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Revista Tecnológica – Número 7 – outubro de 1998, 121-126

AUDITORIA AMBIENTAL
PROBLEMAS COMPORTAMENTAIS VIVENCIADOS PELOS
AUDITORES NA PRÉ CERTIFICAÇÃO

Prof. Carlos Eduardo Sanches da Silva, M.Sc.


Escola Federal de Engenharia de Itajubá - EFEI / Departamento de Produção - DPR
sanches@eps.ufsc.br - Doutorando da UFSC
Profa. Rosemy da Silva Nascimento, M.Sc.
Universidade Federal do Paraná – UFPR/Departamento de Geografia
larus@mbox1.ufsc.br – Doutoranda da UFSC
Prof. Cláudio Luiz Sebben, M.Sc.
Prof. Ricardo Scherer, M.Sc.
Cristiano Hugo Cagnin
Prof. Miguel Fiod Neto, Dr.
Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC
Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção
Caixa Postal 476 - CEP 88.020-970 - Florianópolis/SC

Abstract:

This work evaluates the problems of behavior found by the Brazilian auditors in the environmental pre-

assessment .

Keywords: ISO 14001, Problems of behavior, Pre-assessment

1 – INTRODUÇÃO

A auditoria ambiental é uma avaliação sistemática, documentada, periódica e objetiva

de uma determinada empresa sobre seu sistema de gerência e de equipamentos referente a

proteção ambiental. Principalmente no que se refere ao controle das emissões de poluentes na

atmosfera, água e solo.

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No processo de auditoria ambiental, está presente uma equipe de auditores, que tem

por objetivo auditar as empresas para fins de certificações/registros e/ou auto declaração

referente a NBR ISO 14001.

Para que a empresa possa obter a certificação ambiental, é necessário implementar um

Sistema de Gestão Ambiental (SGA) em conformidade com a norma NBR ISO 14001, e que

este tenha seu desempenho analisado através de auditorias internas e externas. Porém,

observamos que no processo de auditoria ocorrem diversos problemas compartimentais onde

a auditoria, principalmente externa, torna-se um momento de tensão tanto para auditores

quanto para aditados.

Um dos mecanismos utilizados para amenizar esta tensão é a pré-auditoria, que pode

ser entendida como uma simulação da auditoria de certificação, propiciando um contato

inicial entre os funcionários da organização auditada e a equipe do organismo certificador.

Toda auditoria externa tem, até certo ponto, um elemento emocional que estabelece

naturalmente barreiras ao processo de auditoria. Cabe ao grupo de auditores externos a tarefa

de remover estas barreiras que dificultam a coleta de dados, distorcem informações ou

omitem pontos importantes para a auditoria. Estas barreiras são definidas por REBELO

[1995] como “problemas comportamentais”. Surgem assim algumas questões:

Ø Existe alguma relação entre os problemas comportamentais encontrados pelos audirores e

a posterior certificação?

Ø Quais os problemas comportamentais mais freqüentes na relação auditor – auditado?

Quais os menos freqüentes?

Ø Os problemas comportamentais mais freqüentes colocam à prova a postura ética dos

auditores?

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Através de um sondagem dos problemas comportamentais encontrados pelos auditores

de organismos certificadores, por meio de entrevista e/ou questionários, buscamos obter dados

que nos subsidiem responder as questões acima. Como, normalmente, o primeiro contato

entre a organização e os auditores de organismos certificadores se da na Pré Auditoria, nossa

analise se restringirá a avaliar os problemas comportamentais existentes neste processo.

2 – AVALIAÇÃO PRÁTICA DOS PROBLEMAS COMPORTAMENTAIS ENCONTRADOS PELOS

AUDITORES

2.1 – Coleta de dados:

A avaliação se deu através de um questionário enviado aos organismos brasileiros de

certificação da NBR ISO 14001 e de entrevista pessoal com alguns auditores. No Brasil

existem as seguintes certificadoras segundo o IMETRO [1998]:

1. BRTUV Avaliações da Qualidade Ltda - BRTUV

2. BVQI - Bureau Veritas Quallity International

3. Lloyd's Register Q.A. - LRQA

4. Det Norske Veritas Classificadora Ltda - DNV

5. Beritish Standards Institute Quality Assurance - BSI

6. DQS do Brasil Ltda

7. TUV Bayerb Brasil ( TUV CERT )

8. Germanischer Lloyd do Brasil Ltda

9. Fundação Carlos Alberto Vanzolini - FCAV

Os problemas comportamentais utilizados como referência foram os apresentados por REBELO [1995]:

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Ø Associação da auditoria à sindicância: Auditados, tendo em vista o desconhecimento dos

objetivos, passam a procurar responsáveis pelas Não Conformidade (NC), visando

eventual punição;

Ø Amnésia: Auditados propositadamente se esquecem de prover documentos e informações

solicitadas anteriormente;

Ø Pânico: Auditados, tendo em vista o desconhecimento dos objetivos, ficam descontrolados

emocionalmente, temendo conseqüências e deixando de fornecer informações confiáveis;

Ø Reversão da auditoria: Auditados passam a questionar os auditores;

Ø Apatia: Auditados apresentam-se indiferentes às constatações observadas;

Ø Antagonismo interno: Auditados passam a questionar sua própria organização;

Ø Busca de justificativa: Auditados passam a procurar desculpas para cada NC detectadas;

Ø Busca de responsáveis: Auditados passam a buscar outros responsáveis para as falhas

detectadas, que estão sob sua responsabilidade;

Ø Falta de motivação: Auditados passam a boicotar, ridicularizar ou questionar os objetivos

da avaliação;

Ø Refratariedade: Auditados por postura agressiva, dificultam a coleta de informações;

Ø Contra-auditoria: Auditados procuram neutralizar a seqüência da avaliação através de

subterfúgios;

Ø Tentativa de suborno: Auditados oferecem, disfarçadamente recompensas para alterarem o

parecer final da auditoria.

Os problemas comportamentais foram analisados levando-se em conta as pré auditorias realizadas nas

empresas que se certificaram e nas que não se certificaram posteriormente. A situação de pré auditoria foi

escolhida analisada, pois a mesma está mais sujeita a presença de problemas comportamentais e pela

possibilidade dos auditores terem acompanhado mais pré auditorias do que auditorias de certificação. Os

auditores dos organismos certificadores foram avaliados, no período de agosto de 1998, da seguinte forma:

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Ø Envio de um questionário a oito organismos certificadores, dos quais obtivemos sete respostas (87,5%);

Ø Entrevista de três auditores pertencentes ao organismo certificador restante.

2.2 – Tabulação Geral:

A classificação do problema comportamental pelo auditor obedeceu uma escala dividida em cinco

classes (0%-20%, 20% -40%, 40% -60%, 60% -80% e 80% a 100%), onde o auditor deve:

Ø Considerar o universo de empresas das quais participou de pré auditorias;

Ø Classificar, segundo sua experiência, a quantidade relativa de empresas que apresentaram

cada um dos problemas comportamentais listados.

Posteriormente para cada classe foi atribuído um peso (1, 2, 4, 8 e 16). Os pesos foram definidos por

uma progressão geométrica de razão dois com a finalidade de auferir uma maior sensibilidade aos dados

coletados. A freqüência das respostas foi multiplicada pelos respectiv os pesos obtendo o valor absoluto para

cada problema comportamental.

Os resultados obtidos pelos questionários foram tabulados abaixo:

PROBLEMAS Certificadas Não Certificadas TOTAL


COMPORTAMENTAIS Quest. Entr. TOTAL Quest. Entr. Total Geral
Abs. % Abs. % Abs. %
Associação da Auditoria à Sindicância 23 10 33 7,9 73 24 97 18,0 130 13,6
Amnésia 34 4 38 9,0 34 2 36 6,7 74 7,7
Pânico 9 10 19 4,5 44 32 66 12,3 85 8,9
Reversão da Auditoria 68 6 74 17,6 40 6 46 8,6 120 12,5
Apatia 11 4 15 3,6 19 2 21 3,9 36 3,8
Antagonismo Interno 15 4 19 4,5 23 4 27 5,0 46 4,8
Busca de Justificativa 36 40 76 18,1 50 24 74 13,8 150 15,7
Busca de Responsáveis 36 40 76 18,1 40 32 72 13,4 148 15,4
Falta de Motivação 13 3 16 3,8 31 3 34 6,3 50 5,2
Refratariedade 9 4 13 3,1 21 12 33 6,1 46 4,8
Contra-auditoria 13 16 29 6,9 42 24 66 12,3 95 9,9
Tentativa de Suborno 9 3 12 2,9 54 2 56 10,4 68 7,1
TOTAL 276 144 420 100 471 167 538 100 958 100

Tabela 1 – Tabulação Geral dos Problemas Comportamentais

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O gráfico 1 representa os problemas comportamentais e sua relação com a posterior

certificação do SGA.

Problemas
Comportamentais
Associação à Sindicância

Amnésia

Pânico

Reversão da Auditoria
Apatia

Antagonismo Inter.

Busca de Justificativa

Busca de Responsáveis

Falta de Motivação

Refratariedade

Contra Auditoria
Tentativa de Suborno

20 16 12 8 4 4 8 12 16 20 %
0 Posterior
Não Certificadas Certificadas
certificação ?
Gráfico 1 – Relação entre a Maturidade do SGA e os Problemas Comportamentais

3 - CONCLUSÕES:

O elevado índice de respostas obtido nos questionários (87,5%) e nas entrevistas, que abrangeram

praticamente todos os organismos brasileiros certificadores da ISO 14001, permitem obtermos algumas

conclusões consistentes. São elas:

þ Podemos considerar duas concepções de SGA em relação a sua consistência ou grau de

maturidade:

Ø Maduros: possuem no seu SGA características como: consciência e comprometimento

coletivo, estrutura organizacional, procedimentos, responsabilidades, processos e recursos

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necessários para implementar a Gestão Ambiental. Esta maturidade, é observada nas

empresas que posteriormente à pré auditoria obtiveram a certificação.

Ø Imaturos: ainda estão implementando as características apresentadas acima, podendo as

mesmas estarem presentes em diversos graus. Esta imaturidade, é observada nas empresas

que posteriormente à pré auditoria não obtiveram a certificação.

þ As empresas que após a pré auditoria obtiveram a certificação, em relação a intensidade e

a freqüência, apresentam menos problemas comportamentais dos que as empresas que não

obtiveram a certificação.

Empresas que posteriormente após a Pré auditoria foram:

Certificadas Não Certificadas


Questionário Entrevista Questionário Entrevista
Intensidade dos problemas comportamentais 20,5% 25,0% 35,0% 43,5%
em relação ao máximo possível
Freqüência de problemas comportamentais 33,3% 25,0% 75,0% 41,7%
acima da mediana

Tabela 2 – Relação dos Problemas Comportamentais e a posterior Certificação após a Pré Auditoria

þ Os problemas comportamentais mais freqüentes tanto nas empresas certificadas quanto nas não certificadas

após a pré auditoria foram:

Ø Busca de justificativa

Ø Busca de responsáveis

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Problemas
Comportamentais
Associação à Sindicância

Amnésia

Pânico

Reversão da Auditoria
Apatia

Antagonismo Inter.

Busca de Justificativa

Busca de Responsáveis

Falta de Motivação

Refratariedade

Contra Auditoria
Tentativa de Suborno

20 16 12 8 4 0 4 8 12 16 20
Não Certificadas Certificadas Posterior
certificação ?

Gráfico 2 – Problemas Comportamentais mais freqüentes tanto nas empresas certificadas quanto nas

não certificadas

Estes problemas comportamentais são inerentes a natureza humana de tentar justificar o erro ou atribuí-

lo a outra pessoa.

þ Os problemas comportamentais menos freqüentes foram:

Ø Apatia

Ø Antagonismo interno

Ø Falta de motivação

Ø Refratariedade

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Problemas
Comportamentais
Associação à Sindicância

Amnésia

Pânico

Reversão da Auditoria
Apatia

Antagonismo Inter.

Busca de Justificativa

Busca de Responsáveis

Falta de Motivação

Refratariedade

Contra Auditoria
Tentativa de Suborno

20 16 12 8 4 0 4 8 12 16 20
Não Certificadas Certificadas Posterior
certificação ?

Gráfico 3 – Problemas Comportamentais menos freqüentes tanto nas empresas certificadas quanto nas não

certificadas

Um processo de pré auditoria gera nas empresas ansiedade e expectativa que acabam por bloquear os

problemas comportamentais observados como menos freqüentes.

þ Os problemas comportamentais mais comuns apenas nas empresas que após a pré auditoria:

Ø Obtiveram a certificação posteriormente foi a “reversão da auditoria”. Que reflete um

SGA maduro, pois questiona-se os auditores no sentido de testar o conhecimento deles e

até mesmo questionar possíveis NC detectadas. As pessoas da organização conhecem a

NBR ISO 14001 e seu SGA.

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Problemas
Comportamentais
Associação à Sindicância

Amnésia

Pânico

Reversão da Auditoria
Apatia

Antagonismo Inter.

Busca de Justificativa

Busca de Responsáveis

Falta de Motivação

Refratariedade

Contra Auditoria
Tentativa de Suborno

20 16 12 8 4 0 4 8 12 16 20
Não Certificadas Certificadas Posterior
certificação ?

Gráfico 4 – Problema Comportamental mais freqüente nas empresas certificadas

Ø Não obtiveram a certificação posteriormente foram: “associação da auditoria à

sindicância”, “pânico”, “contra auditoria” e “tentativa de suborno”. A natureza destes

problemas comportamentais reflete um SGA imaturo, pois o processo de auditoria é mau

interpretado gerando medo e pânico, além de se buscar subterfúgios para obter um

resultado satisfatório na auditoria. As pessoas da organização estão inseguras em relação

ao SGA implementado. Sugere capacitação deficiente, pouco tempo de socialização dos

procedimentos gerando normalmente insegurança nos auditados.

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Problemas
Comportamentais
Associação à Sindicância

Amnésia

Pânico

Reversão da Auditoria
Apatia

Antagonismo Inter.

Busca de Justificativa

Busca de Responsáveis

Falta de Motivação

Refratariedade

Contra Auditoria
Tentativa de Suborno

20 16 12 8 4 0 4 8 12 16 20
Não Certificadas Certificadas Posterior
certificação ?

Gráfico 5 – Problemas Comportamentais mais freqüente nas empresas não certificadas

þ A tentativa de suborno ocupa uma das primeiras colocações nos questionários porém na

entrevista aparece como uma das últimas. Provavelmente o caracter informal do

questionário elevou a alta pontuação deste problema.

Atualmente, a economia mundial ingressa em um novo ciclo de paradigmas

tecnológicos. Principalmente na implantação de Sistemas de Gestão Ambiental (SGA) e nas

auditorias ambientais. O conhecimento dos problemas comportamentais mais existentes pode

por parte:

þ dos auditores propiciar uma postura pró-ativa no decorrer da auditoria;

þ da empresa subsidiar o estabelecimento de estratégias para minimizar seus efeitos;

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þ da empresa estabelecer mecanismos para monitorá-los, avaliando setorialmente e/ou

globalmente o grau de maturidade do SGA;

Implantar um SGA, que venha garantir um crescimento econômico, pode ser

considerado como sendo o novo paradigma de qualidade de vida. Pois, acreditamos que a

médio e longo prazo, a certificação no futuro será mero referencial histórico, e não uma

obrigatoriedade por questões financeiras, legais ou anti-punitivas.

AGRADECIMENTOS:

Aos auditores que responderam prontamente os questionários enviados e aos auditores entrevistados.

4 – BIBLIOGRÁFIAS

& REBELO, Antônio R. C.. Auditorias da Qualidade . Qualitymark Editora Ltda., São

Paulo -SP, 1995, p.163-170;

& IMETRO. Relação de Organismos Certificadores no Brasil. São Paulo – SP, 1998;

& ABNT, Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR ISO 14010/14011/14012 –

Auditoria Ambiental. Rio de Janeiro, 1997;

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