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UNIDADE SANTO ANTÔNIO DE JESUS

CURSO DE PSICOLOGIA
COMPONENTE CURRICULAR: PSICOPATOLOGIA I
DOCENTE: RAYANNE BÁRBARA
DISCENTES: ADEMILDES TELLES, JOSÉ CARLOS VAZ E LUCIANA MARIANO

RESENHA DO FILME “O MÍNIMO PARA VIVER”

O MÍNIMO para viver. (Título original em inglês: To the bone) Diretor Marti Noxon.
Estados Unidos: Netflix, 2017. 1h47min. Disponível em:
https://www.netflix.com/search?q=o%20m%C3%ADnimo%20para%20viver.
Acesso em 13 nov. 2022.

O filme “O Mínimo para viver” é uma produção americana que traz no seu
enredo a questão dos distúrbios alimentares, de modo especial a anorexia e a
bulimia. Logo de início, há um aviso, alertando que se trata de um filme que foi
criado em parceria com pessoas que sofreram distúrbios alimentares e inclui
representações realistas que podem ser perturbadoras. Diante desse alerta, o
expectador já se mune do assunto que é tratado no filme, que são os distúrbios
alimentares.

A cena de abertura do filme mostra a personagem Ellen, vivida pela atriz Lily
Collins, andando num corredor de um Hospital, e, já traz o impacto da extrema
magreza. Logo em seguida, Ellen aparece numa espécie de grupo de terapia,
entretanto, ela não parece muito confortável nem atende as regras previstas para
o local e, assim, resolve abandonar a terapia em grupo e retornar para a sua casa,
onde vive com o pai, a madrasta e uma meia irmã.

A rotina de Ellen é voltada para a busca incessante por manter o baixo peso,
por não se alimentar e, além disso, inclui exercícios físicos para a perda de calorias.
No seu quarto, as paredes estão cheias de desenhos e pinturas que retratam a sua
condição, revelando certa angustia. Ellen é tão centrada na questão do seu peso
corporal que, sabe a quantidade de calorias de quase todos os alimentos.

A relação com a meia irmã é muito tranquila, revelando certa cumplicidade


entre elas. O pai é um personagem que se mostra ausente, sem habilidade para
tratar com a filha e, acaba por delegar à atual esposa, Susan, o papel de falar, de
orientar, de acompanhar a situação de Ellen. A madrasta trata a questão sem muito
interesse, como se quisesse se desvencilhar de um problema, inclusive sugerindo
a Ellen que vá viver com a sua mãe biológica, porém Ellen não se anima com essa
proposta. Segue-se a essa conversa, a solicitação, por parte da madrasta, que
Ellen se submeta a uma pesagem, e, ao tirar a roupa, a madrasta fica chocada com
a condição corporal dela, revelando que nenhum avanço houve durante o processo
de internação. Apesar das falas da madrasta, da preocupação do pai e mesmo dos
alertas feitos pela meia irmã, Ellen repete uma frase soa quase como um bordão
para a sua personagem: “Eu tenho tudo sobre controle. ”

No desenrolar do drama, a madrasta informa que Ellen precisar tomar uma


decisão. Essa decisão é a aceitação ou não de uma nova terapia, com um médico
que usa métodos não tradicionais. Informa ainda que, a sua mãe biológica
comunicou que não estava preparada para recebê-la naquele momento.

Nesse instante de angústia e solidão, Ellen faz um gesto que se repetirá ao


longo da trama: ela segura o próprio braço como se desejasse fechar a mão sobre
ele, contornando-o entre seus dedos. Esta atitude, revela a adequação do título
original em inglês, que em tradução livre é: até o osso, ou seja, o desejo de chegar
a essa condição, até o osso.

Segue-se que Ellen é levada pela madrasta para uma consulta com o
médico, Dr. William Beckham, interpretado pelo ator Keanu Reeves. Na consulta
inicial, mesmo nem se lembrando da última vez que menstruou, e, revelando a
fragilidade de seu corpo, Ellen argumenta que nunca se sentiu mal, que está tudo
bem, que tem tudo sobre controle. Além da alteração no ciclo menstrual, o médico
detecta que a garota possuiu pelos em excesso nos braços, uma condição
recorrente em casos de anorexia severa, tratando-se de uma forma do corpo se
manter aquecido.

Ellen passa então a integrar um grupo alternativo, numa casa, onde


encontra-se com mais cinco garotas e um rapaz chamado Luck, que também busca
tratamento para o quadro de anorexia, além de apresentar um problema no joelho,
o que lhe fez abandonar os palcos como bailarino. Luck se mostra esperançoso
com o tratamento e passa a se interessar por Ellen. O cotidiano na casa revela as
particularidades e subjetividades de casa caso, as estratégias para não engordar,
incluindo exercícios, caminhadas, indução ao vômito, entre outros. Numa sessão
de terapia familiar, o pai de Ellen não comparece e, as trocas de acusações entre
a mãe e a madrasta tomam a cena.

Na sequência, ela tem uma conversa com o médico, momento em que


resolve adotar o nome de Eli, passa a ter uma melhor convivência com os demais
moradores da casa, porém, se angustia com a rotina, com os fracassos de outros
internos e resolve abandonar o programa. Luck pede que ela permaneça, mas, ela
está decidida e, sem avisar a ninguém, muito debilitada, ela parte em viajem para
a casa de sua mãe biológica, que mora em uma fazenda, vivendo um
relacionamento lésbico. Sua madrasta e a meia-irmã ficam inconformadas com a
naturalidade com que o médico tratou o fato dela ter saído da casa e ter o seu
destino ignorado. Neste momento, o Dr. William Beckham responde de maneira
contundente: “O problema para o tratamento de alguns jovens é que não deixamos
que eles se afundem. É horrível de assistir, mas a Eli (Ellen), ela precisa se afundar.

Segue-se então o encontro de Eli com a mãe, que a recebe de maneira


carinhosa e a leva para uma espécie de redoma, um quarto alternativo onde as
pessoas alugam para temporadas na fazenda. Neste lugar a mãe afirma que teve
depressão pós-parto e que carrega a culpa de não ter conseguido alimentar Ellen
quando criança. A mãe afirma que respeita o seu posicionamento, mas, propõe que
a garota permita que ela lhe alimente, seguindo uma sugestão de uma terapeuta.
Ellen recua, porém, acaba por ceder e, então, se aconchega ao colo da genitora,
numa espécie de retorno ao momento da primeira mamada, permitindo que a mãe
lhe alimente com uma mamadeira. A cena é poética e catártica, pois, trata-se de
um momento singular para mãe e filha, proporcionando uma entrega, uma vivência,
que despertará sentimentos e afetos.

Ellen desperta pela noite e sai a caminhar pelo deserto, acaba por adormecer
e, durante o sono, tem alucinações e sonhos com Luck que lhe fala de sua condição
física. Quando acorda junto com os primeiros raios do sol, Eli decide retornar para
casa, enfrentar o seu próprio deserto. Abraça sua mãe e, ao chegar em casa,
abraça afetuosamente a madrasta e a meia-irmã, agradecendo pelo carinho e
cuidado. Resolve então retornar para o programa terapêutico na casa mantida pelo
Dr. William Beckham.

No que se refere as características apresentadas pela personagem Ellen,


ressalta-se a perda de peso auto induzida, característica da anorexia nervosa.
Entretanto, observa-se que, cada sujeito apresenta singularidades. No caso de
Ellen, ela não reproduz comportamentos de purgação ou vômito auto induzidos,
porém, restringe severamente a ingestão de alimentos e recorre a exercícios para
perda de calorias. Vale ressaltar que, diferente do que comumente se vê na mídia
e na divulgação dos casos de anorexia e bulimia, não fica evidente na trama que
Ellen apresente distorções de sua imagem corporal, muito embora, ela recorra ao
ato de medir a circunferência do braço. Essa face da anorexia não é tão explorada
no enredo.

Neste viés, fica evidenciado que, na trama revelada pelo filme, a


personagem Ellen, utiliza o mecanismo de controle do peso e da imagem corporal
a fim de tentar controlar seus próprios conflitos na dimensão da sexualidade e do
relacionamento com seus pais. Quando há a revelação, por parte de sua mãe
biológica, de sua condição de depressão pós-parto e, consequentemente, o fato
dela não ter conseguido alimentar a filha, parece que se chega a um fator
desencadeante e, a partir da tomada de consciência desse lugar afetivo, tanto Ellen
quanto a mãe, desenvolvem possibilidades de melhor lidar com seus traumas. Por
arremate, o filme traz uma importante mensagem sobre a necessidade de se
conhecer os sintomas, as singularidades que atravessam a síndrome da anorexia,
ressaltando sempre o olhar voltado para o sujeito, seus modos de representação,
suas idiossincrasias, essenciais para a dimensão do cuidado e da abordagem no
caminho da cura terapêutica.

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