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Resumo:
A pesquisa tem como objetivo geral analisar a realidade e as possibilidades de
organização do conteúdo lutas na formação de professores do Curso de Educação
Física (CEDF) da Universidade do Estado do Pará (UEPA) para o trato desse
conhecimento no ambiente escolar e apresentar indicativos para uma organização
pedagógica superadora. Para tanto, faz-se um resgate histórico do conceito de
esporte e uma contextualização histórica de algumas artes de combate (karatê, judô e
capoeira), apresenta-se fundamentações teóricas sobre trabalho pedagógico de uma
forma genérica e, mais especificamente, sobre artes de combate. Foram analisadas
entrevistas realizadas com os professores que atuam com a disciplina Fundamentos
Métodos das Lutas (FML) e as ementas dos Projetos Político-Pedagógico de 1999 e
de 2007 do CEDF/UEPA. As análises revelaram que a disciplina não articula ensino,
pesquisa e extensão, que os professores estão mais interessados com os
conhecimentos técnicos e não apresentam uma unidade que sintetize os
fundamentos em comum entre as diversas lutas, não fazem crítica ao esporte de
rendimento e não enfatizam a necessidade de diferenciar os esportes das lutas.
Concluiu-se que a disciplina não é suficiente para dar conta da complexidade do
conteúdo lutas e aponta-se para a necessária organização de uma disciplina que
trabalhe os fundamentos das lutas em uma unidade, apresentando aspectos comuns
entre as diversas lutas e que critique a lógica do esporte de rendimento, oferecendo
subsídios para estudos mais avançados em disciplinas obrigatórias e/ou eletivas que,
por sua vez, devem preparar os alunos para a intervenção no ensino escolar e para
formações continuadas em cursos de pós-graduação.
Palavras-chave: Formação de professores. Organização do trabalho pedagógico.
Trato do conhecimento Lutas.
INTRODUÇÃO
É fundamental compreender que o esporte não se explica por si só, que não
pode ser compreendido isolado das demais facetas da sociedade. O esporte
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críticas dessas escolas podem ser resumidas em duas teses: a tese da coisificação
ou da alienação e a tese da repressão e manipulação.
Para a tese da coisificação, também conhecida como tese da alienação, como
resultado das relações da sociedade industrial, principalmente no mundo do trabalho,
os homens não conseguem se desenvolver plenamente enquanto tal. Com essa
forma de organização social, as atividades humanas ficam restritas à racionalidade
instrumental, aprofundando o processo de coisificação das relações humanas.
(BRACHT, 2005)
Na tese da repressão e da manipulação, a sociedade moderna, altamente
tecnológica e industrializada, é considerada um sistema de repressão, dominação e
manipulação. Entretanto meios repressivos não são as únicas formas usadas pelo
Estado no processo de controle social. Bracht (2005), entendendo o esporte como um
fenômeno da modernidade, como uma expressão da modernidade no plano da
cultura, fundamentado em Foucault, ajuda a compreender sobre ferramentas
utilizadas pelo Estado no controle social.
De acordo com Bracht (2005), para Foucault, o Estado não controla indivíduos
somente por meio da repressão. O Estado também controla a partir de estimulações,
incitando, por exemplo, que pessoas fiquem nua, desde que expressem o padrão
estético dominante.
Vale destacar as análises desenvolvidas por Freitas (1994) a respeito do
esporte na modernidade. Para ele o esporte é utilizado como catalizador de energias
que poderiam ser utilizadas para o desenvolvimento de atividades libertadoras,
desviando a atenção dos espectadores dos reais problemas da sociedade, de modo
que eles se concentrem em situações ocorridas em espetáculos esportivos como
campeonatos de futebol.
Para Freitas (1994), o esporte substitui, de modo precário, necessidades
fundamentais como sexo, alimentação e organização política. É nesse sentido que o
autor considera o esporte como ópio, ou seja, como um narcótico coletivo. Diz ainda
que “[...] A educação para o conformismo, através dos Desportos, pauta-se no
preenchimento do vazio ideológico deixado no psiquismo da juventude, surgindo e se
insurgindo como contra-ponto às insinuações materialistas, histórico-dialéticas, e
esquerdizantes [...].” (FREITAS, 1994, p. 86)
Segundo Bracht (2005), para o Marxismo Ortodoxo, o esporte de lazer pode
contribuir tanto para a reprodução da força de trabalho, tendo como efeito uma maior
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Esta seção tem como objetivo apresentar um resgate histórico das artes de
combate judô, karatê e capoeira, explicitando como os significados das lutas mudam
de acordo com o desenvolvimento histórico da sociedade na qual se inserem e como
elas sofreram o processo de esportivização.
1.2.1 Judô
1.2.2 Karatê
O karatê é uma arte de combate que tem origens chinesas, porém foi
sistematizada e expandida no Japão. Várias formas de combate corporal da China
influenciaram a criação dos fundamentos técnicos do karatê como Tô-Dê (mãos de
Okinawa) Kobu-Dô e Kung Fu. (FROSI; MAZO, 2011)
Um importante fator para o desenvolvimento do karatê foram proibições do uso
de armas pelos civis na China. Essa proibição tinha como objetivo diminuir o potencial
bélico da população de modo a evitar revoltas. Assim desarmado, o povo precisou
desenvolver outras formas para reagir às imposições do Estado. (FROSI; MAZO,
2011)
A proibição do uso de armas fragilizou a resistência dos camponeses chineses
(Heimin), deixando-os mais vulneráveis às ações do Estado como cobranças de
impostos, uma vez que essas cobranças eram realizadas por membros da classe
guerreira (os Peichin) que, não raras vezes, utilizavam-se de medidas truculentas.
(FROSI; MAZO, 2011)
Assim, desarmados pelo Estado e sofrendo pressões que chegavam a
violências corporais, os Heimin entendem a necessidade de desenvolverem formas
alternativas para se defenderem, utilizando os materiais que tinham (seus próprios
corpos e ferramentas de trabalho). Dessa forma, percebem em algumas artes de
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1.2.3 Capoeira
De acordo com Silva e Heine (2008), ao longo de sua história, a capoeira foi
praticada em locais e contextos bastante diferentes, como nas senzalas, nos
quilombos, nas matas, nas ruas, nas praças e em outros espaços. Nos seus
primórdios, a capoeira foi praticada pelos negros escravizados das fazendas de cana-
de-açúcar no Brasil, nos poucos momentos em que não se dedicavam ao trabalhado
forçado.
Desde o momento mais remoto da história da capoeira, pode-se observar a
transmissão de elementos culturais da geração mais velha para gerações mais
novas. A necessidade de transformação da realidade por parte dos negros que viviam
na condição de escravos era algo vital. Por isso, o jovem escravo crescia pensando
no seu adestramento corporal e no desenvolvimento da sua capacidade de ser
vitorioso na fuga. (SILVA; HEINE, 2008)
Silva e Heine (2008) afirmam que em cidades como Salvador, Recife e Rio de
Janeiro, após a abolição da escravatura, em 1889, muitos negros buscaram garantir a
sua sobrevivência fazendo pequenos serviços domésticos ou como vendedores
ambulantes nas ruas e praças. Muitos se juntaram em bandos ou maltas e lutaram
para defender seus territórios e outros tantos prestaram serviços para os partidos
políticos da época.
Em 1890, a capoeira passou a fazer parte do Código Penal da República, e
uma grande caçada aos capoeiristas foi iniciada. A capoeira era um crime, e pratica-
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pelo Professor II é que, logo no começo do curso, os alunos escolhessem uma luta
para treinar, o que levaria o aluno, ao final do curso, além do diploma de licenciatura,
receber um certificado de faixa preta.
Constata-se que ambos os professores falam da pequena quantidade de
tempo que o curso oferece para as vivências práticas, porém nenhum deles fala da
necessidade de projetos de pesquisa para qualificar o ensino, assim como possibilitar
maior inserção dos estudantes nas atividades de extensão universitárias.
O presente estudo não nega a importância dos fundamentos técnico-
desportivos para as aulas de Educação Física na formação inicial. Entende-se que a
universidade deve se desenvolver baseada no tripé ensino, pesquisa e extensão. Os
projetos de ensino e extensão, situados no ensino superior, devem ser pautados na
pesquisa. A pesquisa serve para qualificar o ensino dos professores universitários, e
o ensino, por sua vez, deve servir para instrumentalizar as vivências em projetos de
extensão que também funcionam como espaços para realização de pesquisas de
diversos tipos.
Compreende-se que uma disciplina como FML, onde várias lutas devem ser
tratadas em unidades, deve existir como preparação para estudos mais avançados
em disciplinas eletivas que, por sua vez, necessitam preparar os alunos para
formações continuadas. Além disso, a universidade precisa estimular o
desenvolvimento de grupos de pesquisa para fundamentar os projetos de ensino e
extensão e estimular estudantes e professores a publicarem em periódicos científicos
qualificados.
Acredita-se que, inicialmente, as pesquisas históricas são fundamentais,
porque permitem uma compreensão ampla de aspectos políticos, econômicos,
epistemológicos, pedagógicos, técnico-desportivos e técnico-artísticos.
A análise das ementas de FML, em ambos PPP, não apresenta indicações de
quais lutas devem ser trabalhadas. Mas, nas entrevistas, os professores comentam
quais lutas são priorizadas. O Professor I afirmou que trabalha com o karatê, o jiu-
jitsu e o judô, porque são lutas olímpicas e a capoeira por ser brasileira. O Professor
II afirmou que trabalha com o boxe, o karatê, a capoeira e o judô, justificando que
elas foram aceitas pelo grupo de trabalho em ocasião da formulação do PPP, em
1999, e pela maior aceitação da comunidade de uma forma geral.
O Professor I organiza o seu trabalho pedagógico em duas partes. No primeiro
momento, aborda os fundamentos históricos e, no segundo, os alunos entram em
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Abordar o conteúdo lutas na formação inicial com vistas a construir uma base
para tratar pedagogicamente esse conteúdo no espaço da escola implica em
identificar o que se configura como fundamentos das lutas. Compreende-se que uma
disciplina de bases, como FML, precisa tratar o que garante unidade ao conteúdo, ou
seja, o que identifica esse conteúdo, que aqui se defende os seguintes conteúdos:
ataques e defesas, imobilização e condução, domínio de ferramentas naturais e
artificiais.
Essas formas gerais para o conteúdo lutas contribuem para consolidar a base
que identifica os seus fundamentos. Uma disciplina inicial precisa garantir essa
formação. Permeia, ainda, a necessária diferenciação entre os esportes e o campo
das lutas, que apresenta diferenças históricas e necessitam ser situadas. A base para
grande parte das lutas, e aqui se prioriza o bloco das artes de combate japonesas e a
capoeira, perpassam por uma dada concepção de sociedade e apresentam
densidade histórico-social particular que são distintas dos fundamentos dos esportes.
Essa disciplina base precisa ser prosseguida por uma de aprofundamento, que
garanta uma subunidade do que foi abordado na disciplina de fundamentos. Como
são dois grandes blocos de disciplinas, um de caráter oriental e outro de caráter
nacional (há possibilidade de tratar lutas regionalizadas como a agarrada marajoara),
disciplinas de aprofundamentos garantiriam um detalhamento desses blocos, em que
seria possível abordar em profundidade as suas bases históricas, sociais e culturais,
assim como os fundamentos técnicos gerais, a partir dos conteúdos unitários
abordados na disciplina de fundamentos, com a garantia de se visualizar bases
metodológicas para tratar pedagogicamente esse conteúdo.
Por fim, em nível de especialização em cada luta, cumpriria o papel de garantir
a vivência em cada luta desses dois blocos com o objetivo de ampliar o domínio
técnico sobre as movimentações particulares. As bases universais já seriam do
domínio dos estudantes no processo de formação de professores, a esse bloco de
disciplinas a especialização consolidaria o domínio sobre a luta selecionada.
Elabora-se, dessa forma, o processo de construção do conhecimento lutas a
partir da crítica radical ao processo de esportivização, garantindo o resgate da sua
densidade histórico-social, assim como possibilita que o futuro professor saiba
organizar o trabalho pedagógico a partir de uma clara perspectiva pedagógica, em
que se valoriza o processo de problematização do conhecimento para aborda-lo no
ambiente escolar.
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CONCLUSÃO
Abstract
The research has as main objective to analyze the reality and the possibilities of
content organization struggles in teacher of Physical Education Course (CEDF) of
Pará State University (UEPA) for the treatment of this knowledge at school and
present indicative for surpassing one educational organization. To this end, it is a
historical concept of sport and historical context of some combat arts (karate, judo and
capoeira), is presented theoretical foundations of educational work in general terms
and, more specifically on arts fight. Interviews were analyzed conducted with teachers
who work with discipline Fundamentals Methods of Fights (FML) and the menus of
Political-Pedagogical Project 1999 and 2007 CEDF / UEPA. Analyses revealed that
the discipline does not articulate teaching, research and extension, that teachers are
more concerned with the technical knowledge and do not have a unit that synthesizes
the fundamentals in common between the various struggles, do not critical to
performance sport and do not emphasize the need to differentiate the sports fights. It
was concluded that discipline is not enough to account for the complexity of the
content struggles and points to the required organizational discipline that works the
fundamentals of fights in a unit, showing commonalities between various struggles
and to criticize the logic the performance sport, offering support for more advanced
studies in compulsory and / or electives that, in turn, should prepare students for
intervention in school education and continuing education in graduate courses.
Keywords: Teacher training. The pedagogical work organization. Fights knowledge of
the deal.
REFERÊNCIAS
FREITAS, F.M.C. Judô: ética e educação: em busca dos princípios perdidos. Vitória:
EDUFES, 2007.