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Supremo Tribunal Federal

Ementa e Acórdão

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29/06/2020 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 599.316 S ANTA CATARINA

RELATOR : MIN. MARCO AURÉLIO


RECTE.(S) : UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL
RECDO.(A/S) : FRICASA ALIMENTOS S/A
ADV.(A/S) : JOÃO JOQUIM MARTINELLI E OUTRO(A/S)

PIS – COFINS – ATIVO IMOBILIZADO – CREDITAMENTO –


LIMITAÇÃO – LEI Nº 10.865/2004. Surge inconstitucional, por ofensa aos
princípios da não cumulatividade e da isonomia, o artigo 31, cabeça, da
Lei nº 10.865/2004, no que vedou o creditamento do PIS e da COFINS,
relativamente ao ativo imobilizado adquirido até 30 de abril de 2004.
ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do


Supremo Tribunal Federal em desprover o recurso extraordinário e fixar a
seguinte tese: "Surge inconstitucional, por ofensa aos princípios da não
cumulatividade e da isonomia, o artigo 31, cabeça, da Lei nº 10.865/2004,
no que vedou o creditamento da contribuição para o PIS e da COFINS,
relativamente ao ativo imobilizado adquirido até 30 de abril de 2004”, nos
termos do voto do relator e por maioria, em sessão virtual, realizada de
19 a 26 de junho de 2020, presidida pelo Ministro Dias Toffoli, na
conformidade da ata do julgamento e das respectivas notas taquigráficas.

Brasília, 29 de junho de 2020.

MINISTRO MARCO AURÉLIO – RELATOR

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RECURSO EXTRAORDINÁRIO 599.316 S ANTA CATARINA

RELATOR : MIN. MARCO AURÉLIO


RECTE.(S) : UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL
RECDO.(A/S) : FRICASA ALIMENTOS S/A
ADV.(A/S) : JOÃO JOQUIM MARTINELLI E OUTRO(A/S)

RE LAT Ó RI O

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Adoto, como relatório,


as informações prestadas pelo assessor Dr. Antônio Claret de Souza
Júnior:

A União interpôs recurso extraordinário contra acórdão


mediante o qual o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ao
negar provimento a apelação e remessa oficial, declarou,
incidentalmente, a inconstitucionalidade do artigo 31, cabeça,
da Lei nº 10.865/2004, reconhecendo o direito da contribuinte ao
creditamento da contribuição para o Programa de Integração
Social — PIS e da Contribuição para o Financiamento da
Seguridade Social — COFINS, em relação aos ativos
imobilizados adquiridos até 30 de abril de 2004. O acórdão
ficou assim ementado:

TRIBUTÁRIO. PIS. COFINS. APROVEITAMENTO


DE CRÉDITOS. LIMITAÇÃO TEMPORAL. ART. 31 DA
LEI Nº 10.865/04. INCONSTITUCIONALIDADE.
A limitação temporal do aproveitamento dos créditos
decorrentes das aquisições de bens para o ativo
imobilizado realizadas até 30 de abril de 2004, no regime
não-cumulativo do PIS e COFINS, ofende os princípios
constitucionais do direito adquirido, da irretroatividade
da lei tributária, da segurança jurídica e da não-surpresa.

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RE 599316 / SC

Declarada a inconstitucionalidade o art. 31 da Lei nº


10.865/05 pela Corte Especial deste Tribunal.

Conforme narra, na redação original das Leis nº


10.637/2002 e 10.833/2003, autorizou-se o creditamento em
relação aos ativos imobilizados adquiridos antes da entrada em
vigor da não cumulatividade, a despeito do fato de os bens
terem sofrido a incidência cumulativa do PIS e da COFINS,
cujas alíquotas gerais são inferiores — situação que veio a ser
corrigida pelo artigo 31 da Lei nº 10.865/2004.

Diz que o artigo 195, § 12, da Constituição Federal, ao


autorizar a não cumulatividade das contribuições, fê-lo de
maneira diversa da relativa ao Imposto sobre Produtos
Industrializados — IPI e ao Imposto sobre a Circulação de
Mercadorias e Serviços — ICMS, remetendo a disciplina
exclusivamente à lei.

Sustenta ausente desrespeito ao princípio da


irretroatividade, frisando que os créditos apurados em períodos
anteriores à vigência da norma não foram afetados. Destaca
constituir a faculdade legal direito de aquisição sucessiva,
obtido mensalmente, afirmando que a revogação não afronta o
artigo 5º, inciso XXXVI, da Lei Maior. Evoca precedentes do
Supremo nos quais assentada a inexistência de direito
adquirido a regime jurídico. Alfim, subsidiariamente, para o
caso de reconhecer-se a inconstitucionalidade, requer seja
limitado o alcance da decisão ao período posterior à entrada em
vigor das Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003.

A recorrida, em contrarrazões, aponta que o artigo 31,


cabeça, da Lei nº 10.865/2004 criou distinção injustificável entre
os contribuintes adquirentes de ativos imobilizados antes e
depois de abril de 2004, em ofensa ao princípio da isonomia
tributária. Diz inobservados os artigos 150, inciso IV, 170, inciso
IV, e 195, § 12, da Constituição Federal, ante a restrição ao

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crédito. Referindo-se ao fato de haver preenchido,


anteriormente à revogação, os pressupostos para usufruir o
direito ao creditamento, aponta violados o direito adquirido e o
ato jurídico perfeito.

O recurso foi admitido na origem.

O Supremo assentou a repercussão geral da matéria


constitucional.

A Procuradoria-Geral da República opina pelo


provimento do recurso em parecer assim sintetizado:

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. PIS/PASEP E


COFINS. DEDUÇÃO DE CRÉDITOS DECORRENTES DA
DEPRECIAÇÃO OU AMORTIZAÇÃO DE BENS
ADQUIRIDOS PARA COMPOR O ATIVO
IMOBILIZADO. LEIS N°S 10.637/2002 E 10.833/2003, ART.
3°, § 1°, III. EXCLUSÃO DO DIREITO À DEDUÇÃO DE
CRÉDITOS RELATIVOS AOS BENS ADQUIRIDOS ATÉ
30.04.2004. LEI N° 10.865/04, ART. 31, CAPUT:
CONSTITUCIONALIDADE.
1. O caput do art. 31 da Lei nº 10.865/04 excluiu
benefício fiscal do PIS e da COFINS concedido pelas Leis
n°s 10.637/02 e 10.833/03 ao restringir o direito à dedução
dos créditos decorrentes da depreciação ou amortização
de bens e direitos integrantes do ativo imobilizado
adquiridos até 30.4.2004.
2. A não-cumulatividade estabelecida para as
contribuições sociais pela EC n° 42/03 diverge da previsão
originária (IPI e ICMS), dependendo da definição do seu
conteúdo pela lei, de forma que a pretensa dedução de
créditos de PIS e COFINS não decorre de exigência
constitucional, mas sim de simples previsão legal.
Doutrina.
3. O caput do art. 31 da Lei n° 10.865/2004

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estabeleceu um termo a partir do qual seria admitido o


creditamento e, antes do qual, seria vedado.
4. A depreciação ou amortização de bens ou direitos
integrantes do ativo imobilizado é fato tributário
sucessivo, pois apurado mês a mês. O art. 31, caput, da Lei
nº 10.865/04 não atingiu os créditos já apurados na forma
do art. 3°, § 1°, III, das Leis n°s 10.637/2002 e 10.833/2003,
pois vedou, tão somente, os descontos dos créditos pela
depreciação ou amortização de bens e direitos do ativo
imobilizado adquiridos até 30.04.2004, a partir de 10 de
agosto de 2004, resguardando os créditos apurados pelos
encargos de depreciação ou amortização dos meses
anteriores. Ausência de violação ao princípio da
irretroatividade tributária (CF, art. 150, III, a).
5. Não há direito adquirido do contribuinte a
determinado regime jurídico-tributário, tampouco lhe é
garantido inalterabilidade do regime de concessão de
benefício fiscal de prazo indeterminado e não
condicionais. Precedentes.
6. Parecer pelo conhecimento e provimento do
recurso extraordinário.

O processo é eletrônico e encontra-se concluso.

É o relatório.

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VOTO

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) – Atendeu-


se aos pressupostos de recorribilidade. A peça, subscrita por Procurador
da Fazenda Nacional, foi protocolada no prazo legal.
As Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003, instituidoras da sistemática não
cumulativa da contribuição para o Programa de Integração Social — PIS e
da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social — COFINS,
autorizavam, até a entrada em vigor da Lei nº 10.865/2004, o desconto de
créditos relativamente aos encargos de depreciação e amortização de
determinados bens integrantes do ativo imobilizado. Transcrevo, para
fins de documentação, os dispositivos pertinentes da Lei nº 10.833/2003:

Art. 3º Do valor apurado na forma do art. 2º a pessoa


jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:
[...]
VI - máquinas, equipamentos e outros bens incorporados
ao ativo imobilizado adquiridos para utilização na produção de
bens destinados à venda, ou na prestação de serviços;
VII - edificações e benfeitorias em imóveis próprios ou de
terceiros, utilizados nas atividades da empresa;
[…]
§ 1º O crédito será determinado mediante a aplicação da
alíquota prevista no art. 2º sobre o valor:
[…]
III - dos encargos de depreciação e amortização dos bens
mencionados nos incisos VI e VII do caput, incorridos no mês;
[…]
Art. 15. Aplica-se à contribuição para o PIS/PASEP não-
cumulativa de que trata a Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de
2002, o disposto [...] nos incisos VI, VII e IX do caput e nos §§ 1º,
incisos II e III, 10 e 11 do art. 3º [...].

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Posteriormente, a Lei nº 10.865/2004 vedou o desconto de crédito no


tocante aos ativos imobilizados adquiridos até 30 de abril de 2004:

Art. 31. É vedado, a partir do último dia do terceiro mês


subseqüente ao da publicação desta Lei, o desconto de créditos
apurados na forma do inciso III do § 1º do art. 3º das Leis nºs
10.637, de 30 de dezembro de 2002, e 10.833, de 29 de dezembro
de 2003, relativos à depreciação ou amortização de bens e
direitos de ativos imobilizados adquiridos até 30 de abril de
2004.
§ 1º Poderão ser aproveitados os créditos referidos no
inciso III do § 1º do art. 3º das Leis nºs 10.637, de 30 de
dezembro de 2002, e 10.833, de 29 de dezembro de 2003,
apurados sobre a depreciação ou amortização de bens e direitos
de ativo imobilizado adquiridos a partir de 1º de maio.

Eis o que está em jogo: saber se a proibição ao creditamento está ou


não em harmonia com a Constituição Federal.
O Constituinte, diferentemente do alegado pela recorrente, não
deixou a critério do legislador o delineamento do regime não cumulativo
das contribuições. O artigo 195, § 12, da Lei Maior autorizou, tão somente,
a definição dos setores em relação aos quais as contribuições podem ser
não cumulativas. Estabelecidos os segmentos de atividade econômica,
cumpre ao legislador observar o princípio da não cumulatividade,
viabilizando a compensação sempre que gravada pelos tributos a
operação precedente.
É meia verdade o argumento de, sendo a receita fenômeno
individual, não poderem estar a contribuição para o PIS e a COFINS
sujeitas a regime de não cumulatividade semelhante ao do Imposto sobre
a Circulação de Mercadorias e Serviços — ICMS e ao do Imposto sobre
Produtos Industrializados — IPI. Tecnicamente, receita consiste na
diminuição do passivo ou no aumento de ativo, a resultar na ampliação
do patrimônio líquido. Como o auferimento de receita deriva de operação
econômica, surge pertinente, sem limitações, o princípio constitucional da
não cumulatividade, compensando-se na saída o montante devido e

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recolhido na entrada.
Ao simplesmente vedar o creditamento em relação aos encargos de
depreciação e amortização de bens do ativo imobilizado, afrontou o
legislador a não cumulatividade, incorrendo em vício de
inconstitucionalidade material.
A par disso, o dispositivo institui tratamento desigual entre
contribuintes em situação equivalente, ofendendo o princípio da
isonomia, revelado no artigo 150, inciso II, da Constituição Federal.
Quanto aos critérios para identificação do desrespeito à isonomia,
assim leciona o professor Celso Antônio Bandeira de Mello (Conteúdo
Jurídico do Princípio da Igualdade. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais.
1978, p. 27-28):

Parece-nos que o reconhecimento das diferenciações que


não podem ser feitas sem quebra da isonomia se divide em três
questões:
A) A primeira diz com o elemento tomado como fator de
desigualação;
B) A segunda reporta-se à correlação lógica abstrata
existente entre o fator erigido em critério de discrímen e a
disparidade estabelecida no tratamento jurídico diversificado;
C) A terceira atina à consonância desta correlação lógica
com os interesses absorvidos no sistema constitucional e
destarte juridicizados.
Esclarecendo melhor: Tem-se que investigar, de um lado,
aquilo que é adotado como critério discriminatório; de outro
lado, cumpre verificar se há justificativa racional, isto é,
fundamento lógico, para, à vista do traço desigualador
acolhido, atribuir o específico tratamento jurídico construído
em função da desigualdade proclamada. Finalmente, impende
analisar se a correlação ou fundamento racional abstratamente
existente é “in concreto”, afinado com os valores prestigiados
no sistema normativo constitucional. A dizer: se guarda ou não
harmonia com eles.
[…]

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Só a conjunção dos três aspectos é que permite a análise


correta do problema. Isto é: a hostilidade ao preceito isonômico
pode residir em quaisquer deles. Não basta, pois, reconhecer-se
que uma regra de direito é ajustada ao princípio da igualdade
no que pertine ao primeiro aspecto. Cumpre que o seja, também
com relação ao segundo e ao terceiro. É claro que a ofensa a
requisitos do primeiro é suficiente para desclassificá-la.
[…]

A ausência de fundamento lógico para a distinção é flagrante. Tome-


se como exemplo a hipótese de contribuinte adquirente de computadores,
os quais, segundo a Instrução Normativa nº 1.700/2017, da Receita
Federal do Brasil, possuem vida útil de 5 anos, devendo ser depreciados à
taxa de 20% ao ano. Se determinado contribuinte houver comprado as
máquinas no mês anterior à vigência da Lei nº 10.865/2004, poderá
creditar-se apenas em relação a 1,7% do valor dos bens – 20% ao ano =
1,7% ao mês. Já concorrente que tenha feito aquisição semelhante no mês
seguinte creditar-se-á no tocante a 100% do preço, considerada a
depreciação até o fim da vida útil. Inexiste razão aceitável para a
diferenciação, a não ser a finalidade arrecadatória.
Não se está a afirmar que há direito adquirido a regime jurídico. A
questão é de violação à isonomia. O regime jurídico do creditamento,
ressalvadas alterações pontuais, permaneceu o mesmo, tendo o legislador
apenas afastado o direito dos contribuintes que incorporaram bens ao
ativo imobilizado até 30 abril de 2004.
Houvesse fixado, como termo inicial para o direito ao creditamento,
o começo da sistemática da não cumulatividade – 1º de dezembro de
2002, para o PIS, e 1º de fevereiro de 2004, para a COFINS –, poder-se-ia
alegar a ausência de arbitrariedade na distinção. Ainda assim, o
argumento seria duvidoso. A aparente regra de transição afrontaria o
princípio da não cumulatividade, na medida em que a operação anterior
teria sido gravada pelos tributos, no regime cumulativo, às alíquotas
gerais de 0,65% e 3%, sendo cabível o crédito, tal como ocorreu
expressamente com os estoques de abertura – artigos 11 da Lei nº

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10.637/2002 e 12 da Lei nº 10.833/2003. Daí o motivo pelo qual não se pode


acolher o pedido sucessivo da União no sentido de limitar o direito a
crédito às aquisições posteriores à instituição da não cumulatividade. A
decisão, a pretexto de corrigir inconstitucionalidade, esbarraria em outra.
Conheço do recurso extraordinário e o desprovejo. Fixo como tese:
“Surge inconstitucional, por ofensa aos princípios da não cumulatividade
e da isonomia, o artigo 31, cabeça, da Lei nº 10.865/2004, no que vedou o
creditamento da contribuição para o PIS e da COFINS, relativamente ao
ativo imobilizado adquirido até 30 de abril de 2004”.

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VOTO

O Senhor Ministro Alexandre de Moraes: Trata-se de Recurso


Extraordinário interposto em face de acórdão proferido pelo Tribunal
Regional Federal da 4ª Região, no qual se discute o Tema 244 da
repercussão geral, que versa sobre Limitação temporal para o aproveitamento
de créditos de PIS E COFINS.

Na origem, a FRICASA ALIMENTOS S/A impetrou Mandado de


Segurança, com pedido de liminar, em face do Delegado da Receita
Federal de Joinville.
Sustenta, em síntese, que, para seu regular funcionamento, adquiriu
diversos bens para compor seu ativo permanente, quais sejam: máquinas,
equipamentos e outros bens utilizados na fabricação de produtos
destinados à venda, bem como a edificações e benfeitorias em seus
próprios imóveis. Realizou, ainda, despesas com empréstimos,
financiamentos e aluguéis.

Afirma que, de acordo com a legislação vigente à época (Lei


10.637/2002 e Lei 10.833/2003), tais despesas geram o creditamento das
contribuições do PIS e da COFINS. Veja-se a redação das normas, antes
da alteração promovida pela Lei 10.865/2004

“Lei 10.637/2002, art. 2º: Para determinação do valor da


contribuição para o PIS/Pasep aplicar-se-á, sobre a base de
cálculo apurada conforme o disposto no art. 1º, a alíquota de

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1,65% (um inteiro e sessenta e cinco centésimos por cento).


Art. 3º. Do valor apurado na forma do art. 2º a pessoa
jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:
[…]
V – despesas financeiras decorrentes de empréstimos,
financiamentos e contraprestações de operações de
arrendamento mercantil de pessoas jurídicas, exceto de optante
pelo Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e
Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno
Porte – SIMPLES;
VI - máquinas e equipamentos adquiridos para utilização
na fabricação de produtos destinados à venda, bem como a
outros bens incorporados ao ativo imobilizado;
VII - edificações e benfeitorias em imóveis de terceiros,
quando o custo, inclusive de mão-de-obra, tenha sido
suportado pela locatária;
[…]
§ 1º O crédito será determinado mediante a aplicação da
alíquota prevista no art. 2º sobre o valor:
II - dos itens mencionados nos incisos III a V do caput,
incorridos no mês;
III - dos encargos de depreciação e amortização dos bens
mencionados nos incisos VI e VII do caput, incorridos no mês;

Art. 68. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação,


produzindo efeitos:
[…]
II – a partir de 1º de dezembro de 2002, em relação aos
arts. 1º a 6º e 8º a 11.

Lei 10.833/2003, Art. 2º. Para determinação do valor da


COFINS aplicar-se-á, sobre a base de cálculo apurada conforme
o disposto no art. 1º, a alíquota de 7,6% (sete inteiros e seis
décimos por cento).
Art. 3º. Do valor apurado na forma do art. 2º a pessoa

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jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:


V - despesas financeiras decorrentes de empréstimos,
financiamentos e o valor das contraprestações de operações de
arrendamento mercantil de pessoa jurídica, exceto de optante
pelo Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e
Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno
Porte - SIMPLES;
VI - máquinas, equipamentos e outros bens incorporados
ao ativo imobilizado adquiridos para utilização na produção de
bens destinados à venda, ou na prestação de serviços;
VII - edificações e benfeitorias em imóveis próprios ou de
terceiros, utilizados nas atividades da empresa;
[…]
§ 1º. O crédito será determinado mediante a aplicação da
alíquota prevista no art. 2º sobre o valor:
II - dos itens mencionados nos incisos III a V e IX do caput,
incorridos no mês;
III - dos encargos de depreciação e amortização dos bens
mencionados nos incisos VI e VII do caput, incorridos no mês;

Art. 93. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação,


produzindo efeito, em relação:
I - aos arts. 1º a 15 e 25, a partir de 1º de fevereiro de 2004;

Prossegue informando que, posteriormente, sobreveio a Lei


10.865/2004 promovendo diversas alterações nas normas acima, entre as
quais:
(a) alteração do artigo 3º, V, da Lei 10.637/2002 e artigo 3º,
V, da Lei 10.833/2003, para suprimir o direito ao creditamento
do PIS/COFINS referente a empréstimos e financiamentos;
(b) vedação da constituição de créditos a partir 31 de julho
de 2004, relativos à depreciação ou amortização de bens e
direitos de ativos permanentes adquiridos até 30 de abril de
2004. Ou seja, com essa limitação temporal, apenas a depreciação
ou amortização dos bens e direitos do ativo permanente
adquiridos a partir de 1º de maio de 2004 poderiam constituir

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crédito do PIS/COFINS.

Veja-se, o teor do artigo 31 da Lei 10.865/2004:

“Art. 31. É vedado, a partir do último dia do terceiro mês


subseqüente ao da publicação desta Lei (31 de julho de 2004), o
desconto de créditos apurados na forma do inciso III do § 1º do
art. 3º das Leis nº s 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e 10.833,
de 29 de dezembro de 2003, relativos à depreciação ou
amortização de bens e direitos de ativos imobilizados
adquiridos até 30 de abril de 2004.
§ 1º Poderão ser aproveitados os créditos referidos no
inciso III do § 1º do art. 3º das Leis nº s 10.637, de 30 de
dezembro de 2002, e 10.833, de 29 de dezembro de 2003,
apurados sobre a depreciação ou amortização de bens e direitos
de ativo imobilizado adquiridos a partir de 1º de maio.
§ 2º O direito ao desconto de créditos de que trata o § 1º
deste artigo não se aplica ao valor decorrente da reavaliação de
bens e direitos do ativo permanente.
§ 3º É também vedado, a partir da data a que se refere o
caput, o crédito relativo a aluguel e contraprestação de
arrendamento mercantil de bens que já tenham integrado o
patrimônio da pessoa jurídica”.

Sustenta que as alterações promovidas pela Lei 10.865/2004


incorreram nas seguintes inconstitucionalidades:

(a) violação aos artigos 5º, caput e 150, II, ambos da


CF/1988, haja vista o tratamento anti-isonômico conferido às
empresas que adquiriram ativo permanente antes até 30 de
abril de 2004 em relação àquelas que adquiriram a partir de 1º
de maio de 2004;
(b) violação ao artigo 195, §12, da CF/1988, que prevê a
não-cumulatividade das contribuições sociais e ao artigo 150,
IV, que prevê a vedação ao confisco;
(c) violação à livre concorrência (art. 170, IV, da CF/1988);

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(d) violação ao direito adquirido e ato jurídico perfeito;

Ao final, requer a concessão da segurança, para determinar


aproveitamento dos créditos do PIS a partir de 1º de dezembro de 2002 e
os créditos da COFINS a partir de 1º de fevereiro de 2004. Portanto, sem
as limitações temporais impostas pelo artigo 31 da Lei 10.865/2004.

O juízo de primeiro grau concedeu a segurança (fl. 76, Vol. 1).


Interposta apelação pela União, o TRF-4 confirmou a sentença, nos termos
da seguinte ementa (fl. 152, Vol. 1):

“TRIBUTÁRIO. PIS. COFINS. APROVEITAMENTO DE


CREDITOS. LIMITAÇÃO TEMPORAL. ART. 31 DA LEI N°
10.865/04. INCONSTITUCIONALIDADE. A limitação temporal
I do aproveitamento dos créditos decorrentes das aquisições de
bens para o ativo imobilizado realizadas até 30 de abril de 2004,
no regime não-cumulativo do PIS e COFINS, ofende os
princípios constitucionais do direito adquirido, da
irretroatividade da lei tributária, da segurança jurídica e da
não-surpresa. Declarada a inconstitucionalidade o art. 31 da Lei
n° 10.865/05 pela Corte Especial deste Tribunal”.

A União interpôs o presente Recurso Extraordinário, com amparo no


artigo 102, III, “b”, da CF/1988, aos fundamentos de que:

(a) diferentemente do que ocorre com o IPI e o ICMS no


qual a Constituição determina a não-cumulatividade, o artigo
195, §12º, trouxe apenas autorização para que a lei instituísse o
regime não-cumulativo do PIS/COFINS para alguns setores da
atividade econômica;
(b) não há ofensa ao direito adquirido, irretroatividade ou
segurança jurídica, visto que quem se utilizou da faculdade
conferida pelo art. 3°, §1°, das Leis n° 10.637/02 e 10.833/03 e
mensalmente calculou créditos relativos aos percentuais admitidos na
legislação pela depreciação ou amortização de bens do seu ativo

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imobilizado tem esses seus cálculos completamente resguardados de


qualquer exigência fiscal. A Lei 10865/2004 não alberga receitas
auferidas antes de sua vigência; o que faz é reduzir o alcance das
hipóteses de abatimento. Assim, abate-se a depreciação e amortização
de bens "novos", mas não de bens "velhos". Tanto que o caput do
artigo 31 da Lei 10.865/2004 ressalvou claramente que a vedação
por ele instituída só se aplicaria "a partir do último dia do
terceiro mês subsequente ao da publicação desta Lei";
(c) não há direito adquirido a regime jurídico tributário; e
(d) caso esta CORTE entenda que houve violação ao
direito adquirido da impetrante, que a decisão se restrinja aos
bens adquiridos após a vigência do novo regime da não-
cumulatividade, de forma a evitar que bens adquiridos por
alíquota menor gerem direito a créditos por alíquota maior.

Em 5/2/2010, o Plenário Virtual desta CORTE reconheceu a


existência de repercussão geral da matéria posta sob debate.

A Procuradoria-Geral da República opinou pelo provimento do


recurso (Vol. 1, fl. 225).

É o relatório.

Trata-se de Recurso Extraordinário interposto em face de acórdão do


Tribunal Regional Federal da 4ª Região no qual se discute, em síntese, a
constitucionalidade do artigo 31 da Lei 10.865/2004, diante da limitação
da data para o aproveitamento de créditos do PIS/COFINS relacionados à
depreciação e amortização do ativo permanente.

Assiste razão à recorrente.

Inicialmente, convém registrar que o PIS e a COFINS surgiram no


ordenamento jurídico como tributos cumulativos.
Com a edição das Medidas Provisórias nº 66 de 29/8/2002 e 135 de
30/10/2003, convertidas respectivamente nas Leis 10.637/2002 e

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10.883/2003, tornaram-se tributos não-cumulativos.


Ou seja, desde então, tornou-se possível o creditamento quanto à
determinadas despesas, de modo a evitar a tributação em cascata.

Posteriormente, o regime não-cumulativo ganhou status


constitucional, com a edição da EC 42/2003, que inseriu o §12 no artigo
195 da Magna Carta.
CHRISTIANO MENDES WOLNEY VALENTE explica bem essa
alteração de regime:

“...as contribuições ao PIS/Pasep e Cofins nasceram


cumulativas, pois incidiam sobre a receita bruta/faturamento
das empresas. Diante dos efeitos indesejados que a
cumulatividade causava (efeitos examinados no Capítulo “3”),
aos poucos foram introduzidas técnicas de dedução para
atenuar tais consequência das quais são exemplo o art. 1º, da
Lei n. 9.363/96 (criação do crédito presumido do IPI como
ressarcimento da carga tributária decorrente das contribuições
ao PIS/Pasep e Cofins incidentes na cadeia) e art. 1º, §4º e art. 3º,
§1º, II, da Lei n. 10.147/2000 ( possibilidade de utilização do
crédito presumido para a dedução das próprias contribuições
ao PIS/Pasep e Cofins no setor de importação e produção de
medicamentos)
A toda evidência, a utilização dessas técnicas parciais era
claramente insuficiente, o que levou o Poder Executivo a editar
inicialmente a Medida Provisória nº 66, de 29 de agosto de 2002
(BRASIL, 2012), que alterou a sistemática de cobrança da
contribuição para o PIS/Pasep para instituir a não-
cumulatividade dessa contribuição. A referida medida
provisória foi convertida na Lei. n. 10.367, de 30 de dezembro
de 2002 (BRASIL, 2012).
(...)
Posteriormente, a Medida Provisória n. 135, de 30 de
outubro de 2003 (BRASIL, 2012), esta convertida na Lei 10.833,
de 29 de dezembro de 2003 (BRASIL, 2012), instituiu a
sistemática de cobrança não-cumulativa para a Cofins, estando

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previsto o aproveitamento de créditos decorrentes da aquisição


de insumos em seu art. 3º, inciso II, com redação idêntica àquela
já existente para a contribuição ao Pis/Pasep.
(...)
Em seguida, foi publicada em 31.12.2003 a Emenda
Constitucional n. 42/2003, de 19de dezembro de 2003 (BRASIL,
2012), que elevou a texto constitucional a possibilidade,
mediante lei, de cobrança não-cumulativa das contribuições
sociais incidentes sobre a receita ou faturamento (situação da
contribuição para o Pis/Pasep e da Cofins), por setores de
atividade econômica, através da inserção do §12 ao art. 195”.
(Pis/Pasep e Cofins Não-Cumulativos, Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2016, p. 123-126)

Como visto, a não-cumulatividade constitui técnica que impede a


tributação em cascata (múltipla incidência do tributo) sobre uma mesma
atividade econômica.

Diferentemente do que ocorre com o IPI e o ICMS, em que a


Constituição Federal impõe a observação do regime da não-
cumulatividade (arts. 153, §3º, II e 155, §2º, I, da CF/1988,
respectivamente), nas contribuições sociais houve mera autorização
constitucional para a instituição desse regime em determinados setores
da atividade econômica, conforme §12 do artigo 195 da Constituição
Federal, incluído pela Emenda Constitucional 42/2003:

“Art. 195, § 12. A lei definirá os setores de atividade


econômica para os quais as contribuições incidentes na forma
dos incisos I, b; e IV do caput, serão não-cumulativas.
(Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)”

Assim, as Leis 10.637/2002 e 10.833/2003, que instituíram o regime da


não-cumulatividade para as contribuições ao PIS e à COFINS relativos a
determinadas despesas, não decorrem de imposição constitucional, até
porque sequer havia sido introduzido o §12º do artigo 195 da CF/1988.

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Dentre as exações submetidas ao regime da não-cumulatividade


encontram-se as despesas previstas no incisos VI e VII do artigo 3º das
Leis 10.637/2002 (PIS) e 10.833/2003 (COFINS), cujas redações são
idênticas, na qual a pessoa jurídica poderá constituir crédito nas
operações seguintes quanto às despesas com o ativo imobilizado (VI -
máquinas, equipamentos e outros bens incorporados ao ativo imobilizado
adquiridos para utilização na produção de bens destinados à venda, ou
na prestação de serviços; e VII - edificações e benfeitorias em imóveis
próprios ou de terceiros, utilizados nas atividades da empresa).

No entanto, o artigo 3º, §1º, III, dessas leis (cujas redações também
são idênticas) disciplinam que, quanto aos encargos com depreciação e
amortização relacionadas aos incisos VI e VII, o crédito será determinado
mediante a aplicação da alíquota correspondente (1,65% para o PIS e 7,6%
para a COFINS), incorridos no mês.

Quanto ao PIS, a Lei 10.637/2002 determinou que seus efeitos


vigorariam a partir de 1º de dezembro de 2002; quanto à COFINS, a Lei
10.833/2003 previu que seus efeitos vigorariam a partir de 1º de fevereiro
de 2004.

Posteriormente, sobreveio o artigo 31 da Lei 10.865/2004, dispondo


que, quanto aos encargos com depreciação e amortização dos bens
adquiridos para o ativo permanente até 30 de abril (com máquinas,
equipamentos e outros bens incorporados ao ativo imobilizado
adquiridos para utilização na produção de bens destinados à venda, ou
na prestação de serviços; edificações e benfeitorias em imóveis próprios
ou de terceiros, utilizados nas atividades da empresa), é vedado o
desconto de crédito a partir de 31 de julho de 2004. Veja-se:

“Art. 31. É vedado, a partir do último dia do terceiro mês


(diga-se, 31 de julho de 2004) subseqüente ao da publicação desta
Lei, o desconto de créditos apurados na forma do inciso III do §

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1º do art. 3º das Leis nº s 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e


10.833, de 29 de dezembro de 2003, relativos à depreciação ou
amortização de bens e direitos de ativos imobilizados
adquiridos até 30 de abril de 2004.
§ 1º Poderão ser aproveitados os créditos referidos no
inciso III do § 1º do art. 3º das Leis nº s 10.637, de 30 de
dezembro de 2002, e 10.833, de 29 de dezembro de 2003,
apurados sobre a depreciação ou amortização de bens e direitos
de ativo imobilizado adquiridos a partir de 1º de maio.
§ 2º O direito ao desconto de créditos de que trata o § 1º
deste artigo não se aplica ao valor decorrente da reavaliação de
bens e direitos do ativo permanente.
§ 3º É também vedado, a partir da data a que se refere o
caput, o crédito relativo a aluguel e contraprestação de
arrendamento mercantil de bens que já tenham integrado o
patrimônio da pessoa jurídica”.

Conforme relatado, o Tribunal de origem reputou inconstitucional


essa alteração temporal, aos fundamentos de que houve violação ao
direito adquirido, à segurança jurídica e à irretroatividade.

Entendo, porém, inexistir qualquer inconstitucionalidade apontada


pela decisão do Tribunal de origem.

Primeiramente, da letra do multicitado artigo 31 da Lei 10.865/2004


decorre que a limitação da data para creditamento do PIS/COFINS refere-
se à depreciação/amortização dos bens adquiridos para compor o ativo
permanente da pessoa jurídica. Logo, por óbvio, o encargo não se dá no
momento da aquisição e sim nos períodos subsequentes.

Verifica-se, portanto, que, quanto aos encargos com aquisição do


ativo imobilizado, não houve qualquer alteração na data para usufruir o
aproveitamento do crédito, ficando resguardados os direitos da
impetrante. Por outro lado, houve, limitação da data quanto à
depreciação e amortização do ativo permanente

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Ocorre que os encargos com depreciação e amortização,


evidentemente, não ocorrem no momento da aquisição do ativo
permanente e sim mês a mês, conforme dispõem os artigos 3º, §1º, III, das
Leis 10.637/2002 (PIS) e 10.833/2003 (COFINS), cuja redação, repita-se, não
idênticas:
“Art. 3º, § 1º. O crédito será determinado mediante a
aplicação da alíquota prevista no art. 2º sobre o valor:
III - dos encargos de depreciação e amortização dos bens
mencionados nos incisos VI e VII do caput (ativo imobilizado),
incorridos no mês;

Assim, a norma respeitou o crédito auferido pela impetrante quanto


à aquisição do ativo permanente, havendo limitação apenas quanto aos
encargos com depreciação e amortização.
Levando-se em consideração que a não-cumulatividade do
PIS/COFINS não decorre de imposição constitucional, e sim de
conformação da lei, entendo que a limitação imposta pelo artigo 31 da Lei
10.865/2004, encontra-se dentro do campo de liberalidade do legislador,
não havendo, dessa forma, qualquer violação ao direito adquirido, à
irretroatividade ou à segurança jurídica.

Some-se, ainda, que esta CORTE já consolidou o entendimento de


que inexiste direito adquirido a regime jurídico tributário. Nesse sentido,
veja-se o seguinte precedente:

“EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO


EXTRAORDINÁRIO. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA.
ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. EFEITOS.
DIREITO ADQUIRIDO. REGIME JURÍDICO. INEXISTÊNCIA.
Diante da constatação de que o sujeito passivo, antes reputado
imune, jamais deveria sê-lo, não há óbice que possa impedir a
Administração tributária de proferir ato declaratório no sentido
de afastar a desoneração. Este ato possui cunho,
inequivocamente, declaratório, na medida em que reconhece

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situação de direito desde sempre consolidada. Não obstante,


cumpre salientar que não existe um direito adquirido a regime
tributário beneficiado (RMS 27382 ED, Rel. Min. Dias Toffoli).
Agravo regimental a que se nega provimento” (RE 354870
AgR/RS, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, DJe.
02/02/2015)

Por todo exposto, dou provimento ao RE, para denegar a ordem.

Sugiro a seguinte tese: É constitucional a limitação temporal introduzida


pelo artigo 31 da Lei 10.865/2004.

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29/06/2020 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 599.316 S ANTA CATARINA

RELATOR : MIN. MARCO AURÉLIO


RECTE.(S) : UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL
RECDO.(A/S) : FRICASA ALIMENTOS S/A
ADV.(A/S) : JOÃO JOQUIM MARTINELLI E OUTRO(A/S)

O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (RELATOR):


Inicialmente, cumpre-me cumprimentar o nobre relator pelas
substanciosas razões de seu voto para, em seguida, delinear os contornos
fático-normativos da presente controvérsia, tendo em vista a função de
precedente que o presente recurso deve desempenhar para todo o sistema
judicial pátrio, por isso se revela necessário a explicitação do que está
posto em juízo e das razões de decidir que esta Suprema Corte adotará
para o deslinde do presente litígio constitucional.
Trata-se, aqui, de saber a constitucionalidade da limitação temporal
do direito à dedução dos créditos decorrentes da depreciação e
amortização de bens e direitos integrantes do ativo imobilizado
adquiridos até 30 de abril de 2004, no regime não-cumulativo do PIS e
COFINS ante eventual ofensa aos princípios constitucionais do direito
adquirido, da irretroatividade da lei tributária, da segurança jurídica e da
não-surpresa.
O benefício fiscal de creditamento de PIS e Cofins previsto no art.3º,
§1º, III, das Leis n.10.637/02 e 10.833/03, respectivamente, foi derrogado
pelo caput do artigo 31 da Lei n. 10.865/04 ao vedar os descontos dos
créditos pela depreciação e amortização de bens e direitos do ativo
imobilizado adquiridos até 30 de abril de 2004, a partir de 1º de agosto de
2004. Simultaneamente, o §1º do dispositivo previu igual direito de
creditamento para bens e direitos que venham a integrar o ativo
imobilizado a partir de 1º de maio.
O Tribunal Regional Federal da 4ªregião (TRF4) firmou posição pela
inconstitucionalidade do dispositivo em decisão que restou assim
ementada:

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TRIBUTÁRIO. PIS. COFINS. APROVEITAMENTO DE


CRÉDITOS. LIMITAÇÃO TEMPORAL. ART.31 DA LEI
N.10.865/04. INCONSTITUCIONALIDADE.
A limitação temporal do aproveitamento dos créditos
decorrentes das aquisições de bens para o ativo
imobilizado realizadas até 30 de abril de 2004, no regime
não-cumulativo do PIS e COFINS, ofende os princípios
constitucionais do direito adquirido, da irretroatividade da
lei tributária, da segurança jurídica e da não-surpresa.
Declarada a inconstitucionalidade o art.31 da Lei
n.10.865/05 pela Corte Especial deste Tribunal.
(…)

Irresignada com a decisão a União interpõe o presente Recurso


Extraordinário no qual sustenta, em síntese: 1) a inexistência de ofensa ao
princípio da irretroatividade, uma vez que os atos praticados antes da
entrada em vigor da Lei n° 10.865/04 não foram por ela afetados; 2)
ausência de ofensa à segurança jurídica, visto que "o próprio 'caput' do
art. 31 da Lei nº 10.865/04 ressalvou claramente que a vedação por ele
instituída só se aplicaria 'a partir do último dia do terceiro mês
subseqüente ao da publicação desta Lei'", respeitando a anterioridade
nonagesimal; 3) que o direito ao creditamento pela depreciação dos bens
do ativo imobilizado não pode ser reputado propriamente um direito
adquirido, mas, sim, um direito de aquisição sucessiva e, assim, "havendo
uma alteração na legislação de regência da matéria, a regra a ser
observada não é o seu afastamento, mas, ao contrário, a sua aplicação
imediata".
Em contrarrazões, a parte recorrida sustenta, em síntese: 1) que "com
a restrição dos créditos enumerados, houve afronta à igualdade na
medida em que há tratamento díspar em relação às empresas que fizeram
investimentos de expansão de planta industrial antes de abril de 2004 -
como é o caso da Apelada - comparando-se com suas concorrentes que

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fizeram as mesmas espécies de investimento a partir de abril de 2004"; 2)


que "a nova legislação é incapaz de atribuir caráter não-cumulativo à
COFINS e ao PIS, visto que apenas concede direito de crédito sobre
algumas despesas efetuadas por algumas espécies de contribuintes"; 3)
que a sistemática de recolhimento criada pelas leis 10.833/2003 e
10.865/2004 "representa um aumento confiscatório de tributos, que deve
ser combatido pelo Poder Judiciário"; 4) violação à livre concorrência,
diante do tratamento desigual promovido pela restrição de creditamento;
5) que "ao se vedar os créditos sobre depreciações de qualquer ativo
imobilizado adquirido antes de abril de 2004 além das outras benesses,
não observou o legislador o direito já adquirido pelo contribuinte"; 6)
violação ao ato jurídico perfeito, dado que as leis concedentes de tais
benesses vigeram validamente não podendo as leis novas prejudicar sua
situação.
Diante das diferentes ordens de argumentação veiculadas tanto pela
recorrente quanto recorrida atinentes às razões de (i) justiça fiscal: não-
cumulatividade, isonomia e neutralidade tributária e, por conseguinte de
(ii) segurança jurídica: violação ao direito adquirido, irretroatividade e
proteção da confiança na revogação do benefício fiscal ora em exame
procede-se ao enfrentamento a partir dessas diferentes perspectivas na
sequência.

i) Da não-cumulatividade no PIS/COFINS e isonomia tributária:

De acordo com as lições do professor de Direito Tributário da UFMG


André Mendes Moreira, haure-se da normatividade constitucional o
seguinte acerca da não-cumulatividade da PIS/COFINS:

“(a) a contribuição para o PIS e a COFINS, sobre a


receita e sobre a importação, poderão continuar sendo
cobradas na forma cumulativa, ficando ao alvedrio do
legislador optar pela não-cumulatividade; (b) se o
legislador fizer a opção, a não-cumulatividade do

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PIS/COFINS somente será aplicável aos setores


definidos na lei.” (A Não-cumulatividade dos
Tributos. 2 ed. São Paulo: Noeses,p. 245)

Visto isso, torna-se patente que a finalidade das contribuições


discutidas é auferir receita pública em face da manifestação de riqueza
decorrente da renda. Ademais, resulta da vontade constituinte desonerar,
em termos tributários, determinados setores ou atividades econômicas
elegidos pelo Poder legiferante, evitando-se o “efeito em cascata” na
tributação.
Dessa análise, também se verifica que a não-cumulatividade do PIS e
da COFINS decorre da legislação infraconstitucional, ao contrário do que
se passa com o IPI e o ICMS. Outra diferença entre as contribuições e
esses impostos sobre o consumo se dá pela técnica em que o princípio da
não-cumulatividade se concretiza, pois se compreende do escólio de
Leandro Paulsen e Andrei Pitten Velloso que “no caso do PIS/PASEP e da
COFINS, não há creditamento de valores destacados nas operações anteriores,
mas apuração de créditos calculados em relação a despesas com bens e serviços
utilizados na sua atividade econômica”1.
Ante essas elucidações, dada a liberdade do legislador
infraconstitucional (THOMÉ, Fabiana Del Padre. Natureza Jurídica da
Não-cumulatividade da Contribuição ao PIS/PASEP e da COFINS:
Consequências e aplicabilidade. In: FISCHER, Octávio Campo; PEIXOTO,
Marcelo Magalhães. PIS/COFINS: Questões atuais e polêmicas. SP:
Quartier Latin, 2005, p.547.), parece inconsistente juridicamente a contra-
argumentação da recorrida no sentido de que a inovação legislativa do
caput do art.31, da Lei n.10.865/04, representa ofensa a não-
cumulatividade e do princípio no não-confisco vez que a supressão do
creditamento encontra-se no legítimo âmbito de exercício de política
fiscal pela União.
Também não prosperam os argumentos trazidos pela contribuinte,
ora recorrida, de violação ao princípio da isonomia e da livre-
concorrência, vez que “reinstituído” o benefício a partir de 1º de maio

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enquanto vedado no caput creditamento da depreciação e amortização


para aquisições realizadas até 30 de de abril de 2004.
A alegação de violação ao princípio da isonomia não prospera dada
a validade do discrímen adotado no citado dispositivo legal; o que está na
razão direta da garantia da isonomia, pois a igualdade se dá entre
contribuintes que procederam a apropriação do crédito na mesma época
em que as aquisições foram contabilizadas.
Demais disso, é pacifico o entendimento do Supremo Tribunal
Federal no sentido de que não cabe ao Poder Judiciário imiscuir-se no
mérito das políticas fiscais para equiparar contribuintes com a
uniformização de alíquotas, com base no princípio da isonomia, uma vez
que não dispõe tipicamente de função legislativa.
Confiram-se, a propósito, os seguintes precedentes:

“AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE


INSTRUMENTO. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO
DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. PIS E
COFINS. EQUIPARAÇÃO DE REGIMES. PRINCÍPIO DA
ISONOMIA. IMPOSSIBILIDADE. Nos termos da
orientação firmada nesta Corte, cabe à parte agravante
impugnar todos os fundamentos da decisão agravada, o
que não ocorreu no presente recurso. A previsão de
estabelecimento de diferentes regimes tributários pela Lei
nº 10.637/2002, de modo a limitar deduções da base de
cálculo do PIS e da COFINS a determinado grupo de
empresas, não implica ofensa ao princípio da isonomia.
Não cabe ao judiciário imiscuir-se no mérito das decisões
políticas adotadas pelo legislador e pela Administração
tributária. Agravo regimental a que se nega provimento.”
(AI 837957 AgR, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, Primeira
Turma, DJe 19.05.2014)

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO

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EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. PIS E COFINS.


EQUIPARAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO. ISONOMIA.
IMPOSSIBILIDADE DE O PODER JUDICIÁRIO ATUAR
COMO LEGISLADOR POSITIVO. PRECEDENTES.
AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA
PROVIMENTO. Ausência de repercussão geral da questão
constitucional (RE 585.740-RG, Rel. Min. Menezes Direito,
DJe 22.8.2008).” (RE 410515 AgR, Rel. Min. CÁRMEN
LÚCIA, Primeira Turma, DJe 1º.07.2009)

“TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O


LUCRO LÍQUIDO. TRIBUTOS. ALÍQUOTAS
DIFERENCIADAS. INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS.
PRINCÍPIO DA ISONOMIA. SUPRESSÃO OU
EQUIPARAÇÃO. PODER JUDICIÁRIO. ATUAÇÃO
COMO LEGISLADOR POSITIVO. IMPOSSIBILIDADE.
AGRAVO IMPROVIDO. I - É defeso ao Poder Judiciário,
com base no princípio da isonomia, atuar na condição
anômala de legislador positivo para suprimir ou equiparar
as alíquotas de tributos recolhidos pelas instituições
financeiras em relação àquelas suportadas pelas demais
pessoas jurídicas, uma vez que essa competência não lhe
foi deferida pela ordem constitucional. Precedentes. II -
Agravo regimental improvido.” (RE 335275 AgR-segundo,
Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma,
DJe 28.03.2011)

Superada a perspectiva de justiça fiscal, quanto à não-


cumulatividade e isonomia tributária, no sentido da insubsistência das
contrarrazões alinhadas pela contribuinte recorrida incumbe verificar, por
conseguinte, as razões de segurança jurídica presentes no caso ora em
exame.

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ii) Violação às regras de segurança jurídica: direito adquirido,


irretroatividade e proteção da confiança da norma tributária:

A ideia de segurança remonta aos primórdios da humanidade: o


Homo sapiens abandonou o nomadismo em busca de segurança.
Humberto Ávila, em feliz apresentação de sua tese de titularidade de
cátedra na Faculdade de Direito do Largo São Francisco (USP), sentencia
com propriedade que “o coroamento da ideia de segurança é, porém, o
Estado e, acima de tudo, triunfa o Direito (ÁVILA, Humberto. Teoria da
Segurança Jurídica. São Paulo: Malheiros, 2012, p.5)
No Direito Tributário, particularmente, o legislador constituinte e
complementar enunciaram uma série de normas com vistas à proteção da
confiança depositada pelo contribuinte em diferentes momentos da
exação tributária: desde a instituição do tributo a partir dos princípios
constitucionais da vedação da irretroatividade da norma tributária (art.
150, III, “a”), da anterioridade (art. 150, III, “b” e “c”) e da legalidade
tributária (art. 5º; 150, I e § 6º), confirmados e regulados pelo CTN ao
enunciar regras de interpretação e aplicação da legislação tributária (arts.
100, 105, 106, 108, § 1º) das regras de constituição do crédito tributário
mediante ato vinculado do lançamento511 (arts. 142, 144, 146)512 até a
dispensa legal do pagamento do tributo e sua eventual revogação (arts.
176 e 178).
Portanto, o estado de direito confere tutela ao contribuinte âmbito de
proteção aos benefícios fiscais muito além do princípio da legalidade e
irretroatividade tributária.
Nesse sentido Lucas Bevilacqua ao tratar segurança jurídica na
fruição dos incentivos fiscais: “Importante registrar desde já que um
Estado de Direito é muito mais do que um Estado sob a égide da lei; é um
Estado firmado no princípio da segurança jurídica, e seu consectário da
proteção da confiança, no qual deve vigorar o respeito ao ato jurídico
perfeito, a coisa julgada e ao direito adquirido (BEVILACQUA, Lucas.
Incentivos fiscais de ICMS e desenvolvimento regional. São Paulo:
IBDT/Doutrina tributária, 2013, p.232).

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Em contrarrazões sustenta a contribuinte violação ao direito


adquirido considerando que a aquisição dos bens e direitos para o ativo
imobilizado a permitir seu creditamento se realizou antes da alteração
legislativa do caput do art.31, da Lei 10.865/04.
Importante relembrar as lições de Marco Aurélio Greco, transcritas
no parecer da Procuradoria Geral da República, no sentido de que o
direito ao creditamento não surge quando da aquisição, mas, sim da
depreciação ou amortização desses bens ou direitos incorrida no mês
(GRECO, Marco Aurélio. Não-cumulatividade no PIS e na Cofins. Revista
Fórum de Direito Tributário –RFDT. Belo Horizonte, n. 12, ano 2,
novembro/dezembro. 2004).
Ademais, este Eg. STF tem jurisprudência assente no sentido de que
não há direito adquirido em face da alteração de regime jurídico; o que
aplica-se, também, às relações jurídicas tributárias.
Noutras palavras, é certo que não há direito adquirido a regime
tributário, assim uma vez modificada ou suprimida a lei, o novel diploma
legal deve ter sua aplicação garantida a partir de sua vigência.
Por óbvio, regras de transição não geram direitos subjetivos ao
contribuinte, não obstante se traduzam em compromissos do Poder
Público para com a segurança jurídica em matéria tributária.
Por sua clareza, torna-se necessária nova reprodução de excerto da
doutrina de André Mendes Moreira:

“(...) o legislador é livre para, a partir de uma data


previamente fixada, modificar o regime de tributação,
transferindo o contribuinte do sistema cumulativo para o
não-cumulativo. O direito ao desconto de créditos somente
surgirá com as despesas incorridas após o início da
vigência do novo regime.”(A Não-cumulatividade dos
Tributos. 2 ed. São Paulo: Noeses, p. 478)

Por razões análogas não há, assim, direito adquirido ao creditamento


diante da alteração do regime jurídico na aquisição de descontos de

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depreciação e amortização de bens e direitos para o ativo imobilizado


dada sua própria natureza de benefício fiscal.
A ausência de direito adquirido do contribuinte não implica, no
entanto, que a expectativa de fruição do benefício fiscal não encontre
guarida em razões outras de segurança jurídica, com destaque para
irretroavidade tributária e à proteção da confiança.
A irretroatividade é princípio geral do direito ao que,
inclusive, prescindira previsão expressa entre as vedações ao poder de
tributar considerando o previsto no art.5.º, XXXVI, da CF/1988. No
entanto, tal foi o âmbito de proteção pretendido pelo Constituinte que o
art. 150 possui a seguinte redação:

"Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias


asseguradas ao contribuinte, é vedado à União,
aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios: (…) III - cobrar tributos: a) em
relação a fatos geradores ocorridos antes do
início da vigência da lei que os houver instituído
ou aumentado".

Misabel Abreu Machado Derzi leciona que no Direito


Tributário Alemão a irretroatividade em matéria tributária é extraída do
conceito de Estado de Direito que conforme antes registrado tem
compreensão muito além da lei. Ainda em análise comparada leciona a
Professora da UFGM que para a doutrina italiana há fundamentos da
irretroatividade tributária no princípio da capacidade contributiva, o qual
apenas pode ser concebido, de forma concreta e atual, se existente no
momento da ocorrência do fato jurídico.
A partir desse vasto âmbito de compreensão da
irretroatividade tributária a mitigar o conceito central da irretroatividade
surge a distinta compreensão da retroatividade própria ou autêntica e a
retroatividade imprópria.
Na primeira situação, a retroatividade autêntica se

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apresenta quando a lei alcança fatos e relações jurídicas inteiramente


ocorridos no passado, ou seja, anteriormente à sua vigência. De modo
notório, essa retroatividade é vedada por afrontar a segurança jurídica; o
que não ocorre no caso aqui em exame. No entanto, não é o que se
verifica quanto à segunda situação da retroatividade imprópria.
De acordo com a Fazenda Nacional, ora recorrente, a
retroatividade imprópria permitiria a aplicação de lei nova sobre os
efeitos presentes (creditamento) de fatos ocorridos (aquisição) antes do
seu surgimento; o que não encontraria vedação na Constituição de 1988.

Considerando a didática da Profa. Misabel Abreu


Machado Derzi oportuno revisitar seus ensinamentos a propósito da
gênese e aplicação da teoria da irretroativiade imprópria nas relações
jurídicas tributárias:

"(...) a afronta ao fato jurídico perfeito, segundo o


entendimento do STF, se deu por meio da modificação
dos efeitos já desencadeados pelo fato, atingindo-o de
forma indireta. É inequívoca a correção desse
pensamento, do ponto de vista lógico-jurídico. (...) o
fato gerador é uma categoria funcional que se explica
na medida em que produza efeitos jurídicos. Mudados
os efeitos a serem desencadeados pelo fato jurídico
(nascimento de uma obrigação em dinheiro, pelo seu
valor nominal, ou seja, sem correção monetária), ou já
desencadeados (retroativamente), altera-se o próprio
fato, pois a relação de implicação lógica entre a
hipótese e conseqüência - segundo a qual, dado um
fato 'A', será a conseqüência (então, deve ser 'C') - é
recíproca e intensiva. Isso significa que, se não é 'C'
(senão ocorrem os mesmos efeitos anteriores da
conseqüência), então não 'A', o fato gerador será outro,
alterado". (DERZI, Misabel Abreu Machado. "O

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princípio da irretroatividade do direito na Constituição


e no Código Tributário Nacional (LGL\1966\26)".
Revista de Direito Tributário, vol. 67, São Paulo,
Malheiros, p.242)

Nessa perspectiva, utilizando o exemplo acima como


modelo para análise da Lei 10.865/2004, na limitação temporal ao
creditamento de PIS/Cofins aos bens integrantes do ativo imobilizado,
verifica-se que, alterando os efeitos do fato jurídico (existência de bens
registrados no ativo imobilizado geradores de encargos de depreciação e
amortização) com vistas a retirar-lhe o poder de gerar créditos das
referidas contribuições, a situação pretérita está sendo atingida, não
somente seus efeitos, tratando-se na hipótese de irretroatividade
imprópria incompatível com o âmbito de proteção da confiança.
(OLIVEIRA, Gustavo Goiabeira. A vedação aos créditos de PIS/Cofins
imposta pela Lei n.10.865/2004: violação ao princípio da irretroatividade.
Revista Tributária e de Finanças Públicas. vol.58/2004, p.146-162. Set-
out/2004.)
Na doutrina pátria, bons trabalhos indicam a proteção da
confiança como princípio inerente à segurança jurídica e ao princípio da
moralidade, que determina que o Poder Público deve sempre proceder de
boa fé (COUTO E SILVA, Almiro. O problema da segurança jurídica
(Proteção da Confiança) no Direito Público brasileiro e o direito da
administração pública de anular seus próprios atos administrativos: o
prazo decadencial do art. 54 da Lei do Processo Administrativo da União
(Lei n. 9.784/99). Revista de Direito Administrativo, n. 237, p. 271–315,
2004; ARAÚJO, Valter Shuenquener de. O princípio da proteção da
confiança: uma nova forma de tutela do cidadão diante do Estado. Rio de
Janeiro: Impetus, 2009.)
O próprio STF reconhece em sua jurisprudência a proteção da
confiança como um elemento do princípio da segurança jurídica
(Mandado de Segurança. MS 22.357, Relator(a): Min. Gilmar Mendes,
Tribunal Pleno, julgado em: 27.05.2004, DJ: 05.11.2004.)

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Para Humberto Ávila, “para existir proteção da confiança é preciso


que o particular tenha confiado na base da confiança”.De acordo com
Ávila o grau de proteção será diretamente proporcional ao grau da
presença dos elementos normativos pertinentes à situação de fato a seguir
indicados: vinculatividade (1), aparência de legitimidade do ato (2),
modificabilidade (3), indução (4), individualidade (5), onerosidade (6) e
efetividade (7). (ÁVILA, Humberto. Teoria da Segurança Jurídica. São
Paulo: Malheiros, 2012, p.397)
Entre os elementos normativos indicados vale destaque à função
indutora (4) da norma tributária que veicula o benefício fiscal ao
contribuinte PIS/Cofins em proceder o creditamento na depreciação e
amortização das aquisições de bens do ativo imobilizado.
Luís Eduardo Schoueri quem de modo inédito tratou da norma
tributária indutora reconhece o emprego das contribuições sociais como
instrumento de intervenção econômica (SCHOUERI, Luís Eduardo.
Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Rio de Janeiro:
Forense, 2007, p.194).
O benefício fiscal previsto o art.3º, §1º, III, das Leis 10.637/2002 e
10.833/2003, tem nítido caráter indutor na medida em que fomenta o
agente produtivo a promover a modernização do parque fabril com
aquisição e troca de suas máquinas e equipamentos na medida em que
assegurado-lhe creditamento referente à depreciação e amortização dos
bens do ativo imobilizado.
Nessa perspectiva, presentes razões de segurança jurídica para
assegurar creditamento referente à depreciação e amortização de bens e
direitos do ativo imobilizado adquiridos até 30 de abril de 2004.
Ante o exposto, conclui-se que, muito embora inexistente violação ao
princípio da não-cumulatividade, igualmente, à direito adquirido, o
art.31, caput, da Lei n.10865/04, viola isonomia, a irretroatividade e
proteção à confiança da norma tributária ao que conheço do recurso
extraordinário e nego provimento.

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29/06/2020 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 599.316 S ANTA CATARINA

RELATOR : MIN. MARCO AURÉLIO


RECTE.(S) : UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL
RECDO.(A/S) : FRICASA ALIMENTOS S/A
ADV.(A/S) : JOÃO JOQUIM MARTINELLI E OUTRO(A/S)

VOTO

O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI (PRESIDENTE):


Trata-se de recurso extraordinário interposto pela União, com
fundamento na letra b do permissivo constitucional, contra acórdão
mediante o qual o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, com base em
julgado de sua Corte Especial, reconheceu a inconstitucionalidade do art.
31 da Lei nº 10.865/04.
O caput do dispositivo instituiu limitação temporal para o
aproveitamento dos créditos de PIS/COFINS, no regime não cumulativo,
relativamente às aquisições de bens para o ativo imobilizado realizadas
até 30 de abril de 2004. Para a Corte de origem, a medida violou o direito
adquirido, a irretroatividade tributária, a segurança jurídica e a não
surpresa.
O julgado foi assim ementado:

“TRIBUTÁRIO. PIS. COFINS. APROVEITAMENTO DE


CRÉDITOS. LIMITAÇÃO TEMPORAL. ART. 31 DA LEI Nº
10.865/04. INCONSTITUCIONALIDADE.
A limitação temporal do aproveitamento dos créditos
decorrentes das aquisições de bens para o ativo imobilizado
realizadas até 30 de abril de 2004, no regime não-cumulativo do
PIS e COFINS, ofende os princípios constitucionais do direito
adquirido, da irretroatividade da lei tributária, da segurança
jurídica e da não-supresa.
Declarada a inconstitucionalidade [d]o art. 31 da Lei nº

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RE 599316 / SC

10.865/0[4] pela Corte Especial deste Tribunal.”

Transcrevo o teor do art. 31 da Lei nº 10.865/04:

“Art. 31. É vedado, a partir do último dia do terceiro mês


subseqüente ao da publicação desta Lei, o desconto de créditos
apurados na forma do inciso III do § 1º do art. 3º das Leis nº s
10.637, de 30 de dezembro de 2002, e 10.833, de 29 de dezembro
de 2003, relativos à depreciação ou amortização de bens e
direitos de ativos imobilizados adquiridos até 30 de abril de
2004.
§ 1º Poderão ser aproveitados os créditos referidos no
inciso III do § 1º do art. 3º das Leis nº s 10.637, de 30 de
dezembro de 2002, e 10.833, de 29 de dezembro de 2003,
apurados sobre a depreciação ou amortização de bens e direitos
de ativo imobilizado adquiridos a partir de 1º de maio.
§ 2º O direito ao desconto de créditos de que trata o § 1º
deste artigo não se aplica ao valor decorrente da reavaliação de
bens e direitos do ativo permanente.
§ 3º É também vedado, a partir da data a que se refere o
caput, o crédito relativo a aluguel e contraprestação de
arrendamento mercantil de bens que já tenham integrado o
patrimônio da pessoa jurídica.”

No recurso extraordinário, a União defende, em essência, que o


dispositivo declarado inconstitucional não é retroativo nem viola a
segurança jurídica ou qualquer direito adquirido dos contribuintes.
O presente caso é paradigma do Tema nº 244 do sistema de
repercussão geral, o qual possui o seguinte título: “limitação temporal
para o aproveitamento de credito de PIS e COFINS”.
Pela União falou a Dra. Flávia Palmeira de Moura Coelho; pela
Fricasa Alimentos S/A, o Dr. Carlos Eduardo Domingues Amorim.
É o relatório.
O Relator, Ministro Marco Aurélio, nega provimento ao recurso
extraordinário e sugere a fixação da seguinte tese de repercussão geral:

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RE 599316 / SC

“Surge inconstitucional, por ofensa aos princípios da não


cumulatividade e da isonomia, o artigo 31, cabeça, da Lei nº
10.865/2004, no que vedou o creditamento da contribuição para
o PIS e da COFINS, relativamente ao ativo imobilizado
adquirido até 30 de abril de 2004.”

Em suma, Sua Excelência entende que o referido art. 31, caput, da


Lei nº 19.865/2005 viola a sistemática da não cumulatividade e o princípio
da isonomia.
Abriu divergência o Ministro Alexandre de Moraes, dando
provimento ao recurso extraordinário, denegando a ordem e sugerindo a
tese de que “[é] constitucional a limitação temporal introduzida pelo
artigo 31 da Lei 10.865/2004”.
Peço vênia para divergir do Relator, Ministro Marco Aurélio, e, em
parte, do Ministro Alexandre de Moraes.
De início, cumpre recordar que Corte tem entendido que o art. 195, §
12, da Constituição Federal conferiu boa liberdade para que o legislador
possa tratar do regime não cumulativo de cobrança do PIS/COFINS. Em
razão disso, pode-se concluir ter ele também a possibilidade de restringir
a concessão de créditos em determinadas situações. Vejamos alguns
julgados que corroboram isso.
No exame do RE nº 607.642/RJ, em que se discute se as empresas
prestadoras de serviços devem se submeter ao PIS/COFINS não
cumulativos, me manifestei sobre aquele dispositivo constitucional e
sobre as Leis nºs 10.637/02 e 10.833/04:

“Sob a minha óptica, o § 12 do art. 195 da Constituição


autoriza a coexistência dos regimes cumulativo e não
cumulativo. Ademais, o texto da EC 42/03, ao cuidar da matéria
quanto ao PIS/Cofins, referiu, apenas, que a lei definirá os
setores de atividade econômica para os quais as contribuições
serão não cumulativas, deixando de registrar a fórmula que
serviria de ponto de partida à interpretação do regime.

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
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RE 599316 / SC

Diferentemente do IPI e do ICMS, não há no texto


constitucional a escolha dessa ou daquela técnica de incidência
da não cumulatividade das contribuições sobre o faturamento
ou a receita.
(...)
Parece ser consenso, na doutrina, que as Leis nºs 10.637/02
e 10.833/03 criaram um critério próprio de operacionalização da
não cumulatividade que não corresponde, na íntegra, a nenhum
dos métodos tradicionais de cálculo da não cumulatividade dos
tributos sobre o valor agregado (base sobre base ou tributo
sobre tributo). Embora a maioria dos doutrinadores extraia das
leis instituidoras a intenção de adotar uma técnica próxima da
’base sobre base’5, é recorrente a assertiva de que o legislador,
na técnica de apuração não cumulativa da base de cálculo das
contribuições PIS/Cofins, inaugura um regime todo novo,
autônomo em relação tanto à forma preexistente de cálculo
dessas contribuições como aos modelos de não cumulatividade
por todos nós conhecidos e empregados na circulação
plurifásica do IPI e do ICMS, superando o regime do crédito
escritural.
(...)
Na disciplina inaugurada pelas Leis nºs 10.637/02 e
10.833/03, para mim, o que parece ser assente é que não se
assimilou, por inteiro, os métodos tradicionais de cálculo sobre
o ’valor agregado’. A opção do legislador foi de negar o crédito
em determinadas hipóteses e concedê-los em outras de forma
genérica ou restritiva. No rol dos créditos passíveis de
aproveitamento verificamos desde (i) bens e serviços, utilizados
como insumo na prestação de serviços e na produção ou
fabricação de bens ou produtos destinados à venda (art. 3º, II);
(ii) máquinas, equipamentos e outros bens incorporados ao
ativo imobilizado, adquiridos ou fabricados para locação a
terceiros, ou para utilização na produção de bens destinados à
venda ou na prestação de serviços (art. 3º, VI); até outras
deduções e créditos presumidos, como, por exemplo, aqueles
concedidos à importação e à produção de produtos

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RE 599316 / SC

farmacêuticos.
O modelo legal, em sua feição original, abstratamente
considerado, embora complexo e confuso, mormente quanto às
técnicas de deduções (crédito físico, financeiro e presumido) e
aos itens admitidos como créditos, não atenta, a priori, contra o
conteúdo mínimo de não cumulatividade que pode ser
extraído do art. 195, § 12, da Constituição” (grifo nosso).

Por ser concernente ao caso, também destaco a seguinte passagem


do voto proferido pelo Ministro Roberto Barroso no julgamento do RE nº
570.122, em que também se discutiu o regime não cumulativo de
cobrança do PIS/COFINS:

“14. Dito isso, penso que devem ser destacadas três


premissas principais para o presente julgamento: (i) ao
contrário do IPI e do ICMS não houve, por parte do
constituinte, a definição do conteúdo da não cumulatividade
aplicável ao PIS e a COFINS; (ii) a base econômica sobre a qual
incidem tais tributos (receita ou faturamento) não autoriza a
simples aplicação da noção de não cumulatividade tal qual
prevista para os imposto incidentes em cadeia; (iii) a Emenda
Constitucional nº 42/2003 veio para constitucionalizar uma
regra de não cumulatividade que já tinha previsão em lei
federal válida.
15. Desse conjunto de premissas, entendo que se deve
extrair como interpretação constitucionalmente adequada
aquela que conduza à conclusão que, no que diz respeito à não
cumulatividade da COFINS, o constituinte atribuiu ao
legislador ordinário uma ampla margem de discricionariedade
para definição desse regime de tributação. Mais que isso, em
verdade, constitucionalizou a opção efetuada pelo legislador
ordinário de criação de um regime de tributação mais favorável.
Desse modo, a Lei nº 10.833/2003 não contém nenhum vício de
inconstitucionalidade. Mesmo porque, a rigor, o que se chama
aqui de não cumulatividade da COFINS é a mera autorização
de dedução de diversas despesas da base de cálculo do tributo

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RE 599316 / SC

(receita) como forma de reduzir o impacto da carga tributária


sobre alguns contribuintes inseridos em cadeias longas de
produção e circulação de mercadorias” (grifo nosso).

À luz dessas considerações, pode-se dizer que o legislador, a priori,


pode modificar as normas que dizem respeito aos fatos que geram direito
a ser aproveitado no regime não cumulativo do PIS/COFINS.
No que diz respeito às demais normas constitucionais
(irretroatividade, segurança jurídica, não surpresa e isonomia), também
se verifica não ter havido violação de nenhuma delas.
Especialmente quanto ao objeto do recurso extraordinário, as Leis
nºs 10.637/02 e 10.833/03 previram que o contribuinte, no regime não
cumulativo do PIS/COFINS, poderia calcular créditos em relação a bens
adquiridos para o ativo imobilizado.
Note-se, no entanto, que esse crédito não decorria (e ainda não
decorre) da mera aquisição do bem para o ativo imobilizado, mas sim da
depreciação ou da amortização, mês a mês, do bem adquirido, como
bem destacou a Dra. Flávia Palmeira de Moura Coelho, em sustentação
oral pela União. Vejamos:

“Art. 3º Do valor apurado na forma do art. 2º a pessoa


jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:
(Regulamento)
(...)
VI - máquinas, equipamentos e outros bens incorporados
ao ativo imobilizado, adquiridos ou fabricados para locação a
terceiros ou para utilização na produção de bens destinados à
venda ou na prestação de serviços. (Redação dada pela Lei nº
11.196, de 2005)
VII - edificações e benfeitorias em imóveis de terceiros,
quando o custo, inclusive de mão-de-obra, tenha sido
suportado pela locatária;
(...)
XI - bens incorporados ao ativo intangível, adquiridos
para utilização na produção de bens destinados a venda ou na

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prestação de serviços. (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014)


(Vigência)
(…)
§ 1º O crédito será determinado mediante a aplicação da
alíquota prevista no caput do art. 2º desta Lei sobre o valor:
(Redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004)
(...)
III - dos encargos de depreciação e amortização dos bens
mencionados nos incisos VI, VII e XI do caput, incorridos no
mês; (Redação dada pela Lei nº 12.973, de 2014) (Vigência)”.

Vide que a simples aquisição de bens para o ativo imobilizado não


gerava direito adquirido ao cálculo do crédito de PIS/COFINS. O crédito
era decorrente dos encargos da depreciação e da amortização de tais
bens, incorridos mês a mês.
A Lei nº 10.865/04, publicada em 30/04/04, portanto, não violou
direito adquirido nem mesmo incidiu em retroatividade, mas apenas
vedou, a partir do último dia do terceiro mês subsequente ao de sua
publicação, o desconto de créditos apurados daquela forma, relativos aos
encargos decorrentes da depreciação ou da amortização de bens e direitos
de ativos imobilizados adquiridos até 30 de abril de 2004.
Note-se que os fatos que gerariam direito ao crédito que passou a ser
vedado, isto é, os encargos da depreciação ou da amortização do bem
incorridos no mês, não haviam ocorrido quando do advento da nova lei.
É certo também que a nova lei não impediu que o contribuinte
gozasse dos créditos de PIS/COFINS já adquiridos quando de seu
advento, isto é, daqueles oriundos dos encargos de depreciação ou
amortização já ocorridos, relativamente a bens e direitos de ativo
imobilizado adquiridos até 30/04/04.
Também não há que se falar em violação da segurança jurídica ou da
não surpresa, na medida em que a lei contestada observou a regra da
anterioridade nonagesimal a que se submetem as contribuições para a
seguridade social. Somente a partir do último dia do terceiro mês
subsequente ao de sua publicação é que passou a ser vedado o crédito em

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RE 599316 / SC

tela.
Por fim, não se vislumbra ofensa à isonomia. Isso porque a lei se
aplica a todos que estão na mesma situação. Todos os contribuintes que
adquiriram bens para o ativo imobilizado até 30/04/04 estão sujeitos à
mesma medida, não tendo havido, note-se, qualquer diferenciação
quanto ao setor de atividade econômica em que ele se encontra.
Mutatis mutandis, as mesmas considerações aplicam-se à limitação
temporal do crédito relativo a aluguel e contraprestação de arrendamento
mercantil de bens que já tenham integrado o patrimônio da pessoa
jurídica a que se refere o § 3º do citado art. 31, que, aliás, remete ao caput.
Em suma, entendo ser constitucional a limitação temporal
introduzida pelo art. 31 da Lei nº 10.865/04.
Passo a tratar da resolução do caso concreto.
No que diz respeito ao caso concreto, verifica-se que o Ministro
Alexandre de Moraes dá provimento ao recurso extraordinário para
denegar a ordem.
Com a devida vênia, entendo ser caso de simplesmente se dar
provimento ao recurso extraordinário para se assentar a
constitucionalidade da limitação temporal introduzida pelo art. 31 da Lei
nº 10.865/04.
Com efeito, conforme se verifica do relatório constante do acórdão
recorrido, a impetrante questionava não só a limitação temporal para o
aproveitamento de créditos de PIS/COFINS calculados em relação a bens
adquiridos para o ativo imobilizado, mas também a limitação temporal
para o aproveitamento de créditos de PIS/COFINS decorrentes de
“despesas financeiras atinentes a empréstimos e financiamentos”, bem
como de “despesas de aluguel e contraprestação de arrendamento
mercantil de bens que tenham integrado o patrimônio da pessoa
jurídica”.
A sentença foi pela concessão da segurança, tendo sido confirmada
pelo Tribunal de origem. Em face do acórdão, a União interpôs o presente
recurso extraordinário questionando tão somente a constitucionalidade
do art. 31 da Lei nº 10.865/04.

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Vale destacar que não decorre desse dispositivo a limitação temporal


do aproveitamento de crédito de PIS/COFINS quanto a despesas
financeiras atinentes a empréstimos e financiamentos.
Nesse sentido, entendo ser o caso de apenas se dar provimento ao
recurso extraordinário da União e se assentar a constitucionalidade do
art. 31 da Lei nº 10.865/04.
Diante do exposto, pedindo vênia para divergir do Relator, o
Ministro Marco Aurélio, e, em parte, do Ministro Alexandre de Moraes,
dou provimento ao recurso extraordinário apenas para assentar a
constitucionalidade do art. 31 da Lei nº 10.865/04.
Adoto a tese de repercussão geral sugerida pelo Ministro Alexandre
de Moraes:

“É constitucional a limitação temporal introduzida pelo


artigo 31 da Lei 10.865/2004.”

É como voto.

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29/06/2020 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 599.316 S ANTA CATARINA

RELATOR : MIN. MARCO AURÉLIO


RECTE.(S) : UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL
RECDO.(A/S) : FRICASA ALIMENTOS S/A
ADV.(A/S) : JOÃO JOQUIM MARTINELLI E OUTRO(A/S)

VOTO

O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI (PRESIDENTE):


Trata-se de recurso extraordinário interposto pela União, com
fundamento na letra b do permissivo constitucional, contra acórdão do
Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que, com base em julgado de sua
Corte Especial, reconheceu a inconstitucionalidade do art. 31 da Lei nº
10.865/04.
O caput do dispositivo instituiu limitação temporal para o
aproveitamento dos créditos de PIS/COFINS, no regime não cumulativo,
relativamente às aquisições de bens para o ativo imobilizado realizadas
até 30 de abril de 2004. Para a Corte de origem, a medida violou o direito
adquirido, a irretroatividade tributária, a segurança jurídica e a não
surpresa.
O julgado foi assim ementado:

“TRIBUTÁRIO. PIS. COFINS. APROVEITAMENTO DE


CRÉDITOS. LIMITAÇÃO TEMPORAL. ART. 31 DA LEI Nº
10.865/04. INCONSTITUCIONALIDADE.
A limitação temporal do aproveitamento dos créditos
decorrentes das aquisições de bens para o ativo imobilizado
realizadas até 30 de abril de 2004, no regime não-cumulativo do
PIS e COFINS, ofende os princípios constitucionais do direito
adquirido, da irretroatividade da lei tributária, da segurança
jurídica e da não-supresa.
Declarada a inconstitucionalidade [d]o art. 31 da Lei nº

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10.865/0[4] pela Corte Especial deste Tribunal”.

Transcrevo o teor do art. 31 da Lei nº 10.865/04:

“Art. 31. É vedado, a partir do último dia do terceiro mês


subseqüente ao da publicação desta Lei, o desconto de créditos
apurados na forma do inciso III do § 1º do art. 3º das Leis nº s
10.637, de 30 de dezembro de 2002, e 10.833, de 29 de dezembro
de 2003, relativos à depreciação ou amortização de bens e
direitos de ativos imobilizados adquiridos até 30 de abril de
2004.
§ 1º Poderão ser aproveitados os créditos referidos no
inciso III do § 1º do art. 3º das Leis nº s 10.637, de 30 de
dezembro de 2002, e 10.833, de 29 de dezembro de 2003,
apurados sobre a depreciação ou amortização de bens e direitos
de ativo imobilizado adquiridos a partir de 1º de maio.
§ 2º O direito ao desconto de créditos de que trata o § 1º
deste artigo não se aplica ao valor decorrente da reavaliação de
bens e direitos do ativo permanente.
§ 3º É também vedado, a partir da data a que se refere o
caput, o crédito relativo a aluguel e contraprestação de
arrendamento mercantil de bens que já tenham integrado o
patrimônio da pessoa jurídica”.

No recurso extraordinário, a União defende, na essência, que o


dispositivo declarado inconstitucional não é retroativo nem viola a
segurança jurídica ou qualquer direito adquirido dos contribuintes.
O presente caso é paradigma do Tema nº 244, que possui o seguinte
título: “limitação temporal para o aproveitamento de credito de PIS e
COFINS”.
Pela União falou a Dra. Flávia Palmeira De Moura Coelho; pela
Fricasa Alimentos S/A, o Dr. Carlos Eduardo Domingues Amorim.
É o relatório.
O Relator, o Ministro Marco Aurélio, nega provimento ao recurso
extraordinário e sugere a fixação da seguinte tese de repercussão geral:

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“Surge inconstitucional, por ofensa aos princípios da não


cumulatividade e da isonomia, o artigo 31, cabeça, da Lei nº
10.865/2004, no que vedou o creditamento da contribuição para
o PIS e da COFINS, relativamente ao ativo imobilizado
adquirido até 30 de abril de 2004”.

Em suma, Sua Excelência entende que o referido art. 31, caput, da


Lei nº 19.865/2005 viola a sistemática da não cumulatividade e o princípio
da isonomia.
Abriu divergência o Ministro Alexandre de Moraes, dando
provimento ao recurso extraordinário, para se denegar a ordem, e
sugerindo a tese de que “[é] constitucional a limitação temporal
introduzida pelo artigo 31 da Lei 10.865/2004”.
Peço vênia para divergir do Relator, Ministro Marco Aurélio, e, em
parte, do Ministro Alexandre de Moraes.
De início, cumpre recordar que Corte tem entendido que o art. 195, §
12, da Constituição Federal conferiu boa liberdade para que o legislador
possa tratar do regime não cumulativo de cobrança do PIS/COFINS. Em
razão disso, pode-se concluir ter ele também a possibilidade de restringir
a concessão de créditos em determinadas situações. Vejamos alguns
julgados que corroboram isso.
No exame do RE nº 607.642/RJ, em que se discute se as empresas
prestadoras de serviços devem se submeter ao PIS/COFINS não
cumulativos, me manifestei sobre aquele dispositivo constitucional e
sobre as Leis nºs 10.637/02 e 10.833/04:

“Sob a minha óptica, o § 12 do art. 195 da Constituição


autoriza a coexistência dos regimes cumulativo e não
cumulativo. Ademais, o texto da EC 42/03, ao cuidar da matéria
quanto ao PIS/Cofins, referiu, apenas, que a lei definirá os
setores de atividade econômica para os quais as contribuições
serão não cumulativas, deixando de registrar a fórmula que
serviria de ponto de partida à interpretação do regime.

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Diferentemente do IPI e do ICMS, não há no texto


constitucional a escolha dessa ou daquela técnica de incidência
da não cumulatividade das contribuições sobre o faturamento
ou a receita.
(...)
Parece ser consenso, na doutrina, que as Leis nºs 10.637/02
e 10.833/03 criaram um critério próprio de operacionalização da
não cumulatividade que não corresponde, na íntegra, a nenhum
dos métodos tradicionais de cálculo da não cumulatividade dos
tributos sobre o valor agregado (base sobre base ou tributo
sobre tributo). Embora a maioria dos doutrinadores extraia das
leis instituidoras a intenção de adotar uma técnica próxima da
“base sobre base”5, é recorrente a assertiva de que o legislador,
na técnica de apuração não cumulativa da base de cálculo das
contribuições PIS/Cofins, inaugura um regime todo novo,
autônomo em relação tanto à forma preexistente de cálculo
dessas contribuições como aos modelos de não cumulatividade
por todos nós conhecidos e empregados na circulação
plurifásica do IPI e do ICMS, superando o regime do crédito
escritural.
(...)
Na disciplina inaugurada pelas Leis nºs 10.637/02 e
10.833/03, para mim, o que parece ser assente é que não se
assimilou, por inteiro, os métodos tradicionais de cálculo sobre
o “valor agregado”. A opção do legislador foi de negar o
crédito em determinadas hipóteses e concedê-los em outras de
forma genérica ou restritiva1. No rol dos créditos passíveis de
aproveitamento verificamos desde (i) bens e serviços, utilizados
como insumo na prestação de serviços e na produção ou
fabricação de bens ou produtos destinados à venda (art. 3º, II);
(ii) máquinas, equipamentos e outros bens incorporados ao
ativo imobilizado, adquiridos ou fabricados para locação a
terceiros, ou para utilização na produção de bens destinados à
venda ou na prestação de serviços (art. 3º, VI); até outras
deduções e créditos presumidos, como, por exemplo, aqueles

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. O documento pode ser acessado pelo endereço
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concedidos à importação e à produção de produtos


farmacêuticos.
O modelo legal, em sua feição original, abstratamente
considerado, embora complexo e confuso, mormente quanto às
técnicas de deduções (crédito físico, financeiro e presumido) e
aos itens admitidos como créditos, não atenta, a priori, contra o
conteúdo mínimo de não cumulatividade que pode ser
extraído do art. 195, § 12, da Constituição.” (grifei).

Por ser pertinente ao caso, também destaco a seguinte passagem do


voto proferido pelo Ministro Roberto Barroso no julgamento do RE nº
570.122, em que também se discutiu sobre o regime não cumulativo de
cobrança do PIS/COFINS:

“14. Dito isso, penso que devem ser destacadas três


premissas principais para o presente julgamento: (i) ao
contrário do IPI e do ICMS não houve, por parte do
constituinte, a definição do conteúdo da não cumulatividade
aplicável ao PIS e a COFINS; (ii) a base econômica sobre a qual
incidem tais tributos (receita ou faturamento) não autoriza a
simples aplicação da noção de não cumulatividade tal qual
prevista para os imposto incidentes em cadeia; (iii) a Emenda
Constitucional nº 42/2003 veio para constitucionalizar uma
regra de não cumulatividade que já tinha previsão em lei
federal válida.
15. Desse conjunto de premissas, entendo que se deve
extrair como interpretação constitucionalmente adequada
aquela que conduza à conclusão que, no que diz respeito à não
cumulatividade da COFINS, o constituinte atribuiu ao
legislador ordinário uma ampla margem de discricionariedade
para definição desse regime de tributação. Mais que isso, em
verdade, constitucionalizou a opção efetuada pelo legislador
ordinário de criação de um regime de tributação mais favorável.
Desse modo, a Lei nº 10.833/2003 não contém nenhum vício de
inconstitucionalidade. Mesmo porque, a rigor, o que se chama
aqui de não cumulatividade da COFINS é a mera autorização

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RE 599316 / SC

de dedução de diversas despesas da base de cálculo do tributo


(receita) como forma de reduzir o impacto da carga tributária
sobre alguns contribuintes inseridos em cadeias longas de
produção e circulação de mercadorias” (grifei).

À luz dessas considerações, pode-se dizer que o legislador, a priori,


pode modificar as normas que dizem respeito aos fatos que geram direito
a ser aproveitado no regime não cumulativo do PIS/COFINS.
No que diz respeito às demais normas constitucionais
(irretroatividade, segurança jurídica, não surpresa e isonomia), também
se verifica não ter havido violação de nenhuma delas.
Especialmente quanto ao objeto do recurso extraordinário, as Leis nº
10637/02 e 10.833/03 previram que o contribuinte, no regime não
cumulativo do PIS/COFINS, poderia calcular créditos em relação a bens
adquiridos para o ativo imobilizado.
Note-se, no entanto, que esse crédito não decorria (e ainda não
decorre) da mera aquisição do bem para o ativo imobilizado, mas sim da
depreciação ou da amortização, mês a mês, do bem adquirido, como
bem destacou a Dra. Flávia Palmeira de Moura Coelho, em sustentação
oral pela União. Vejamos:

“Art. 3º Do valor apurado na forma do art. 2º a pessoa


jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:
(Regulamento)
[...]
VI - máquinas, equipamentos e outros bens incorporados
ao ativo imobilizado, adquiridos ou fabricados para locação a
terceiros ou para utilização na produção de bens destinados à
venda ou na prestação de serviços. (Redação dada pela Lei nº
11.196, de 2005)
VII - edificações e benfeitorias em imóveis de terceiros,
quando o custo, inclusive de mão-de-obra, tenha sido
suportado pela locatária;
[...]
XI - bens incorporados ao ativo intangível, adquiridos

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RE 599316 / SC

para utilização na produção de bens destinados a venda ou na


prestação de serviços. (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014)
(Vigência)
[…]
§ 1º O crédito será determinado mediante a aplicação da
alíquota prevista no caput do art. 2º desta Lei sobre o valor:
(Redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004)
[...]
III - dos encargos de depreciação e amortização dos bens
mencionados nos incisos VI, VII e XI do caput, incorridos no
mês; (Redação dada pela Lei nº 12.973, de 2014) (Vigência)

Vide que a simples aquisição de bens para o ativo imobilizado não


gerava direito adquirido ao cálculo do crédito de PIS/COFINS. O crédito
era decorrente dos encargos da depreciação e da amortização de tais
bens, incorridos, mês a mês.
A Lei nº 10.865/04, publicada em 30/04/04, portanto, não violou
direito adquirido nem mesmo incidiu em retroatividade, mas apenas
vedou, a partir do último dia do terceiro mês subsequente ao de sua
publicação, o desconto de créditos apurados naquela forma, relativos aos
encargos decorrentes da depreciação ou da amortização de bens e direitos
de ativos imobilizados adquiridos até 30 de abril de 2004.
Note-se que os fatos que gerariam direito ao crédito que passou a ser
vedado, isto é, os encargos da depreciação ou da amortização do bem,
incorridos no mês, não haviam ocorridos quando do advento da nova lei.
É certo também que a nova lei não impediu que o contribuinte
gozasse dos créditos de PIS/COFINS já adquiridos quando de seu
advento, isto é, daqueles oriundos dos encargos de depreciação ou
amortização já ocorridos, relativamente a bens e direitos de ativo
imobilizado adquiridos até 30/04/04.
Também não há que se falar em violação da segurança jurídica ou da
não surpresa, na medida em que a lei contestada observou a regra da
anterioridade nonagesimal, a que se submetem as contribuições para a
seguridade social. Somente a partir do último dia do terceiro mês

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subsequente ao de sua publicação é que passou a ser vedado o crédito em


tela.
Por fim, não se vislumbra ofensa à isonomia. Isso porque a lei aplica-
se a todos que estão na mesma situação. Todos os contribuintes que
adquiriram bens para o ativo imobilizado até 30/04/04 estão sujeitos à
mesma medida, não tendo havido, note-se, qualquer diferenciação
quanto ao setor de atividade econômica em que ele se encontra.
Mutatis mutandis, as mesmas considerações aplicam-se à limitação
temporal do crédito relativo a aluguel e contraprestação de arrendamento
mercantil de bens que já tenham integrado o patrimônio da pessoa
jurídica a que se refere o § 3º do citado art. 31, que, aliás, se remete ao
caput.
Em suma, entendo ser constitucional a limitação temporal
introduzida pelo art. 31 da Lei nº 10.865/04.
Passo a tratar da resolução do caso concreto.
No que diz respeito ao caso concreto, verifica-se que o Ministro
Alexandre de Moraes dá provimento ao recurso extraordinário para
denegar a ordem.
Com a devida vênia, entendo ser o caso de simplesmente dar
provimento ao recurso extraordinário para se assentar a
constitucionalidade da limitação temporal introduzida pelo art. 31 da Lei
nº 10.865/04.
Com efeito, conforme se verifica do relatório constante do acórdão
recorrido, a impetrante questionava não só a limitação temporal para o
aproveitamento de créditos de PIS/COFINS calculados em relação a bens
adquiridos para o ativo imobilizado, mas também a limitação temporal
para o aproveitamento de créditos de PIS/COFINS decorrentes de
“despesas financeiras atinentes a empréstimos e financiamentos” bem
como de “despesas de aluguel e contraprestação de arrendamento
mercantil de bens que tenham integrado o patrimônio da pessoa
jurídica”.
A sentença foi pela concessão da segurança, que foi confirmada pelo
Tribunal de origem. Em face do acórdão, a União interpôs o presente

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recurso extraordinário questionando tão somente a constitucionalidade


do art. 31 da Lei nº 10.865/04.
Vale destacar que não decorre desse dispositivo a limitação temporal
do aproveitamento de crédito de PIS/COFINS quanto a despesas
financeiras atinentes a empréstimos e financiamentos.
Nesse sentido, entendo ser o caso de apenas se dar provimento ao
recurso extraordinário da União para se assentar a constitucionalidade do
art. 31 da Lei nº 10.865/04.
Diante do exposto, pedindo vênia para divergir do Relator, o
Ministro Marco Aurélio, e, em parte, do Ministro Alexandre de Moraes,
dou provimento ao recurso extraordinário apenas para assentar a
constitucionalidade do art. 31 da Lei nº 10.865/04.
Adoto a tese de repercussão geral sugerida pelo Ministro Alexandre
de Moraes:

“É constitucional a limitação temporal introduzida pelo


artigo 31 da Lei 10.865/2004”.

É como voto.

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29/06/2020 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 599.316 S ANTA CATARINA

RELATOR : MIN. MARCO AURÉLIO


RECTE.(S) : UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL
RECDO.(A/S) : FRICASA ALIMENTOS S/A
ADV.(A/S) : JOÃO JOQUIM MARTINELLI E OUTRO(A/S)

VOTO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
REPERCUSSÃO GERAL. DIREITO
TRIBUTÁRIO. PIS E COFINS.
DESCONTO DE CRÉDITOS RELATIVOS
À DEPRECIAÇÃO OU AMORTIZAÇÃO
DE BENS E DIREITOS DE ATIVOS
IMOBILIZADOS. LIMITAÇÃO
TEMPORAL ATÉ 30 DE ABRIL DE 2004.
ALEGADA OFENSA AOS PRINCÍPIOS
DO DIREITO ADQUIRIDO, DA
IRRETROATIVIDADE LEI TRIBUTÁRIA
E DA SEGURANÇA JURÍDICA. LEI
10.865/04, ARTIGO 31. CF/88, ARTIGOS
5º, XXXVI; E 150, III, 'A'.
IMPROCEDÊNCIA. RECURSO
EXTRAORDINÁRIO DA FAZENDA
NACIONAL JULGADO PROCEDENTE.
1. As Leis 10.637/2002 e 10.833/2003
estabeleceram a possibilidade de
aproveitamento de créditos de PIS e de
COFINS decorrentes da aquisição de bens
para o ativo fixo da empresa, calculados
mensalmente sobre os encargos de

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RE 599316 / SC

depreciação e amortização daqueles bens.


2. O art. 31 da Lei 10.865/2004 modificou a
sistemática de creditamento, estabelecendo,
a partir de 1º de maio de 2004, o cálculo a
partir do valor de aquisição do bem e
vedando o aproveitamento dos créditos
relativos aos bens adquiridos até 30 de abril
de 2004.
3. O regime de aproveitamento de créditos
de PIS e COFINS decorrentes da aquisição
de bens para o ativo imobilizado da
empresa insere-se em um contexto de um
benefício criado pela legislação
infraconstitucional e não uma decorrência
do princípio da não cumulatividade.
Precedente do Supremo Tribunal Federal
em relação ao aproveitamento de créditos
de ICMS decorrentes da aquisição de bens
do ativo fixo: ADI 2325 MC, Rel. Min.
Marco Aurélio, Tribunal Pleno, DJ
6/10/2006.
4. O Supremo Tribunal Federal reconhece a
inexistência de direito adquirido a regime
jurídico, inclusive em matéria tributária.
Precedentes: RMS 28200-AgR, Relator Min.
Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe
27/10/2017; RMS 27396-AgR, Relator Min.
Edson Fachin, Primeira Turma, DJe
2/3/2016; ARE 1175599-AgR, Relatora Min.
Rosa Weber, Primeira Turma, DJe 3/2/2020;
RE 1225966, Relator Min. GILMAR
MENDES, DJe 21/10/2019.
5. In casu, o momento da aquisição do bem

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pelo contribuinte, de per si, não encerra


elemento constitutivo do direito ao
abatimento do crédito. A apuração do
crédito demanda a verificação mensal das
condições de amortização ou depreciação
do bem associadas à aplicação da alíquota
estabelecida em lei.
6. A alteração no regime de aproveitamento
de créditos de PIS e COFINS na aquisição
de bens para ativo permanente configura
alteração de regime jurídico, passível de
efetivação sem agressão ao primado da
segurança jurídica. Consectariamente,
considerando que o direito ao crédito nasce
a cada nova rodada de apuração realizada
sobre o montante a amortizar ou depreciar
do bem adquirido, não há violação ao
princípio da irretroatividade em matéria
tributária (art. 150, III, a, da CRFB).
7. O princípio da anterioridade nonagesimal
previsto no art. 195, § 6º, da CRFB foi
respeitado pela mudança no regime jurídico
tendo em vista que o aproveitamento de
créditos restou vedado a partir do último
dia do terceiro mês subsequente ao da
publicação da Lei 10.865/2004.
8. Recurso Extraordinário provido.

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX: Trata-se de Recurso Extraordinário


com Repercussão Geral admitida em que se discute a mudança no regime
de aproveitamento de créditos de PIS e COFINS estabelecida pela Lei
10.865/2004.

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A lei em questão extinguiu a possibilidade de aproveitamento


mensal de créditos, até então existente, calculados sobre os encargos de
depreciação e amortização de bens do ativo fixo da pessoa jurídica,
adquiridos até 30 de abril de 2004. Os créditos nas aquisições realizadas a
partir de 1º de maio de 2004 foram resguardados, mas em modalidade
diferente do sistema anterior. A partir da nova lei, o cálculo se opera pela
fração mensal do custo de aquisição.

A Lei 10.865/2004 estabelece que o não aproveitamento de créditos


somente começaria a produzir efeitos a partir do terceiro mês
subsequente à sua publicação, em homenagem ao princípio da
anterioridade nonagesimal. Eis a redação do dispositivo impugnado:

Lei 10.865/04

Art. 31. É vedado, a partir do último dia do terceiro mês


subseqüente ao da publicação desta Lei, o desconto de créditos
apurados na forma do inciso III do § 1º do art. 3º das Leis nº s 10.637,
de 30 de dezembro de 2002, e 10.833, de 29 de dezembro de 2003,
relativos à depreciação ou amortização de bens e direitos de ativos
imobilizados adquiridos até 30 de abril de 2004.
§ 1º Poderão ser aproveitados os créditos referidos no inciso III
do § 1º do art. 3º das Leis nº s 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e
10.833, de 29 de dezembro de 2003, apurados sobre a depreciação ou
amortização de bens e direitos de ativo imobilizado adquiridos a partir
de 1º de maio.
§ 2º O direito ao desconto de créditos de que trata o § 1º deste
artigo não se aplica ao valor decorrente da reavaliação de bens e
direitos do ativo permanente.
§ 3º É também vedado, a partir da data a que se refere o caput, o
crédito relativo a aluguel e contraprestação de arrendamento mercantil
de bens que já tenham integrado o patrimônio da pessoa jurídica.

O ponto nodal da demanda remete à situação do contribuinte que


realizou aquisições de bens para o ativo fixo antes de 30 de abril de 2004 e

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vinha promovendo o abatimento de crédito das contribuições,


mensalmente, sobre os encargos de depreciação e amortização dos bens
adquiridos.

Pela novel legislação, esse procedimento deveria cessar em três


meses da sua publicação, no que se invoca a violação aos princípios da
segurança jurídica, da irretroatividade e da anterioridade.

Parece-me que o primeiro elemento a se considerar no exame da


matéria diz com a natureza da sistemática de aproveitamento de créditos
criada na origem do PIS e da COFINS não cumulativos, por meio das Leis
10.637/2002 e 10.833/2003.

Deve-se dizer que o mecanismo de aproveitamento de créditos


decorrentes da aquisição de bens para o ativo fixo da empresa insere-se
em um contexto muito mais de um benefício criado pela legislação
infraconstitucional do que propriamente uma eventual imposição que
decorreria da não cumulatividade das referidas contribuições calcada no
art. 195, § 12, do Texto Constitucional.

A jurisprudência desta Suprema Corte já assentou que esse modelo


de aproveitamento de crédito, em que a Administração Tributária
franqueia o abatimento decorrente da aquisição não de insumos que
compõem o produto final, mas de bens que permitirão a produção
daquelas mercadorias a serem comercializadas, insere-se num contexto
de um benefício fiscal, concedido pelo ordenamento e que pode ser
calibrado por atos infraconstitucionais sem incorrer em mácula ao regime
previsto na Constituição. Nesse sentido é o entendimento firmado a partir
do voto do Ministro Carlos Veloso, nos autos da ADI 2325-MC, Rel. Min.
Marco Aurélio, Tribunal Pleno, DJ 6/10/2006, em que se discutia a
modificação do regime de aproveitamento de créditos de ICMS
decorrente das aquisições para o ativo fixo.

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O mesmo se aplica ao regime de PIS e COFINS. Como dito, as Leis


10.637/2002 e 10.833/2003 criaram o regime de “crédito financeiro” para as
ditas contribuições, regime este posteriormente modificado pela Lei
10.865/2004.

A partir dessa premissa é que deve ser examinada invocação dos


princípios da segurança jurídica, em seus corolários da anterioridade e
irretroatividade em matéria tributária.

Esta Suprema Corte possui uma gama considerável de precedentes


em que se reconhece a inexistência de direito adquirido a regime jurídico.
Em matéria tributária, esse posicionamento se manifesta nas mais
diversas questões. Assim, por exemplo, é corrente o reconhecimento de
que as entidades imunes não ostentam direito adquirido a, ad eternum,
gozarem do reconhecimento de sua condição, sendo legítimo que,
periodicamente, o Fisco lhes exija a demonstração dos requisitos para a
benesse: RMS 28200-AgR, Relator Min. Roberto Barroso, Primeira Turma,
DJe 27/10/2017; RMS 27396-AgR, Relator Min. Edson Fachin, Primeira
Turma, DJe 2/3/2016

Do mesmo modo, vem reconhecendo o Tribunal que a modificação


para menor promovida no benefício fiscal denominado REINTEGRA
pode ser realizada, desde que respeitado o princípio da anterioridade.
(RE 1150649-AgR, Relator Min. Celso de Mello, Segunda Turma, DJe
15/5/2020; RE 1253469-AgR, Relatora Min. Rosa Weber, Primeira Turma,
DJe 15/5/2020).

E ainda, no caso da contribuição previdenciária patronal, podemos


citar a decisão no RE 1225966, Relator Min. Gilmar Mendes, DJe
21/10/2019.

In casu, o que se tem é a situação do contribuinte que adquire um


bem para seu ativo fixo e passa a utilizar como crédito no cálculo do

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montante devido a título de PIS e COFINS o valor dos encargos de


depreciação e amortização do bem em questão, incorridos mensalmente.

Nessa operação devem ficar claros eventos distintos: (i) o momento


da aquisição do bem e (ii) o instante da apuração do crédito.

Tenho que o momento da aquisição do bem, de per si, não encerra


elemento constitutivo do direito de abatimento do crédito dissociado do
momento (ii), em que o crédito será apurado. Esse segundo momento é
que deve ser entendido como o nascedouro de cada abatimento, na
medida em que a apuração do crédito demanda a verificação das
condições de amortização ou depreciação do bem associada à aplicação
da alíquota estabelecida em lei.

Mutatis mutandis, a alteração no regime de aproveitamento de


créditos de PIS e COFINS na aquisição de bens para ativo permanente
aproxima-se, muito, das situações de alteração de regime jurídico,
passível de efetivação sem agressão ao primado da segurança jurídica.

Mesmo as regras de isenção, que possuem disciplina mais rígida


pelo ordenamento tributário, segundo termos do art. 178 do Código
Tributário Nacional , desde que não concedidas a prazo certo e em função
de determinadas condições, podem ser revogadas, respeitando-se a regra
da anterioridade. Justamente porque não pode o contribuinte invocar a
imutabilidade de sua condição para impedir a atuação da Administração
Tributária.

Decantando a assertiva e fazendo referência ao caso em julgamento,


observo que o primeiro aspecto da segurança jurídica em matéria
tributária foi, deveras, observado pela legislação impugnada. Como se vê
da redação do dispositivo, a vedação ao aproveitamento do crédito que
vinha se operando somente passa a valer três meses após a publicação da
lei que a cassou. A fortiori, está respeitado o princípio da anterioridade, no

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caso a nonagesimal, estampada no art. 195, § 6º, da CRFB.

Noutro tanto, também decorrente da segurança jurídica, a


irretroatividade em matéria tributária mostra-se obedecida pela regra
posta na Lei 10.865/2004. É que, como visto, o aproveitamento dos
créditos reclamados pelo contribuinte se operava pela sistemática anterior
a partir do cálculo mensal do valor a ser abatido. Neste diapasão,
somente foram atingidos pela Lei 10.865/2004 aqueles valores apurados
posteriormente ao advento da norma ao mundo jurídico. O elemento
fundamental aqui é estabelecer que o direito ao crédito nasce a cada nova
rodada de apuração realizada sobre o montante a amortizar ou depreciar
do bem adquirido, tal como mencionado linhas atrás.

Ex positis, PROVEJO o Recurso Extraordinário da Fazenda Nacional


para reconhecer a legitimidade da modificação no aproveitamento de
créditos de PIS e COFINS realizada pelo art. 31 da Lei 10.685/2004.

É como voto.

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Extrato de Ata - 29/06/2020

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PLENÁRIO
EXTRATO DE ATA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 599.316


PROCED. : SANTA CATARINA
RELATOR : MIN. MARCO AURÉLIO
RECTE.(S) : UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL (00000/DF)
RECDO.(A/S) : FRICASA ALIMENTOS S/A
ADV.(A/S) : JOÃO JOQUIM MARTINELLI (03210/SC) E OUTRO(A/S)

Decisão: O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 244 da


repercussão geral, negou provimento ao recurso extraordinário e
fixou a seguinte tese: "Surge inconstitucional, por ofensa aos
princípios da não cumulatividade e da isonomia, o artigo 31,
cabeça, da Lei nº 10.865/2004, no que vedou o creditamento da
contribuição para o PIS e da COFINS, relativamente ao ativo
imobilizado adquirido até 30 de abril de 2004”, nos termos do voto
do Relator, vencidos os Ministros Alexandre de Moraes, Dias
Toffoli (Presidente), Gilmar Mendes, Luiz Fux e Celso de Mello.
Falaram: pela recorrente, a Dra. Flávia Palmeira de Moura Coelho,
Procuradora da Fazenda Nacional; e, pela recorrida, o Dr. Carlos
Eduardo Domingues Amorim. Plenário, Sessão Virtual de 19.6.2020 a
26.6.2020.

Composição: Ministros Dias Toffoli (Presidente), Celso de


Mello, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Cármen
Lúcia, Luiz Fux, Rosa Weber, Roberto Barroso, Edson Fachin e
Alexandre de Moraes.

Carmen Lilian Oliveira de Souza


Assessora-Chefe do Plenário

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