Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Brief notes on the impacts of the new CIVIL Procedure CODE in the legal departments of
companies
Revista de Processo | vol. 267/2017 | p. 75 - 87 | Maio / 2017
DTR\2017\1029
___________________________________________________________________________
Elias Marques de Medeiros Neto
Pós-Doutor em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito da Universidade de
Lisboa. Pós-Doutorando em Direito Processual Civil na Faculdade de .Direito da
Universidade de São Paulo – USP. Doutor e Mestre em Direito Processual Civil pela PUC/SP.
MBA em Gestão Empresarial pela FGV. Especialista em Direito da Economia e da Empresa
pela FGV. Especializações em Direito Processual Civil e em Direito dos Contratos pelo
IICS/CEU. Advogado. elias.marques@cosan.com
Sumário:
Este humilde artigo tem como foco tecer breves apontamentos sobre possíveis impactos do
novo Código de Processo Civil na rotina dos departamentos jurídicos das empresas.
Página 1
Breves apontamentos sobre os impactos do novo Código de
Processo Civil nos departamentos jurídicos das empresas
Pode-se dizer que são vetores comuns da administração de contencioso: (i) o refino dos
controles internos do departamento, (ii) a gestão detalhada da informação, (iii) a atuação
preventiva, com compreensão e apoio ao negócio da empresa, (iv) o domínio das técnicas
jurídicas de resolução de disputas, (v) a seleção e gestão adequada dos escritórios de
advocacia parceiros, e (vi) o controle das contingências da empresa e do orçamento do
departamento.
O departamento jurídico deve ter um controle exemplar das informações dos processos
que se relacionam com a empresa, sendo necessário implementar sistemas de
acompanhamento, os quais devem estar sempre atualizados com a inserção dos
andamentos processuais e dos respectivos valores envolvidos. É recomendável que o
departamento jurídico tenha também cópias das principais peças e decisões processuais e
relatórios atualizados dos escritórios quanto aos processos por eles conduzidos. O
departamento precisa ter profissionais especializados para gerir adequadamente os
processos que envolvem a empresa.
Por gestão de informação, compreende-se “um conjunto de estratégias que visa identificar
as necessidades informacionais, mapear os fluxos formais de informação nos diferentes
ambientes da organização, assim como sua coleta, filtragem, análise, organização,
armazenagem e disseminação, objetivando apoiar o desenvolvimento das atividades
cotidianas e a tomada de decisão no ambiente corporativo. A gestão do conhecimento é um
conjunto de estratégias para criar, adquirir, compartilhar e utilizar ativos de conhecimento,
bem como estabelecer fluxos que garantam a informação necessária no tempo e formato
adequados, a fim de auxiliar na geração de idéias, solução de problemas e tomada de
decisão”1.
Página 2
Breves apontamentos sobre os impactos do novo Código de
Processo Civil nos departamentos jurídicos das empresas
Neste passo, é missão do advogado da empresa, que atua com contencioso, conhecer bem
o teor da nova Lei de Mediação (Lei 13.140/15), da nova Lei de Arbitragem (Lei
13.129/15), e do novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/15).
Selecionar e gerir escritórios de advocacia contratados pela empresa é uma arte que vai
muito além da simples análise de relatórios periódicos do andamento de processos.
Uma boa gestão de contencioso implica na busca do escritório que realmente seja parceiro
da empresa, entenda as particularidades do negócio da organização e compreenda e
mapeie quais são as principais teses jurídicas que podem afetar a empresa. O escritório
deve manter o departamento jurídico informado dos trâmites dos processos, sendo
recomendável o debate com o departamento acerca da estratégia processual e do teor das
peças processuais a serem apresentadas.
A contratação do escritório também deve ser bem refletida quanto aos honorários
envolvidos, definindo-se critérios adequados para a remuneração do escritório, para
reembolso de custos e despesas, bem como se alertando o escritório quanto aos
procedimentos e políticas da organização.
Reconhecimento
(a) uma entidade tiver uma obrigação presente (legal ou presumida) como resultado de
um evento passado;
(b) for provável que um fluxo de saída de recursos que incorporam benefícios econômicos
será exigido para liquidar a obrigação; e
Se essas condições não forem atendidas, nenhuma provisão será reconhecida”; e “Em
casos raros, não fica claro se há uma obrigação presente. Nesses casos, um evento
passado é considerado como dando origem a uma obrigação presente se, considerando
todas as evidências disponíveis, houver maior probabilidade de que exista uma obrigação
presente no final do período de relatório”.
Página 3
Breves apontamentos sobre os impactos do novo Código de
Processo Civil nos departamentos jurídicos das empresas
tenha que ser pago pela organização empresarial, o montante deverá ser reservado para
fins de pagamento no futuro.
Neste contexto, é claro que uma relevante mudança nas ferramentas processuais, com o
advento de um novo Código de Processo Civil, é capaz de gerar sérios impactos na rotina
dos departamentos jurídicos.
O novo Código de Processo Civil, em vigor desde março de 2016, apresenta um modelo de
processo focado no resultado e na busca da efetividade na solução do conflito, com adoção
de técnicas de aceleração dos julgamentos, com muita preocupação com a segurança
jurídica e a previsibilidade dos julgamentos, com prestígio aos precedentes judiciais, com
foco nas técnicas de cooperação entre os sujeitos do processo e com incentivo às técnicas
de conciliação e mediação, com aberturas para flexibilidade quanto ao procedimento, com
aumento do risco de litigar, com aumento do risco de sucumbência e com possível
encarecimento do custo dos litígios.
Página 4
Breves apontamentos sobre os impactos do novo Código de
Processo Civil nos departamentos jurídicos das empresas
A forte preocupação do Código com posturas mais cooperativas dos sujeitos processuais
também pode acarretar impacto nas políticas de gestão de informação, com um alerta para
a necessidade de melhoria das políticas de compliance e de melhor documentação e
registro das informações da empresa.
A postura cooperativa incentivada pelo Código também exigirá uma sinergia maior entre as
áreas de contencioso e as áreas de contratos e de planejamento, principalmente porque
cláusulas contratuais, com combinações quanto ao procedimento judicial, poderão ser
desenhadas em negócios jurídicos.
A gestão de contencioso também deverá analisar de forma mais atenta às teses jurídicas
relevantes para a empresa e para o setor em que ela atua, com estudos sobre a
jurisprudência dominante e os precedentes das cortes.
Litigar pode ser caro no novo Código de Processo Civil, na medida em que há aumento de
multas por litigância de má-fé e dos honorários de sucumbência. O departamento deve
analisar adequadamente as teses e as possibilidades de êxito de cada caso judicial. A meta
é atuar sempre dentro do que for o melhor custo e benefício para a empresa.
Advogar dentro da dinâmica do novo Código de Processo Civil é também aprender a atuar
em conformidade com uma visão mais estratégica do comportamento das cortes,
buscando-se proteger teses jurídicas, além dos casos individuais em si. E isso porque o
novo Código coroa a figura do precedente judicial, sendo imprescindível atuar de forma a
proteger teses jurídicas que tenham relevância para os negócios da empresa.
Esses possíveis impactos ficarão mais nítidos com um breve detalhamento de quais são as
mudanças mais relevantes com o advento do novo Código de Processo Civil.
O Projeto Unidroit / American Law Institute, capitaneado pelos mestres Geoff Hazard e
Página 5
Breves apontamentos sobre os impactos do novo Código de
Processo Civil nos departamentos jurídicos das empresas
A doutrina portuguesa assinala com maestria que o princípio da cooperação não se destina
apenas às partes, sendo, na realidade, um grande vetor de comportamento para os
magistrados e demais sujeitos do processo. Os deveres do juiz, de acordo com a noção de
cooperação processual, seriam: a) dever de esclarecer; b) dever de prevenir; c) dever de
consultar as partes; e d) dever de auxiliar as partes.
O STJ português, nesse passo, já decidiu que: “Os princípios que regem o processo civil,
nomeadamente os da igualdade e da cooperação, fazem com que o processo judicial em
curso se transforme numa comunidade de trabalho” (STJ – 21.03.12 / 41/06.4tbcsc.l1.s1
/ Ana Paula Boularot).
A doutrina inglesa do active case management também deixou sua influência no novo
Código de Processo Civil. Para essa doutrina, o juiz, como um verdadeiro gestor, deve: (a)
identificar questões relevantes; (b) incentivar as partes a se valerem dos meios
alternativos de solução de controvérsias; (c) medir o tempo necessário para concluir
adequadamente todos os passos processuais. O juiz planeja o processo e disciplina o
calendário, ouvindo as partes; (d) facilitar uma solução amigável da controvérsia; e (e)
eliminar questões frívolas e planejar o processo, fazendo-o caminhar para o julgamento
com eficiência e sem custo exagerado4.
A própria Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso LXXVIII, na mesma linha, prevê a
importância de o processo ser efetivo: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são
assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua
tramitação”.
Página 6
Breves apontamentos sobre os impactos do novo Código de
Processo Civil nos departamentos jurídicos das empresas
Oportuna é a lição de José Roberto dos Santos Bedaque6: “Processo efetivo é aquele que,
observado o equilíbrio entre os valores segurança e celeridade, proporciona às partes o
resultado desejado pelo direito material. Pretende-se aprimorar o instrumento estatal
destinado a fornecer a tutela jurisdicional. Mas constitui perigosa ilusão pensar que
simplesmente conferir-lhe celeridade é suficiente para alcançar a tão almejada efetividade.
Não se nega a necessidade de reduzir a demora, mas não se pode fazê-lo em detrimento do
mínimo de segurança, valor também essencial ao processo justo. Em princípio, não há
efetividade sem contraditório e ampla defesa. A celeridade é apenas mais uma das
garantias que compõem a idéia do devido processo legal, não a única. A morosidade
excessiva não pode servir de desculpa para o sacrifício de valores também fundamentais,
pois ligados à segurança do processo”.
A citada obra, escrita nos idos dos anos 70 do século passado, de forma didática e
magistral, conseguiu abordar, com singular atualidade, reflexões sobre a efetividade do
processo civil e a eficiência dos seus ritos; temas esses que hoje se encontram no foco de
preocupação dos juristas que desenharam o novo Código de Processo Civil.
Página 7
Breves apontamentos sobre os impactos do novo Código de
Processo Civil nos departamentos jurídicos das empresas
considerados adequados, à luz dos cinco critérios acima referidos, a obtenção de uma
sentença que resolva o conflito, com respeito aos direitos fundamentais e no menor tempo
possível, realizando o interesse público da atuação da lei material”.
Logo nos primeiros artigos do novo Código de Processo Civil, busca-se positivar a
importância de um processo verdadeiramente efetivo:
“Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito,
incluída a atividade satisfativa.
Art. 5º Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo
com a boa-fé.
Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em
tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.
Art. 8º Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do
bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a
proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.”
c) Preocupação com a uniformidade na aplicação do direito pelos tribunais (art. 55, § 3º, do
Código), com prestígio à formação de precedentes judiciais (arts. 926 e 927 do Código),
forte respeito à jurisprudência dominante (arts. 332 e 932 do Código), e adoção de
técnicas para alinhamento em casos de natureza repetitiva (arts. 976 e 1036 do Código);
d) Incentivo à prática de atos por meio eletrônico. As empresas, por exemplo, deverão
cadastrar endereço eletrônico nos tribunais para fins de recebimento de citação (art. 246
do Código);
Página 8
Breves apontamentos sobre os impactos do novo Código de
Processo Civil nos departamentos jurídicos das empresas
h) Atribuição dinâmica do ônus da prova, dentro das hipóteses do art. 373 do Código;
j) Julgamento parcial de mérito, podendo o magistrado julgar desde logo os pedidos que
não demandam maior dilação probatória, prosseguindo-se em primeira instância com a
instrução necessária referente aos pedidos ainda não apreciados (art. 356 do Código). A
decisão de mérito aqui mencionada poderá ser executada provisoriamente, inclusive sem a
necessidade de caução (art. 356 do Código);
o) Previsão de que o dinheiro deve ser penhorado de forma prioritária, conforme previsto
nos arts. 835 e 854 do Código;
Os artigos acima já nos adiantam o perfil de resolução de conflitos que o novo Código de
processo civil deseja adotar, sendo que podemos entender que o legislador almeja a um
processo civil de resultados, econômico e efetivo; com amplo espírito de conciliação e com
incentivo para que tanto as partes como os juízes adotem uma visão participativa e
colaborativa do processo.
Página 9
Breves apontamentos sobre os impactos do novo Código de
Processo Civil nos departamentos jurídicos das empresas
Como já foi adiantado, esse cenário pode impactar o controle de contingências e provisões.
Ora, como visto, o processo civil tende a se tornar mais dinâmico e célere, inclusive com a
possibilidade de decisões parciais de mérito, julgamentos liminares de improcedência,
tutela provisória de evidência, com a antecipação da tutela independentemente do perigo
da demora, e alto prestígio aos precedentes judiciais. Todo esse contexto permitirá à
empresa obter em um menor espaço de tempo a adequada impressão sobre as
probabilidades de êxito do processo, bem como exigirá da companhia um preciso estudo
sobre o comportamento do Poder Judiciário em relação a determinado tema jurídico; tudo
de modo a garantir que seu controle de provisão, contingências e caixa esteja de acordo
com o trâmite processual e as reais chances de êxito do caso.
O departamento jurídico também deve estar atento quanto à majoração dos riscos do
contencioso, sendo certo que deve auxiliar a empresa na análise do adequado custo /
benefício de um determinado litígio.
Essas são apenas algumas humildes impressões quanto aos impactos de um novo Código
de Processo Civil no ambiente dos departamentos jurídicos, sendo certo que, longe de
esgotar o tema, procurou-se, ao menos, chamar a atenção para a importância de as
empresas e os seus departamentos jurídicos estarem atentos às mudanças do contexto
processual.
Página 10
Breves apontamentos sobre os impactos do novo Código de
Processo Civil nos departamentos jurídicos das empresas
6 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. São
Paulo: Malheiros. 2007. p. 49.
7 CAPPELLETTI, Mauro. Acesso à justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre:
Fabris, 1988.
Página 11