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Formação inicial e continuada de educadores do campo vivências, práticas e


desafios

Book · November 2020

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Natália Lampert Batista


Universidade Federal de Santa Maria
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Formação inicial e continuada
de educadores do campo
vivências, práticas e desafios

Cesar De David
Natália Lampert Batista
Ana Carla Lenz
(Organizadores)
Formação inicial e continuada
de educadores do campo
vivências, práticas e desafios
Conselho Editorial Técnico-Científico Mares Editores e Selos Editoriais:

Renato Martins e Silva (Editor-chefe)


http://lattes.cnpq.br/4416501555745392

Lia Beatriz Teixeira Torraca (Editora Adjunta)


http://lattes.cnpq.br/3485252759389457

Ilma Maria Fernandes Soares (Editora Adjunta)


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Célia Souza da Costa


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Chimica Francisco
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Diego do Nascimento Rodrigues Flores


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Dileane Fagundes de Oliveira


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Erika Viviane Costa Vieira


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Joana Ribeiro dos Santos


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José Candido de Oliveira Martins


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Liliam Teresa Martins Freitas


http://lattes.cnpq.br/3656299812120776

Marcia Tereza Fonseca Almeida


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Ricardo Luiz de Bittencourt


http://lattes.cnpq.br/2014915666381882

Vitor Cei
http://lattes.cnpq.br/3944677310190316
Formação inicial e continuada
de educadores do campo
vivências, práticas e desafios

1ª Edição

Cesar De David
Natália Lampert Batista
Ana Carla Lenz
(Organizadores)

Rio de Janeiro
Dictio Brasil
2020
Copyright © da editora, 2020.

Capa e Editoração
Mares Editores

Todos os artigos publicados neste livro sob a forma de capítulo de coletânea


foram avaliados e aprovados para sua publicação por membros de nosso
Conselho Editorial e/ou colaboradores pós-graduados da Mares Editores,
assim como pelos organizadores da obra.

Dados Internacionais de Catalogação (CIP)

Formação inicial e continuada de educadores do campo:


vivências, práticas e desafios / Cesar De David; Natália
Lampert Batista; Ana Carla Lenz (Organizadores). – Rio
de Janeiro: Dictio Brasil, 2020.
293 p.
ISBN 978-65-86953-10-7
doi.org/10.35417/978-65-86953-10-7

1. Formação de professores. 2. Educação do Campo.


3. Ensino I. Título.

CDD 370.71
CDU 37/49

Os textos são de inteira responsabilidade de seus autores e não representam


necessariamente a opinião da editora.

2020
Todos os direitos desta edição reservados à
Mares Editores e seus selos editoriais
Dictio Brasil é um selo editorial de Mares Editores
CNPJ 24.101.728/0001-78
Contato: mareseditores@gmail.com
Sumário

Apresentação ................................................................................ 9

Programa de formação continuada de professores de Silveira


Martins/RS: relatando vivências ................................................. 17

Análise dos elementos teórico-práticos discutidos na formação de


professores na Educação do campo na E. M. E. F. José Paim de
Oliveira, Santa Maria/RS ............................................................. 47

PROMSAC (Programa Municipal Mosaico de Saberes do Campo) -


Santa Maria, RS: afirmando identidades locais .......................... 72

Formação inicial de educadores do campo: contribuições do PIBID


Diversidade .................................................................................. 97

A escola vai ao campo: o ensino de Geografia em tempos de


pandemia................................................................................... 115

A saúde na educação indígena: o caso da Escola Karay Tataendy


Verá Claudio Acosta de Estrela Velha/RS .................................. 145

Educação do campo e educação ambiental: processos identitários


em afirmação ............................................................................ 161

Experiências da agricultura familiar: Assentamento Capela em


Nova Santa Rita/RS .................................................................... 190
Passando adiante as heranças: experiências na horticultura
urbana no município de Santa Maria/RS .................................. 221

Cosmografia geográfica: o estudo dos eclipses e o caso do


meteoro em Bossoroca/RS ....................................................... 243

Análise dos livros didáticos de Geografia utilizados na escola do


campo do distrito de Santa Flora Município de Santa Maria/RS
................................................................................................... 266

Sobre os autores ....................................................................... 287


Apresentação

A obra Formação inicial e continuada de educadores do


campo: vivências, práticas e desafios apresenta relevantes debates
acerca da Educação do campo no Brasil. Organizada por Cesar De
David, Natália Lampert Batista e Ana Carla Lenz, reúne pesquisas,
relatos de práticas e reflexões epistemológicas inerentes a temática
central do livro. A seguir descreve-se cada uma das obras que
compõem essa coletânea.
O primeiro capítulo Programa de formação continuada de
professores de Silveira Martins/RS: relatando vivências, escrito por
Cesar De David, Ana Carla Lenz e Natália Lampert Batista tem como
objetivo relatar atividades desenvolvidas ao longo do projeto
Programa de Formação Continuada de Professores de Silveira
Martins/RS, desenvolvido em 2019, com professores e estudantes das
redes municipal e estadual do referido município. O texto relata
algumas atividades desenvolvidas ao longo do Programa e é finalizado
com uma reflexão acerca da importância desse projeto para a
comunidade escolar de Silveira Martins e o papel da Universidade na
promoção da extensão.
Jaqueline da Costa Braz, Eliane Aparecida Galvão dos Santos e
Janaína Pereira Pretto Carlesso, também abordam a formação
continuada docente no segundo capítulo, intitulado Análise dos
elementos teórico-práticos discutidos na formação de professores na

-9-
Educação do campo na Escola Municipal Ensino Fundamental José
Paim de Oliveira, Santa Maria/RS. As autoras tiveram como objetivo
analisar as contribuições da formação continuada para os docentes
participantes dessa pesquisa a partir das rodas de conversas reflexivas
mediadas por professores formadores. resultados do estudo apontam
que há necessidade de qualificar o ensino com momentos de estudo e
reflexões sobre os temas abordados, as contribuições da formação
continuada colocam em evidência que a formação continuada propicia
a ressignificação de trajetórias docentes, pois envolve movimento,
inovação, ação e aspectos relevantes na prática pedagógica a partir de
vivências colaborativas e interdisciplinares favorecendo o pensamento
reflexivo e assim a efetivação da interação entre currículo e contexto
na educação do Campo.
Já Ail Conceição Meireles Ortiz, Cláudia Bassoaldo e Maria
Goretti R. Farias, no texto do terceiro capítulo, PROMSAC (Programa
Municipal Mosaico de Saberes do Campo) - Santa Maria, RS:
afirmando identidades locais, apresentam fundamentos conceituais e
práticos do Programa Municipal Mosaico de Saberes do Campo,
desenvolvido pela SMED no município de Santa Maria, RS. Segunda as
professoras e pesquisadoras, o campo hoje, assume um novo papel no
espaço geográfico definindo novas funções para atender a demanda
da sociedade. A escola do campo se ocupa com a construção de
conhecimentos, mas acima de tudo, pela busca de laços identitários
ao contexto do campo. Em 2017 emerge o PROMSAC, envolvendo dois

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grandes eixos: uma formação continuada para docentes, que atuam
nas escolas do campo e o turismo rural pedagógico, voltado para todos
os alunos da rede municipal de ensino, tanto da zona urbana, quanto
rural. Concluíram que o PROMSAC compreende uma proposta
inovadora, que procura contribuir com a formação dos sujeitos
envolvidos com a educação do campo.
Em formação inicial de educadores do campo: Contribuições
do PIBID Diversidade, Everton de Souza destaca, no quarto capítulo,
que no Brasil, a profissão docente nunca teve o devido prestígio que
merece, atualmente a profissão é pouco atrativa devido a sua
desvalorização perante a sociedade. Os inúmeros desafios
historicamente encontrados na formação de professores têm se
agravado com o aumento significativo dos cursos de licenciatura a
distância, os quais estão deixando excessivas lacunas nas formações
dos licenciandos. Quanto à formação de educadores do campo,
importantes conquistas foram alcançadas nas últimas décadas, como,
por exemplo, o projeto PIBID Diversidade que tem contribuído
significativamente a uma formação docente mais contextualizada às
realidades rurais. O texto proposto pelo autor discute como o projeto
tem contribuído não somente aos pibidianos, mas também aos
professores supervisores, às escolas e à comunidade local em que se
desenvolvem as atividades.
Letícia Ramires Corrêa e Rafael Lesses da Silva apresentam no
quinto capítulo, A escola vai ao campo: o ensino de Geografia em

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tempos de pandemia, uma temática urgente e atual. Segundo os
autores, o texto tem como objetivo discutir o ensino de Geografia em
tempos de pandemia, a partir de vivencias, práticas e desafios na
escola do campo. Diante do isolamento social foram realizados muitos
apontamentos sobre os problemas do ensino à distância.
Considerando que a educação do campo foi negligenciada por anos, a
pandemia apenas mostrou a verdadeira situação em que se
encontram as escolas. Os professores e pesquisadores concluíram que
mais importante que aprontar os problemas da educação do campo é
da responsabilidade dos Poder Público, corpo docente, alunos,
responsáveis e comunidade escolar, uma mudança de
comportamento no que se refere ao âmbito educacional, objetivando
de tal modo a articulação de estratégias que possam auxiliar na
construção de uma Política educacional que respeites as demandas do
campo.
O sexto capítulo, de autoria de Evandro Dalcin De Franceschi e
Ana Carla Lenz, intitulado A saúde na educação indígena: o caso da
Escola Karay Tataendy Verá Claudio Acosta de Estrela Velha/RS
destaca algumas das dinâmicas educacionais voltadas para a saúde
indígena da aldeia Guarani Ka Aguy Poty ou Flor da Mata localizada no
município de Estrela Velha - RS. Os autores fizeram o uso da
abordagem qualitativa, mas também, buscou-se subsídios na pesquisa
bibliográfica e entrevistas através do aplicativo de troca de mensagens
e comunicação em áudio e vídeo pela internet - Whatsapp para o

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levantamento de informações e dados. Na atualidade vivem na aldeia
em torno de trinta indígenas que são atendidos por uma agente de
saúde, a qual fez e faz uso da Escola Estadual de Ensino Fundamental
Karay Tataendy Verá Claudio Acosta como elo de comunicação para
dialogar com a comunidade.
Ail Conceição Meireles Ortiz e Silvana Zancan no texto
Educação do campo e educação ambiental: processos identitários em
afirmação, que compõem o sétimo capítulo, objetivam estabelecer
aproximações e contrapontos em torno de concepções e ações da
educação do campo e da educação ambiental. O estudo mais
específico da Educação Ambiental, no campo, evidencia o modo
singular da realidade do homem do campo, suas relações com as
condições de sua existência, definindo assim, seu modo de pensar,
suas concepções de mundo e de educação. Formar uma consciência
ambiental em espaços educativos no campo significa pressupor o
respeito aos processos culturais locais. A escola no campo possui,
ainda, na figura docente, sua mais forte referência. O educador do
campo, segundo as autoras, representa a força dinamizadora das
relações socioculturais, contribuindo assim, para o encaminhamento
de soluções às questões socioambientais para se aproximar da
qualidade social também no campo.
Experiências da agricultura familiar: Assentamento Capela
em Nova Santa Rita/RS, escrito por Altair Groff e Janete Webler
Cancelier, compõem o oitavo capítulo. Segundo os autores, a partir

- 13 -
deste trabalho, buscam-se estabelecer discussões acerca da
importância da agricultura familiar e da permanência dos jovens no
campo. Para isso, utiliza-se como área empírica de pesquisa o
Assentamento da Reforma Agrária Capela, localizado no município de
Nova Santa Rita/RS. Nesse assentamento, destaca-se a Cooperativa
Agropecuária de Nova Santa Rita (COOPAN), a qual possui relevante
papel para a permanência dos jovens no campo. Os referenciais
teóricos utilizados na investigação que resultaram neste artigo buscam
elementos que propiciem a compreensão do fenômeno analisado. A
coleta de dados primários, realizada por meio de trabalhos de campo,
e o cruzamento dos dados teóricos com os empíricos permitiram a
análise apresentada.
Também tratando a agricultura, Ana Carla Lenz e Daiane Loreto
Vargas apresentam o nono capítulo, intitulado Passando adiante as
heranças: experiências na horticultura urbana no município de Santa
Maria/RS. capítulo apresenta a relação de um sujeito com a terra e
com a educação, sua formação indentitária e as experiências felizes
que teve na infância no ambiente escolar por meio de práticas de
ensino voltadas para a produção agrícola orgânica. Para levantar o
acervo de informações se fez uso da abordagem qualitativa, da
pesquisa bibliográfica e de entrevistas abertas, nesse momento o
participante passou as informações por meio das redes sociais,
WhatsApp e Facebook. A importância do texto está em divulgar como
práticas de ensino impregnadas de educação transformam vidas

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humanas e são passadas adiantes pelas mãos daqueles que
aprenderam com elas.
Airton Rosa Lucion Guites escreve o décimo capítulo intitulado
Cosmografia geográfica: o estudo dos eclipses e o caso do meteoro
em Bossoroca/RS. O artigo é um relato de experiência sobre um
trabalho de cosmografia geográfica desenvolvido nas turmas de 6º ano
de uma escola em Bossoroca/RS, sobre os eclipses solar e lunar, bem
como a análise de notícias sobre a ocorrência de um meteoro em 2019.
Investigou-se a interface da Astronomia com a Geografia, percebendo
a grande interação entre elas e também a formação acadêmica
precária dos professores com relação a esse tema. Os alunos
confeccionaram uma maquete, que serviu para complementar os
estudos a fim de esclarecer dúvidas e misticismos sobre a ocorrência
destes fenômenos naturais. Usando as teorias de Bruner e Ausubel, foi
possível atingir os objetivos e obter resultados satisfatórios, com uma
ideia inovadora de recurso didáticos e incentivando a participação e
cooperação entre as turmas.
Por fim, no décimo primeiro capítulo, Análise dos livros
didáticos de Geografia utilizados na escola do campo do distrito de
Santa Flora Município de Santa Maria/RS, Zuleika Maria da Silva Ries
traz uma análise de dois livros didáticos 4º ano do Ensino Fundamental
(Anos Iniciais) oriundos do Plano Nacional do Livro Didático (PNLD
campo), para alunos da Escola Municipal de Ensino Fundamental Santa
Flora, localizada no nono distrito (Santa Flora) do município de Santa

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Maria - RS. A análise é importante porque, na atualidade, é impossível
imaginar uma sala de aula na escola sem a presença do um livro
didático. Mesmo com a inserção das Tecnologias de Informação e
Comunicação (TIC) na Educação Básica, as quais não estão presentes
na realidade dessa escola do campo. O Livro Didático é o único
material didático disponível para o professor, ainda, apesar de ser um
dos recursos educacionais que nos últimos anos foi muito criticado.
Todos os capítulos contribuem com a interface vivências,
práticas e desafios para a Educação no/do campo que centraliza a
discussão e permitem um olhar contextualizado e diverso sobre a
temática. Assim, deseja-se que essa produção coletiva contribua
significativamente para a promoção da Educação do Campo e para
fomentar o debate dos inúmeros temas explorados em cada um dos
capítulos. Ressaltamos que a organização deste e-book foi realizada
com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (CAPES), com financiamento de Bolsa do Programa Nacional
de Pós-doutorado (PNPD), concedida à segunda organizadora.

Desejamos a todos uma excelente leitura!

Os organizadores

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Programa de formação continuada de professores de
Silveira Martins/RS: relatando vivências

Cesar De David1
Ana Carla Lenz2
Natália Lampert Batista3

Introdução
A formação de professores perpassa pela articulação entre os
conhecimentos específicos da área de atuação, dos conhecimentos
pedagógicos e teorias da aprendizagem e sobre o contexto de atuação,
isto é, a realidade da profissão professor na contemporaneidade. Por
isso, a formação docente deve preparar esse profissional para uma
atuação pautada na articulação entre as teorias e a práticas
pedagógicas, ou seja, uma atuação pautada na práxis educacional. “O
caminho de uma ação docente que contemple a indissociabilidade
entre teoria e prática requer, portanto, uma reforma no modo de
conceber, organizar e processar o pensamento e o conhecimento”
(MARTINAZZO; BERSCH, 2016, p. 175), isto é, requer um olhar

1
Doutor em Geografia, UFSC. Docente do Departamento de Geografia, UFSM e do
Programa de Pós-graduação em Geografia, PPGGEO/UFSM. E-mail:
cdedavid2009@gmail.com.
2
Doutoranda em Geografia, UFSM. E-mail: anacarlalenz@gmail.com.
3
Doutora em Geografia, UFSM. Realizando estágio pós-doutoral em Geografia –
PPGGEO/UFSM. E-mail: natilbatista3@gmail.com.

- 17 -
integrado e complexo sobre a realidade educacional, pautado na
realidade do lugar e sua relação com o mundo.
O Programa de Formação Continuada de Professores de
Silveira Martins/RS foi desenvolvido no município ao longo do ano de
2019 com esse intuito: pensar a formação continuada docente com
foco no lugar e nas necessidades das escolas envolvidas. Foi
promovido pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e pela
Secretaria de Municipal Educação de Silveira Martins/RS, abrangendo
as duas escolas do local: a Escola Municipal de Ensino Fundamental
João Frederico Savegnago e a Escola Estadual de Educação Básica Bom
Conselho. A equipe de coordenação do Programa foi composta pelos
Professores Cesar De David e André Luis Ramos Soares, representando
a UFSM, pela Professora Silvia Fioreze, secretária municipal de
educação de Silveira Martins e pelos Professores Débora Lerina e
Alexandre B. Rodrigues, respectivamente, diretores das escolas
mencionadas.
As ações de extensão e ensino do Programa somaram
iniciativas no sentido da formação contínua e permanente dos
educadores, na perspectiva da troca de saberes e experiências entre
os sujeitos envolvidos, compromisso fundamental da universidade
pública, conforme estabelece o Plano de Desenvolvimento
Institucional (PDI) da UFSM. Integraram-se nesses esforços os gestores
municipais, dos respectivos sistemas de ensino, em nível municipal e
estadual. O Programa atendeu uma demanda das Instituições

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envolvidas e, sobretudo, dos educadores e educadoras que já
partilham ações em conjunto desde 2018. Essa proposta aglutinou
práticas e esforços que já se encontravam em andamento, integrando-
as e articulando-as, a fim de ampliar seus escopos de ação, maximizar
os esforços e potencializar as equipes de trabalho.
Consolidou práticas pautadas na dialogicidade entre os sujeitos
envolvidos e suas comunidades, quais sejam: profissionais da
educação dos diferentes sistemas de ensino (universidade, escola
estadual e escola municipal), estudantes (acadêmicos das licenciaturas
e alunos da educação básica) e pessoas do campo e da cidade, na
reflexão-ação como possibilidade de formação contínua e
permanente, problematizando o contexto e a conjuntura escolar e o
processo ensino-aprendizagem, desenvolvendo uma postura crítica
frente ao conhecimento, à docência e ao próprio mundo.
Reconheceu e valorizou o diálogo e a comunicação entre
educadores e educandos com as comunidades rurais e urbanas como
possibilidade de formação individual e coletiva, e, sobretudo, como
condição necessária para a promoção do desenvolvimento local e para
a construção das identidades territoriais. Com essas concepções,
associou-se ensino, pesquisa e extensão, constituindo espaços-
tempos fecundo para novas aprendizagens, conhecimentos e saberes.
A dialogicidade e a reflexão-ação que constituem esse programa de
formação continuada se efetivaram por meio de diferentes ações
organizadas em propostas, elencadas a seguir, todas de caráter

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multidisciplinar, possibilitando o trabalho com conteúdos, técnicas,
metodologias, habilidades e competências do conjunto dos
componentes curriculares.
O presente capítulo tem como objetivo relatar algumas de tais
atividades desenvolvidas ao longo do Programa de Formação
Continuada de Professores de Silveira Martins/RS, desenvolvidas em
2019, com professores e estudantes das redes municipal e estadual. O
texto é finalizado com uma reflexão acerca da importância deste
projeto para a comunidade de Silveira Martins e para a UFSM.
Os projetos tiveram suas bases metodológicas articuladas
entre universidade, escolas e comunidades e envolveram: processos
de sensibilização, planejamento coletivo das atividades, execução das
atividades práticas, atividades pedagógicas integradas nas escolas
envolvendo as comunidades escolares, a partir dos recursos criados,
editados e produzidos a partir das práticas e ações realizadas,
sistematização dos conhecimentos e saberes produzidos e partilhados,
popularização da ciência, a universalização da educação e a
socialização e publicação das descobertas e, também, avaliação final e
definição de ações futuras, para a continuidade do projeto em outras
edições.

Metodologia do programa
O projeto proposto compreendeu ações de ensino, pesquisa e
extensão, todas de caráter multidisciplinar, constituindo uma

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contribuição substancial na articulação reflexão/ação acerca do
sentido e do significado implícitos na formação continuada do
professor. O debate no ambiente escolar e universitário contribui para
o processo dialético da construção do conhecimento e, sobretudo, da
educação em constante diálogo, na troca de saberes e no conhecer a
realidade do outro e do mundo.
O projeto articulou-se com o projeto pedagógico da UFSM, que
pretende: formar professores em nível superior para a docência na
educação básica; aprofundar o conhecimento sobre a complexidade
da educação no contexto sociocultural; desenvolver conhecimentos
teóricos e práticos sobre o processo educacional de modo abrangente
e flexível, possibilitando que a formação esteja em interface com as
transformações dos contextos sociais e educacionais; formar um
profissional capaz de agir nas mais diferentes modalidades de ensino
na busca de soluções dos problemas complexos da realidade
educacional de forma preventiva, favorecendo a reflexão acerca dos
valores éticos que devem permear o pensar e o agir profissional. Por
meio de práticas de pesquisa, ensino e extensão integradas aos
conteúdos formais das licenciaturas, aos estudos interdisciplinares e
aos temas transversais, possibilita-se uma formação integral e
referenciada socialmente, superando a fragmentação do
conhecimento científico e a dissociação teoria-prática, comum nos
currículos acadêmicos.

- 21 -
A formação pedagógica conectada ao mundo da vida e do
trabalho, alcançada por meio do aprender – do pensar, do fazer e do
agir – constitui um meio de superar obstáculos, vencer limites e
atender necessidades específicas do processo ensino-aprendizagem,
como forma de conter o atraso dos percursos formativos e a evasão
escolar (comum nos cursos de licenciatura). Concebeu-se, neste
projeto, que a interdisciplinaridade pressupõe um abrir-se para outras
aprendizagens, conhecimentos que vão além do científico e do
acadêmico, reconhecendo na alteridade saberes, experiências e
vivências que precisam ser partilhadas e aprendidas. Romper barreiras
disciplinares e colher contribuições de outras ciências, assim como
reconhecer os saberes tradicionais e populares são imprescindíveis
para a formação de educadores criativos, responsáveis, reflexivos e
comprometidos social e politicamente.

Sobre as atividades desenvolvidas no programa


Neste eixo foram relatadas algumas atividades desenvolvidas
ao longo do ano de 2019 no Programa de Formação Continuada de
Professores de Silveira Martins/RS. Para isso, subdividiu-se o texto em
quatro segmentos que detalham cada proposta de formação: (a) Horta
Escolar Comunitária; (b) As festas comunitárias e espaço de
socialização; (c) Paisagens da colônia: arquivos no tempo e do lugar; e
(d) Projeto Georreferenciamento.

- 22 -
(a) Horta Escolar Comunitária
O projeto visou à implantação e a manutenção de uma horta
comunitária para a produção de hortaliças, verduras, legumes e ervas
medicinais, assentada no trabalho coletivo de estudantes, educadores
e comunidade em geral. Várias atividades foram desenvolvidas ao
longo do ano, com parcerias com a EMATER/Silveira Martins, via
colaboração com Katiule Morais e Aline Berlese que ministraram uma
palestra sobre o manejo ecológico do solo com plantas de cobertura e
práticas de conservação do solo e da água antes de iniciar o processo
de construção das hortas, bem como contou significativamente com
auxílio da Pós-doutoranda em Geografia/UFSM Janete Webler
Cancelier e dos Graduandos em Geografia/UFSM Alexia Telles e
Maurício Severo, assim como das Professoras Mariângela Branco e
Rosane Bianchin.
Para conhecerem uma experiência concreta, a partir do
discutido no encontro com a EMATER, os professores e os alunos
participantes do projeto realizaram uma visita técnica ao Colégio
Politécnico da UFSM. O itinerário percorrido envolveu as estufas
hidropônicas de plantas medicinais, os canteiros, a floricultura e o
setor da cunicultura. A Figura 1 demonstra a interação dos alunos com
as plantas, os técnicos e os professores do Colégio. As indagações
sobre o manejo das estufas foram respondidas e as práticas de
trabalho demonstradas, para posteriormente, serem aplicados no
espaço destinado a construção da horta escolar comunitária de
Silveira Martins.
- 23 -
Figura 1: Visita à estufa de hidropônica do Colégio Politécnico da UFSM.

Fonte: Programa de Formação Continuada de Professores de Silveira


Martins/RS, 2019.

Com o conhecimento vivenciado se deu início ao processo de


construção da Horta Comunitária em um espaço cedido pela UFSM,
Campus de Silveira Martins. Alunos e professores removeram os
entulhos, reviraram a terra, estruturaram os canteiros e realizaram os
primeiros plantios de hortaliças. Todo esse movimento coletivo se dá
em virtude de que a Geografia estudada deve permitir que o aluno se
perceba como participante do espaço, como alguém capaz de intervir
nesse espaço, como quem estuda os fenômenos que são resultados da
vida e do trabalho na coletividade (CALLAI, 2013).
As dinâmicas que circunvizinham nos lugares de moradia no
município, anteriormente a modernização do campo, eram pautadas
na da policultura: as famílias cultivavam pomares, pequenas lavouras
de milho, mandioca, batatinha; possuíam uma diversificação de
criações, como galinhas, porcos, gado leiteiro dentre outros e suas

- 24 -
hortas, que aos poucos estão deixando a paisagem silveirense. Elas,
juntamente com o jardim, eram o orgulho de muitas famílias que as
exaltavam mostrando sua produção e hoje passam a perder espaço na
paisagem do lugar (LENZ, 2020). O projeto veio de encontro a esse
processo de extinção, pois motivou o interesse dos alunos e
professores pela prática de cultivar sua própria horta. A Figura 2
demostra o início da construção da Horta Comunitária na UFSM,
Campus de Silveira Martins.

Figura 2: Primeira atividade no terreno da UFSM, Campus de Silveira Martins.

Fonte: Programa de Formação Continuada de Professores de Silveira


Martins/RS, 2019.

Alunos e professores trabalharam intensamente. Construíram


canteiros em formas geométricas, fizeram valas para escoar a água da
chuva, organizaram a mandala de chás com mudas doadas pela
Congregação das Irmãs do Imaculado Coração de Maria, de Silveira
Martins, que além de doarem algumas espécies, explicaram a função,
os benefícios e os malefícios de cada uma.

- 25 -
As atividades de pesquisa, ensino e extensão desenvolvidas
pelos próprios alunos permitiram a fixação da aprendizagem de um
modo descontraído, além de ilustrar as noções abstratas da vida
cotidiana. Com o trabalho em equipe realizado entre professores,
alunos, comunidade e órgãos públicos como a UFSM, Campus Silveira
Martins, a Secretária de Educação do Município e a EMATER, a horta
escolar comunitária foi construída (Figura 3) produzindo muitas
verduras e legumes durante o ano de 2019.

Figura 3: Horta escolar comunitária em dezembro de 2019.

Fonte: Programa de Formação Continuada de Professores de Silveira


Martins/RS, 2019.

O trabalho não acabou por aí, a professora Mariângela Branco


juntamente com os seus alunos realizaram a (re)construção da horta
da avó de um dos aluno da turma do 6º ano. O terreno fica na
comunidade da Vila Cattani, em frente à Escola João Frederico
Savegnago. As atividades perpassam os processos de preparação e
recuperação dos canteiros já existentes, diálogo sobre a manutenção

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e importância da “palha” (cobertura de matéria orgânica) e plantio de
verduras, temperos e legumes.
Além disso, foi desenvolvida uma oficina sobre Reutilização de
materiais recicláveis e hidroponia: uma alternativa para o cultivo de
hortaliças, ministrada por José Nilton de Mello Facco, acadêmico de
Agronomia (UNICRUZ), e por Fernanda Lampert Batista Facco,
Mestranda em Geografia (UFSM). Na sequência os alunos e
professores colocaram em prática o diálogo sobre a sustentabilidade
no uso da água e produziram vasos auto irrigáveis com material
reciclável como mostra a Figura 4.

Figura 4: Oficina Reutilização de materiais recicláveis e hidroponia: uma


alternativa para o cultivo de hortaliças.

Fonte: Programa de Formação Continuada de Professores de Silveira


Martins/RS, 2019.

As atividades envolvendo a horta escolar comunitária foram


essenciais para motivar os estudantes a valorizaram à produção
comunitária, orgânica e local, bem como para o trabalho coletivo e

- 27 -
colaborativo frente desenvolvido, especialmente, nas aulas de
Matemática, Ciências e Geografia.

b) As festas comunitárias e espaço de socialização


De acordo com Lenz (2020), Silveira Martins é um município
que se caracteriza pela existência de um intenso calendário de festas
comunitárias, sobretudo no interior. São festas religiosas e profanas
marcadas pela gastronomia e pelos festejos populares, muitos dos
quais relacionados à vida camponesa. Configuram tempos de
confraternização em que se encontram moradores atuais e antigos e
visitantes em geral. Os eventos contribuem para o desenvolvimento
das localidades, com a promoção do turismo, integração das
comunidades e com as conexões rurais-urbanas. Por esse motivo o
projeto realizou visitas em dois lugares de festas. São eles: Val Feltrina
e Linha Seis Norte, visando favorecer e desenvolver nos professores e
alunos o sentimento de pertencimento a esses espaços, assim como a
cultura local. O Mapa da Figura 5 apresenta os principais pontos de
festas do município.

- 28 -
Figura 5: Mapa das festas de Silveira Martis/RS.

Elaboração: Ana Carla Lenz, 2019.

Para o desenvolvimento das atividades, inicialmente, foi


realizada uma oficina sobre o instrumento de recolhimento de
informações e dados, denominado diário de campo. Após, os alunos,
confeccionaram cada um o seu diário, onde registraram tudo o que
julgaram interessante nas visitas à Val Feltrina e Linha Seis Norte, em
formato de desenho e texto, desde o deslocamento até às visitas aos
moradores (Figura 6).

Figura 6: Representação da moradora de Val Feltrina que recebeu o grupo

Fonte: Programa de Formação Continuada de Professores de Silveira


Martins/RS, 2019.

- 29 -
A primeira parada foi na Linha Seis Norte. Alunos e professores
conversaram com o senhor Adelino Felin (92 anos), morador da
comunidade. Ele relatou que a Festa para São Valentim, no início era
realizada na circunvizinhança da capela e o churrasco era assado em
fogo de chão com espetos de madeira. Falou das dificuldades
enfrentadas pela comunidade para construir a capela e mantê-la,
assim como das brincadeiras de quando era criança e jovem. Jogavam,
especialmente, Bocha: “O jogo era no potreiro com pedras retiradas
do riacho Guarda Mor”, afirmou.
Posteriormente, o grupo se dirigiu à capela da comunidade e
ao capitel de Santa Ana para visualizar os relatos do senhor Adelino
(Figura 7). Um dos mais impactantes, para os alunos, foi sobre o
processo em torno do nascimento das crianças que, segundo ele, iam
a cavalo buscar a parteira, em dia de sol e de chuva, a qual só depois
de rezar um terço inteiro, em frente ao capitel de Santa Ana, dirigia-se
ao local do parto. Também relatou um evento que muita lama desceu
do morro e destruiu a capela de madeira, mas que o altar ficou em pé
com o Santo Padroeiro.

- 30 -
Figura 7: Descobrindo a Capela da Linha Seis Norte

Fonte: Programa de Formação Continuada de Professores de Silveira


Martins/RS, 2019.

A segunda saída de campo foi na comunidade de Val Feltrina.


Alunos e professores dialogaram com a Dona Mariazinha sobre a
escolha do Santo Padroeiro da comunidade, São Vítor e Santa Corona.
Posteriormente, o grupo se dirigiu até a capela de Val Feltrina (Figura
8). Segundo os relatos dela, a capela foi construída com o barro da
estrada. Os moradores da época, após as chuvas, amoleciam o barro
passando várias vezes com carros de boi, depois de mole moldavam os
tijolos para erguer a paredes. Outro encontro foi com o senhor
Vicentini, que mora ao lado da capela, que relatou todo o processo de
produção do vinho e apresentou as pipas.

- 31 -
Figura 8: Capela de Val Feltrina

Fonte: Programa de Formação Continuada de Professores de Silveira


Martins/RS, 2019.

O grupo também visitou a capela da Linha Duas, que tem como


padroeira a Santa Inês (Figura 9). Depois, foram até a Igreja Matriz
Santo Antônio de Pádua no centro do município, para conhecer um
pouco mais sobre a historicidade de Silveira Martins e sua ligação com
o catolicismo, além de conhecer a capelinha de Nossa Senhora de
Schoenstatt.

Figura 9: Capela Linha Duas - Santa Inês

Fonte: Programa de Formação Continuada de Professores de Silveira


Martins/RS, 2019.

- 32 -
Conhecer sobre as festas e sobre a cultura local, estimula o
sentimento de pertencimento entre os alunos, levando-os a
valorizarem o espaço local e a gostarem do seu espaço de vivência.
Isso colabora com o entendimento de que o estudante e o docente são
capazes de pensar o seu próprio espaço, assim como intervir nele
conscientemente.

(c) Paisagens da colônia: arquivos no tempo e do lugar


A paisagem de Silveira Martins é constituída de uma grande
diversidade étnica, social e cultural responsável por um mosaico
multifacetado de atividades, relações, hábitos, tradições e concepções
que produzem lugares complexos, dinâmicos e ricos (LENZ, 2020). Por
meio da escola e de seus educadores e educandos desenvolve
atividades que reconheçam o maior patrimônio das comunidades – as
pessoas idosas, suas histórias de vida, suas experiências em outros
tempos e, talvez, outros lugares, seus saberes e fazeres, seus
testemunhos de outras épocas, suas histórias de vida e seus modos de
viver contribuem para que os participantes desenvolvam a um
sentimento de pertencimento a historicidade do município. Nesse
contexto, o projeto conversou com alguns silveirenses para
salvaguardar o conhecimento dos mesmos, um deles foi o senhor
Adelino Felin (91 anos), da linha Seis Norte (Figura 10).

- 33 -
Figura 10: Visita a Adelino Felin, Linha Seis Norte de Silveira Martins/RS

Fonte: Programa de Formação Continuada de Professores de Silveira


Martins/RS, 2019.

No encontro o senhor Adelino relatou algumas das suas


vivências. Destacou que para namorar com sua futura esposa
levantava antes do cantar do galo, encilhava o seu cavalo e andava
longas léguas para embarcar no trem. Acrescenta que a interação
entre os jovens tinha o auxílio do Padre, ele quem organizava tudo,
como a declamação versos um para o outro, além do bingo que servia
de instrumento para passar recados os enamorados. Outra
entrevistada, mas de uma forma mais informa foi a Dona Virgínia
Weber (90 anos - falecida/2019), da Linha Base (Figura 11).

- 34 -
Figura 11: Visita a Virginia Weber, Linha Base de Silveira Martins/RS.

Fonte: Programa de Formação Continuada de Professores de Silveira


Martins/RS, 2019.

Uma fervorosa defensora da policultura (afirmava que o


agricultor deve ter em sua propriedade vaca, porco, galinha, horta,
pomar, lavouras dentre outros), da cultura local e da família. Dona
Virgínia em seus relatos deixou claro que a constituição paisagística de
Silveira Martins iniciou com base na agricultura familiar de
subsistência. Revela que no início as distâncias eram longas, a
locomoção era de carro de boi ou a pé, observa que toda a família
trabalhava na lavoura, nas plantações de batatinha a época. Mas,
também se divertiam, segundo ela, nos filos (encontros promovidos
nas linhas e vilas para a socialização) as mulheres ensinavam suas
filhas a bordar, cantar. Cada família levava um pratinho de doces
caseiros, como o grostoli.

- 35 -
Os relatos destacados se constituem como fonte de
reconstrução da memória local, tornando-se eficientes materiais
didáticos para os professores utilizarem em suas aulas sobre o
município de Silveira Martins. Todos foram gravados e disponibilizados
como fonte de consulta na UFSM, Campus Silveira Martins.

d) Projeto Georreferenciamento
O projeto georreferenciamento foi constituído basicamente de
duas oficinas4. A oficina Cartografia Escolar, formação de professores
e pertencimento: pensando Silveira Martins/RS através dos mapas
mentais, ministrada por Natália Lampert Batista e Guilherme Moreira
da Silva, contou com 25 professores participantes de variadas áreas do
conhecimento. Os participantes eram docentes das redes estadual e
municipal do município onde as propostas foram desenvolvidas.
Para a realização da oficina, trabalhou-se com dois momentos:
o primeiro momento contou com exercícios de lateralidade e também
enfocou a localização do município por meio de um quebra-cabeça do
mapa de localização do mesmo, retomando e construindo conceitos
cartográficos essenciais ao (re)conhecimento do município. Ressalta-
se, aqui, que no dia da realização da oficina 8 professores estavam
tomando posse em seus cargos como docentes e, portanto,
começando a conhecer o município. Na segunda etapa, trabalhou-se

4
Mais de detalhes destas oficinas podem ser encontrados em: Da Silva, Batista e
Petsch (2019).

- 36 -
com a elaboração de um mapa mental coletivo, sobre uma base
fornecida pelos ministrantes da Oficina, para que fossem ressaltados
os elementos que levam as noções de pertencimento e a socialização
de conhecimentos entre os (novos) colegas docentes, conforme
relatam Da Silva, Batista e Petsch (2019).
A atividade inicial consistiu na apresentação dos ministrantes e
dos conceitos de lateralidade, orientação e foco na importância de
compreender tais elementos para conhecer o espaço e desenvolver
noções de pertencimento nos estudantes. Essa proposta inicial foi
baseada em Da Silva et al (2017). Observou-se que quando se tratava
de localização relacionada à direita e esquerda os professores não
apresentaram dificuldades significativas, porém no processo de
descentralização da orientação para o espaço geográfico, através da
localização no tabuleiro via rosa dos ventos, houve grande dificuldade,
levando-os a refletir sobre a importância de atividades que remetem
a localização e orientação via descentralização dos referenciais (DA
SILVA, BATISTA, PETSCH, 2019).
Com relação aos quebra-cabeças de Silveira Martins, traçou-se
como enredo a seguinte questão: “um extraterrestre quer achar
Silveira Martins, com esses elementos distribuídos na folha, como
você poderia explicar onde o município está para ele?”. Assim, os
professores recortaram e colaram os elementos do mapa e
organizaram mapas de localização do município demostrando onde
ele estaria no contexto do Rio Grande do Sul. Observou-se que muitos
apresentaram dificuldades com dois conceitos: escala e coordenadas
- 37 -
geográficas. Os participantes questionaram o fato de Silveira Martins
estar com “mais zoom” que o Rio Grande do Sul e, por conseguinte,
como o município caberia no Estado. De mesmo modo, as
coordenadas em ambos os mapas não eram utilizadas, ficando apenas
como um número jogado nas duas representações (DA SILVA,
BATISTA, PETSCH, 2019).
Após a elaboração dos mapas pelos grupos de docentes, fez-se
uma roda de conversar para que o grupo analisasse os mapas dos
demais colegas, bem como para explicação desses conceitos.
Percebeu-se que muitos docentes ao se darem conta dos elementos
ali expostos comentavam “mas era só isso”, “por isso esses números
aqui”, a professora de matemática relacionou as coordenadas ao
plano cartesiano e explicou aos colegas. Enfim, levou-se os professores
a refletir sobre onde estavam e a importância de trabalhar com a
identificação do lugar onde se está com os estudantes (DA SILVA,
BATISTA, PETSCH, 2019).
Na sequência a produção do mapa mental com pontos
significativos ao pertencimento no município, despertou o desejo de
conhecer o lugar pelos professores que estavam chegando. Muitos
docentes ressaltavam a localização de Santa Maria, município vizinho
a Silveira, pois residem lá. Após os desenhos, fez-se uma roda de
apresentação do material e abordou-se sobre os elementos que
constituem a paisagem do município. O mosaico da Figura 12
apresenta esses momentos de realização da oficina (DA SILVA,
BATISTA, PETSCH, 2019).
- 38 -
Figura 12: A – Mostra a atividade inicial de orientação pelos pontos cardeais;
B – Demonstra os docentes debatendo sobre a organização dos mapas de
localização de Silveira Martins (RS). C e D – São exemplos de mapas de
localização construídos pelos docentes. E – Apresenta um mapa mental
sendo confeccionado. F – Exemplo de mapa final da oficina.

Fonte: DA SILVA; BATISTA, PETSCH, 2019, p. 156.

A oficina Com a mão na massa: construindo maquetes


geográficas em Silveira Martins/RS, ministrada pelas Professoras
Carina Petsh e Natália Lampert Batista, e pelos graduandos em
Geografia/UFSM, Francisco Augusto Alternnan e Guilherme Moreira
- 39 -
da Silva, contou com a participação de dez alunos do ensino
fundamental e quatro Professoras da Educação Básica: uma docente
de Geografia, uma de Ciências, uma de Matemática e outra de
História. Abordou-se o relevo e biomas do Brasil e de Silveira Martins
(RS). Para isso, foram realizadas em três etapas, visando a participação
dos professores juntamente com os alunos em todo processo de
construção do material. A primeira etapa foi de apresentação da ideia
da oficina; a segunda etapa se constitui no momento de construção da
estrutura da maquete e entendimento do significado da folha de
isopor como variação altimétrica; e a terceira etapa foi a de
representação espacial de dados de um mapa em duas dimensões
para a maquete e interpretação do que foi pintado na estrutura de
isopor e massa corrida. A confecção da maquete foi baseada em Silva
e Becker (2014).
Pretendeu-se que os alunos, ao interpretar sua realidade
geográfica, conseguissem aumentar o interesse pela disciplina de
Geografia e, ainda, tornarem-se sujeitos ativos na escola e
participantes dentro da sala de aula. Por outro lado, Da Silva, Batista e
Petsch (2019) apontam que as maquetes não precisam estar atreladas
somente a instrumentos de ensino de Geografia, e também podem
estar presentes nas disciplinas de Matemática, História, Letras, Artes
e Pedagogia. Nesse viés, pode-se avançar numa discussão de
alfabetização e letramento cartográfico como uma linguagem que
abre caminhos de aprendizagem em várias facetas da vida acadêmica
dos alunos, assim como é o aprender a ler e escrever.

- 40 -
Assim, tem-se que:

(1) As maquetes colaboram com o entendimento


do espaço vivido e do espaço ausente (espaço
geográfico como um todo), tornando os
conhecimentos complexos e abstratos mais
pautáveis para o entendimento dos estudantes; (2)
As maquetes são excelentes recursos didáticos para
estimular o trabalho interdisciplinar e a integração
entre diferentes áreas do conhecimento no
ambiente escolar como Artes, Geografia e Língua
Portuguesa; (3) Como possibilidade metodológica
no ensino de Geografia, são ferramentas didáticas
muito interessantes que estimulam a criatividade
na criação das representações do espaço
geográfico, como base em noções inerentes a
Cartografia Escolar como: proporcionalidade,
escala, observação da distribuição espacial dos
elementos, tipos de visão, entre outras; (4) Ao
associar os conhecimentos específicos das
diferentes áreas do conhecimento e integrá-los
com os elementos que despertam curiosidade aos
alunos (elementos do espaço vivido ou ausente) e
com sua representação em maquetes permitimos
que a aprendizagem se torne mais significativa e
que tenha sentido; (5) Os mais diversos temas
podem ser integrados a partir do uso de maquetes
como ferramentas de ensino, potencializando a
aprendizagem e evidenciando a eficácia desse
recurso metodológico na Educação Básica.
(BATISTA et al, 2019, p. 14).

De forma geral, algumas percepções iniciais serão descritas.


Todos os alunos e professores se sentiram motivados e instigados a
participarem da construção do material e atuaram ativamente do
processo, fazendo perguntas e buscando entender cada passo. Os
professores ainda apresentaram novas ideias de como aplicar as
maquetes em suas disciplinas, enquanto dois alunos ainda disseram

- 41 -
que gostariam de fazer a maquete em escala de maior detalhe para
visualizar os dados com melhor precisão (DA SILVA, BATISTA, PETSCH,
2019). O mosaico apresentado na Figura 13 demonstra alguns
momentos da atividade.

Figura 13: A – Mostra os alunos recortando o molde que ficará disponível na


escola e poderá ser utilizado para construção de maquetes cartográficas em
outras disciplinas; B – Demonstra a maquete do Brasil e de Silveira Martins
(RS) após a colagem de cada placa de isopor, representando a variação
altimétrica. C, D e E – Alunos pintando as folhas de isopor seguindo o
princípio do círculo das cores da Cartografia Temática. F – Exemplo de
produto final da oficina.

Fonte: DA SILVA; BATISTA, PETSCH, 2019, p.149.

- 42 -
As ferramentas trabalhadas nessas duas oficinas poderão se
utilizadas em outros momentos e com outras temáticas, ou seja, a
formação continuada dos professores, no âmbito do no Programa de
Formação Continuada de Professores de Silveira Martins/RS, dá-se
efetivamente em serviço, isto é, agregando docentes e discentes nas
práticas pedagógicas que são desenvolvidas no município com base
nas demandas das professoras e professores atuantes nas escolas. Isso
colabora para a efetivação de uma práxis pedagógica mais eficaz e
pautada nas necessidades docente.

Reflexão final
Com base nas atividades apresentadas, podemos afirmas que
o Programa de Formação Continuada de Professores de Silveira
Martins/RS colabora com a instrumentalização dos docentes para a
realização de práticas pedagógicas pautadas no lugar e no
desenvolvimento do sentimento de pertencimento ao lugar, de
valorização da cultura local, de engajamento da comunidade com o
seu espaço de vivência. As atividades potencializaram a autoria
docente e o envolvimento voluntário dos professores e estudantes
com as temáticas propostas, pois elas surgem das suas demandas
locais, das suas curiosidades e dos conteúdos que lhes interessam.
Os docentes solicitavam as oficinas conforme suas
necessidades e, consequentemente, os conteúdos que os estudantes

- 43 -
estariam estudando. Isso faz com que as práticas tenham sentido para
eles e, portanto, que potencializa que eles se engajem com as
propostas. Quando a formação é centrada no professor e no aluno e
em suas necessidades temos efetivamente um crescimento dos
envolvidos, pois eles estão dispostos a aprenderem e ensinarem,
envolvendo-se com as práticas pedagógicas. Assim, a grande
contribuição do Programa de Formação Continuada de Professores de
Silveira Martins/RS é a valorização do lugar, do professor e do
estudante silveirense, colocando o ato educativo como fonte de prazer
e de (re)conhecimento das potencialidades do local e, portanto,
levando a aprendizagem colaborativa entre todos os envolvidos no
processo de formação continuada.
Além disso, o Programa contribui com a formação continuada
e inicial de Professores e acadêmicos da UFSM, fomentando a troca de
saberes e a execução de atividades práticas correlacionadas com os
temas de estudo e pesquisa desenvolvidos na Universidade. Essa
aproximação Universidade e Escola também demostra a importância
da horizontalização das relações desses segmentos, promovendo a
aprendizagem colaborativa entre ambas as Instituições de ensino e
conduzindo a apropriação do Campus Silveira Martins pela
comunidade local. O trabalho desenvolvido fomenta a extensão e a
utilização dos espaços públicos para uma aprendizagem efetiva e de
qualidade como busca o PDI da UFSM.

- 44 -
Portanto, por meio da consolidação de práticas pautadas na
dialogicidade entre os profissionais da educação dos diferentes
sistemas de ensino, estudantes e pessoas do campo e da cidade,
potencializou-se a reflexão-ação como estratégia de formação
continuada no município de Silveira Martins/RS, problematizando
lugar e promovendo um processo ensino-aprendizagem integrada e
articulado com as necessidades das escolas, desenvolvendo uma
postura crítica à docência e a formação integral de professores e
alunos.

Agradecimentos
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) –
Código de Financiamento 001, do Programa Nacional de Pós-
Doutorado (PNPD – CAPES), e da Universidade Federal de Santa Maria
(UFSM) – Fundo de Incentivo à Extensão (FIEX).

- 45 -
Referências
ALMEIDA, R. D; PASSINI, E. Y. O espaço geográfico: ensino e
representação. 7. ed. São Paulo: Contexto, 1999.
BATISTA, N. L.; FELTRIN, T; CASSOL, M. S; BECKER, E. L. S. A utilização
de maquetes no Ensino Fundamental: possibilidades e experiências
metodológicas. Contemporâneos, Revista de Artes e Humanidades, v.
1, p. 1-15, 2019.
CALLAI, H. C. O município: uma abordagem geográfica nos primeiros
anos da formação básica. In: CAVALCANTI, L. S. Temas da Geografia na
escola básica. Campinas, SP: Papirus, 2013.
DA SILVA, G. M; BATISTA, N. L; PETSCH, C. A cartografia escolar como
possibilidade pedagógica na formação de professores. In: BATISTA, N.
L.; RIZZATTI, M. (Org.). O ensino de geografia na contemporaneidade:
práticas e desafios. 1ed.Rio de Janeiro: Dictio Brasil, 2019, v. 1, p. 134-
164.
DA SILVA, G. M; CASSOL, R.; RIZZATTI, M; BATISTA, N. L. Oficina
pedagógica sobre lateralidade e orientação: uma experiência com
alunos do ensino fundamental. In: PEREZ FILHO, A.; AMORIM, R. R.
(Org.). Os Desafios da Geografia Física na Fronteira do Conhecimento.
1ed.Campinas, SP: Instituto de Geociências - UNICAMP, 2017, v. 1, p.
3461-3471.
LENZ, A. C. Festividades religiosas e socialização em espaços rurais: o
caso de Silveira Martins/RS. (Dissertação de Mestrado). Programa de
Pós-Graduação em Geografia. Santa Maria/RS: Universidade Federal
de Santa Maria, 2020.
MARTINAZZO, C; DRESCH, O. I. Reflexões sobre saber-fazer docente na
contemporaneidade. In: MARTINAZZO, C; BARBOSA, M. G; DRESCH, O.
I. A educação escolar em um mundo complexo multicultural. Ijuí/RS:
Unijuí, 2016, p.173-190.
SILVA, C. P; BECKER, E. L. S. Relevo do Brasil e sua representação em
maquete. Disciplinarum Scientia: Série Ciências Humanas, v. 15, p. 1-
15-15, 2014.

- 46 -
Análise dos elementos teórico-práticos discutidos na
formação de professores na Educação do campo na E. M. E.
F. José Paim de Oliveira, Santa Maria/RS

Jaqueline da Costa Braz5


Eliane Aparecida Galvão dos Santos6
Janaína Pereira Pretto Carlesso7

Introdução
A formação continuada de professores na educação do Campo
obteve significativo avanço nas últimas décadas, visto que é necessário
a elevação da qualidade de ensino a ser ofertado nas escolas a partir
de políticas públicas de educação para as escolas do Campo.
Refletir sobre a qualificação profissional e o desafio dos
profissionais da área escolar em manter-se atualizados, tanto na busca
por novas metodologias de ensino quanto no desenvolvimento de
práticas pedagógicas que contemplem as especificidades da educação
do Campo, se torna necessária como forma de ampliar os espaços
escolares para a formação continuada.

5
Especialista em Gestão Escolar na Educação, CUBM. ORCID: http://orcid.org/0000-
0001-7372-5190. E-mail: jackcostabraz@gmail.com
6
Doutora em Educação, UFSM. ORCID: http://orcid.org/0000-0002-3982-7297. E-
mail: elianeagalvao1@gmail.com
7
Doutora em Educação em Ciências: Química da Vida e Saúde, UFSM. ORCID:
http://orcid.org/0000-0001-8488-1906. E-mail: janapcarlesso@yahoo.com.br

- 47 -
Nas palavras de Nóvoa (1995), é importante entender que o
local de trabalho é o espaço ideal para a formação continuada. Para
ele, a formação continuada é um trabalho coletivo e depende da
experiência e da reflexão como instrumento contínuo de análise. A
importância de refletir sobre o processo de formação continuada se
torna mais abrangente na medida em que as políticas educacionais
possam contemplar as relações entre educação e trabalho e criem
ambientes propícios para o desenvolvimento de competências básicas
para a atuação profissional.
Perrenoud (2000) enfatiza que é fundamental que a política de
formação continuada de professores esteja num âmbito cada vez
maior de discussões desses profissionais. Assim, eles podem se
sentirem responsáveis pelos caminhos de elaboração e definição
dessas políticas, intervindo, desse modo, nesse processo, tanto em
nível individual como coletivo.
Ao se pensar sobre prática docente, é importante refletir sobre
os saberes docentes, tanto em aspectos pedagógicos, sociais e
políticos na articulação quanto em mediação de construção de
conhecimento com educandos.
Cabe também às escolas organizarem momentos de formação
para que sejam feitas as reflexões necessárias acerca da realidade e
delineamento de propostas de ensino voltadas as especificidades de
cada comunidade escolar, trazendo o debate coletivo e a constante
atualização profissional como forma de qualificar o ensino. Neste

- 48 -
sentido, como aponta Nunes (2001, p. 30), resgata-se a ideia de se
“considerar o professor em sua própria formação, num processo de
autoformação, de reelaboração dos saberes iniciais em confronto com
sua prática vivenciada”.
Os educadores reconhecem que estes momentos formativos
na escola, contemplam em muitos aspectos a análise e o estudo dos
aspectos inerentes aos desafios da docência. A escola, onde foi
realizado o presente estudo, já proporciona em sua proposta
momentos formativos, com temas escolhidos pelos educadores. Isso
vem a contribuir com o aperfeiçoamento em serviço e com o
planejamento de projetos voltados ao contexto do Campo. Sendo no
exercício da docência na escola como local de aprendizagem da
profissão que os educadores desenvolvem os saberes e as
competências de ensinar. A partir disso, este estudo tem como
objetivo investigar as contribuições da formação continuada proposta
a um grupo de educadores de uma escola do Campo. Tal investigação
será feita a partir da análise de elementos teórico-práticos discutidos
nas formações pelos professores formadores.

Metodologia
O tipo de pesquisa realizada neste estudo é de abordagem
qualitativa, tendo o ambiente como fonte direta dos dados. O
pesquisador mantém contato direto com o ambiente e o objeto de
estudo em questão, necessitando de um trabalho mais intensivo de

- 49 -
campo. Nesse caso, as questões são estudadas no ambiente em que
elas se apresentam sem qualquer manipulação intencional do
pesquisador (PRODANOV; FREITAS, 2013).
A pesquisa realizada caracteriza-se como um estudo de caso
que, conforme (YIN, 2001), conceitua que é um estudo minucioso e
profundo de um ou mais objetos. Pode permitir novas descobertas de
aspectos que não foram previstos inicialmente. Pensar, então, a escola
do Campo, na atualidade, pode nos proporcionar o resgatar a cultura
dos povos do Campo. Segundo Rocha (2005), para conhecer a história
do Campo, é preciso entender tempos e espaços: os sujeitos, os
alunos.
A educação do Campo resulta de uma política pública
construída ao longo dos anos para atender a luta por uma escola do
Campo e para os povos do Campo. Uma escola que contemple em seu
fazer pedagógico o contexto e a realidade do meio onde se encontra.
O profissional para atuar na escola do Campo necessita, assim, de uma
formação ampliada sobre essa especificidade para dar conta das
dimensões educativas presentes nesta realidade. Refletindo sobre a
formação continuada alguns aspectos são fundamentais ao propor
essa formação como um espaço de reflexão sobre sua prática
permitindo a aprendizagem docente.

- 50 -
Procedimentos e etapas da Pesquisa
Com o intuito de proporcionar momentos de reflexão e
formação ao grupo de educadores, a pesquisadora, primeiramente,
fez intermediação com a equipe gestora para apresentar a proposta
de estudo e organizar os momentos de formação continuada para os
educadores da escola. Após a apresentação da proposta, foram
definidas as datas para as formações e temas e o contato com os
professores formadores, a serem convidados para abordar os temas
sugeridos na pesquisa. Assim sendo, foram enviados os convites para
as instituições as quais esses atuavam como docentes, a fim de haver
a liberação dos mesmos. Ademais, a pesquisadora elaborou um
convite aos docentes da escola, com o tema das formações, o local e
os formadores convidados. Os encontros foram planejados para
aplicação em duas etapas, com duração de quatro horas cada
encontro. A formação proposta aos educadores foi realizada na escola
Municipal de Ensino Fundamental José Paim de Oliveira localizada em
Santa Maria/RS, em encontros que serão descritos a seguir:
A primeira Formação Continuada proposta ao grupo de
educadores da escola com o tema Gestão e Práticas pedagógicas na
perspectiva da educação do campo, foi ministrada por um professor
Doutor em Educação, formado Universidade Federal Fluminense, com
doutoramento Sanduíche pela Universidade de Coimbra, em Portugal
(2014), graduação em Pedagogia, pela Universidade Federal
Fluminense (2001), e mestrado em Educação pela UFF (2006). Sua

- 51 -
experiência é na área de Educação, com ênfase em Educação popular,
Educação do campo e Educação escolar, atuando principalmente nos
seguintes temas: Educação do campo, Educação popular, Formação de
professores, Avaliação, Epistemologia, Currículo e Alfabetização,
Movimentos sociais e imperialismo.
O segundo momento formativo teve como tema: Em busca de
um saber Interdisciplinar, foi ministrado por uma professora Doutora,
com graduação em Ciências Biológicas (Bacharelado e Licenciatura),
na UFSM (2012). O doutorado e Mestrado dela é em Educação em
Ciências: Química da vida e saúde/ UFSM (2017). Especialização em
Tecnologias da Educação aplicadas à Educação/UFSM (2013) e em
Educação Ambiental/UFSM (2017). Ela é professora adjunta da
UNIPAMPA, Campus Dom Pedrito. Também é docente do Programa de
Pós-Graduação em Ensino de Ciências (PPGEC)/UNIPAMPA, Campus
Bagé. E pós-doutoranda pelo PPG em Ensino de Ciências e Matemática
da Universidade Franciscana (UFN).
Os participantes das formações, que ocorreram por meio das
rodas de conversas reflexivas, foram: 19 educadores, sendo que
desses, 8 foram sujeitos dessa pesquisa. Para a análise do conteúdo
dos dados coletados nas palestras realizadas foi utilizada a análise de
conteúdo que, segundo Bardin (2006), envolve um conjunto de
técnicas, divididas em três etapas básicas: a primeira é a pré-análise, a
segunda é a exploração do material e a terceira refere-se ao
tratamento dos resultados, inferência e interpretação.

- 52 -
Resultados e discussões
Nesta secção, serão apresentadas as categorias elaboradas
para discussão dos resultados, conforme quadro 9:

Quadro 9 – Categorias analisadas


1) Gestão Escolar e Práticas Pedagógicas na escola do Campo

2) Interdisciplinaridade na Educação do Campo

Fonte: As autoras (2019).

Gestão Escolar e Práticas Pedagógicas na escola do Campo


O professor formador (pf1) que ministrou o primeiro encontro
de formação continuada, proposta ao grupo de educadores da escola
com o tema Gestão e Práticas pedagógicas na perspectiva da
educação do campo, realizou, primeiramente, uma roda de conversa
e uma dinâmica para mobilizar o grupo de educadores. Logo após,
iniciou um diálogo com o grupo para, assim, traçar uma linha de
pensamento reflexivo, mediando à realidade com a construção de um
plano de ação voltado ao tema a ser abordado. O formador enfatizou
a importância do trabalho da gestão escolar, colocando a
aprendizagem dos estudantes como premissa para pensar as práticas
curriculares.
A gestão escolar deve ser pensada em aspectos como:
financeiros, humanos e organizacional, enfatizando o planejamento de
ações, em busca da aprendizagem com significado. Nesse contexto, a

- 53 -
escola deve ser articuladora junto aos membros de sua comunidade
de mecanismos que possibilitem um planejamento coletivo que
aponte a direção, o norte, o sentido de sua prática, sabendo aonde
devem chegar, na busca de um currículo pautado na realidade a qual
se atua. A escola é espaço de formação social e política dos seus
sujeitos, também tem a função social de resgate dos saberes
acumulados e, assim, reelaborar e produzir novos conhecimentos.
Desse modo,

A escola pode ser um lugar privilegiado de


formação, de conhecimento e cultura, valores e
identidades das crianças, jovens e adultos. Não
para fechar-lhes horizontes, mas para abri-los ao
mundo desde o campo, ou desde o chão em que
pisam. Desde suas vivências, sua identidade,
valores e culturas, abrir-se ao que há de mais
humano e avançado no mundo (ARROYO,
CALDART, MOLINA, 2011, p. 14).

Ao abordar a temática sobre gestão e prática pedagógica, o pf1


possibilitou a criação de uma janela imaginária, para que os
educadores fossem respondendo aos seus questionamentos e,
refletissem sobre as práticas pedagógicas no contexto da educação do
Campo.
Refletir sobre a função da escola faz com que os integrantes da
gestão escolar e do grupo de educadores reflitam sobre suas práticas
e sobre o significado que a aprendizagem tem para o educando que
chega cheio de incertezas nesta escola, com sua família, sua bagagem

- 54 -
cultural, seus anseios busca de fato refletir sobre este papel de ser
agente de transformação na vida destes sujeitos.
Pensar o que será proposto para este educando é fundamental
para que os conhecimentos sejam preparados para atender as
demandas e interesses deste educando e assim efetivar um ensino de
qualidade. A escolha dos conteúdos a serem trabalhados são de
extrema importância, vistos não somente como conhecimentos das
diversas disciplinas, mas também hábitos, atitudes, habilidades,
valores que fazem parte das possibilidades de aprendizagem
propostas aos educandos. Como afirma Libâneo:

A aprendizagem escolar tem um vínculo direto com


o meio social que circunscreve não só as condições
de vida das crianças, mas também a sua relação
com a escola e estudo, sua percepção e
compreensão das matérias. A consolidação dos
conhecimentos depende do significado que eles
carregam em relação à experiência social das
crianças e jovens na família, no meio social, no
trabalho (LIBÂNEO, 1994, p. 87).

É importante que a escola organize estratégias para pensar nos


conhecimentos que deve organizar para oferecer ao educando de
modo mais concreto, pensando nas diversas áreas do conhecimento.
Para isso, deve-se considerar que o educando que ingressa na escola
carrega conhecimentos prévios da realidade.
O pf1 citou como exemplo da Educação Infantil, que trabalha
os conhecimentos de forma integrada e que a estrutura pedagógica

- 55 -
integra valores, sentimentos e aprendizagem sem lacunas ou divisões.
Desta maneira o trabalho contextualizado é valorizado com o objetivo
de resgatar conhecimentos dos educandos e utilizar os espaços
escolares e da comunidade para que o ensino possa ser
interdisciplinar.

Cabe à escola do campo a condução de trabalhos


pedagógicos que superem a sala de aula como
espaço único e central de conhecimento e construa
estratégias além da fragmentação presente na
maioria dos processos de ensino aprendizagem
vigentes (MOLINA; SÁ, 2012).

Trazer o aluno como centro do pensamento pedagógico,


pressupõe pensar o currículo de maneira que contemple todos os anos
escolares que o educando irá percorrer até concluir o ensino
fundamental. Ao partir desse pressuposto, o pf1 propôs ao grupo uma
dinâmica para refletir sobre as práticas da escola a partir de um mapa,
elaborado em conjunto pelos educadores. Nesse mapa era
contemplado as características dos educandos, dos ambientes e das
necessidades da escola. Com a análise desses elementos iniciou-se a
discussão e reflexão sobre as brincadeiras que as crianças costumam
trazer para o contexto da escola, resgatando aspectos relevantes da
cultura local relacionados as práticas pedagógicas a serem
contempladas na escola.
Fernandes (2011) enfatiza que o Campo deve ser concebido a
partir de toda a dimensão humana que contempla. O campo é o

- 56 -
espaço/território de vida, onde pessoas moram, trabalham, estudam
e precisam ter sua dignidade reconhecida a partir do seu lugar, da sua
identidade cultural. A escola do Campo é um local que se diferencia
das demais escolas pelas características que assume diante do
contexto e das necessidades de educação que possui, pois tem
características próprias que a identificam. Ela abrange questões
sociais, econômicas, de meio ambiente e de formação do ser humano
interagindo entre si e com o espaço físico e social aonde se insere.
Dessa maneira, trazer aspectos relacionados à cultura, aos modos de
ser e viver dos povos do Campo para o currículo escolar traça um novo
perfil de valorização do contexto. Inúmeras possibilidades de elaborar
e reelaborar conhecimentos surgem, com base na realidade e nos
saberes dos educandos.
Conhecer as famílias e suas propriedades, a partir de visitações,
é uma prática da escola pesquisada neste estudo. Isso ocorre como
forma de resgatar aspectos importantes do modo de produção e de
organização e relaciona tal resgate os conhecimentos científicos que a
escola tem como base para ensinar. Assim, cabe aos integrantes da
comunidade escolar a reflexão e o compromisso junto às famílias, para
construírem um currículo que resgate e contemple as necessidades,
especificidades e experiências de todos os envolvidos neste processo.
O pf1, juntamente com o grupo de educadores, contemplou tal
ideia ao delinear o perfil dos educandos, das famílias e da comunidade
em que a escola está inserida. Elaboraram de um mapa representando

- 57 -
o território da escola com aspectos significativos da comunidade
escolar. A partir da construção coletiva do mapa foram sendo
delineados, com os educadores, conceitos sobre a Proposta
pedagógica da escola sobre o currículo. Resgastou-se vivências
realizadas na escola e fora dela com as características sociais, culturais,
econômicas e assim construindo o tempo da escola, o tempo de fazer,
o tempo de aprender e o tempo de viver.
Libâneo (2001) enfatiza as escolas possuem determinada lógica
de funcionamento, vindas das relações que se estabelecem nela e/ou
sobre ela, da forma como as decisões são tomadas, dos
comportamentos, valores e interesses dos diferentes sujeitos que dela
fazem parte. Há congruência dos fatores externos e internos que
produzem a cultura da escola. Para o autor,

[...] por um lado, a organização educa os indivíduos


que a compõem; por outro, os próprios indivíduos
educam a organização, à medida que são eles que
a constituem e, no final de contas, a definem com
base nos seus valores, práticas, procedimentos,
usos e costumes (LIBÂNEO, 2001, p. 22).

Cabe às escolas criarem novos espaços de construção coletiva,


envolvendo educandos, educadores, gestores e comunidade escolar,
pois as escolas do Campo têm um vasto repertório cultural a ser
utilizado como base nos planejamentos e ações da escola. Organizar
os tempos para formação, para reuniões pedagógicas, para a
participação da gestão escolar em ações e em planejamentos coletivos

- 58 -
são extremamente necessários. Pensar nesses espaços na escola do
Campo são fundamentais para que a escola possa, de fato, estar
resgatando as práticas sociais, pensada a partir do seu lugar e dos seus
sujeitos num diálogo amplo com questões da educação e da formação
humana.
Os educadores têm um papel fundamental no pensar e no fazer
essa formação humana, no educar e no desenvolvimento dos
processos de aprendizagem significativos aos sujeitos do Campo. Isso
requer políticas para formação continuada e de projetos de formação
para os educadores:

Construir a educação do Campo significa formar


educadores e educadoras do e a partir do povo que
vive no Campo como sujeitos destas políticas, que
estamos ajudando a construir, e também do
projeto educativo que já nos identifica. Como fazer
isso, é uma das questões que deve nos continuar
ocupando de um modo especial (ARROYO,
CALDART, MOLINA, 2011, p 158).

Em um dos momentos do encontro da formação continuada, o


pf1 enfatizou em sua fala o encantamento que tem com a proposta da
escola em estudo. Destacou também aspectos relacionados à
metodologia e ao planejamento realizado dentro do contexto da
educação do Campo que mostram que é possível trabalhar de maneira
articulada com os saberes e os fazeres do Campo.

- 59 -
Interdisciplinaridade na Educação do Campo
O segundo momento formativo proposto ao grupo de
educadores teve como tema: Em busca de um saber Interdisciplinar. O
encontro iniciou-se, primeiramente, com a apresentação da
professora formadora (pf2) que para introduzir a temática sobre
interdisciplinaridade, utilizou a dinâmica do tangram, distribuindo
envelopes com peças do jogo, solicitando aos educadores que fosse
montado um quadrado utilizando todas as peças. Para isso, a pf2 foi
fornecendo dicas do número de peças necessárias para montar o
tangram (sete peças), enfatizando que todos os docentes se
envolvessem no desafio e que muitos vivenciassem um contexto
interdisciplinar. Contudo, no momento do desafio os professores não
pediram ajuda uns dos outros e tentaram montar individualmente o
seu tangram, não pensaram em compartilhar peças com os colegas.
Com isso, ficou mais difícil conseguir montar o quadrado proposto na
atividade. Durante a realização da dinâmica, foi possível refletir sobre
o contexto interdisciplinar, pois, na medida em que os educadores
foram se dando conta de que para montar o tangram precisariam
solicitar ajuda para um colega e que poderiam misturar as cores e
assim formar o quadrado mais facilmente. Não pensaram de maneira
coletiva, no modo compartilhado que facilitaria a montagem do
tangram.
Bolzan (2006) define o conhecimento pedagógico
compartilhado,

- 60 -
como um sistema de ideias com distintos níveis de
concretude e articulação, apresentando dimensões
dinâmicas de caráter processual, pois implica em
uma rede de relações interpessoais, organizando-
se com variedade e riqueza, apresentando quatro
dimensões: o conhecimento teórico e conceitual, a
experiência prática do professor, a reflexão sobre a
ação docente e a transformação da ação
pedagógica (BOLZAN, 2006, p. 320).

Pensar de maneira compartilhada evidencia, então, a atitude


do educador em romper certos paradigmas e trazer inovação ao ato
de planejar. Sendo possível refletir continuamente sobre a prática e a
ação como forma de organização dos sabres pedagógicos.
Ao pensar sobre as razões que levam os docentes e os
educandos para a escola nos remete a refletir como a gente aprende
como a gente ensina e o processo de interações que acontecem no
ambiente escolar. O educador em seu processo formativo se apropria
diariamente de novos aspectos conceituais que são reorganizados a
partir de estratégias de ensino utilizadas, ampliando seu
conhecimento e domínio do saber e assim proporcionando novos
conceitos, novas maneiras de ensinar. Atentar sobre como o educando
aprende requer pensar também como o educador reelabora seus
conhecimentos para então refletir sobre o ensinar e aprender. O
educador precisa posicionar-se de forma crítica, equilibrada e
contextualizada para dar novos rumos ao processo de ensinar e

- 61 -
aprender. Dessa maneira, contribui-se para a construção de novos
rumos para a escola do Campo e para as demandas da sociedade atual.
A pf2 enfatizou que a escola está sendo invadida pelo
conhecimento e que a utilização de estratégias pedagógicas
inovadoras podem auxiliar neste processo, são principalmente o uso
de recursos tecnológicos valorizando o que os educandos sabem e
buscando novos recursos para trazer ao contexto escolar novos
recursos que possibilitem a aprendizagem significativa.
Todos os avanços sociais, científicos, tecnológicos de alguma
maneira chegam até a escola. O uso das tecnologias de informação e
de comunicação, no processo de ensino e aprendizagem, são recursos
que proporcionam ao educador e ao educando novas oportunidades
de interação e construção de conhecimento.
A educação do Campo em seu contexto apresenta recursos e
repertório culturais necessários para a construção de um currículo
pautado nas vivências e saberes oriundos da comunidade. Com isso
pode proporcionar a efetivação de práticas interdisciplinares e
contextualizadas.
Refletindo sobre as ações interdisciplinares como um assunto
que ainda requer atenção especial para os educadores que estão
acostumados a pensar sozinhos para então buscarem ações conjuntas.
Ao se falar sobre interdisciplinaridade existe uma inquietação e o
educador se questiona sobre a simbologia do compartilhamento e do
trabalho em conjunto. Isso acontece porque muitas vezes não se

- 62 -
valoriza aspectos relevantes sobre a formação e sobre a capacidade
que o educador tem de construir estratégias que poderiam ser
interdisciplinares. Fazenda (2002) destaca que o trabalho em conjunto
de professores e alunos é um dos elementos que pode auxiliar na
superação das barreiras disciplinares e das dicotomias existentes na
relação professor-aluno. A interdisciplinaridade, portanto, contribui
para que se instale uma prática baseada no diálogo, não só entre
disciplinas, mas também entre as pessoas.
Uma das dificuldades em se trabalhar interdisciplinarmente é
que, muitas vezes, acontece a desmotivação dos educadores, por não
acharem que não faz sentido trabalhar com um determinado projeto
interdisciplinarmente. Por isto é fundamental que sejam assumidas as
responsabilidades de coordenar uma ação interdisciplinar para que os
professores vivenciem na prática novos conceitos e maneiras de
trabalhar a interdisciplinaridade. Para muitos educadores pensar a
interdisciplinaridade se torna um desafio, pois muitas vezes tem uma
dimensão difícil de ser executada na prática.
Sendo um desafio esse pensar interdisciplinar, que muitas
vezes é considerado pelos educadores como algo muito grande, difícil
de ser executado na prática. A atitude interdisciplinar precisa partir de
pequenas ações e desse compartilhamento, envolvendo e agregando
o grupo para a partir disto ser construído um projeto. Ressalta-se que
também é preciso sensibilidade e formação adequada para poder
entender o processo interdisciplinar.

- 63 -
A interdisciplinaridade requer um novo posicionamento diante
da prática educacional e da vida, pois a interdisciplinaridade é o motor
de transformação, de mudança social, em que a comunicação, o
diálogo e a parceria são fundamentais para que ela ocorra. Para
Fazenda (2003), a interdisciplinaridade se apoia na tríade, formada
pelo sentido de ser, de pertencer e de fazer: “A ação do educador será
a de decifrar com o educando as coisas do mundo das quais ambos são
participantes” (FAZENDA, 2003, p. 38).
Para que o educando se envolva no processo de ensino e
aprendizagem o educador precisa buscar atividades que despertem o
interesse, a motivação, a participação, porque educar é formar o
indivíduo. Para isso é preciso fazer com que o educando entenda a
realidade, pense sobre o contexto em que está inserido, qual é a
concepção, os conceitos podem extrair dessa realidade.
A pf2 fez um paralelo com relação ao avanço tecnológico, que
está imediato, e as metodologias de ensino que às vezes ficam retidas
no tradicional, baseado em conteúdos científicos. Sendo necessário a
ruptura do velho em detrimento do novo para assim, construir novos
caminhos. Ao refletir sobre o saber cientifico articulado com a
realidade é possível transformar e construir novos conhecimentos.
Para Rodrigues e Amaral (1996), contextualizar o ensino
significa trazer a própria realidade do aluno, não apenas como ponto
de partida para o processo de ensino e aprendizagem, mas como o
próprio contexto de ensino. O educador, ao pensar de maneira

- 64 -
contextualizada e ao planejar suas aulas, deve ter claro que muitas
vezes até um exemplo pautado na realidade do educando pode
transformar a aprendizagem, deixando-a mais significativa. Dessa
maneira o professor deve ser pesquisador de sua realidade de sua
atuação como docente. Nas palavras de Freire (1996, p.29),

não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino:


Fala-se hoje, com insistência, no professor
pesquisador. No meu entender o que há de
pesquisador no professor não é uma qualidade ou
uma forma de ser ou de atuar que se acrescente à
de ensinar. Faz parte da natureza da prática
docente a indagação, a busca, a pesquisa. O de que
se precisa é que, em sua formação permanente, o
professor se perceba e se assuma, porque
professor, como pesquisador.

O educador busca adequar metodologias, busca outras


estratégias que possam de fato fazer com que o ensino seja
significativo para o educando.
Durante o momento formativo, a pf2 enfatizou que o educador
deve ser o mediador, colocando em evidência temas importantes para
refletir a contextualização, a interdisciplinaridade, a neurociência e o
afeto. Esses aspectos perpassam as vivências da escola na construção
de um projeto dialógico para guiar a prática dos educadores.
Segundo Paulo Freire (1996) é dever da escola não só respeitar
os saberes do educando mas direcionar o processo de ensino-
aprendizagem com a participação ativa. Partindo das sugestões dos

- 65 -
educandos o educador pode desenvolver um projeto que englobe a
participação ativa na construção de estratégias de ensino pautadas na
realidade e nas interações, fazendo com que o ensino seja
contextualizado.
Surgem desafios ao se pensar nas metodologias, nas
estratégias. Às vezes o educador se depara com questões muito
pontuais e muitas vezes não consegue dar uma continuidade aquele
processo, uma fluidez aquela ação. Isso dificulta os projetos
interdisciplinares, porque existe a preocupação em cumprir uma meta
e, às vezes, essa meta está em curto prazo, sendo difícil estabelecer
outras estratégias para prolongar a execução deste projeto e assim
muitas vezes não tem continuidade.
Cabe apontar que uma estratégia interessante para pensar
interdisciplinar é criar situações para o educando ser desafiado a
pensar criticamente sobre a sua realidade. Os educadores têm uma
preocupação de trazer o conhecimento pronto, direcionado,
esquecendo que esse pode chegar até ele por outros meios, por outras
vias, valorizando os saberes dos educandos para juntamente com eles
criar novas possibilidades de aprendizagem.
Também é necessário pensar avaliação permanente do
educador e da gestão escolar como forma de rever aspectos
relacionados ao planejamento e aos objetivos e, assim, repensar o
projeto da escola pautado em ressignificações e construções que
possam ser significativas para o educando e para a comunidade

- 66 -
escolar. Conforme aponta Lück (2010,) a opção pelo enfoque
interdisciplinar, para orientar a prática pedagógica, requer romper
hábitos e acomodações na busca do novo, tanto nas questões do
cotidiano escolar quanto nos momentos confronto com a pesquisa
cientifica.
A pf2 destacou que a interdisciplinaridade é uma interação
coordenada entre várias disciplinas. A interação entre os envolvidos
no processo de construção de um projeto, na abordagem
interdisciplinar, para ela, que requer planejamento para que seja feita
a integração coordenada com várias disciplinas. Na análise da pf2 os
educadores têm dificuldade de divulgar suas vivências e experiências
interdisciplinares e assim trabalhar de forma conjunta com seu colega.
Isso ocorre porque é necessário planejamento, diálogo e tempo para
compartilhar os saberes docentes entre os docentes. A
interdisciplinaridade, portanto, contribui para que se instale uma
prática baseada no diálogo, não só entre disciplinas, mas também
entre as pessoas (FAZENDA, 2002).
É preciso, como sustenta Fazenda (1979), uma atitude
interdisciplinar, condição essa, a nosso ver, manifestada no
compromisso profissional do educador, no envolvimento com os
projetos de trabalho, na busca constante de aprofundamento teórico
e, sobretudo, na postura ética diante das questões e dos problemas
que envolvem o conhecimento.

- 67 -
Considerações finais
A formação continuada proposta neste estudo possibilitou, de
maneira relevante, a análise de aspectos significativos sobre a prática
interdisciplinar e o planejamento articulado de ações coletivas na
escola do Campo. Cabe destacar que estimular o debate por meio de
uma proposta formativa, com a participação de profissionais
qualificados no contexto escolar, pode possibilitar aos educadores a
reflexão, a ressignificação e a inovação de ações e práticas no contexto
da escola do Campo. Além disso, o aperfeiçoamento das metodologias
utilizadas pelos educadores, possibilitando mudanças necessárias para
romper com o comodismo, com ideias que ficam defasadas em relação
ao uso de tecnologias no contexto escolar.
A escola em estudo apresenta uma caminhada com relação à
promoção de formação continuada em serviço e assim os educadores
demonstram estar abertos ao uso de metodologias adequadas ao
contexto do Campo. A partir da proposta para o desenvolvimento de
um trabalho coletivo e interdisciplinar com o comprometimento e a
participação de toda a comunidade escolar fica evidente que é possível
construir uma proposta de educação do Campo, pautada no contexto
e na realidade da escola.
Pensar os espaços escolares com acompanhamento mais
constante, através de formação continuada como suporte e apoio a
atuação dos docentes, é, sem dúvida, uma condição para que se

- 68 -
efetive a prática inovadora tão sonhada por todos os que lutam pela
educação do Campo e no Campo.
As contribuições deste estudo apontam que é possível o
desenvolvimento de uma formação continuada que proporcione aos
educadores um clima afetivo, participativo sustentado pela
criatividade e responsabilidade coletiva com o objetivo de transformar
a escola em espaço colaborativo de trocas de ideias e conhecimentos
significativos.

- 69 -
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- 70 -
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- 71 -
PROMSAC (Programa Municipal Mosaico de Saberes do
Campo) - Santa Maria, RS: afirmando identidades locais

Ail C. Meireles Ortiz8


Cláudia Bassoaldo9
Maria Goretti R. Farias10

Contextualizando o recorte espacial do campo


A organização territorial representa consequência de
processos espaço-temporais desenvolvidos pelo homem ao longo da
história. Após a consolidação do capitalismo, em sua fase industrial, a
cidade afirma sua hegemonia sobre o campo e passa a comandar a
economia e a sociedade em escala mundial. As transformações na
organização do espaço geográfico trouxeram várias consequências nas
relações campo-cidade, dentre elas podemos destacar a
modernização agrícola: a industrialização, a urbanização e a
globalização, assim como exemplifica o autor:

Nas décadas de 50, 60 e 70 que se desenvolve o


processo que ficou conhecido como “Revolução
Verde” e que buscava elevar a produtividade

8
Mestre em Educação, UFSM. Docente do Curso de Geografia e Pedagogia da
Universidade Franciscana.
9
Mestranda em Ensino de Humanidades e Linguagens, UFN. Supervisora Pedagógica
da Educação do Campo da Smed, Santa Maria, RS.
10
Mestranda em Ensino de Humanidades e Linguagens, UNIFRA. Equipe Diretiva de
Escola do Campo de Distrito de Santa Maria, RS.

- 72 -
através do uso intensivo de fatores de produção,
como sementes melhoradas, fertilizantes,
agrotóxicos e mecanização [...] (ELESBÃO, 2007, p.
51).

No Brasil, a modernização agrícola ocorreu através da


Revolução Verde, que estava fundamentada em um modelo que
visava acabar com a fome a nível mundial e também voltada à
agroindústria. Segundo Silva (1991, p. 11), “a indústria se apropria do
excedente que seria o lucro e a renda da terra”. Desse modo, o
processo industrial é movido pelo capital através do excedente
agrícola. “A industrialização é um fenômeno concentrado no espaço
enquanto produto de aglomeração dos meios de produção, mão-de-
obra, capitais e mercadorias. [...]” (CARLOS, 2000, p. 44). Sendo assim,
o processo de industrialização está diretamente ligado à urbanização
e também a agricultura que teve como consequência o êxodo rural.
Neste sentido, o êxodo rural caracteriza-se a partir da saída do homem
do campo para as cidades devido ao processo de mecanização do
campo e pela concentração de terras e de renda dos grandes
latifundiários. Conforme Valente (1995, p. 115 e 116),

[...], êxodo rural, ou seja, o abandono pela maioria


dos homens e mulheres, expulsos do campo pela
concentração fundiária, pelo avanço constante da
mecanização que liberta a mão-de-obra e atraídas
pelas cidades, pelas “facilidades” e valores
implantados na sociedade urbana que
acompanharam o processo de modernização dos
meios de produção.

- 73 -
Com isso ocorreu à separação entre o campo e a cidade por
meio do capital, da mecanização e dos financiamentos. Ou seja, tanto
o espaço urbano quanto o rural são interdependentes, pois o centro
urbano desenvolve a tecnologia e concentra os bancos que financiam,
através do crédito maquinários, insumos e sementes para o agricultor
por meio das empresas multinacionais. A globalização representa o
globo terrestre integrado em nível mundial. Ou seja, é a expansão do
capitalismo por meio de uma ideologia, a qual reforça a legitimidade
de um poder político dominante. Isso por que, na globalização, os
países dependem uns dos outros em grande proporção, e suas
economias são integradas. As consequências decorrentes do processo
da globalização estão relacionadas diretamente às empresas
multinacionais que abriram e ampliaram seus mercados, provocando
não só o aumento em seus ganhos, mas também a mobilização de
recursos econômicos, tecnológicos e humanos. Assim, torna a
economia nacional desvalorizada perante a internacional, gerando
desigualdade de competição dos produtos.

A dinâmica globalizante não apaga os restos do


passado, mas modifica seu significado e
acrescenta, ao já existente, novos objetos e novas
ações características do novo tempo. Agravaram-
se as diferenças e disparidades, devidas em parte,
dinamismos e outras formas de comando e
dominação. Onde carregava a indústria esse papel
motor, agora é a informação que ganha tal poder
[...] (SANTOS, SILVEIRA, 2003, p. 253).

- 74 -
A globalização reflete o processo capitalista dominante, por
meio do qual circula capital, tecnologia e informação em nível mundial.
Com isso, a globalização induz as pessoas a um espaço cada vez mais
homogêneo, ou seja, a uma economia mundializada, em que o capital
e o lucro estão acima dos valores humanos. Desse modo, o homem
destrói a si mesmo, as outras pessoas e a natureza. A globalização,
mobilizada pelo capitalismo acelerado e hegemônico marca também,
de forma acentuada o espaço rural, em que a industrialização passa a
atingir os processos de produção agrícola, dando novos formatos à
organização do espaço rural. De acordo com Silva (1996, p. 73):

A transformação industrial da agricultura ocorreu


historicamente através de uma série de
apropriações parciais, descontínuas do trabalho
rural e dos processos biológicos de produção
(máquinas, fertilizantes, sementes híbridas,
produtos químicos, biotecnologias) e do
desenvolvimento paralelo de substitutos
industriais para os produtos rurais [...].

A modernização agrícola e o desenvolvimento do capitalismo


trouxeram novas formas e funções que modificaram a relação do
campo/cidade. O campo assume um novo papel no espaço geográfico
definindo novas funções para atender a demanda da sociedade. Assim,
o campo é responsável pela concentração da produção agrícola, ao
mesmo tempo em que a cidade passa a ser uma organização espacial
que detém o controle político e ideológico sobre o campo,

- 75 -
principalmente com o uso do excedente agrícola, que passa a ser
utilizado como moeda de troca, visto que a cidade oferece os produtos
como maquinários, fertilizantes, serviços e tecnologia para o homem
do campo. Sendo assim, conforme Hespanhol (2007, p. 277 e 278):

A expansão dos níveis de instrução da população


rural, sobretudo dos jovens, a baixa rentabilidade
das atividades agropecuárias, a expansão da
eletrificação rural e as maiores facilidades de
locomoção e de comunicação entre os espaços
rural e urbano têm feito uma parcela cada vez
maior da população do campo desenvolva
atividades na cidade, embora permaneça na zona
rural. A agricultura [...] e a pluriatividade são cada
vez mais expressivas; [...].

No entanto, o processo da industrialização e da modernização


agrícola desencadeou um intenso processo de urbanização, pois o
homem do campo não tinha condições financeiras para investir na
modernização de sua propriedade rural, restando-lhe apenas ir para a
cidade em busca de novas possibilidades de trabalho. Desse modo, o
homem do campo começou a receber uma renda fixa com um salário
e a indústria atraiu muitas pessoas da área rural para trabalhar nos
centros urbanos. Atualmente, a população rural enfrenta dificuldades
devido ao envelhecimento da população e ao êxodo rural, em que as
pessoas deixam o campo para estudar ou trabalhar na cidade.

A cidade é o lugar em que o Mundo se move mais;


e os homens também. A co-presença ensina aos
homens a diferença. Por isso, a cidade é o lugar da

- 76 -
educação e da reeducação. Quanto maior a cidade,
mais numeroso e significativo o movimento, mais
vasta e densa a co-presença e também maiores as
lições e o aprendizado (SANTOS, 1998, p. 34).

No período da imigração, o espaço rural era fragmentado,


pois não havia comunicação e integração entre o campo e a cidade.
Mas com o passar do tempo, os dois espaços necessitaram a interação,
pois o campo começou a depender de capital e a cidade de insumos
agrícolas para a sobrevivência. Essa relação entre os dois ocasionou a
modernização do campo, no qual o uso das novas tecnologias tornou-
se presente. Os dois espaços passam por transformações decorrentes
da produção e da reprodução provocada pela sociedade. Logo, tanto
o campo quanto a cidade são espaços heterogêneos. Portanto, a
ciência geográfica analisa a sociedade em um determinado espaço
através dos aspectos históricos, culturais, econômicos e sociais.

A base técnica da sociedade e do espaço constitui,


hoje, um dado fundamental da explicação
histórica, já que a técnica invadiu todos os aspectos
da vida humana, em todos os lugares. Diacronia e
sincronia são, ambas, possíveis de explicação em
termos de técnica, ainda que nada se possa
entender sem que se conheçam e avaliem as
respectivas formas de organização (SANTOS, 1998,
p. 33).

Dessa forma, cada lugar tem uma composição capitalista


diferente. O espaço rural por meio da agricultura, das suas relações
com o meio e dos elementos referentes às atividades realizadas pelo

- 77 -
homem, entre os quais o sistema financeiro, a indústria, o espaço físico
e as atividades agrícolas são elementos interdependentes no espaço
rural. A análise interpretativa das relações entre sociedade e natureza,
sob o viés da periodicização, resguarda forte postura investigativa à
aproximação de efetivos sentidos desvelados a testemunhos, que dão
forma à recriação de fatos históricos ocorridos em tempos e espaços
distintos e, assim, submetidos a explicações e justificativas. Como
afirma Ribeiro (1988, p. 46) “o espaço produzido é a materialização do
tempo, por meio do trabalho dos homens”. Esta singularidade carrega
intensa resistência à volatilização de referenciais locais, impedindo
que o vigor da globalização se consuma. A afirmação de identidades
humanas e naturais que se arranjam sobre o lugar, ao longo de um
tempo presente e passado, reafirmam sentimentos de pertencimento
e identidade aos integrantes do lugar. Esta forma de ser, viver, de
sentir, de construir, de pertencer o lugar, legitima sua identidade.
Assim como afirma Yázigi (2001, p. 49) “Considero que o lugar está
para o espaço, assim como a periodização está para o tempo”. Este
processo de homogeinização de referências identitárias tem
provocado um movimento de contra-globalização, em que se principia
a inculcação de valores afirmadores da cultura local, resgatando assim,
por atitudes coordenadas por mobilizações sociais, a emergência do
sentimento de pertencimento aos lugares sobre os quais integram e
intervém. Interpretar o lugar, em sua história de construção,
representa a descoberta de sentidos valorativos. A identidade deve

- 78 -
determinar e não, subjulgar. O nosso singular processo de construção
histórica justifica nosso projeto social identitário. Nesta ideia,
chamamos Touraine (1994, p. 70),

Para alguns a correspondência da atividade


econômica e da organização social forma a
infraestrutura que determina todas as formas de
vida política e cultural, ideia que introduz o
determinismo econômico, porém mais importante
é a afirmação da unidade de todas as formas da
vida coletiva como manifestações de uma
capacidade e de uma vontade de autoprodução e
de autotransformação da sociedade.

As relações sociais congregam sujeitos diferentes, mas que,


concomitantemente, compartilham pensamentos, sentimentos,
realizações, promovendo o entendimento da identidade, sem
negligenciar a consciência da alteridade, como reconhecimento de si
no outro. Evidenciado na ideia do autor:

[...] A identidade surge não tanto da plenitude da


identidade que está dentro de nós como
indivíduos, mas de uma falta de inteireza que é
preenchida a partir de nosso exterior, pelas formas
através das quais nós imaginamos ser vistos por
outros [...] (HALL, 2006)

A cultura nos assemelha a uns e nos diverge de outros, em


firme sentido identitário, reafirmando a perspectiva de que as
identidades são construídas, a partir de um arranjo de atributos que
passam a legitimar o sentimento de pertencimento de grupos sociais

- 79 -
sobre espaços em transformação, mancando significados e práticas
sob o movimento temporal.

Estabelecendo considerações sobre a educação do campo:


A escola do campo, conforme Resolução nº 342, de 11 de abril de
2018 do Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Sul em seu artigo
2º, inciso II é aquela situada em área rural, conforme definição da

Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, ou


aquela situada em área urbana, desde que atenda
predominantemente a população do campo. A proposta pedagógica
da escola do campo não deve somente deter-se em transmitir
conhecimentos, e sim preocupar-se com os educandos. De acordo com
Leite (1999, p. 99):

A função primordial da escola é ensinar, transmitir


valores e traços da história e da cultura de uma
sociedade. A função da escola é permitir que o
aluno tenha visões diferenciadas de mundo e de
vida, de trabalho e de produção, de novas
interpretações de realidade, sem, contudo, perder
aquilo que lhe é próprio, aquilo que lhe é
identificador.

É importante que o docente possa levar em consideração a


vida cotidiana dos educandos, instigá-los a conhecer e a intervir na
comunidade que está inserido, priorizando a cultura local.
Preservando a cultura e a sua identidade local, os estudantes têm a
possibilidade de serem cidadãos que constroem sua história através

- 80 -
da identidade local. “A educação no campo deve assumir de fato a
identidade do meio rural, sua cultura e história, desenvolvendo
práticas pedagógicas contextualizadas que valorizem os saberes
sociais presentes no rural [...]” (MOURA, 2009, p. 47). É necessário que
o docente valorize o aluno do campo como um sujeito que tem uma
identidade do meio rural, podendo, assim, permanecer no campo. A
escola do campo desenvolveu-se com base em projetos que foram
elaborados para as escolas urbanas, em consonância aos objetivos dos
grandes proprietários de terra, ignorando os aspectos culturais e
profissionais da vida rural. Logo, a escola rural foi uma adaptação de
um ensino desenvolvido nas cidades. Assim como destacam Farenzena
e Brancher: “[...], as escolas do campo apresentam uma realidade
bastante diferenciada das escolas urbanas, não só em relação ao
contexto geográfico e econômico em que estão inseridas, mas no que
se refere a sua organização político-pedagógica, [...]” (2013, p. 15).
As primeiras escolas do campo foram aquelas que atendiam
a demanda local, conforme a necessidade das localidades rurais para
que os filhos dos agricultores pudessem estudar. Desse modo, elas
foram construídas de forma bastante precárias, nas quais havia
somente um professor para ensinar desde a primeira série até a quarta
séries do Ensino Fundamental (multisseriadas). A partir dos anos 90,
foram construídas novas escolas com estruturas mais modernas e
organizadas, conhecidas de escolas-núcleo ou escola polo que se
localizaram em localidades centrais do interior dos municípios para

- 81 -
atender crianças e adolescentes desde o Ensino Fundamental ou até
mesmo o Ensino Médio. Esse processo de nucleação possibilitou às
pessoas a permanência em seu local de origem, pois não precisavam
deslocar-se à cidade para concluir os estudos.
A maioria dos docentes que trabalham na escola do campo
mora no meio urbano, transmitindo a ideia de que faltava o
conhecimento da realidade rural. No entanto, para o desenvolvimento
educacional dos alunos, importante envolvimento e o conhecimento
do lugar onde se leciona. Segundo Ortiz (2006):

Às muitas preocupações soma-se a incorporação


de um modelo urbano de trabalho e estrutura
escolar no meio rural, bem como a resistência em
organizar um plano pedagógico em que os
principais orientadores do processo educativo, os
professores, priorizem a valorização da cultura
local na conduta do processo educativo (p. 63-64).

Atualmente, a escola rural simboliza um lugar onde se


desenvolvem e reproduzem as dinâmicas próximas da realidade
urbana. De acordo com Gracindo et al (2006, p. 22), “[...] o debate
entre educação do campo e educação da cidade, na maioria das vezes,
vincula-se à simples transposição da educação da cidade para a
educação do campo, desconsiderando as especificidades dos sujeitos
que vivem no campo”.
A escola do campo não é um tipo diferente de escola, mas sim
é a mesma que reconhece e ajuda a fortalecer as pessoas do campo
como sujeitos sociais, que também fazem parte da sociedade através
- 82 -
de suas lutas, sua história, seu trabalho, seus saberes e a sua cultura.
Na busca de novos caminhos e perspectivas ao mundo do trabalho à
juventude campesina, a educação do campo, passa a incorporar uma
dimensão empreendedora, por meio da criação de ações
colaborativas, aproximando e mobilizando todos os sujeitos
envolvidos sobre o espaço rural, para a descoberta de formas
sensibilizadoras à percepção e a criação de novos campos de atuação
profissional no meio rural. O mundo globalizado tem imposto atitudes
inovadoras às realidades locais, motivando à emergência de novas
possibilidades, que passem a assegurar a afirmação de identidades
socioculturais da vida local, porém, de forma sustentável. A
sensibilização, a percepção e a disponibilização à criação, apenas serão
reais, por um processo educativo, que promova a ambiência ao
aprender a aprender. O processo educativo, seguramente, um
movimento de formação humana, deve ter princípio por
aprendizagens, que partam de vivências cotidianas, constituindo
assim, impulso ao conhecimento, pela compreensão de fatores
interferentes e funcionalidade dos fenômenos, que compõe a
realidade sobre a qual este ser humano, esteja inserido. O campo, em
uma análise realista, na contemporaneidade brasileira, tem
manifestado reduzidas possibilidades e oportunidades de inserção
profissional, mesmo, visualizando, nestas últimas décadas, o que
sabemos, o “novo rural”. A escola do campo possui projetos
pedagógicos voltados à realidade do campo, proporcionando a
construção de saberes e fazeres, impulsionados por propostas
- 83 -
pedagógicas, que partam de conhecimentos locais, na busca de
soluções a questões emergentes. As evidências manifestadas com esta
ação, caracterizada pela parceria, tem representado o fortalecimento
de fortes vínculos entre os sujeitos envolvidos na construção de uma
educação campesina, que desperte no aluno do campo, a essência
geradora do significado do empreendedorismo - pró-atividade
visionária. O sentido de que o campo pode representar objeto de
desenvolvimento local, constitui, sobre uma educação em dimensão
empreendedora, fundamental eixo mobilizador do trabalho docente.
O jovem do campo tem futuro no campo. O jovem do campo pode
gerar oportunidades. O jovem do campo, participante ativo, deste
diálogo intergeracional, com os sujeitos, que presentificam a história
local, seguramente, estará preparando a continuidade e a afirmação
da identidade rural local.

Conhecendo a gestão da educação do campo na SMEd Santa Maria, RS:


A Rede Municipal de Ensino de Santa Maria (RME) atende
aproximadamente 20.000 alunos, distribuídos em 80 escolas, sendo 24
de Educação Infantil, 54 de Ensino Fundamental, dessas 12 ofertam a
Educação de Jovens e Adultos (EJA) e 02 de Ensino Profissionalizante,
contando com um quadro de 1.558 professores (EDUCACENSO, 2018).
Nesse contexto, 70 escolas situam-se no 1º Distrito/Sede, urbano, e 10
escolas situam-se no campo, sendo nove de Ensino Fundamental (com
classes de Educação Infantil) e uma de Educação Infantil. Cabe
ressaltar que em cada distrito há, pelo menos, uma escola ou turmas

- 84 -
de alunos da RME. Esse fato demonstra o quanto as escolas do campo
ocupam lugar de destaque dentro do distrito, tornando-se referência,
não apenas educacional, mas também sociocultural e local de
convívio/encontro dos sujeitos que residem nesse contexto.
Corroborando com o acima exposto, as Diretrizes Curriculares
Municipais, no artigo 5º, salientam que a Escola do Campo, é definida:

[...] pela sua identidade, pelas questões inerentes a


sua realidade, embasados na natureza e
temporalidade dos saberes próprios dos
educandos e, na construção democrática,
ancorada:
I. Na identidade individual e coletiva;
II. Na valorização da cultura da zona rural,
pertencente aos distritos do Município, onde estas
escolas estão inseridas, respeitando suas
multidimensionalidades e incorporando um olhar
privilegiado no que diz respeito ao currículo;
III. No respeito à cultura dos cidadãos do campo;
a) Agricultores familiares;
b) Assentados e acampados da reforma agrária;
c) Trabalhadores assalariados rurais nas chácaras;
d) Indústrias;
e) Quilombolas e demais populações residentes,
itinerantes e/ou vinculadas à vida e ao trabalho no
meio rural (SANTA MARIA, 2016).

Nessa tessitura, percebe-se a necessidade de implementar


políticas públicas educacionais que compreendam a articulação dos
saberes científicos e saberes populares de modo sistêmico, com vistas
à produção de saberes que evidenciem as especificidades dessa
modalidade de ensino, rompendo assim, com concepções e práticas

- 85 -
docentes que desconsideram as idiossincrasias da cultura rural. Nesse
viés, a Secretaria de Município da Educação institui no ano de 2017
uma proposta educativa voltada para os profissionais que atuam na
educação do campo que envolvesse não apenas a formação docente,
mas também a formação humana e a valorização dos diversos saberes
que constituem o processo educativo. Para abarcar tal propósito,
emerge no cenário educacional santamariense o Programa Municipal
Mosaico de Saberes do Campo (PROMSAC), o qual desmembra-se em
dois grandes eixos: Formação Continuada, específica, para docentes
que atuam nas escolas do campo e Turismo Rural Pedagógico-Veredas
do campo, voltado para todos os alunos da rede municipal de ensino
(Zona urbana e rural), com a identidade visual,

Figura 1: Identidade visual do Promsac

- 86 -
Para a concretização da proposta de formação continuada, a
Secretaria de Município da Educação desenvolve diversas ações,
como: encontros sistemáticos com os educadores que atuam em
Escolas do Campo, com vistas a subsidiá-los e apropriá-los da
proposta, Seminários, Cursos, Oficinas, Fóruns, entre outros que
objetivam ressignificar os processos que permeiam a prática
pedagógica desse contexto educativo. Tais encontros contam com a
participação das entidades parceiras, as quais, cada uma dentro de
suas habilitações, trabalham com os professores as especificidades,
conforme figuras 2 e 3, abaixo:

Figura 2: Encontro com Educadores do Campo

- 87 -
Figura 3: Foto de visita técnica nos distritos de Santa maria, RS

Ao compreender que a Escola do Campo deve apresentar, em


seu currículo, elementos que contribuam para o aprendizado e
valorizem os saberes sociais do lugar em que a mesma está inserida,
conforme prevê a LDBEN/96, tal formação se propõe a desenhar uma
ação docente mais empreeenderora que favoreça o desenvolvimento
tanto dos alunos quanto dos colaboradores envolvidos na proposta.
Assim, para concretude de uma educação empreendedora nas escolas
do campo, firmou-se, dentre outras, uma parceria com o Serviço
Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), a partir
do Programa Jovens Empreendedores Primeiros Passos (JEPP), cujo
cerne é fomentar a educação e a cultura empreendedora. O curso de
formação procura apresentar práticas de aprendizagem, considerando
a autonomia do aluno para aprender, além de favorecer o
desenvolvimento de atributos e atitudes necessários para a gestão da
própria vida. Para tal, os professores passam por uma capacitação,
- 88 -
com duração de 45 horas, contemplando o 1º e 2º ciclo do ensino
fundamental. Após o curso concluído, os professores aplicam a
metodologia recebida nas classes de 1º a 9º ano do Ensino
Fundamental. Ao projetar-se novas possibilidades para a Educação do
Campo evidencia-se o outro eixo do Programa, o Turismo Rural
Pedagógico “Veredas do Campo”, o qual evidencia a necessidade de
maior aprofundamento, compreensão e inclusão do conceito do
“Novo Rural”11 às práticas pedagógicas. Tal conceito tem por premissa
incorporar atividades até então consideradas como hobbies e/ou
pequenos empreendimentos no meio rural, tornando-os negócios
rentáveis, como os sítios de lazer, turismo rural, artesanato,
floricultura, além de outros serviços, como clubes, hotéis-fazenda,
dentre outros. A proposta consiste em fortalecer o desenvolvimento
da pluriatividade no meio rural a fim de diversificar as fontes de renda
e garantir uma maior sustentabilidade das famílias do campo. Assim,
percebe-se que a realidade que circunda a escola localizada no meio
rural começa a tomar novos rumos. Diante disso, é preciso que se
aproprie dos novos conceitos e funções que permeiam o contexto
escolar do campo, a fim de contribuir para o aprimoramento de
práticas que respeitem a identidade cultural dos estudantes e
familiares, o contexto social, cultural e econômico, entre outros

11
Novo Rural - Defende a ideia de que as áreas rurais do Brasil já não se restringem
mais às atividades relacionadas à agropecuária ou agroindústria. Nas últimas
décadas, o campo vem se transformando em um espaço múltiplo, com novas
funções que extrapolam tais práticas e oferecem diferentes oportunidades de
trabalho e renda (GRAZIANO DA SILVA,1999, p.170).

- 89 -
fatores que assegurem o acesso e a permanência desse educando na
escola com qualidade. Além disso, deve estimular o sentimento de
pertença, orgulho e respeito pelo meio onde habita.
Nesse novo cenário, insere-se o Turismo Rural Pedagógico por
representar um conjunto de atividades práticas realizadas no âmbito
rural, que utiliza, como ferramenta de ensino, os recursos naturais do
meio e as atividades agrícolas, pecuárias e artesanais. Constitui-se,
portanto, em uma alternativa pedagógica que objetiva articular os
saberes adquiridos em sala de aula com as diferentes realidades
ambientais e culturais que compõem o meio rural, com a premissa de
enriquecer o currículo escolar, considerando que o mesmo, vai muito
além da sala de aula. Ao desenvolver ações no âmbito das
propriedades rurais, os agentes educativos não serão apenas os
professores, mas também os agricultores, os proprietários rurais e
outros parceiros que vivem o cotidiano do campo, cujos saberes e
fazeres, trarão um novo enfoque às práticas curriculares. Com isso,
objetiva-se gerar situações de aprendizagem, relacionadas a
conteúdos curriculares e a valores éticos, que façam emergir atitudes
como: o desenvolvimento da capacidade de iniciativa e solidificação
de amizades; o respeito ao outro; o fortalecimento da noção de
pertencimento a um grupo ou a um ecossistema; a experiência de
autonomia; a elaboração conjunta de regras de convivência, dentre
outras (VINHA, 2005). Com vistas a consolidar suas ações, o PROMSAC
busca envolver em sua proposta, além dos professores, os diversos
atores como: alunos, pais, profissionais parceiros da Empresa de
- 90 -
Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER) do Serviço Nacional de
Aprendizagem Rural (SENAR), Sindicato dos Trabalhadores Rurais,
Universidade, proprietários rurais, Secretaria de Município de
Desenvolvimento Rural, Sindicato Rural, entre outras entidades locais.
Esta estratégia formativa, passa a revelar o caráter colaborativo,
ultrapassando as fronteiras escolares e atingindo a comunidade local,
por meio de parcerias interinstitucionais. Esta ação pedagógica passa
ser organizada por meio de um recurso de ensino, denominado
“Catálogo de potencialidades locais: aprendendo a conhecer e
compreender nossas identidades locais”, tendo nas imagens abaixo,
algumas das páginas temáticas;

- 91 -
O pressuposto teórico desta proposta pedagógica considera
que a atividade docente não é exercida sobre um objeto, fenômeno a
ser conhecido ou uma obra a ser produzida, e sim concretamente, em
uma rede de interações com outras pessoas, na qual o elemento
humano é central e estão presentes símbolos, valores, sentimentos,
atitudes, passíveis de interpretação e decisão (TARDIF, 2002). As ações
abrangem as dez escolas da Educação do Campo do Município, sendo
desenvolvidas in lócus e na forma de extensão, tendo também, veículo
especial, destinado pela Prefeitura Municipal de Santa Maria, RS,
conforme figura 4, abaixo:

Figura 4: Foto do ônibus disponibilizado para visitas técnicas com alunos e


professores da rede pública municipal da zona urbana e rural.

Cada escola com seu grupo de professores e estudantes realiza


atividades interdisciplinares que possibilitam a ampliação dos saberes
campeiros, como: visitas às propriedades rurais, indústrias ou pontos
de cultura, turismo e lazer de seu distrito e distritos vizinhos, dentre

- 92 -
outras. As atividades de ensino são construídas a partir de temas
previstos na Resolução nº 35/2016, do CMESM, que no artigo 45
preconiza:

[…] a abordagem de temas abrangentes e


contemporâneos que afetam a vida humana em
escala global, regional e local, bem como na esfera
individual. Temas como saúde, sexualidade e
gênero, vida familiar e social, assim como os
direitos das crianças e adolescentes, de acordo
com o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº
8.069/90), preservação do meio ambiente, nos
termos da política nacional de educação ambiental
(Lei nº 9.795/99), educação sanitária, educação
para o consumo, educação fiscal, trabalho, ciência
e tecnologia, diversidade cultural, práticas
agricolas, comerciais e industriais devem permear
o desenvolvimento dos conteúdos da base nacional
comum e da parte diversificada do currículo
(SANTA MARIA, 2016).

O currículo que permeia a Educação do Campo deve ir além dos


tradicionais conteúdos programáticos, contemplando a diversidade
sociocultural dos educandos, de modo a efetivar o processo de
inclusão. Isso não significa que os conteúdos historicamente
sistematizados percam sua centralidade no processo pedagógico, uma
vez que a apreensão e o domínio da ciência é função inquestionável
da Escola. Nesse viés, é primordial que os educadores façam o
exercício de conectarem os conteúdos programáticos com os
propostos do PROMSAC, desenvolvendo ações significativas para o
educando. Os resultados do Programa até então alcançados,

- 93 -
reproduzem-se nas dimensões subjetiva e objetiva. Na dimensão
subjetiva percebe-se que o sentimento de pertencimento aflorou
consideravelmente; o reconhecimento e a valorização de seu contexto
de vida; o resgate dos valores do campo; a motivação e o empreender
para a vida; dentre outros. Na dimensão objetiva evidencia-se a
emergência de condições para a melhoria da qualidade de vida e de
trabalho; a implementação de novas práticas docentes; a integração e
trocas inter e entre escolas, comunidade a demais atores; dentre
outras. Destaca-se como resultado concreto, também, a culminância
do trabalho anual das escolas em uma “Feira de Empreendedorismo e
Inovação da Rede Municipal de Ensino de SM”, onde ocorre a
comercialização, de forma cooperativa, de produtos das escolas
confeccionados no contexto das atividades do PROMSAC. Momento
que oportuniza a participação, a integração, as trocas, o
empreendedorismo, a inovação, a motivação e a valorização dos
sujeitos.
Conclui-se, enfatizando que o Programa Municipal Mosaico de
Saberes do Campo (PROMSAC), destaca-se, portanto, por ser uma
proposta inovadora, que procura inserir na formação integral dos
sujeitos, pessoas com conhecimento e saberes, além da academia e
dos muros escolares.

- 94 -
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- 96 -
Formação inicial de educadores do campo: contribuições do
PIBID Diversidade

Everton de Souza12

Introdução
Nos últimos anos, a formação de professores é uma das
temáticas que tem ganhado maior ênfase nas produções acadêmicas
e nas políticas públicas educacionais. Para Libâneo (2015, p.630), as
discussões sobre a formação de professores ganharam destaque, no
Brasil, ao seguir “a tendência mundial de investigações em torno desse
tema, originados em boa parte de organismos internacionais como a
OCDE, UNESCO e o Banco Mundial, chegando a constituir o maior
número de ensaios e pesquisas no campo da educação”.
O maior destaque dado à formação docente, decorre,
sobretudo, da preocupação de professores, pesquisados, gestores e
do Estado em melhorar a qualidade da educação no país, pois um dos
elementos necessários para mudar o cenário preocupante, no qual se
encontram os índices educacionais, é qualificar os profissionais que
estão em sala de aula. Contudo, apenas qualificar os professores não
tornará o país uma referência na educação, mas pode ser o primeiro
passo para sonharmos com uma outra realidade.

12
Especialista em Psicomotricidade e em Psicopedagogia Institucional, FESL.

- 97 -
Vale destacar que, apesar de mostrar-se interessado em
melhorar a qualidade da educação, o Estado tem permitido cada vez
mais a entrada, no campo educacional, do setor privado com
propostas que objetivam elevar apenas os números referentes as
avaliações em larga escala e não, propriamente, melhorar a qualidade
da educação. Peroni e Oliveira (2019, p.40) salientam que há uma
“crescente presença do privado mercantil e/ou neoconservador
definindo a educação pública”, prevalecendo sempre os interesses
específicos dos capitalistas.
As empresas privadas têm visto na educação mais um espaço
para lucrarem e inserirem a lógica do capital, a qual fundamenta-se na
competitividade e se alicerça nos resultados e premiações. Nóvoa
(2002, p.12), já nos alertava que “a educação está em vias de ser
considerada uma mercadoria submetida às leis do comércio e da livre
concorrência”. Contudo, Mészáros (2008, p.9), um crítico do
capitalismo, afirma que “a educação não é uma mercadoria”, que a
educação deve qualificar para a vida e não para o mercado.
Ao permitir que órgãos privados proponham e decidam a
educação, o Estado assume a sua incapacidade perante seu dever de
promover educação de qualidade a todos os cidadãos brasileiros, e
permite, também, que as desigualdades educacionais enraizadas em
nossa sociedade sejam alargadas, sobretudo, pelo conceito de
meritocracia defendido e difundido pela maioria dos defensores da
privatização da educação.

- 98 -
Neste texto, o objetivo é debater sobre a formação de
educadores do campo, porém, compreendemos que ao comentar
sobre formação docente e qualidade educacional é necessário fazer
um adendo à influência majoritariamente negativa da privatização da
educação, ainda mais para a educação do campo que historicamente,
pela pouca atenção recebida do Estado, mostrou-se vulnerável às
políticas elitistas, Freitas (2007), salienta:

A educação no meio rural brasileiro é marcada por


um quadro extremamente precário, refletindo os
graves problemas da situação geral da educação
brasileira. Embora a sua trajetória comece no início
do século XX, nenhuma das iniciativas alterou
positivamente esta situação, ao contrário, muitas
delas ajudaram a reforçar as sérias desigualdades
que marcam o campo no Brasil. Se o quadro geral
da educação no país ainda apresenta graves
problemas, no campo esses problemas são ainda
maiores (FREITAS, 2007, p. 18).

Perante o exposto, neste trabalho debateremos sobre a


formação docente inicial de educadores do campo. Para tanto, em um
primeiro momento abordaremos a formação docente em geral e, em
seguida, será tratado especificamente das contribuições do PIBID
Diversidade (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência
para a Diversidade) para a formação de educadores do campo.

- 99 -
A Formação de Professores no Brasil
Em nosso país, há de se reconhecer que a profissão docente
não é nem um pouco atrativa a quem busca uma profissão valorizada
e que possibilite ascensão socioprofissional. Para o português António
Nóvoa, “os professores nunca viram o seu conhecimento específico
devidamente reconhecido” (NÓVOA, 2002, p.22). A afirmação de
Nóvoa, se faz contextualizada ao Brasil, uma vez que, aqui, os
profissionais da educação nunca tiveram o prestígio que merecem.
A ideia de muitos de que quarenta ou cinquenta anos atrás os
professores brasileiros eram valorizados, não procede. O que se via no
passado eram professores sem uma formação adequada, com salários
ruins, escolas, em sua maioria, com estruturas precárias e professores
temidos por usarem, muitas vezes, procedimentos extremos contra
seus alunos. Atualmente, os docentes que chegam mais próximo de
terem um devido reconhecimento são os professores universitários,
pelos melhores salários, pelos bons planos de carreira e pela formação
que possuem. Contudo, nem por isso deixam de sofrer constantes
ataques injustos de políticos e ministros brasileiros que não conhecem
o dia a dia desses profissionais e, muitos menos, a importância que
eles possuem para o desenvolvimento do país.
Compreendemos que sem que a sociedade mude suas
concepções sobre a profissão docente, sem que o Estado reconheça a
importância dos profissionais da educação, sem melhores condições
estruturais e pedagógicas que tornem a escolas atraentes aos

- 100 -
profissionais e aos alunos, sem possibilitar uma sólida formação ao
magistério, entre outras tantas mudanças necessárias, a educação no
Brasil continuará trilhando o caminho do descaso e do fracasso. Para
Nóvoa (2002):

Nada será alterado se continuarmos a repetir, sob


as mais variadas formas, uma visão desvalorizada
da profissão docente. Uma maior exposição pública
exige níveis de confiança profissional que não são
compatíveis com muitas das imagens que
tradicionalmente circulam sobre os professores.
Uma das razões principais deste equívoco prende-
se com a convicção que o ensino é uma atividade
relativamente “simples”, que se exerce
naturalmente (NÓVOA, 2002, P. 23).

Ao comentar sobre a formação de professores, Penin (2001)


afirma que as instituições públicas brasileiras levaram muito tempo
para assumir a função de formar o magistério. Desta forma, as
instituições privadas assumiram o papel de principais formadoras de
professores, contribuindo com uma formação insatisfatória da maioria
dos licenciados.
A pouca atenção atribuída aos cursos de licenciatura pelas
universidades públicas ainda persiste, pois, atualmente, “os dados
mostram que cerca de 70% dos professores são oriundos de
instituições privadas” (BRASIL, 2013, p.72). Nos dias atuais, o grande
número de licenciandos em instituições privadas está diretamente
atrelado à educação a distância (EaD), pois “com nada mais que 1%

- 101 -
das matrículas em 2001, os cursos a distância chegam a abrigar 31,5%
dos alunos de licenciatura em 2011 e, em 2016, passam a atender 42%
dos estudantes”, a maioria deles em instituições privadas (GATTI et al,
2019, p.114).
Amaral (2016) afirma que a grande oferta de cursos à distância
por instituições privadas se dá pelo baixo custo desta modalidade,
segundo o autor os dados do MEC mostram que os custos da EaD
chegam a ser até 80% menores do que dos cursos presenciais. Os
cursos com baixo custo para sua execução resultam em baixas
mensalidades aos alunos, tornando-se atraente às populações
desfavorecidas financeiramente e aos que não conseguem ter acesso
às instituições públicas.
Para Gatti et al (2019, p.54), a EaD oferece importantes
qualidades para um país como o Brasil que apresenta realidades
geográficas tão diversas. Para os autores, essa modalidade poderia
ampliar as oportunidades educacionais, desde que “se bem construída
e posta em prática, dirigida a grupos e regiões específicos”, contudo:

[...] as práticas têm mostrado vários problemas. A


maneira como esses cursos vieram sendo
ofertados e se expandiram, com monitoramento
precário, por meio de polos pouco equipados,
tutoria pouco preparada e estágios realizados em
condições insatisfatórias, acaba por gerar
formações para o exercício da profissão docente
com excessivas lacunas. Também, como já
sinalizamos, não apresenta inovações curriculares
adequadas às características necessárias a uma

- 102 -
formação a distância, reproduzindo os currículos
presenciais cujos formatos e dinâmicas estão
igualmente em questão (GATTI et al, 2019, p 54).

A formação de professores pela EaD necessita de maiores


discussões, não basta formarmos professores em grande quantidade,
necessitamos de uma formação com qualidade para que os
profissionais estejam aptos a enfrentar os desafios da área, que não
são poucos.
Para Sant’Anna e Marques (2015, p.726), a formação docente
necessita de políticas educacionais eficazes que estimulem a formação
inicial e continuada, para que assim consigamos superar o desafio que
é formar um professor. Para os autores é necessário apresentar
“cenários atraentes para a inserção no mercado de trabalho com
salários justos, com a valorização da prática docente e com escolas
bem equipadas; que estimulem a pesquisa e o desenvolvimento de
novas tecnologias de ensino”.
Ao criticar os modelos tradicionais que são seguidos na
formação de professores no país, centrados, sobretudo, na
racionalidade técnica, Voigt et al (2013, p.8035) afirmam que esse
modelo tradicional está ultrapassado e não supre as exigências
educacionais da sociedade contemporânea, “nessa perspectiva, os
cursos de formação de professores precisam preparar profissionais da
educação que, além de conhecer o conteúdo da disciplina que
lecionam, dominem também os saberes do campo da educação”. É

- 103 -
necessário superarmos a atual forma, pouco reflexiva, como se
desenvolvem os cursos de formação de professores.
Gatti et al (2019, p.40), salientam que “a constituição da
profissionalidade docente demanda formação inicial consistente e
formação continuada como ampliação a atualização”. Entretanto,
Gatti (2008) salienta que os cursos de formação continuada estão
assumindo a função de preencher lacunas de uma formação inicial
precária e deixando de ser um meio de aprofundamento,
demonstrando a pouca eficiência dos cursos de graduação.
São inúmeros os problemas que assolam a formação de
professores no Brasil, para Freitas (2007):

As soluções dos problemas relativos à formação


dos professores não estão vinculadas a
questões técnicas, nem sequer a grandes
proposições teóricas. Elas se articulam com a
possível e devida apropriação, pelo Estado, dos
resultados dos estudos dos pesquisadores que
têm orientado os educadores, seus movimentos
e entidades no debate sobre os princípios e os
fundamentos da formação (FREITAS, 2007, p.
2027).

Devemos ouvir as orientações dos profissionais da área e criar


e dar continuidade às políticas educacionais que favoreçam a
formação de professores críticos e reflexivos, para que assim
consigamos superar os entraves que arruínam a formação de
professores no país. Só então começaremos a vislumbrar um país

- 104 -
melhor, pois o desenvolvimento da nação depende de uma educação
de qualidade e para uma educação de qualidade é indispensável que
as instituições formem professores capacitados e aptos à assumirem a
sua função na sociedade e dispostos a lutarem pela transformação da
realidade perversa que nos cerca.
Ressaltamos que passou do momento do Estado mudar a
forma de pensar a educação no Brasil, pois necessitamos
urgentemente de um plano de Estado para a educação, um plano que
seja contínuo independente do governo que esteja no poder, um
plano que seja definido pelos profissionais da educação, seja abraçado
pela sociedade e sem a intervenção da setor privado, caso contrário
nada mudará e continuaremos condenados ao fracasso escolar que
historicamente nos assombra e com o qual parecemos estar
conformados.

Educação do Campo
A luta das populações do campo por uma educação de
qualidade e contextualizada às realidades locais é marcada pelo
descaso e desinteresse dos governos a nível municipal, estadual e
nacional. O Estado parece fechar os olhos para um povo que necessita
de ser visto e valorizado.
Ao longo da história da educação brasileira, os camponeses
pouca atenção tiveram nas políticas públicas e nas reformas
educativas, isso refletiu duramente em índices educacionais inferiores

- 105 -
dessas populações quando comparados aos índices das populações
urbanas, resultando em uma histórica desigualdade educativa.
A árdua luta dos camponeses pela educação resultou em
importantes conquistas, inclusive quanto à formação de professores
do campo, como exemplo citamos o Programa Nacional de Educação
na Reforma Agrária - Pronera, o Programa de Apoio à Formação
Superior em Licenciatura em Educação do Campo - Procampo e o
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência para a
Diversidade - PIBID Diversidade.
Vale ressaltar que essas conquistas passam pela ação conjunta
dos camponeses, dos movimentos sociais, sobretudo, o Movimento do
Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, e, também, determinados
partidos políticos que sempre estão ao lado da classe trabalhadora nas
reivindicações populares que buscam reduzir as desigualdades sociais
presentes na sociedade brasileira.
A seguir, apresentaremos as contribuições do PIBID
Diversidade na formação de professores para o exercício em escolas
indígenas e do campo.

Contribuições do PIBID Diversidade


O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência para
a Diversidade - PIBID Diversidade, foi criado, em 2010, com a finalidade
de aperfeiçoar a formação inicial de docentes para atuarem em

- 106 -
escolas indígenas e do campo. O programa apresenta os seguintes
objetivos:

a) incentivo à formação de docentes em nível


superior; b) a contribuição para a valorização do
magistério indígena e do campo; c) a integração
entre educação superior e educação básica; d) o
desenvolvimento de metodologias específicas para
a diversidade sociocultural e linguística, na
perspectiva do diálogo intercultural; e) o
desenvolvimento de um processo formativo que
leve em consideração as diferenças culturais, a
interculturalidade do país e suas implicações para
o trabalho pedagógico (BRASIL, 2010, p.1).

Desde a criação do PIBID Diversidade, os subprojetos do


programa estão sendo abordados em diversas pesquisas que
objetivam debater as contribuições proporcionadas à formação de
futuros professores de escolas rurais. Nessas pesquisas o programa
tem se mostrado um importe elemento para uma formação
contextualizada às peculiaridades regionais das populações do campo.
Sant’Anna e Marques (2015, p.740), ao relatarem as
contribuições do PIBID Diversidade, desenvolvido na Universidade
Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri – UFVJM, para a
formação do educador do campo, afirmam que o projeto “possibilitou
uma mudança expressiva na atitude dos licenciandos em relação à sua
trajetória formativa”. Os autores destacam dois pontos desse
processo, o primeiro trata-se da:

- 107 -
[...] dificuldade inicial de sair de um modelo de
formação no qual predomina a reflexão teórica
para uma situação de aprendizado que se dá no
fazer, aprender fazendo. O confronto com a
realidade da escola do campo e sua comunidade
apresentou desafios que levaram os discentes a
construir alternativas e a pensar sobre elas. O
processo de ação-reflexão- ação criou condições
para que os discentes assumissem um papel de
protagonismo no seu processo de formação
(SANT’ANNA; MARQUES, 2015, p.740).

O outro ponto destacado pelos pesquisadores refere-se à:

[...] mudança de percepção em relação à escola e à


perspectiva de atuação profissional no magistério.
No grupo de licenciandos que participaram desse
subprojeto, foi possível verificar uma maior
vinculação com a escola do campo e um maior
comprometimento com a carreira docente
(SANT’ANNA; MARQUES, 2015, p.740).

Os autores ainda salientam que o projeto apresenta resultados


promissores, porém, necessita avançar em direção a uma maior
articulação entre escola e atores sociais, movimentos, associações,
entre outros, para estabelecer uma educação participativa e de
natureza identitária.
Lopes (2017), ao relatar sobre importância do PIBID
Diversidade na formação inicial de alunos da educação do campo,
afirma que os licenciandos dizem:

[...] ter aprendido e percebido a necessidade de se


ter boa formação para entender esses novos
sujeitos que se encontram no campo. Sujeitos

- 108 -
esses que historicamente foram marginalizados.
Nesse processo, se discute sobre práticas
pedagógicas diversas, entendimentos teóricos,
troca de experiências e um envolvimento do aluno
com a pesquisa acadêmica (LOPES, 2017, p.4).

Segundo o autor, com o projeto há uma maior aproximação


entre as instituições e a comunidade e um maior contato entre
professores experientes e alunos, acarretando em aprendizagens
significativas e discussões relevantes em torno das questões sociais
relacionadas à realidade local.
Ao inserirem um projeto Interdisciplinar em Educação do
Campo na Universidade Federal de Santa Maria - UFSM, por meio do
PIBID, Mumbach e Meurer (2015), afirmam que o programa:

[...] tem gerado consequências positivas para a


escola inserida no projeto, e principalmente para
os licenciandos participantes do mesmo, pela
oportunidade em ampliar seus conhecimentos,
adquirir prática e ampliar a sua formação como
educador. Como também tem buscado trazer
reflexões acerca da educação do campo para
dentro das licenciaturas da universidade
(MUMBACH; MEURER, 2015, p.76).

Ao inserir um projeto do PIBID Diversidade em escolas do


campo em vários municípios do Paraná, Ramos et al (2014, p.2047)
relatam que o projeto está “garantindo um espaço coletivo de estudos
e reflexão sobre a prática docente nas escolas do campo envolvendo

- 109 -
educadores e educandos universitários, educadores e educandos das
Escolas de Ensino Básico das Escolas do Campo e comunidade”
O objetivo central do PIBID é aperfeiçoar o processo inicial da
formação de professores. Contudo, os licenciandos não são os únicos
beneficiados pelo projeto, tal fato pode ser observado no relato,
abaixo, de um supervisor do PIBID:

O PIBID Diversidade tem contribuído para minha


formação profissional nas dimensões prática e
teórica. Ao acompanhar e supervisionar os
estudos, leituras e reflexões dos alunos a partir das
referências indicadas pela coordenação, tenho me
apropriado de conceitos e categorias teóricas
novas, o que tem me possibilitado uma maior
compreensão do contexto da educação
intercultural. Por sua vez, as visitas às comunidades
dos alunos me puseram em contato com a
realidade das escolas indígenas, bem como
possibilitaram-me compreender ainda mais as
especificidades da educação escolar indígena, e
isso tem impactado minhas ações enquanto
professor (BRASIL, 2013, P.104).

O projeto PIBID tem se mostrado como um importante


elemento para a qualificação inicial de docentes e, também,
ressignificado as concepções dos professores formadores envolvidos,
para Rausch e Frantz (2013, p. 626), o projeto está contribuído para
uma formação “mais contextualizada à realidade educacional, com
mais conhecimento prático e teórico acerca da profissão docente”.

- 110 -
Considerações Finais
A educação do campo necessita de profissionais capacitados e
aptos a exercerem a profissão com dedicação, professores que
compreendam a importância da sua profissão não somente para a
escola, mas também para a existência da comunidade local, Nóvoa
(2002, p.24) salienta que “os professores têm de ser formados, não
apenas para uma relação pedagógica com os alunos, mas também
para uma relação social com as comunidades locais.”
No Brasil, precisa-se de projetos de iniciação à docência
consistentes que comtemplem a diversidade cultural, social e
econômica do país, projetos que atinjam as mais diferentes
populações, em especial àquelas que sempre foram marginalizadas e
excluídas, como, por exemplo, os moradores da zona rural. Para
Sant’Anna e Marques (2015):

Os projetos de formação de educadores do campo


devem, portanto, oportunizar espaços formativos
que extrapolem os muros das universidades, que
levem o discente a interagir com a diversidade do
campo, com os seus saberes e formas de
construção e apropriação do conhecimento.
Insere-se, nesse contexto, a reflexão política sobre
os projetos de campo em discussão no cenário
brasileiro (SANT’ANNA; MARQUES, 2015, p.732).

A literatura da área revela que o PIBID Diversidade é um dos


projetos que estão contribuindo para uma formação inicial mais
contextualizada às realidades do campo. O projeto permite um maior

- 111 -
período dos pibidianos no contexto escolar e uma atuação mais ativa
dos licenciandos quando comparado aos estágios obrigatórios. O
projeto também tem contribuído com a formação profissional dos
supervisores por meio dos estudos e das relações vivenciadas, além
disso, as atividades realizadas no projeto contribuem com melhorias
nas escolas e nas comunidades locais.

- 112 -
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Nacional de Educação – EDUCERE, Curitiba, 2013.

- 114 -
A escola vai ao campo: o ensino de Geografia em tempos de
pandemia

Letícia Ramires Corrêa13


Rafael Lesses da Silva14

Introdução
Não há como separar o tempo e espaço, sendo que os dois
estão continuamente interligados, um em relação ao outro (ROCHA,
2017). Seu significado (tempo e espaço), porém, necessitaram ser
“ressignificados”, desde o início do atual surto de coronavírus (SARS-
CoV-2), causador da Covid-19. O tempo e o espaço escolar
demandaram uma adaptação rápida. Bem como o ensino de geografia.
A sala de aula deu lugar à sala das residências dos alunos; o
quadro branco deu lugar a tela dos computadores, celulares e tablets;
o educador e mediador do conhecimento não estão mais diante dos
alunos e sim do outro lado das telas; os pais e/ou responsáveis
tornaram-se figuras importantes nesse processo, auxiliando na
mediação;

13
Doutoranda em Geografia, UFSM. Professora da Rede Municipal de Ensino de Vila
Nova do Sul. E-mail: leticiarcorrea@gmail.com.
14
Especializando em Gestão Educacional, UFSM. Professor da Rede Estadual de
Ensino do Rio Grande do Sul. E-mail: lessesrafael@gmail.com.

- 115 -
O tempo não é mais o mesmo, não há sinal da escola para
controlar os períodos e intervalos; não necessitam acordar cedo para
estar no ponto de ônibus para tomar o transporte escolar; as
atividades são recebidas e realizadas no tempo de cada aluno;
E como se dá o ensino de geografia em uma escola do campo
em meio ao isolamento social? Este capítulo busca discutir o ensino de
geografia no período de isolamento social, trazendo as vivencias,
práticas e desafios na Escola Municipal Maria Pereira Teixeira,
localizada no Município de Vila Nova do Sul (RS, Brasil).
Ressalta-se a relevância do uso da internet e das redes sociais
para a comunicação com os alunos, porém ainda encontramos uma
parcela considerável de alunos que não tem acesso a internet ou até
mesmo a um “pacote” de dados que possibilite uma navegação por
vídeos e sites para a realização de pesquisa e acabam por demandar
um outro movimento dos professores e equipe diretiva no que refere-
se não apenas ao desenvolvimento das atividade, mas na chegada
desse material pedagógico até o aluno. Lembrando que essa situação
também se coloca como algo novo diante da realidade escolar. Afinal,
o professor tem sua familiarização com o espaço da sala de aula bem
como na mediação das discussões e trocas de experiências
possibilitadas por intermédio desse espaço e contato entre professor
e aluno.
Os desafios são grandes, para reafirmar a importância do
ensino de geografia, principalmente em tempos de Pandemia.

- 116 -
Continuar a mediar as discussões e instigar os alunos para o estudo da
ciência geográfica. No caso da Geografia, o professor deve buscar
aproximar cada vez mais os conceitos (espaço, lugar, paisagem, região
e território) das vivencias socioespaciais dos alunos, a fim de explicar
e exemplificar situações reais de seu cotidiano (TRINDADE, 2017). Mas
como fazer isso à distância? Como fazer-se entender através dos meios
eletrônicos? Como instigar os alunos a pesquisar em plataformas
digitais assuntos pertinentes aos temas desenvolvidos nas atividades
se por vezes os mesmos não tem acesso à internet ou a um pacote de
dados que possibilite tais pesquisas? Como tornar o material
pedagógico mais acessível? Como avaliar a devoluta da realização das
atividades? Como considerar a singularidade e o tempo de cada aluno
nesse espaço familiar que por vezes ele é pressionado a assumir
distintos papeis e funções? São alguns dos questionamentos atuais dos
educadores, não apenas da Geografia, mas todos da área da educação.
Sendo assim este capitulo busca discutir algumas estratégias para
manter o ensino de Geografia durante o isolamento social.
Qualquer profissional em início de carreira encontra muitos
desafios. Não é diferente com os jovens professores em Geografia, que
se depara com a dificuldade em instrumentalizar os conceitos básicos
em seus planos de ensino. Se em sala de aula, com acesso direto ao
livro didático, manuseio e criação junto aos alunos, comunicação
direta com a equipe diretiva já é um grande desafio, o que falar sobre
a realização destas tarefas a distância? Sem o olho no olho? Sem a

- 117 -
troca das experiências? Sem as discussões que são tão pertinentes
para a construção do conhecimento?

A escola do campo em isolamento social


Com aumento no número de casos de coronavírus no Brasil,
suspendeu-se as aulas presenciais da rede pública e privada em todo
o país. A medida serve para evitar aglomerações e deslocamentos.
Segundo a Organização Mundial da saúde (OMS) e Ministério da
Saúde, uma das únicas e melhores formas de parar/retardar a
transmissão de casos de propagação do vírus, que até o momento não
conta com um tratamento ou a disponibilidade de vacina ou
medicação para o combate do mesmo. Sendo assim a única solução é
ficar em isolamento social. Sem aulas formais e presenciais, as escolas
têm adotado a educação a distância (EaD), com uso de computadores
e atividades complementares, para dar continuidade à aprendizagem
dos estudantes.
Ao longo dos tempos, o Brasil vem enfrentando muitos
problemas educacionais, não é de hoje que o governo tem
disponibilizado a área uma pequena fatia do “bolo” e nos últimos anos
isso tem se acentuado ainda mais, medidas que também resultam da
aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC), sancionada
no ano de 2016 que prevê o congelamento de investimentos por parte
do governo no âmbito da educação e da saúde por 20 anos. Atitudes
que poderiam aumentar ainda mais as desigualdades sociais no Brasil

- 118 -
conforme sinalização dos Órgãos das Nações Unidas- ONU em carta
aberta ao país. O fato é que o governo bem como os demais órgãos
responsáveis por investimentos nas áreas, que são tão cruciais para o
desenvolvimento intelectual e cultural de uma sociedade, se isentam
de suas responsabilidades e deixam tais áreas à mercê, de
privatizações como meio único de salvação. Quatro anos após a
aprovação da “PEC da morte”, como ficou conhecida, nos deparamos
em meio a uma pandemia, que apenas revelou o quão desigual ainda
é nosso país e o quão distante estamos de possibilitar um
conhecimento que esteja ao alcance de todos e todas. Não por falta
de vontade do corpo docente, mas pelo desamparo de condições
básicas para “o partilhar do conhecimento”. Parte do que colhemos
hoje, como salários baixos aos educadores, infraestruturas escolares
precárias, falta de reconhecimento pela sociedade, evasão e
reprovação, desvios de repasses de verbas, amplo analfabetismo
informal com resultados negativos nas avaliações internas e externas
(AVELINO; MENDES, 2020),
resultam de uma escolha de parlamentares e senadores que não
consideraram opiniões de professores, alunos, comunidade escolar
que convivem diariamente nestes espaços.
Ainda que a educação seja um direto social, devendo ser
garantida com qualidade, a qualquer indivíduo, seja do meio urbano
quanto no rural. Entretanto não está disponível para todos,
especialmente para a população do campo (BELING; CANCELIER,

- 119 -
2019). Em tempos de Pandemia e isolamento social, em função do
coronavírus (SARS- CoV-2), causador da Covid-19, essas dificuldades e
problemas se agravaram, e mostrando a verdadeira face da educação
e de suas mazelas, principalmente do campo. Ao longo dos anos as
escolas do campo foram negligenciadas pelo Estado, a partir do
fechamento de muitas escolas, limitação de recursos (AGUIAR, 2000),
o que resultou em um alto índice de analfabetismo, aproximadamente
a 23,3%, para aqueles acima de 15 anos (MOLINA; FREITAS, 2011). Bem
como a evasão desses estudantes, que agora tiveram que encontrar
meios de se deslocar aos centros urbanos na busca de ensino.
Entretanto, inicialmente as dificuldades não estão apenas nessa busca,
mas sim também no deslocamento dos estudantes até esses espaços.
Afinal, ainda é possível encontrar prefeituras que não oferecem o
suporte para o deslocamento desses estudantes até as instituições, e
quando oferecem por vezes, são em pontos comuns que acabam
distante da casa dos estudantes. Diante desta Pandemia as escolas do
campo, as que ainda resistem, entraram no isolamento social. O
Estado em uma estratégia desesperada iniciou aulas à distância, mas
desconsiderou as dificuldades de uma parcela desses estudantes, que
ficaram as margens nesse processo. Aulas que para acontecer
precisam ir de encontro aos alunos, precisam chegar a todos. Mas
como se dará esse processo, sendo que muitos estudantes ainda estão
restritos a esse meio tecnológico? Do que vale considerar a existência
de um celular nesse processo se o mesmo não possui um pacote de

- 120 -
acesso às redes? Muitos estudantes tem sua “vida” em meio à
tecnologia atualizada na escola, quando este espaço disponibiliza um
sinal de Wifi com acesso aberto a rede ou até mesmo por intermédio
de computadores e tablets. Mas como pensar em pedagogias para
esses alunos, que estão as margens das políticas educacionais? É
valido o não cancelamento do ano letivo nessas circunstâncias em que
muitos estudantes não estão tendo acesso aos materiais base
elaborado pelos professores?
Diante disso, as dificuldades das escolas frente aos meios
tecnológicos, bem como de infraestrutura que comportem tais
tecnologias são existentes e se fazem latentes nesse momento.
Infelizmente, as escolas não estão preparadas para esse tipo de
situação, muito menos os educadores que agora se colocam diante de
um ensino impar do cotidiano da sala de aula.
A pesquisa realizada pelo Instituto Península, com 7.734 mil
professores de todo o país entre os dias 13 de abril e 14 de maio de
2020, revela que mesmo após seis semanas de isolamento social, 83%
dos professores brasileiros, em média, sente-se nada ou pouco
preparados para o ensino á distancia, que virou rotina em diferentes
pontos do país (INSTITUTO PENÍNSULA, 2020).
Diante deste momento de isolamento social, é que se percebe
as enormes limitações que as escolas possuem. O coronavírus fez a
educação do campo esbarrar no desafio do acesso à internet e na
inexperiência dos educadores e alunos. Sem aulas presenciais, as

- 121 -
escolas adotaram a educação à distância (EaD), com o uso de
computadores e atividades complementares, para dar continuidade
ao processo de ensino-aprendizagem dos alunos (VALADARES, 2020).
Ou para alimentar a utópica visão de que esses meios, adotados até o
momento, são aplicáveis tanto na realidade das escolas de perímetro
urbano como nas escolas do campo. E sabemos que na realidade isso
não se aplica, não se concretiza. No entanto, nem todos os estudantes
do país têm acesso a computadores e à internet de qualidade. Outro
desafio é manter a concentração e a rotina de estudos de alunos de
menor idade, muitos em processo de alfabetização, enquanto os pais
também trabalham em casa e/ou não possuem preparo profissional
para ensinar os filhos. Outra realidade considerável, nesse processo de
aprendizagem é que muitas famílias residem em pequenos espaços, e
assim nem sempre o aluno encontra um local “reservado” em que ela
consiga estudar ou até mesmo ler o material pedagógico. Em um
áudio, que circulou pelas redes sociais e sensibilizou muitas pessoas,
um aluno do primeiro ano, do Rio Grande do Sul, que tem sido ajudado
pela sua mãe na realização das tarefas escolares, declara:

Oi professora tudo bem? a mãe, a mãe, não eu não.


Assim, você professora sem você, professora, mas
eu não consigo aprender bem. A mãe não é igual,
não é igual a você. Você tem as manias de prof, a
minha mãe não tem, ela trabalha no Restaurante
ela só tem a mania de fazer comida. Me desculpe
te incomodar agora só que eu queria falar para a
senhora isso (GAZETA WEB,2020).

- 122 -
No áudio, o aluno relata sobre a falta que a professora faz, com
os desafios de ter que realizar os estudos em casa, contando com a
ajuda de sua mãe, que não possui formação profissional para orientá-
lo. Mesmo com todos esses desafios os professores se dedicam e
fazem o possível para manter a chama da educação acesa.
Diante desta pandemia, percebeu-se o quanto, a escola do
campo foi marginalizada, tendo em vista que os programas de acesso
à educação à distância não consideram a realidade das escolas rurais.
O campo não é somente um espaço de produção agrícola, mas
também de produção de vida e cotidiano, onde se constrói de
diferentes maneiras relações econômicas, sociais e culturais (BELING;
CANCELIER, 2019). Nesse sentido a escola do campo se dá a partir de
suas práticas educacionais e pedagógicas e pode possibilitar a
formação de sujeitos críticos, capazes de compreender a totalidade e
mudar a realidade, não apenas local, mas diante de um agir
globalmente. Esses estudantes não são tabuas rasas a espera de
polimento, são corpos ativos, e também contribuem para o
desenvolvimento intelectual da comunidade em que habitam. A escola
do campo possui papel relevante no contexto em que estão inseridas,
principalmente em tempos de Pandemia, suas ações devem estar
focadas na busca da aproximação da realidade dos sujeitos que vivem
no campo com seu espaço, a fim de se tornar um local difusor de
dinâmicas capazes de atender as especificidades locais.

- 123 -
A Geograficidade do campo em tempos de Pandemia
A Geograficidade é a condição espacial da existência do
homem em qualquer sociedade. O equivalente do que em filosofia
Heidegger designa a mundanidade do homem. Ou em outro contexto
Hegel designa o ser-estar do homem no mundo (DICIONÁRIO
INFORMAL, 2013). Um dos desafios da geografia como ciência, é dar
conta da Geograficidade inerente à nossa existência. Contudo, é por
meio desta Geograficidade que se sabe quase tudo acerca da
Pandemia Covid-19. E se pode compreender as dificuldades que o
professor de geografia vem enfrentando, em relação ao ensino a
distância nesse atual formato de realização pedagógica mesmo sem
qualquer formação prévia adequada para a execução da mesma,
durante esse isolamento social.
Por muitos anos, se falou do ensino de Geografia, como uma
disciplina “tediosa” e conteudista, sem lugar fora das salas de aula,
totalmente formal e limitada aos mapas impressos. Mesmo após a
mudança teórica que foi com o movimento da Geografia Crítica, esta
a visão, a de uma Geografia que não apenas teoriza, e não apenas
descreve. Mas a Geografia contemporânea e sua multiplicidade
teórica e metodológica lhe permitem ir muito além desta visão
simplista, reducionista em quem o ensino Geográfico se reduz ao
mapa. Neste momento de Pandemia, aos mapas são lidos
constantemente, e divulgados pelas mídias, para localizar e quantificar

- 124 -
os casos de COVID-19 no Brasil e no mundo. São usados como modo
de sinalizar os focos de uma pandemia que chega a todos sem
qualquer restrição, que se alastra como focos de incêndio, queimando
atingindo tudo o que está em seu caminho. Chamas invisíveis que se
alastram sorrateiramente e silenciosamente.
A Pandemia permite observar claramente as diversas
dificuldades que a sociedade e suas múltiplas espacialidades dos
sujeitos que não apenas vivem, mas constroem o espaço (AMPARO,
2020). Enquanto pessoas saem para realizar o isolamento social com
seus familiares em praias particulares, fazendas restritas e até mesmo
tal realidade se mantém em um paralelo, considerando que muitos
brasileiros residem em comunidades, formado por aglomerações
habitacionais como é o caso da Rocinha na Zona Sul do Rio de Janeiro,
considerada a maior comunidade do país, com 69.161 habitantes em
23.352 domicílios. E é do Brasil a maior favela da América Latina,
localizada em Sol Nascente no Distrito Federal, com 79 mil habitantes
(IBGE, 2010). Realidades que cada vez se colocam enquanto um
imenso abismo social que muitos empresários e políticos acabam por
negar e não considerar em políticas inclusivas ou de auxílio a essas
famílias.
Assim, enquanto alguns aparecem defendendo a continuidade
de um sistema que claramente não funciona, no qual a solidariedade
é reduzida a ações de caridade, outros estão, efetivamente, utilizando
a pandemia para refletir sobre nossa vulnerabilidade como espécie

- 125 -
(BITTENCOURT, 2020). Bem como o potencial catastrófico das grandes
epidemias históricas, como a gripe espanhola (sec. XX) ou a peste
bubônica (sec. XIII) e a tuberculose (século XIX).
Diante desse cenário, o professor de Geografia busca, assim
como as outras disciplinas, dar continuidade ao processo de ensino-
aprendizagem com os seus alunos. O ensino de Geografia é central ao
desenvolvimento do pensamento espacial e do raciocínio geográfico
dos estudantes, para compreender as causas e consequências do
COVID-19, pensando em uma escala local-global. Por meio das
interpretações do espaço geográfico, dos lugares, das paisagens, das
regiões, dos territórios, e das diferentes realidades em que todos se
encontram nesse período de isolamento social. E o objetivo do
professor de Geografia é construir aulas que permitam aos estudantes
a compreensão do mundo e, consequentemente, a questionar e
interpretar criticamente a realidade em que vive-se.
Diante deste período em que vivemos, ensinar Geografia é,
acima de tudo, construir junto ao aluno um domínio de elementos que
dão significado ao indivíduo que permitam ler o mundo e partir disso
desenvolva um pensamento crítico (CASTROGIOVANI; COSTELLA,
2006). Em um contexto de crise a possibilidade de discutir as relações
do ser humano e a natureza a partir do ensino de Geografia (REGO;
SUERTEGARAY; HEIDRICH, 2000), é importante valorizar a utilização de
novas abordagens que leve os indivíduos a pensar o lugar, no âmbito
de articular a educação e a Geografia para a construção de um

- 126 -
pensamento crítico (CALLAI, 2005). É nesse contexto que este trabalho
buscar trazer vivencias do ensino de Geografia na escola do município
de Vila Nova do Sul, RS, em período de Pandemia. Vamos discutir os
desafios encontrados e as estratégias traçadas para superar as
dificuldades do ensino EaD.

Vivencias, práticas e desafios na cidade dos ventos: Vila Nova do Sul


A Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEF) Maria
Pereira Teixeira, está localizada no município de Vila Nova do Sul (RS).
Possui 447 alunos (segundo dados do Censo Escolar de 2019) em
Educação Infantil, Ensino Fundamental I e Ensino Fundamental II.
Segundo o último Censo do IBGE (2010) o município de Vila Nova do
Sul possui uma população de 4.221 habitantes.
A escola está localizada na área considerada urbana, porém
boa parte dos alunos reside na área rural. Desta forma busca-se
trabalhar na valorização do campo. E a aproximação dos conteúdos de
Geografia com a realidade dos alunos.
Durante a pandemia a escola traçou uma estratégia para levar
a todos os alunos, as aulas preparadas, de acordo com a Base Nacional
Comum Curricular (BNCC) e o Referencial Curricular Gaúcho (RCG),
com o objetivo é articular o conhecimento da ciência geográfica com
a atualidade e a realidade dos alunos.
A BNCC permite que a Geografia seja incorporada desde os
anos iniciais do Ensino Fundamental, uma mudança estrutural

- 127 -
importante da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (TREVISAN,
2020). Na nova abordagem proposta pelo documento, a ênfase é
sobre o pensamento espacial e o raciocínio geográfico. Para se
aproximar dos objetivos de aprendizagem. Faz se necessário
aproximar os alunos do contexto em que vivemos e fazer o movimento
reverso, onde a escola vai ao campo. Desta forma organizou-se uma
Tabela com o Plano de Trabalho da disciplina de Geografia. O Plano de
Trabalho Docente é um documento que registra tudo o que o
professor pretende dar na prática, dentro da sala de aula, mas no caso
o Plano foi criado para as aulas à distância. Foi uma maneira de
organizar o ensino e a aprendizagem dos alunos à distância. E tem
como objetivo orientar e direcionar o trabalho do professor de
Geografia.
Nesse sentido o Plano de Trabalho para o ensino de Geografia
na EMEF Maria Pereira Teixeira em situação de isolamento social,
contou com as seguintes estratégias:
• Objetivo geral da disciplina de Geografia do ensino
Fundamental II;
• Conteúdos programáticos para o I trimestre do ano
letivo;
• As habilidades da BNCC que abarcam os conteúdos a
serem trabalhados;
• A metodologia e recursos didáticos para aulas à
distância;

- 128 -
• A avaliação que ocorre de forma continuada e que deve
respeitar a realidade dos alunos;
Como estratégia para a aproximação e comunicação com os
alunos foi organizado uma adaptação dos conteúdos, afim de articular
com a realidade deles e a atual Pandemia. A educação básica para o
meio rural é tratada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB)
9.394/96 no Artigo número 28 prevendo adaptações de conteúdos e
de metodologia de ensino, como designa-se abaixo:

I – Conteúdos curriculares e metodologias


apropriadas às reais necessidades e interesses dos
alunos da zona rural; II – organização escolar
própria, incluindo adequação do calendário às
fases do ciclo agrícola e às condições climáticas; III
– adequação à natureza do trabalho na zona rural
(BRASIL, 1996, p. 16).

Com embasamento na LDB, a metodologia como menciona


Oliveira (2006, p. 89) “deve ser aquela que parte da prática do aluno
numa relação prática-teoria-prática”, sendo necessário um empenho
por parte dos docentes e dos pais, com o objetivo de criar condições
que ajudem no processo de aprendizagem dos alunos, priorizando as
relações entre comunidade, saberes local e o âmbito escolar, mesmo
em isolamento social. Como menciona Meurer & David (2008, p.46) “a
escola itinerante é necessária e fundamental para assegurar o direito
à educação em função do grande número de crianças em idade escolar
e de adultos analfabetos nos acampamentos”.

- 129 -
Diante dessa situação de isolamento criou-se um “avatar” da
professora (FIGURA 1), que se comunica através de balões de diálogo
com os alunos, passando instruções das atividades.

Figura 1: “Avatar” da professora para dialogar com os alunos.

Fonte: autores, 2020.

Todas as aulas foram construídas e enviadas para a escola e


para a Secretaria Municipal de Educação (SMED) do município, assim
foram impressas e entregues aos alunos que não possuem acesso à
internet. Organizou-se os conteúdos de acordo com conteúdos
programáticos da escola e com a BNCC (TABELA 1). Priorizou-se a
articulação das atividades com a Pandemia do coronavírus a fim de
contextualizar os alunos, instigando e movimentando reflexões acerca
dos desafios de maneira global a partir do local, transportando as
vivencias e conectando com o mundo.

- 130 -
Tabela 1- Plano de trabalho docente para a disciplina de Geografia da EMEF
Maria Pereira
Metodologia
Tema da
Ano Habilidades e recursos Avaliação
aula
utilizados
(EF06GE01) Texto
Comparar introdutório;
modificações das Imagens de Avaliação
Paisagem
paisagens nos pontos continuada;
geográfica
lugares de vivência e históricos da acompanhamento
eo
os usos desses Itália antes de dúvidas e
movimento
lugares em de depois do realização das
da vida
diferentes tempos. COVID-19; atividades.
(EF06GE02) Analisar Atividades
modificações de de reflexão
6º paisagens por Charge
diferentes tipos de sobre a
sociedade, com teoria da
Planeta Avaliação
destaque para os Terra Plana;
Terra: De continuada;
povos originários. texto
onde acompanhamento
(EF06GE08) Medir introdutório;
viemos e de dúvidas e
distâncias na imagem do
para onde realização das
superfície pelas sistema
vamos? atividades.
escalas gráficas e solar;
numéricas dos manchete de
mapas. notícia
(EF07GE07) Analisar Texto
a influência e o papel introdutório; Avaliação
das redes de Formação mapas da continuada;
transporte e do formação do acompanhamento
comunicação na território território de dúvidas e
configuração do brasileiro brasileiro; realização das
7º território brasileiro. atividades atividades.
(EF07GE08) de reflexão;
Estabelecer relações Texto
As Avaliação
entre os processos introdutório;
paisagens continuada;
de industrialização e manchetes
físico- acompanhamento
inovação tecnológica de jornais
naturais do de dúvidas e
com as que

- 131 -
transformações Brasil nas abordam as realização das
socioeconômicas do mídias paisagens do atividades.
território brasileiro. Brasil;
atividades
de reflexão;
EF08GE01) Descrever Texto
as rotas de dispersão introdutório;
da população mapa com Avaliação
humana pelo planeta os casos de continuada;
COVID-19
e os principais fluxos COVID-19; acompanhamento
em
migratórios em imagens de dúvidas e
números
diferentes períodos sobre a realização das
da história, Guerra Fria; atividades.
discutindo os fatores atividades
históricos e de reflexão
condicionantes
físiconaturais
associados à
8º distribuição da
população humana
pelos continentes;
Avaliação
(EF08GE02) Município
Texto continuada;
Relacionar fatos e de Vila
introdutório; acompanhamento
situações Nova do
atividade de dúvidas e
representativas da Sul, RS,
reflexiva realização das
história das famílias Brasil.
atividades.
do Município em que
se localiza a escola,
considerando a
diversidade e os
fluxos migratórios da
população mundial.
Texto Avaliação
(EF09GE05) Analisar
introdutório; continuada;
fatos e situações O COVID-
letra de acompanhamento
para compreender a 19 e o
música; de dúvidas e
integração mundial mundo
atividade de realização das
9º (econômica, política
reflexão atividades.
e cultural),
Texto Avaliação
comparando as Geografia
introdutório; continuada;
diferentes do COVID-
manchetes acompanhamento
interpretações: 19
de notícias; de dúvidas e

- 132 -
globalização e atividade de realização das
mundialização; reflexão; atividades.
(EF09GE18)
Identificar e analisar
as cadeias industriais
e de inovação e as
consequências dos
usos de recursos
naturais e das
diferentes fontes de
energia (tais como
termoelétrica,
hidrelétrica, eólica e
nuclear) em
diferentes países.
Fonte: Org. autores, 2020.

A partir deste Plano de Trabalho buscou-se, mesmo à distância,


a interação com o aluno, objetivando despertar o sentimento de
acolhida do mesmo por professores e escola. Diante disso foram
propostas atividades que estimula o pensamento crítico com base nos
saberes do campo.
Com o 6º ano foram propostas atividades de leitura e analise
da paisagem, utilizando imagens de pontos turísticos da Itália (FIGURA
2), antes de depois da Pandemia, a fim de problematizar a atual
conjuntura em que vivemos com o conceito de paisagem.

- 133 -
Figura 2 – Fotos de pontos turísticos da Itália, antes de depois do isolamento
social. A- Basílica e Praça São Pedro (antes da COVID-19);B - Basílica e Praça
São Pedro (depois da COVID-19); C - Monumento do Coliseu (antes da COVID-
19); D - Monumento do Coliseu (depois da COVID-19); E - Fontana di Trevi
(antes da COVID-19); F - Fontana di Trevi (depois da COVID-19);

A B

C D

E F
Fonte: VEJA, 2020.

Os alunos foram instigados a pensar os efeitos da Pandemia nas


paisagens pelo o mundo, e desenvolver o pensamento sobre as
consequências desse período em que a humanidade vive. Diante dessa
problemática eles desenvolveram a dinâmica da “Ilha” (FIGURA 3), que

- 134 -
inicialmente consiste em desenhar uma ilha, sem a interferência
humana, a fim de que os alunos destaquem os elementos naturais da
paisagem. Posteriormente, são convidados a realizar o movimento
reverso, agora devem desenhar em cima do desenho original,
intervenções humanas, como pontes, casas, cercas, barragens e
demais elementos. O objetivo era que os alunos percebessem a
diferença da paisagem natural e para a paisagem humanizada, e que o
ser humana necessita, intrinsecamente, dos elementos naturais para
sobreviver.

Figura 3 – Trabalhos sobre a Dinâmica da “Ilha” realizada pelos alunos do 6º


ano.

Fonte: Arquivo pessoal, 2020.

Esta atividade estimulou e motivou os alunos a pensar o


conceito de paisagem, de maneira criativa. Como no 7º ano trabalha-
- 135 -
se com a formação do território brasileiro, buscou-se abordar como o
Brasil é visto pela mídia internacional, com foco nas suas paisagens
naturais. Para contextualizá-los realizou-se o seguinte
questionamento: “Como eu descreveria meu país em tempos da
Pandemia COVID-19?”.
Com os alunos do 8º ano trabalhou-se o município de Vila Nova
do Sul, com o intuito de valorizar a cidade. A atividade proposta foi
chamada de “Vila Nova do Sul em mente”. Considerando que as
cidades sofrem modificações com o passar do tempo, e em muitas
ocasiões um espaço utilizado para uma determinada função pode
passar a realizar outra atividade, ou até mesmo pela circulação de
pessoas em determinados espaços. O professor Milton Santos chama
isso de rugosidade. Ao longo da História as ações humanas e as
sociedades vão imprimindo suas construções ao espaço geográfico,
registrando suas atividades, seus costumes, suas tecnologias, suas
culturas. Diante disso foi proposto aos alunos que escrevessem em seu
caderno, as transformações ocorridas em Vila Nova do Sul. Para o
desenvolvimento da atividade, deveriam conversar com seus
familiares, que estão em casa, para ajudar na realização da mesma.
Questionando-os como era a cidade na época de infância e
adolescência deles. O que mudou nesses últimos anos? Que locais
mudaram suas funções no decorrer do tempo? Objetivando no
decorrer desta atividade resgatar a memória do município a partir de
suas transformações oportunizando nesse âmbito familiar discussões

- 136 -
acerca destas modificações ocorridas na cidade. A segunda atividade
foi chamada de “Todos os caminhos levam a EMEF Maria Pereira
Teixeira”. Como ferramenta importante para compreender a
percepção ambiental, os mapas mentais são uma forma de linguagem
que reflete o espaço vivido. Os alunos poderiam construir em uma
folha branca seu mapa mental (FIGURA 4), com o trajeto da sua casa a
Escola Maria Pereira em Vila Nova do Sul.

Figura 4 – Mapa mental construído por um aluno do 8º ano.

Fonte: arquivo pessoal, 2020.

Com esta atividade buscou-se, ressaltar a importância do


conceito de lugar no contexto da escola do campo. O objetivo era que
os alunos valorizassem os elementos da paisagem rural. Ao abordar
espaço e lugar, Tuan (1983) enfatiza que são termos familiares que
expressam experiências comuns. Nesse sentido, “[...] O lugar é
segurança e o espaço é liberdade: estamos ligados ao primeiro e
- 137 -
desejamos o outro” (TUAN, 1983, p. 3). Para o autor, o espaço
somente passa a ser lugar no momento em que adquire
reconhecimento, definição, intimidade, valor, significação e desperte
o pertencimento. O lugar é marcado pela percepção, experiência e
valores. Os lugares guardam e são núcleos de valor, por isso eles
podem ser totalmente apreendidos através de uma experiência total
englobando relações íntimas/próprias (insider) e relações externas
(outsider). De esta forma valorizar a educação do campo é construir,
no sentido de ir além do padrão estabelecido, o espaço onde o sujeito
e o saber científico estejam inseridos, integrados e socializados
(BELING; CANCELIER, 2019).
No sentido de contextualizar e articular o conteúdo sobre
Globalização e o COVID-19, assim como os efeitos no meio ambiente,
pediu-se aos alunos que escrevessem sobre o tema a partir da leitura
de manchetes, de jornais do Brasil e do mundo. Para posteriormente
dar segmento a criação de um “emoji” (FIGURA 5), símbolos que
normalmente são utilizados como meio de representação de uma
ideia, palavra ou frase completa. A criação deveria representar, o
momento de isolamento social. E seu objetivo era unir a criatividade
de cada aluno, com a representação do emoji que é algo globalmente
utilizado, e o isolamento social.

- 138 -
Figura 5 – Emoji criado por uma aluna do 9º ano da EMEF Maria Pereira
Teixeira.

Fonte: arquivo pessoal, 2020.

Pode-se observar que é de extrema importância o papel da


escola e sua aproximação com a comunidade escolar, mantendo
diálogos constantes, para assim, poder conhecer as especificidades,
dinâmicas, limites, possibilidades e alternativas para as práticas
pedagógicas. Que devem ser voltadas e planejadas, para o lugar que
os alunos estão inseridos, sua realidade, respeitando e valorizando
seus saberes sociais e culturais, pois a educação do campo deve ser
pensada e articulada a partir do contexto em que a escola está
inserida, com intuito de atender as reais necessidades e anseios da
comunidade, principalmente nesse período de isolamento social.

Considerações finais
O intuito deste texto foi trazer as vivencias, as práticas e os
desafios do ensino de geografia em tempos de Pandemia em uma

- 139 -
escola do campo. As consequências dessa pandemia em relação a
educação do campo, dificilmente serão analisadas com precisão
durante o pico da pandemia no Brasil. Pois, os alunos permanecem
com as atividades enviadas via Facebook, e-mail, WhatsApp, ou no
caso da referente escola, entregue impresso pela Secretaria de
Educação do Município.
Embora, acredita-se que essas atividades sejam desenvolvidas
sem acompanhamentos docentes, dificilmente se comparam com as
aulas presenciais. Devido às incertezas do tempo de retorno às aulas e
o volume que essas proporcionarão com o decorrer da gravidade da
propagação do vírus, não ainda desconhecemos sob de que maneira
serão administradas essas atividades.
Portanto, pais, alunos e professores que tiveram suas rotinas
alteradas no ano letivo de 2020, por conta da Pandemia (SARS-CoV2),
sentiram a importância dos quatro pilares da educação, ou seja,
aprender a conhecer, fazer, viver e ser.
De fato, as dificuldades e os problemas da educação brasileira
sempre existiram, a diferença é que foram somadas a outros
problemas de amplitudes mundiais, que mostraram a verdadeira face
da educação no país, suas mazelas e fragilidades que culturalmente e
socialmente ficam com aqueles que por vezes estão as margens das
políticas, desassistidos por governadores e parlamentares.
Os questionamentos que ficam nesse momento seguem as vias
de é, como ficará a educação do campo após o fim do isolamento social

- 140 -
provocado pelo coronavírus? Servirá apenas para impulsionar novas
políticas públicas que sejam mais efetivas para o campo? Será que
esses espaços serão assistidos conforme suas necessidades e
demandas? Será que a escola do campo novamente trará à tona a
importância da sua própria existência no perímetro rural? Será que o
reconhecimento social, bem como da família sobre a permanência dos
estudantes na escola irá ser reforçado? Será que o professor enquanto
presença física no espaço escolar terá seu reconhecimento como
mediador de extrema importância do conhecimento?
Por fim, pode-se concluir que os resultados dessa pandemia,
serviram para mostrar o quanto a escola exerce um papel fundamental
na vida do aluno, por inseri-lo ao convívio social; por mostrar a
relevância do papel do professor como mediador e articulador do
conhecimento, e na relevância da formação inicial e continuada em
relação ao uso novas tecnologias para o ensino. Mais importante do
que apontar os problemas, é da responsabilidade dos Poder Público,
corpo docente, alunos, responsáveis e comunidade escolar, uma
mudança de comportamento, sensibilizar-se e ter consciência que, o
educar está diretamente atrelado a uma ação.

- 141 -
Referências

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apenas-um-dia/. Acesso em 24 de maio de 2020.

- 144 -
A saúde na educação indígena: o caso da Escola Karay
Tataendy Verá Claudio Acosta de Estrela Velha/RS

Evandro Dalcin De Franceschi15


Ana Carla Lenz16

Introdução
O presente capítulo aborda as dinâmicas educacionais voltadas
para a saúde indígena realizadas na aldeia indígena Guarani Ka Aguy
Poty ou Flor da Mata localizada no município de Estrela Velha - RS. A
comunidade no ano de 2008 “ganhou” uma escola, Escola Estadual de
Ensino Fundamental Karay Tataendy Verá Claudio Acosta, que além de
estar voltada para as práticas de ensino e aprendizagem tornou-se elo
de comunicação entre indígenas e não indígenas funcionando como
centro comunitário, pois era e é no espaço escolar, com o auxílio do
professor, que a agente de saúde da aldeia realizava o atendimento e
continua organizando as reuniões com o grande grupo.
A unidade de paisagem que identifica a reserva onde a aldeia
está alocada é intensamente marcada pela mata nativa do bioma Mata
Atlântica e pela agricultura de subsistência. As dinâmicas sociais
existentes nela são voltadas para a preservação da cultura MBYA-

15
Especializando em Assistência e Atenção Farmacêutica. E-mail:
evandrodefranceschi@gmail.com.
16
Doutoranda em Geografia, UFSM. E-mail: anacarlalenz@gmail.com.

- 145 -
GUARANI transmitida de geração em geração e, no centro do processo
de promoção, preservação, manutenção está a escola que além do
exercício da educação escolar formal contribui com a não formal e,
também, com as práticas de saúde e bem-estar indígena.
Para realizar a investigação fez-se uso da abordagem
qualitativa. Em um primeiro momento foi realizado um levantamento
bibliográfico sobre: paisagem, cultural, povos tradicionais, educação e
ensino, população, saúde do povo indígena entre outros.
Posteriormente verificou-se quais são as atividades realizadas pela
comunidade escolar, em cooperação com a agente de saúde, para a
preservação e promoção da saúde indígena. Neste momento, devido
a pandemia do Covid-19 foi utilizado o aplicativo de troca de
mensagens e comunicação em áudio e vídeo pela internet - Whatsapp.
Através desta plataforma uma professora da escola e a assistente de
saúde da comunidade responderam questões e enviaram informações
e dados referente a temática. Com o material em “mãos” realizou-se
a compilação para a redação do capítulo.

A espacialidade - Município de Estrela Velha - RS


O município de Estrela Velha faz parte da mesorregião Centro-
Oriental Rio-grandense. Foi emancipado no ano de 1995, mas somente
dois anos depois passou a funcionar administrativamente. Sua
constituição paisagística teve início com os acampamentos de
combatentes das revoluções passadas, os quais julgavam o lugar

- 146 -
seguro por ser uma região cercada por águas, uma vantagem no
período das guerras. Quanto ao nome do município está ligado a um
estabelecimento comercial que foi construído no alto de uma colina,
por ser de fácil visualização, que servia de hospedagem para viajantes
e também de venda para os moradores locais. Na fachada dele estava
fixado um escudo em forma de estrela que foi deixado no local pelos
combatentes (PREFEITURA MUNICIPAL DE ESTRELA VELHA, 2020).
Na atualidade a paisagem municipal é fortemente marcada
pelas ruralidades. A maior porção da população reside no campo,
segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, são:
2461 habitantes rurais e 1167 habitantes urbanos (IBGE, CENSO,
2010). Os cinco principais cultivos agrícolas do município são: soja,
trigo, aveia, fumo e milho dentre eles, a soja se destaca ocupando em
torno de 66% das áreas destinadas às atividades agropecuárias. Cabe
lembrar que os cultivos são intercalados na chamada safrinha.
No distrito de Itaúba, na Linha Somavilla, está alocada a aldeia
indígena Ka Aguy Poty ou Flor da Mata, onde moram em torno de 30
indígenas da cultura Mbya-Guarani. A área destinada a reserva é
aproximadamente de 115 hectares, deste total, 40% é de mata nativa
(Plano Político Pedagógico (PPP) da Escola Karay Tataendy Vera
Claudio Acosta). No espaço destinado a produção de alimentos a
comunidade cultiva hortaliças, árvores frutíferas (pêssego, bergamota,
pitanga e banana), plantam feijão, mandioca, batata-doce, milho e
amendoim com sementes “crioulas”, passadas de geração para

- 147 -
geração. Toda a produção se destina a alimentação da comunidade.

A Escola Karay Tataendy Vera Claudio Acostada Aldeia


As atividades escolares na aldeia tiveram início em 2005 e o ato
formal de criação foi firmado em 16 de julho de 2008. A escola
funcionou e funciona como anexo da Escola Estadual de Ensino
Fundamental Itaúba. Seu primeiro nome foi Escola Estadual Indígena
da Reserva, substituído em 2012 pelo atual, Escola Karay Tataendy
Vera Claudio Acosta, em homenagem a um dos membros da
comunidade que incentivou e lutou pela educação das crianças e
jovens indígenas na aldeia.
O quadro funcional da escola é integrado por um professor de
Língua Guarani (membro da comunidade), uma funcionária (membro
da comunidade) e uma professora que, também é responsável pela
administração escolar, ou seja, exerce a função de diretora, secretária
entre outras. Todo o quadro da escola está lotado na Escola Estadual
de Ensino Fundamental Itaúba, localizada a 6 km da reserva.
A modalidade de ensino é o fundamental, séries iniciais até o
5º ano em turma única multisseriada. O primeiro ensinamento escolar
é a Língua Guarani, posteriormente o Português. Isso ocorre porque
para a comunidade indígena, as práticas de ensino e aprendizagem
devem estar interligadas com os conhecimentos do povo, transmitidos
por meio da oralidade, visando valorizar os saberes e fazeres dos mais
velhos.

- 148 -
Cabe destacar que a pedagogia Guarani permite as relações
interculturais, de modo que as crianças reconheçam, além da sua
própria identidade, também a de outros grupos sociais (indígenas e
não indígenas). Acima de tudo, a escola indígena trabalha para
preservar a cultura Mbya-guarani transmitida, mas também incentiva
o relacionamento com outras culturas respeitando-as e buscando ser
respeitados (Depoimento feito por meio do aplicativo whatsapp, 22 de
maio de 2020). A escola da aldeia além de promover a educação
escolar formal, contribui com a não formal e com a promoção da saúde
e bem-estar indígena. As ações voltadas para a saúde ocorrem devido
a não dissociação entre educação e saúde pelo povo indígena Mbya-
guarani.
Ao completar o quinto ano os alunos da escola indígena são
inseridos na Escola Estadual de Ensino Fundamental Itaúba. Lá são
recebidos por professores que já são informados da “diferença” das
técnicas educacionais destes alunos indígenas relacionados aos alunos
locais. Convêm ressaltar que existe uma boa receptividade por parte
dos alunos da escola Itaúba, onde os mesmos fazem visitas à aldeia em
momentos de integração das escolas. Quanto à avaliação, essa se faz
por parecer e leva em consideração o desenvolvimento e a interação
do aluno guarani com a sociedade, ou seja, nesse caso a base da
avaliação se faz diferenciada à aplicada ao aluno não guarani.
(Depoimento feito por meio do aplicativo whatsapp, 22 de maio de
2020).

- 149 -
Os alunos guaranis têm total liberdade em utilizar as
dependências da escola, bem como, dos laboratórios. A escola
promove a integração do aluno indígena com o aluno não indígena
com didáticas, brincadeiras, destacando-se o futebol. Nesse caso a
escola promove a inserção do aluno indígena junto a sociedade local,
respeitando a soberania guarani e seus costumes. (Depoimento feito
por meio do aplicativo whatsapp, 22 de maio de 2020).

A paisagem indígena e suas dinâmicas educacionais


Os grupos sociais adaptam o espaço geográfico ao seu modo
de vida. Nesse processo elementos são impressos no espaço
configurando as paisagens que revelam a identidade dos seus
construtores. Os hábitos e costumes, saberes e fazeres desenvolvidos
nesse processo são transmitidos de geração a geração, por meio de
processos de ensino e aprendizagem formais e não formais, que visam
a educação das crianças e jovens na cultura local.
O descrito está de acordo com o destacado por Lenz, Cancelier
e De David,

A influência cultural e histórica do grupo social


molda no espaço uma feição distinta, como que o
personalizando, tornando-o sua propriedade, na
qual o espaço revela-se como identidade tipo
humano (o grupo social cultural), que sobre ele
movimenta-se, atua e perpetua-se, reproduzindo o
próprio espaço, agora transformado em sua
morada de vida, o seu território. (LENZ; CANCELIER;

- 150 -
DE DAVID, 2019, p.80-81).

É por meio do olhar, do escutar, do sentir, do provar que a


paisagem se revela e, também, todas as dinâmicas socioeconômicas,
socioculturais, socioambientais e educacionais do grupo social cultural
que pertence a ela. Santos (2002, p.103) diz que “a paisagem é um
conjunto de formas que, num dado momento, exprime as heranças
que representam as sucessivas relações localizadas entre homem e
natureza. O espaço são as formas mais a vida que as anima".
Mas, ele mesmo lembra que

A paisagem nada tem de fixo, de imóvel. Cada vez


que a sociedade passa por um processo de
mudança, a economia, as relações sociais e
políticas também mudam, em ritmos e
intensidades variados. A mesma coisa acontece em
relação ao espaço e à paisagem que se transforma
para se adaptar às novas necessidades da
sociedade (SANTOS, 1997, p. 37).

Por serem sabedores do postulado por Milton Santos, a


comunidade indígena da Aldeia Flor da Mata ou Ka Aguy Poty participa
ativamente da educação escolar, visando perpetuar a sua cultura entre
as novas gerações. O auxílio dado aos professores não indígenas
perpassa pela produção de materiais didáticos (Figura 1), livros e vai
até a orientação do modelo educacional, o qual deve ter as práticas de
ensino voltadas para o que realmente são importantes para o grupo;
o que faz sentido às suas crianças e jovens aprendem. Ou seja, modelo
- 151 -
educacional não pode estar desconectado dos hábitos e costumes da
comunidade indígena.

Figura 1 - Fração do livro produzido pelos indígenas da aldeia Ka Aguy Poty

Fonte - acervo pessoal Marilei Haas Pereira, 2020.

A Figura 1 é um trecho fotografado de um dos livros organizado


pela comunidade indígena da aldeia Flor da Mata, com figuras que
representam o seu espaço de vivência e com textos escritos na língua
materna Guarani. Isso porque eles entendem a educação como uma
“arma” para promover a resistência de seus saberes e fazeres frente à
homogeneização cultural, tanto que os alunos da Escola Estadual
Indigena de Ensino Fundamental Karay Tatendy Vera Cláudio, que
atende as séries iniciais, só são aprovados para a próxima etapa se
tiverem domínio da Língua Guarani (saber ler e escrever
corretamente), caso não, permanecem na escola até dominarem a sua
oralidade. (Depoimento feito por meio do aplicativo whatsapp, 20 de
maio de 2020).

- 152 -
É por meio dos processos de ensino e aprendizagem, pautados
no modo de vida local que ocorre a difusão da cultura. Dentre as
práticas didáticas o saber pintar, desenhar e colar de acordo com a
depoente, são as técnicas mais valorizadas pelos indígenas, pois
segundo eles, pode-se ensinar aos alunos todos os conhecimentos
sobre animais e plantas da floresta através delas, motivo pelo qual,
juntamente com a língua guarani, é um dos primeiros saberes a ser
trabalhado. (Depoimento feito por meio do aplicativo whatsapp, 20 de
maio de 2020).
Mas, cabe lembrar que o descrito só é possível se a escola
estiver em conformidade, em consenso, em diálogo com a
comunidade, assim as práticas de ensino formais não destoam das não
formais, aquelas que ocorrem nos núcleos familiares no seio do grupo
social. Pois, são elas, as ações de ensino e aprendizagem, que irão
garantir a manutenção dos saberes e fazeres, principalmente dos
tradicionais, que na atualidade, lutam para existir no mundo
globalizado, no mundo das Tecnologias de Informação e Comunicação
- TIC.
A educação escolar deve ensinar habilidades que supram as
necessidades do grupo social, isso deve ocorrer em todas as etapas,
até mesmo na hora da merenda. Na escola da Aldeia Flor da Mata
oferecer uma alimentação adequada aos hábitos gastronômicos
indígena é uma preocupação, por isso a pessoa responsável pela
alimentação dos alunos é um membro da comunidade indígena.

- 153 -
(Depoimento feito por meio do aplicativo whatsapp, 20 de maio de
2020).
Identificar quais são as necessidades humanas do grupo antes
de organizar as atividades escolares, como: hábitos de alimentação,
estilo de moradia, segurança, educação e inseri-los nas práticas de
ensino e aprendizagem contribui para o desenvolvimento do
sentimento de pertencimento ao grupo e ao lugar nas crianças e
jovens, ou seja, nos alunos. Pois, são eles que (re, des) constroem as
paisagens.
Se são as necessidades humanas que moldam as paisagens,
quais são as necessidades das populações tradicionais grafadas na
paisagem brasileira? Na atualidade, são delas ou do modo de sistema
econômico capitalista? Existe uma necessidade que é inerente a todas
as pessoas: a da alimentação que, segundo Abraham Harold Maslow é
uma das essências, é fisiológica. Mas deve ser de qualidade,
diversificada, rica em vitaminas e nutrientes encontrada nos alimentos
presentes nos diferentes cultivos, criações, pescados para uma
alimentação balanceada, preservando a saúde dos indivíduos.
Essa é a preocupação do cacique da aldeia Flor da Mata:
preservar a saúde do seu povo, ensinando-os a valorizar o que a terra
os dá, iniciando na infância, por isso exige que o cardápio escolar
esteja de acordo com os hábitos alimentares da comunidade, porque
para eles a saúde e educação caminham juntas, contribuindo dessa
forma, com a manutenção da paisagem local.

- 154 -
Salvaguardar os cenários com elementos paisagísticos do
patrimônio cultural dos povos tradicionais é proteger, defender a
memória coletiva do grupo. A paisagem tem como base a memória
coletiva, seja de uma nação, região ou comunidade composta de todas
as expressões materiais e espirituais que o constituem e inclui também
o meio ambiente. Visto que cada organização social indígena possui
peculiaridades específicas, cada grupo tem seus rituais, ritmos, ritos,
saberes e fazeres tradicionais que são passadas às novas gerações por
meio dos processos de ensino e aprendizagem. Com isso os currículos
da escola do campo indígenas devem elaborar conteúdos que
atendam às necessidades educacionais do local como a Escola
Estadual de ensino Fundamental Karai Tataendy Vera Claudio Acosta
do município de Estrela Velha.

A saúde na escola ou a escola na saúde


No passado a saúde era vista como o estado de ausência de
doença, na atualidade é entendida como o bem-estar físico, mental e
social. Nesse contexto, o lugar de vivência onde ocorrem as
experiências contribuir ou não para a promoção da saúde. Como
destaca a própria Organização Mundial da Saúde - OMS, os principais
determinantes da saúde incluem o ambiente social e econômico, o
ambiente físico e as características e comportamentos individuais da
pessoa. Isso porque a identidade do sujeito é formada por uma
multiplicidade de fatores, desde: idade, sexo, traços familiares e a

- 155 -
paisagem do lugar onde se nasce dentre outras. (LENZ, CANCELIER, DE
DAVID, 2019).
Um dos elementos da paisagem que propicia a interação da
criança com o ambiente e suas dinâmicas socioeconômicas,
socioculturais, socioambientais é a escola. Na aldeia Ka Aguy Poty ou
Flor da Mata a escola contribuiu e contribui ativamente com a
promoção da saúde indígena. As práticas escolares favoreceram e
favorecem a comunicação entre a agente de saúde e os indígenas,
visto que na aldeia só se fala a Língua Guarani e os alunos nos
primeiros anos escolares aprendem somente a oralidade materna, a
ler e a escrever em Guarani- para depois terem contato com o
Português, assim, saúde e educação andam juntas, até os dias atuais,
uma auxiliando a outra.
Os relatos destacam que os ensinamentos perpassam o lavar
as mãos, escovar os dentes, a importância da vacinação até o descarte
do lixo do mundo moderno, pois a problemática do lixo não orgânico
não existia na aldeia; o lixo descartado apodrecia ou os animais se
alimentavam dos restos. (Depoimento feito por meio do aplicativo
whatsapp, 20 de maio de 2020).
Os professores trabalham em cooperação com os agentes de
saúde. De acordo com os depoimentos foram inúmeras atividades em
parceria, todas com boa aceitação pela comunidade que, na
atualidade, as crianças e os adultos aceitam a saúde do branco, até
procuram-na. Contudo, existe resistência da única idosa (72 anos) da

- 156 -
comunidade, ela utiliza os conhecimentos herdados dos seus
antepassados para tratar as dores do corpo e da alma. Os depoentes
apontam que a saúde do branco só é aceita porque a sua aldeia não
possui um Karai (líder espiritual) e o mais próximo reside no município
Salto do Jacuí.
A cultura reservada da comunidade foi outra dificuldade
destacada. Além da comunicação, principalmente por parte das
mulheres, as quais se dirigiam ao cacique para fazer pedidos de
medicamento ou para marcar consultas, o vínculo de confiança
demorou a ser construído. O cacique também era e é um frequentador
assíduo da escola, está sempre presente, dialogando trocando ideias
organizando as rodas de conversa coletiva que reúne as mulheres,
homens, crianças e idosos para debater assuntos relacionados a saúde
e bem-estar do seu povo.
Uma casa foi adaptada para se ter um espaço de saúde nos
últimos anos. Neste espaço trabalha uma técnica de enfermagem
“branca” não indígena, um agente de saúde e um agente de
saneamento ambos da comunidade todos vinculados a Secretaria
Especial de Saúde Indígena (SESAI), responsável por coordenar e
executar a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas
e todo o processo de gestão do Subsistema de Atenção à Saúde
Indígena (SasiSUS) no Sistema Único de Saúde (SUS). (BRASIL,
MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2020). Mesmo com um espaço desvinculado
da escola, os trabalhadores da saúde mantêm uma comunicação

- 157 -
constante com os professores, pois, segundo eles, não se faz saúde
sem educação e não se tem educação sem saúde. (Depoimento feito
por meio do aplicativo whatsapp, 20 de maio de 2020)

Considerações finais
A Escola Estadual de ensino Fundamental Karay Tataendy Vera
Claudio Acosta da aldeia indígena Ka Aguy Poty ou Flor da Mata é um
dos elementos da paisagem que agrupa diversos atividades, não
somente as de ensino e aprendizagem, mas também a de promoção à
saúde e bem-estar indígena, uma vez que a saúde deixou de ser vista
apenas como a ausência de doenças. Hoje ela engloba o bem-estar
físico, mental e social dos sujeitos e, é isso que os agentes da saúde
comunitária indígena visam proporcionar à comunidade indígena Flor
da Mata, através da união entre educação e saúde.
As dinâmicas educacionais promovidas pelos professores, com
a articulação dos agentes de saúde contribuíram tanto para a
prevenção de doenças (com o calendário de vacinação) como para a
aceitação da saúde do branco entre os membros da comunidade. A
escola teve e tem um papel importante nas ações realizadas, pois ela
é o elo de comunicação entre indígenas e não indígenas. Ao mesmo
tempo que faz esse papel tão importante de ajudar na promoção da
saúde, acaba, também, favorecendo o desinteresse dos adultos e
jovens pelos conhecimentos herdados, acerca do uso das plantas
medicinais, levando-os ao esquecimento e com o tempo ao

- 158 -
desaparecimento.
Por isso infere-se que a escola e os seus colaboradores
precisam estar atentos às práticas de ensino formais e não formais
adotadas em comunidades tradicionais, ou em escolas do campo. Elas
não podem destoar da realidade do local respeitando assim a sua
cultura, pois caso isso ocorra pode provocar o desinteresse dos
moradores do local pelas tradições da comunidade, pelos saberes
herdados. Levando, assim, ao desequilíbrio na relação cultural
branco/índio, movimento que está ocorrendo na comunidade
indígena Ka Aguy Poty em relação às práticas de promoção e
preservação da saúde indígenas, com o auxílio das práticas educativas,
a inserção da medicina do branco (devido às facilidades) vem
favorecendo o desaparecimento dos conhecimentos da medicina
natural indígena.
Agradecimentos

Os autores agradecem a professora Marilei Haas Pereira, a professora


Marisa T. Dalcin De Franceschi e a Técnica de Enfermagem Aline da
Silva Vollbrecht por gentilmente colaboraram com o capítulo
fornecendo informações e dados.

- 159 -
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https://www.saude.gov.br/saude-indigena/sobre-a-sesai. Acessado
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Hucitec, 1997.

SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo – razão e


emoção. São Paulo: Edusp, 2002.

- 160 -
Educação do campo e educação ambiental: processos
identitários em afirmação

Ail C. Meireles Ortiz17


Silvana Zancan18

Introdução
É notória a relevância decisiva que se atribui à Educação na
consolidação de processos de desenvolvimento ao longo da história
das nações, tanto desenvolvidas quanto subdesenvolvidas. O Brasil
vem sendo palco de políticas de desobrigações governamentais com
uma educação de qualidade e que atinja grande parcela popular,
firmando claramente um quadro de negação a concepções de
democracia, igualdade e justiça social, educação, escola, participação,
autonomia e cidadania. Confirmando que no bojo do atual projeto de
desenvolvimento, está o mercado como cerne do neoliberalismo19. E

17
Mestre em Educação, UFSM. Docente do Curso de Pedagogia Presencial e EAD da
Universidade Franciscana.
18
Doutora em Educação, UFSM. Docente do Curso de Educação do Campo/ EAD da
Universidade Federal de Santa Maria.
19
Neoliberalismo, segundo Bianchetti (1997, p. 50), é o movimento político-
econômico heterogêneo, consolidado nos países capitalistas desenvolvidos, em
meados da década de 70, cuja proposta econômica significa o retorno aos princípios
ortodoxos do liberalismo, ou seja, às propostas da economia clássica como única
alternativa de superação da crise pela qual passam as sociedades. Na educação surge
a Teoria do Capital Humano, em que a educação é o principal capital humano
enquanto produtora de capacidade de trabalho, potenciadora do fator trabalho.
Neste sentido é um investimento como qualquer outro.

- 161 -
não, o aperfeiçoamento e a respeitabilidade ao ser humano. É clara a
contradição, historicamente observada, entre o discurso e a ação
governamental brasileira frente às políticas públicas, especialmente
àquelas das áreas sociais. O acirramento da crise educacional, vivida
pelo Brasil, tem vindo reforçar o conjunto de políticas públicas
adotadas pelo governo, em que obedecem à matriz definida pelo
Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento e pela
Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL). Os países
alinhados a essa política neoliberal vêm controlando as verbas
destinadas à educação. Os encontros reunindo expressivos
Organismos Internacionais de Financiamento (BIRD, BID, USAID)
passam a incluir em seus programas de investimentos, também,
projetos educacionais para a América Latina e América Central. A
própria “Declaração de Santiago”, realizada em 1998, reuniu 34 países
das três Américas e indicou a Educação como preocupação prioritária
aos planos de desenvolvimento destinados ao grupo de países
subdesenvolvidos, já referidos. Este novo enfoque – implementado
pelos grandes Organismos Internacionais de Financiamento –
destinado ao rumo desenvolvimentista dos países pobres, segundo tal
filosofia, visa estimular acesso à educação para todos, mitigando
miséria, violência e desigualdades socioeconômicas. Essa declarada
intenção com uma “educação de qualidade” impera alguns
questionamentos: Qual o objetivo de bancos multilaterais ao
proporem direcionamento e ampliação de verbas na área educacional

- 162 -
para países subdesenvolvidos, como o Brasil? Que tipo de educação
preconizam como de qualidade, eficiência e equidade? Em primeiro
lugar, é provável, segundo muitos analistas educacionais, que o
alargamento de financiamentos na área educacional venha exigir uma
conivência político-econômica com os princípios de desenvolvimento
praticados pelos países desenvolvidos. E, em segundo lugar, o tipo de
educação que pretendem implementar, representa uma decorrência
da lógica econômica que seguem, bem como, a preponderância da
racionalidade e da utilização máxima dos recursos reduzidos.
Assim, esses preceitos que permeiam os planos financeiros
desses Organismos Internacionais, com vista à Educação Brasileira,
estão atrelados a uma concepção economicista da educação e não
humanística. Assim, entendem a educação de qualidade como algo
mensurável, na qual o educando deve apenas acumular
conhecimentos e isolando-o de um processo de formação como
sujeito social. Esta realidade sócio-político-educacional vem ditar, de
forma autoritária, as concepções educacionais, que direcionam o
sistema de ensino no país. As concepções educacionais de setores
hegemônicos, utilizadas para manutenção da situação generalizada de
exclusão social, a que se submete a sociedade brasileira, diferem de
concepções educacionais reivindicadas hoje, por muitos segmentos
populares organizados. Nesse sentido, fortalecer a luta pela qualidade
social, em meio ao curso acelerado de globalização econômica e
cultural, implica providenciar uma educação, tanto para o

- 163 -
desenvolvimento econômico, social, cultural e político, como para
assegurar direitos básicos de cidadania e liberdade. Assim, nesta
perspectiva faz-se necessário destacar algumas concepções de
educação que apresentam aspectos tangíveis e que vêm dar suporte a
este trabalho.

Educação do campo, educação ambiental e o educador ambiental:


O norte orientador da ação humana é a liberdade, definindo
assim o processo educativo como ato de libertação. Em Fiori (1991, p.
83) podemos perceber a Educação como legítimo processo de
condução à construção de uma consciência histórica.

A educação é esforço permanente por constituir-


se, buscando a forma histórica na qual possa
reencontrar-se consigo mesmo, em plenitude de
vida humana, que é, substancialmente, comunhão
social. Esse reencontro que, no horizonte do
respectivo momento histórico, coloca o homem
em seu lugar próprio, tem um nome adequado:
autonomia e liberdade.

A direção firme por liberdade passa a forjar um


comportamento humano, na qual a intersubjetividade acontece como
impulso à autonomia. Acredita-se então, que a liberdade e a
autonomia determinarão, ao longo dos refazes da história, novas
formas históricas para que o homem se ocupe em uma luta por
conquistar o sentido de sua existência. Não se permite mais retomar
concepções de educação sem impingir a ela o caráter determinante à

- 164 -
formação de uma consciência ampla, crítica, que promova a
possibilidade da mudança. Esta dimensão de consciência possível,
atingida pelos grupos oprimidos, se confunde com a vontade popular
emergente em empenhar-se a fazer história. Pensando em uma
Educação que inscreva o homem na caminhada certa para sua
afirmação como sujeito histórico, Freire apud Kowarzik (1988, p.70)
reafirma a importância da autolibertação como condição à assunção
da libertação humana em âmbito social.

A educação constitui também uma ocupação


política, ao pretender facultar ao homem em
formação tornar-se sujeito de sua práxis individual,
livre de objetivos estranhos e sujeito da práxis
histórico-social em solidariedade com os outros.

Uma educação que objetiva aproximar-se da libertação deve


esforçar-se a estreitar os espaços entre uma práxis alienada a uma
práxis humanizadora e desalienante. Logo, podendo acontecer, m um
cotidiano de experiências conduzidas pela solidariedade e no diálogo
crítico. O processo de leitura do mundo em que o ser humano passa a
interpretar conscientemente a realidade sobre a qual se insere
envolve inicialmente, uma reflexão de si próprio e do mundo. Essas
reflexões não se dão distanciadas uma da outra. A comunicação entre
elas incita a intersubjetividade, momento em que os ideais de
libertação se cruzam. Uma reflexão de si próprio frente o mundo e
uma reflexão do mundo, em uma maneira indissociável, desperta a
conscientização. Conscientização esta, considerada como processo
- 165 -
interno fundante à predisposição à ação, ou seja, a transformação
deste mundo que não o afirma como sujeito histórico livre. Nesse
sentido, Gadotti (1987, p.155) se pronuncia acerca do ato educativo:

O ato educativo corresponde a este esforço de


leitura do meio social, econômico e político. Esta
leitura é um ato de tomada de consciência do nosso
mundo, aqui e agora, que visa notadamente
ultrapassar as contradições e os elementos
opressores deste mundo. Sim, porque a educação
não pode ser uma outra coisa a não ser uma obra
libertadora do homem e do mundo, operada junto
e não um ato individual de manipulação e de
domínio do mundo.

Todas as concepções abordadas neste diálogo intertextual


possuem em sua essência fatores que consideramos determinantes a
uma educação que se identifique com a cultura popular. A consciência
da plenitude da vida humana no processo de libertação, o caráter de
busca da forma histórica para atingir emancipação, a dimensão
intersubjetiva do fazer história e, acima de tudo, a percepção de
transformação desta realidade nada justa apenas se efetivará por
ações conjuntas, solidárias. Ainda se faz relevante endossar a
importância da construção coletiva de uma nova sociedade como
produto de relações de parentesco entre todos, numa dinâmica em
que as consciências se encontrem no entrelaçamento de
subjetividades. Reafirmando a importância em educar na perspectiva
de preparar para uma produção social pela participação, como prática

- 166 -
democrática, a que se atinja uma sociedade diferente, que venha
assegurar a qualidade social, corroboramos com Gandin apud
Kowarzik (1988, p. 18), que “educar é dotar a população de
instrumentos básicos para a participação na sociedade”. Com efeito,
as concepções evidenciadas sobre educação representam ideias-força
sobre a análise que se propõe acerca da Educação Ambiental no
campo. O comportamento humano marcado pela renovação e
revalorização de sua existência precede de uma tomada de
consciência, a qual esta consciência o habilite a assumir os riscos, que
a história lhe impõe. A educação, como processo impulsionador à
formação de uma consciência pessoal e social, vem determinar uma
práxis transformadora. Não se concebe o exame de questões
socioambientais numa perspectiva conscientizadora desarticulando o
ato educativo do curso das estratégias sociais, políticas, econômicas e
culturais que implicam o esforço humano em produzir um autêntico
Projeto Nacional. Também não é possível postular a revisão do ato de
educar, alienado de um sistema de valores, de uma sociedade que se
delineia no atual momento histórico. O momento histórico que
presenciamos é de extrema fragilidade nos procedimentos humanos
que dão significado à instauração de um estado de, no mínimo,
aproximação à emancipação. O Estado, como instituição mediadora de
procedimentos que garantam condições iguais de vida digna à
sociedade, passa a estabelecer práticas governamentais inculcadas
por uma ideologia estranha aos interesses populares; e muito familiar

- 167 -
aos interesses de países desenvolvidos, alijando de forma dilacerante
o verdadeiro processo de desenvolvimento nacional. A educação se dá
sobre este contexto político, econômico, social, espaço-temporal. A
educação, como processo histórico no qual o homem se reconstrói em
comunhão, necessita efetivar colaboração na construção de um
mundo humano. A educação, pelo desvelamento de questões sociais,
deve promover uma reflexão crítica frente às contradições estruturais
que se agudizam na clara prática dominadora de que a vida nacional é
testemunha. Com esse tom a Educação Ambiental precisa ser
construída, representando verdadeiro empecilho à alienação humana,
diante dos conflitos deflagrados neste ambiente social.

O maior desafio da educação atual é formar um homem que


atinja a consciência de que o “seu bem-estar” é também o “bem-estar”
do outro, numa íntima relação de consciência de si e consciência de
mundo. E a partir desta revelação consciente o sujeito histórico
passará a promover a vida humana, num trato equânime a todas as
entidades humanas e não humanas. A fronteira entre um
comportamento humano interventor, que garanta a concretização
histórica, e um comportamento alienado, alheio de intencionalidade
transformadora, está no momento da conscientização. Por isso, se faz
relevante o processo educativo como formação de consciências
crítico-reflexivas para alicerçar solidamente a construção da Educação
Ambiental. Quando consideramos decisiva uma atitude consciente na
ação histórica, lembramos Damke (1995, p. 97): “se a conscientização

- 168 -
indica o processo de inserção crítica dos seres humanos na ação
transformadora da realidade, ligam-se a ela duas tarefas
fundamentais: desmitificar a realidade e agir sobre ela para modificá-
la”. A Educação Ambiental integra o campo educativo. A construção da
Educação Ambiental envolve um saber amplo, um “saber”, conceitos
e princípios, um “saber fazer” habilidades e um “saber ser” valores e
atitudes. Portanto, segundo Grüm (1994, p. 171): “A Educação
Ambiental se dá no encontro entre valores de conservação das
comunidades bióticas, abióticas e sociais provenientes destes valores.
Essas esferas estão mutuamente informadas, constituindo o “campo
educativo”. A Educação Ambiental deverá ocorrer em associação a
princípios fundamentais de participação, cidadania, autonomia,
intimidade à cultura local e sustentabilidade. Uma educação que
priorize estes princípios, em suas bases epistemológicas e
metodológicas, estará formando seres humanos preparados para os
desafios que a realidade socioambiental, que vem impondo à
obtenção da qualidade social necessária à emancipação social. A
produção participativa aguça a formação de uma consciência social,
por uma postura reflexiva frente à realidade conflituosa e que exige a
busca por superação dos problemas encontrados, pois é na prática
social que emergirão novos saberes, novos olhares, novos valores
numa original prática educativa. Nessa direção:

A Educação Ambiental exige uma postura crítica e


um corpo de conhecimentos produzido a partir de

- 169 -
uma reflexão sobre a realidade vivenciada. Sendo
uma proposta essencialmente comunitária,
materializa-se através de uma prática cujo objetivo
maior é a promoção de um comportamento
adequado à proteção ambiental. Comporta uma
concepção desalienante, porquanto pressupõe
ações voltadas para o surgimento de novos valores,
onde a participação é um princípio fundamental
(LIMA, 1984, p. 23).

Que função se atribui à Educação Ambiental nesse contexto


histórico-cultural, que presenciamos? A função primeira da Educação
Ambiental reside no papel de integradora dos sistemas educativos de
que dispõe a sociedade, bem como instrumento de tomada de
consciência do fenômeno do desenvolvimento e suas implicações
ambientais e de transmissão de conhecimentos, habilidades e
experiências que permitam ao homem atuar eficientemente no
processo de manutenção ou recuperação do equilíbrio ambiental, de
forma a manter uma qualidade de vida condizente com suas
necessidades e aspirações. Representando um processo que visa
formar uma sociedade consciente e preocupada com o ambiente e os
problemas que lhe dizem respeito, uma sociedade que tenha os
conhecimentos, as intencionalidade, as motivações e o sentido de
participação e engajamento que lhe permitam agir individualmente e
coletivamente para resolver os problemas atuais e impedir que se
repitam. Compreendendo um processo permanente e participativo de
explicitação de valores, instrução sobre problemas específicos
relacionados com o meio ambiente, formação de conceitos e aquisição

- 170 -
de conhecimentos que motivem o comportamento de defesa,
preservação e melhoria do ambiente acima de tudo social. Pensar
Educação Ambiental prescinde pensar uma educação, que promova
conscientização. Assim como fala Freire (1995, p. 19): “Na educação
como façanha da liberdade, ser consciente não é uma fórmula ou um
“slogan”, mas a forma de estar sendo dos seres humanos, enquanto
seres que não apenas conhecem, mas sabem que conhecem”. A
Educação Ambiental necessita representar instrumento ao
desenvolvimento da consciência das coisas e dos fatos que rodeiam o
ser humano. A consciência deste mundo incita também, a consciência
de que se pode mudá-lo e refazendo este mundo, o homem se refaz
também. Assim, evidenciamos claramente a importância de priorizar
a vida frente à existência humana.

Nós temos de colocar a existência decentemente


frente à vida, em sua contradição com a vida, em
sua dialeticidade, de tal maneira que a existência
não mate a vida e que a vida não pretenda acabar
com a existência, para se defender dos riscos que a
existência lhe impõe (FREIRE, 1987, p. 14).

Tratar a caminhada de formação de uma consciência ambiental


requer postular uma educação, que impulsione a sociedade à
descoberta de mecanismos, que mobilizem ao exercício de cidadania.
É sabido, que a política educacional brasileira vem refletir aspectos,
que condicionaram historicamente, a evolução do ensino no Brasil,
envolvendo a herança cultural, o modelo econômico e as relações de

- 171 -
poder. Nessa seara, as Políticas Educacionais no Brasil estão servindo
à manutenção dos detentores do poder econômico. Lutar para
transformar esta realidade socioambiental perpassa a consciência de
cidadania. Que cidadania? Cidadania como princípio democrático
como fala Medeiros (1997, p. 56),

Cidadania trata-se da consciência dos direitos


democráticos, é a prática de quem está ajudando a
construir valores. Em nossa sociedade, significa a
mobilização em busca da mudança de estruturas
injustas onde uns são beneficiados em detrimento
da grande maioria. É a luta pela transformação da
realidade, através da elaboração de propostas, da
crítica de ações inadequadas e da promoção da
solidariedade.

Uma educação crítico-reflexiva, comprometida com a


realidade iminente, agregadora, humanizadora, marcada na liberdade
e autonomia poderá dar suporte mobilizador à cidadania. Cidadania,
que qualifique democraticamente o Estado em que a equalização
social seja uma realidade. A educação não favorece a imediata
cidadania. A educação funciona como processo formador de
consciências para a ação coletiva “em ambiente solidário”, “ para uma
ação participativa e interventora na sociedade. A aproximação a um
projeto nacional emancipatório exige confronto, consciência crítica
contestatória, a busca pela condução do destino histórico, a formação
de um projeto próprio de desenvolvimento, e a ocupação de espaços
sociais pela massa popular. O sujeito emancipado luta por direitos

- 172 -
sociais, tendo a ética e as relações humanas como fundamento da
conquista. Esta ética que confunde a consciência de si e a consciência
do outro, que aproxima consciência de existência, vem instaurar outro
princípio fundamental do processo emancipatório - a autonomia. Uma
autonomia desejada e concebida pelo esforço de todos e para todos.
Uma autonomia que implica participação consciente no mundo. É a
assunção consciente do que é verdadeiro e o que se deseja na
caminhada por libertação. Autonomia, participação e cidadania são
fundamentos estruturais da práxis ambiental, como produção
resultante de uma consciência ambiental. A Educação Ambiental, vista
na dimensão que se acredita, incorpora a possibilidade de superação
dos problemas socioambientais pela modificação do modelo social
para que uma nova sociedade venha conciliar as relações dos homens
entre si e deles com a natureza, numa tentativa de atingir
sustentabilidade. A sustentabilidade não pode ser analisada de forma
dissociada do contexto econômico neoliberal. Logo, “a educação
ambiental não é neutra, mas ideológica. É um ato político, baseado em
valores para a transformação social” (CARVALHO, 2012, p. 58).
Por isso, a garantia de sustentabilidade está subordinada ao
modelo de desenvolvimento coordenado por nações desenvolvidas,
quando dita às nações subdesenvolvidas, sistemas produtivos que
vinculam desenvolvimento à apropriação consumista de recursos
naturais e humanos. Contudo, atingir sustentabilidade requer uma
revisão conjuntural do modelo político-econômico e social que vigora

- 173 -
no país. E, portanto, quando se considera Desenvolvimento
Sustentável como aquele que atende às necessidades presentes sem
comprometer a capacidade de as gerações futuras também
atenderem as suas, vale levar em conta a contribuição decisiva do
processo educativo na formação de consciências cidadãs; de tal forma
que, em longo prazo, se obtenha uma sociedade e um Estado
compostos por líderes representativos da vontade popular e que
revelem consciência pública perante o rumo desenvolvimentista das
próximas gerações. Nessa perspectiva, temos que compreender que a
educação ambiental caminha para uma consciência ética sobre todas
as formas de vida humana, logo, os líderes necessitam planejar ações
educativas, no sentido de capacitar os sujeitos a trabalharem conflitos
de forma justa e com viés humanizador (CARVALHO, 2012). Então, o
ponto de partida deste estudo envolveu a compreensão de que atingir
consciência ambiental exige o exame de aspectos como libertação,
participação, autonomia e cidadania como pressupostos inerentes ao
ato educativo, e que são condicionamentos fundamentais à formação
de uma sociedade diferente e emancipada e que atinja qualidade
socioambiental.
Assim, como o desvelamento de muitas questões sociais, a
Educação Ambiental deve ser construída de forma consciente,
participativa, autônoma e cidadã também no meio rural. O ser
humano é produto do mundo e neste mundo busca renovação,
aperfeiçoamento. A forma de vida do homem do campo vai

- 174 -
concretizando a forma histórica que lhe atribui uma cultura própria.
Corroboramos neste sentido, com as ideias de Carvalho (2012) ao
sinalizar que as comunidades rurais precisam retomar a condução de
seus próprios destinos, ou seja, buscar na educação alternativas e
iniciativas autogestionárias para a transformação do sistema que as
sustentam, de formais mais apropriada econômica e ecologicamente.
O fenômeno educacional encontra-se profundamente relacionado
com os fatos fundamentais que constituem o cerne da sociedade,
quais sejam a produção, a reprodução e a transformação social. Essa
postura nos leva a perceber a dimensão histórica da educação,
possibilitando que ela mesma se modifique e que também contribua à
transformação social, pois os grupos humanos elaboram não apenas
bens materiais, mas também bens culturais, diretamente ligados à sua
existência. Formar uma consciência ambiental em espaços educativos
no campo significa pressupor o respeito aos processos culturais locais.
Processos culturais estes, que não estão deslocados de um quadro
socioeconômico mais amplo, marcado por um sistema de valores de
uma sociedade que o coloca factualmente numa estrutura agrária
desigual e excludente. O estudo mais específico da Educação
Ambiental, no campo, evidencia o modo singular da realidade do
homem do campo, suas relações com as condições de sua existência,
definindo assim seu modo de pensar, suas concepções de mundo e de
educação. Revelando seus posicionamentos e perspectivas numa
imagem do papel que desempenham nos acontecimentos da vida

- 175 -
nacional. Por isso, entendemos que a educação está implicada na ação
humana de transformar as singularidades do campo em cultura, pois
os sujeitos campesinos necessitam se assegurar que sua atividade
compreende uma trajetória de luta e qualidade para se fortalecer em
seu espaço (CARVALHO, 2012).
Contudo, o campo compreende a área onde se desenvolve,
predominantemente, a atividade agrária. Configurando diferentes
tipos de produção e aproveitamento da terra. A estrutura fundiária
brasileira é marcada por grandes extensões de terra ao lado de
pequenas propriedades. Esta estrutura agrária contraditória define
um cenário de não aproveitamento de terras produtivas, trazendo
como consequência graves problemas sociais no campo. A realidade
do campo é dependente de uma estrutura econômica, sócio-política e
cultural dominante. As más condições de sobrevivência em que se
encontra o homem campesino, lhe impinge abandonar a terra e buscar
melhores condições de vida no meio urbano. Esse quadro marginal em
que se encontra o homem do meio rural não oferece significação real
a que este homem obtenha o mínimo de direitos à liberdade, à
cidadania, à emancipação. Este é o contexto no qual acontece a
educação no campo, aliada a carência de qualidade nos serviços sociais
destinados ao homem do campo está a deficiência dos serviços
educacionais. Isto retardará sobremaneira, que o homem do campo
realize uma leitura consciente do mundo e, mais especificamente, do
meio rural, impossibilitando-o lutar coletivamente, por transformar as

- 176 -
condições sociais e culturais a que está inserido. Entende-se que a
educação não tem o poder de mudar as estruturas agrárias, porém
uma educação na dimensão conscientizadora significa refletir,
desadaptar, recriar, num esforço permanente o sujeito histórico,
fazendo com que ele saia do imobilismo histórico-cultural para a luta
para libertação, numa atitude de transformação. O sucesso do ato
educativo reside na tomada de consciência do ser histórico, com a
finalidade de reverter as formas de organização social para maior
incursão na vida política e social do país, caracterizando novas
estratégias de mudança. O processo de transformação vai da
consciência à ação, ou seja, “a conscientização não é exigência prévia
para a luta de libertação, é a própria luta.” (FIORI, 1991, p. 81).
O homem do campo também possui consciência do momento
histórico, pois a busca caminhos, saídas, projetos de realização, de
humanização. Entretanto, ação educativa e ação social são assumidas
como momentos de um único processo que persegue um
compromisso na ação. Alguns pontos centrais podem pautar a
educação no campo, como a incorporação dos valores culturais da
comunidade campesina aos programas e estruturas educacionais; a
possibilidade de integração das comunidades rurais à vida nacional; a
participação da comunidade local no processo de planejamento e da
própria ação educativa e a possibilidades reais de participação na
busca de superação de questões sociais locais por uma educação
conscientizadora .Estes pontos centrais acham-se interligados em

- 177 -
unidade, já que se interrelacionam. É assim que a educação no campo
corresponderá ao reflexo da estrutura econômico-produtiva da
comunidade rural, basicamente agropecuária, e passará a
desencadear um processo de elaboração de currículos próprios, sem
deixar de considerar valores culturais locais que se formam por
relações produtivas com a terra. Como questiona Calazans (1990,
p.161): “Por que não deixar que as propostas se expressem através de
palavras do mundo das populações, nos quais o sentido da vida, de
preservação, de senso comum, tem raízes fincadas na terra?” A
educação que se dá no campo não pode se isolar do contexto mais
amplo em que se insere, sendo imprescindível a sua interação ao
contexto nacional. Esta educação necessita promover também o
desenvolvimento das comunidades rurais, buscando ajustar esta
comunidade ao ritmo da vida moderna, sem perder suas
peculiaridades, reafirmando, assim, a especificidade do meio rural
com sua cultura local. Criar uma escola no campo, com identidade
rural e não uma escola urbana adaptada ao meio rural, pressupõe
participação da comunidade rural na elaboração de programas que
satisfaçam o acesso ao conhecimento já sistematizado, consolidado
culturalmente, bem como, às exigências de trabalho no setor
produtivo e, que integre a oferta de ensino público, passando a
configurar como perspectiva de fixação do homem rural ao campo. Até
hoje não se percebem escolas do campo para o campo, como enfatiza
Petty apud Calazans (1989): “...produz-se uma disfuncionalidade entre

- 178 -
a escola e o meio, decorre da imposição de um modelo educativo que
serve mais à cidade de que propriamente às zonas rurais”. Esta
inserção da comunidade no processo pedagógico representa um ato
de participação efetiva, colaborando assim à democratização da
sociedade. É primordial que a comunidade assuma a escola como sua
voz, que venha contribuir para a formação de uma consciência de
organização comunitária em torno de seus desejos, interesses e
reivindicações, assegurando, assim, a irreversibilidade da escola como
conquista da comunidade em pleno exercício de cidadania. Para
Caldart (2004) e Ghedin (2012), a escola necessita trabalhar a
formação de identidades, de modo que esses sujeitos tenham uma
visão de si e de seu trabalho social, como camponês, e trabalhador que
tem valores, um modo de vida, memória e cultura. Nesse sentido, o
cultivo das identidades apontadas por Caldart (2004) e as reflexões de
Borges e Silva (2012, p. 215) nos leva a compreender que “as pessoas
do campo são um coletivo e não um espaço singular que aproxima o
campo a uma construção histórica, diversa, de ressignificações, de
novos sujeitos e novas disputas”.
Muitos são os problemas sociais do meio rural, como
trabalhadores do campo, sem-terra, trabalhadores campesinos em
condições sub-humanas de trabalho, desapropriação de terras sem
devida indenização, residências e áreas alagadiças, descaso com o
ambiente, estrutura fundiária arcaica, inexistência de uma política
agrícola, desrespeito às áreas destinadas às comunidades indígenas,

- 179 -
inexistência de infraestrutura satisfatória que atenda à clientela
escolar. A escola no campo abraçará o compromisso social no
momento em que assumir o papel de desvelar o real para favorecer a
transformação dessa realidade. Este compromisso social efetivar-se-á
na busca por identidade sociocultural, na construção de projetos
sociais conquistados pela luta coletiva, baseado na refletida leitura de
mundo em associação a uma ação, possivelmente consciente. A
educação, em qualquer contexto sócio espacial deve incitar a
intervenção na realidade iminente, na verdadeira ação como sujeito
atuante, percebendo a totalidade social e conclamando à ação, assim
como, comenta Gajardo apud Calazans (1990, p. 115): “O sujeito,
entendido como grupo humano que se educa, é estimulado a
participar mediante perguntas abertas, propondo problemas e
relacionando livremente questões sociais”. O exíguo referencial,
acerca da Educação Ambiental no campo, incitou interrogações e
curiosidades, tornando possível empreender estudos, em que também
no meio rural se possa formar consciências que, a partir de uma leitura
desta realidade socioambiental, deem significado de libertação a uma
existência desejada. Que Educação Ambiental se deseja ao campo?
Uma Educação ambiental que se adapte à realidade local, em respeito
aos processos histórico-culturais locais, bem como às características
biofísicas e socioeconômicas locais. O objetivo fundamental da
Educação Ambiental será transformar a educação numa das forças
mais produtivas da comunidade, reconquistando em esforço

- 180 -
permanente, seu destino histórico por suas próprias mãos,
colaborando dessa forma, para um mundo comum. O fazer humano
envolve consciência e comportamento.
Portanto, a luta ambiental necessita de conscientização, só
adquirida pelo ato de educar-se. A luta ambiental congrega lutas
sociais, num misto de princípios e ações que tenham como alicerce
auxiliar os educandos a construírem uma consciência global das
questões relativas ao ambiente para que possam assumir posições
afinadas com os valores, sua proteção e melhoria. Para isso, é
importante que os educandos atribuam significado ao que saibam
sobre as questões socioambientais. E que esse significado resulte da
ligação que o educando estabelece entre o que aprende e o que já
conhece, possibilitando utilizar estes aprendizados em outras
situações. A perspectiva ambiental deve oferecer instrumentos à
compreensão de problemas que afetam este ambiente humano. Nesta
caminhada de compreensão, o educando com certeza irá intervir
sobre a realidade, de forma a valorizar igualmente todos os elementos
deste ambiente. O exercício constante de participação, desde o
ambiente escolar até movimentos envolvendo a comunidade, é
fundamental para a contextualização no processo educativo. O
ambiente é produto de relações naturais e socioculturais. A crise geral
de degradação socioambiental caracteriza um quadro de conflito nas
relações sociedade/natureza, exigindo a operacionalização de ações
locais, na perspectiva de soluções locais e globais. Assim, formar uma

- 181 -
consciência social para ações locais, implica um desafio aos planos e
programas de desenvolvimento. O planejamento e desenvolvimento
de políticas de gerenciamento ambiental pressupõem implicações
éticas, políticas, sociais e educacionais. Impõe-se uma nova ética,
exige-se o desenvolvimento de hábitos e valores sociais, que regulem
as relações de um indivíduo para com os outros, bem como dos
indivíduos com o meio. Impõe-se o resgate da identidade histórico-
cultural como preservação do patrimônio nacional. Impõem-se novos
dispositivos que tornem possível a comunicação entre as instituições
nacionais, onde o gerenciamento de programas e planos atentem aos
interesses populares. A “práxis política” deve estar imbuída de
manifestações de interesubjetividade, como condição basilar à
construção histórica. Impõe-se também organização e participação
popular na construção de um projeto nacional legítimo e que
represente canal de pronunciamento de uma conduta comunitária e
associativista na criação de novas fórmulas para tornar viável uma
mediação nas relações conflituosas entre sociedade e natureza.
Enfim, não há comportamento novo isento de experiências que
recriem o caminho humano. Não há apreensão do mundo sem
experimentar a vida. Não há comportamento ideal, acabado, há
sempre a conquista e criação de novas formas históricas em que o
homem inscreva a sua vida. Só acontece a educação na
intercomunicação de consciências, no encontro consigo e com os
outros. Está na intencionalidade da consciência humana o impulso à

- 182 -
elaboração de uma nova postura frente ao meio ambiente, como toda
a experiência humana, que tenta obstruir sua prática de libertação. A
Educação não vem constituindo prioridade às Políticas Públicas neste
país, por razões essencialmente, estruturais. Os planos educacionais
no Brasil são elaborados na óptica desenvolvimentista, tendo como
objetivos habilitar recursos humanos ao sistema produtivo dominante.
Segundo estes planejadores, a Educação não é concebida como
instrumento que sirva a todos, e que crie novas possibilidades de
produção científica e cultural, resultando em comportamento
consciente para a emancipação social e política. As pesquisas nessa
área, vem denunciando índices alarmantes, que figuram deficiências
no sistema educacional brasileiro. Este cenário desesperançoso
instaura sobre a sociedade nacional uma grande insatisfação com o
trabalho realizado, principalmente, na Escola Pública. O problema da
Educação Escolar no Brasil aponta para questões como: repetência
sucessiva – evasão escolar – desinteresse geral pelo trabalho escolar –
desvinculação do conteúdo pedagógico às exigências e interesses da
maioria da população – formação precária do quadro docente –
incipientes recursos e equipamentos didáticos – ausência de Projetos
Pedagógicos identificados à cada ambiente escolar. As questões
elencadas são também presença no sistema educacional do meio
rural. Acrescido a este elenco de preocupações soma-se a
incorporação de um modelo urbano de trabalho e estrutura escolar ao
meio rural, bem como a resistência em organizar um plano pedagógico

- 183 -
em que os principais orientadores do processo educativo –
professores – priorizem a valorização da cultura local na conduta do
processo educativo. Como fala Petty (1989, p.31):

A adequada capacitação dos docentes deve


abranger não apenas a sua atividade acadêmica,
mas também um conjunto de qualidades pessoais
exigidas para este tipo de educação, além de uma
estrutura que permita a maior identificação com o
conjunto da obra.

Essa resistência à elaboração de projetos pedagógicos


identificados à cultura local está associada ao próprio despreparo na
formação desses docentes. As instituições responsáveis à formação
inicial desses docentes não estão incluindo em seus currículos básicos,
reflexões epistemológicas, políticas e sociais, que condicionem à
criação de estratégias metodológicas ao trabalho pedagógico em
ambientes rurais. A escola no campo - ambiente pedagógico de caráter
formal – possui, ainda, na figura docente, sua mais forte referência. O
professor, em ambientes rurais, juntamente com os representantes
das instituições locais, representa força dinamizadora das relações
socioculturais, manifestadas e produzidas nestes espaços. Demo
(1991, p. 266) expressa com evidência o papel do professor no
processo pedagógico: “Será mister orquestrar todas as ações de modo
convergente, tendo na qualidade do professor o vetor mais
estratégico”. São tantas as atribuições destinadas a este educador?
Mais ainda a este educador do campo? Ou se espera muito da escola

- 184 -
no campo? Ao educador do campo – componente da escola do campo
– se percebe a tarefa de planejar uma oferta curricular em conjunto
com a comunidade escolar, que garanta a todos o desenvolvimento de
capacidades e possibilidades de reconstrução de conhecimentos
necessários à vida social, ao mundo do trabalho, da cultura e da
compreensão das relações sócio-políticas e econômicas deste modelo
social. Configurando ao educador, seu papel fundamental na trajetória
histórica, como afirma Luckesi (1986, p. 23):

[...] compreendo o educador, o autêntico


educador, como o ser humano que constrói, pedra
sobre pedra, o projeto histórico de
desenvolvimento do povo. Um ser, junto com os
outros, conscientemente engajado no “fazer“
história.

Este professor deve representar o canal mediador nas relações


dialógicas entre o aluno e o conhecimento. Impulsionando-o ao
desenvolvimento da criticidade, da criatividade e da autonomia como
verdadeiros pressupostos ao “aprender a aprender“. Este educador,
que procura desenvolver a percepção e análise contextual da
realidade em que o aluno se insere, já está dando pistas ao cidadão
que se conscientiza gradativamente, pois neste “ olhar reflexivo “ em
que o aluno passa a vislumbrar esta realidade que o cerca, reside a
percepção da importância do ambiente natural na construção de um
ambiente humano de qualidade, bem como as intrincadas relações
sócio-políticas e econômicas que serão compreendidas neste

- 185 -
conflituoso ambiente social que é a sociedade hoje. O “saber escolar”
deve estar qualificado também de cientificidade. Uma cientificidade
obtida pela reflexão do dia-a-dia, numa prática refletida, que irá
balizar um comportamento consciente na sociedade. Este educador,
comprometido com a formação de cidadãos conscientes e críticos
contribui fundamentalmente para a prática ambiental. Os problemas
ambientais locais necessitam ser identificados, analisados
coletivamente, e a partir da formação cidadã recebida, os membros da
comunidade escolar serão voluntariamente conduzidos à ação
ambiental. O que então se espera do educador ambiental no campo?
Basicamente, espera-se uma ação educativa marcada por uma opção
filosófica-política pela libertação - pela maturidade e atualização
profissional na reflexão teórica sobre a “sua” prática - e pela promoção
do espírito crítico como nascedouro da ambiência emancipatória.

Conclusão:
Portanto, é fundamental ao educador ambiental em qualquer
meio, tanto urbano quanto rural, porém tratado aqui o meio rural em
evidência, incorporar à prática educativa uma postura cidadã afinada
aos princípios de uma sociedade democrática, em que a qualidade de
vida dos atores sociais seja pensada de forma igual à qualidade
ambiental.É imprescindível ao processo de formação e informação do
cidadão consciente recriar conhecimentos, porém numa dimensão
interdisciplinar, onde diversos campos da ciência sejam chamados a

- 186 -
dialogar permanentemente. Ao educador do campo se impõe o
desafio em aliar docência – discência e pesquisa. Levando-o a recriar
metodologias em que o trabalho educativo seja ativo, atrativo e
reflexivo, aproximando a análise de questões sociais locais, onde na
verdade se formule uma educação através da vida e para a vida. Onde
o homem do campo descubra formas particulares para a busca de
melhores condições de vida, aliando justiça social, educação,
preservação ambiental, trabalho e acima de tudo enraizamento
cultural. E, a escola no campo, quando sensibiliza para a mobilização
social, à participação popular no encaminhamento de soluções às
questões socioambientais locais se aproxima da obtenção da
qualidade social “ também” no campo.

- 187 -
Referências

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do Campo e a organização do trabalho pedagógico. In: GUEDIN,
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- 189 -
Experiências da agricultura familiar: Assentamento Capela
em Nova Santa Rita/RS

Altair Groff20
Janete Webler Cancelier21

Introdução
A agricultura familiar possui significativo papel na economia
brasileira, sendo responsável pela maior parte da produção de
alimentos que são ofertados à população, bem como pelo maior
percentual de contratação de mão de obra no campo.
As reflexões atribuídas às questões trabalhadas indicam
atributos referentes à permanência da agricultura familiar na
atualidade e à sua continuidade. No espaço rural, a tendência
instaurada pelo capitalismo é inserir gradativamente a monocultura
em todos os locais, criando uma sensação de homogeneidade, sendo
aceito como algo natural. Porém, a agricultura familiar está presente
em todos os rincões, as mudanças estão presentes em todos os
aspectos e, atualmente, presencia-se, perante os agricultores
familiares, um processo maior de insegurança.

20
Doutorando em Geografia, UFSM. TAE – Técnico Administrativo em Educação na
UFSM.
21
Doutora em Geografia, UFSM. Professora do Curso de Licenciatura em Educação
do Campo da UFSM.

- 190 -
Numa abordagem sucinta, verificam-se os vínculos da
agricultura familiar com o mercado, bem como, na sequência, tratam-
se as estratégias utilizadas pela agricultura familiar no contexto social.
Há sempre um redirecionar, um reinventar, pois tal processo está
marcado por lutas, com muitas dificuldades, porém o reacender, a
busca por novos afazeres e novas ocupações no meio agrário estão em
trâmite.
Buscando entender o papel da agricultura familiar, utiliza-se
como área de pesquisa o assentamento da Reforma Agrária Capela,
localizado no Município Nova Santa Rita/RS, bem como a atuação da
Cooperativa Agropecuária de Nova Santa Rita (COOPAN), no sentido
de viabilizar a permanência dos jovens.
O assentamento Capela se destaca pela forma de organização
de seus membros e pelas culturas desenvolvidas, que ocorrem via
agricultura orgânica, isto é, acordadas com o princípio da convivência
natural. Neste, até meados dos anos noventa, a lógica era estudar para
sair da roça. No entanto, com o passar do tempo, este fenômeno se
alterou. Como exemplo, cita-se o estudo de caso de uma jovem
nascida e residente no assentamento (RUBENICH, 2017), que busca
estudar para permanecer no local e nele investir.
Como metodologia, optou-se pelo método qualitativo num
contexto dialético, pois as questões sociais e geográficas, no que se
refere ao vir a ser, aos movimentos do cotidiano, estão sempre
predispostas a seguir a própria sequência da natureza. Para seu

- 191 -
desenvolvimento, realizou-se a pesquisa bibliográfica, a pesquisa
documental, a pesquisa de campo e as análises. A pesquisa de campo,
ocorreu em janeiro do ano de 2019, com agricultores familiares do
assentamento Capela na Nova Santa Rita. A partir de uma conversa
informal, tornou-se possível vivenciar e compreender a importância
que possui o elemento terra, enfatizado pela Reforma Agrária, para a
reprodução e permanência dos agricultores familiares.
Constata-se que a agricultura familiar segue o mesmo princípio
da sua própria produção - produzir maçãs, arroz, milho, verduras,
sementes jogadas na terra... parece que o infinito as recolhe para si,
mas passa a noite, a luz resplandece e surge uma nova planta. Novos
rumos, novas metodologias de trabalho, novas políticas, novos
desafios. E a juventude representa a continuidade da atividade, pois
as máquinas não fazem dialéticas, são mecânicas, é preciso gente no
campo.

Permanência da Agricultura Familiar


A discussão sobre a temática da agricultura familiar está
presente na contemporaneidade em distintas áreas do conhecimento,
nas quais se busca demonstrar, de forma geral, a importância desses
sujeitos para a sociedade, bem como o papel atribuído a este
segmento de produtores em distintos espaços-tempos. Dessa forma,
os estudos relacionados à agricultura familiar e às dinâmicas que
movimentam esse grupo estão presentes em estudos acadêmicos e

- 192 -
debates políticos, ganhando centralidade na condução da temática
agrária, o que se deve, em grande parte, à referida heterogeneidade
desses sujeitos (CANCELIER, et. al, 2017).
A partir das reflexões teóricas, compreende-se que o termo
agricultura familiar é recente, sendo instituído de forma legal a partir
do ano de 1990, momento no qual surgiu nos debates políticos e
acadêmicos, por meio de discussões, reivindicações, e luta dos
movimentos sociais pela necessidade de valorização da agricultura
familiar, os quais lutavam pela garantia do direito à terra. Em 1994,
depois das pressões do I Grito da Terra Brasil, surge o Programa de
Valorização do Pequeno Agricultor, assim, esboçam-se as políticas
públicas reconhecendo a agricultura familiar.
Além disso, os estudos realizados conjuntamente pela
FAO/INCRA “definem com maior precisão conceitual a agricultura
familiar e estabelecem um conjunto de diretrizes que nortearia a
formulação de políticas para a agricultura familiar”. Esses estudos
serviriam de base para as primeiras formulações do Programa
Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar - PRONAF.
Até a criação do PRONAF, a categoria de produtor familiar não
havia sido utilizada pela política de crédito. De acordo com Buainain
(1997), os produtores vinham sendo classificados por “tamanho, com
base em uma estratificação feita ora a partir do nível de renda ora a
partir do tamanho da unidade e extensão da lavoura”. Dessa forma,
até o início da década de 1990, não existia nenhuma política pública

- 193 -
destinada ao atendimento das necessidades específicas da agricultura
familiar.
Contudo, os sujeitos que vivem e trabalham no campo estão
presentes anteriormente à institucionalização da Lei que legitima e
reconhece a existência do agricultor familiar. Esse grupo possui suas
raízes, conhecimentos tradicionais, um modo de vida, baseado em
atributos que vão além do fator econômico, os quais inclusive
permitem sua permanência ao longo dos anos. A lógica de
funcionamento da propriedade é distinta, a terra é vista como um bem
que possibilita o sustento, a (re)produção e a permanência e não
apenas para fins de exploração fundiária.
Entendido como um conceito geral, Wanderley (1997)
especifica que o termo agricultura familiar incorpora uma diversidade
de situações particulares. A referida autora ainda evidencia que todo
camponês é um agricultor familiar, mas nem todo agricultor familiar é
um camponês.
A permanência da agricultura familiar tende a manter-se por
motivos bem peculiares e inerentes à atividade, isto é, produzir
alimentos. Produção que, para o agronegócio, que investe mais em
cultivos destinados ao mercado externo, como a soja, não vislumbra
rentabilidade na produção de alimentos que atendem as demandas
diretas da população.
O trabalhador do campo, entretanto, que vive do campo, faz e
faz bem. Demonstra o agricultor familiar uma simbiose com o

- 194 -
ambiente, com as agruras da existência e não tem esmorecido, mesmo
diante das inúmeras crises enfrentadas pelo campo.
A produção da agricultura familiar, em sua maioria, destina-se
a atender as demandas das populações urbanas locais, contribuindo
para a segurança alimentar e nutricional de habitantes dos 5.570
municípios do Brasil. São 4,5 milhões de unidades familiares presentes
no Brasil, representando 84% do total de unidades rurais do país e
ocupando uma parcela de 21,4% da área total ocupada (CENSO
AGROPECUÁRIO, 2017). Mesmo trabalhando em pequenas áreas e
com indicadores de produtividade menores, além de acessar um
conjunto muito inferior de políticas públicas, o agricultor familiar ainda
é responsável por uma parcela considerável dos alimentos básicos e
das proteínas que abastecem a população brasileira.
Tomando como referência os últimos dois Censos
Agropecuários disponibilizados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), referente às edições de 2006 e 2017, torna-se
possível compreender a importância da agricultura familiar, bem como
a extensão da área ocupada, da população empregada, suas
produções, mercados, os avanços e retrocessos, entre outros
aspectos. Os dados do Censo demonstram que, apesar de todas as
dificuldades impostas e diversidades presentes, a agricultura familiar
se mantém ao longo dos anos.
Os dados do Censo Agropecuário de 2006 (IBGE) apontavam a
existência de 4,305 milhões de estabelecimentos considerados como

- 195 -
agricultura familiar, ou seja, representavam 83,2% do total. Estes
ocupavam 81,26 milhões de hectares, 24,4% da área total, dos quais
45% eram destinados a pastagens, 28% a florestas e 22% a lavouras.
Em relação à produção de alimentos que compõem a cesta básica do
brasileiro, a agricultura familiar era responsável por 87% da produção
de mandioca, 70% da produção de feijão, 46% do milho, 38% do café,
34% do arroz, 21% do trigo; e, na pecuária, 58% do leite, 59% do
plantel de suínos, 50% das aves e 30% dos bovinos.
Por sua vez, a edição de 2017 aponta a existência de 3,897
milhões de estabelecimentos agropecuários da agricultura familiar,
representando 76,8% dos estabelecimentos agropecuários brasileiros.
Em extensão de área, a agricultura familiar ocupa 80,9 milhões de
hectares, o que representa 23% da área total dos estabelecimentos
agropecuários brasileiros. A maioria destes estabelecimentos (81%) é
de propriedade das próprias famílias e a produção ocorre em áreas
com média de 22,6 hectares em 2017 (CENSO AGROPECUÁRIO, 2017).
De acordo com o levantamento, a agricultura familiar emprega
mais de 10 milhões de pessoas, o que representa 67% do total de
pessoas ocupadas na agropecuária. A agricultura familiar também foi
responsável por 23% do valor total da produção dos estabelecimentos
agropecuários.
Conforme o Censo, os agricultores familiares têm participação
significativa na produção dos alimentos que vão para a mesa dos
brasileiros. Nas culturas permanentes, o segmento responde por 48%

- 196 -
do valor da produção de café e banana; nas culturas temporárias, são
responsáveis por 80% do valor de produção da mandioca, 69% do
abacaxi e 42% da produção do feijão.
Ao realizar a comparação entre os dois censos percebe-se que,
no período de uma década, o número de estabelecimentos
classificados como agricultura familiar diminuiu 9,5%, o que equivale
a 406, 698 mil estabelecimentos; por sua vez, a área ocupada teve
queda de 0,5%, o que representa uma diminuição de 377 695 hectares
ocupados.
Estes resultados evidenciam que o agricultor familiar enfrenta
muitas dificuldades e obstáculos para se reproduzir no campo, entre
os quais estão: as intempéries climáticas; o tamanho das propriedades
que, muitas vezes, não geram renda suficiente para manter as famílias;
o acesso restrito aos mercados, principalmente para aqueles que se
encontram distantes de maiores centros populacionais; as dificuldades
de mobilidade, uma vez que muitas propriedades ficam localizadas em
espaços de difícil acesso, onde as estradas mal permitem a locomoção
dos agricultores; a carência de infraestrutura pública básica; a falta de
motivação para os jovens permanecerem no campo e assumirem o
estabelecimento; o envelhecimento da população; bem como a
carência de incentivos e políticas públicas destinadas aos segmento,
pois, ainda que o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura
Familiar (PRONAF) esteja presente, não está disponível a todos.

- 197 -
Contudo, apesar das dificuldades, os agricultores familiares
persistem, utilizando estratégias de (re)produção diversificadas.
Historicamente, utiliza estratégias para manter sua propriedade,
identificada não somente pelos seus aspectos econômicos, agregando
um conjunto importante de elementos simbólicos, implantando
diversos modelos e técnicas de produção e reprodução social, que
viabilizem, em última instância, a família.
De forma geral, na atualidade, o espaço rural brasileiro
apresenta realidades complexas e distintas, é um espaço de múltiplas
funções, onde as exigências ultrapassam a simples função daquilo que
os agricultores podem produzir e ficam, segundo Souza (2006), “mais
centradas naquilo que os inúmeros interesses econômicos, políticos e
sociais desejam que produzam o que traz implicações quanto a
reprodução da agricultura familiar”.
Nesse contexto, a exploração familiar “transforma-se, evolui,
adapta-se em função de sua história e do contexto econômico, social
e político no qual sobrevive” (LAMARCHE, 1993, p. 23). Em termos
gerais, a agricultura familiar permanece como um setor importante da
agricultura, mesmo nos países de capitalismo mais avançado, apesar
de todo o processo de transformação. Além disso, o rural vem
assumindo novas funções em termos de uso da terra, vem
apresentando novos agentes, novos atores vêm atuando no espaço e
novas formas de inserção ao mercado têm sido percebidas. O espaço
rural se transforma a todo o tempo, novas ruralidades e rearranjos

- 198 -
socioespaciais vão surgindo, e dentro deste contexto, estão inseridos
os agricultores familiares.
A agricultura familiar tem papel relevante dentro da economia
capitalista, atua sob diversas formas, desde a produção de
hortifrutigranjeiros até o fornecimento de matérias-primas para as
indústrias de transformação. No caso brasileiro, a reprodução da
agricultura familiar sempre esteve associada às lutas dos próprios
agricultores pela garantia do espaço necessário a sua sobrevivência.
Também, faz-se necessário compreender e analisar o espaço
ocupado pela agricultura familiar, como diversificado, onde distintas
relações se estabelecem. A heterogeneidade é característica
relevante; ocorrem diversas formas, técnicas de produção, de
organização social nas quais o ser humano é o “ator que anima as
formas espaciais, dando-lhe vida, atribuindo uma função que a cada
momento histórico, vai se modificando” (SANTOS, 2004). Dentro do
segmento da agricultura familiar, ainda há uma diversidade de
modelos de exploração. Mesmo que ocorram similaridades em relação
ao valor que a terra possui para estes, as formas de organização dos
espaços produtivos, o acesso a técnicas e aos mercados são
diferenciados. No caso específico da agricultura familiar, as diferenças
materializadas na paisagem geralmente são resultantes do acesso ou
não a recursos e investimentos públicos que determinados
agricultores possuem em relação aos demais.

- 199 -
A ação do Estado, via políticas públicas, influencia diretamente
as relações que se estabelecem nos territórios ocupados pela
agricultura familiar. O PRONAF se configura enquanto um exemplo,
ainda que seja um avanço nas políticas direcionadas aos agricultores
familiares, também apresenta entraves. O Programa não atende de
forma satisfatória todos os segmentos da agricultura familiar, a
burocracia e as exigências feitas excluem a maioria dos agricultores
dos recursos.
Bianchini (2015) relata que o PRONAF está vinculado a regras
do Sistema Bancário e não chega a todo o conjunto dos agricultores.
Dessa forma, os que não se enquadram nas normativas da Lei nº
11.326/2006 estão impossibilitados de acessar o Programa. Nesse
sentido, destaca-se que a bibliografia especializada refere que a
própria tipologia de agricultor familiar diz respeito a grupos
socialmente localizados predominantemente nas regiões Sul e Sudeste
do país. Corroborando essa assertiva, há inúmeras “linhas” existentes
no programa, resultado da diversidade e heterogeneidade desse
grupo.
Schneider (2016, p. 17) demonstra que “apesar de haver uma
grande diversidade de políticas que beneficiam os agricultores
familiares, que varia segundo os distintos países, a ação do Estado tem
sido decisiva”. De forma geral, em espaços onde o acesso às políticas
públicas é mais significativo, os agricultores familiares se
(re)produzem e permanecem. Concorda-se com Wanderley (1995, p.

- 200 -
43) que a agricultura familiar se move no interior de um certo espaço
social, e que os limites da reprodução desta forma social de produção
se dão, inicialmente, pelo acesso à terra.

O espaço ocupado pela agricultura familiar


O agricultor familiar na atualidade está presente em diferentes
proporções em todos os estados e municípios brasileiros. O Censo
Agropecuário de 2017 demonstra que a agricultura familiar é
responsável pela economia de 90% dos municípios com até 20 mil
habitantes e que 40% da população economicamente ativa depende
dessa atividade. O Brasil ocupa a 8ª posição entre os países que mais
produzem alimentos, considerada somente a agricultura familiar.
A reportagem do jornal Folha de São Paulo (2019) demonstra
que os agricultores familiares são responsáveis por mais de 80% de
toda a comida do planeta, segundo a ONU, que, inclusive, lançou
recentemente a “década da agricultura familiar”, para fomentar, entre
2019 e 2028, políticas que permitam o desenvolvimento e o progresso
dessa área.
O espaço ocupado pela agricultura familiar é diversificado. Em
um mesmo lugar, num mesmo modelo de funcionamento, as
explorações dividem-se em diferentes classes sociais, segundo suas
condições objetivas de produção, superfície, grau de mecanização,
nível técnico e capacidade financeira (LAMARCHE, 1993). Contudo,
independentemente da diversidade, todos, de alguma forma, ao longo

- 201 -
dos anos, foram/são afetados pelo direcionamento das ações do
Estado, entre as quais está a modernização do campo pelo viés
conservador.
O processo de reestruturação produtiva ocasionou mudanças
no espaço ocupado pela agricultura familiar de uma maneira muito
significativa. Nos últimos anos, principalmente a partir de 1950, o
espaço rural passa por contínuas mudanças, com um acelerado
processo de êxodo rural, resultando na prevalência do domínio de
poucos proprietários e da monocultura de produtos que atendem as
demandas do capital internacional.
A denominada “modernização conservadora” modificou
substancialmente a estrutura produtiva, sem, contudo, modificar as
formas de acesso e permanência na terra, ainda marcadamente
caracterizada pela existência de vastas áreas sob o domínio de poucos.
Esse processo estabeleceu um movimento de exclusão,
principalmente dos agricultores menos capitalizados, de tal forma que
é possível referir-se sobre um processo de aumento das propriedades
já identificadas como grandes em razão da incapacidade dos pequenos
proprietários suportarem a pressão (CANCELIER, et. al, 2017).
Contudo, apesar das constantes adversidades, o agricultor
familiar prevalece. Wanderley (2000, p. 31) ressalta que se assiste, nas
sociedades modernas, a um processo de “recomposição do rural” e da
emergência de uma “nova ruralidade”. Espaços, então, continuam

- 202 -
sendo ocupados pela agricultura familiar, com mudanças inerentes às
transformações ocorridas no país e no mundo.
As políticas públicas possuem papel central na permanência
destes grupos, na medida em que possibilitam o acesso a recursos, à
assistência e à própria terra.

Entre 2003-2014 foi implantado no meio rural


brasileiro... Um conjunto integrado de ações
públicas que, além de contribuir decisivamente
para o aumento da produção agropecuária do país,
proporcionou vida digna para uma parcela
expressiva da população que se encontrava à
margem da sociedade brasileira. Foi neste contexto
que, além de terem sido priorizadas ações diretas
junto aos assentados da reforma agrária e aos
agricultores familiares tradicionais, se priorizou o
atendimento também a diversos segmentos sociais
até então praticamente invisíveis às políticas de
desenvolvimento rural. Neste caso, destacam-se os
extrativistas, pescadores artesanais, povos
ribeirinhos, povos da floresta, quilombolas e
grupos indígenas, os quais passaram a ter acesso
aos recursos das distintas políticas públicas
(MATTEI, 2018).

As mudanças ocasionadas pelas políticas são significativas para


a agricultura familiar. No entanto, em nosso país, no atual momento,
fica evidenciado que o projeto de desenvolvimento rural adotado não
está voltado ao atendimento das necessidades do produtor familiar,
como um segmento a ser valorizado e beneficiado. Processo este que
vem a colocar em risco a manutenção e permanência dos agricultores
familiares. Apesar de haver um avanço significativo nos últimos anos
- 203 -
nas políticas destinadas aos agricultores familiares, estas ainda são
ínfimas se comparadas às destinadas ao agronegócio. Poucas vezes e
em poucos momentos da história, estabeleceram-se políticas mais
favoráveis à agricultura familiar. No geral, estas estão voltadas ao
agronegócio.
Em grande parte do território nacional, a produção do espaço
está vinculada à ação dos agentes territoriais. Esses agentes são,
segundo Correa (2011, p.44), “concretos, históricos, dotados de
interesses, estratégias e práticas espaciais próprias, portadores de
contradições e geradores de conflitos entre eles mesmos e com outros
segmentos da sociedade”. Os diferentes interesses dos agentes que
mobilizam o território têm ocasionado, ao longo dos anos, uma
diversidade de problemas que afetam as sociedades. Um dos
elementos visíveis deste processo no espaço rural é o aumento das
propriedades já identificadas como grandes, fenômeno este
recorrente das políticas adotadas ao longo dos anos que inviabiliza a
permanência dos agricultores familiares. A apropriação dos territórios
da agricultura familiar pelo agronegócio amplia as desigualdades
sociais.
Santos (1977) destaca que, para interpretar o espaço22 através
da geografia como o fato histórico que ele é, torna-se indispensável

22
A categoria espaço é abordada segundo a definição de Santos (2004: 63), isto é,
“um conjunto indissociável, solidário e também contraditório de sistemas de objetos
e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como o quadro único no
qual a história se dá”. Segundo Santos (1992), em cada momento histórico, o

- 204 -
compreender a história da sociedade mundial aliada à sociedade local,
pois isto é fundamental à compreensão da realidade espacial, além de
permitir a sua transformação a serviço do homem.
Na atualidade, ao se analisar o espaço rural, percebe-se que
sua função se alterou com o tempo, apresentando realidades
complexas e distintas. O rural, antes visto como um espaço prioritário
para a produção agropecuária, passa a ser visto como um espaço de
múltiplas funções.
Desse modo, o processo de reprodução do espaço geográfico
envolve dinâmicas implementadas por distintos agentes sociais, que
possuem demandas e interesses específicos. Os agentes territoriais
interessados nesse novo mercado evidenciam-no como um espaço
portador de qualidade da vida e bem-estar, criando novos usos,
principalmente, por meio dos condomínios rurais fechados, das
chácaras de lazer e do turismo rural. Atividades que já estavam
presentes, porém, muitas vezes, sem atributo comercial, passam a
ressurgir, dotadas de valores, sentidos e significados. Inserido neste
contexto, está o agricultor familiar, que busca acima de tudo manter
seu espaço.
Historicamente, o agricultor familiar utiliza estratégias para
manter sua propriedade, identificada não somente pelos seus

elemento a ser definido muda seu papel, sua posição no sistema temporal e no
sistema espacial, sendo que o seu valor deve ser tomado em função da sua relação
com os demais elementos e com o todo.

- 205 -
aspectos econômicos jurídicos, agregando um conjunto importante de
elementos simbólicos importantes, implantando diversos modelos e
técnicas de produção e reprodução social, que viabilizem, em última
instância, a família.
Alves e Vale (2013, p. 36) apontam para o uso do espaço rural
que vai além da exploração econômica, referenciam um conjunto de
atividades não agrícolas ligadas à moradia e ao lazer, nas quais
aposentados optam em residir no meio rural, ou pessoas na ativa que
se estabelecem no campo e continuam com trabalho no meio urbano.
As estratégias utilizadas estão elencadas na constante dialética
do acontecer, das mudanças. A produção de forma artesanal e ou
tradicional é um fator de resistência à permanência ou ao retorno ao
campo. Embora se estabeleçam outras atividades, a agricultura
continua sendo a atividade que identifica o meio rural.

O papel do Estado
Verifica-se que, a partir do ano de 2016, diversas ações vêm
sendo implementadas pelo Poder Público no sentido de enfraquecer
as reivindicações da agricultura familiar. A título de reflexão, destaca-
se a extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário em maio de
2016. Na época, suas funções foram incorporadas ao Ministério do
Desenvolvimento Social e Ministério da Agricultura, atualmente
inseridas no Ministério da Pecuária, Agricultura e Abastecimento, o
que, inegavelmente, implicou retrocessos, visto que as demandas da

- 206 -
agricultura familiar são numericamente menos expressivas e
articuladas do que aquelas oriundas da agricultura empresarial.
Contudo, os exemplos de ações e medidas que dificultam a
permanência da agricultura familiar são contínuas e constantes. Nos
dias atuais, entre os atos do “novo” poder executivo da união, está a
extinção do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional,
criado na década de 1990, órgão que desempenhou papel-chave para
tirar o Brasil do Mapa da Fome da ONU. "Quem tem fome tem pressa",
- com a frase simbólica, o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho,
liderou, em 1992, o Movimento pela Ética na Política. Era um clamor
de organizações da sociedade civil contra a corrupção numa época em
que mais de 32 milhões de brasileiros passavam fome no país. A
intensa mobilização articulada durante o governo de Itamar Franco
resultou na criação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e
Nutricional (Consea), extinto pelo atual presidente do PSL no seu
primeiro dia no Planalto. O governo também revogou os pontos sobre
a composição do conselho. As diretrizes e programas sobre segurança
alimentar e nutricional foram vinculadas ao Ministério da Cidadania.
Uma demonstração de que as ações do Estado estão mais voltadas ao
agronegócio, deixando para segundo plano o incentivo a quem produz
uma percentagem significativa de alimentos que vão para a
população.
No que se refere aos financiamentos e créditos destinados à
agricultura, a diferença de recursos destinados ao agronegócio e à

- 207 -
agricultura familiar é discrepante. Nesta linha de raciocínio, é válido
salientar o trabalho de Aquino, et. al. (2018, p. 125), no qual os autores
evidenciam que a política de crédito conduzida pelo Estado,
conscientemente ou não, tem contribuído para manter e até
aumentar o abismo produtivo que predomina no campo.

O perfil distributivo apresentado reflete o


movimento organizado do chamado “agronegócio”
no sentido de captar fatias crescentes de recursos
do crédito rural, mas também evidencia a
desigualdade que o próprio Estado introduz nos
processos de reprodução socioeconômicos das
“duas agriculturas” analisadas, com um nítido
desfavorecimento das formas familiares de
produção e trabalho no campo (AQUINO, et. al.,
2018, p. 130).

Em relação aos recursos destinados a viabilizar a permanência


dos assentamentos da Reforma Agrária, ocorrem sérios problemas,
como destaca Mattei (2018). Discorrendo sobre as dotações
orçamentárias agrárias, o autor (p.304) evidencia que, no ano de 2016,
dos R$ 946 milhões previstos para crédito-instalação de famílias
assentadas, nada foi efetivamente executado. Sequencialmente, este
mesmo autor cita que, do total de dotações autorizadas para o INCRA,
num montante de R$ 2,7 bilhões, aproximadamente 15% foi destinado
às atividades fins da reforma agrária, sendo que o restante desses
recursos foi utilizado para o pagamento de precatórios e para as
atividades de manutenção da autarquia (MATTEI, 2018, p.304-305).

- 208 -
No que tange à Reforma Agrária e à necessidade de modificar
a estrutura agrária presente em nosso país, marcada pela
concentração de terras, observa-se que a partir do ano de 2018,
poucas alterações ocorreram. Os Movimentos Sociais, bem como os
agricultores familiares, silenciaram-se de tal maneira, que suas ações
ocorrem de forma isolada em determinados espaços. Essa ausência
vem possibilitando que a agricultura empresarial, vinculada aos
interesses do capital internacional, amplie substancialmente suas
áreas. O Governo Federal, por sua vez, cria mecanismos que torna
possível esta exploração. Espaços que outrora eram ocupados por
povos tradicionais passam a ser explorados freneticamente em defesa
do suposto "crescimento econômico do país". Um crescimento que se
embasa somente em critérios econômicos e não sociais. Este
fenômeno está alinhado às demandas das políticas neoliberais, tendo
em vista que o modo de produção capitalista se embasa na produção
e apropriação da riqueza, desta forma, ocorre uma “[...] separação
entre política econômica e política social e a subordinação desta
àquela” (SAVIANI, 2007, p. 207).
Outro elemento a ser apresentado é o Plano Safra 2019/2020,
instituído pelo Governo Federal no ano de 2019, que apresenta
mudanças. É a primeira vez em 20 anos que um único plano atende a
todas as demandas dos diferentes grupos presentes no campo
brasileiro. A partir desse contexto, pequenos, médios e grandes
produtores rurais estão inseridos num mesmo pacote. O plano prevê
R$ 225, 59 bilhões para apoiar a produção agropecuária nacional.
- 209 -
Deste total, R$ 222,74 bilhões são para o crédito rural (custeio,
comercialização, industrialização e investimentos), R$ 1 bilhão para o
Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR) e R$ 1,85
bilhão para apoio à comercialização (MINISTÉRIO DA AGRICULTURA,
PECUÁRIA E ABASTECIMENTO, 2019).
Diante deste contexto, para acessar os recursos, a agricultura
familiar precisa se adequar. Algo desproporcional, na medida em que,
as demandas da agricultura familiar não são as mesmas da agricultura
empresarial. Pois, a agricultura familiar, em muitas circunstâncias,
devido as suas especificidades, não tem condições de competir
igualmente com a agricultura empresarial, muito menos de concorrer
pelos recursos. Assim, considera-se que as formas de atuação e as
ações direcionadas para a agricultura familiar pelo Governo Federal
devam ocorrer de forma diferenciada, não no sentido de beneficiar,
mas de incentivar, estimular e propiciar aportes para a permanência
destes grupos e de seus cultivos que são essenciais para a garantia da
segurança alimentar.
Apesar desses retrocessos e das constantes tentativas de
desarticular a agricultura familiar, os agricultores prevalecem. Aqui,
destacam-se os assentamentos da Reforma Agrária do município de
Nova Santa Rita, estado do Rio Grande do Sul.

Assentamento Capela
A busca por alimentos saudáveis, livres de agrotóxicos, tem se
ampliado na sociedade brasileira. Estes produtos são muito cultivados
- 210 -
pelos diferentes segmentos que compõem a agricultura familiar, entre
os quais estão os assentamentos da Reforma Agrária. A partir da figura
1, torna-se possível visualizar a distribuição dos assentamentos no
estado do Rio Grande do Sul entre os anos de 1975 - 2016.

Figura 01: Número de famílias assentadas 1975-2016 - COREDEs

A partir do acesso à terra, as famílias passaram a ter uma fonte


de renda e a possibilidade de produzir uma diversidade de alimentos
e matéria-prima. Veiga (2002) enfatiza que onde se valorizam a
agricultura familiar e a educação, tem-se uma vida com saúde.
O território gaúcho, entre os anos de 1975 a 2012, contabilizou
336 assentamentos (DATALUTA, 2013, p. 18). Certifica-se nestes que
cada família e a comunidade têm a possibilidade concreta de produzir

- 211 -
alimentos saudáveis diversificados. Nesse contexto, estão inseridos os
assentados do assentamento Capela do Município de Nova Santa
Rita/RS, localizado na Região Metropolitana de Porto Alegre,
conforme figura 1, onde os jovens estudam e trabalham nas atividades
agrícolas.
O Assentamento Capela, figura 2, foco deste estudo, foi criado
em 5 de maio de 1994 e abriga atualmente 100 famílias, a maioria
oriunda da região norte do estado. Deste total, 29 famílias e 70 sócios
estão envolvidos diretamente nas atividades de produção,
industrialização e comercialização de arroz orgânico, leite e carne
suína, por meio da Cooperativa de Produção Agropecuária Nova Santa
Rita LTDA (COOPAN), fundada em 1995.

Figura 02: Assentamento Capela

Fonte: Arquivo pessoal dos autores, 2019.

- 212 -
No assentamento, também são produzidos hortaliças, frutas e
peixes. Os alimentos são comercializados através do Programa
Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) em mercados e feiras da
região da grande Porto Alegre - RS.
Os dados revelam, de forma qualitativa, a persistência, a
coerência e a manutenção do estado de vida com a terra, com o meio
ambiente, com os consumidores, os quais não são consumistas no
sentido do capital, do comércio que tem como fim o lucro. São os que
advêm do básico, do essencial, daquilo que fez manter a continuidade
da existência, ou seja, produzir alimentos. A partir da figura 03, é
possível observar duas atividades do assentamento: à esquerda, o
beneficiamento de arroz orgânico e, à direita, o grupo que trabalha
com o abate de suínos.

Figura 03. Jovens no trabalho das agroindústrias do Assentamento Capela

Em ambas as atividades, é constante a presença dos jovens, os


quais são valorizados pelos seus conhecimentos e atuam diretamente
à frente de diversas atividades presentes no assentamento. Convém
- 213 -
destacar que muitos jovens realizam curso superior, alguns ficam fora
do assentamento durante o curso, mas ao término, acabam
retornando e assumindo diferentes funções, segundo suas áreas de
formação.
O assentamento em questão possui, em seu espaço, uma
escola municipal de ensino fundamental, a qual oferece o ensino nos
anos iniciais e 1º ao 5º ano. Nos anos seguintes, para realizar o ensino
fundamental II e o ensino médio, os estudantes são levados para
escolas que estão fora do assentamento. A prefeitura disponibiliza o
transporte gratuito para os estudantes.
Em relação à cooperativa do assentamento, um fato destacado
pelos depoentes se refere à ampliação no número de jovens sócios ao
longo dos anos. Esse crescimento se apresenta como uma necessidade
de inserir os jovens no processo de trabalho da cooperativa. A partir
destes, a cooperativa tem ampliado suas estruturas,
consequentemente aumentando sua produção e suas frentes de
trabalho (RUBENICH, 2017).
A abertura da Cooperativa aos jovens se deu num momento em
que muitos pensavam em sair para estudar e ter uma profissão que
não estivesse vinculada diretamente à agricultura. Os assentados,
representados pelos pais, principalmente cooperados fundadores,
passaram a entender que a terra adquirida com tanto esforço poderia
ficar sem sucessor. Neste contexto, começaram a pensar em
alternativas viáveis para o retorno dos jovens ao assentamento após o
término do curso superior, bem como para a continuidade daqueles
- 214 -
que não almejavam continuar estudando. A condição de sócio na
Cooperativa se mostrou muito atrativa para a maior parte dos jovens,
os quais permaneceram no assentamento. No ano de 2018, o
assentamento contava com 31 jovens associados (DIÁRIO DE CAMPO,
2019). A continuidade da agricultura familiar no assentamento se
viabiliza pela permanência desses jovens.
Neste assentamento, segundo Rubenich (2017), os jovens que
fazem parte da Cooperativa pretendem permanecer. A saída é
considerada como hipótese, somente para aqueles que desejam
realizar cursos superiores nos quais não é possível ainda desenvolver
atividades na Cooperativa, como são os cursos vinculados à área da
saúde. Atualmente, entre as áreas de formação em nível superior dos
jovens sócios estão: economia, agronomia, administração, zootecnia e
licenciaturas.
A partir do trabalho de campo realizado (2019), os jovens
reconhecem que são motivados a permanecer, que a abertura na
participação enquanto sócios da Cooperativa foi crucial neste
processo. Eles se sentem felizes, pois além da remuneração, estão com
as famílias, além de que o local é considerado tranquilo, seguro, com
estrutura e com fácil acesso à capital do estado. O rodízio no trabalho
entre as diferentes atividades permite que o jovem tenha
conhecimento de todas as atividades realizadas pela Cooperativa, bem
como a sua importância para os resultados alcançados.
Contudo, os jovens salientam a dificuldade de acessar um curso
superior gratuito, ainda que estejam inseridos na região metropolitana
- 215 -
da grande Porto Alegre, onde estão presentes instituições públicas de
ensino superior. A maior parte dos cursos são ofertados durante o dia,
período em que os jovens estão trabalhando. De acordo com os
depoentes, os cursos ofertados à noite estão mais presentes nas
instituições privadas de ensino, sendo que a falta de financiamentos e
os cortes realizados pelo Governo Federal na educação dificultam o
acesso aos estudos. Ainda destacam a falta de investimentos do poder
público, principalmente na consolidação de acesso a mercados.
Mesmo diante de dificuldades inerentes aos acontecimentos
atuais interligados aos que se propagaram no passado, percebe-se que
há interesse e vontade dos jovens em permanecer no meio rural e
continuar com suas atividades na agricultura familiar. No
assentamento Capela, a Cooperativa, proporciona oportunidades e
subsídios para os jovens continuarem no local de origem. Inseri-los nas
atividades desenvolvidas e remunerar é essencial, no sentido de
possibilitar que este vislumbre permanecer no campo a partir de seu
trabalho.
Incentivar a permanência da agricultura familiar em seus
diferentes segmentos é possibilitar a construção de uma sociedade
mais igualitária, oportunizando melhores condições de vida para o
trabalho, bem como condições de saúde e educação, em que os
valores não estejam unicamente vinculados aos direcionamentos
determinados pelo capital neoliberal e exploração da sociedade.
Modelos como o do assentamento Capela demonstram que isso é
possível.
- 216 -
Considerações Finais
As atividades vinculadas ao agronegócio têm modificado
substancialmente as paisagens rurais. Áreas ocupadas por
comunidades tradicionais e demais agricultores familiares sofrem
constantes pressões. Os investimentos, em sua maioria, são
destinados ao agronegócio. Ainda que, no atual momento, todas as
demandas estejam vinculadas a uma única pasta, o poder de
articulação política dos agricultores familiares é inferior se comparado
aos que representam os interesses do agronegócio.
Ao longo dos anos, os agricultores familiares enfrentam
constantes adversidades. Entretanto, apesar das dificuldades
impostas, estes recompõem-se, resistem, organizam-se em
movimentos e lutam pelas condições de trabalho, pelos
investimentos, pela sobrevivência.
O assentamento citado no texto é um exemplo de resistência,
de persistência, em que o baixo custo de investimentos não
impossibilitou o retorno satisfatório à sociedade quanto à produção
de alimentos e empregos aos envolvidos no setor. Aos jovens, o
estímulo à permanência e sua inserção nas atividades têm
possibilitado uma nova realidade a este espaço, validada pela
continuidade dos jovens. O assentamento e o residir no campo
demonstram atitudes de ocupação deste espaço, mostrando que a re-
territorialização é possível.

- 217 -
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- 220 -
Passando adiante as heranças: experiências na horticultura
urbana no município de Santa Maria/RS

Ana Carla Lenz23


Daiane Loreto de Vargas24

Introdução
Quando falamos em educação do campo lembramos dos
espaços rurais, dos processos de ensino e aprendizagem que ocorrem
nele, contudo temos que elucidar que toda área urbanizada já foi
destinada às práticas agrícolas. O que comprava são os inúmeros
espaços destinados a “agricultura urbana”, na contemporaneidade.
Sendo assim, as técnicas de cultivo deveriam estar presente nas
dinâmicas escolares, sejam elas rurais ou urbanas visto que os
documentos norteadores da educação brasileira orientam para a
inserção das experiências extra escolar, dos alunos, nos currículos.
Seguindo essa linha de pensamento, o capítulo visa transcrever
a história bem-sucedida de práticas de ensino voltadas para uma
educação do campo em área urbana do município Santa Maria. Além
de destacar como as práticas de ensino impregnadas de educação
contribuíram para a formação de um sujeito com senso de
responsabilidade social, crítico e atuante no meio em que vive, mesmo

23
Doutoranda em Geografia, UFSM. E-mail: anacarlalenz@gmail.com.
24
Doutora em Extensão Rural, UFSM. Professora do Centro de Ciências Agrárias,
Ambientais e Biológicas, UFRB. E-mail: loretodevargas@gmail.com.

- 221 -
com a mudança de paisagem. Para isso serão relatados os trabalhos
voluntários realizados por um ator social no município de Santa Maria,
atual área de residência do mesmo.
A abordagem utilizada para a redação desse capítulo foi a
qualitativa. No primeiro momento realizou-se o levantamento
bibliográfico sobre: educação do campo, ensino, paisagem, lugar e Leis
que disciplinam e orientam a educação brasileira. No segundo
momento foi realizado a pesquisa diretamente com o depoente, em
virtude da pandemia ocasionada pelo Covid-19, fez-se uso das redes
sociais whatsapp e facebook. Através dessas tecnologias de
comunicação, o entrevistado respondeu questões e enviou
fotográficas das ações que realiza no município de Santa Maria. E, no
terceiro momento, se compilou as informações e os dados coletados
para a redação do presente texto.
A relevância deste trabalho está no descrever como as práticas
de ensino contribuem para a formação dos sujeitos, elas podem, ou
não, formar cidadãos atuantes de forma positiva no meio em que
vivem. No caso aqui, apresenta-se um exemplo positivo de ensino
impregnado de educação para a formação de pessoas responsáveis,
que operem no espaço social, modificando não só as suas vidas, mas
também de outras pessoas, através da reprodução e transmissão do
que foi ensinado no ambiente escolar.

- 222 -
O ato de ensinar: experiências vivenciadas no e do lugar
A educação escolar brasileira está atualmente dividida em
Educação Superior, Educação Básica, mas também atende a Educação
de Jovens e Adultos e a Educação Profissional. Na Educação Básica os
sujeitos passam por alguns níveis: Educação Infantil subdividida em
creche (para crianças de até três anos de idade) e pré-escola (para
crianças de quatro a seis anos de idade), Ensino Fundamental em anos
iniciais e anos finais e Ensino Médio cada uma dessas etapas possui um
currículo específico. É disciplinada pela Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Brasileira – LDB de 1996, de acordo com esta Lei, a educação
é dever da família e do Estado.
A LDB/1996 em seu Art. 2 observa que a educação tem “por
finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o
exercício da cidadania e a sua qualificação para o trabalho”, deixa
claro, em seu texto, que a educação básica é obrigatória (a partir da
pré-escola) e gratuita em todos os níveis nas instituições próprias do
governo. A Educação Infantil, segundo a LDB/1996, deve
complementar as ações da família e da comunidade promovendo “o
desenvolvimento integral da criança, até os seis anos, em seus
aspectos físico, psicológicos, intelectuais e sociais”.
Se a Educação Infantil deve complementar as ações da família
e da comunidade (a qual a criança é membro) as escolas devem
adaptar os seus currículos a cultura local? Se a Escola for elemento de
uma paisagem fortemente marcada por ruralidades, elas, as
ruralidades, devem compor o Planos Políticos Pedagógico- PPP? São
- 223 -
questões que devem ser respondidas pensando nas escolas do campo
e nas escolas urbanas? Para que não ocorra essa dualidade Meurer
(2010, p. 14) destaca que:

[...] o projeto político-pedagógico da idade


moderna presentifica-se na escola de formas
diferentes, propondo uma educação que busca
controlar os pensamentos, as ações, os
comportamentos, transformando essas
instituições em espaços que não privilegia a
diversidade.

Outra questão que cabe lembrar quando se discute PPP, é que


todo urbano já foi rural na escala espaço-tempo, as inúmeras áreas de
agricultura urbana que existem na paisagem brasileira confirmam essa
ideia. Essas questões se materializam, também, a relação da
agricultura que está intrínseca nos moradores urbanos, muitos do
quais são oriundos dos espaços rurais e por isso incluem em seu
cotidiano a preocupação com os hábitos alimentares e com a
segurança alimentar da família.
A corporificação dos saberes desses sujeitos, que eram rurais e
no decorrer de suas vidas tornaram-se urbanos, muitas das vezes
ficam visíveis na prática da agricultura urbana. A qual tem sido
realizada, de forma cada vez mais ampliada, em pequenas áreas e
destina-se a produção de alimentos saudáveis para o consumo
próprio. Essas práticas geralmente são realizadas em pequenas hortas,
terraços, pátios, quintais ou espaços públicos comunitários. Fato que
expressa a presença da ruralidade no espaço urbano.

- 224 -
Exemplos práticos dessa questão são encontrados no
município de Santa Maria, na região central do Estado Rio Grande do
Sul, onde o cultivo de hortaliças tem sido frequente nos quintais de
muitas famílias, assim como o plantio em espaços comunitários e
solidários. Nos últimos anos a área urbana do município tem se
expandido sobre o espaço rural, assim algumas localidades que
anteriormente eram destinadas ao cultivo agrícola, atualmente são
configuradas como bairros urbanos.
Um exemplo é o bairro Patronato (Figura 1), em Santa Maria,
que anteriormente tinha sua área destinada a produção da cultura
arroz e hoje em dia mantém os plantios de verduras e legumes nas
denominadas hortas urbanas. Portanto, embora tenha sido
reconfigurado para o espaço urbano do município, o modo de vida de
alguns dos habitantes do bairro são de características rurais.

Figura 1 – Fração de paisagem do Bairro Patronato – Santa Maria/RS

Fonte: Google Maps, adaptado por Lenz (2020).


- 225 -
O quadrado e o retângulo destacados na Figura -1 demonstram
os cultivos de hortaliças, legumes, milho e mandioca promovidos por
antigos arrendatários de áreas rurais, na atualidade proprietários de
terrenos urbanos. Os relatos são de que a urbanização foi se
apropriando e transformando a paisagem de uma forma acelerada e
desordenada, suprimindo o espaço rural. Já o círculo diz respeito a
uma escola, a distância entre esses dois elementos paisagísticos é
mínima, o que os separa são alguns metros e uma avenida. A questão
é, se as práticas agrícolas existentes nas duas hortas fazem parte do
espaço em que a escola está inserida, porque elas não estão nas
práticas de ensino? O relato por Meurer (2010), talvez, responda à
questão:

A escola tornou-se distante da sociedade. Os


murros a separam do cotidiano das vidas dos
educandos, pais, comunidade. A comunidade na
qual a escola encontra-se inserida, no campo, com
possibilidades e saberes acumulados por
agricultores e agricultoras, aparenta estar
desconectada dos conhecimentos apresentados
pelos educadores, destoando da comunidade, dos
ritmos, ritos e cultura. As especificidades de cada
comunidade, com suas festas, organização, datas e
formas de plantio e colheita, dialetos, entre outros
saberes, deixam de ser aceitos. O que passa a
vigorar é algo que busca desarticular
conhecimentos historicamente acumulados
(MEURER, 2010, p.14-15).

- 226 -
A descrição da autora faz referência às escolas do campo, mas
se enquadra também para as escolas urbanas, pois como já
comentado todo urbano já foi rural. Assim como, toda escola é um
elemento social do lugar onde está alocada, elas fazem parte das
dinâmicas sociais reveladas pelas paisagens urbanas e rurais. O grupo
que a habita, a construiu ou reconstruiu, a paisagem, possui uma
historicidade, hábitos e costumes, saberes e fazeres que
contribuem/contribuíram para com a formação identitária dos
sujeitos, como destaca Lenz, Cancelier e De David (2019).

A identidade de um sujeito é formada a partir da


interação de uma multiplicidade de elementos,
entre os quais se destacam: nome, idade, sexo,
traços familiares, o lugar onde se nasce com suas
paisagens naturais e culturais. As relações sociais e
as interações estabelecidas entre sujeitos ao longo
da vida contribuem para a formação da identidade.
Cada sujeito possui traços/memórias construídas a
partir da infância, relacionados diretamente ao
lugar vivenciado com suas peculiaridades
impressas (LENZ, CANCELIER, DE DAVID, 2019, p.
80).

Os autores também observam que “na infância, a interação


com o ambiente e com as informações encontradas ocorre geralmente
a partir do tato, paladar, audição, visão e olfato” (LENZ, CANCELIER, DE
DAVID, 2019, p.80). Sendo assim, desenvolvem práticas de ensino que
promovam a experienciação com as diferentes formas de movimento,
trabalhos, ritmos, ritos entre outros do lugar em que a escola está

- 227 -
inserida favorece o sentimento de pertencimento a ele e ao grupo
social.
Mas para isso a comunidade escolar precisa estar em diálogo
com o grupo, saber quais são as dinâmicas socioeconômicas,
socioambientais e socioculturais que marcam a paisagem. Uma forma
de realizar esse levantamento é por meio da avaliação diagnóstica,
voltada para identificar o perfil dos alunos. Com as informações e
dados sobre as rotinas dos alunos e sobre a configuração espacial, se
torna mais viável a elaboração de práticas de ensino voltadas para o
lugar de vivência deles. A própria Base Nacional Comum Curricular –
BNCC de Geografia orienta que no primeiro ano da disciplina, na
unidade temática: o sujeito e seu lugar no mundo, se tenha como
objetivo de conhecimento o modo de vida das crianças, que elas
aprendam a descrever as características observadas de sua
espacialidade (BRASIL, BNCC, 2016).
Cabe lembrar que os lugares são os espaços geográficos com os
quais os homens e mulheres estabelecem relações de sentimentos
como: alegria ou tristeza, conforto ou desconforto, proteção e
exposição, silêncio ou barulho e as expressões dos grupos com o
espaço dependem das características físicas do mesmo e dos
interesses do grupo social. As interações na paisagem humanizada, ou
não, envolve sua transformação em cultura, por isso toda paisagem
possui significado simbólico enquanto apropriação e transformação

- 228 -
(LENZ, CANCELIER, DE DAVID, 2019, p.80), motivo pelo qual se faz
necessário inseri-las nas práticas de ensino escolar.
Visando aproximar as práticas de ensino escolar com as
práticas de ensino social, tornando-as mais fronteiriças e não as
destoando das especificidades de cada comunidade, pois se as práticas
se conversam não ocorre a desarticulação dos conhecimentos
historicamente construídos revelados na paisagem. Nesse sentido,
talvez, as escolas do mundo moderno deixem de serem espaços de
formação que interessa ao sistema capitalista, que busca estabelecer
controles sociais e formar consumidores, que alimentam a produção
desse sistema, gerando cada vez um número maior de necessidades.
(MEURER, 2010, p.16). E passem a formar pessoas com senso de
responsabilidade social, críticas e atuantes no meio em que vivem.
Por “serem nos espaços de vivências que os sujeitos são
submetidos a inúmeras práticas de ensino não formais para o processo
de socialização” (LENZ, SOUZA, DE DAVID, 2019, p. 277), de acordo
com Rego e Costella (2019, p.2), é nesse contexto que a educação se
associa a cada uma das “ações tópicas de ensinos diversos e ao mesmo
tempo as ultrapassa em significados, pois seu objetivo mais
abrangente é simultaneamente difuso é a adequação dos indivíduos à
sociedade” por meio da educação. Os autores também destacam que
existe uma diferença entre educação e ensino apresentados no
resumo do Quadro -1, a seguir.

- 229 -
Quadro 1 – Diferenças entre educação e ensino
EDUCAÇÃO ENSINO

• Abrangente; • Sistemático (relativo a um


• Adequação para a vida sistema);
em sociedade; • Transmissão de
• Todos os espaços e conhecimentos;
tempos; Combinações múltiplas • Meta específica a ser
entre o explícito e o subjacente atingida;
(que não se manifesta • Diplomas (níveis
claramente); curriculares);
• Inclui diversos ensinos. • Impregnado de educação;
• Instrumental.
Fonte: adaptado de Rego; Costella (2019).

Como se observa no esquema o ensino e a educação não são


sinônimos apesar de serem indissociáveis. O ensino é instrumental
relativo a um sistema voltado para a transmissão de conhecimentos,
mas está impregnado de educação, pois, no ato de ensinar as
ideologias, as culturas são comunicadas de uma forma implícita e, o
ensino escolar possui seus níveis curriculares e diplomas. Já a
educação é mais abrangente, ocorre em todos os lugares e tempos,
possui diversos ensinos com combinações múltiplas do que é explicito
com que não se manifesta claramente, é uma preparação do sujeito
para a vida em sociedade ou comunidade.
Sendo assim, podemos considerar que nas práticas de ensino
os educadores transmitem suas ideologias e sua cultura (seus saberes
e fazeres, seus hábitos seus costumes), ou seja, seu modo de ver o
mundo de uma forma não clara. Mas, será que os possuem senso de

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responsabilidade social e são atuantes no meio em que vivem
conseguem transmitir seu modo de ser para os seus alunos? E, seus
alunos, na etapa adulta de suas vidas seguem passando adiante o que
lhes foi ensinado?

Multifuncionalidade da horticultura urbana e periurbana


As práticas agrícolas em meio urbano ou periurbano se
configuram atualmente como um fenômeno mundial, estando
presente em todos os países e podendo ser encontradas em diversos
formatos e finalidades em quase todas as cidades do mundo, desde as
grandes metrópoles, até aquelas pequenas cidades, que ainda
possuem características rurais bastante presentes.
As agências das Nações Unidas, como a Organização das
Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), adotaram os
termos agricultura urbana ou periurbana “referindo-se à utilização de
pequenas superfícies situadas dentro das cidades ou em suas
respectivas periferias para a produção agrícola e criação de pequenos
animais, destinados ao consumo próprio ou comercialização em
mercados locais” (SMITH et al., 1996, apud MELO, 2016). Sobre esse
tipo de agricultura, Melo (2016, p.1) ressalta que:

Essas atividade são de caráter multifuncional e


multicomponente, que inclui a produção ou
transformação inócua de produtos agrícolas e
pecuários em zonas intra e periurbanas para
autoconsumo ou comercialização, (re)

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aproveitando de modo eficiente e sustentável os
recursos e insumos locais, promovendo a gestão
urbana, social e ambiental das cidades,
contribuindo para a melhoria da qualidade de vida
da população.

Sendo assim, observa-se que a produção de alimentos em


espaços urbanos e periurbanos, promove a relação do sujeito com a
terra, tem por objetivo uma alimentação saudável e ainda, pode gerar
renda para as famílias, quando parte desses alimentos são
comercializados. Além disso, por vezes, esse tipo de produção se
consolida em espaços comunitários e sociais, onde crianças, jovens,
adultos e idosos podem estar interagindo socialmente e no cultivo da
terra, afim de produzir o próprio alimento.
Ademais, Smit e Bailkey (2006) apud Santos (2012) ressaltam
que a agricultura urbana e comunitária pode contribuir para o capital
humano, social, político, cultural, econômico e natural do local onde
está inserido e dos sujeitos envolvidos nessa prática. A atividade
também pode ser prejudicada pela falta de participação ativa dos
agentes, pela falta de equipamentos adequados, de assistência técnica
e de materiais básicos para levar adiante a produção de alimentos
(sementes de qualidade, adubos, irrigação adequada, dentre outros).
Essa alternativa tem ganhado destaque em projetos sociais,
que utilizam áreas individuais ou coletivas para o cultivo de alimentos,
com objetivo de uma produção sustentável e do combate à pobreza
urbana, já que a fome é um dos principais flagelos da pobreza em

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espaços periféricos das cidades. Assim, são fortalecidos os laços
comunitários e as estratégias coletivas para a segurança alimentar.
Podem ser citados, nesse sentido, as hortas comunitárias,
hortas escolares e as hortas terapêuticas ou ocupacionais (ARRUDA,
2006). As quais se tornam espaços de educação ambiental, de prática
dos saberes rurais, de valorização da educação do campo e de
incentivo a participação e a mobilização social. Enfim, contribuem para
a valorização geográfica do lugar e dos sujeitos.

Um conto: passando adiante o que se aprendeu “lá atrás25”


Relata-se e discute-se aqui, ações socioambientais na
construção da agricultura urbana e periurbana, através do trabalho
voluntário de um sujeito26 que tem sua história marcada pela
agricultura familiar, embora, na atualidade, esteja residindo no espaço
urbano de Santa Maria. O participante é natural do município de Cerro
Largo, situado na região noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. A
paisagem cerro-larguense contemporânea é intensamente marcada
pelas ruralidades com suas hortas, pomares, pequenas áreas com
lavouras de mandioca, milho, abóbora

25
Agradecemos ao senhor Leonir Welter Caetano pela paciência, dedicação e
comprometimento com a pesquisa.
26
Cerro Largo tem a sua história de formação territorial pautada na colonização
alemã e Santa Maria iniciou o seu povoamento com uma instalação de um
acampamento militar. Duas configurações paisagísticas diferentes, uma paisagem
fortemente marcada pela agricultura familiar e outra pelos assentamentos militares
que iniciaram o processo de urbanização na atual rua do Acampamento

- 233 -
Os cultivos urbanos no município ganharam destaque com os
ensinados do educador Irmão Ambrósio, no antigo Movimento
Assistencial de Cerro Largo – MACEL instituído em 1977, hoje, Escola
de Educação Infantil Irmão Ambrósio em homenagem ao educador já
falecido. O movimento foi criado para atender crianças em
vulnerabilidade social do município. Era mantido por meio de doações
e por ações promovidas, como: brechós, venda do excedente dos
cultivos da horta, venda de pães e tortas, entre outras desenvolvidas
por membros da comunidade que trabalhavam na instituição.
O educador irmão Ambrósio era responsável pela manutenção
da horta orgânica, à época, foi nela que, segundo o nosso depoente,
inúmeras crianças aprenderam a técnicas agrícolas de cultivo
agroecológico. Os ensinamentos do educador abarcavam desde o
tratar a terra, adubar, plantar, colher e comer o que se plantava. Todo
a colheita era destinada ao movimento, o que não era consumido no
local, nas refeições servidas às crianças era vendido para custear a
manutenção da estrutura física e, também, para a compra de
sementes e ferramentas para as práticas na horta.
A partir dessa vivência/experiência marcante, o entrevistado
reproduz o que aprendeu “lá atrás” na paisagem santa-mariense por
meio de trabalhos voluntários em duas instituições do município, Lar
das Vovozinhas e casa de Apoio Dona Odete. Além disso, mantém um
cultivo orgânico em sua propriedade do qual faz uso do excedente
para preparar marmitas e distribuir a crianças e idosos em

- 234 -
vulnerabilidade social do município de Santa Maria, através do projeto
“Proteínas de Carinho” criado por ele.
A Associação Amparo e Providência Lar das Vovozinhas,
fundada em 16 de outubro de 1946, atualmente, é considerado o
maior asilo do Brasil segundo seus administradores, com mais de 190
idosas residentes. Nessa instituição o depoente mantém uma horta
orgânica e um pomar para compor a alimentação das moradoras do
Lar. Trabalha na mesma, nos sábados e domingos, quando realiza o
trabalho durante os dias uteis da semana promove, também, a
integração entre gerações, levando crianças para ajudar na
manutenção e no plantio como mostra a Figura - 2.

Figura 2 - Trabalho na Horta do Lar das Vovozinhas - Santa Maria/RS

Fonte: Arquivo pessoal de Leonir Welter Caetano, 2020.

Para o entrevistado, trabalhar com crianças e jovens garante


que todos os ensinamentos do seu educador, Irmão Ambrósio, sejam
passados adiante, umas das suas preocupações é que as futuras

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gerações percam o amor pela terra, pelo alimento “natural” orgânico.
De acordo com ele, deve-se ensinar as técnicas de cultivos agrícolas
tanto para as gerações do urbano como do rural, pois a alimentação é
uma das necessidades básicas dos seres humanos, sem alimento não
se vive. Motivo que o leva a trabalhar na Casa de Apoio Dona Odete.

A Casa de Apoio Dona Odete é uma instituição que


atende cerca de 30 crianças e adolescentes, dos 6
aos 15 anos, em situação de vulnerabilidade social
no Bairro Diácono João Luiz Pozzobon, em Santa
Maria/RS. Atuante desde 2018, após a reforma e
ampliação do espaço, uma antiga escola, o projeto
está transformando a realidade de crianças e
adolescentes, em uma estrutura com sala de
música e informática, refeitório, quadra de
esportes, pracinha e horta. (Site Oficial Casa de
Apoio Dona Odete. Acesso em 12 de maio de 2020).

A participação numa horta comunitária, envolvendo crianças,


jovens e idosos, através do trabalho voluntário, para além da
satisfação das necessidades pessoais dos intervenientes, proporciona
a criação de contributos visíveis para o desenvolvimento destes
coletivos e das comunidades em que se encontram inseridos.
Percebemos que a contribuição para a comunidade não se limita à
obtenção de alimentos, mas abrange várias áreas. Na questão,
educacional, por exemplo, “a agricultura urbana fornece
oportunidades de demonstração e formação sobre a origem dos
alimentos, práticas e técnicas agrícolas, formação ambiental, entre
outras” (SANTOS, 2012, p.9).

- 236 -
Nas cidades surgem frequentemente ações de agricultura
urbana que têm como finalidade colaborar para fortalecer as
comunidades onde são implantadas (SANTOS, 2012). Nesse sentido,
dentre as atividades propostas pela Casa Dona Odete uma é o cultivo
de horta. Nesta atividade, além de darem manutenção a horta da Casa
de Apoio, os educandos aprendem a elaborar, desenvolver e a dar
manutenção a hortas domésticas, assim como reutilizar matérias
como canteiros, Figura - 3, como pneus.

Figura 3 – Canteiros para pequenos espaços – Casa de Apoio Dona Odete

Fonte: Acervo pessoal de Leonir Welter Caetano, 2020.

Ensinar a utilizar materiais que iriam para o lixo, faz parte das
tarefas do depoente, que relatou esse aprendizado na sua educação
básica, mais especificamente na creche e pré-escola, no MACEL, que
se deve utilizar os materiais não orgânicos, de difícil decomposição, o
máximo para evitar a contaminação dos solos e das águas,
ensinamentos que busca, atualmente, por meio de suas ações sociais
passar adiante. Também, busca despertar nas novas gerações com que
- 237 -
trabalha o sentimento de compartilhar o que se aprende e o de “ajuda
ao próximo”, por esse motivo criou o projeto “Proteínas de Carinho”,
no qual conta com a ajuda das crianças e jovens que a Casa de Apoio
dona Odete para distribuir alimentos a pessoas que estão em
vulnerabilidade social.
Os alimentos não perecíveis do projeto são de doações de
comerciantes do município e os perecíveis, verduras e legumes, são do
excedente da horta e do pomar que cultiva em sua residência. O
projeto monta marmitas e distribui em algumas ocupações do
município de Santa Maria como mostra as Figuras 4.

Figuras 4 – Marmitas do projeto Proteínas de Carinho

Fonte: Acervo pessoal de Leonir Welter Caetano, 2020.

Os trabalhos voluntários, o amor pela terra e pelas práticas


agrícolas orgânicas foram despertadas, segundo o participante,
através dos processos de ensino e aprendizagem que eram
desenvolvidos pelo educador Irmão Ambrósio no movimento
assistencial MACEL de Cerro Largo. O trabalho na horta da instituição

- 238 -
lhe ensinou que “a vida vem da terra e da água”, que se deve cultivar
o alimento para si e para os outros, ensinamento que está registrado
em sua identidade, motivo que o faz trabalhar para que as novas
gerações, principalmente as que estão em situação de vulnerabilidade
social, tenham contato com o mesmo, para que continue passando
adiante o que se aprendeu “lá atrás” na escola voltada a educação do
campo.
A observação do entrevistado, está de acordo com a análise de
Santos (2012), os autores destacam que a agricultura urbana é capaz
de juntar pessoas com um propósito comum (produzir comida), num
local físico de encontro (uma horta comunitária) e realizam-se
atividades relacionadas com a comida, criam-se pontes com outras
iniciativas e bairros e também se criam ligações com instituições e
fundos.

Resistimos para existir: considerações


Como observado por Lenz, Cancelier e De David em 2019 é na
infância, que a interação com o ambiente e com as informações
encontradas ocorre geralmente a partir do tato, paladar, audição,
visão e olfato por meio desses contatos que as identidades dos sujeitos
vão se constituindo, por isso as práticas de ensino escolares devem
proporcionar experiências que marquem de forma positiva os
educandos, para a que os mesmo, futuramente busquem, também,
marcar de forma positiva o meio em que vivem, assim como os outros

- 239 -
seres humanos, como o nosso entrevistado, que busca passar adiante
o que aprendeu na sua educação básica.
Não os conteúdos curriculares, mas sim as práticas de cultivar
a terra para se ter uma alimentação saudável, e por consequência,
saúde. Por esse motivo, considera-se necessário que as escolas, tanto
do campo como urbanas, estejam em diálogo com a comunidade, para
identificar quais são as dinâmicas socioeconômicas, socioambientais e
socioculturais que marcam a paisagem que elas fazem parte.
No processo de comunicação entre escola e comunidade,
muitas vezes, se descobre que existe uma corporificação dos saberes
do campo nas áreas urbanas, os quais ficam visíveis na prática da
agricultura urbana. Assim, infere-se que a educação voltada para o
sujeito do campo deveria compor alguns currículos escolares, visando,
como destaca o participante da pesquisa, ensinar que “a vida vem da
terra e da água” e que a alimentação é uma das necessidades básicas
dos seres humanos, ensinamento adquirido na escola por meio de
processos de ensino e aprendizagens voltados para o campo, desta
forma, para finalizar cabe deixar uma questão. Que tipo de sujeitos as
práticas ensino escolares estão formando na contemporaneidade?

- 240 -
Referências

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei número


9394, 20 de dezembro de 1996.

BRASIL. Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Educação é a Base.


Brasília, MEC/CONSED/UNDIME, 2017. Disponível em: http://basena
cionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_publicacao.pdf. Acesso em:
02/04/2010.

ARRUDA, J. Agricultura urbana e peri-urbana em Campinas/SP:


análise do programa de hortas comunitárias como subsídio para
políticas públicas. Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual de
Campinas, Faculdade de Engenharia Agrícola. Campinas, SP. 2006.

LENZ, A.C; CANCELIER, J.W; DE DAVID, C. Colonização alemã e a Escola


do Campo: um olhar a partir da Escola Padre José de Anchieta - Linha
Tremonia - Cerro Largo/ RS. In: FOLMER, Ivanio e MEURER, Ane Carine
(Orgs.) Territórios em Movimento. São Leopoldo: Oikos, 2019.

MELO, L. P. Os benefícios da agricultura urbana e periurbana para a


sustentabilidade da cidade de Macapá-AP. In: 7º Congresso Luso
Brasileiro para o Planejamento Urbano, Regional, Integrado e
Sustentável: Contrastes, Contradições e Complexidades. Maceió,
2016. Disponível em: https://fau.ufal.br/evento/pluris2016/files/
Tema%204%20%20Planejamento%20Regional%20e%20Urbano/Pape
r1342.pdf. Acesso: 11 de mai, 2020.

MEURER, Ane Carine. Projeto Político Pedagógico Escolar: questões a


serem refletidas nas escolas do campo. In: MATOS, Kelma Socorro
Alves Lopes de; WIZNIEWSKU, Carmem Rejane Flores et al. (Orgs.).
Experiências e Diálogos em Educação do Campo. Fortaleza: Edições
UFC, 2010.

REGO, Nelson; COSTELLA, Roselane Zordan. Educação Geográfica e


Ensino de Geografia, distinções e relações em busca de
estranhamentos. In: Signos Geográficos, Goiânia-GO, V.1, 2010.

- 241 -
SANTOS, F. Hortas Urbanas de iniciativa comunitária - Participação e
Desenvolvimento: dois casos de estudo. Tese de Mestrado. Instituto
Universitário de Lisboa - ISCTE. 2012. Disponível em:
https://repositorio.iscteiul.pt/bitstream/10071/7842/1/Tese%20Flavi
a%20Santos.pdf. Acesso: 11 de mai, 2020.

- 242 -
Cosmografia geográfica: o estudo dos eclipses e o caso do
meteoro em Bossoroca/RS

Airton Rosa Lucion Guites27

Introdução
O conhecimento da Astronomia foi imprescindível para grande
parte das civilizações ocidentais e orientais. A influência dos astros
celestes no Planeta Terra, como o fenômeno das marés provocado
pelo magnetismo da Lua ou a ocorrência de meteoros em nossa
Atmosfera – popularmente conhecido por estrela cadente – é
estudado também pela Geografia.
Apesar de o conhecimento acerca do Universo ser mais
amplamente debatido na disciplina escolar de Ciências por
determinação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a Geografia
deve debruçar-se sobre a temática uma vez que a Terra compõe o
Sistema Solar e sofre influência da dinâmica dos corpos celestes. Além
disso, estamos sujeitos a presenciar fenômenos naturais do Universo,
que sempre despertam interesse e curiosidade nos alunos, gerando
um terreno fértil para o professor atuar em sala de aula.
O presente artigo é um relato de experiência sobre a confecção
de uma maquete sobre os eclipses solar e lunar com as duas turmas

27
Mestre em Geografia, UFSM.

- 243 -
de 6º ano na Escola Municipal de Ensino Fundamental Josefina Ferreira
Aquino, localizada no município de Bossoroca/RS. Também relata a
análise de um estudo de caso, em que nos dias de confecção da
maquete, houve a ocorrência de um meteoro no espaço aéreo
bossoroquense, que culminou no debate sobre os corpos celestes.
O objetivo geral da pesquisa compreende-se por: construir um
recurso didático sobre os eclipses solar e lunar. Como objetivos
específicos da pesquisa: (1) Verificar a diferença na disposição dos
astros e de luminosidade em cada eclipse; (2) Analisar a ocorrência de
meteoros na Atmosfera terrestre; e (3) Compreender a influência dos
eclipses e dos meteoros na Terra.

Fundamentação Teórica
A Astronomia é uma ciência que se dedica ao estudo dos astros
e dos fenômenos que ocorrem no Universo. A Geografia sendo uma
ciência que estuda o Planeta Terra e este, por sua vez, compõe o
Universo, deve dar atenção a temática astronômica no decorrer de
suas aulas, para que os alunos compreendam a dinâmica universal dos
corpos celestes.
Buscando uma confluência entre os conhecimentos geográfico
e astronômico, Cavalcante (2012) induz que:

Os temas de Astronomia estão tão presentes no


cotidiano do cidadão, de maneira que as pessoas
nem se dão conta deles. Alguns deles são: as

- 244 -
estações do ano, a orientação geográfica, os fusos
horários, as marés associadas às fases da Lua (para
as populações litorâneas), as concepções das
constelações, o dia e a noite e os calendários. A
Astronomia e a Geografia sempre caminharam
juntas, suas gêneses podem ser situadas na própria
origem do homem, embora só tenham alcançado
notoriedade com o florescimento da civilização
grega. (CAVALCANTE, M., p. 193-194, 2012).

Entre outros assuntos que sempre aproximaram a Geografia da


Astronomia são os movimentos da Terra (rotação e translação) e, na
atualidade, com respeito as inovações tecnológicas, como os satélites,
que possibilitaram representações da Terra e do Universo mais
precisas com a realidade, facilitando o estudo e permitindo uma
Cartografia mais complexa.
Analisando mais profundamente, entendemos que a
Astronomia é considerada a mais antiga entre as Ciências Naturais.
Portanto, ela serviu de base para outras ciências, como a Geografia,
que se intensificaram – inicialmente – através de ramificações do
estudo dos Cosmos, como comprova Maguelniski e Foetsch (2019):

Na Idade Antiga vários povos, com seus


observadores dos céus, astrônomos-astrólogos,
sacerdotes e estudiosos davam explicações
diferentes sobre o universo, a forma da Terra, os
oceanos, as terras continentais conhecidas (que
legou-se sobre o nome de Ecúmeno) e a morada
dos deuses e demônios. A busca de uma ordem e
de um elemento dominante para os Cosmos, além
da configuração da superfície terrestre, irá
demandar esforços da Matemática, da Astronomia,

- 245 -
da Geografia, da Filosofia e de outros campos do
conhecimento que hoje nós separamos em
diferentes ciências. [...] Houve na Idade Antiga uma
unicidade entre os conhecimentos geográficos,
cartográficos, astronômicos e cosmográficos.
(MAGUELNISKI, D.; FOETSCH, A., p. 58-59, 2019).

Durante séculos, os conhecimentos da Geografia e da


Astronomia – embora ainda não existissem como ciências
propriamente ditas – caminharam lado a lado no desenvolvimento
científico e em grandes momentos históricos da Humanidade, como as
Grandes Navegações. Somente a partir da Idade Contemporânea (pós-
1789) é que as duas ciências surgem, de fato, e possuem estudos
independentes, mas ainda com interações de pesquisas científicas.
Além disso, novos paradigmas são lançados, como: “Quais
interferências têm a tecnologia espacial em nossas vidas? Quais as
previsões para as futuras explorações espaciais? São respostas que
procuramos na Astronomia ou na Geografia?” (MAGUELNISKI, D.;
FOETSCH, A., p. 66, 2019).
Recentemente, surgiu a concepção de Cosmografia Geográfica,
que conceitua a interface da Geografia com a Astronomia no ambiente
escolar. O precursor deste conceito foi Sobreira (2005), afirmando
que:

A Cosmografia Geográfica é um campo de estudos


da Geografia, cujo conjunto de conhecimentos e
habilidades é predominantemente escolar. Estuda
a interface entre os conhecimentos terrestres e os
celestes e lhes atribui significância geográfica.
- 246 -
Analisa as relações humanas e naturais com o
Espaço Sideral e suas consequências para a
sociedade e a natureza e, portanto, para a
organização do espaço. (SOBREIRA, P., p. 115,
2005).

Entre os diversos assuntos que existem nesta interface, há os


eclipses e os meteoros. Entende-se por eclipses o alinhamento entre
o Sol, a Terra e a Lua, no mesmo plano. A diferença de posições dos
astros neste alinhamento é o que difere. Como informa Bretones
(2011):

Quando o alinhamento dos três astros – Sol, Terra


e Lua – se dá com a Terra no centro, a Lua penetra
na região de sombra ou de penumbra gerada pela
Terra: é o eclipse lunar. [...] Quando o alinhamento
se dá com a Lua no centro, entre o Sol e a Terra,
temos um eclipse solar. (BRETONES, P., p. 7-8,
2011).

Por conseguinte, os meteoros são popularmente chamados de


estrelas cadentes, uma vez que ao entrarem na Atmosfera terrestre,
produzem um enorme clarão até se desintegrar e se chocar com nossa
superfície. É importante diferenciar os meteoros de meteoroides e
meteoritos, como informa Bretones (2011):

Cada vez que um cometa se aproxima do Sol, perde


partículas de gás e poeira. Essas partículas são os
meteoroides, que formam “enxames” e ficam no
espaço girando ao redor do Sol. [...] Quando a Terra
cruza com a órbita desses meteoroides, eles são
atraídos pela força gravitacional terrestre. Ao

- 247 -
penetrarem em nossa atmosfera, sofrem intenso
aquecimento e se queimam totalmente. Essa
queima produz rastros luminosos no céu,
cientificamente denominados meteoros. [...] Os
meteoroides maiores, formados por rochas e
metais, ao atravessar a atmosfera e chocar-se
contra a superfície da Terra, passam a ser
denominados meteoritos. (BRETONES, P., p. 41,
2011).

Desta forma, é necessário que o professor de Geografia tenha


o conhecimento astronômico para adequar o processo de ensino desta
temática alinhados aos parâmetros educacionais, uma vez que o
Universo tem maior ênfase na disciplina de Ciências, segundo a BNCC.
Apesar disso, a Geografia ainda detém parte do estudo desta área,
principalmente no que concerne à influência dos fenômenos
universais na superfície terrestre. Todavia, há uma problemática
maior: a formação deficiente de professores de Geografia com relação
a temática astronômica. Como afirma Filho (2017):

A maioria dos programas das licenciaturas em


Geografia do Brasil não possui disciplinas de
Astronomia, o que pode significar um descaso por
parte dos gestores das instituições responsáveis
por estas licenciaturas, que parecem ignorar a
importância dos vínculos históricos e conceituais
que existem entre essas ciências (FILHO, H., p. 223,
2017).

Complementando o problema da formação de professores, os


livros didáticos de Geografia oferecidos pelo Ministério da Educação
(MEC) não enfocam na Astronomia e, quando enfocam, acabam por
- 248 -
perpetuar conceitos superficiais e imagens distorcidas, reforçando a
ideia de Universo do senso comum. Se o professor possui uma
formação precária neste sentido e buscar apoio no material distribuído
pelo Governo Federal, acabará por conduzir de maneira equivocada a
confluências entre as duas ciências. Por conseguinte, o mesmo livro
vai fomentar a construção do imaginário coletivo dos estudantes, que
irão compreender a Astronomia com distorções, erros conceituais,
problemas de interpretação ou ideias do senso comum.
Para tal, devemos entender o que é conhecimento e saberes,
em especial entendendo qual é o papel do ensino. Segundo Cavalcantti
(2014):

A tarefa do ensino é a de tornar os conteúdos


veiculados objetos de conhecimento para o aluno,
o que requer constante diálogo do sujeito do
conhecimento, portador de uma cultura
determinada, com esses outros objetos culturais,
no sentido de atribuir-lhes significados próprios, o
que é necessário para um processo de
aprendizagem significativa. (CAVALCANTTI, L.; p.
71, 2014).

Sendo a cosmografia geográfica bastante abstrata as crianças e


adolescentes, é necessário que o professor crie mecanismos
alternativos para que os alunos assimilem e adquirem o
conhecimento. A confecção da maquete e a análise de notícias é uma
possibilidade de criar condições para a ocorrência de uma
aprendizagem. Para tal, Castellar (2014) demonstra que:

- 249 -
No processo de aprendizagem, a ênfase tem sido
dada ao conteúdo e aos resultados da avaliação, e
não em como criar condições para a aprendizagem.
Tenho como pressuposto que a solução para essas
questões está na didática ou na metodologia do
ensino, ou seja, como o conteúdo é desenvolvido,
levando em consideração o processo de
aprendizagem escolar, como o aluno adquire seu
conhecimento e como constrói os conceitos
científicos. Nesse sentido, o resultado da
aprendizagem é consequência desse processo.
(CASTELLAR, S.; p. 43, 2014).

Com relação ao fato ocorrido no Rio Grande do Sul em


06/06/2019 e que também foi objeto de trabalho com as turmas, nos
reportaremos as notícias que saíram na época. Vale ressaltar que,
embora Bossoroca não apareça na lista de cidades em que foi avistado
o meteoro28 no espaço, há relato de professores, alunos e funcionários
da escola, que afirmam ter avistado o mesmo, que consta como
avistado no município vizinho, Santiago/RS. Para os jornalistas Pinzon
e Viesseri (2019), no site do jornal Gaúcha ZH:

Dezenas de pessoas, de diferentes regiões do


Estado, contaram ter visto um objeto luminoso se
deslocando no céu. Algumas narraram inclusive ter
escutado estrondos e sentido tremores. Os relatos
vieram das regiões Metropolitana, Noroeste,
Central e das Missões. [...] No começo da manhã

28
A notícia apresenta um erro conceitual, pois não trata-se de um meteoro, mas sim
de um meteorito, uma vez que o mesmo chocou-se com a superfície terrestre, mais
especificadamente no município de Jari/RS. Contudo, para os habitantes de
Bossoroca, trata-se de um meteoro, pois apenas foi avistado cruzando a Atmosfera.

- 250 -
desta sexta-feira (7), a Brazilian Meteor
Observation Network (Bramon) informou, em
nota, que "o objeto tratava-se de fato de um
meteoro e teria ocorrido no oeste do Estado do Rio
Grande do Sul". (PINZON, E.; VIESSERI, B.; 2019).

Neste aspecto, o município de Bossoroca pertence a região das


Missões no estado, citada no fragmento da notícia acima. Analisar
fatos da cosmografia geográfica através de notícias que integram a
realidade local em assuntos científicos estudados em sala de aula,
torna o conhecimento mais próximo dos alunos, com significado e
sentido de aprendizagem, fomentando a curiosidade e incentivando o
empirismo de todos sobre aquele tema que, de formas distintas, iria
repercutir entre os moradores do município, pois o fenômeno chamou
a atenção e virou assunto por semanas.
Criando alternativas para driblar as técnicas do ensino
tradicional, o professor deve buscar recursos didáticos que promovam
a construção do conhecimento por parte dos alunos, incentivando o
trabalho em grupo e a autonomia em buscar informações, sempre com
auxílio mediador do professor. A ludicidade pode ser um mecanismo
primordial, transformando a Geografia em algo mais atrativo e
interessante.
No relançamento da clássica Literatura infantil de Lobato
(2013, p. 14), Dona Benta explica que “a Terra é um dos milhões e
milhões de grãozinhos de poeira que flutuam no espaço – e Geografia
quer dizer a descrição das coisas da superfície desse grãozinho”. A

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ludicidade em explicar o que é Geografia e qual o papel da Terra no
Universo pode inspirar os professores a refletir sobre tornar o
conhecimento científico mais palpável a cada faixa etária.
Entretanto, romper com as práticas tradicionais não é um
trabalho simples e fácil. Como bem destaca Callai (2005):

Para romper com a prática tradicional da sala de


aula, não adianta apenas a vontade do professor. É
preciso que haja concepções teórico-
metodológicas capazes de permitir o
reconhecimento do saber do outro, a capacidade
de ler o mundo da vida e reconhecer a sua
dinamicidade, superando o que está posto como
verdade absoluta. É preciso trabalhar com a
possibilidade de encontrar formas de compreender
o mundo, produzindo um conhecimento que é
legítimo. (CALLAI, H., p. 231, 2005).

Portanto, não basta apenas à vontade, é preciso buscar


embasar suas ações com métodos e metodologias bastante precisas,
com objetivos e metas delimitados e estimados. A maquete pode ser
um recurso didático importante nesse processo, como indicam
Bandrão e Mello (2013, p.90-91) ao propuserem que “a maquete
possibilita ao aluno a construção de noções espaciais através da
visualização, em modelo reduzido, de representações bidimensional
(mapas) para um tridimensional (maquetes), simplificando noções
abstratas”.
O processo de ensino-aprendizagem deve ter empenho de
organização do professor e também dedicação dos alunos para

- 252 -
participar do processo. Neste aspecto, surge a didática, que segundo
Melo e Urbanetz (2012) analisando Veiga (2006), ocorre em quatro
etapas:

[...] São quatro os elementos envolvidos no


processo didático: ensinar, aprender, pesquisa e
avaliação. O primeiro elemento pertence,
principalmente, à tarefa do professor. O segundo,
aprender, é uma necessidade especialmente do
aluno. A pesquisa é inerente ao processo,
envolvendo a ação docente e discente. Por último,
a avaliação do processo é necessidade elementar
para averiguação do seu sucesso ou fracasso, das
fragilidades e lições do processo educativo. (MELO,
A.; URBANETZ, S., p. 106, 2012).

A aprendizagem está ligada ao sucesso do ensino, sendo a


didática um caminho primordial para atingir este objetivo central.
Complementando o sentido do aprendizado, Melo e Urbanetz (2012)
reforçam que:

Outra característica da aprendizagem é que ela


acontece somente se houver da parte do educando
uma atividade autônoma no sentido de que ele se
mobilize para o aprendizado. Significa dizer que a
transmissão de conteúdos, os conhecimentos
científicos, as habilidades, atitudes etc., não é feita
de maneira mecânica, do professor para o aluno,
sem que este queira. (MELO, A., URBANETZ, S., p.
117, 2012).

Portanto, confeccionar uma maquete sobre uma temática que


é de interesse comum da turma, bem como relacioná-la aos fatos que

- 253 -
ocorreram na região e foi noticiado, é uma forma de instigá-los ao
saber geográfico, de dar significância aqueles conteúdos por ora
apenas mencionados superficialmente nas páginas dos livros
didáticos. No entanto, é importante observar as singularidades do
ensino em escolas localizadas em áreas rurais ou cuja maioria dos
alunos provém de ambientes rurais. Portugal (2017, p. 22) já indica
que é relevante cartografar as práticas pedagógicas dos professores
de Geografia em escolas rurais observando “como as vivências e
experiências das histórias de vida em contextos rurais reverberam no
fazer docente no cotidiano escolar”.

Metodologia
Para iniciar a atividade, primeiramente foi necessário
estabelecer as bases metodológicas para o desenvolvimento da
mesma. Neste sentido, foram utilizados os conceitos dos teóricos
educacionais, Bruner e Ausubel.
Segundo Bruner, o método de aprendizagem por descoberta é
uma ferramenta importante para que o professor consiga instigar seus
alunos a caminhar para o esclarecimento de dúvidas a respeito do
conhecimento a ser atingido. Mais especificamente, Bruner afirma
que, segundo Lakomy (2014):

O método de aprendizagem por descoberta é uma


forma de aprendizagem em que os alunos são
estimulados pelo professor por meio de perguntas

- 254 -
que geram estudos e pesquisas. Na busca por
respostas, podem descobrir, sozinhos, algumas
ideias ou princípios básicos relacionados com a
questão colocada. (LAKOMI, A., p. 45, 2014).

Portanto, antes de começar a confecção da maquete, o


professor estimulou os alunos com perguntas sobre o que
compreendiam por eclipses, se já haviam presenciado algum e qual a
influência dele em nossas vidas. Através disso, foi possível perceber
uma visão mística dos fatos, ou seja, ainda está presente na sociedade
a percepção dos eclipses como um sinal ou aviso divino. Após isso, foi
incentivado a pesquisa dos alunos sobre os fenômenos celestes, que
incluem os eclipses e meteoros.
Em contrapartida, Ausubel reflete acerca do método de
aprendizagem significativa, na qual ocorre através de pontos de
ancoragem, que são conceitos e informações incorporados a nossa
estrutura cognitiva. Ausubel afirma que, segundo Lakomy (2014):

Quando não temos pontos de ancoragem – por


exemplo, não saber as regras do basquete –, temos
então dificuldade para compreender o que se
passa durante um jogo como esse. Mas, se
recebermos informações, elas podem servir de
base para que possamos entender como se
processa o jogo. Em suma, a aquisição de pontos de
ancoragem e a aprendizagem significativa não
estão presentes somente na escola; elas nos
acompanham durante toda a vida, isto é, são
ativadas sempre que algum conteúdo novo precise
ser aprendido. (LAKOMY, A., p. 49, 2014).

- 255 -
Desta maneira, para dar significado aquele aprendizado
construído com esta atividade, foi papel do professor estabelecer os
pontos de ancoragem anteriormente, para então conseguir significar
o conhecimento aos alunos. Reunindo as teorias de Bruner e Ausubel,
foi possível estabelecer com as turmas um caminho ao conhecimento
da cosmografia geográfica sobre os eclipses e os meteoros, a partir da
curiosidade gerada pelas perguntas e significados.
Após usar tais metodologias educacionais para estimular os
alunos, realizamos a prática. As duas turmas de 6º ano do Ensino
Fundamental foram divididas em dois grupos, em que cada um ficou
responsável por confeccionar uma maquete sobre um dos eclipses.
Distribui-se os seguintes materiais: uma placa de isopor para servir de
suporte; três bolas de isopor de circunferências diferentes; tinta
guache e pincéis. Sendo assim, ao final, cada turma produziu duas
maquetes.
A placa de isopor serviu como base para as circunferências. Ela
foi pintada de preto, representando a escuridão do Universo. As bolas
de isopor representavam os astros celestes que compõe os eclipses: o
Sol, a Terra e a Lua, nesta ordem de tamanho das circunferências. Elas
foram pintadas, respectivamente, de laranja, azul e cinza; sendo
ordenados conforme os eclipses.
Por fim, utilizou-se notícias que relatavam a queda de um
meteoro nas proximidades de Bossoroca, explicando os motivos de
ocorrência e suas consequências.

- 256 -
Resultados
Após a aula teórica, composta por questionamentos acerca dos
eclipses e meteoros, os alunos realizaram uma pesquisa sobre os
astros celestes que compõe o Universo e, mais especificadamente, o
Sistema Solar. Desta forma, foi possível entender a dinâmica do espaço
sideral, tirar dúvidas sobre as ideias e imaginações que compõe o
senso comum e o misticismo da sociedade sobre essa temática.
Após isso, tivemos o resultado principal desta atividade: a
confecção das maquetes pelos alunos das duas turmas. Elas ficaram
expostas na sala de aula, para que as turmas pudessem ver o trabalho
alheio; e meses depois foram expostas em uma feira municipal, de
acesso a todas as escolas bossoroquenses. A maquete gerou
curiosidade, uma vez que o assunto é interessante e também não é
comum encontrar relatos de maquetes desse tema na internet.
Vale ressaltar que por Bossoroca ser um município com um
número reduzido de habitantes29, cuja atividade primária é o grande
foco da economia local e a escola está inserida nessa realidade do
interior e do campo; sendo assim, a curiosidade por assuntos mais
distantes do círculo comum de vivência dos alunos gera uma imensa
curiosidade e participação dos mesmos.
A escola se localiza próxima ao Bairro da Gaúcha e a maioria
dos alunos são desta localidade em Bossoroca, que apresenta uma

29
Segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE,
2010), o município de Bossoroca possui 6.884 habitantes, sendo que a estimativa
para 2019 foi de 6.279 habitantes.

- 257 -
realidade social bastante delicada e uma inclinação muito perceptível
a Igreja Evangélica. Sendo assim, é comum que a visão de mundo dos
estudantes ou até mesmo daquilo que é distante e desconhecido,
muitas vezes, seja composta por elementos construídos através dos
preceitos religiosos ou do senso comum do meio de vivência já
desajustado.
Neste sentido, o conhecimento disseminado na escola vem
para esclarecer dúvidas e curiosidades, além de justificar a diferença
entre o que é científico e o que é religioso, promovendo o respeito
mútuo entre ambas, mas reforçando que em sala de aula o que é
estudado é o que é cientificamente comprovado, independente da fé.

IMAGEM 1: maquetes dos eclipses solar e lunar do 6º ano (turma manhã).

FONTE: Acervo pessoal.

- 258 -
Ao colorir a maquete, foi dialogado também que as cores dos
astros celestes são utópicas, ou seja, não correspondem com a
realidade, mas servem para demonstrar uma diferença simbólica
entre eles na composição do espaço sideral. Também foi discutido a
relação da escala de tamanhos e distâncias, cuja maquete não se
preocupou em corresponder com a realidade, mas buscou-se
esclarecer esses detalhes importantes.
A confecção de uma maquete sobre os eclipses solar e lunar é
algo pouco registrado em artigos acadêmicos no Brasil.
Tradicionalmente, ao tratar o tema do Universo, é comum que os
professores de Geografia confeccionem uma maquete do Sistema
Solar, que embora seja interessante e válido, acaba por reproduzir
uma atividade normalmente já realizada nos anos iniciais do Ensino
Fundamental pelas pedagogas. Uma maquete sobre os eclipses trouxe
maior interesse e participação dos estudantes, tornando visível e
perceptível aquele fenômeno natural tão instigante.

- 259 -
IMAGEM 2: maquetes dos eclipses solar e lunar do 6º ano (turma
tarde).

FONTE: Acervo pessoal.

Por fim, o último resultado foi a compreensão da realidade


sobre a ocorrência natural dos eclipses e dos meteoros,
desmistificando estereótipos e misticismos, que grande parte dos
alunos trouxeram para a sala de aula, movidos por desinformação na
internet e pelo senso comum compartilhado na rede de contatos da
sociedade.
A possibilidade de relacionar os conteúdos e a prática da
atividade com os fatos ocorridos no munícipio e proximidades trouxe
maior aprendizado as turmas, que perceberam na vivência da
atividade e da sociedade o conhecimento adquirido no decorrer das
aulas.

- 260 -
Considerações Finais
A temática da Astronomia é bastante abstrata as crianças e
adolescentes, pois é algo muito distante e inatingível na mentalidade
deles. Tornar esse tema mais próximo e perceptível, é um caminho
complexo e permanente, oferecendo um significado aquilo que se
ensina e se aprende. Ao relacionar a confecção das maquetes sobre os
eclipses com a ocorrência verídica de um meteoro no município da
escola, os alunos puderam entender a relação entre o Universo e o
lugar onde vivem, bem como se interessar ainda mais pelos assuntos
astronômicos e geográficos.
A construção de uma maquete sobre os eclipses promoveu o
trabalho em equipe, onde houve cooperação para confecção da
mesma. Ao deixar exposto na sala de aula durante alguns meses,
outros professores puderam utilizar o trabalho para contextualizar os
conteúdos de suas disciplinas, como na área de Ciências e História.
A análise de notícias é importante, uma vez que incentiva a
leitura de um gênero textual que não é próximo do dia a dia das
crianças e adolescentes, podendo ser auxiliado pela área de Língua
Portuguesa, na interpretação de texto e em pedir que relatassem –
oral e escrita – o meteoro que observaram cruzar a Atmosfera de
Bossoroca. Por intermédio disto, foi possível promover um diálogo
sobre a diferença entre ciência e misticismo ou senso comum,
explicando que a ocorrência de fenômenos como os eclipses e os
meteoros devem ser estudados sob a visão de pesquisas científicas,

- 261 -
em que ocorrem de forma natural e imprevisível, sem relação com
conceitos religiosos ou mitológicos, embora existam interpretações da
fé que indicam suas ocorrências como sinais divinos, porém não cabe
à escola analisar sob esse viés e sim sobre o que é científico.
O conceito de cosmografia geográfica é recente, mas a
interação entre Astronomia e Geografia é tão antiga quanto a
Humanidade. Compreender a relação entre ambas ciências e
transformar seus conhecimentos em algo lúdico e palpável aos alunos,
é papel fundamental do professor de Geografia. Mesmo que não haja
embasamento na formação acadêmica, o professor pode e deve
buscar uma formação complementar que supra essa deficiência e
possibilite que realize adequadamente seu compromisso de trabalho
com o aprendizado.

- 262 -
Referências

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- 264 -
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- 265 -
Análise dos livros didáticos de Geografia utilizados na escola
do campo do distrito de Santa Flora Município de Santa
Maria/RS

Zuleika Maria da Silva Ries30

Introdução
O capítulo traz uma análise de dois livros didáticos 4º ano do
Ensino Fundamental (Anos Iniciais) oriundos do Plana Nacional do
Livro Didático – PNLD campo, para alunos da Escola Municipal de
Ensino Fundamental Santa Flora, localizada no nono distrito (Santa
Flora) do município de Santa Maria - RS. A análise é importante
porque, na atualidade, é impossível imaginar uma sala de aula na
escola sem a presença do um livro didático. Mesmo com a inserção das
Tecnologias de Informação e Comunicação – TIC na Educação Básica,
as quais não estão presentes na realidade dessa escola do campo. O
Livro Didático é o único material didático disponível para o professor,
ainda, apesar de ser um dos recursos educacionais que nos últimos
anos foi muito criticado.
É tamanha a relevância do livro didático do campo para os
processos de ensino e aprendizagem de geografia no 4º ano do Ensino

30
Mestra em Geografia, UFSM. Professora da rede municipal de ensino de Santa
Maria – SMEd. Educadora do campo na Escola de Ensino Fundamental Santa Flora.
E-mail: zuleikaries@outlook.com.

- 266 -
Fundamental da E. M. E. F. Santa Flora. Para chegar a essa avaliação se
considerou a paisagem do lugar com suas peculiaridades culturais e
sociais, assim se definiu alguns itens para a avaliar nos dois livros
didáticos, como: a identificação do livro; a adequação à realidade do
campo; a seleção dos conteúdos, bem como, a articulação entre eles
e a abordagem metodológica.
Para isso se fez uso da abordagem qualitativa. Foi realizada
uma pesquisa bibliográfica para a construção do referencial teórico. As
leituras perpassaram pelo entendimento de Educação do Campo; o
Guia do Livro Didático do ano de 2016; a Base Nacional Comum
Curricular – BNCC – Geografia. Cabe lembrar que a “pesquisa
bibliográfica é o estudo sistematizado desenvolvido com base em
material publicado em livros, revistas, jornais, redes eletrônicas. Isto
é, material acessível ao público em geral” (VERGARA, 2004, p. 48). E
realizamos a análise dos dois livros didáticos utilizados no 4º ano do
Ensino Fundamental na Escola do Campo Santa Flora.
A escolha do livro didático não é uma tarefa fácil. Assim como
utiliza-lo em sala de aula. O educador precisa conhecer
antecipadamente as suas dimensões e os métodos utilizados para
trabalhar determinados conceitos da Geografia correlacionando-os
com a paisagem de vivencia dos educandos, para que as práticas de
ensino não destoem do lugar de vivencia deles, visando fomentar a sua
permanência no campo. Os livros didáticos são recursos didáticos
“antigos” e importantes, muitas escolas dependem desse elemento

- 267 -
tão criticado nas últimas décadas. Ele além de auxiliar as práticas de
ensino, também possibilita ao educador reflexão contribuindo para
estudos paralelos relativos às atividades agropecuárias da paisagem
que a escola do campo faz parte.

Educação do campo e o Guia do Livro Didático PNLD - Campo


O Livro Didático é um instrumento que contribui com o
processo de ensino e aprendizagem de Geografia nas escolas do
campo, muitas vezes é o único recurso que o educador tem para o
exercício da função docente. A Constituição Federal - CF de 1988, no
seu Art. 208, ratifica esta ideia, destacando que o livro didático é uma
importante ferramenta de auxílio para o professor. A CF deixa claro
que os alunos das instituições oficiais de ensino do governo, da
Educação Básica, têm direto a oferta de material didática. O que é
ratificado, mais tarde na Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996,
em seu Art. 4˚, inciso VIII (BRASIL, 1988; BRASIL, 1996).
Os Livros Didáticos são distribuídos para as escolas públicas
por meio do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) (re)instituído
pelo Decreto nº 91.542, de 19/8/85, substituindo ou assumindo o
lugar do Programa do Livro Didático para o Ensino Fundamental o
Plidef. O PNLD tem por objetivo distribuir às escolas públicas livros
didáticos, dicionários e outros materiais que apoiem a prática
educativa (VIEIRA, 2013). Em 2016 foi instituído o PNLD Campo, para
a adequação dos Livros didáticos à população do campo.

- 268 -
O Programa Nacional do Livro Didático (PNLD
Campo), em sua segunda edição, tem como
objetivo considerar as especificidades do contexto
social, econômico, cultural, político, ambiental, de
gênero, geracional, de raça e etnia dos Povos do
Campo, como referência para a elaboração de
livros didáticos para os anos iniciais do Ensino
Fundamental (seriado e não seriado), de Escolas do
Campo, das redes públicas de ensino. (MINISTERIO
DA EDUCAÇÃO. BRASIL. 2016).

Resultado de muita luta dos movimentos sociais. O PNLD


Campo foi criado para auxiliar o professor a desenvolver práticas de
ensino voltadas para os sujeitos do campo, contribuindo com a
adaptação dos conteúdos, tanto de Geografia, como das demais áreas
ciências a realidade dos alunos, à paisagem rural a qual o aluno faz
parte. Quanto a Educação do Campo ela

[...] teve suas origens no final dos anos 1980 e veio


para provar que, muito mais que luta por escola,
busca “reconhecer e fortalecer o processo de
resistência e emancipação dos povos do campo. E
nessa estratégia, as lutas por políticas públicas que
garantam o seu direito à educação, preconizam
uma educação no campo que seja do campo”
(MUNARIM et al., 2010, p. 12).

Os primeiros livros do PNLD Campo foram distribuídos em


2013 para os estudantes do primeiro ao quinto ano do ensino
fundamental de escolas públicas da área rural, seriadas e
multisseriadas. As particularidades dos sujeitos do campo, ou seja, os

- 269 -
hábitos e costumes, os saberes e fazeres estavam impressos no
material tendo uma boa aceitação. Na atualidade para uma obra
constar no PNLD Campo (2016) ela precisa ser validada de acordo com
alguns critérios.

(1) Respeito à legislação, às diretrizes e às normas


oficiais relativas ao Ensino Fundamental, anos
iniciais, com as especificidades da Educação do
Campo; (2) observância de princípios éticos
necessários à construção da cidadania e ao
convívio social republicano; (3) coerência e
adequação da abordagem teórico-metodológica
assumida pela obra, no que diz respeito à proposta
didático-pedagógica explicitada e aos objetivos
visados; (4) correção e atualização de conceitos,
informações e procedimentos; (5) observância das
características e finalidades específicas do Manual
do Professor e adequação do livro do aluno à
proposta pedagógica nele apresentada; (6)
adequação da estrutura editorial e do projeto
gráfico aos objetivos didático-pedagógicos da obra
(MINISTERIO DA EDUCAÇÃO. BRASIL. 2016).

Esses critérios são importantes porque a educação do campo


busca valorizar os saberes e fazeres do local articulando os
conhecimentos locais com os conteúdos curriculares. Desta forma a
escola deixa de ser um dos aparelhos ideológicos do governo, que ao
longo do tempo procurou transmitir a ideologia dominante, ou seja,
das elites, através dos seus currículos e se volta para as verdadeiras
necessidades locais. E passa a contribuir, também, com o
desenvolvimento de práticas de ensino voltadas para a realidade dos

- 270 -
sujeitos do campo, para o modo de vida revelado pela paisagem dos
lugares de vivencia dos alunos fomentando a permanecia das crianças
e jovens do campo no campo.
Pois, como destacam Kolling, Nery e Molina (1999, p. 26-29)
quando se aborda educação do campo “se estará tratando da
educação que se volta ao conjunto dos trabalhadores e das
trabalhadoras do campo, sejam as nações indígenas, sejam os diversos
tipos de assalariados vinculados à vida e ao trabalho no meio rural”. O
mesmo diz o texto base da Conferência Nacional de Educação do
Campo

Entende-se por escola do campo aquela que


trabalha desde os interesses, a política, a cultura e
a economia dos diversos grupos de trabalhadores e
trabalhadoras do campo, nas suas diversas formas
de trabalho e de organização, na sua dimensão de
permanente processo, produzindo valores,
conhecimentos e tecnologias na perspectiva do
desenvolvimento social e economicamente
igualitário dessa população. A identificação política
e a inserção geográfica da própria realidade
cultural do campo são condições fundamentais de
sua implementação.
(UNESCO, 1998).

Percebe-se que a educação no campo não é assunto novo nas


demandas políticas e sociais brasileira. Silva (2004) observou que após
a década de 30, a escola institucionalizou-se no campo, entretanto,
esse processo se deu sem considerar “a população a quem se
destinava, o contexto onde estava situada, as relações sociais,

- 271 -
produtivas e culturais e a necessidade de formação sócio profissional
desse povo” (SILVA, 2004, p.1). Na atualidade se luta para que se tenha
uma educação compromissada com os povos do campo que leve em
consideração as suas peculiaridades e necessidades.
A comunidade escolar deve estar em diálogo constante o
grupo social que habita a paisagem que ela faz parte e proporcionar
experiências voltadas as atividades do campo, além de fomentar
debates que tragam os problemas enfrentados diariamente pelos do
homem e mulheres do campo, como a “comercialização, a exportação,
a distribuição dos produtos, o uso dos agrotóxicos, os mecanismos
seletivos de crédito rural, a política de preços mínimos, o sistema
tributário, entre outros” (FRANCO, 1985, p.37), ou seja, o trabalho
agrícola deve estar presente no processo ensino-aprendizagem a
partir dele realizar juntamente com os educando uma análise crítica
do sistema capitalista.
Como abordado por Freire (1987, p. 44) a escola precisa
desenvolver o habito de trabalhar as relações de classe, não as
reproduzir, para contribuir com os alunos no desvendamento do
mundo de opressão em que vivemos, a partir daí visualizem o
comprometimento que devem ter com o seu lugar de vivencia nas
práxis da transformação desta realidade. Assim, as práticas de ensino
voltadas para o mundo real levam em conta “o contexto do campo em
termos de sua cultura específica quanto à maneira de ver e de se
relacionar com o tempo, o espaço, o meio ambiente e quanto ao modo

- 272 -
de viver, de organizar família e trabalho” (KOLLING, NERY, MOLINA,
1999, p. 14).
(RE) Construir a relação entre comunidade e escola do campo
passa pelo livro didático e pela pratica docente. Para que isso ocorra
os livros didáticos voltados para as escolas do campo devem trazer em
suas ilustrações, em seus textos a realidade vivenciada pelos alunos do
campo, se comprometendo com a construção de uma formação
educativa capaz de superar as contradições geradas no antagonismo
socioeconômico, sociopolítico e sociocultural.

Um olhar para a Base Nacional Curricular Comum – BNCC -Geografia


A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um dos
documentos normativos da educação brasileira, ele estabelece as
competências (saber-saber) e habilidades (saber-fazer) que os
estudantes devem estar habilitados ao terminar o ensino
fundamental. São dez as competências, que perpassam: 1 - pelo
conhecimento do mundo físico, cultural e social; 2- desenvolvimento
do pensamento crítico, criativo e cientifico; 3- adquirir um repertorio
cultural local, mundial e estético; 4 - desenvolver a habilidade de
leitura da linguagens \(verbal, oral, visual); 5 – Entender da cultura
digital - Tecnologias de Informação e Comunicação –TIC; 6 – Valorizar
as experiências desenvolvidas para o mundo do trabalho; 7 -
Argumentação para defender ideias; 8 – atentar para o
autoconhecimento, autocuidado; 9 – saber resolver problemas, ter

- 273 -
empatia e cooperar com a comunidade e 10 – ter autonomia, agir
pessoal e coletivamente. (BNCC, 2018).
Para Ribeiro (2019) o livro didático é de grande valor nesse
processo de mudança da educação brasileira proposto pela BNCC pois

[...] ele passa a abordar o conteúdo de forma


menos enciclopédica, valorizando mais o trabalho
com competências e habilidades. Quando alinhado
à BNCC, o livro didático facilita a sua
implementação, já que é o principal instrumento
de referência do processo de ensino-
aprendizagem. Com a indicação das habilidades
mobilizadas em cada capítulo do livro, o professor
tem um direcionamento maior de como trabalhar
o conteúdo em sala de aula. Dessa forma, ele não
o trata como algo a ser memorizado, mas como
uma habilidade a ser desenvolvida pelo aluno.

Assim, as atividades desenvolvidas pelos educadores do


campo do 4º ano do Ensino Fundamental, com o auxílio do livro
didático, devem preservar as experiências vividas no lugar, envolver
suas histórias familiares, comunitárias abarcando os elementos
culturais impressos no espaço geográfico e revelados na paisagem,
isso porque segundo Jackson (2003, P.55) “Uma paisagem não é um
elemento do meio ambiente, mas um espaço sintético, um sistema
artificial de espaços superpostos na superfície da Terra, que funciona
e evolui, não segundo leis naturais, mas para servir uma comunidade”.
A paisagem rural serve as populações do campo que as

- 274 -
construíram. Muitas das famílias da agricultura familiar do meio rural
Rio-grandense são descendentes de imigrantes, esses, (des, re)
configuraram as paisagens rurais atuais, como a do distrito de Santa
Flora. A BNCC – Geografia orienta que no 4º os processos migratórios
do Brasil sejam trabalhados e com isso as transformações que ocorrem
ou ocorram na paisagem. Além, de destacar os territórios étnicos-
culturais existente nela, como: quilombola, indígena os quais,
também, devem ser contemplados nos livros didáticos do PNLD
Campo.
A BNCC - Geografia 4º ano enfatiza que as práticas docentes
devem valorizar nesta etapa o que é próprio de cada lugar, saberes e
fazeres do campo, assim como a contribuição de cada homem, mulher,
jovem, criança para a formação cultural do local. Nesse contexto inclui-
se a comunidade escolar, mesmo que os educadores sejam oriundos
de outras espacialidades, eles, devem estar em sintonia com as
dinâmicas sociais que formatam a paisagem do campo onde a escola
está inserida e faz parte e, os materiais didáticos utilizados por eles,
também, neste conjunto inclui-se livro didático.

Os livros didáticos analisados


O professor faz uso de diferentes recursos didáticos para o
exercício de sua função, um deles é o livro didático. Os destinados as
escolas campo devem trazer em seus conteúdos ilustrações e textos
que retratem a paisagem rural com as suas dinâmicas, para o aluno

- 275 -
sentir-se representado e, também, para fomentar o interesse das
crianças e jovens pelo seu lugar de vivencia, estimulando assim o
sentimento de pertencimento ao campo. Contribuindo, de uma certa
forma, para a permanência do sujeito do campo no campo.
Destacar as peculiaridades por meio de ilustrações, textos ou
experiências diretamente nos elementos da paisagem rural, como
visitar uma criação de gado leiteiro (leitaria) favorece o sentimento de
pertencimento ao lugar, assim como demostra a importância das
atividades agrícolas para a sociedade. Lenz, Cancelier e De David
(2019, p. 80) destacaram que “os lugares de vivencia são espaços
geográficos com os quais os homens e mulheres “estabelecem
relações de sentimentos como: alegria ou tristeza, conforto ou
desconforto, proteção ou exposição, silencio ou barulho” por isso
proporcionar aprendizados in sito é importante.
Seguindo essa linha de raciocínio cabe destacar que o livro
didático precisa ilustrar a realidade local, pois de nada adianta o
professor proporcionar o descrito, ou seja, encontros com o mundo
vivido e o material didático (livro didático) utilizado em sala de aula
apresentar um mundo diferente do cotidiano dos educandos, com
imagens e textos voltados para a vida urbana.
Sobre a afirmativa Tardif (2002, p. 42) observa sobre a escolha
do livro didático

O professor, portanto, definirá o livro didático em


conformidade com a consciência que tiver da

- 276 -
finalidade do seu trabalho enquanto sujeito da
educação formal que existe na sociedade que
integra. Isso porque o ensino, no contexto escolar,
tem seus fins e objetivos de socialização e instrução
a partir de certos “instrumentos”, que são manuais,
orientações pedagógicas, programas, diretivas do
Ministério de Educação. São esses “instrumentos”
que especificam “a natureza dos fins e oferecem
um princípio e meios para atingi-los”.

Nesse sentido conclui-se que toda a atividade escolar é


baseada em objetivos e em um programa estabelecido, e parte desse
programa encontra-se no livro didático. Motivo que levou a análise
dos livros de Geografia do 4º do Ensino Fundamental utilizados pela
professora de Geografia da Escola do Campo Santa Flora. O primeiro
livro “Novo Girassol Saberes e Fazeres do Campo” abarca as disciplinas
de Língua Portuguesa, Geografia e História, ele foi publicado em 2014
pela Editora FTD, integra o Guia de Livros Didáticos: PNLD-Campo 2016
(Figura 1). O segundo livro intitulado “Conectados” Geografia – 4º ano
do Ensino Fundamental, publicado em 2018 pela Editora FTD, obra não
produzida exclusivamente para as escolas do campo.

- 277 -
Figura 1 – Livro Novo Girassol Saberes e Fazeres do Campo

Fonte – Acervo pessoal dos autores, 2020.

Figura 2 – Conectados Geografia

Fonte – Acervo pessoal dos autores, 2020.

A diferença entre ambos se inicia pela capa. A primeira (Figura


1) traz uma ilustração de uma paisagem rural romantizada, que habita
o imaginário de muitas pessoas, contudo faz referência ao campo, ao

- 278 -
modo de vida existente no rural. A segundo (Figura 2) apresenta
alunos descolados, bem vestidos, com cabelos bem aparados e
penteados, com roupas e acessórios da moda e “brancos”, somente
brancos. Outra questão que pode ser observada é a discordância do
título da segunda obra denominada “Conectados” com a proposta do
PNLD campo, já a primeira obra está em sintonia e traz como titulação
“Novo Girassol Saberes e Fazeres do Campo”, fazendo referência a
própria criança, demostrando que elas são o futuro.
O livro “Novo Girassol Saberes e Fazeres do Campo” faz parte
do PNLD Campo 2016. Pode-se visualizar que as temáticas
relacionadas a Geografia são abordadas com uma linguagem de fácil
compreensão e apropriada às comunidades do campo. Os conteúdos
seguem a mesma metodologia: leitura adequada para a faixa etária da
criança; ilustrações fazendo referências aos elementos paisagísticos
existentes no rural; destacando a história e cultura dos povos do
campo e, também, destacam algumas atividades do cotidiano dos
homens e mulheres do rural.
O conteúdo do livro destaca ainda as diferentes culturas que
constituem a paisagem brasileira. Faz referência ao agronegócio, os
impactos que o uso indiscriminado de herbicidas causa ao meio
ambiente, as modificações das paisagens com a adesão desse modelo
de negócio no campo. Assim como, aborda as relações cidade-campo.
O material está dividido em capítulos é possível verificar que a
classificação dos mesmos está adequadamente a sua disposição, onde

- 279 -
são tradicionalmente trabalhados na série/ano e há articulação entre
um e outro.
O segundo livro Conectados Geografia faz parte do PNLD
2019, publicado em 2018, foi o eleito para substituir o primeiro “Novo
Girassol Saberes e Fazeres do Campo”. Os conteúdos de Geografia são
abordados, porém de uma forma mais árida com pouca articulação
entre as temáticas e de uma forma mais complexa ao alcance da
idade/série, uma vez que Piaget postula que as crianças entre 8 e 9
anos estão na fase do operacional concreto, por isso a didática deve
ser mais dinâmica e contextualizada

Dos sete aos doze anos, aproximadamente, a


criança está inserida no estágio da Inteligência
operacional concreta. Neste estágio, o grande
progresso está, exatamente, na conquista das
operações, ou seja, das relações mentais, cuja
reversibilidade e flexibilidade garantem à criança a
compreensão lógica das situações vivenciadas.
(Piaget, 2013, p. 43).

Os textos informativos trazem uma linguagem distante da


realidade do campo e dos povos do campo. Cabe destacar que na
atualidade com a pandemia do Novo Covid-19, com o isolamento
social, os pais precisam ajudar seus filhos com as tarefas escolares
enviadas através do transporte público aos alunos do campo e o livro
eleito para substituir o “Novo Girassol Saberes e Fazeres do Campo” é
inadequado de acordo com a professora, “muitas famílias são
analfabetas e não se identificam com as ilustrações, figuras, assim não

- 280 -
conseguem contribuir com o processo de ensino e aprendizagem de
geografia do seus filho”. Desta forma, para suprir a necessidade a
professora de Geografia elaborou um poligrafo para o 4ºano como
material voltado as atividades do campo, visando estimular o diálogo
entre pais e filhos sobre as dinâmicas socioeconômicas,
socioambientais e socioculturais existentes no campo, fazendo com
que os pais contribuam de alguma forma com seus filhos mantendo-
os entusiasmados para a aprendizagem escolar.
Por isso tuto é importante acrescentar que o bom livro
didático é aquele que consegue atingir todos os envolvidos no
processo educacional, capaz de pensar o mundo em diferentes
escalas, formas e funções, seja da sua escola, do seu bairro, ou do
funcionamento do mundo.

Considerações finais
Conclui-se que o Livro Didático é, ainda, na atualidade, um
importante instrumento que colabora com o professor das escolas, ele
favorece o processo de ensino e aprendizagem de Geografia e das
demais áreas, contudo todos os elementos que estão ligados as
práticas de ensino na escola do campo devem estar conectadas, em
dialogo, para não confundir o aluno entrando em contradição. O
conteúdo do livro didático deve abordar as dinâmicas do meio rural,
trazer em suas ilustrações frações de paisagem do espaço agrário
brasileiro, destacando a importância dos povos do campo e, de como

- 281 -
os agricultores e agricultoras, homens e mulheres do campo são
importantes para a sociedade.
Outra questão apurada é a importância dos movimentos
sociais para a (re) existência dos povos do campo, suas lutas por uma
educação voltada para o campo, por uma educação digna e que
valorize os saberes e fazeres da população rural foram incansáveis.
Uma das vitorias foi a edição de livros didáticos específico para a
comunidade escolar do campo, contribuindo com o desenvolvimento
do sentimento de pertencimento ao campo no aluno.
Também se observa que edições como a do livro “Novo
Girassol Saberes e Fazeres do Campo” Língua Portuguesa, Geografia e
História 4º ano, do ano de 2014, é a mais adequada, devido aos
conteúdos serem voltados as dinâmicas existentes no campo, além da
linguagem ser acessível e as unidades abordarem o modo de vida do
campo, os saberes e fazeres existente nas realidades dos alunos,
trazendo a terra e suas histórias; história e memória da comunidade;
povo e cultura e tempos e sujeitos. Enquanto o segundo livro,
Conectados Geografia, além de não ser produzido exclusivamente
para o campo, os conteúdos são abordados de uma forma muito
distante da realidade da clientela camponesa. E são conteúdos que
não condizem com a idade/ano que se propõe.
Cabe aqui também ressaltar o professor no processo
educacional. Ele que tem a tarefa de escolher livro didático que
converse, dialogue esteja em consonância com a realidade de seus

- 282 -
alunos, levando em conta uma série de fatores e questões, e que
esteja de acordo com a BNCC. Silva e Cardoso Filho (2018, p. 27)
observam “que o sucesso do livro didático também depende do
professor e da metodologia de ensino implementada, incluindo-se os
objetivos mirados e a visão docente sobre o processo ensino-
aprendizagem”.

- 283 -
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- 286 -
Sobre os autores

Ail C. Meireles Ortiz


http://lattes.cnpq.br/6940923978217052
Possui: Mestrado em Educação pela Universidade Federal de Santa
Maria - UFSM/ (2000). Especialização em Geociências pela
Universidade Federal de Santa Maria - UFSM/ (1997). Graduação em
Geografia Licenciatura Plena pela Universidade Federal de Santa Maria
- UFSM/ (1983). Docente do Centro Universitário Franciscano -
UNIFRA. Profissional de ensino aposentada da rede pública do estado
do RS. É Autora e Organizadora do Livro "Desafios da Educação na
Sociedade de Consumo", publicado em 2007, sendo Autora do
Capítulo: Educação Ambiental e Educação Rural: Processos Histórico-
Sociais em Análise.

Airton Rosa Lucion Guites


http://lattes.cnpq.br/2593510584005210
Graduado em Geografia Licenciatura Plena pela Universidade Federal
de Santa Maria (UFSM). Especialista em Metodologia do Ensino de
História e Geografia pelo Centro Universitário Internacional
(UNINTER). Mestre em Geografia pelo Programa de Pós-Graduação em
Geografia (PPGGEO) da UFSM. Tem ênfase na pesquisa da área do
Ensino de Geografia. Atua como professor de Geografia e Ensino
Religioso na rede pública municipal de Bossoroca/RS; bem como é
revisor do periódico "Geografia Ensino & Pesquisa".

Altair Groff
http://lattes.cnpq.br/0877652899315037
Possui graduação em Direito pela Universidade Federal de Santa
Maria(1993), graduação em Letras - Licenciatura Curta pela
Universidade Federal de Santa Maria(1987), graduação em Filosofia
pela Universidade Federal de Santa Maria(1985), especialização em
Educação Ambiental pela Universidade Federal de Santa Maria(2000),
mestrado em Geografia pela Universidade Federal de Santa

- 287 -
Maria(2016) e ensino-medio-segundo-graupelo Seminário Seráfico
São josé(1980). Atualmente é Servidor Público da Universidade
Federal de Santa Maria. Tem experiência na área de Direito. Atuando
principalmente nos seguintes temas:Educação do Campo,
Desteritorialização das Escolas no Campo, Territorializada.

Ana Carla Lenz


http://lattes.cnpq.br/0888770742442030
Mestranda do Programa de Pós-graduação em Geografia da
Universidade Federal de Santa Maria-UFSM, RS. Graduada em
Geografia Licenciatura Plena pela Universidade Federal de Santa Maria
- UFSM, RS. (2017). Integrou o Programa Institucional de Bolsa de
Iniciação à Docência (PIBID Geografia), como bolsista de Iniciação à
docência no período de 2014/2016. Integrante do Núcleo de Estudos
Regionais e Agrários (NERA/UFSM), no período de 2016/2017.
Atualmente é membro do Grupo de Pesquisa em Educação e Território
(GPET/UFSM). E-mail: anacarlalenz@gmail.com

Cesar De David
http://lattes.cnpq.br/2003244296217013
Professor Associado da Universidade Federal de Santa Maria. Doutor
em Geografia pela Universidade Federal de Santa Catarina (2005), com
Pós-doutorado pela Université du Maine - Le Mans (França). Mestre
em Geografia pela UNESP - Rio Claro (1995). Possui experiência em
ensino, pesquisa e extensão na área de Geografia Humana, com ênfase
em geografia agrária, atuando nos seguintes temas: Territorialidades
rurais, agricultura familiar e educação do campo. É líder do Grupo de
Pesquisa em Educação e Território e coordena o Núcleo de Estudos da
Paisagem da UFSM Silveira Martins.

Cláudia Bassoaldo
http://lattes.cnpq.br/7036013706243934
Licenciada em Pedagogia, Pós -Graduada em Psicopedagogia e Mestre
em Ensino de Humanidades e Linguagens pela Universidade
Franciscana- UFN. Professora da Rede Municipal de Ensino de Santa

- 288 -
Maria/RS . Possui larga experiência na Área de Ensino com ênfase em
Educação, atuando principalmente nos seguintes temas: Avaliação no
processo de ensino e aprendizagem; Avaliação em larga escala com
foco no IDEB, Formação docente e Alfabetização. Exerceu a função de
Gestora escolar, Orientadora de Estudos do Pacto Nacional de
Alfabetização pela Idade Certa (PNAIC), Coordenadora Local do Pacto
Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC), Coordenadora
Pedagógica do Ensino Fundamental e Superintendente da Educação
Básica da Secretaria de Município da Educação de Santa Maria-RS.

Daiane Loreto de Vargas


http://lattes.cnpq.br/6805666089141035
Graduada no Curso de Tecnologia em Agropecuária: Sistemas de
Produção pela Universidade Estadual do Rio Grande do Sul/ UERGS
(2005-2009); Mestre em Extensão Rural pela Universidade Federal de
Santa Maria/ UFSM (2010-2012); Graduada no Programa Especial de
Formação de Professores para a Educação Técnica e Tecnológica pela
Universidade Federal de Santa Maria/ UFSM (2012-2014). Doutora
pelo Programa de Pós-Graduação em Extensão Rural - Universidade
Federal de Santa Maria/ UFSM; Colaboradora do Grupo de Pesquisa
Extensão Rural Aplicada da Universidade Federal de Santa Maria/
UFSM; Foi tutora a distância do Curso Técnico em Fruticultura
realizado pelo Colégio Politécnico da UFSM.

Eliane Aparecida Galvão dos Santos


http://lattes.cnpq.br/7953554954853301
Graduada em Pedagogia Séries Iniciais e Matérias Pedagógicas pela
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Imaculada Conceição (1989),
Mestre em Educação pela Universidade Federal de Santa Maria (2007)
e Doutora em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade Federal de Santa Maria (2013). Atualmente
é Coordenadora pedagógica na Rede Municipal de Santa Maria e
Coordenadora do Curso de Pedagogia da Universidade Franciscana.
Atua como membro do colegiado do Mestrado em Ensino
Humanidades e Linguagens da mesma universidade.

- 289 -
Evandro Dalcin De Franceschi
http://lattes.cnpq.br/7160914732190857
Possui graduação em farmácia pela Universidade de Santa Cruz do Sul
(2007).

Everton de Souza
http://lattes.cnpq.br/7753469745806560
Graduação em Educação Física Licenciatura pela Faculdade Guairacá
(2015). Especialização em Psicomotricidade pela Faculdade de
Educação São Luis (2016). Especialização em Psicopedagogia
Institucional pela Faculdade de Educação São Luis (2016). Participação
no Projeto PIBID entre os anos de 2014 e 2015. Professor de Educação
Física na rede pública de ensino do município de Abelardo Luz - SC
entre os anos de 2016 e 2019. Atualmente é servidor TAE - Técnico
Administrativo em Educação do Instituto Federal de Educação, Ciência
e Tecnologia de Santa Catarina - IFSC.

Janaína Pereira Pretto Carlesso


http://lattes.cnpq.br/7677126784753262
Possui graduação em Psicologia pelo Centro Universitário Franciscano
(2004), é especialista em educação especial: altas
habilidades/superdotação pela UFSM (2007). Cursou mestrado em
Distúrbios da Comunicação Humana pela Universidade Federal de
Santa Maria (2011). Doutora pela Universidade Federal de Santa Maria
no Programa de Pós-graduação Educação em Ciências: Química da
Vida e Saúde. Atualmente é professora adjunta do curso de Psicologia
e do Curso de Mestrado em Ensino de Humanidades e Linguagens da
Universidade Franciscana,atuando na Linha de Pesquisa: Ensino e
formação docente.

Janete Webler Cancelier


http://lattes.cnpq.br/7710315647430813
Doutora em Geografia pela Universidade Federal de Santa Maria
(2018), mestrado em Geografia pela Universidade Federal de Santa

- 290 -
Catarina (2007). Especialização em Docência para o Ensino Superior
em Geografia pela UNOCHAPECÓ (2005). Graduação em Geografia -
Licenciatura pela Universidade Comunitária Regional de Chapecó
(2003), graduação em Geografia - Bacharelado pela Universidade
Comunitária Regional de Chapecó (2007), Tem experiência na área de
Geografia, com ênfase em Geografia Humana, atuando
principalmente nos seguintes temas: espaço urbano, meio ambiente,
agricultura familiar, geografia agrária e educação do campo.

Jaqueline da Costa Braz


http://lattes.cnpq.br/2178771799071116
Possui graduação em Pedagogia pela Faculdade de Filosofia Ciência e
Letras Imaculada Conceição (1990). Pós Graduação em Educação
Infantil e Gestão Escolar. Atualmente é Coordenadora Pedagógica -
José Paim de Oliveira, Prefeitura Municipal de Santa Maria. Tem
experiência na área de Educação, com ênfase em Educação

Letícia Ramires Corrêa


http://lattes.cnpq.br/3357786530501748
raduada em geografia pela Universidade Federal de Santa Maria-
UFSM (2016); Com especialização em Metodologia de Ensino em
geografia pela UNIASSELVI (2019); Mestra em Geografia pelo
Programa de Pós-Graduação em Geografia da UFSM; Estagiária da
Fundação MO´Ã (Organização Não-Governamental de estudos e
pesquisas para o desenvolvimento e proteção ambiental). Tem
experiência na área de Geografia, com ênfase em Educação Ambiental,
Interpretação Ambiental, Áreas Protegidas, Unidades de Conservação,
Reservas Particulares do Patrimônio Natural com ênfase na
conservação dos Recursos Hídricos. Com intercâmbio acadêmico junto
ao Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento Territorial (CEGOT)
da Universidade do Minho (Portugal) e no Laboratório da Paisagem
(Portugal). Email: leticiarcorrea@gmail.com ORCID:
https://orcid.org/0000-0002-7372-3141

- 291 -
Maria Goretti R. Farias
http://lattes.cnpq.br/9719714447404676
Tenho graduação em Pedagogia pelo Centro Universitário Franciscano
(1996) e Especialização em Informática Educacional Centro
Universitário Franciscano (1998). Tenho experiência em sala de aula
com regência de classe, com coordenação pedagógica, vice-direção e
direção de escola. Atualmente sou coordenadora pedagógica dos anos
finais da Escola Municipal de Ensino Fundamental José Paim de
Oliveira, no município de Santa Maria - RS.

Natália Lampert Batista


http://lattes.cnpq.br/9721608652971809
Graduada em Geografia (Licenciatura) pelo Centro Universitário
Franciscano (2013). Mestra e Doutora em Geografia pelo Programa de
Pós-graduação em Geografia (PPGGeo) da Universidade Federal de
Santa Maria (UFSM, 2015 e 2019 respectivamente). Pós-doutoranda
em Geografia (PPGGeo/UFSM) e bolsista do Programa Nacional de
Pós-doutorado (PNPD) da Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior (CAPES). Professora de Geografia (Anos
Finais) na Prefeitura Municipal de Santa Maria (PMSM) em Licença de
Interesse Particular (Portaria nº 1586/SMG de 19 de julho de 2019).
Colaboradora no Observatório de Dados da COVID-19, UFSM (2020).

Rafael Lesses da Silva


http://lattes.cnpq.br/9869574613416391
Possui graduação em Artes Visuais - Licenciatura Plena em Desenho e
Plástica pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM/2018),
curso-técnico-profissionalizante em Design Gráfico pela Sociedade
Educacional Três de Maio (SETREM/2011). Atualmente é acadêmico
do curso de Gestão Educacional no Programa de Pós-Graduação em
Políticas Públicas e Gestão Educacional / PPPG pela Universidade
Federal de Santa Maria. Atualmente é professor da Rede Estadual de
Educação de Ensino do Rio Grande do Sul. Atuou como professor na
Rede Municipal de Educação de Ensino da cidade de Vila Nova do Sul
(2019-2019).

- 292 -
Silvana Zancan
http://lattes.cnpq.br/8067582097952093
Docente do curso de Dança, Pedagogia, Música e Educação Física
Licenciatura da UFSM, do Departamento de Metodologia do Ensino.
Professora Formadora do curso de licenciatura em Educação do
Campo UAB/UFSM. Tutora do curso de Pedagogia EAD/UAB/UFSM das
disciplinas Processos de Leitura e Escrita I, Processos da Leitura e
Escrita II, Seminário Integrador e Filosofia da Educação II. Professora
orientadora da disciplina de TCC do curso de Pedagogia
EAD/UAB/UFSM. Tutora das Licenciaturas, Cursos de Extensão e
Especializações EAD/UFN. Doutora em Educação pela Universidade
Federal de Santa Maria - UFSM; Mestre em Educação pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS.

Zuleika Maria da Silva Ries


http://lattes.cnpq.br/4947150078486852
Possui Graduação em Pedagogia series iniciais pela Universidade
Federal de Santa Maria (1993) e Graduação em Geografia licenciatura
pelo Centro Universitário Franciscano (2008). Atualmente é professor
do Governo do Estado do Rio Grande do Sul e professor da Prefeitura
Municipal de Santa Maria. Mestranda do programa de Pós Graduação
em Geografia da Universidade Federal de Santa Maria.

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