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Introdução

A palavra fenomenologia foi empregada por alguns pensadores ao longo da


história da filosofia, e pode ser aqui definida nos seguintes termos: “descrição
daquilo que aparece ou ciência que tem como objetivo ou projeto essa descrição”.
Como se pode deduzir do próprio vocábulo, a fenomenologia está relacionada
diretamente ao conceito de fenômeno que pode ser definido como “aquilo que
aparece ou se manifesta”. Todavia, não se pretende aqui apresentar um esboço
histórico do conceito de fenômeno nem tampouco da fenomenologia. Em sendo
assim, será feita uma abordagem da fenomenologia.

A Fenomenologia

Husserl apresenta a sua fenomenologia como um método de investigação que


tem o propósito de apreender o fenômeno, isto é, a aparição das coisas
à consciência, de uma maneira rigorosa. “Como um método de pesquisa, a
fenomenologia é uma forma radical de pensar”. Como as coisas do mundo se
apresentam à consciência, o filósofo alemão pretende perscrutar essa aparição
no sentido de captar a sua essência (aquilo que o objeto é em si mesmo), isto é,
“ir ao encontro das coisas em si mesmas”. Nesse sentido, a filosofia husserliana
traz consigo um novo método de investigação que irá exercer grande influência no
meio acadêmico, o que fará da fenomenologia um marco imprescindível na
filosofia contemporânea. É oportuno enfatizar que a filosofia de Husserl é um
tanto quanto vasta e densa, o que requer, por sua vez, certo esforço para
interpretá-la. Diante disso, enfocaremos aqui apenas os aspectos capitais do
pensamento husserliano. 

O rigor que Husserl reivindica para o seu método fenomenológico advém


do propósito desse pensador em dispensar à filosofia o mesmo rigor
metodológico conferido à ciência. Por ter efetuado estudos nos campos da
matemática e da lógica, Husserl sempre nutriu certo apreço pelo rigor
metodológico. Contudo, Husserl não via “com bons olhos” os métodos
empregados, por exemplo, pela psicologia experimental. Isso porque essa ciência,
como outras ciências experimentais, parte dos dados empíricos para daí
desenvolver seus postulados. Para o filósofo alemão, a instabilidade dos dados
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da empiria não fornecem o rigor necessário concernente à investigação filosófica.


Assim, “enquanto a ciência positivista restringe seu campo de análise ao
experimental, a fenomenologia abre-se a regiões veladas para esse método,
buscando uma análise compreensiva e não explicativa dos fenômenos”. Em
contrapartida, o pensador alemão propõe a “análise compreensiva” da
consciência, uma vez que todas as vivências do mundo se dão na e pela
consciência. Daí a tão célebre definição husserliana de consciência: “toda
consciência é consciência de algo”. Essa definição de consciência está vinculada,
por seu turno, à noção de intencionalidade. 

Para Husserl, “a palavra intencionalidade significa apenas a característica geral da


consciência de ser consciência de alguma coisa”. Eis o ponto de partida adotado
pelo filósofo alemão: a análise dos fenômenos no âmbito da consciência no
intuito de se tentar apreender as coisas em si mesmas, isto é, como elas são.
Podemos dizer que em Husserl o cogito cartesiano ganha uma nova roupagem
onde a intencionalidade (toda consciência é consciência de) assume o lugar da
certeza “clara e distinta” de René Descartes.

A intencionalidade seria a marca fundamental da consciência, uma vez que a


consciência está o tempo todo voltada para fora de si. Contudo, a consciência não
é considerada por Husserl como se fosse uma substância ou um revestimento a
partir do qual o mundo brotaria:   

O conceito husserliano de intencionalidade traz no seu seio as noções de intenção,


intuição e evidência apodítica. Husserl chama de “intenção” o conteúdo
significativo de alguma coisa. Temos a intenção de um objeto (um livro sobre a
mesa) quando possuimos apenas o significado intencional desse livro (bem como
da mesa). No entanto, no momento dessa intenção não há efetivamente a
presença em carne e osso do livro e da mesa. Em outras palavras:    

      

A REDUÇÃO FENOMENOLÓGICA (EPOCHÉ)

Ao deter-se na análise da consciência, Husserl irá propor seu método radical para

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"vasculhar" o fenômeno, a saber, a redução fenomenológica (epoché). Tomando


emprestado da filosofia antiga o termo grego epoché, que os antigos céticos
traduziam por “suspensão” do juízo a respeito das coisas, Husserl o adota sob
outra perspectiva. A epoché husserliana consiste em pôr "entre parênteses" o
mundo quando da apreensão do fenômeno. 

Dito de outra forma, a epoché consiste numa suspensão momentânea da “atitude


natural” com a qual nós nos relacionamos com as coisas do mundo. Isso consiste
em deixar provisoriamente de lado todos os preconceitos, teorias, definições, etc.,
que nós utilizamos para conferir sentido às coisas. Tal suspensão da nossa
atitude natural diante do mundo tem como escopo apreender na consciência as
coisas no sentido de captá-las como elas são em si mesmas: "a fenomenologia
procura enfocar o fenômeno, entendido como o que se manifesta em seus modos
de aparecer, olhando-o em sua totalidade, de maneira direta, sem a intervenção de
conceitos prévios que o definam e sem basear-se em um quadro teórico prévio
que enquadre as explicações sobre o visto". A fenomenologia de Husserl parece
ser uma tentativa de perscrutar o fenômeno em sua “pureza”, isto é, em sua
“originalidade”. A proposta husserliana de se evitar a “atitude natural” na
apreensão e análise do fenômeno denota no filósofo alemão sua insistente busca
pelo rigor metodológico. 

Conclusão

Apresentamos uma visão panorâmica da fenomenologia husserliana, a qual é um


marco referencial no pensamento contemporâneo. O rigor metodológico que
Husserl reivindica para a filosofia atesta o vigor com o qual o pensador alemão
sempre pautou suas investigações. A título de conclusão, julgamos pertinente
tecer uma breve consideração. A epoché (sobretudo a redução transcendental)
parece mergulhar a consciência num estado onde, de uma certa maneira,
perdemos a aderência com este mundo real. Certamente é louvável o rigor que
Husserl buscava para a investigação filosófica. No entanto, “reduzir” a realidade
ao nível do “consciente”, através de sucessivas epochés, para a partir daí tirar
conclusões seguras e radicais, parece não tornar a análise do fenômeno menos
problemática. E Husserl, como um bom filósofo, tentou fazê-lo com muita

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propriedade e esmero.

Referências bibliográficas

ABBAGNANO, N. Dicionário de filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

BAKDINI, M. Da G. Fenomenologia e teoria literária. São Paulo: EDUSP, 1990.

COX, G. Compreender Sartre. Petrópolis: Vozes, 2005.

DARTIGUES, A. O que é a fenomenologia? São Paulo: Centauro, 2005.

DEPRAZ, N. Compreender Husserl. Petrópolis: Vozes, 2007.

DESCARTES, R. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1986.

FRAGATA, J. A fenomenologia de Husserl como fundamento da filosofia. Braga:


Livraria Cruz, 1959.

____________. Problemas da fenomenologia de Husserl. Braga: Editorial Presença,


1962.

HUSSERL, E. A crise da humanidade europeia e a filosofia. Porto Alegre;


EDIPUCRS, 2008.

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