Você está na página 1de 68

A SEQUÊNCIA DIDÁTICA (SD) NO PLANO

EXPERIMENTAL DA SALA DE AULA, EM


CONTEXTOS QUE ENVOLVEM A MINERAÇÃO,
IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS E
REVITALIZAÇÃO NA BACIA DO RIO DOCE

Adriana Angélica Ferreira1

Este texto foi produzido no âmbito do Curso de


Aperfeiçoamento: Mineração, Rompimento da
Barragem e Revitalização: desafios para a Educação.
O Curso é uma ação desenvolvida no Programa de
Extensão Formação Continuada de Educadores
da Rede Pública dos municípios atingidos pelo
rompimento da Barragem de Fundão em Minas
Gerais.

1 Doutora em Geografia. Pós-doutora em História da Educação, pelo Instituto de Edu-


cação da Universidade de Lisboa/Portugal. Professora da Escola de Educação Básica e
Profissional da UFMG (Centro Pedagógico).
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
Reitora: Sandra Goulart Almeida
Vice-Reitor: Alessandro Moreira

FACULDADE DE EDUCAÇÃO
Diretora: Andrea Moreno
Vice-Diretora: Vanessa Ferraz Almeida Neves

UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO


Reitora: Cláudia Aparecida Marliére de Lima
Vice-Reitor: Hermínio Arias Nalini Júnior

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS


Diretor: Luciano Campos da Silva
Vice-Diretora: Helena Miranda Mollo

FUNDAÇÃO DE DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA


FUNDEP
Presidente: Jaime Arturo Ramírez

FUNDAÇÃO RENOVA
Diretor-presidente: André de Freitas

CÂMARA TÉCNICA DE EDUCAÇÃO, CULTURA, LAZER, ESPORTE E


TURISMO (CTECLET) DO COMITÊ INTERFEDERATIVO
Coordenadora: Anna Claudia Aparecida de Alcântara Tristão

PROGRAMA DE FORMAÇÃO CONTINUADA DE EDUCADORES


DA REDE PÚBLICA DOS MUNICÍPIOS ATINGIDOS PELO
ROMPIMENTO DA BARRAGEM DE FUNDÃO EM MINAS GERAIS
Coordenação Geral
Maria Isabel Antunes-Rocha - Coordenação UFMG
Luiz Paulo Ribeiro – Vice Coordenação UFMG
Marcelo Loures dos Santo – Coordenação UFOP
Paula Cristina de Almeida Rodrigues – Vice Coordenação UFOP

Apoio Administrativo
Maria José Teixeira Mendes

Coordenação Pedagógica
Sirleine Brandão de Souza

Coordenação Operacional
Octávio Valente Borges

Coordenação de Monitoramento e Avaliação


Suzana dos Santos Gomes

Coordenação de Produção Acadêmica


Leandro Silva de Paula
Célia Maria Fernandes Nunes
Marlucy Alves Paraiso

Gestão Banco de Dados


Luana Cordeiro

Gestão Redes Sociais


Otávio Pereira

Apoio Pedagógico
Mariana Esteves da Costa
COMISSÃO ACADÊMICA

IGC/Universidade Federal de Minas Gerais - Lúcia Fantinel


FAE/Universidade Federal de Minas Gerais – Geraldo Magela Pereira Leão
Universidade Federal de Ouro Preto – Maria do Rosário Tripodi
Universidade Federal de Ouro Preto – Luciano Campos Silva

COMISSÃO GESTORA REGIONAL

Comissão Técnica de Educação, Cultura, Lazer, Esporte e Turismo


CT-ECLET – Comitê Interfederativo
Camila Camargos
Renato Resende Braga
Vanda Meire Costa Freitas

Fundação RENOVA – Igor Thiago Moreira


Universidade Federal de Minas Gerais – Maria Isabel Antunes-Rocha
Universidade Federal de Ouro Preto – Marcelo Loures dos Santos
REPRESENTANTES DAS REDES PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO

Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais - Camila Camargos

Superintendencias Regionais de Ensino (SREs) e


Secretarias Municipais de Educação (SMEs)

SRE Caratinga - Alessandra Souza

SME Bom Jesus do Galho - Márcia Clemente Pereira de Oliveira


SME Bugre - Eva Vilma Viana da Costa Souza
SME Caratinga - Rosa Irene Toledo Nascimento
SME Córrego Novo - Cristiana Corrêa de Sá
SME Pingo D’Água - Lucinéia Joana dos Santos
SME Iapu - Sandra Gomes Barbosa do Amaral
SME Ipaba - Lucinéia Joana dos Santos

SRE Coronel Fabriciano - Dalva Morais

SME Belo Oriente - Vanda Meire Costa Freitas


SME Ipatinga - Ana Cristina Neves Abreu
SME Marliéria - Ana Maria Quintão Gomes
SME Santana do Paraíso - Janice Alves da Silva
SME Timóteo – Sirlaine Araújo de Castro
SRE Governador Valadares - Aureliana Manhani Rodrigues

SME Aimorés - Ana Maria de Souza Lemos


SME Alpercata - Lucélia Alves Pereira Amaral
SME Conselheiro Pena - Jackson Viana Luciano
SME Galiléia - Leandra Gonçalves Pereira
SME Governador Valadares - Walice Soares Rodrigues
SME Periquito - Raquel Alves de Morais Brandão
SME Raul Soares - Mariluce da Consolação Morais Rocha
SME Resplendor - Rafaela Xavier Rodrigues
SME Rio Casca - Hérica Martins Andrade
SME Naque - Silvéria Fernandes dos Santoss
SME Tumiritinga - Ricardo Bruno Costa Ribeiro da Silva

SRE Nova Era - Sara Cristina Gomes Andrade Silva


SME Dionísio - Maria Assunção Vieira Castro/Silmara R. Garcia

SRE Ouro Preto - João Paulo de Souza Araújo


SME Mariana - Renato Resende Braga

SRE Ponte Nova -Susana Lúcia do Nascimento

SME Barra Longa – Elaine Aparecida de Sousa Rosa


SME Ponte Nova – Edlaine Aparecida Nogueira dos Santos
SME Raul Soares – Mariluce da Consolação Morais Rocha
SME Rio Casca – Hérica Martins Andrade
SME Rio Doce – Rosângela Moreira de Oliveira
SME Santa Cruz do Escalvado – Kyssila Clara Gomes Lopes
SME São Pedro dos Ferros – Wellington Domingos Gomes
SME Sem Peixe – Joana D’Arc Aparecida Alves do Couto
Curso de Aperfeiçoamento
Mineração, Rompimento da Barragem e Revitalização:
desafios para a Educação

Coordenação
Maria de Fátima Almeida Martins

Coordenação Adjunta
Vanessa Aparecida Cruz

Coordenação Pedagógica
Erica Fernanda Justino

Professores Referência
Adriana Angélida Ferreira
Analise de Jesus Silva
Ana Paula S. Rodrigues
Ana Paula Giavara
Charles Moreira Cunha
Cláudio Scliar
Daniele Souza
Eliano S. M. Freitas
Felipe Sales de Oliveira
Filipe Santos Fernandes
Isabel de Oliveira
Iza Rodrigues
Jacks Richard Paulo
Lais Carolina Bitencourt
Leila de Cássia Faria Alves
Marcelo Donizete
Marco Antônio de Melo Franco
Marina Assis Fonseca
Maria Amália de A. Cunha
Michele Aparecida de Sá
Penha das Dores Silva
Rita Cristina Lima
Sérgio Manuel M. Martins
Shirley Aparecida Miranda
Sônia Roseno
Vanessa Sena Tomaz

Formadores
Antoniel Assis de Oliveira
Ana Paula Silva Freitas
Ana Heloisa e Pires
Glauber Loures de Assis
Gabriel de Souza Santos
Paula Aparecida Diniz Gomides
Valber de Resende Tevira
Rubia da Conceiçãoo Camilo

Colecão Didática Mineração, Rompimento da Barragem e


Revitalização: desafios para a Educação
COLECÃO DIDÁTICA MINERAÇÃO, ROMPIMENTO DA BARRAGEM E REVITALIZAÇÃO:
DESAFIOS PARA A EDUCAÇÃO

Coordenadoras
Maria de Fátima Almeida Martins
Sirleine Brandão de Souza

Comissão Editorial
Erica Fernanda Justino
Luiz Paulo Ribeiro
Marcelo Loures dos Santos
Maria Isabel Antunes-Rocha
Maria de Fátima Almeida Martins
Mariana Esteves da Costa
Marlucy Alves Paraíso
Paula Cristina de Almeida Rodrigues
Sirleine Brandão de Souza

Revisão Textual
Cristhianne Antunes David Oliveira

Diagramação
Iracema Miki Yamada
Laura Maria Almeida Oliveira
Apresentação
Prezado (a) Educador (a)

Apresentamos a você a Coleção Didática Mineração, Rom-


pimento da Barragem e Revitalização: desafios para a Edu-
cação, elaborada para ser utilizada por Formadores, Tuto-
res e Cursistas do Curso de Aperfeiçoamento Mineração,
Rompimento da Barragem e Revitalização: desafios para a
Educação, como uma das ações desenvolvidas no âmbito
do Programa de Formação continuada de educadores da
rede pública dos municípios atingidos pelo rompimento
da Barragem de Fundão em Minas Gerais – Escola da Ba-
cia do Rio Doce – PEBRID
O Programa objetiva construir um processo formativo que
alcance os educadores (professores e gestores) da região
da Bacia do Rio Doce que estão atuando em escolas públi-
cas na Educação Básica, em seus diferentes níveis e mo-
dalidades. A oferta se dará buscando articular a formação
com ações práticas que resultem em projetos visando a
inclusão da temática referente à revitalização da Bacia do
Rio Doce no contexto escolar. Serão ofertados 1 curso de
aperfeiçoamento, 1 curso de especialização e 2 Projetos de
Extensão.

10
O curso de Aperfeiçoamento tem como foco a sala
de aula. A formação é voltada para as educadoras e
os educadores atuantes na educação básica nos mu-
nicípios atingidos pelo rompimento da Barragem de
Fundão. Tem como propósito a formação continua-
da para a construção de Projetos Pedagógicos com-
prometidos com a revitalização das áreas atingidas.
Com carga horária de 240 horas compreende momentos
de alternância e de diferentes modalidades. Os momen-
tos de alternância se referem aos tempos e espaços de
sua realização, seja sob orientação virtual dos Formado-
res/Tutores, denominado Tempo Universidade (TU), seja
em atividades desenvolvidas pelos próprios cursistas, vi-
sando desenvolver ações planejadas no Tempo Escola,
denominado Tempo Escola/ Comunidade (TC). Quanto à
modalidade, a formação se desenvolverá em momentos
de aulas, rodas de conversa, oficinas, seminários e ações
planejadas para as salas de aula, onde lecionam, com a
aplicação do Plano Pedagógico Experimental em sala de
aula a ser produzido durante o processo formativo. Este
Plano envolve a articulação entre as discussões realizadas
durante o processo formativo e a organização de práticas
pedagógicas em sala de aula - Sequência didática; cam-
pos de experiência e outras práticas realizadas no território
relacionadas aos modos de vida. A gestão do curso será

11
construída como uma rede colaborativa envolvendo pon-
tos focais das superintendências Regionais de Ensino e dos
municípios, professores, formadores, tutores e cursistas.
O material didático tem por finalidade se constituir como
mediação no processo de construção dos conhecimentos
e práticas. Os textos desta Coleção são, portanto, um apoio
para que os participantes do curso possam fazer reflexões
sobre como incluir o tema mineração, rompimento e revi-
talização na prática da sala de aula. E vale acrescentar que
será necessário a busca em outras fontes, pois um texto
sozinho não responde a todas as inquietações, sejam elas
de natureza teórica, conceitual e/ou prática.
O material foi elaborado a partir da inter-relação entre
áreas de conhecimento e/ou temas, modalidades e níveis
de ensino. Assim temos como níveis de ensino contempla-
dos: Educação infantil, ensino fundamental, ensino médio.
Como modalidades: educação infantil, educação especial,
educação indígena e quilombola, educação do campo,
educação de jovens e adultos. Como áreas de conheci-
mento e/ou temas: Ciências Sociais e Humanidades, Ciên-
cias da Vida e da Natureza, Linguagem, Artes e Literatura,
Matemática, Tecnologias Educacionais, Mineração, Educa-
ção Socioambiental, Cartografia: Mineração, rompimento
e revitalização, Plano Experimental em Sala de Aula: Se-
quência didática; campos de experiência e outras práticas
pedagógicas em sala de aula.

12
Todo este material elaborado servirá de base para as dis-
cussões distribuídas por módulos. O primeiro módulo - de-
nominado Educação e Mineração e Educação Socioam-
biental – aborda a relação entre a mineração e práticas
minerárias, a educação e o ambiente e as relações políticas,
sociais, econômicas e culturais estabelecidas no tempo e
espaço. O segundo módulo - denominado: Temas especí-
ficos em Educação no contexto da revitalização da Bacia
do Rio Doce – aborda as temáticas específicas das áreas de
conhecimento, níveis e modalidades de ensino e suas rela-
ções com a mineração, o rompimento e a revitalização. E,
por fim, no terceiro módulo denominado Organização do
trabalho pedagógico: articulando a prática mineradora
com as práticas de sala de aula, aborda-se a organização
do trabalho pedagógico: articulando a prática mineradora
com as práticas de sala de aula, destinado à elaboração e
aplicação dos Planos Pedagógicos Experimentais.
Ao pensar em um projeto de formação continuada é im-
portante levar em consideração que esta envolve um con-
junto de dimensões que se entrecruzam no ato educativo.
Demanda, assim, conhecer o sujeito e a realidade sobre a
qual será produzido o conhecimento.
Nesta formação, as ações serão construídas no diálogo
com as populações envolvidas, com um compromisso éti-
co e político assentado nos direitos humanos, com vistas
à ampliação do entendimento acerca do rompimento da
barragem. O objetivo é potencializar, assim, a participação

13
da comunidade nessa compreensão e nas ações voltadas
para o restabelecimento de um outro território sustentado
pelo respeito às vidas e às dinâmicas de seus moradores.
Buscará, então, a produção de um conhecimento acessí-
vel à todas e todos que compõem os territórios atingidos e
participam para sua reconstrução de forma ativa, proble-
matizadora e crítica.
A compreensão e a ação sobre a realidade das áreas atingi-
das pelo rompimento da Barragem de Fundão exige um/a
educador/a que tenha condições teóricas e técnicas para
construir conhecimentos e práticas para organizar um
projeto pedagógico na perspectiva de uma escola contex-
tualizada. Para tanto, necessita de uma formação capaz de
lhe garantir ferramentas conceituais e metodológicas para
sistematizar, analisar e alterar suas formas de trabalho. Afi-
nal, a inclusão do tema mineração na perspectiva da revi-
talização no currículo em ação exigirá estudos que devem
partir da realidade em seus aspectos econômicos, políti-
cos, sociais, culturais e socioespaciais. O currículo em ação
trata-se do conjunto de aprendizagens oportunizadas aos/
às estudantes no ambiente escolar. Aprendizagens que,
para de fato serem significativas e comprometidas, devem
estar articuladas com o contexto em que a escola está in-
serida.

14
Sem dúvida a busca por responder as principais perguntas
que mobilizam essa formação, a saber: em que o rompi-
mento da Barragem do Fundão interroga a Educação?, e
quais os limites e as possibilidades para organizar o fazer
pedagógico na perspectiva da revitalização dos modos
de produzir e reproduzir a vida após o rompimento?, é um
grande desafio. Acreditamos que somente espaços e tem-
pos de diálogo e reflexão compartilhados possam nos au-
xiliar na construção coletiva de respostas e possibilidades
e que o compromisso com os conhecimentos produzidos
no contexto, torna-se relevante, uma vez que sua centra-
lidade demanda refletir acerca do projeto de educação e
de sociedade conectada diretamente com a produção e
comprometimento político.

Bons estudos!

15
1. Apresentação
O que ensinar? Como ensinar? Quais habilidades pri-
vilegiar? Quais atitudes potencializar por meio de pro-
cessos educativos? Como adotar uma prática reflexiva e
crítica sobre a relação sociedade natureza? Como pro-
mover a educação socioambiental? Estas perguntas co-
mumente fazem parte das dúvidas de muitos educadores,
comprometidos com uma formação humana na qual a
cooperação, a empatia, o respeito às diferenças e o respei-
to ao meio ambiente são premissas fundamentais. Algu-
mas dificuldades podem ser associadas a essas questões,
como, por exemplo, a necessidade de que os docentes rea-
lizem um planejamento do ensino que dê conta de toda
essa complexidade de elementos.
O planejamento de ensino sempre se apresentou como
um dos grandes desafios para professoras e professores
na condução de suas práticas educativas. Especialmente
nos contextos trabalhistas brasileiros que envolvem, entre
outras coisas, a:
- Elevada quantidade de turmas e, por consequência, o
grande número de estudantes;
- Atuação em diferentes anos escolares;
- Lotação em mais de uma rede de ensino e em diferen-
tes turnos de trabalho;
- Ausência de um tempo de planejamento coletivo e/ou
individual adequado;
- Escassez de recursos didáticos das escolas;
- Necessidade de preparação dos educandos com vistas
a processos seletivos.
Acrescido a isso, educadores vivenciam também a ne-
cessidade de inserir, em seus planejamentos anuais, os
conhecimentos e as habilidades essenciais indicadas para
cada nível de ensino e área do conhecimento, definidas
pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que segue

16
recebendo críticas contundentes. E, quando se trata da
educação socioambiental, destaca-se entre tais críticas a
ausência de uma delimitação clara desse campo do co-
nhecimento, em detrimento apenas de recomendações
aos sistemas e redes de ensino para que incorporem em
seus currículos e propostas pedagógicas a abordagem dos
temas que afetam a vida humana em diferentes escalas.
Nesse panorama, evidencia-se no plano experimental
da sala de aula a importância da Sequência Didática (SD),
também chamada de Sequência de Ensino (SE), ou ainda,
Sequência de Aprendizagem (SA), compreendida como
uma das estratégias docentes que auxilia professores e
professoras na organização do seu planejamento de en-
sino, ajudando-o a sistematizar os conteúdos a serem tra-
balhados e os recursos adequados para a sua implemen-
tação.
Nas últimas décadas, os textos que referenciam e reco-
mendam a utilização de sequências didáticas têm assumi-
do centralidade em cursos de formação, aperfeiçoamento
e especialização docente. Assim, partindo do resgate de
referenciais teóricos e práticos já existentes, o presente
texto tem como objetivo apresentar diretrizes e orienta-
ções iniciais àqueles que aderirem ao curso de Aperfeiçoa-
mento “Mineração, rompimento da Barragem e revita-
lização: Desafios para a educação Escola do Rio Doce”,
com vistas à elaboração de Sequências Didáticas, que po-
tencializem a reflexão sobre a temática da mineração. So-
bretudo nos municípios dos estados de Minas Gerais e Es-
pírito Santo, atingidos pelo rompimento da Barragem de
Fundão, localizada em Mariana – MG, cujos impactos são
vivenciados ao longo de toda a bacia do Rio Doce.
Além de apresentar um percurso básico para a criação
de Sequências Didáticas, denominadas a partir desse mo-
mento somente pelas siglas – SD para o singular e SDs para
o plural – este material pretende indicar materiais de refe-
rências, assim como privilegiar diferentes abordagens que

17
podem ser utilizadas em atividades a serem elaboradas,
indo além da simples descrição do que vem a ser as dife-
rentes etapas desse tipo de sequência pedagógica. Para
tanto, não será privilegiada uma área do conhecimento,
ou um campo disciplinar específico, mas um conjunto di-
versificado de repertórios didáticos, indicados como possí-
veis exemplos para cada uma das fases de planejamento
de uma SD.
Tendo em vista essa opção, ou seja, de apresentar exem-
plos de áreas diversas e campos disciplinares distintos, é
importante ressaltar que a indicação de habilidades por
disciplinas curriculares, segundo as orientações contidas
na BNCC, é uma tarefa impraticável no contexto deste tex-
to, uma vez que para isso são necessários, tanto o domí-
nio, quanto a incursão verticalizada em conteúdos muito
particulares. Disso resulta um primeiro desafio, prezado
professor e prezada professora que iniciam esta leitura, a
saber:

Levantar para sua área de conhecimento e campo


disciplinar, habilidades que podem ser desenvolvidas
por meio das atividades que serão apresentadas, a partir
da consulta a Base Nacional Comum Curricular (BNCC)...

Esperamos que, ao final da leitura e reflexão proposta


para este Eixo Integrador, denominado “Plano Experimen-
tal em Sala de Aula: Sequência didática e outras práticas
pedagógicas”, vocês sejam capazes de:

Em outras palavras

Conhecer referenciais teóricos básicos que contribuem


para a elaboração de uma SD;
Elaborar uma SD que contemple a temática da minera-
ção, seus impactos socioambientais e a revitalização da
bacia do Rio Doce;
Contemplar em seu planejamento de ensino a dimen-
são prática da SD;
18
Conhecer exemplos de atividades que podem ser reali-
zadas em diferentes etapas de uma SD;

Desejamos que o diálogo aqui iniciado represente o iní-


cio de uma construção coletiva e significativa para todos
os envolvidos nesse curso.
Com os melhores cumprimentos...

2. SD E O PLANEJAMENTO DE
ENSINO
Uma busca rápida dos textos acadêmicos sobre SDs,
abrigados nos repositórios bibliográficos das universida-
des e/ou na internet, de um modo mais genérico, permite
ao leitor encontrar um grande acervo de produções. Essas
se dividem entre aquelas que se detém em:
- Aspectos mais amplos, relacionados aos formatos e
etapas de desenvolvimento de SDs, baseados na revisão e
indicação de suportes teóricos;
- Aspectos mais específicos, com destaque para o deta-
lhamento de SDs, realizadas por educadores de diferentes
áreas de conhecimento e campos disciplinares.

Prezado professor e prezada professora,


Faça uma pesquisa na internet e localize entre as pro-
duções encontradas aquelas que correspondem a sua
disciplina, ou área de atuação...

Como ponto de partida, avaliamos como essencial a de-


finição do termo SD, na perspectiva de dois autores, cujos
textos podem ser tomados como referência desta temáti-
ca, Antoni Zabala (1998) e Orlando Gomes de Aguiar Júnior
(2005). Para muito além de uma mera perspectiva instru-

19
mental, suas produções destacam-se pelo modo didático
com que apresentam a elaboração pedagógica de uma
SD e, portanto, comparecem recorrentemente nos cursos
voltados para a formação de professores.

Segundo Antoni Zabala, educador espanhol e referên-


cia internacional em pedagogia, uma SD:
“É um conjunto de atividades articuladas entre si, que
permitem ao estudante refletir sobre os conteúdos,
elaborar hipóteses, confirmá-las ou refutá-las grada-
tivamente, conseguindo, por meio do desenvolvimento
de habilidades, sistematizar os conteúdos abordados”
(ZABALA, 1998, p.18).

De modo semelhante, Aguiar Júnior, pesquisador no


campo da Educação em Ciências e Física, define as Se-
quências de Ensino, como:
“Um conjunto organizado e coerente de atividades,
abrangendo um certo número de aulas, com conteú-
dos relacionados entre si” (AGUIAR JÚNIOR, 2005, p.24).
Seu texto auxilia na compreensão de que a proposição
de uma sequência de ações em um planejamento do
ensino contribui com a organização do trabalho e define
suas intenções, mesmo que no decorrer dessa ação seja
preciso alterar algo.

Sensações desagradáveis relacionadas às imprevisibi-


lidades dos processos educativos podem ser apontadas
como causas de adoecimento docente e refletem-se em:
aflição nas vésperas das aulas, inatividade perante situa-
ções adversas do cotidiano escolar, constrangimento re-
lacionado ao dimensionamento inadequado dos tempos
educativos etc. Longe de cercar todas as incertezas ine-
rentes ao fazer pedagógico, o planejamento do ensino1
1 O PDP – Programa de Desenvolvimento Profissional de Educadores, foi desenvolvido
pela Secretaria Estadual de Educação de Minas Gerais, em 2005. Fazia parte deste pro-
grama o Projeto Escolas-Referência, que dedicou o seu segundo módulo de estudos

20
indica princípios, orienta escolhas e potencializa a reflexão
docente sobre a própria prática.
Esse pode ser compreendido a partir de diferentes ní-
veis, indo desde o mais abrangente, relacionado ao pla-
nejamento do currículo, passando pelo nível do planeja-
mento de um tópico de conteúdo, e chegando ao mais
específico, como o planejamento de uma aula. Localizada
na esfera do planejamento dos tópicos de conteúdo, a SD
desdobra-se em aulas, cujo planejamento detalhado tam-
bém é imprescindível. Sendo assim, o planejamento didá-
tico contribui com a organização e êxito do processo de
ensino, favorecendo também a saúde do trabalhador da
educação, que enfrenta todas as adversidades que foram
pontuadas na apresentação deste texto.
Com base no material indicado no destaque anterior,
tomaremos diversas orientações pedagógicas para este
texto, dentre as quais a proposta de organização de uma
SD por meio do planejamento de quatro fases: Problema-
tização inicial, Desenvolvimento da narrativa do ensino,
Aplicação dos novos conhecimentos e Reflexão sobre o
que foi aprendido (AGUIAR JÚNIOR, 2005, p.25). Tais fases
correspondem aos diferentes momentos do processo de
construção do conhecimento na sala de aula e, contrarian-
do a nomenclatura que se vale da palavra sequência para
designar esse tipo de planejamento, não significa que
devem ser desenvolvidas de modo sequencial, podendo
apresentar sobreposições e alternâncias.
Antes de passarmos à apresentação de cada uma das
fases da SD e seus desdobramentos em temáticas que
dialogam com a motivação central deste curso de Aper-
feiçoamento é importante refletir de modo geral sobre os
ao tema do Planejamento do Ensino, de autoria de Aguiar Júnior. Este texto contém
importantes orientações que auxiliam na produção de Sequências de Ensino (SE). Pro-
cure entre os docentes da sua cidade professoras e professores que tiveram acesso a
essa formação e saiba mais sobre a mesma. Apesar do tempo decorrido desde a sua
publicação, esse material é uma fonte importante e pode lhe ajudar muito na tarefa de
produção de uma SD. Nas referências bibliográficas encontra-se um link de acesso a
essa produção.

21
objetivos do processo de ensino que procura responder as
indagações: O que ensinar? Como ensinar? Para que en-
sinar? A própria organização e exposição dos objetivos de
aprendizagem impõe a necessidade de se responder a es-
tas questões e, muitas vezes, se estruturam a partir desta
tríade, pois apresentam um verbo enunciador das habili-
dades que se pretende desenvolver + a ação pedagógica +
o resultado esperado, como nos exemplos a seguir: Iden-
tificar um acidente ampliado de trabalho por meio de
estudo de caso do rompimento da Barragem de Fundão
– Mariana (MG), indicando suas características; Com-
preender as consequências de acidentes ampliados de
trabalho envolvendo a atividade mineradora por meio
da análise de relatos orais, valorizando os saberes locais.
Desse modo, cada texto de referência das áreas de co-
nhecimento e/ou dos eixos integradores que compõem
o material deste curso, oferece uma valiosa colaboração
acerca dos seus modos particulares de organização do
processo pedagógico e estabelecimento dos objetivos es-
senciais para a aprendizagem.
Ainda vale destacar que a SD pode ser utilizada como
referencial para a efetivação do planejamento pedagógi-
co em diferentes anos escolares do Ensino Fundamen-
tal e Médio. Porém, no contexto desse curso de Aperfei-
çoamento, no qual diversas modalidades de ensino2 são
contempladas, como por exemplo, a Educação Infantil, a
Educação Especial, a Educação Indígena e Quilombola,
2 A Educação Indígena se vale, entre outros formatos, da realização do Calendário So-
cionatural ou Socioambiental, como suporte para a organização das ações educativas.
Através deste calendário, são levantados marcos sociais e naturais das comunidades
indígenas, a partir dos quais são extraídos elementos que dão origem aos conteúdos
pedagógicos, articulando o conhecimento tradicional e a ciência.
Os Campos de Experiência, definidos para a Educação Infantil, estão organizados de for-
ma a apoiar professores e professoras no planejamento de sua prática e indicam quais
experiências são fundamentais para que as crianças aprendam e se desenvolvam.
O trabalho pedagógico estruturado em torno dos Temas Geradores, que tanto orien-
ta práticas na Educação do Campo, quanto na Educação de Jovens, Adultos e Idosos,
também constitui um formato de organização do processo de ensino. Nesses casos, em
especial, passíveis de organização a partir de um conjunto de atividades alinhadas, que
também caracteriza a SD.

22
a Educação do campo, a Educação de Jovens, Adultos e
Idosos, é necessário estar atento para os tipos de planeja-
mento e especificidades pertinentes a estas modalidades
e áreas correlatas. Recomendamos que professores e pro-
fessoras que atuam em algumas dessas modalidades de
ensino considerem outros formatos para o planejamento
da sua prática e que recorra aos seus textos de referência,
bem como se apropriem das orientações didáticas aqui
realizadas sempre que possível.
Atrelado à indicação dos objetivos da aprendizagem
podemos assinalar a reflexão quanto a necessidade de le-
vantamento dos conhecimentos prévios dos estudantes,
como requisito fundamental ao planejamento de um tó-
pico de conteúdo a partir de uma SD. Os conhecimentos
prévios dos estudantes, ora alinhados com o conhecimen-
to a ser ensinado, ora em desalinho com o mesmo, podem
ser acessados por meio da análise de avaliações iniciais,
que muitas vezes são chamadas de diagnósticos. Cada
professor e professora também agrega ao levantamen-
to das demandas de aprendizagem dos estudantes uma
experiência empírica adquirida ao longo da sua prática
docente, que não deve ser menosprezada. Pesquisas em
ensino, igualmente, são fortes aliadas nesse sentido, pois
sistematizam o pensamento de crianças e adolescentes
acerca dos conteúdos escolares.
“A questão dos objetivos de aprendizagem pode ser
colocada em termos das diferenças entre o que os es-
tudantes já sabem sobre determinado tema e o que
gostaríamos que eles passassem a saber depois do
ensino. Essa diferença entre os conhecimentos prévi-
os dos estudantes e os conhecimentos da ciência (ou
das artes) que nos propomos a ensinar é o que nos dá
condições de estabelecer metas para o ensino” (AGU-
IAR JÚNIOR, 2005, p.24).

Além das demandas de aprendizagem, que se relacio-

23
nam aos tópicos de conteúdos disciplinares, avaliamos
que pautas socioambientais decorrentes da imposição
dos graves acidentes de trabalho, envolvendo os desastres
dos rompimentos de barragens de mineração no Brasil,
devem fazer parte dos objetivos de aprendizagem dos pla-
nejamentos de ensino de professores e professoras com-
prometidos com a formação humana, cidadã e em defesa
da vida.

Saiba mais

Sobre a produção de SD, confira também o artigo:


ARAÚJO, Denise Lino de. O que é (e como faz) sequência
didática? Entrepalavras, Fortaleza, ano 3, v.3, n.1, p. 322-
334, jan/jul 2013. Disponível em:

Com o objetivo de estabelecer algumas sínteses quanto


ao modo de organização de uma SD apresentamos a se-
guir três quadros com orientações sobre: as fases de uma
SD; os itens necessários à sua elaboração; sugestões de es-
tratégias didáticas que podem ser utilizadas nas suas dife-
rentes etapas.
O quadro a seguir (QUADRO 1) apresenta as fases de
uma Sequência de Ensino (SE), sistematizada a partir da
proposição de Aguiar Júnior (2005), que assim denomina
esse nível de planejamento do ensino. Lembrando que a
terminologia Sequência de Ensino (SE), também é usada
para designar uma SD.

24
QUADRO I
FASES DA SEQUÊNCIA DIDÁTICA
FASES CARACTERIZAÇÃO

Momento voltado para o envolvimento dos estu-


dantes com o tema proposto, por meio da explo-
Problematização inicial ração de suas visões, conhecimentos prévios e in-
teresses;

Momento em que o professor e professora dispo-


Desenvolvimento de nibiliza as ideias e conceitos da ciência e/ou das
Narrativa artes no plano da sala de aula;

Momento caracterizado por possibilitar aos es-


tudantes aplicarem as ideias apreendidas a uma
variedade de contextos, com maior controle e res-
Aplicação/elaboração de ponsabilidade pelo seu uso. Deve proporcionar aos
novos conhecimentos estudantes oportunidades de expressar e pensar
com as novas ideias e conceitos, em pequenos
grupos e por meio de atividades com a toda a clas-
se;

Momento dedicado a sistematização, generali-


zação e formalização dos conceitos apreendidos.
Reflexão sobre o que foi Sob a orientação do professor, esse momento de
apreendido síntese favorece a reflexão dos estudantes sobre
aquilo que já foi aprendido e a elaboração de suas
conclusões.

Fonte: AGUIAR JÚNIOR, Orlando Gomes. O planejamento do ensino. Belo Hori-


zonte: Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE – MG), 2005. p.25.
– Adaptado.

Ao planejar uma SD professores e professoras devem es-


tar atentos para os itens indicados no quadro abaixo (QUA-
DRO 2), cuidando para que contemple as orientações con-
tidas na sua descrição.

25
QUADRO II

ROTEIRO DOS ITENS NECESSÁRIOS NA


ELABORAÇÃO DE UMA SD

ITENS DESCRIÇÃO

O título deve expressar a temática e fornecer uma


Título porta de entrada para a sua compreensão;

Área de conhecimento e Indicação da(s) área(s) de conhecimento e discipli-


disciplinas na(s) envolvidas;

Indicação dos nomes e contatos (telefone, e-mail)


dos responsáveis: professores, coordenadores pe-
Equipe
dagógicos, parceiros institucionais, lideranças co-
munitárias e etc.;

Consiste na apresentação do contexto em que será


utilizada (região, cidade, escola, rede de ensino, co-
munidade e etc.), sua temática, sua importância,
Contextualização
conhecimentos prévios dos estudantes sobre o
tema (levantados em pesquisas e outros momen-
tos avaliativos) e principais conceitos explorados;

Compreende os objetivos conceituais, atitudinais


e procedimentais, com destaque para a apresen-
tação das expectativas quanto aquilo que os estu-
dantes serão capazes de realizar após a sua con-
clusão. Recomenda-se a descrição dos objetivos
a partir da tríade: verbo enunciador habilidade +
Objetivos ação pedagógica + resultado esperado.
EXEMPLO: Após a realização da SD, tem-se a ex-
pectativa que os alunos e alunas sejam capazes de:
- Identificar um acidente ampliado de trabalho
por meio de estudo de caso do rompimento da
Barragem de Fundão – Mariana (MG), indicando
suas características;

Lista das habilidades da Base Nacional Comum


Habilidades
Curricular (BNCC);

Conteúdos Lista dos conteúdos trabalhados;

Nível Ensino/Ano escolar Indicação do nível de ensino, ano escolar ou série;

O tempo previsto pode ser detalhado através do


quantitativo de horas-aula que serão destinadas
Tempo previsto
para o desenvolvimento de todo o processo de en-
sino;

26
Levantamento dos materiais e recursos necessá-
Previsão de materiais e rios para a sua realização (tecnológicos, humanos,
recursos estruturais, etc.);

Detalhamento das fases da sequência didática,


desdobradas em aulas, com o apontamento das
Desenvolvimento atividades a serem realizadas, a descrição dos re-
cursos que serão empregados em cada momento
etc.;

Descrição do processo de avaliação, que deve ser


Avaliação contínuo e processual, além de atrelado, entre ou-
tras coisas, aos objetivos propostos;

As referências podem ser divididas em dois tipos.


Para o professor e professora, contendo a lista de
referências teóricas e práticas que foram utilizadas.
Referências Para os estudantes, indicando as referências reco-
mendadas durante a sequência e outras sugestões
para aprofundamento dos conteúdos e/ou concei-
tos abordados.

Fonte: Curso de Especialização em tecnologias Digitais e Educação 3.0, ofertado


pelo Centro Pedagógico (CP), Escola de Educação Básica e Profissional da Univer-
sidade Federal de Minas Gerais (UFMG) 2021 – Adaptado a partir da atuação neste
curso como orientadora de Trabalho de Conclusão do Curso (TCC).

A prática docente conta com um leque de repertórios


muito diversificado. Chamadas aqui de estratégias didáti-
cas, as atividades que compõem o quadro a seguir (QUA-
DRO 3), são apenas alguns dos exemplos daquilo que pode
ser realizado e não se esgota na listagem sistematizada e
nem se limita exclusivamente a cada uma das fases a qual
foi associada.

Prezado professor e prezada professora,


Acrescente ao repertório de estratégias didáticas apre-
sentadas em seguida, aquelas que muito particular-
mente você já realizou e que conta com a sua bagagem
e conhecimentos práticos que construiu ao longo de sua
vida...

27
QUADRO III

ESTRATÉGIAS DIDÁTICAS QUE PODEM SER UTILIZADAS EM


DIFERENTES FASES DE UMA SEQUÊNCIA DE ENSINO

ETAPAS EXEMPLOS

Levantamento de ideias/“tempestade de ideias”


– questionários – desafios – nuvens de palavras –
enquetes/questões problematizadoras – análise
de imagens diversas: fotografias, charges, cartuns,
Contextualização pinturas, histórias em quadrinhos – vivências cul-
turais – produção de desenhos – debates – traba-
lhos de campo – exibição de filmes, curtas metra-
gens, animações – entrevistas – análise de poesia,
música, depoimentos, contos, romances...

Aulas expositivas dialogadas – estudo de caso –


análise de imagens diversas: fotografias, charges,
cartuns, pinturas, histórias em quadrinhos – entre-
Desenvolvimento de vista – trabalhos de campo – análise de filmes, cur-
Narrativa tas metragens e animações – pesquisa – mapea-
mentos diversos – palestras – jogos – produção de
maquetes – produção de jogos scratch – produção
de jogos de tabuleiro ...

Júri simulado – estudo de caso – mapa conceitual


– pesquisa – mapeamentos diversos – produção de
Aplicação/elaboração de maquetes – produções artísticas – produção de
novos conhecimentos textos colaborativos on-line – criação de protóti-
pos – robótica livre (Arduino) – objetos virtuais de
aprendizagem – jogos on-line...

Produção de peças teatrais – confecção de carta-


zes – confecção de mural – júri simulado – produ-
ção de registros escritos de diferentes formatos
– criação de apresentações por meio de diversas
ferramentas: Power Point, Canva Education, Li-
breOffice – elaboração de mapa conceitual – apre-
sentação de trabalhos individuais e em grupo
Reflexão sobre o que foi
– produção de vídeos – produção de charges, car-
apreendido
tuns, desenhos, histórias em quadrinhos – mostras
culturais – feiras temáticas – mapeamentos diver-
sos – produções artísticas – produção de publica-
ções digitais on-line: revista, jornal, histórias em
quadrinhos, e-book, manual, almanaque – produ-
ção de podcast, lives e webnários – produção de
animações – produção de storytelling...

Fonte: FERREIRA, Adriana Angélica (2022).

28
Realizado esse percurso mais próximo das discussões
teóricas que auxiliam o entendimento sobre o planeja-
mento do ensino e o desenvolvimento de SDs, a próxima
parte deste texto dedica-se ao detalhamento de suas fa-
ses, com a indicação de exemplos práticos, que foram cha-
mados de propostas ilustrativas. A opção escolhida foi a
de apresentar para cada uma das quatro fases da SD um
conjunto de atividades ao invés de uma única sequência
encadeada de modo linear. Para cada atividade são suge-
ridos: o nível de ensino, os anos escolares (quando possí-
vel) e as disciplinas envolvidas, de acordo com os princi-
pais conteúdos abordados, sem excluir a possibilidade de
inserção de outras matérias do currículo. As atividades não
foram divididas em aulas, pois entendemos que essa de-
finição sofre influência de diversos fatores atrelados à di-
visão específica dos tempos escolares nas diferentes insti-
tuições de ensino.
Prezado professor e prezada professora,
Procure articular as atividades apresentadas para cada
fase, planejando as atividades necessárias as outras
etapas que não foram contempladas. Por exemplo, a
partir das atividades problematizadoras indicadas, como
você daria sequência a essa SD...
Antes de passar ao próximo segmento do texto vale a
pena recuperar algumas ideias que foram exploradas e in-
dicar outras características essenciais das SDs.
Para refletir

Como qualquer planejamento de ensino são abertas a


alterações e não podem ser encaradas como camisas de
força;
Comportam diferentes aulas e diversificadas atividades,
cujo planejamento também é indispensável;
Devem estar abertas as singularidades no processo de
ensino, respeitando os ritmos diferenciados de aquisição
do conhecimento;

29
Devem favorecer a exploração de gêneros textuais diver-
sificados a partir de suas funções sóciocomunicativas;
Levam em consideração os conhecimentos prévios dos
estudantes, valorizando aquilo que é significativo;
Possibilitam e favorecem a integração de vários campos
disciplinares e áreas do conhecimento;
Potencializam a elaboração autoral dos educadores e o
trabalho colaborativo;
Devem ofertar formas diferenciadas de resolução de
problemas, de estratégias, de procedimentos comple-
mentares aqueles que são comuns no cotidiano escolar;
Valorizam os contextos individuais, datas importantes, a
cultura, os atores locais e os espaços de vivência dos es-
tudantes;
Devem contemplar objetivos conceituais, procedimen-
tais e atitudinais articulando-os harmoniosamente.
Acrescente a essa breve definição a sua contribuição
pessoal...

3.1 PROBLEMATIZAÇÃO INICIAL


Partindo da compreensão de que o momento de pro-
blematização inicial de uma SD dedica-se ao engajamen-
to dos estudantes com o tema a ser trabalhado, algumas
escolhas podem ser indicadas no trabalho abrangendo a
mineração, o rompimento de suas barragens de rejeitos,
os impactos desse tipo de desastre ambiental e a revitali-
zação das áreas degradadas. A problematização em torno
dessas questões, no entanto, não deve ocorrer apenas nas
aulas de abertura da SD, mas seguir orientando outras fa-
ses, sempre na intenção de envolver os estudantes.
Tomemos como ponto de partida uma apreensão sobre
as questões problematizadoras no âmbito da discussão
acerca da experiência.
Como defende Jorge Larrosa, a experiência não é algo
que passa, acontece ou toca, mas “o que nos passa, o que
nos acontece, o que nos toca” (2002, p. 21). Podemos en-
30
contrar no sujeito da experiência alguém que é formado
e transformado pelo que lhe acomete. Alguém que está
aberto à sua própria transformação (LARROSA, 2002,
p.25). Desse modo, pode-se dizer que estudantes e seus
familiares, atingidos pelos impactos causados pelos rejei-
tos minerais originárias do rompimento da Barragem de
Fundão3, localizada em Mariana – MG, de propriedade e
responsabilidade legal da mineradora Samarco/ controla-
das pelas mineradoras Vale S.A. e BHP Billiton, foram to-
cados por uma verdadeira experiência.
Os sentidos atribuídos a essa experiência, que é indivi-
dual, podem ser cartografados4 e seguem uma trilha que
contempla desde aqueles que viviam nas proximidades
da barragem rompida até os que moram perto da foz do
Rio Doce, cuja bacia hidrográfica foi altamente afetada.

Saiba mais

Consulte os textos de apoio dos seguintes Eixos Integradores para uma maior funda-
mentação e planejamento de suas atividades:
3. Eixo Integrador: Mineração e práticas minerárias; Texto: Reflexões sobre a mine-
ração de ferro no quadrilátero ferrífero, rompimento da Barragem do Fundão e im-
pactos no vale do Rio Doce, Minas Gerais; Autor: Claudio Scliar; Dedicado a análise da
história social, política e econômica da extração do minério de ferro no Quadrilátero
Ferrífero e suas consequências.
4. Eixo Integrador: Cartografia; Texto: A cartografia para refletir sobre a mineração,
rompimento e revitalização na bacia do Rio Doce no trabalho pedagógico; Autora:
Daniele Cristina de Souza. Orienta quanto a importância da inventariação de práti-
cas que tematizem esse acidente de trabalho ampliado e suas consequências para
aqueles que fazem parte da bacia do Rio Doce.

Assim, revisitar o vivido, aquilo que chegou às “retinas


fatigadas” pela imagem desses rejeitos parece indispensá-
vel, quando se trata da problematização de ações educa-
tivas que pretendem dar centralidade a essa experiência.
Diversificadas estratégias podem ser usadas para isso.
Todas as opções apresentadas a seguir viabilizam-se a
partir do levantamento dos conhecimentos prévios dos
estudantes sobre o tema e lançam mão de alguns su-
portes e ações pedagógicas, tais como: apontamento de
questões problematizadoras; encaminhamento de roteiro
de pesquisa; análise da letra de uma canção; análise das

31
fotografias da geógrafa Luciana Dias Gontijo, realizadas
em Paracatu de Baixo, subdistrito de Mariana – MG, após
o rompimento da barragem; análise de fotografias que re-
tratam a chegada da lama ao mar. É importante lembrar,
que sempre cabe ao professor e professora avaliarem qual
atividade educativa é mais adequada aos seus estudan-
tes, tendo em vista o seu grau de dificuldade, as condições
materiais disponíveis para a sua efetivação, a linguagem
empregada, entre outros aspectos. Portanto, as propostas
socializadas indicam apenas orientações básicas, ilustrati-
vas, endereçadas aos educadores e não estão formatadas
para serem adotadas sem um tratamento final. Tratam-se
de exemplos de estratégias didáticas que podem ser utili-
zadas integralmente ou em pequenas partes, ao longo da
primeira fase de uma SD.

1ª Proposta Ilustrativa:

Ensino Médio Todas as disciplinas do Currículo

A) Pergunte aos seus alunos e alunas quantos anos eles


tinham em novembro de 2015, quando a lama com rejei-
tos da mineração da Barragem de Fundão em Mariana
– MG deflagrou sua jornada rumo ao mar e como viven-
ciaram esse acidente. Oriente-os a registrar suas expe-
riências a partir de diversos gêneros textuais. Sendo pos-
sível, procure incentivá-los por meio da criação de uma
sala de aula virtual no Google Classroom/Google Sala de
Aula, uma ferramenta digital gratuita5, na qual possam
compartilhar suas narrativas. Em seguida, promova mo-
mentos de socialização dessas narrativas, acolhendo-as e
fazendo uma síntese do que foi socializado. A partir dessa
sistematização encaminhe pontos de aproximação com
a sua disciplina. Coloque-se no debate como alguém que
de alguma maneira também foi alcançado por essa expe-

32
riência, como um cidadão brasileiro.
5. Antes de pensar na utilização de ferramentas digitais, professores e professoras
devem se atentar para quais habilidades desejam que os estudantes desenvolvam.
Assim, as ferramentas digitais devem ser encaradas como auxiliares na execução das
atividades e não adquirir o foco central. Trazer para a centralidade essas ferramentas,
entre outros problemas, atribui um caráter excludente para as propostas didáticas,
especialmente quando ainda existem impossibilidades quanto a sua utilização por
parte de muitos alunos e alunas.
Diversas são as ferramentas digitais disponíveis gratuitamente para professores e es-
tudantes, que facilitam os processos pedagógicos e atendem da mesma forma que
as ferramentas proprietárias, acessíveis somente mediante pagamento.
O Moodle é uma ferramenta poderosa, porém, depende da hospedagem em um
servidor e sua implementação é complexa, o que torna complexa a sua utilização
enquanto um Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA). Ferramentas mais simples,
gratuitas, com curva de aprendizagem rápida e cujo acesso realiza-se a partir de
qualquer lugar com internet, já podem ser encontradas.
Nesse sentido, o Google Classroom / Google Sala de Aula está disponível para qual-
quer professor que tenha um @gmail. Além de ser muito intuitivo, possui centenas
de tutoriais no YouTube que explicam seu funcionamento. Veja algumas caraterísti-
cas dessa ferramenta:

O Google Sala de aula permite a criação de turmas, nas quais professores e professo-
ras podem criar atividades individuais e coletivas em tempo real, postar vídeos (bas-
tando para isso indicar o link da internet), imagens, textos, apresentações, planilhas
e etc. As atividades ali postadas podem ser realizadas de modo colaborativo. Estu-
dantes também podem postar suas produções nessa sala virtual, compartilhando-as
com o professor e com os colegas.
Outra ferramenta interessante é a plataforma de design gráfico chamada Canva, to-
talmente online e gratuita, repleta de templates que permitem a criação de: apre-
sentações, vídeos, livros, folhetos, panfletos, jornais, mapas mentais e outros modelos
de conteúdo para inserção nas redes sociais. O Canva ainda possibilita aos professo-
res a criação de uma conta educacional, que vai permitir a criação de turmas, seme-
lhante ao Google Classroom. As produções criadas por meio dessa ferramenta digital
podem se tornar uma publicação online, gratuita, hospedada em sites como o Issuu
e Flipsnack, com divulgação de links, que facilitam o acesso de leitores.

33
Ensino Fundamental
Todas as disciplinas do Currículo
Anos iniciais

B) Oriente os estudantes a realizar uma pesquisa com


seus familiares e/ou vizinhos, destinada a recolher im-
pressões sobre o que ficou nas memórias dessas pessoas
acerca do dia de rompimento da Barragem de Fundão
em Mariana – MG e dos meses que se seguiram, com base
em um roteiro básico:
• Você e sua família foram atingidos de alguma ma-
neira pelas atividades da mineração praticada na região
onde mora? Como?
• Atualmente você identifica as consequências do
rompimento da Barragem de Fundão em sua comunida-
de?

Promova momentos de socialização do resultado das


entrevistas, acolhendo-as e registrando no quadro uma
síntese do que foi socializado. A partir dessa sistematiza-
ção encaminhe pontos de aproximação com a sua disci-
plina.

Ensino Fundamental
Todas as disciplinas do Currículo
Anos finais

C) Apresente aos estudantes a música “Vão”6, de Luiz Ta-


tit e Dante Ozzetti, escutan-
do-a quantas vezes for ne- 6. Vão
(Dante Ozzetti / Luiz Tatit)
cessário. Destaque trechos
importantes da sua letra Toda lama escorre pelo chão
Vira mancha vira poluição
e, em seguida, encaminhe Picha todos cria um mundo-cão
Passa tudo na televisão
questões problematizado- Entra pelos poros da nação
ras que levem os estudan- Todo ciclo acaba e esse não, esse não...
tes a refletir sobre a circu- Fonte: TATIT, Luiz. Disponível em: http://
lação das imagens desse luiztatit.com.br/composicoes/composi-
cao?id=9/V%C3%A3o.html Acesso em: 15
abr. 2022.

34
acidente de trabalho ampliado, que foram veiculadas na
televisão e as quais tiveram acesso. Alguns exemplos des-
se tipo de questões problematizadoras são:

• Você já viu alguma imagem do rompimento da


Barragem de Fundão de Mariana – MG e o que sentiu ao
visualizá-las?
• Pesquise imagens que retratam esse desastre e
suas consequências para o ambiente e para as pessoas
envolvidas, ao longo da bacia do Rio Doce.
• Partindo do modo como os telejornais apresentam
os eventos ocorridos no país, procure imaginar o dia em
que as imagens dessa lama entraram nos lares da nação
brasileira. Você se lembra da reação das pessoas com as
quais você convive perante esse acontecimento? Qual
reação você acredita que muitos telespectadores apre-
sentaram? Você avalia que todos que viram essas ima-
gens tiveram a mesma reação que as pessoas diretamen-
te envolvidas?
• Você e sua família foram atingidos por essa lama?
Como?

Promova momentos de socialização do resultado das


discussões, acolhendo-as e realizando uma síntese do
que foi socializado. A partir dessa sistematização, encami-
nhe pontos de aproximação com a sua disciplina.

Ensino Fundamental
Todas as disciplinas do Currículo
e Ensino Médio

D) Apresente para seus alunos e alunas as fotografias


abaixo. Faça uso de um data show para exibi-las, caso te-
nha disponível esse recurso. Não sendo possível a exibi-
ção, opte pela impressão das imagens para cada um dos
estudantes, ou em um tamanho que permita a aprecia-

35
ção de todos. A qualidade dos recursos não pode ser me-
nosprezada. Imagens ruins ou pequenas demais, dificul-
tam a entrega dos estudantes ao objeto de estudo. Afinal,
não pontuamos que a experiência se viabiliza por aquilo
que nos toca! Assim, a visão não seria por excelência um
dos sentidos essenciais a essa experiência? Além disso, é
preciso ter em mente que alunas e alunos com baixa vi-
são são comuns em nossas escolas e que incluir esses es-
tudantes também é um compromisso educativo.
As fotografias compartilhadas podem ser substituídas
por registros pessoais, ou por imagens e vídeos7 encon-
tradas nas diferentes cidades da bacia do Rio Doce, uma
vez que esse acidente foi fartamente documentado ima-
geticamente. Para além das imagens que apresentam o
Subdistrito de Paracatu de Baixo, fotografias que retratam
outros trechos da bacia do Rio Doce e do local de chega-
da da lama no mar, também podem ser enfatizadas.

Fonte: GONTIJO, Luciana Dias. Paracatu de Baixo, subdistrito de Mariana – MG. Arquivo
pessoal, 2015. Cedido pela autora.

7. FERREIRA, Bárbara. Um adeus ao Rio Doce. Portal O tempo. Disponível em: https://
www.otempo.com.br/polopoly_fs/1.1180473.1449081357!/index.html
Acesso em: 15 fev. 2022.
36
Explore o sentimento dos estudantes em relação às
imagens apresentadas, solicitando uma produção escrita,
uma reflexão oral, um desenho, uma poesia, entre outras
possibilidades, que retrate questões como as indicadas a
seguir:
• Você consegue identificar o que aconteceu com o
local onde essas fotografias foram tiradas?
• Quais sensações e sentimentos você experimentou
ao visualizar estas imagens?
* Auxilie os estudantes quanto à dife-
renciação dos conceitos de sensações e senti-
mentos. O primeiro, por definição, refere-se aos
fenômenos relacionados às reações corporais,
causadas por um estímulo e o segundo relacio-
nado às experiências subjetivas e individuais.
• O que mais lhe chamou a atenção nas imagens?
• Quais cores predominam nas cenas retratadas?
• Em algum momento da sua vida você viu essas co-
res predominando em algum local da sua comunidade?
Descreva esse momento e as suas percepções sobre ele.

Promova momentos de socialização do resultado das


discussões, acolhendo-as e realizando uma síntese do
que foi socializado. A partir dessa sistematização, encami-
nhe pontos de aproximação com a sua disciplina.
E) Os rios correm para o mar! Viver às margens de um
rio ou à beira do mar permite entregas ao ambiente e
apropriações diferenciadas por parte dos estudantes, até
mesmo levando-se em consideração a sua faixa etária.
Meninos e meninas de rio. Meninos e Meninas de mar. Jo-
vens ribeirinhos. Jovens caiçaras. Jovens Surfistas. Jovens
banhistas de rio e de mar. Filhos de pescadores. Como a
lama chegou no espaço vivido desses estudantes? Todos
foram tocados da mesma maneira por essa experiência?
Procure imagens do momento em que a lama de rejei-
tos proveniente do rompimento da Barragem de Fundão
37
chega ao mar. Lance mão de imagens locais as quais você
tem acesso.
Apresente, por exemplo, a coletânea de imagens da se-
ção de fotografias publicadas pelo El País8, destacando os
créditos dos fotógrafos e dos diferentes meios de divulga-
ção das imagens ali reunidas. Levante as sensações e sen-
timentos dos estudantes em relação a essa situação. Em
seguida promova um momento de socialização dessas
narrativas, acolhendo-as e registrando os conhecimentos
prévios que foram socializados. A coletânea indicada, ape-
nas exemplifica os tipos de imagens que podem auxiliar
nessa atividade. Colha as narrativas dos estudantes levan-
do em consideração, especialmente, a sua relação com o
rio e/ou mar e como ela foi afetada. Algumas questões po-
dem ser abordadas:
• Você e sua família foram atingidos de alguma ma-
neira pelas atividades da mineração, cuja lama decorren-
te do rompimento da Barragem de Fundão – MG, atingiu
o mar, na costa litorânea de sua cidade? Como?
• Você sabe indicar quais as consequências do rom-
pimento da Barragem de Fundão em sua comunidade?
Atualmente você ainda identifica consequências desse
acidente em sua cidade?
• Quais cores predominam nas cenas retratadas?
Qual a sua percepção em relação a essas cores e o que
elas representam? Essas cores são comuns na paisagem
litorânea da sua cidade?

Promova momentos de socialização do resultado das


discussões, acolhendo-as e realizando uma síntese do
que foi socializado. A partir dessa sistematização, encami-
nhe pontos de aproximação com a sua disciplina.

8. Lama de barragem da Samarco chega ao mar


A onda de lama percorreu 700 quilômetros até chegar à costa do Espírito Santo. Atingiu
local de reprodução de tartarugas marinhas e tingiu o mar de com a cores da poluição.
Fonte: El País. Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2015/11/23/al-
bum/1448301345_943414.html#foto_gal_1 Acesso em: 15 abr. 2022.
38
3.2 DESENVOLVIMENTO DA
NARRATIVA
Após o envolvimento emocional dos estudantes com o
tema, professoras e professores assumem um protagonis-
mo maior das discussões, pois nessa fase do desenvolvi-
mento da narrativa, a partir do prisma científico e/ou das
artes, dedicam-se à disponibilização de conceitos e ideias
de suas áreas de conhecimento. Centrada muitas vezes
em aulas expositivas, prática predominante em nossos
modelos disciplinares, outras alternativas para o desenvol-
vimento da narrativa podem ser construídas com a me-
diação dos professores, visando uma maior participação
dos alunos e alunas. A construção de conhecimentos por
parte dos estudantes nesse momento, deve ser orientada
pelo professor e professora que intervém didaticamen-
te corrigindo erros conceituais, fornecendo vocabulários
narrativos das áreas científicas, de modo também a evitar
posturas negacionistas e reduções históricas e interpreta-
tivas.
Vejamos, por exemplo, o que tem se apresentando a
partir dos princípios da metodologia ativa, propagada por
exemplo, pelo MIT (Massachusetts Institute of Technolo-
gy). Os artigos e vídeos de Mitchel Resnick, fundador do
grupo Jardim de infância para toda a vida (Lifelong Kin-
dergarten), pertenc ente ao MIT, têm como fundamento
a aprendizagem por meio do conceito de mãos na massa.
Resnick (2020), defende uma espiral da aprendizagem
criativa9, na qual os estudantes: identificam um proble-
ma real, imaginam soluções para esse problema de forma
colaborativa, propõe protótipos para representar suas so-

9. Confira nas referências os links de acesso a seis vídeos de Mitchel Resnick sobre a
Aprendizagem Criativa: Introdução à Aprendizagem Criativa; Aprendendo por Projetos.
Pares; Paixão; Brincar e Sociedade Criativa.

39
luções, testam suas ideias, compartilham-nas e refletem
sobre todo o processo. Advogando em defesa das práticas
experimentais comuns à educação infantil, chamada por
ele de jardim da infância, esse autor coloca a experimen-
tação como pilar da aprendizagem para a vida.
Indo ao encontro dessa ideia, o trabalho da professora
de matemática Petrina Avelar, chamado “Mar de Lama
– Modelagem na Educação Matemática”, desenvolvido
de modo colaborativo com seus alunos e alunas do sex-
to ano do Ensino Fundamental, da Escola Municipal Mi-
nervina Augusta, da rede pública municipal de Belo Ho-
rizonte, merece ser resgatado. A partir de outro acidente
de trabalho ampliado, ocorrido em Brumadinho – MG na
Barragem do Feijão, o projeto citado apresenta uma pro-
posta que, exemplarmente, concebe a educação fora da
caixa sedimentada da memorização e de pouca atribui-
ção de sentido, por parte dos educandos. O projeto bebe
na fonte das metodologias para o ensino de matemática
na Educação Básica, baseada na resolução de problemas
e no desenvolvimento de modelagens. O vídeo que apre-
senta o projeto foi premiado no terceiro festival de vídeos
digitais de educação matemática, em duas categorias:
júri popular e júri técnico.

2ª Proposta Ilustrativa:

Nível de Ensino Mãos na massa – Mãos na Lama

Diferente da apresentação que foi realizada para a fase


de problematização da SD, com a explicitação de exem-
plos de atividades, a opção dessa segunda proposta ilus-
trativa é de dar visibilidade ao projeto “Mar de Lama – Mo-
delagem na Educação Matemática”, com a exposição de
suas motivações e das ações que foram desenvolvidas.
40
• Qual foi a motivação dos estudantes envolvidos pela
proposta?
− Refletir sobre a recuperação da área de
Brumadinho, atingida pelo rompimento da
barragem de rejeitos da Mina Córrego do Fei-
jão, da mineradora Vale S.A, ocorrida em de-
zembro de 2021 e que vitimou 270 pessoas,
além de deixar desaparecidos?
• Qual problema real foi levantado pelos estudantes e
gerou o desenvolvimento da narrativa do ensino apresen-
tada
− Quanto de rejeito proveniente da ruptu-
ra da Barragem do Córrego do Feijão, na ci-
dade de Brumadinho, deverá ser retirado para
iniciar um projeto de recuperação ambiental?
• Quais procedimentos colaborativos foram adotados
para responder à pergunta geradora nessa proposta didá-
tica?
− Estudos de imagens de satélite da área
atingida e delimitação de uma área para reali-
zação de maquete;
− Estudos de mapas topográficos da área
escolhida e transposição para o papel das cur-
vas de nível da área delimitada, utilizando co-
tas de 10 metros;

41
− Transposição das cotas altimétricas para
placas de isopor;
− Cálculo de escala envolvendo a corres-
pondência entre cada cota representada pela
placa de isopor e a realidade;
− Levantamento da cota altimétrica que a
lama atingiu;
− Construção de uma maquete com foco
na altimetria e outra no relevo e vegetação;
− Criação de um molde de papel da área
devastada situada na cota de 790m;
− Cálculo da área devastada pela lama por
meio do preenchimento do molde de papel
com quadrados coloridos, que foram reduzi-
dos proporcionalmente até que toda a área
fosse coberta;
− Criação de tabela para lançamento dos
valores dos quadrados utilizados para preen-
chimento da área devastada:

Medida Medida real Quantidade Área real


Área total
do lado do do lado do de quadra- de um
Cor por cor,
quadrado, quadrado dos que quadrado,
em metros
em centí- na escala, foram dese- em metros
quadrados
metros em metros nhados quadrados

− Identificação da área total estudada cor-


respondendo a 570.000 m2;
− Cálculo envolvendo a transformação
dos valores da área estudada de metros para
hectares e identificação de uma área de 57
hectares de lama;
− Cálculo envolvendo a unidade de me-
dida volume para identificar quanto de lama
corresponde a área devastada em metros
quadrados;
− Identificação por estimativa do volume

42
total de lama da área de estudo de aproxima-
damente 5. 330.000 m3;
− Levantamento de custos para a retirada
da lama, estimados em quase 1 bilhão de reais.
• Quais atitudes um processo de ensino como o que
foi apresentado pode potencializar?
− Valorização do trabalho colaborativo;
− Reconhecimento da dor do outro e de-
senvolvimento de sentimentos de empatia;
− Engajamento em processos políticos
que envolvem a preservação ambiental e o di-
reito à vida, em múltiplos sentidos;
− Posicionamento crítico quanto aos mo-
delos capitalistas de (re)produção do espaço;

Ao analisar o processo apresentado, parece não existir


grande espaço para a pergunta que muitas vezes ronda
nossas disciplinas escolares, ou seja: Por que estou estu-
dando esse conteúdo?

Enquanto educador, você já se deparou com pergun-


tas desse tipo, em relação ao seu campo disciplinar? O
quanto e como você acolhe as perguntas problematiza-
doras realizadas por seus alunos e alunas no desenvolvi-
mento da sua narrativa de ensino?

As dificuldades relacionadas à abstração que permeiam


o estudo de conceitos como escala, unidades de medi-
das, representações cartográficas é uma realidade com
a qual professores e professoras de algumas disciplinas
convivem. No entanto, essa abstração cede lugar a um
conhecimento prático, quando tais conteúdos materiali-
zam-se a partir de questões que partem do vivido pelos
estudantes e do modo como vão sendo transformados à
medida que avançam na aquisição do conhecimento sis-
tematizado.

43
Vejamos novamente a música “Vão”10, de Luiz Tatit e Dan-
te Ozzetti, indicada na fase 10. Vão
anterior como um possível (Dante Ozzetti / Luiz Tatit)
suporte de uma ativida- Toda lama escorre pelo chão
de de problematização. A Vira mancha vira poluição
Picha todos cria um mundo-cão
recuperação de um outro Passa tudo na televisão
trecho da canção nos re- Entra pelos poros da nação
Todo ciclo acaba e esse não, esse não...
mete às possibilidades que
se apresentam por meio Fonte: TATIT, Luiz. Disponível em: http://
luiztatit.com.br/composicoes/composi-
da coletividade: de fazer cao?id=9/V%C3%A3o.html
abr. 2022.
Acesso em: 15

junto, de estudar junto, de


mobilizar junto, de aprender e de ensinar de modo coo-
perativo.
Do ponto de vista atitudinal, permite-nos refletir sobre a
necessidade de lutas coletivas em prol de uma formação
cidadã, que lute para que a lama de rejeitos, de compa-
nhias mineradoras, não ocupe mais os espaços de cida-
des, de matas, de rios, de vidas humanas. Essa é uma luta
de todos...

Prezado professor e prezada professora,


Reflita sobre como você pode contribuir para a criação
de escudos contra essa flecha de destruição socioam-
biental por meio de seus projetos educativos...

3.3 APLICAÇÃO/ ELABORAÇÃO


DE NOVOS CONHECIMENTOS
O menino e a menina brincam na serra, com
as pedras, com as dobras do relevo. Se escon-
dem entre matacões, frestas de rochas e têm
medo do buraco da caverna onde o eco repete o
que eles gritam. Vivem o pó da mineração sem
se dar muito conta disso. Experimentam o mi-

44
nério de ferro, por meio de
seus pés miúdos, que im-
pregnados de terra deixam
uma trilha no chão da casa,
depois de terem andado ao
longo do dia. Se encantam
com as pedrinhas coloridas,
gemas que brilham quan-
do lapidadas. Escolhem as
melhores pedras de casca-
lho para jogar no rio e se di-
vertem com o repique que
fazem na água, de acordo
com o seu peso. Aprovei-
tam a quentura da areia
das prainhas fluviais, em
dias ensolarados. Por ve-
zes, brincam no rio e apren-
dem onde é mais fundo e
onde podem se entregar às
águas sem muito se preocupar. São meninos e
meninas do vale do Rio Doce, meninos e meni-
nas das escolas
do vale do Rio Doce.
Adriana Angélica Ferreira

A elaboração de conhecimentos não é prerrogativa de


um determinado momento de uma SD em detrimento
de outro. Ao longo de todo esse processo, os estudantes
elaboram conhecimentos sobre as temáticas trabalhadas.
No entanto, algumas orientações didáticas favorecem sig-
nificativamente a apropriação de conhecimentos por par-
te dos estudantes, especialmente quando oportunizam
a aplicação dos conceitos e ideias apreendidas em con-
textos variados. Desse modo, diversificar as situações de
ensino permite aos educandos realizar novas inferências

45
e posicionar-se perante novas constatações. Nessa fase
da SD, denominada aplicação dos novos conhecimentos,
segundo Aguiar Júnior, é importante “dar oportunidades
aos estudantes de falar e pensar com as novas ideias e
conceitos, em pequenos grupos e por meio de atividades
com a toda a classe” (AGUIAR JÚNIOR, 2005, p. 25).
A temática hidrográfica, muito cara a este curso de Aper-
feiçoamento, que demarca a sua abrangência a partir da
unidade territorial/espacial da bacia hidrográfica do Rio
Doce, na maioria das vezes é concebida a partir de aspec-
tos físicos, cuja importância da abordagem não pode ser
questionada. Vários conteúdos conceituais decorrem des-
se estudo relacionados a: distribuição das águas no pla-
neta; formação de lagos, rios, oceanos e mares; dinâmica
desses corpos hídricos e etc. A utilização desses recursos
pelos seres humanos também comparece nos currículos
de diversas disciplinas, do nível fundamental ao médio.
Considere que esse tema e os conteúdos dele derivados
tenham sido trabalhados em etapas anteriores de uma
SD. Dando sequência a essa discussão, apresentamos
como alternativa de ampliação dessa fase do planejamen-
to a possibilidade de entender os rios como uma metáfora
para a reflexão sobre a própria existência. Sem prescindir
também dos aspectos físicos mencionados, a proposta
ilustrativa a seguir tem por objetivo contribuir em proces-
sos educativos que levem os estudantes a se conhecerem
por meio de seu rio interior e de suas experiências pes-
soais.

3ª Proposta Ilustrativa:

Nível de Ensino O rio da minha aldeia e o rio interior

46
Ensino Fundamental II Disciplinas: Língua Portuguesa –
Anos iniciais e Anos Geografia – História – Educação
Finais Física – Arte

A) Escolha um dos suportes apresentados abaixo, ou


quantos julgar pertinente, e viabilize o meio de apresen-
tá-lo(s) aos estudantes. As opções para isso podem ser
desde as mais simples até as mais elaboradas, como por
exemplo: reproduzir a poesia do suporte 1 para os estu-
dantes em papel, ou projetá-la; incentivar à leitura do li-
vro por meio de um projeto que busque alternativas para
viabilizá-la; passar as frases dos suportes 3 e 4 no quadro;
reproduzir a canção do suporte 5, quantas vezes for ne-
cessário.

SUPORTE 1: O escritor português, Fernando Pessoa12,


assinando com o heterônimo de Alberto Caeiro, que re-
presentava um homem simples, cuja maior parte da vida
passou no campo, em contato com a natureza, escreveu
uma obra chamada “Guardador de Rebanhos”. No XX
poema desse livro o narrador/autor compara o rio da sua
aldeia com o rio Tejo e conclui que o primeiro é mais bo-
nito, exatamente porque é o rio da sua aldeia. Sem deixar
de reconhecer a beleza do rio Tejo, maior em volume e
extensão, atribui sentido ao rio particular, que não o faz
pensar em nada e ao pé do qual ele deseja estar.

12. As obras de Fernando Pessoa (1888 a 1935) já podem ser baixadas no Portal Domí-
nio Público, da Secretaria de Educação a Distância (Seed/MEC). O acervo do poeta está
disponível, pois, tanto em Portugal quanto no Brasil, os direitos autorais perduram so-
mente até 70 anos após a morte de um autor. Passado esse período, sua obra entra em
domínio público.
Fonte: MEC. Disponível em:
http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/PesquisaObraForm.do
Acesso em: 15 abr. 2022.

47
XX

O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia,
Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela mi-
nha aldeia
Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia,
O Tejo tem grandes navios
E navega nele ainda,
Para aqueles que vêem em tudo o que lá não está,
A memória das naus.
O Tejo desce de Espanha
E o Tejo entra no mar em Portugal.
Toda a gente sabe isso.
Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeia
E para onde ele vai
E donde ele vem.
E por isso, porque pertence a menos gente,
É mais livre e maior o rio da minha aldeia.
Pelo Tejo vai-se para o Mundo.
Para além do Tejo há a América
E a fortuna daqueles que a encontram.
Ninguém nunca pensou no que há para além
Do rio da minha aldeia.
O rio da minha aldeia não faz pensar em nada
Quem está ao pé dele está só ao pé dele.

Alberto Caeiro, In: O guardador de rebanhos.

SUPORTE 2: O mineiro Ziraldo Alves Pinto, multiartista


reconhecido pela diversidade de produções, nasceu em
Caratinga, Minas Gerais – MG e aprendeu a nadar nas
águas do Rio Doce. Seu livro chamado “Menino do Rio
Doce” foi ilustrado pelas bordadeiras da família Dumont,
da cidade de Pirapora, cujo um outro rio, o Rio São Fran-
cisco, também marca a existência dos moradores da ci-
dade.

48
Recuperar a narrativa desse livro parece essencial, ainda
que os bordados que o ilustram sejam notáveis.
Ziraldo narra a vida de um menino e do Rio Doce, já anun-
ciando de início a certeza de que o menino personagem
tinha nascido no dia em que viu o rio. “Na sua memó-
ria, não havia nada antes daquele dia. O menino amou
o rio pois acreditou que o rio também havia nascido no
dia em que ele o viu” (ZIRALDO, 2000, p. 1-2). Quem já foi
“menino de rio”, algum dia na vida, pode entender bem
o que o escritor diz nesse livro. Pode entender que o rio é
tudo aquilo que compõem o próprio rio, como por exem-
plo: a pedra pontuda, o peixe, o martim-pescador, o ho-
mem também pescador remando a sua canoa, a capiva-
ra, a figueira e o ingá. Pode entender, igualmente, que o
rio são as histórias sobre o rio, como a da grande serpen-
te emiboitatá e que a água da chuva é a refeição do rio.
Ele sabe que o rio engole a margem, ou seja, transborda
sobre a sua planície de inundação e que, quando as ca-
sas estão nas margens, elas também se vão com a cor-
renteza, e nesse caso não se pode atribuir a ele o papel
de culpado, pois se trata de um viajante que segue seu
destino. Mesmo quando esse rio, por algumas vezes leva
consigo outro menino, companheiro de folgança, quem
já foi menino de rio consegue compreendê-lo, e a sua re-
lação com o rio não deixa de ser amistosa e respeitosa
“— pois que o rio às vezes, faz sua misteriosa vontade”
(ZIRALDO, 2000, p. 22). Muitos desses meninos, na visão
do autor, com o passar do tempo, deixam de olhar para a
serra de onde o rio vem e passam a olhar para onde o rio
aponta sua flecha, alvo nunca visto por eles. E, junto vem
a pergunta: “Onde vou cravar meu rio?”. Distante de suas
cercanias, muitos partem para onde o rio encontra com
um mundo de água. Mundo no qual a sua história, de
homem que veio com o rio, menino feito de água, torna
a começar. Essa pode ser também a importante história
do rio interno de cada um...

49
É perceptível o fato de que o livro nasceu enquanto fru-
to das vivências de seu escritor, mas o mesmo aplica-se
para todas as meninas, que também se aventuraram pe-
los “reinos das águas claras”, marrons e escuras dos rios
interioranos.
Em 2021 essa obra completou 25 anos.

SUPORTE 3:
“Ninguém entra no mesmo rio uma segunda vez, pois
quando isto acontece já não se é mais o mesmo. Assim
como as águas que já são outras.”
Heráclito de Éfeso – Século VI a.c

SUPORTE 4:
“Foi um rio que passou em minha vida
E meu coração se deixou levar”.
Paulino da Viola

Após a apresentação dos su-


portes encaminhe reflexões e SUPORTE 5:
Na Pele
atividades que levem os estu- (Pitty)
dantes a refletirem individual- “Olhe dentro dos meus olhos
Olhe bem pra minha cara
mente e no coletivo, sobre ques- Você vê que eu vivi muito
Você pensa que eu nem vi nada ...
tões relacionadas a etapas da sua ... A vida tem sido água
vida, comparando-as à dinâmica Fazendo caminhos esguios
Se abrindo em veios e vales
dos rios. Os itens abaixo apresen- Na pele leito de rio
tam apenas algumas sugestões Contemple o desenho fundo
Dessas minhas jovens rugas
de temas que podem nortear a Conquistadas a duras penas
Entre aventuras e fugas
realização de diferentes tipos de Observe a face turva
atividades, cuja execução conta O olhar tentado e atento
Se essas são marcas externas
com múltiplas estratégias e su- Imagine as de dentro”.
portes, de acordo com as áreas Fonte: Elza Soares e Pitty – Na
de ensino e as disciplinas do cur- Pele (Videoclipe Oficial) Dispo-
nível em: https://www.youtube.
rículo. Observe que essas suges- c o m /w a tc h? v = s a H c m t U 9 I - 0
Acesso em: 25 abr. 2022.
tões apostam no maior protago-

50
nismo dos estudantes e assim, professores e professoras,
assumem um papel de mediação e orientação.
• Suporte 1: Levante junto aos estudantes quais rios
correm perto de suas moradias, em suas cidades, distri-
tos, sub distritos, vilas, aldeias – Estimule os estudantes a
refletirem sobre a singularidade dos cursos d´água que
identificaram e de suas próprias histórias – Incentive a
produção de obras autorais tais como: biografias, mapas
mentais, ensaios fotográficos, poemas, histórias em qua-
drinhos, bordados, depoimentos orais, cenas teatrais, en-
tre outras;
• Suporte 2: Auxilie os estudantes a realizar o perfil do
menino do Rio Doce, apresentado na produção literária –
Disponibilize a biografia do autor – Estimule os estudantes
a levantar outras histórias de meninos e meninas da bacia
do Rio Doce em diferentes épocas – Apresente o fotógrafo
Sebastião Salgado, outro menino da bacia do Rio Doce e
seu Instituto Ambiental. Nascido na vila de Conceição do
Capim, um distrito do município mineiro de Aimorés, esse
artista viveu sua infância em Expedicionário Alício, outro
distrito desse mesmo município. Fruto de sua iniciativa e
da sua companheira Lélia Deluiz Wanick, criou o Instituto
Terra, que tem como objetivo a preservação de áreas de-
gradadas na região onde nasceu – Incentive a produção
de obras autorais que reflitam as histórias pessoais dos es-
tudantes;
• Suporte 3: Auxilie os estudantes na realização da
reflexão filosófica proposta por Heráclito de Éfeso – Esti-
mule a reflexão sobre a importância do aprendizado que
se viabiliza a partir das mudanças vivenciadas ao longo
do tempo e as mudanças do próprio curso d’água local
– Proponha a discussão sobre a mudança do Rio Doce
ao longo do tempo, as alterações das águas em função
da sua contaminação com os rejeitos provenientes do
rompimento da barragem de Fundão – Atrelado ao tópi-
co anterior proponha a discussão sobre as mudanças do

51
moradores da bacia do Rio Doce em decorrência desse
acidente e as perspectivas de sua revitalização por meio
do engajamento pessoal;
• Suporte 4: Levante junto aos estudantes quais rios
físicos e internos já passaram pelas suas vidas – Estimule
os estudantes a refletir sobre como foram levados por suas
próprias histórias e os sentimentos que já vivenciaram ou
vivenciam – Incentive a produção de obras autorais tais
como: biografias, mapas mentais, ensaios fotográficos,
poemas, histórias em quadrinhos, bordados, depoimen-
tos orais, cenas teatrais, entre outras;
• Suporte 5: Estimule a reflexão sobre o envelheci-
mento e a valorização dessa condição antropológica do
ser humano – Estimule a reflexão sobre os padrões cor-
porais valorizados na nossa sociedade e o processo de
envelhecimento – Oriente os estudantes a refletir sobre a
experiência adquirida com o passar do tempo, a exemplo
dos rios que vão acumulando água na medida em que
recebem seus afluentes – Incentive os estudantes a co-
lher narrativas das pessoas mais velhas da sua comunida-
de com vistas e realização de uma exposição – Auxilie os
estudantes a levantarem, por meio das entrevistas reali-
zadas, as marcas internas da experiência relacionada ao
desastre ambiental ocorrido na bacia do Rio Doce;

B) Ao contrário da proposta anterior, muitas crianças das


metrópoles brasileiras não são meninos e meninas de rio,
como na acepção apresentada. Para elas, o rio é compos-
to por outros elementos e tem outros significados. Paras
estas, faltam elementos na história narrada por Ziraldo,
como por exemplo, o cocô? Para muitas crianças das
nossas metrópoles e mesmo de cidades médias, o rio é
o que ele se tornou, ao longo dos muitos anos e déca-
das: o lugar para onde vai o esgoto de suas e de todas as
outras casas. O depositário do xixi, do lixo, do sabão que
sai das vasilhas, etc. Dificilmente essas crianças vão com-
52
partilhar uma visão sobre o rio semelhante a que foi des-
crita anteriormente. Ainda podemos encontrar nessas
cidades aqueles que são herdeiros dos rios invisíveis, que
correm canalizados subterraneamente13 e que a cada ve-
rão reivindicam suas várzeas sepultadas. São estudantes
a quem o rio faltou. Favoreça a apropriação de novos co-
nhecimentos, explorando também essa possibilidade de
ampliação da discussão sobre a temática hidrográfica.

3.3 APLICAÇÃO/ ELABORAÇÃO


DE NOVOS CONHECIMENTOS
A última fase da SD, relacionada à reflexão sobre o que
foi aprendido, muitas vezes é compreendida como a etapa
de avaliação formal dos estudantes. Ainda que a avaliação
também faça parte da mesma, o processo avaliativo não
precisa assumir a centralidade dessa etapa. Ao contrário,
todas as etapas de uma SD devem ser avaliadas de modo
equilibrado. Algumas alternativas podem auxiliar profes-
sores e professoras na sistematização da avaliação, favo-
recendo o registro processual e gradativo do processo de
aprendizagem dos estudantes. Por exemplo, a criação de
rubricas já é usada para complementar com esse intuito.
Vejamos de modo simplificado em que consiste uma
avaliação por rubrica.
Baseada na identificação clara das expectativas de
aprendizagem, uma rubrica consiste na criação de pa-

13. O livro Meio ambiente em cena propõe uma reflexão crítica sobre diferentes ques-
tões socio ambientais por meio de um diálogo com produções cinematográficas. Um
dos capítulos do livro dedica-se a discussão dessa temática. Cada um dos seus nove
capítulos é composto por uma análise teórica de um filme ficcional, um documentário
ou uma animação, seguida de uma SD. Ele faz parte do acervo do PNBE do Professor
2013 - Programa Nacional Biblioteca da Escola e foi distribuído para escolas públicas de
todo o território nacional. Consulte as bibliotecas das escolas da sua cidade e verifique
se elas foram contempladas com esse livro, que permite um acesso direto a várias SDs
envolvendo a sétima arte.

53
râmetros para a avaliação, que podem ser apresentados
por meio de grades/tabelas14, contendo os critérios ava-
liativos de cada atividade e os níveis de desempenho es-
perados. Para o especialista em avaliação Domingos Fer-
nandes (2020), as rubricas possuem caráter abrangente
quanto a verificação dos diversos aspectos relacionados
aos processos de aprendizagem dos estudantes. Sua re-
levância decorre do simples fato de que deixa demarca-
do e claro para os envolvidos, tanto estudantes quanto
professores, as expectativas quanto a aprendizagem, ou
seja, “perante uma rubrica que se assume que é clara e
bem construída, alunos e professores ficam bem cientes
acerca das características e das qualidades, que o traba-
lho deve ter, para evidenciar as aprendizagens realiza-
das” (FERNANDES, 2020, p.3)
Nesse tipo de avaliação, espera-se que o professor e
professora registrem, ao longo do processo educativo, o
progresso dos estudantes em relação às diferentes com-
petências e habilidades que foram elencadas como im-
portantes, ou seja, aquilo que se espera que os estudantes
sejam capazes de realizar ao longo e no final da SD. Além
disso, os estudantes também podem ser convocados a se
avaliarem, prática que ainda é pouco valorizada em nossas
escolas, de um modo geral.
Realizada a ressalva de que o processo avaliativo deve
ser contínuo e processual, consideramos, no entanto, que
é importante nessa fase da SD a promoção de atividades
através das quais ocorra uma socialização ampla daqui-
lo que foi aprendido por parte dos estudantes. A difusão

14. PINTO, Péricles Brandão. Tecnologia como recurso auxiliar na aprendizagem: pro-
posta de inovação por meio de sequências didáticas. 90 f (Monografia). Universidade
Federal de Minas Gerais, escola de Educação Básica e Profissional, Centro Pedagógico.
Curso de Especialização em Tecnologias Digitais e Educação 3.0. Belo Horizonte, 2020.
Disponível em:
https://repositorio.ufmg.br/bitstream/1843/35430/1/Tecnologia%20como%20recurso%20
auxiliar%20na%20aprendizagem.pdf
Confira as rubricas que foram usadas neste trabalho como proposta avaliativa para cada
uma das seis SDs sistematizadas como monografia dessa especialização.

54
dos resultados do processo de ensino, contribui para um
maior envolvimento dos mesmos, que no contexto das
sociedades em rede, desejam alçar suas vozes para além
dos muros da escola. Tomando os devidos cuidados para
não reforçar com esta atitude, aquilo que desejamos ne-
gar como princípio, a saber, os fundamentos da sociedade
do espetáculo e da superexposição, essa fase pode se be-
neficiar de inúmeros suportes tecnológicos e ferramentas
digitais. Além disso, momentos educativos que já fazem
parte dos calendários escolares, como feiras, semanas de
arte, mostras culturais, entre outros, podem abrigar essas
narrativas e enriquecer a agenda e as atividades que se
desenvolvem nesses eventos.
A proposta ilustrativa apresentada a seguir recupera
uma prática usual nas nossas escolas por parte de várias
disciplinas, que é o júri simulado, adaptando uma pro-
posta realizada por educadores da região de Governador
Valadares. Mais do que um jogo, esse tipo de atividade
promove o engajamento dos estudantes, possibilitando o
desenvolvimento da capacidade argumentativa e o apro-
fundamento dos temas trabalhados. Outra síntese que se
propõe, parte da narrativa indígena sobre a mineração,
cuja recuperação se faz obrigatória em processos que bus-
cam a reflexão sobre a relação sociedade natureza, nesse
momento atual da nossa história planetária e societária,
marcada por contradições e destruição ambiental.

4ª Proposta Ilustrativa:

Nível de Ensino Narrativas sobre a mineração

A coletânea de cadernos chamada Conversas com o


rio Doce, resultado do projeto “Relação com o saber e
Educação Ambiental: uma pesquisa com estudantes em
tempo integral”, da Universidade Vale do Rio Doce (UNI-

55
VALE), apresenta um diversificado material sobre o rio
Doce, tematizado sob diferentes aspectos. Essas temáti-
cas foram levantadas a partir dos desejos de aprendiza-
gem dos estudantes envolvidos no projeto, sobre esse rio,
antes e depois do rompimento da barragem de Fundão,
localizada no município de Mariana – MG. Essa coleção
pode ser considerada um material essencial para educa-
dores de toda a bacia do Rio Doce. O 10º caderno apre-
senta o tema conversas na escola sobre a qualidade da
água no Rio Doce e conta com a autoria de um Thiago
Martins Santos e Ana Luiza de Quadros.
A influência do rompimento da barragem de Fundão
na qualidade da água do Rio Doce, apresentou-se de
modo imperativo na vida dos moradores dessa bacia hi-
drográfica. A preocupação com a água para o consumo
diário, nesse sentido, não pode ser analisada enquanto
uma abstração, uma vez que foi vivenciada por muitas
pessoas por um longo período. Com foco na mobiliza-
ção/ participação social, uma das três atividades pro-
posta pelos autores deste caderno contém informações
cujo objetivo é permitir aos estudantes compreenderem
melhor a temática explorada e se engajarem na defesa
do rio Doce. Desdobrado a partir de reflexões, estudos e
etapas anteriores, essa atividade propõe o confronto de
diferentes visões que pautam o debate sobre o aciden-
te, divididas entre: os que durante ato público realizado
na cidade de Mariana – MG, foram a favor da empresa
Samarco, responsável pela mineradora cuja barragem se
rompeu, por entender que essa posição corrobora com
a manutenção dos empregos que ela oferecia; e os que
denunciam a empresa em redes sociais, por explorarem
os bens naturais e destruir o meio ambiente. Mediante
tal divergência, a orientação pedagógica para esse júri si-
mulado é avaliar qual é o melhor encaminhamento den-
tre os dois que foram apresentados.
• Título da atividade:

56
− Júri Simulado: um conflito em nossa vida!
• Como a turma pode ser dividida:
− Em três grupos, sendo cada um deles respon-
sáveis pelas tarefas a seguir:
• Grupo A – responsável, entre outras coisas,
por buscar dados que demonstre que a cidade
de Mariana necessita da presença da minerado-
ra Samarco para manter os empregos da popu-
lação;
• Grupo B – responsável por buscar dados cien-
tíficos que ateste a baixa qualidade da água do
rio Doce;
• Grupo C – responsável por conversar com a
população de Governador Valadares e pescado-
res e levantar os argumentos usados por essa
população quanto ao consumo/não consumo
da água, bem como acerca da água tratada pelo
SAAE (Serviço Autônomo de Água e Esgoto) da
cidade.
• Quais estratégias podem ser adotadas para a orga-
nização do Júri Simulado:
− Disponibilização de tempo para que os gru-
pos se preparem para a defesa de seus argumen-
tos;
− Instrução de cada uma das equipes quanto
a materiais, fontes de estudos, procedimentos in-
vestigativos etc.;
− Organização junto com os estudantes do
momento de defesa dos lugares sociais que cada
grupo representa, por meio da criação de regras e
princípios. No caso da atividade analisada, os dois
primeiros grupos tiveram um tempo para sua ex-
posição e o terceiro, atuou como mediador desse
conflito.
• Quais habilidades a atividade que foi apresentada

57
pode potencializar?
− Desenvolvimento da capacidade de argu-
mentação;
− Reflexão sobre a construção de narrativas por
meio da análise de discurso;
− Valorização da pesquisa empírica no proces-
so de construção do conhecimento.

Prezados professores e professoras,


O silenciamento acerca desse acidente é uma realidade
já detectada em muitas pesquisas. A despeito do que a
atividade mineradora significa em termos de desenvol-
vimento econômico local, lançar luz sobre os impactos
que ela causa no ambiente é um compromisso socioam-
biental do qual não devemos nos furtar.
Consulte o texto de apoio do Eixo Integrador Educação e
mineração para uma ampliação dessa discussão. Texto:
Educação e Mineração: interrogações à escola a partir do
rompimento da Barragem de Fundão; Autora: Adriane
Cristina de Melo Hunzicker.

Disciplinas: Ciências – Geografia


Ensino Médio – História – Sociologia – Filosofia –
Língua Portuguesa - Literatura

A etnia Krenak, dentre os indígenas de Minas Grais, se-


gue resistindo ao processo de extermínio que lhe tem
sido delegado. Seu território tradicional tem sofrido inú-
meras violações decorrentes, dentre as coisas pode-se ci-
tar a criação da Usina Hidrelétrica de Aimorés – MG. Como
todos aqueles que vivem na bacia do Rio Doce, o Watu,
os Krenak também tiveram suas vidas marcadas pelo aci-
dente minerário que impactou a bacia desse rio.
Ailton Krenak, uma de suas lideranças, possui inúmeros
textos que podem ser recuperados em diferentes etapas
de uma SD. Para essa discussão, que já caminha para o
58
fim, apresentamos a transcrição de parte da sua entrevis-
ta ao programa Roda Viva16, a partir do questionamento
do professor de literatura e compositor José Miguel Wis-
nik. Amparado na poética de Carlos Drummond de An-
drade, Wisnik convida Ailton a descrever a sua experiên-
cia com a mineração.
José Miguel Wisnik: Que alegria Ailton, poder conver-
sar com você aqui nessa companhia e na televisão aber-
ta. E, eu queria lembrar aqui a relação que tem a sua ex-
periência e da aldeia Krenak com a mineração e com a
história da companhia Vale do Rio Doce. A mineração, ela
vem atuando no Brasil ao longo do século XX, sem que
isso se tornasse visível para o país.
Essa devastação foi sendo feita de uma maneira que
se revelou como que abruptamente, aos olhos, podemos
dizer assim, “nas nossas retinas tão fatigadas”, para usar
expressão do Drummond, com as tragédias criminosas
de Mariana e Brumadinho.
Foi então que a gente viu a escala desses acontecimen-
tos. Mas, esses acontecimentos, vocês, a aldeia Krenak,
convivem com eles há muito tempo. Porque por ali pas-
sa, como você escreve, como você narra, o trem mons-
tro mineiro, que está num poema de Carlos Drummond
de Andrade, chamado a montanha pulverizada, que fala
desse trem que vai levando a montanha e deixando só o
mísero pó de ferro.
E, esse trem que está no poema de Drummond, está
ligado a essa experiência que ele teve, como nativo de
Itabira, que é o lugar onde foi criada a companhia Vale
do Rio Doce, para explorar inicialmente as montanhas e
o Pico do Cauê, em Itabira. Então, você, a sua história, a
história que você conta, se liga com a história do poeta.
E, você mesmo diz que o Carlos Drummond é pra você

16. Assista na íntegra o programa através do link indicado abaixo:


RODA VIVA. Ailton Krenak. Youtube, 19 maio 2021. Disponível em: https://www.youtube.
com/watch?v=BtpbCuPKTq4&t=1502s Acesso em: 21 abril 2022.

59
como um escudo, como uma força, um aliado, um nome.
A poesia está muito ligada na verdade ao seu pensamen-
to, a experiência, a experiência que você testemunha.
Então, gostaria que você contasse pra todos essa expe-
riência com a mineração, quer dizer, com o Rio Doce, que
passa ali e o trem junto. Você mesmo diz que o trem, o
caminho-de-ferro, foi seguindo o caminho do Rio. Então,
é como se o rio fosse sendo replicado por esse trem. E o
que vimos é o rio, o rio depois ser tomado pelos rejeitos
das barragens, que resultaram em mortes e na tragédia
das povoações, do ambiente e do Rio Doce. A companhia
Vale do Rio Doce a certo momento, ela riscou o nome do
rio do nome dela. Para ser mais empresa ela virou com-
panhia Vale. E ao mesmo tempo é como se ela riscasse
do mapa, ou riscasse a vida do rio também. Essa é a expe-
riência que vocês testemunham ali. Então gostaria que
você nos falasse sobre essa experiência e sobre a relação
dela com o poeta Carlos Drummond de Andrade.

Ailton Krenak: Que bom te ouvir evocando o nosso


querido Drummond e essa recorrente imagem que a
obra dele, e que quem compartilha com ele essa poética,
de viver nessas montanhas, assistiu: uma manobra. Uma
manobra que a narrativa sobre a colonização dessa região
do Brasil instituiu desde sempre. A busca do diamante, a
busca do Ouro, que fez praticamente o berço dessa narra-
tiva das Minas Gerais. Essa narrativa que mimetiza o cor-
po do rio e depois faz desaparecer o próprio rio e só sobra
essa serpente de metal. Ela está presente nos primeiros
movimentos de abrir estradas na crista da Serra, vindo de
lá de Parati, atravessando as alturas da Serra, passando
pela Rola Moça, subindo a Serra do Espinhaço, indo bater
lá em Diamantina, caçando Diamante, fazendo algumas
passagens pra outros lados do corpo da Serra e descendo
o Santo Antônio, o Piracicaba, formado isso que é o Watú,
o Rio Doce. O vale que esse mesmo pensamento, essa

60
mesma narrativa ampla, pesada, vai chamar de Vale do
Aço. Vale do Aço. A floresta do Rio Doce, ela cede lugar a
um lugar que é o Vale do Aço. O rio cede também lugar a
alguma coisa que vai ser só essa Vale, uma superespecia-
lização, no sentido capitalista mesmo, dessa máquina de
comer mundo. O Drumonnd, ele é onipresente, porque
ele passou quase que o século XX todo, testemunhando
essa invasão. Evocando os outros estragos históricos que
essa atividade de fuçar a terra com diz o Kopenawa Ya-
nomami, e de buscar tirar de dentro da terra aquilo que
dormem em mágico equilíbrio cósmico, mas que quando
você traz pra fora vira wawara, vira uma doença, vira um
veneno. O Drummond e o meu querido amigo Kopenawa
Yanomami, eles denunciam de alguma maneira a mes-
ma coisa. Os homens deveriam deixar dormir no fundo da
terra essa potência que constitui o delírio de gente aqui
fora, que é o ouro, que é o minério. Essa fúria de alcançar
o minério, trazer ele pra fora, no pensamento da Xamã Ya-
nomami, é trazer pra fora essa tragédia sanitária que es-
tamos vivendo no mundo hoje, com a morte de milhões
de pessoas. Isso é de uma gravidade tão absurda que
não daria para gente limitar o comentário a um contex-
to do capitalismo regional, local, aqui no nosso país, mas
pensar o capitalismo com essa a máquina devoradora de
mundo. E, seguindo ainda a parelha de pensamento de
Drumonnd e do Xamã Yanomami, o mundo da merca-
doria ele não sossega, assim como esse trem que passa
incansavelmente aqui, levando as montanhas embora. O
que me fez pensar que aquela afirmação antiga de que
se Maomé não vai à montanha, a montanha vai a Maomé,
talvez seja uma aplicação desse termo, que eles decidi-
ram pegar nossas montanhas e mandar ela ir para outro
lugar.
A partir do depoimento contundente de Ailton Krenak
avaliamos algumas possibilidades de encaminhamento
de um processo reflexivo na etapa final de uma proposta

61
de SD. Todas as propostas ilustrativas a esse respeito pa-
recem redutoras diante da representação que essa narra-
tiva evoca. No entanto, algumas reflexões, podem orien-
tar o debate e serem sistematizadas pelos estudantes nos
mais diversos formatos, como por exemplo, a produção
de revistas digitais envolvendo as temáticas:

• A cosmovisão indígena e o conhecimento do am-


biente;
• Os impactos socioambientais da atividade minerá-
ria de “fuçar a terra” e trazer para fora aquilo que dorme
em mágico equilíbrio cósmico;
• Estudos literários sobre o poeta Carlos Drummond
de Andrade e a mineração;
• O modelo capitalismo enquanto máquina devora-
dora de mundo;
• Os meandros do Rio Doce e o trem de metal que
serpenteia a paisagem ao longo do leito e várzeas do rio.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esperamos que as reflexões realizadas ao longo deste
texto, mais do que uma receita sobre a produção de SD,
possam contribuir com a prática dos professores e profes-
soras que tiverem acesso a esse material.
Comparando as fases da vida dos seres humanos às
fases da SD que foram apresentadas, tecemos algumas
aproximações: Primeiramente, encontramos na infância a
problematização, por meio do universo de perguntas que
as crianças fazem e que nunca se deixam estar satisfeitas
pelas respostas obtidas. Por que ao longo do processo de
escolarização nossos estudantes param de perguntar o
“porquê” das coisas? O quanto as respostas prontas que
lhes damos colaboram com esse enquadramento? Expe-

62
rimentações as quais os adolescentes e jovens se permi-
tem assemelham-se aquilo que no processo de produção
do conhecimento exige a imersão em outros contextos.
Assim, romper com o instituído, ousar, são atitudes tão
frequentes nessa fase da vida. Estimular essa potência
criativa e essa postura não parece ser o desejável na apli-
cação dos conhecimentos adquiridos? Ainda podemos
dizer que as imposições do mundo adulto exigem a ela-
boração dos erros e acertos vivenciados, parecida com o
lugar reflexivo que requer a fase de síntese de uma SD.
A ambivalência proposta não busca uma linearidade e
tem por objetivo apenas estimular a reflexão sobre o pro-
cesso educativo e suas similaridades com elementos inte-
grantes da própria vida.
A imagem referente à velhice foi resguardada nessa sin-
gela comparação. Para essa fase da vida optamos por tra-
zer à cena a imagem do rio, plenamente. O rio abaixo, o
rio a fora, o rio a dentro. O rio grande, que bebeu muitas
águas e pede ao oceano que o aceite. Rio que integra e
encerra a narrativa de Riobaldo, no livro Grande Sertão:
veredas, de Guimarães Rosa, “Cerro. O senhor vê. Contei
tudo. Agora estou aqui, quase barranqueiro. Para a velhi-
ce vou, com ordem e trabalho. Sei de mim? Cumpro. O rio
de São Francisco – que de tão grande se comparece – pa-
rece é um pau grosso, em pé, enorme... Amável o senhor
me ouviu (...)” (ROSA, 1994, p. 623-624).

Pela escuta atenciosa dessas reflexões, agradecemos...

63
REFERÊNCIAS

AGUIAR JÚNIOR, Orlando Gomes. O planejamento do


ensino. Belo Horizonte: Secretaria de Estado de Educação
de Minas Gerais (SEE – MG), 2005. Disponível em: http://rbe-
ducacaobasica.com.br/wp-content/uploads/sites/5/2019/11/
Modulo-II_planejamneto-do-ensino_Orlando-Aguiar.pdf
Acesso em: 15 abr. 2022.

ARAÚJO, Denise Lino de. O que é (e como faz) sequência


didática? Entrepalavras, Fortaleza, ano 3, v.3, n.1, p. 322-334,
jan/jul 2013. Disponível em: https://drive.google.com/drive/
folders/10f6ky0rbm9jrHQI-I5rPo7lEilDU_fdg Acesso em: 15
fev. 2022.

AVELAR, Petrina Rúbia Nogueira. Mar de Lama e a Mo-


delagem Matemática. Youtube, 17 setembro de 2019. Dis-
ponível em: https://www.youtube.com/watch?v=RGKAKQ-
fzJ8I&t=8s Acesso em: 15 abril 2022.

BEZERRA, Maria Cristina dos Santos; JESUS, Adriana do


Carmo de. Organização do trabalho pedagógico em esco-
las do campo: limites e possibilidades. Revista Linhas. Flo-
rianópolis, v. 17, n. 33, p. 238-260, jan. /abr. 2016. Disponível
em: https://www.revistas.udesc.br/index.php/linhas/article/
view/1984723817332016238 Acesso em: 24 abr. 2022.

CAEIRO, Alberto. XX. In: CAEIRO, Alberto. O guardador de


rebanhos. Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.
br/download/texto/pe000001.pdf Acesso em: 24 abr. 2022.

EL PAÍS. Lama da barragem da Samarco chega ao mar.


Fotografias. El País. 25 nov. 2015. Disponível em: https://bra-
sil.elpais.com/brasil/2015/11/23/album/1448301345_943414.
html#foto_gal_1 Acesso em: 15 abr. 2022.

64
FERNANDES, Domingos. Rubricas de avaliação. Lis-
boa: Universidade de Lisboa, Instituto de Educação, 2020.
Disponível em: https://www.researchgate.net/profile/Do-
mingos_Fernandes/publication/339956075_Rubricas_de_
Avaliacao/links/5e6fc5c4458515eb5aba58ad/Rubricas-de-
-Avaliacao.pdf. Acesso em: 09 jun.2020.

FERREIRA, Adriana Angélica. A água nossa de cada ve-


rão. In: Meio ambiente em cena FREITAS, Eliano de Souza
Martins; FERREIRA, Adriana Angélica (Orgs.). Belo Hori-
zonte: RHJ, 2012. p.118-150.

FERREIRA, Bárbara. Um adeus ao rio Doce. Portal O


tempo. Disponível em: https://www.otempo.com.br/po-
lopoly_fs/1.1180473.1449081357!/index.html Acesso em: 25
abr. 2022.

TATIT, Luiz; OZETTI, Dante. Vão. In: TATIT, Luiz; OZETTI,


Dante. Abre a cortina. São Paulo: Selo Circus, 2021 (CD).
Disponível em: http://luiztatit.com.br/composicoes/com-
posicao?id=9/V%C3%A3o.html Acesso em: 15 abril 2022.

LARROSA, Jorge Larrosa. Tremores: escritos sobre ex-


periência. 1 ed. 1 reimp. Belo Horizonte: Autêntica Editora,
2015.

LISBOA, Liliane do Vale; LISBÔA, Eliana Santana. Ca-


lendário Socionatural: uma proposta pedagógica na
escola da Comunidade Indígena Sorocaima I. Revis-
ta Presença Geográfica, vol. 06, núm. esp.01, s.p. 2019.
Disponível em: http://portal.amelica.org/ameli/jatsRe-
po/274/2741099007/2741099007.pdf Acesso em: 15 abr.
2022.

PINTO, Péricles Brandão. Tecnologia como recurso auxi-


liar na aprendizagem: proposta de inovação por meio de

65
sequências didáticas. 2020. 90f. Monografia. Universidade
Federal de Minas Gerais, escola de Educação Básica e Pro-
fissional, Centro Pedagógico, Belo Horizonte, 2020. Dispo-
nível em:
https://repositorio.ufmg.br/bitstream/1843/35430/1/Tec-
nologia%20como%20recurso%20auxiliar%20na%20apren-
dizagem.pdf Acesso em: 25 abr. 2022.

PITTY. Elza Soares e Pitty - Na Pele (Videoclipe Oficial).


Youtube. Disponível em: https://www.youtube.com/wat-
ch?v=saHcmtU9I-0 Acesso em: 25 abr. 2022.

SANTOS, Thiago Martins; QUADROS, Ana Luiza de. Con-


versas na escola sobre a qualidade da água do rio Doce
[livro eletrônico]: caderno temático 10. 1. ed. Governador
Valadares: Univale Editora, 2021. 27 p. Disponível em: ht-
tps://www.univale.br/wp-content/uploads/2021/10/10_Ca-
dernoTematico_final-1.pdf Acesso em: 18 abr. 2022.

RESNICK, Mitchel. Jardim de infância para a vida toda:


por uma aprendizagem criativa, mão na massa e relevante
para todos. Porto Alegre: Penso, 2020.

__________. Introdução à Aprendizagem Criativa. Lifelong


Kindergarten, 18 abr. 2017. Disponível em: https://youtu.be/
zALGoSjIvAY Acesso em: 24 abr. 2022.

__________. Aprendendo por Projetos. Lifelong Kinder-


garten, 25 abr. 2017. Disponível em: https://youtu.be/Uqym-
Vt-TtwU Acesso em: 24 abr. 2022.

__________. Pares. Youtube, 08 nov. 2017. Disponível em:


https://www.youtube.com/watch?v=ALtSEWV3yeg Acesso
em: 24 abr. 2022.

__________. Paixão. Youtube, 02 nov. 2017. Disponível em:

66
https://www.youtube.com/watch?v=IAYgBf7S4NQ&t=215s
Acesso em: 24 abr. 2022.

__________. Brincar. Youtube, 15 nov. 2017. Disponível em:


https://www.youtube.com/watch?v=VaSSFKgIBss&t=83s
Acesso em: 24 abr. 2022.

__________. Sociedade criativa. Youtube, 22 nov. 2017.


Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=lnYyL-
fhvpWc Acesso em: 24 abr. 2022.

ROSA, Guimarães. Grande sertão: veredas. Rio de Janei-


ro: Nova Fronteira, 2001.

RODA VIVA. Ailton Krenak. Youtube, 19 maio 2021. Dispo-


nível em: https://www.youtube.com/watch?v=BtpbCuPKT-
q4&t=1502s Acesso em: 21 abril 2022.

UNIVALE. Conversas com o Rio Doce. Governador Vala-


dares: Univale Editora, 2021. Disponível em: https://www.
univale.br/cadernos-tematicos-conversas-com-o-rio-do-
ce/ Acesso em: 15 abr. 2022.

VIOLA. Paulinho da. Foi um rio que passou em minha


vida. In: VIOLA. Paulinho da. Foi um rio que passou em
minha vida. São Paulo: Odeon, 1970 (Vinil). Disponível em:
http://www.paulinhodaviola.com.br/portugues/discogra-
fia/disco.asp?cod=8&tipo=2 Acesso em: 15 abril 2022.

ZABALA, Antoni. A prática educativa: como ensinar. Por-


to Alegre: ArtMed, 1998.

ZIRALDO. O menino do rio doce. 8. reimp. São Paulo:


Companhia das Letrinhas, 2000.

67
Adriana Angélica Ferreira
Graduação em Geografia (Licenciatura), mestrado e dou-
torado em Geografia, pelo Instituto de Geociências (IGC)
da Universidade Federal de Minas Gerais. Professora da Es-
cola de Educação Básica e Profissional da UFMG (Centro
Pedagógico), aprovada em concurso público (2006). Coor-
denadora da área de Geografia do Projeto de Educação
de Jovens e Adultos, 2º segmento (PROEF-2/UFMG), desde
2014. Pós-doutorado em História da Educação, pelo Insti-
tuto de Educação da Universidade de Lisboa/Portugal.
E-mail: adrianaruga@gmail.com

68

Você também pode gostar