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Ementa e Acórdão

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22/02/2023 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 636.562 S ANTA CATARINA

RELATOR : MIN. ROBERTO BARROSO


RECTE.(S) : UNIÃO
ADV.(A/S) : PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL
RECDO.(A/S) : JOSÉ LINO SCHAPPO
ADV.(A/S) : EUGÊNIO SALOMÃO RICHARD CÂMARA
AM. CURIAE. : MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO DE BELO
HORIZONTE
AM. CURIAE. : MUNICÍPIO DE SÃO PAULO
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO DE SÃO
PAULO

EMENTA: DIREITO TRIBUTÁRIO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO.


REPERCUSSÃO GERAL. EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. ART.
40 DA LEI Nº 6.830/1980 E ART. 146, III, B, DA CF/1988.
1. Recurso extraordinário interposto pela União, em que
pleiteia seja reconhecida a constitucionalidade do art. 40, caput e § 4º, da
Lei nº 6.830/1980, que versa sobre prescrição intercorrente em execução
fiscal. Discute-se a validade da norma, no âmbito tributário, diante da
exigência constitucional de lei complementar para dispor acerca da
prescrição tributária (art. 146, III, b, da CF/1988).
2. Diferença entre prescrição ordinária tributária e prescrição
intercorrente tributária.
3. A prescrição consiste na perda da pretensão em virtude da
inércia do titular (ou do seu exercício de modo ineficaz), em período
previsto em lei. Em matéria tributária, trata-se de hipótese de extinção do
crédito tributário (art. 156, V, do CTN).
4. A prescrição ordinária tributária (ou apenas prescrição
tributária) se inicia com a constituição definitiva do crédito tributário e
baliza o exercício da pretensão de cobrança pelo credor, de modo a
inviabilizar a propositura da demanda após o exaurimento do prazo de 5
(cinco) anos. A prescrição intercorrente tributária, por sua vez, requer a

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propositura prévia da execução fiscal, verificando-se no curso desta.


Nesse caso, há a perda da pretensão de prosseguir com a cobrança.
5. A prescrição intercorrente obedece à natureza jurídica do
crédito subjacente à demanda. Se o prazo prescricional ordinário é de 5
(cinco) anos, o prazo de prescrição intercorrente será também de 5 (cinco)
anos.
6. Desnecessidade de lei complementar para dispor sobre prescrição
intercorrente tributária. A prescrição intercorrente tributária foi introduzida
pela Lei nº 6.830/1980, que tem natureza de lei ordinária. O art. 40 desse
diploma não afronta o art. 146, III, b, da CF/1988, pois o legislador
ordinário se limitou a transpor o modelo estabelecido pelo art. 174 do
CTN, adaptando-o às particularidades da prescrição intercorrente.
Observa ainda o art. 22, I, da CF/1988, porquanto compete à União
legislar sobre direito processual.
7. O prazo de suspensão de 1 (um) ano (art. 40, § 1º, da Lei nº
6.830/1980) busca estabilizar a ruptura processual no tempo, de modo a
ser possível constatar a probabilidade remota ou improvável de satisfação
do crédito. Não seria consistente com o fim do feito executivo que, na
primeira dificuldade de localizar o devedor ou encontrar bens
penhoráveis, se iniciasse a contagem do prazo prescricional. Trata-se de
mera condição processual da prescrição intercorrente, que pode,
portanto, ser disciplinada por lei ordinária.
8. Termo inicial de contagem da prescrição intercorrente tributária.
Não é o arquivamento dos autos que caracteriza o termo a quo da
prescrição intercorrente, mas o término da suspensão anual do processo
executivo.
9. Recurso extraordinário a que se nega provimento, com a
fixação da seguinte tese de julgamento: “É constitucional o art. 40 da Lei nº
6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais – LEF), tendo natureza processual o prazo
de 1 (um) ano de suspensão da execução fiscal. Após o decurso desse prazo,
inicia-se automaticamente a contagem do prazo prescricional tributário de 5
(cinco) anos”.
ACÓRDÃO

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Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do


Supremo Tribunal Federal, em Sessão Virtual, por unanimidade de votos,
em apreciando o Tema 390 da repercussão geral, em negar provimento ao
recurso extraordinário, nos termos do voto do Relator. Em seguida, por
unanimidade de votos, fixar a seguinte tese: “É constitucional o art. 40 da
Lei nº 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais – LEF), tendo natureza
processual o prazo de 1 (um) ano de suspensão da execução fiscal. Após o
decurso desse prazo, inicia-se automaticamente a contagem do prazo
prescricional tributário de 5 (cinco) anos”.
Brasília, 10 a 17 de fevereiro de 2023.

Ministro LUÍS ROBERTO BARROSO - Relator

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Relatório

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RECURSO EXTRAORDINÁRIO 636.562 S ANTA CATARINA

RELATOR : MIN. ROBERTO BARROSO


RECTE.(S) : UNIÃO
ADV.(A/S) : PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL
RECDO.(A/S) : JOSÉ LINO SCHAPPO
ADV.(A/S) : EUGÊNIO SALOMÃO RICHARD CÂMARA
AM. CURIAE. : MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO DE BELO
HORIZONTE
AM. CURIAE. : MUNICÍPIO DE SÃO PAULO
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO DE SÃO
PAULO

RELATÓRIO:

O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (RELATOR):

1. Trata-se de recurso extraordinário interposto pela União,


em que se pleiteia seja reconhecida a constitucionalidade do art. 40, caput
e § 4º, da Lei nº 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais – LEF). Os
dispositivos impugnados possuem a seguinte redação:

Art. 40. O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto


não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os
quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o
prazo de prescrição.
[...]
§ 4º Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver
decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a
Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição
intercorrente e decretá-la de imediato. (incluído pela Lei nº
11.051/2004)
[...]

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2. Na origem, foi ajuizada uma ação de execução fiscal para a


cobrança de créditos tributários relativos a contribuições previdenciárias
não recolhidas tempestivamente.

3. Em 08.05.2003, a União requereu a suspensão da execução


pelo prazo de 90 (noventa) dias para proceder com a pesquisa de
endereço e bens do executado. Em decisão proferida em 24.07.2003, o
magistrado da origem determinou a suspensão do curso do processo pelo
prazo de 1 (um) ano, na forma do art. 40, § 1º, da Lei nº 6.830/1980, com o
posterior arquivamento dos autos, caso nada fosse requerido pela
exequente.

4. Em 16.11.2009, a União foi intimada a se manifestar sobre a


ocorrência da prescrição intercorrente, na forma do § 4º do art. 40 da Lei
de Execuções Fiscais. A exequente sustentou não terem sido cumpridos os
requisitos do art. 40 do aludido diploma legal e que não deu causa à
paralisação do processo. Ao final, requereu o prosseguimento da
execução fiscal.

5. Sobreveio a sentença de mérito, na qual o magistrado de


primeira instância reconheceu a prescrição intercorrente, uma vez
decorridos mais de 5 (cinco) anos desde o encerramento da suspensão
anual sem que houvesse qualquer movimentação útil por parte da
exequente nem a ocorrência de causa interruptiva da prescrição.
Consignou o magistrado que, “no presente caso, considerando que a ação
permaneceu arquivada por mais de cinco anos, sem qualquer
movimentação e sem notícia de causa interruptiva, mesmo após nova
intimação do exequente, rest[ou] extinto [o] seu direito à cobrança do
crédito, pela prescrição intercorrente, razão pela qual julg[ou] extinta a
Execução Fiscal na forma do art. 40, § 4º, da Lei nº 6.830/1980”.

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6. Irresignada, a União interpôs recurso de apelação,


alegando que não deu causa à paralisação do processo e que não foi
intimada da decisão que determinou o arquivamento do feito, o que
contrariaria os arts. 25 da Lei nº 6.830/1980 e 20 da Lei nº 11.033/2004.
Requereu o provimento do recurso para afastar a prescrição e dar
seguimento à execução fiscal. Após vista ao apelado, os autos foram
remetidos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

7. Ao apreciar a apelação, a Primeira Turma do TRF da 4ª


região negou provimento ao recurso, por entender que o art. 40, caput e §
4º, da Lei nº 6.830/1980 conflita com o art. 174 do CTN, que prevê o prazo
prescricional de 5 (cinco) anos, sem elencar hipótese de suspensão. O
acórdão proferido pelo Tribunal restou assim ementado:

EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-


EXECUTIVIDADE. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE.
OCORRÊNCIA.
1. O Código Tributário Nacional possui status de lei
complementar e as diretrizes nele estabelecidas relativas à
decadência e prescrição prevalecem à Lei de Execuções Fiscais,
norma hierarquicamente inferior.
2. Paralisado o processo por mais de cinco anos, se ausente
causa de suspensão ou interrupção, ocorre a prescrição
intercorrente.
3. Declarada pela Corte Especial deste TRF a
inconstitucionalidade do caput e § 4º do art. 40 da Lei nº
6.830/80, por conflitar com a prescrição quinquenal prevista no
art. 174 do CTN, que não aponta hipótese de suspensão do
prazo (ArgInc nº 0004671-46.2003.404.7200/SC, D.E. 15/09/10).
4. Não se justifica a manutenção de relação processual
inócua, com prescrição do direito de ação e prescrição
intercorrente evidenciadas.
5. Mantido o decreto de extinção da execução fiscal pela

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ocorrência da prescrição intercorrente.

8. Na sequência, a União interpôs recurso extraordinário,


com fundamento no art. 102, III, b, da CF/1988, sustentando, em síntese,
que: (i) a sistemática da suspensão processual preconizada pelo art. 40 da
Lei de Execuções Fiscais é compatível com o art. 174 do CTN; (ii) o § 4º do
art. 40 da LEF trouxe segurança jurídica aos contribuintes, pois limitou a
suspensão do processo pelo prazo de 1 (um) ano, findo o qual passa a
fluir a prescrição intercorrente; (iii) as normas sob enfoque têm natureza
processual, de modo que não versam sobre a suspensão do prazo da
prescrição em si, mas constituem causa legal suspensiva do processo
executivo; e (iv) tratando-se de regra de procedimento que determina a
suspensão da execução fiscal por 1 (um) ano, essa suspensão é um
corolário lógico.

9. A parte recorrida não apresentou contrarrazões. O recurso


extraordinário foi admitido na origem e encaminhado a este Supremo
Tribunal Federal.

10. Em 21.04.2011, foi reconhecida a repercussão geral da


matéria em exame, conforme proposta do então relator, Ministro Joaquim
Barbosa. O referido acórdão possui a seguinte ementa:

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO – ADMINISTRATIVO


– FINANCEIRO. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. MARCO
INICIAL. RESERVA DE LEI COMPLEMENTAR DE NORMAS
GERAIS PARA DISPOR SOBRE PRESCRIÇÃO. SUPREMACIA
DAS DISPOSIÇÕES DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL
POR FORÇA DA CONSTITUIÇÃO. ART. 173 DO CÓDIGO
TRIBUTÁRIO NACIONAL. ART. 40, § 4º, DA LEI 6.830/1980.
(REDAÇÃO DA LEI 11.051/2004). ART. 146, III, B, DA
CONSTITUIÇÃO.
Possui repercussão geral a discussão sobre o marco inicial
da contagem do prazo de que dispõe a Fazenda Pública para
localizar bens do executado, nos termos do art. 40, § 4º, da Lei

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6.830/1980.

11. Em seu parecer, a Procuradoria-Geral da República se


manifestou pelo desprovimento do recurso, por entender que a parte
final do caput do art. 40 da LEF é incompatível com o art. 146, III, b, da
CF/1988, que reserva à lei complementar estabelecer normas gerais em
matéria de legislação tributária, especialmente sobre prescrição e
decadência tributárias, inclusive sobre suspensão e interrupção dos
prazos respectivos.

12. Em 1º de dezembro de 2011, o Ministro Joaquim Barbosa


admitiu o Município de Belo Horizonte nos autos, na condição de amicus
curiae. O Município de São Paulo, por sua vez, foi admitido na mesma
qualidade já sob a minha relatoria, em 13 de março de 2015.

13. É o relatório.

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22/02/2023 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 636.562 S ANTA CATARINA

VOTO:

O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (RELATOR):

I. MÉRITO

1. A questão tratada no presente recurso consiste em saber se


o art. 40, caput e § 4º, da Lei nº 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais – LEF)
pode versar sobre a prescrição intercorrente tributária, considerando a
exigência constitucional de lei complementar para a disciplina do
instituto da prescrição tributária, nos termos do art. 146, III, b, da CF/1988.
Para o deslinde dessa controvérsia, divido este voto em quatro tópicos:
(I.1) diferenciação entre a prescrição ordinária tributária e a prescrição
intercorrente tributária; (I.2) necessidade de lei complementar para dispor
sobre normas gerais tributárias, especialmente acerca da prescrição; (I.3)
desnecessidade de positivação da prescrição intercorrente tributária por
meio de lei complementar; (I.4) parâmetro para a prescrição intercorrente
tributária.

I.1. DIFERENÇA ENTRE PRESCRIÇÃO ORDINÁRIA TRIBUTÁRIA E


PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE TRIBUTÁRIA

2. A prescrição consiste na perda da pretensão em virtude da


inércia do titular (ou do seu exercício de modo ineficaz), em período
previsto em lei. Em matéria tributária, em atenção ao art. 156, V, do CTN,
trata-se de hipótese de extinção do crédito tributário – diversamente da
prescrição civil. Há duas espécies de prescrição tributária: a prescrição
ordinária tributária (ou apenas prescrição tributária) e a prescrição
intercorrente tributária.

3. A prescrição ordinária tributária é disciplinada pelo art.

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174 do CTN, que prevê o prazo de 5 (cinco) anos, começando a fluir a


partir da data de constituição definitiva do crédito tributário. Isto é, uma
vez constituído definitivamente o crédito tributário, começa a correr o
prazo de 5 (cinco) anos para que a Fazenda Pública ajuíze a ação de
execução fiscal. Confira-se, nesse sentido, a redação do dispositivo legal:

Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário


prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição
definitiva.
Parágrafo único. A prescrição se interrompe:
I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em
execução fiscal;
II – pelo protesto judicial;
III – por qualquer ato judicial que constitua em mora o
devedor;
IV – por qualquer ato inequívoco ainda que extrajudicial,
que importe em reconhecimento do débito pelo devedor

4. O parágrafo único do art. 174 do CTN, por sua vez, prevê,


de forma taxativa, as causas interruptivas da prescrição. Na hipótese da
ocorrência de quaisquer delas, o prazo prescricional de 5 (cinco) anos
recomeça a contar em sua integralidade.

5. A prescrição intercorrente tributária, de maneira distinta,


observa o disposto no art. 40 da LEF, segundo o qual, não sendo
localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a
penhora, o juiz suspenderá a execução fiscal. Decorrido o prazo de 1 (um)
ano sem que tenham sido encontrados bens penhoráveis, o juiz
determinará o arquivamento do feito. Após o transcurso de 5 (cinco) anos,
o juiz declarará a prescrição intercorrente. Confira-se o teor do referido
dispositivo:

Art. 40 - O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto


não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os
quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o

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prazo de prescrição.
§ 1º - Suspenso o curso da execução, será aberta vista dos
autos ao representante judicial da Fazenda Pública.
§ 2º - Decorrido o prazo máximo de 1 (um) ano, sem que
seja localizado o devedor ou encontrados bens penhoráveis, o
Juiz ordenará o arquivamento dos autos.
§ 3º - Encontrados que sejam, a qualquer tempo, o devedor
ou os bens, serão desarquivados os autos para prosseguimento
da execução.
§ 4º Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver
decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a
Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição
intercorrente e decretá-la de imediato. (Incluído pela Lei nº
11.051, de 2004)
§ 5º A manifestação prévia da Fazenda Pública prevista no
§ 4º deste artigo será dispensada no caso de cobranças judiciais
cujo valor seja inferior ao mínimo fixado por ato do Ministro de
Estado da Fazenda. (Incluído pela Lei nº 11.960, de 2009)

6. Note-se que, enquanto a prescrição ordinária se inicia com


a constituição definitiva do crédito tributário e baliza o exercício da
pretensão de cobrança pelo credor, de modo a inviabilizar a propositura
da ação após o exaurimento do prazo, a prescrição intercorrente requer a
propositura prévia da ação de execução fiscal, verificando-se no curso
desta. Nesse caso, há a vedação do prosseguimento da prática de atos
para a cobrança. Em qualquer das hipóteses, ocorre a extinção do crédito
tributário, em atenção ao art. 156, V, do CTN.

7. Para uma melhor compreensão da controvérsia, impõe-se


esmiuçar as características da prescrição intercorrente tributária. Como
visto, ela ocorre no curso dos processos executivos quando não se localiza
o devedor ou não se identificam bens passíveis de penhora, o que
inviabiliza que o credor atinja a satisfação do seu crédito. Há, assim, a
ruptura do regular andamento processual, o que indica que a realização do
fim último da execução fiscal, em princípio, será remota ou improvável.

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8. Paralelamente, o sistema jurídico, voltado à pacificação dos


conflitos sociais, não pode conviver com a permanência, sem qualquer
limite temporal, do poder persecutório do Estado em face dos indivíduos.
Em outras palavras, a imprescritibilidade das relações jurídicas não é
compatível como os princípios da segurança jurídica e do devido
processo legal, considerando-se a necessidade de que as demandas sejam
solucionadas em um tempo razoável. Soma-se a isso o fato de que,
segundo o Relatório Justiça em Números 2022 do Conselho Nacional de
Justiça, as execuções fiscais são o principal fator de morosidade no Poder
Judiciário. Confiram-se a seguir alguns dados:

Os processos de execução fiscal representam,


aproximadamente, 35% do total de casos pendentes e 65% das
execuções pendentes no Poder Judiciário, com taxa de
congestionamento de 90%. Ou seja, de cada cem processos de
execução fiscal que tramitaram no ano de 2021, apenas 10
foram baixados. Desconsiderando esses processos, a taxa de
congestionamento do Poder Judiciário cairia 6,3 pontos
percentuais, passando de 74,2% para 67,9% em 2021.
O maior impacto das execuções fiscais está na Justiça
Estadual, que concentra 86% dos processos. A Justiça Federal
responde por 14%; a Justiça do Trabalho por 0,2%; e a Justiça
Eleitoral por apenas 0,01%.
Da mesma forma, o impacto desses processos nos acervos
é mais significativo na Justiça Estadual e na Federal. Na Justiça
Federal, os processos de execução fiscal correspondem a 42% do
seu acervo total de primeiro grau (conhecimento e execução);
na Justiça Estadual, a 39%; na Justiça do Trabalho, a 1%; e na
Justiça Eleitoral, a 1%.
[...] do total de 26,8 milhões execuções fiscais pendentes:
12 milhões (44,8%) estão na justiça estadual de São Paulo; 4
milhões (14,9%) estão no Tribunal de Justiça do Estado do Rio
de Janeiro; e 1,7 milhão (6,4%) estão no Tribunal Regional
Federal da 3ª Região (SP/MT). Juntos, esses três tribunais detêm

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66% das execuções fiscais em tramitação no país e 25% do total


de processos em trâmite no primeiro grau do Poder Judiciário.
Em números percentuais, verifica-se que apesar das
execuções fiscais representarem cerca de 39% do acervo de
primeiro grau na Justiça Estadual, verifica-se [...] que somente
três tribunais possuem percentual superior a essa média: TJRJ
(58%); TJSP (57%); e TJDFT (44%). Na Justiça Federal, somente o
TRF3 (54%) possui percentual de acervo em execução fiscal
maior que a média de seu segmento.
[...] O tempo de giro do acervo desses processos é de 8
anos e 8 meses, ou seja, mesmo que o Judiciário parasse de
receber novas execuções fiscais, ainda seria necessário todo esse
tempo para liquidar o acervo existente.

9. Desse modo, a prescrição intercorrente tributária atende


aos princípios da segurança jurídica e do devido processo legal, além de
servir a uma política judiciária de não eternização dos litígios judiciais.
Afasta-se, consequentemente, a noção de que constituiria uma punição do
credor que não teria promovido o regular prosseguimento da execução
fiscal. Tanto não é assim que a inércia do credor não é um requisito para a
caracterização da prescrição intercorrente. Também não se trata de um
privilégio do devedor que não honra com as suas obrigações junto ao
Estado. Fala-se, nesse caso, apenas e tão somente, em um meio executivo
ineficaz para o atingimento do seu fim, pelo que se aplica um limite
temporal para que a demanda não se perenize sem uma solução. Por
outro lado, deve-se reconhecer que a prescrição intercorrente não incide
nas situações em que a demora para o regular prosseguimento do feito
executivo seja imputável exclusivamente aos órgãos julgadores, isto é, por
motivos inerentes aos mecanismos da justiça. Nesses casos, o decurso e a
consumação do prazo prescricional constituiriam uma verdadeira
penalidade contra o credor e um benefício ao mal pagador.

10. A prescrição intercorrente, portanto, é intrínseca ao


processo executivo, obedecendo, porém, à natureza jurídica do crédito
subjacente à demanda. Nesse sentido, há uma relação necessária entre o

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prazo prescricional ordinário e o prazo prescricional intercorrente: se o


prazo prescricional ordinário tributário é de 5 (cinco) anos, o prazo
prescricional intercorrente deverá ser também de 5 (cinco) anos. Essa
relação decorre não somente da natureza jurídica da prescrição
intercorrente, como também se amolda à particularidade de que a
prescrição tributária (ordinária ou intercorrente) sempre extingue o
crédito tributário, havendo um prazo único fixado pelo Código Tributário
Nacional. Vale dizer, ocorre a prescrição intercorrente quando há o
exercício ineficaz da pretensão executória, em decorrência da não
localização do devedor ou da não identificação de bens passíveis de
penhora, por prazo superior ao previsto legalmente para deduzir a
pretensão em juízo, salvo nas hipóteses em que a demora advém de culpa
exclusiva dos mecanismos da justiça.

I.2. NECESSIDADE DE LEI COMPLEMENTAR PARA DISPOR SOBRE NORMAS


GERAIS TRIBUTÁRIAS, ESPECIALMENTE AQUELAS RELATIVAS À PRESCRIÇÃO

11. Vistas as características da prescrição intercorrente em


matéria tributária, questiona-se se ela deve ou não estar prevista em lei
complementar, haja vista o disposto no art. 146, III, b, da CF/1988. Essa
espécie normativa foi instituída pela Constituição de 1967, com um
procedimento diferenciado da lei ordinária para aprovação, que demanda
um quórum qualificado de maioria absoluta. A ela foi conferido o papel,
entre outros, de dispor sobre normas gerais de direito tributário. Era o
que estabelecia o art. 19, § 1º, da Constituição de 1967:

Art. 19. [...]


§ 1º - Lei Complementar estabelecerá normas gerais de
direito tributário, disporá sobre os conflitos de competência
tributária entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, e regulará as limitações constitucionais do poder
tributário.

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12. A Emenda Constitucional nº 1, de 1969, por sua vez,


manteve a exigência de lei complementar para tratar do tema. Confira-se:

Art. 18. [...]


§ 1º - Lei Complementar estabelecerá normas gerais de
direito tributário, disporá sôbre os conflitos de competência
nesta matéria entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, e regulará as limitações constitucionais do poder
de tributar.

13. Já a Constituição de 1988, em seu art. 146, III, além de


impor a edição de lei complementar para dispor sobre normas gerais em
matéria tributária, especificou alguns assuntos que estão compreendidos
em tal exigência. Veja-se:

Art. 146. Cabe à lei complementar:


I – dispor sobre conflitos de competência, em matéria
tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios;
II – regular as limitações constitucionais ao poder de
tributar;
III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação
tributária, especialmente sobre:
[...]
b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência
tributários;

14. Assim, tanto as Constituições de 1967 e 1969 quanto a


Constituição de 1988, prescreveram que o regramento geral do direito
tributário deve se dar por meio de lei complementar.

15. Como se sabe, o Código Tributário Nacional foi


introduzido pela Lei ordinária nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. À
época, a Constituição de 1946, então vigente, não exigia a edição de lei
complementar para tratar da matéria. Foi com a promulgação da

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Constituição de 1967 que o Código Tributário Nacional, naquilo que


compreendido no art. 19, § 1º, passou a ostentar a hierarquia de lei
complementar, só podendo ser revogado ou modificado por norma de
igual patamar. Com esse mesmo status, o CTN também foi recepcionado
pelas Constituições de 1969 e de 1988, nas matérias que lhe foram
reservadas.

16. Como visto, de acordo com o art. 146, III, b, da CF/1988,


compete à lei complementar a disciplina das normas gerais em matéria
tributária, entre as quais se encontra a prescrição. O CTN tratou desse
último instituto em seu art. 174. Essa é uma regra de caráter nacional, de
observância obrigatória por todos os integrantes da federação. A
exigência da edição de lei complementar para versar sobre normas gerais
em matéria tributária, principalmente acerca da prescrição, tem o
propósito de dar tratamento uniforme ao instituto e, como consequência,
a sujeitos passivos que se encontram em situações equivalentes. Com isso,
também se confere segurança jurídica à matéria, evitando-se que cada
ente político estabeleça um prazo próprio de prescrição. Não por outra
razão, no julgamento do RE 433.352-AgR, o Supremo Tribunal Federal
consignou o seguinte:

A observância de normas gerais em matéria tributária é


imperativo de segurança jurídica, na medida em que é
necessário assegurar tratamento centralizado a alguns temas
para que seja possível estabilizar legitimamente expectativas.
Nesse contexto, “gerais” não significa “genéricas”, mas sim
“aptas a vincular todos os entes federados e os administrados”.
(RE 433.352-AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. em 20.04.2010)

17. Nesse contexto, se a Constituição reservou à lei


complementar o regramento da prescrição tributária, classificando-a
como uma norma geral de direito tributário, não há espaço, em princípio,
para que uma lei ordinária discipline a matéria. Não pode o legislador
ordinário dispor sobre o instituto, estabelecendo novos prazos ou causas

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da sua suspensão ou da sua interrupção, sob pena de


inconstitucionalidade formal por invasão de competência reservada à lei
complementar.

I.3. DESNECESSIDADE DE POSITIVAÇÃO DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE


POR MEIO DE LEI COMPLEMENTAR

18. Em face do exposto até aqui, seria possível, em uma


primeira leitura, sustentar que as prescrições ordinária e intercorrente
devem ser disciplinadas exclusivamente por meio de lei complementar, já
que são espécies de “prescrição”.

19. No tocante à prescrição ordinária, o Supremo Tribunal


Federal possui o entendimento consolidado de que somente lei
complementar pode estabelecer o prazo prescricional ou introduzir uma
causa de interrupção. Vejam-se, nesse sentido, alguns dos julgados desta
Corte sobre o tema:

Ementa: PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA TRIBUTÁRIAS.


MATÉRIAS RESERVADAS A LEI COMPLEMENTAR.
DISCIPLINA NO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL.
NATUREZA TRIBUTÁRIA DAS CONTRIBUIÇÕES PARA A
SEGURIDADE SOCIAL. INCONSTITUCIONALIDADE DOS
ARTS. 45 E 46 DA LEI 8.212/91 E DO PARÁGRAFO ÚNICO DO
ART. 5º DO DECRETO-LEI 1.569/77. RECURSO
EXTRAORDINÁRIO NÃO PROVIDO. MODULAÇÃO DOS
EFEITOS DA DECLARAÇÃO DE
INCONSTITUCIONALIDADE.
I. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA TRIBUTÁRIAS.
RESERVA DE LEI COMPLEMENTAR. As normas relativas à
prescrição e à decadência tributárias têm natureza de normas
gerais de direito tributário, cuja disciplina é reservada a lei
complementar, tanto sob a Constituição pretérita (art. 18, § 1º,
da CF de 1967/69) quanto sob a Constituição atual (art. 146, III,
b, da CF de 1988). Interpretação que preserva a força normativa

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da Constituição, que prevê disciplina homogênea, em âmbito


nacional, da prescrição, decadência, obrigação e crédito
tributários. Permitir regulação distinta sobre esses temas, pelos
diversos entes da federação, implicaria prejuízo à vedação de
tratamento desigual entre contribuintes em situação
equivalente e à segurança jurídica.
II. DISCIPLINA PREVISTA NO CÓDIGO TRIBUTÁRIO
NACIONAL. O Código Tributário Nacional (Lei 5.172/1966),
promulgado como lei ordinária e recebido como lei
complementar pelas Constituições de 1967/69 e 1988, disciplina
a prescrição e a decadência tributárias.
III. NATUREZA TRIBUTÁRIA DAS CONTRIBUIÇÕES.
As contribuições, inclusive as previdenciárias, têm natureza
tributária e se submetem ao regime jurídico-tributário previsto
na Constituição. Interpretação do art. 149 da CF de 1988.
Precedentes.
IV. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO PROVIDO.
Inconstitucionalidade dos arts. 45 e 46 da Lei 8.212/91, por
violação do art. 146, III, b, da Constituição de 1988, e do
parágrafo único do art. 5º do Decreto-lei 1.569/77, em face do §
1º do art. 18 da Constituição de 1967/69.
V. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO.
SEGURANÇA JURÍDICA. São legítimos os recolhimentos
efetuados nos prazos previstos nos arts. 45 e 46 da Lei 8.212/91 e
não impugnados antes da data de conclusão deste julgamento.
(RE 560.626, Rel. Min. Gilmar Mendes)

EMENTA: DIREITO TRIBUTÁRIO.


CONSTITUCIONALIDADE FORMAL DOS ARTIGOS 45 E 46
DA LEI N. 8.212/1991. ARTIGO 146, INCISO III, ALÍNEA B, DA
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. PRESCRIÇÃO E
DECADÊNCIA TRIBUTÁRIAS. MATÉRIA RESERVADA À LEI
COMPLEMENTAR. ARTIGOS 173 E 174 DO CÓDIGO
TRIBUTÁRIO NACIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO
AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
1. A Constituição da República de 1988 reserva à lei

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complementar o estabelecimento de normas gerais em matéria


de legislação tributária, especialmente sobre prescrição e
decadência, nos termos do art. 146, inciso III, alínea b, in fine, da
Constituição da República. Análise histórica da doutrina e da
evolução do tema desde a Constituição de 1946.
2. Declaração de inconstitucionalidade dos artigos 45 e 46
da Lei n. 8.212/1991, por disporem sobre matéria reservada à lei
complementar.
3. Recepcionados pela Constituição da República de 1988
como disposições de lei complementar, subsistem os prazos
prescricional e decadencial previstos nos artigos 173 e 174 do
Código Tributário Nacional.
4. Declaração de inconstitucionalidade, com efeito ex nunc,
salvo para as ações judiciais propostas até 11.6.2008, data em
que o Supremo Tribunal Federal declarou a
inconstitucionalidade dos artigos 45 e 46 da Lei n. 8.212/1991.
5. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento.
(RE 559.943, Relª. Minª. Cármen Lúcia)

20. A prescrição intercorrente tributária foi positivada pela Lei


nº 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais – LEF), que tem natureza de lei
ordinária. O art. 40 desse diploma estabelece que (i) o juiz suspenderá a
execução fiscal enquanto não for localizado o devedor ou encontrados
bens sobre os quais possa recair a penhora; (ii) nesse período de
suspensão, não corre a prescrição; (iii) decorrido o prazo de 1 (um) ano,
sem alteração das circunstâncias fáticas, o juiz deve arquivar o processo; e
(iv) a partir daí, transcorrido o prazo prescricional, o magistrado deverá,
após ouvida a Fazenda Pública, reconhecer a prescrição intercorrente.

21. A despeito de a introdução da prescrição intercorrente


tributária ter sido feita por lei ordinária, entendo que não há vício de
inconstitucionalidade. Nesse caso, o legislador ordinário se limitou a
transpor o modelo estabelecido pelo art. 174 do CTN, adaptando-o às
particularidades da prescrição verificada no curso de uma execução

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fiscal. Em verdade, o tratamento dado ao tema por meio de lei ordinária


nacional atende ao comando do art. 22, I, da CF/1988, porquanto
compete à União legislar sobre direito processual. Tal competência
garante, assim como o art. 146, III, do CF/1988, a uniformidade do
tratamento da matéria em âmbito nacional e, por conseguinte, a
preservação da isonomia entre os sujeitos passivos nas execuções fiscais
em todo o País.

22. Tampouco se pode dizer que o prazo de suspensão de 1


(um) ano deveria estar previsto em lei complementar. Trata-se de mera
condição processual para que haja o início da contagem do prazo
prescricional de 5 (cinco) anos, de modo a ser possível constatar uma
probabilidade remota ou improvável de satisfação do crédito tributário.
Em outras palavras, cuida-se de um intervalo temporal razoável fixado
por lei dentro do qual o credor deve buscar bens para submissão à
penhora.

23. Não seria consistente com o fim do feito executivo que, na


primeira dificuldade de satisfação do crédito, se iniciasse a contagem do
prazo prescricional. O legislador, por isso, instituiu o prazo de 1 (um) ano
como o período para que se caracterize a situação processual necessária
para o início da fluência da prescrição intercorrente. Trata-se, portanto, de
um pressuposto dessa espécie de prescrição. Essa natureza jurídica afasta
o prazo de 1 (um) ano da exigência do art. 146, III, b, da CF/1988. Vale
dizer: como requisito processual, deve ser disciplinado por lei ordinária
nacional (art. 22, I, da CF/1988).

24. Não se está aqui a negar a necessidade de compatibilização


entre o Código Tributário Nacional – lei complementar que trata de
norma gerais de direito tributário – e a Lei de Execução fiscal – lei
ordinária de índole procedimental. O art. 40 da LEF não extrapola o
dispositivo constitucional, porque, ao estabelecer o marco inicial para a
prescrição intercorrente, apenas prevê um marco processual para a

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contagem do prazo, sem que deixe de observar o prazo de 5 (cinco) anos,


estabelecido no CTN.

I.4. TERMO INICIAL DE CONTAGEM DO PRAZO DE PRESCRIÇÃO


INTERCORRENTE

25. Considerando que a suspensão prevista no caput do art. 40


da LEF não pode implicar uma duração ad aeternum da execução fiscal,
torna-se imperativo o estabelecimento do termo final da suspensão. Trata-
se, aliás, de uma medida essencial à observância dos princípios
constitucionais relacionados ao processo, como o da segurança jurídica e
o do devido processo legal. Nesse sentido, impõe-se que se interprete o
art. 40, § 4º, da LEF, em linha com as normas constitucionais
mencionadas.

26. Para tanto, perceba-se que, nos termos da Súmula 314 do


Superior Tribunal de Justiça, “em execução fiscal, não localizados bens
penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual se inicia o prazo da
prescrição quinquenal intercorrente”. Nesse sentido, nas execuções fiscais,
após a suspensão anual da execução, independentemente do
arquivamento do feito, deve-se iniciar a contagem do prazo da
prescrição intercorrente. Não se sustenta, consequentemente, que o
marco inicial da prescrição intercorrente deve ser o despacho que ordena
o arquivamento dos autos, porque, em diversas situações, o referido
pronunciamento judicial jamais chega a se concretizar. Nesses casos,
impedir o início automático da contagem do prazo após o término da
suspensão poderia acarretar a eternização das execuções fiscais, em
contrariedade aos princípios da segurança jurídica e do devido processo
legal, sobretudo frente à exigência de razoável duração do processo. Com
efeito, o art. 40, § 4º, da LEF, deve ser lido de modo que, após o decurso
do prazo de 1 (um) ano de suspensão da execução fiscal, inicia-se
automaticamente a contagem do prazo prescricional de 5 (cinco) anos.

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I.5. SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO

27. Aplicando-se a tese jurídica aqui firmada ao caso concreto


dos autos, constato a ocorrência de prescrição intercorrente. Em
24.07.2003, foi deferido o pedido de suspensão do processo (fls. 175).
Assim, a partir de 24.07.2004, teve início o prazo quinquenal de prescrição
intercorrente. Em 16.11.2009, a Fazenda Nacional foi intimada para se
manifestar acerca desse fato (fls. 175), esclarecendo que não haviam sido
identificados quaisquer bens penhoráveis durante esse período. De modo
que, não obstante o reconhecimento da validade do art. 40 da Lei de
Execução Fiscal, com a interpretação conforme a Constituição exposta
acima, este recurso extraordinário não deve ser provido, uma vez que
reconhecida a prescrição intercorrente pelo Tribunal a quo.

II. CONCLUSÃO

28. Diante do exposto, nego provimento ao recurso


extraordinário.

29. Proponho a fixação da seguinte tese de julgamento: “É


constitucional o art. 40 da Lei nº 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais – LEF),
tendo natureza processual o prazo de 1 (um) ano de suspensão da execução fiscal.
Após o decurso desse prazo, inicia-se automaticamente a contagem do prazo
prescricional tributário de 5 (cinco) anos.”.

30. É como voto.

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Extrato de Ata - 22/02/2023

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PLENÁRIO
EXTRATO DE ATA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 636.562


PROCED. : SANTA CATARINA
RELATOR : MIN. ROBERTO BARROSO
RECTE.(S) : UNIÃO
ADV.(A/S) : PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL (00000/DF)
RECDO.(A/S) : JOSÉ LINO SCHAPPO
ADV.(A/S) : EUGÊNIO SALOMÃO RICHARD CÂMARA (6060/SC)
AM. CURIAE. : MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE
AM. CURIAE. : MUNICÍPIO DE SÃO PAULO
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, apreciando o tema 390 da


repercussão geral, negou provimento ao recurso extraordinário e
fixou a seguinte tese: “É constitucional o art. 40 da Lei nº
6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais – LEF), tendo natureza
processual o prazo de 1 (um) ano de suspensão da execução fiscal.
Após o decurso desse prazo, inicia-se automaticamente a contagem
do prazo prescricional tributário de 5 (cinco) anos". Falaram:
pela recorrente, a Dra. Flávia Palmeira de Moura Coelho,
Procuradora da Fazenda Nacional; e, pelo amicus curiae Município
de São Paulo, o Dr. Paulo André Moreira de Souza, Procurador do
Município. Plenário, Sessão Virtual de 10.2.2023 a 17.2.2023.

Composição: Ministros Rosa Weber (Presidente), Gilmar Mendes,


Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Luiz Fux, Roberto
Barroso, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Nunes Marques e André
Mendonça.

Carmen Lilian Oliveira de Souza


Assessora-Chefe do Plenário

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