sangue é uma medida
sintomática importante, pois os glóbulos vermelhos transfundidos geralmente não
são deficientes em G6PD e viverá uma vida normal na circulação do receptor. As
pessoas afetadas devem evitar medicamentos como a aspirina. Alguns pacientes
podem se beneficiar com a remoção do baço (esplenectomia), pois este é um
importante local de destruição dos glóbulos vermelhos. O ácido fólico deve ser
usado em qualquer doença com alto índice de renovação dos glóbulos vermelhos.
Embora a vitamina E  e o selênio tenham propriedades antioxidantes, seu uso não
diminui a gravidade da deficiência de G6PD.
.

3 FAVISMO
Favismo é uma resposta hemolítica ao consumo da fava, também conhecida
como favas. Embora todos os indivíduos com favismo apresentem deficiência de
G6PD, nem todos os indivíduos com deficiência de G6PD apresentam favismo. O
favismo afeta, sobretudo, a variante Mediterrânica. A condição é conhecida por ser
mais prevalente em bebês e crianças, e a variante genética G6PD pode influenciar a
sensibilidade química. Os indivíduos mais susceptíveis são os jovens e aqueles que
concomitantemente estão infectados. Fora isso, as especificações da relação
química entre favismo e G6PD não são bem compreendidas. Na hemólise induzida
pela ingestão de favas (favismo), sabe-se que nem todas as variantes são afetadas
pela ingestão de favas e o grau de hemólise é variável de uma exposição para outra.
No favismo, os compostos como a divicina e o isouramil, que estão
presentes nas favas, provocam a oxidação irreversível do glutatião e grupos sulfidrilo
presentes nas proteínas, levando a alterações electrolíticas que conduzem ao
aumento da permeabilidade do eritrócito, e ao estabelecimento de pontes cruzadas
entre a espectrina e a banda 3 presentes na membrana da hemoglobina, conduzindo
à diminuição na deformabilidade eritrocitária. Esta alteração na deformabilidade da

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membrana atua como um sinal para que os eritrócitos alterados sejam removidos na
circulação pelo sistema reticulo endotelial. Além disso, há aumento dos níveis de
cálcio intra-eritrocitário pela degradação da ATPase com atividade de bomba de
cálcio, levando a alterações no metabolismo do cálcio e consequente diminuição de
potássio. Os eritrócitos deficientes em G6PD são também mais susceptíveis a
veiculação induzida pelo cálcio, levando a hemólise mediada pelo complemento.
Classicamente, o episódio hemolítico caracteriza-se por palidez, icterícia e
hemoglobinúria, que surge 24 a 48 horas após a ingestão de favas. O diagnóstico
biológico é feito com base na determinação da atividade da G6PD em eritrócitos
desleucocitados e comparação com a atividade de outra enzima eritrocitária
(piruvato cinase ou hexocinase). Preferencialmente o exame deve ser feito na
ausência de hemólise, para evitar falsos diagnósticos devido a contagens elevadas
de reticulócitos. As deficiências moleculares subjacentes incluem, sobretudo
mutações pontuais na sequência codificante, levando a substituições de
aminoácidos. Não são conhecidas mutações que levem à perda de função do gene.
A análise molecular permite a identificação das mutações causais e a
escolha de uma estratégia terapêutica adequada com base na previsão da
gravidade das manifestações clínicas.

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4 POR QUE PITÁGORAS NÃO COMIA FALAFEL ?
Tanto na lenda quanto na mitologia, o favismo é conhecido desde a
antiguidade. O Falafel é provavelmente o mais conhecido, mas a fava também
costuma ser usada como recheio de almôndegas e outros alimentos. Os sacerdotes
de vários cultos da era greco-romana eram proibidos de comer feijão,
e Pitágoras tinha uma regra estrita de que, para ingressar na sociedade
dos pitagóricos,  era preciso renunciar ao feijão, pois a ingestão de favas é um fator
desencadeante da crise hemolítica.

5 CONCLUSÃO
As pessoas afetadas com deficiência de G6PD devem evitar os gatilhos
dietéticos,  principalmente o feijão-fava. Isso pode ser difícil, pois a fava pode ser
chamada de "favas" e é usado em muitos alimentos, inteiro ou como farinha.  Uma
vez que a deficiência de G6PD não é uma alergia, os regulamentos alimentares na
maioria dos países não exigem que o feijão fava seja destacado como um alérgeno
no rótulo.
A deficiência de G6PD consiste na existência de um baixo nível dos valores
desta enzima. Indivíduos com deficiência de G6PD não parecem adquirir nenhuma
doença com mais frequência do que outras pessoas e podem ter menos risco do
que outras pessoas de adquirir doença isquêmica do coração e doença
cerebrovascular.
A maioria das pessoas que têm deficiência de G6PD é assintomática, não
apresentando anemia nem hemólise. O desenvolvimento de ambas resulta de
agentes exógenos. É particularmente importante nos hemizigóticos e nas mulheres
homozigóticas, podendo desencadear crises hemolíticas graves. Na maioria dos
casos, o primeiro episódio de hemólise ocorre na infância, mas este pode ocorrer no
estado adulto. O diagnóstico, dado por uma história clínica bem realizada evita
episódios transfusionais.

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BIBLIOGRAFIA

LUZZATTO L. Deficiência de glicose 6-fosfato desidrogenase: do genótipo ao


fenótipo. Haematologica. 91 (10): 1303-6. 2006.

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CASTRO, S.M. Aspectos laboratoriais do diagnóstico da deficiência de Glicose


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