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REVISTA VERDE DE AGROECOLOGIA E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

GRUPO VERDE DE AGRICULTURA ALTERNATIVA (GVAA)


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UTILIZAÇÃO DA MANDIOCA NA ALIMENTAÇÃO DE RUMINANTES

Adriano Henrique do Nascimento Rangel


Prof.D.Sc. Departamento de Ciências Animais-Universidade Federal Rural do Semi-Árido-UFERSA ,Núcleo de Estudo do
Agronegócio do Leite e Empreendedorismo – NEALE, Km 47 da BR 110,Caixa Postal 137,Mossoró- RN.
E-mail: adrianorangel@ufersa.edu.br

Fernando de Paula Leonel


Zootecnista D.Sc.Departamento Técnico da Serrana Nutrição Animal/ Bunge-Goiânia-GO
E-mail: fernando.leonel@bunge.com

Alexandre Paula Braga


Prof.D.Sc. Departamento de Ciências Animais-Universidade Federal Rural do Semi-Árido-UFERSA, Núcleo de Estudo do
Agronegócio do Leite e Empreendedorismo – NEALE, Km 47 da BR 110,Caixa Postal 137,Mossoró- RN.
E-mail: apbraga@ufersa.edu.br

Marcelo José Pedrosa Pinheiro


Prof.M.Sc.Departamento de Ciências Animais-Universidade Federal Rural do Semi-Árido-UFERSA, Km 47 da BR 110,Caixa Postal
137,Mossoró- RN.
E-mail: marcelopedrosa@ufersa.edu.br

Dorgival Morais de Lima Júnior


Graduando de Zootecnia da UFERSA-Núcleo de Estudo do Agronegócio do Leite e Empreendedorismo - NEALE, Km 47 da BR
110,Caixa Postal 137,Mossoró- RN.
E-mail: juniorzootec@yahoo.com.br

RESUMO: A redução dos custos dos sistemas de produção de ruminantes tem despertado interesse por estudos de
fontes energéticas alternativas que substitua os concentrados energéticos tradicionais, conferindo maior competitividade
e sustentabilidade ao setor. Nesse contexto, as pesquisas com mandioca (Manihot esculenta, Crantz) e seus subprodutos,
vêm se destacando nos últimos anos, em função da facilidade de seu cultivo e expressiva produção, além da
possibilidade de utilização de seus resíduos culturais e seus subprodutos industriais. Normalmente a colheita das raízes
é efetuada próximo aos 18 meses pós-plantio. Contudo, dependendo da variedade e das condições de alimentação, essas
são inadequadas para o consumo animal, imediatamente após a colheita, devido ao fato de que algumas variedades
(bravas) possuem elevados teores de ácido cianídrico (HCN). Este problema quando existente pode ser eliminado
através da picagem ou trituração das raízes e posterior secagem ao sol, transformando-se em raspas, as quais podem ser
devidamente armazenadas sem problemas. Na alimentação animal a mandioca pode ser fornecida sob as mais variadas
formas: raízes frescas, raspas, restos culturais (hastes e folhas) e subprodutos sólidos de sua industrialização (cascas,
entrecascas, descarte e farelos). A composição nutricional das raspas e dos resíduos variam sensivelmente com a
variedade de mandioca, com a idade da planta e com a época do ano, e ainda com o processo de fabricação dos produtos
derivados da mandioca. Nos tecidos da planta da mandioca estão presentes glicosídeos cianogênicos, especialmente a
linamarina e a lotoaustralina, que, em consequência da hidrólise, produzirem o ácido cianídrico (HCN), responsável por
efeitos tóxicos. Para a eliminação total ou parcial do conteúdo de HCN da mandioca, podem ser utilizados diversos
procedimentos, como a desidratação artificial com temperaturas superiores a 40º C, a cocção em água ou a desidratação
por radiação solar. Alguns trabalhos de pesquisa com farinha de varredura da mandioca na alimentação de bezerros tem
sido relatados com possibilidade de utilização em substituição ao milho com resultados satisfatórios com relação ao
ganho de peso, bem como, a inclusão da raspa de mandioca ou substituição do milho em vacas em lactação e animais
confinados, respectivamente, também são relatados com resultados satisfatórios. Outros trabalhos de pesquisa com a
utilização do bagaço de mandioca em substituição ao milho foram relatados com substituição viável de até 66%, sem
alterar o ganho de peso e a conversão alimentar dos bovinos em crescimento Concluese que a mandioca e seus
subprodutos constituem importante alternativa para a alimentação de ruminantes, podendo substituir totalmente o milho
nas rações sem comprometimento do desempenho dos animais.

Revista Verde (Mossoró – RN – Brasil) v.3, n.2, p.01-12 de abril/junho de 2008


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CASSAVA IN THE FEEDING OF RUMINANT


SUMMARY The reduction of the costs of the systems of production of ruminants has interested for studies of
alternative energy sources that substitutes the traditional energy concentrates, conferring bigger competitiveness and
sustentability to the sector. In this context, the research with cassava (Manihot esculent, Crantz) and its by-products,
come in recent years if detaching, in function of the easiness of its culture and high production, beyond the possibility
of use of its cultural residues and its industrial by-products. Normally the harvest of the roots is made next to the 18
months after-plantation. However, depending on the variety and the conditions of feeding, these are inadequate for the
animal consumption, immediately after the harvest, which had to the fact of that some varieties possess high levels of
prussic acid. This problem when existing can be eliminated through the triturayion of the roots and posterior drying to
the sun, making scraps, which can duly be stored without problems. In the animal feeding the cassava can be supplied
under the most varied forms: cool roots, cultural scraps, remaining portions (connecting rods and leaves) and solid by-
products of its industrialization. The nutritional composition of scraps and the residues varies significantly with the
variety of cassava, the age of the plant and the time of the year, and still with the process of manufacture of the products
derived from the cassava. In fabrics of the plant of the cassava they are present cianogenic glicosídeos, especially the
linamarina and the lotoaustralina, that, because of hydrolysis, to produce the prussic acid, responsible for toxic effect.
For the total or partial elimination of the content of prussic acid, of the cassava, diverse procedures can be used, as the
artificial dehydration with superior temperatures 40º C, the firing in water or the dehydration for solar radiation. Some
works of research with flour of sweepings of the cassava in the feeding of year-old calves have been told with
possibility of use in substitution to the maize with satisfactory results with regard to the weight profit, as well as, the
inclusion of the cassava scrap or substitution of the maize in confined cows in lactation and animals, respectively, also
is told with satisfactory results. Other works of research with the use of the cassava bagasse in substitution to the maize
had been told with viable substitution of up to 66%, without modifying the profit of weight and the alimentary
conversion of the bovines in growth, we can conclude that the cassava and its by-products constitute important
alternative for the feeding of ruminants, being able to total substitute the maize in the rations without affect the
performance of the animals.

subprodutos industriais (casca, farinha de varredura,


INTRODUÇÃO fécula etc), com importância marcante na alimentação
humana e forragem animal .
A globalização da economia mundial determina mudanças Conhecida pela rusticidade e pelo papel social que
estratégicas nas organizações e nas estruturas de desempenha junto às populações de baixa renda, a cultura
produção. A adequação destas estruturas às novas da mandioca tem grande adaptabilidade aos diferentes
exigências do mercado constitui garantia de sobrevivência ecossistemas, possibilitando seu cultivo em praticamente
em ambientes de competição elevada. Estas mudanças todo o território nacional. Sua produção mundial é de
vêm ocorrendo em todo cenário econômico nacional, do mais de 180 milhões de toneladas anuais. Esta entre os
qual a agropecuária é parte integrante. dez produtos alimentares da humanidade em volume de
O agronegócio brasileiro tem importância fundamental na produção. Cerca de 65% da produção mundial da cultura
balança comercial, como gerador de renda e riqueza, fica localizada na
sendo responsável por 33% do produto interno bruto, 42% Nigéria,Brasil,Tailândia,Congo,Indonésia e Gana
da pauta de exportações e 37% dos empregos. No ano de (MAPA,2005). Sendo o Brasil o país mais desenvolvido
2004, as vendas externas de produtos agropecuários dentre os grandes produtores .
renderam ao Brasil US$ 36 bilhões, com superávit de A cultura da mandioca no Brasil se localiza em todas as
US$ 25,8 bilhões (CEPEA, 2004). E dentro desse regiões fisiográficas, exceto nas áreas mais frias do país.
contexto, a redução dos custos dos sistemas produção de Segundo estimativas do IBGE, referente a safra nacional
ruminantes, tem despertado interesse por estudos de de mandioca 2006/2007 foi de 27,5 milhões de toneladas
fontes energéticas alternativas que substitua os de raiz, destacando-se as contribuições da regiões
concentrados energéticos tradicionais, conferindo maior Nordeste e Norte com 35,9% e 25,2%, respectivamente,
competitividade e sustentabilidade ao setor (HOLZER et da produção nacional. Nas demais regiões, essa
al., 1997; MEDRONI, 1998; e ZEOULA et al., 1998). participação foi de 23,1% no Sul, 9,7% no Sudeste e 6%
E sob essa ótica, as pesquisas com mandioca (Manihot no Centro Oeste.
esculenta, Crantz) e seus subprodutos, vêm se destacando No atual cenário em que as margens de retorno
nos últimos anos, em função da facilidade de seu cultivo, econômico das atividades pecuárias se encontram cada
expressiva produção e seu papel na conjuntura sócio- vez mais restritas, a busca por maior eficiência produtiva
econômica do país, além da possibilidade de utilização de se torna uma questão de sobrevivência. Nesse sentido o
seus resíduos culturais (folhas e caule), e de seus aproveitamento dos subprodutos provenientes da cultura
da mandioca assume um importante papel de expressivo

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valor econômico, face ao volume dos resíduos, sua de forma prática, tomando-se um pedaço de raspa ou raiz,
disponibilidade, bem como a sua utilização, basicamente se este riscar um determinado piso, como um giz, indica
na forma de insumos na alimentação e ruminantes . que está com teor de umidade adequado.
No caso de variedades mansas (baixos teores de HCN),
Características do Cultivo da Mandioca estas devem ser lavadas e picadas ou quebradas, e
fornecidas imediatamente aos animais, pois em ambientes
A exploração da mandioca está localizada entre os 30 tropicais o amido pode sofrer hidrólise, facilitando uma
graus de latitude Norte e Sul, embora a concentração do fermentação alcoólica, o que pode inviabilizar o uso desse
plantio esteja entre as latitudes 150 N e 150 N. É uma material rapidamente.
planta rústica e com capacidade de adaptação às A parte aérea da planta da mandioca, também pode ser
condições mais variadas de clima e solos.O clima mais utilizada na alimentação de ruminantes, sendo nesse caso
adequado é o quente úmido.A temperatura ideal varia de comum a prática de dois cortes entre o plantio e a
180 C e 350 C.Suporta altitudes desde o nível do mar até colheita. Para a confecção de feno de elevado teor
cerca de 2.000m, com precipitações anuais bem protéico, CARVALHO e KATO (1987) recomendam dar
distribuídas oscilando de 1.000mm a 1.500mm preferência ao terço superior da planta, fazendo-se os
(MATIAS, 2008). cortes 12 e 16 meses após o plantio, ou seja, no período
A propagação da mandioca,se dá de forma vegetativa, por de maior enfolhamento. Nestas épocas, apesar dos taninos
meio de hastes denominadas estacas ou manivas, as quais totais serem altos, as formas poliméricas, apresentam-se
devem possuir cerca de 5 a 7 nós e comprimento mínimo com teores relativamente baixo, não suficiente para
de 20 cm, com diâmetro aproximado de 2,0 a 2,5 cm. exercerem um efeito depressor sobre digestibilidade
Manivas provenientes de plantas que se encontram com 8 protéica. Para a obtenção de feno de qualidade, CAMPOS
a 12 meses de idade são as mais indicadas para o plantio, NETO e BEM (1997) recomendam retirar a haste
pois apresentam grande número de gemas viáveis principal após a colheita, o que permitirá maior
(CONCEIÇÃO, 1986 ). concentração de folhas e hastes tenras e,
Normalmente o plantio da mandioca é realizado com consequentemente, maior teor protéico. O passo seguinte
espaçamento de 1,0 x 0,5 m, sendo necessário para o é picar esse material em partículas de aproximadamente 2
plantio de 01 ha aproximadamente 04 a 06 m3 de ramas. cm, sendo o mesmo colocado para o processo de
A mandioca praticamente não responde à aplicação de secagem sobre lona ou área cimentada, revirando-o
nitrogênio e potássio (K). Todavia as respostas à periodicamente até que alcance umidade próxima a 12%.
aplicação de fósforo são mais freqüentes. Por ocasião do Outras formas de utilização da parte aérea podem ser:
plantio, recomenda-se a aplicação de até 80 kg/ha de P2O5 fresca, seca ao sol, ensilada, ou ainda na forma de farelo
e até 60 kg/ha de K2O. ou peletizada (CARVALHO, 1984).
Em trabalho, realizado no estado de Santa Catarina-SC,
Formas de utilização ALMEIDA et al. (1990), objetivando determinar sistemas
de corte e aproveitamento da parte aérea da mandioca em
Normalmente a colheita das raízes é efetuada próximo aos cultivo de dois ciclos (plantio em outubro de 1985 e
18 meses pós-plantio. Contudo, dependendo da variedade colheita de raízes em maio de 1987) buscando maior
e das condições de alimentação, essas são inadequadas rendimento e valor nutritivo com mínimo de perdas na
para o consumo animal, imediatamente após a colheita, produção de raízes, recomendaram dois cortes da parte
devido ao fato de que algumas variedades (bravas) aérea da mandioca, de 10 a 30 cm do solo, sendo o
possuem elevados teores de ácido cianídrico (HCN). Este primeiro corte sete meses após o plantio, e o segundo
problema quando existente pode ser eliminado através da aproximadamente 18 meses após o plantio. Cortes feitos
picagem ou trituração das raízes e posterior secagem ao nestes períodos não reduziram a produção de raízes e
sol, transformando-se em raspas, as quais podem ser proporcionaram um aumento de 40% da produção de
devidamente armazenadas sem problemas (PEREIRA, proteína bruta (PB) pelas folhas, conforme pode ser
1987). De acordo com SAMPAIO et al. (1997), o ponto observado na Tabela 1.
de secagem (menos de 15% de umidade) é determinado

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TABELA 2: Produção de raízes e parte aérea de mandioca, cultivar Mico, em cultivo de dois ciclos, EMPASC,
Ituporanga, 1989
Época de corte (meses pós- Raízes Parte Aérea
plantio)
Produção (kg/ha) Redução (%) Amido Produção de MS Produção de PB
(%) (kg/ha) (kg/ha)

4 e 15 22.161c 43,3 26,9 4.404 c 717b


5 e 16 22.794c 25,8 41,7 5.872 bc 960a
6 e 17 31.564b 19,2 25,9 7.194 ab 934a
7 e 18 38.442a 1,6 28,8 6.861 ab 710b
8 e 19 (Testemunha) 39.090a 0,0 30,9 8.023 a 508c

A parte aérea fresca da mandioca é a forma mais Nestas condições, a silagem da parte aérea da
simples para se fornecer aos animais. CAMPOS NETO e mandioca apresenta fermentação láctica e acética dentro
BEM (1997) recomendam fornecer esse material picado, de padrões desejáveis, o que confere uma boa qualidade
com tamanhos de partículas entre 3 a 5 cm. No caso de ao material ensilado. Considerando um cultivo de dois
variedades mansas, o material picado pode ser fornecido ciclos, pode-se trabalhar com o terço superior da parte
aos animais imediatamente, já as variedades bravas aérea no primeiro corte (feno ou silagem) e ensilar a parte
(elevados teores de HCN), devem sofrer um processo de aérea total (10 a 30 cm do solo) por ocasião da colheita.
murcha de, no mínimo, 24 horas, para promover redução
do teor de ácido cianídrico (HCN) para níveis não tóxicos Caracterização Nutricional da Mandioca e
aos animais. seus Subprodutos
A confecção da silagem da parte aérea é um
método empregado com o objetivo da conservação do O processamento industrial da mandioca está
valor nutritivo desse material. Alguns autores, preferem relacionado à fabricação de farinha e à extração de fécula
considerar somente os dois terços finais ou superiores (amido). Na alimentação animal a mandioca pode ser
como um material adequado para o fornecimento aos fornecida sob as mais variadas formas: raízes frescas,
animais, além da liberação da parte da haste de maior raspas, restos culturais (hastes e folhas) e subprodutos
diâmetro para novo plantio. Entretanto, de acordo com sólidos de sua industrialização (cascas, entrecascas,
CARVALHO et al. (1983), o corte a 5 cm acima do solo descarte e farelos). Pode ser observado na Figura 1 os
possibilita melhor conservação do material ensilado, por principais resíduos energéticos da mandioca que possuem
manter maior porcentagem de carboidratos solúveis, interesse de inclusão em dietas de ruminantes.
essenciais para uma boa fermentação láctica.

FIGURA 1: Obtenção dos subprodutos a partir das raízes da mandioca


FONTE: CAMPOS NETO e BEM (1995)

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Apesar de não existirem dados absolutos a O farelo de varredura e do lavador é obtido a


respeito da quantidade total de resíduos produzidos a partir da industrialização para obtenção do amido, da
partir da industrialização farinheira, sabe-se que cerca de farinha de mesa e da farinha de raspas, sendo constituído
10% da mandioca total utilizada na fabricação de farinha de todo material perdido no chão recolhido e juntado ao
é eliminada na forma de casca e cerca de 3 a 5%, na resíduo do lavador, sendo posteriormente seco e moído.
forma de farinha de varredura (CALDAS NETO et al., Geralmente possui uma coloração escura devido à
2000a). presença de terra.
As raspas são obtidas por meio da picagem e A casca corresponde à periderme e varia entre 2
desidratação da raiz ao sol ou em estufa, e quando e 5% do peso total das raízes. É um resíduo proveniente
desintegradas transformam-se em farelo de raspa de principalmente de fecularia, geralmente constituído da
mandioca (Silva, 1983, citado por PEREIRA, 1987). mistura de casca e entrecasca (CAMPOS NETO e
O farelo ou bagaço é o resíduo composto pelo BEM,1995; MARTINS et al., 2000).
material fibroso da raiz, possuindo também certa O descarte é um subproduto proveniente da
quantidade de amido residual. É proveniente do seleção das raízes antes de serem submetidas ao ralador.
processamento da extração da fécula, obtido após a Possui composição semelhante à raiz de mandioca, porém
segunda peneiragem. Como para a obtenção da fécula é apresenta teor de fibra mais elevado, devido à presença do
utilizado um grande volume de água, esse resíduo chega a pedúnculo (CAMPOS NETO e BEM, 1995).
apresentar cerca de 75% de umidade (CAMPOS NETO e A composição nutricional das raspas e dos
BEM, 1995). resíduos variam sensivelmente com a variedade de
O farelo de farinha de mesa ou crueira , é o mandioca, com a idade da planta e com a época do ano, e
resíduo da produção de farinha de mesa, que após a ainda com o processo de fabricação dos produtos
peneiragem, os pedaços da casca e raiz que escaparam à derivados da mandioca (PEREIRA, 1987). Observa-se na
ralação formam um resíduo grosseiro (PEREIRA, 1987). Tabela 2, uma compilação de dados da composição
O farelo de raspas é obtido após a moagem e químico-bromatológica da mandioca e seus
peneiragem das raspas para obtenção da farinha de raspas. subprodutos/resíduos.

TABELA 3: Composição químico-bromatológica da mandioca e seus subprodutos/ resíduos


Item MS PB1 EE1 NDT1 CHOT1 CHOSol pH FDN1 FDA1
Farelo de Farinha de 90,95 3,69 0,86 76,69 93,59 --- --- --- ---
Mesa2
Mandioca Raspa2 88,42 2,97 0,49 --- 93,14 --- --- 24,93 ---
Casca de Mandioca3 88,68 3,37 --- --- --- --- --- 28,63 20,44
Farelo de Bagaço4 89,83 1,64 0,48 74,83 --- --- --- --- ---
Farelo de Bagaço 17,23 2,30 --- --- --- --- --- 34,90 29,36
(silagem)5
Silagem da raiz6 45,00 1,61 0,37 --- --- --- --- --- ---
Silagem parte aérea 24,19 10,29 --- --- --- 14,92 4,04 --- ---
total7
Silagem terço superior7 24,15 12,15 --- --- --- 14,82 4,11
Feno parte aérea total7 85,16 9,87 5,222 49,912 68,532 17, 48 --- 74,292 45,012
7
Feno terço superior 84,63 9,88 --- --- --- 16,37 --- --- ---
1
% MS; 2VALADARES FILHO (2000); 3PRADO et al. (2000); 4MELOTTI (1972), citado por PEREIRA (1987);
5
RAMOS et al. (2000b); 6 LOPES (1998); 7TIESENHAUSEN (1987)

Particularidade sobre amido A amilose é um polímero linear de D-glicose


O amido é composto de átomos de carbono, unidas através de ligações α1-4, existindo na forma de
hidrogênio e oxigênio em uma relação 6:10:5 (C6H10O5)n, hélice. A proporção de amilose no amido varia de 0 a
sendo um polímero de moléculas de glicose, ligadas por 80% dependendo da espécie e das variações genéticas
meio de ligações glicosídicas, apresentando em sua dentro da espécie. O milho, sorgo, trigo e os demais
composição dois tipos principais de moléculas, amilose e cereais contêm na composição da molécula de amido uma
amilopectina, podendo conter ainda pequena quantidade maior quantidade de amilose (cerca de 28%) em relação
de amilose ramificada (Swinkels, 1985; Rooney e ao amido de raízes e tubérculos (mandioca, batata). As
Pflugfelder, 1986, citados por ZEOULA e CALDAS moléculas de amilose da mandioca e batata apresentam
NETO, 2001). um peso molecular substancialmente mais elevado que o

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milho e o trigo, sendo que enquanto as moléculas de da mandioca explica sua a maior digestibilidade quando
amilose da batata apresentam de 1000 a 6000 unidades de comparada com o amido do milho e sorgo.
glicose, a amilose do milho apresenta de 200 a 1200 Os grânulos de amido se distribuem de forma
moléculas de glicose. diferente nos diversos grãos, variando com o cereal e com
A amilopectina é um polímero ramificado, com as diversas variedades. De forma geral, o grão é composto
maior peso molecular e geralmente mais abundante na por três camadas distintas: pericarpo, endosperma e
composição das moléculas de amido em relação a embrião.
amilose. Sua composição consiste de cadeias lineares de O pericarpo corresponde à superfície protetora
glicose com 10 a 60 unidades ligadas por ligações que envolve o grão, servindo como uma barreira,
glicosídicas α1-4, apresentando ramificações através de impedindo inclusive a atividade de enzimas hidrolíticas,
ligações α1-6 em média a cada 20 ou 25 unidades de caso a mesma não seja rompida pela mastigação ou por
glicose. A amilopectina compõe de 70 a 80% do amido processamentos, sendo seu teor de amido muito pequeno.
dos cereais e até 85% do amido em raízes. O endosperma corresponde a uma estrutura de
As moléculas de amilose e amilopectina do reserva contendo a maior parte do amido, sendo dividido
amido são mantidas juntas através da formação de pontes em diversas camadas. A mais externa é denominada
de hidrogênio entre os grupamentos hidroxila das aleurona, seguida pelo endosperma periférico e pelo
unidades de glicose, apresentando assim insolubilidade endosperma córneo; enquanto a camada mais interna é
em água fria. Apesar das pontes de hidrogênio serem denominada de endosperma farináceo.
fracas, existe uma quantidade enorme de pontes em uma O endosperma periférico e o córneo contêm
molécula de amido, acarretando esta insolubilidade. grânulos de amido envoltos por uma matriz, composta
Contudo, os grânulos de amido apresentam a capacidade principalmente por proteína e carboidratos não-amiláceos,
de se dilatar de forma reversível (10 a 15% de aumento no relativamente impermeáveis à água e à atividade
diâmetro) na água fria, retornando ao estado original após enzimática (Kotarski et al., 1992; Huntington, 1997;
a secagem. O grânulo de amido de raízes e tubérculos citados por ZEOULA e CALDAS NETO, 2001).
apresenta uma maior capacidade de expansão na água que Finalmente, o endosperma farináceo é aquele que se
o amido dos cereais. encontra mais próximo ao embrião, sendo constituído
A estrutura dos grânulos de amido apresenta praticamente de grânulos de amido, encontrados em
duas áreas distintas. A primeira apresenta uma estrutura grande densidade, sendo altamente susceptível a atividade
organizada, sendo denominada região cristalina; enquanto enzimática (ZEOULA e CALDAS NETO, 2001).
a segunda, conhecida como região amorfa é relativamente O trigo, o centeio e a aveia apresentam maior
desorganizada. A região cristalina ou micelar é proporção de endosperma farináceo na constituição dos
primeiramente composta de amilopectina, sendo esta a grãos, apresentando menor quantidade de amido envolto
principal responsável pela organização desta área. A área por uma matriz protéica. Fato esse, que pode explicar a
cristalina apresenta uma maior resistência à entrada de maior digestibilidade destes cereais em relação ao milho e
água e consequentemente a atividade enzimática. A região ao sorgo, os quais apresentam maior proporção de
amorfa é rica em amilose e menos densa que a área endosperma periférico e córneo. O sorgo é o que
cristalina. Devido a menor densidade, a água se move apresenta a maior camada de endosperma periférico e
livremente através desta região e a atividade hidrolítica córneo, e matriz protéica mais densa, que determinam
das amilases em geral se inicia nesta área (Rooney e digestibilidade inferior do amido em relação ao milho.
Pflugfelder, 1986; citados por ZEOULA e CALDAS As cultivares cujos grãos apresentam alta
NETO, 2001). Desta forma, aparentemente uma maior proporção de endosperma periférico e córneo são
proporção de amilose na molécula de amido denominados vítreos, córneos ou pétreos, devido sua
proporcionaria uma melhor atividade hidrolítica. Contudo aparência vítrea. Os cultivares ricos em endosperma
o que ocorre na realidade é uma diminuição na hidrólise farináceo são denominados opacos, farináceos ou moles.
do amido e consequentemente da digestibilidade de fontes O conhecimento dos valores de degradabilidade
de amido com maior teor de amilose, devido a maior efetiva do amido, obtido através da técnica de
formação de pontes de hidrogênio. degradabilidade in situ é de grande importância devido à
Desta forma, a maior capacidade de expansão do necessidade de se determinar às relações de sincronização
amido da mandioca em relação ao amido dos cereais, em no rúmen entre as fontes energéticas ricas em amido e as
especial ao do milho, pode estar relacionada a menor fontes protéicas, de forma a maximizar a eficiência
quantidade de amilose, ao fato da amilose estar presente microbiana. De modo geral, os maiores valores de
apenas na região amorfa (formando menos pontes de degradabilidade efetiva do amido foram obtidos para
hidrogênio com a amilopectina) e a menor formação de aveia, trigo, triticale e cevada, sendo os menores valores
complexos lipídio-amilose. Esta característica do amido obtidos para o milho e sobretudo sorgo (Tabela 3).

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Tabela 4 : Fração solúvel (a), potencialmente degradável (b), taxa de degradação da fração b (c) (%/h), degradabilidade efetiva
e corrigida do amido das principais fontes (taxa de passagem de 5%/h)
Fonte de amido a B c Média e desvio padrão Referências *
Milho moído 29,3 73,30 5,6 57,6 ± 3,1 1,2,3,4,5,7,8,10,13
Milho moído 13,1* - - 55,0** 13
Milho amassado# 8,8 91,2 1,3 34,5 12
Sorgo moído 52,1 38,1 3,4 54,5 ± 11,6 1,7,8,9,11,13
Sorgo moído 10,7* - - 39,5** 13
Sorgo amassado 12,7 87,3 2,7 47,7 12
Cevada moída - - - 95,4 ± 3,2 1,2,3,4,7,8
Cevada amassada 12,7 86,1 7,1 65,4 12
Triticale moído 84,6 15,1 5,1 91,2 ± 11,2 6,8,13
Triticale moído 20,8* - - 91,9** 13
Triticale amassado 18,8 76,9 18,2 80,5 12
Trigo moído - - - 97,4 ± 3,5 1,2,3,4,7,13
Trigo moído 0,7* - - 90,3** 13
Trigo amassado 11,9 86,4 33,2 87,4 12
Aveia moída - - 5,0 96,4 ± 2,2 2,3,4,7,8
Aveia amassada 25,8 66,4 5,1 63,3 12
Mandioca moída 51,9 47,5 7,0 80,2 ± 5,1 7,13,10,11
Mandioca moída 14,0* - - 62,7** 13
Mandioca amassada 23,1 76,9 7,3 66,3 12

Arieli et al. (1995); 2. Cerneau e Michalet- fontes de amido e nitrogênio de diferentes


Doreau (1991); 3. Herrera-Saldana et al. (1990b); 4. degradabilidades ruminais não influenciaram o pH e a
Johnson (1998); 5. Mertens et al. (1992); 6. Metayer et al. concentração de amônia no líquido ruminal. A
(1993); 7. Nocek e Taminga (1991); 8. Piva et al. (1987); composição química das bactérias ruminais isoladas não
9. Rossi Jr et al. (1997); 10. Simas et al. (2000); 11. Smet foi influenciada pelas fontes de amido e nitrogênio. A
et al. (1995); 12. Zeoula et al. (1998a); 13. Zeoula et al. eficiência de síntese microbiana não diferiu entre as
(1999a); citados por ZEOULA e CALDAS NETO (2001) fontes de amido e nitrogênio avaliadas. No entanto,
# Os grãos inteiros e a mandioca integral picada CALDAS NETO et al. (2000b) observaram menor
e seca, foram amassados em cilindro de preparar massas. concentração de amônia ruminal, menor digestibilidade
*Fração solúvel obtida em solução tampão ruminal da PB e maior eficiência microbiana para as
bicarbonato fosfato rações com farinha de varredura, em substituição total ao
**Degradabilidade corrigida pela solubilidade milho, indicando uma melhor sincronização na
em solução tampão de bicarbonato-fosfato. disponibilidade de energia e nitrogênio no rúmen.

O amido da mandioca apresenta maior Toxidez Cianogênica das Mandiocas


degradabilidade efetiva em relação ao do milho e do
sorgo, devido à inexistência de pericarpo, endosperma Nos tecidos da planta da mandioca estão
córneo e periférico, matriz protéica e possivelmente presentes glicosídeos cianogênicos, especialmente a
devido à uma menor proporção de amilose e lipídios nos linamarina e a lotoaustralina, que, em consequência da
grânulos de amido, diminuindo a quantidade de ponte de hidrólise, produzirem o ácido cianídrico (HCN),
hidrogênio na molécula de amido e aumentando responsável por efeitos tóxicos. A linamarina, assim como
capacidade de expansão do amido da mandioca em meio outros glicosídeos cianogênicos, é facilmente hidrolisável
aquoso. por betaglicosidases originando a cianoidrina. Esta por
FREGADOLLI et al. (2001) avaliaram o efeito sua vez é hidrolizada pela hidroxinitrila-liase em HCN e
de rações contendo 50% de silagem de milho e 50% de acetona (Figura 2). Ambas as enzimas estão presentes no
concentrado, resultante da combinação de fontes de amido tecido vegetal e são liberadas quando a célula é lesada.
de alta (casca de mandioca) e baixa (milho) Assim, a expressão conteúdo em ácido cianídrico deve ser
degradabilidade ruminal, com fontes de nitrogênio (N) de entendida como potencial, pois o HCN não se apresenta
alta (levedura) e baixa (farelo de algodão e farinha de na forma livre em nenhuma planta até que o glicosídeo
carne e ossos) degradabilidade ruminal sobre o pH, seja quebrado (NUNES, 1998).
amônia e eficiência microbiana. As rações compostas por

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FIGURA 2: Mecanismo da decomposição enzimática da linamarina

FONTE: TELES (1987)

Com base no nível de glicosídeos cianogênicos se obtido ótimos resultados com o processo de extrusão
e/ou de ácido cianídrico presentes na raiz é que se das raízes de mandioca (TELES, 1987).
determina a diferença entre as variedades de maior
toxicidade, conhecidas como bravas, e variedades menos Avaliação do Desempenho de Ruminantes
tóxicas, mansas. CAMPOS NETO e BEM (1997) Alimentados com Mandioca e seus Subprodutos
recomendaram a seguinte classificação de acordo com o
teor de HCN nas raízes dos diferente cultivares: Com o objetivo de avaliar a substituição do
Não tóxicas: menos de 50 mg/kg de raízes milho pela farinha de varredura (0, 25, 50, 75 e 100% na
frescas; base da matéria seca), JORGE et al (2002a) trabalhando
Pouco tóxicas: de 50 a 80 mg/kg de raízes com bezerros holandeses, verificaram uma redução sobre
frescas; o consumo de matéria seca, proteína bruta e fibra em
Tóxicas: de 80 a 100 mg/kg de raízes frescas; detergente neutro, entretanto, não houve redução no
Muito tóxicas: mais de 100 mg/kg de raízes consumo de amido. O ganho de peso foi reduzido com a
frescas inclusão de farinha de varredura, contudo, a conversão
Para a eliminação total ou parcial do conteúdo de alimentar não foi alterada. Os níveis substituição não
HCN da mandioca, podem ser utilizados diversos influenciaram os níveis de hematócrito, uréia e glicose
procedimentos, como a desidratação artificial com sangüíneos. Os autores concluíram que a farinha de
temperaturas superiores a 40º C, a cocção em água ou a varredura pode ser utilizada em substituição total ao
desidratação por radiação solar. Quando o material é milho na alimentação de bezerros holandeses do
submetido a desidratação, ao atingir um nível de 10 a desaleitamento até 180 dias de idade, com ganhos de
15% de umidade, o ácido cianídrico é volatilizado, pesos satisfatórios.
podendo o produto ser consumido sem riscos ao Os resultados da substituição (0, 33, 67 e 100%)
metabolismo animal. do milho pela farinha de mandioca de varredura, em
De acordo com CARVALHO (1987), a dietas de cabras Saanen em lactação, sobre o desempenho,
trituração provoca ruptura de tecidos, facilitando um a composição do leite (sólidos totais e proteína bruta), a
maior contato entre enzima (linamarase) e substrato digestibilidade da matéria seca (MS), matéria orgânica
(linamarina) e, consequentemente, maior liberação de (MO), proteína bruta (PB), extrato etéreo (EE), fibra em
ácido cianídrico por volatilização. detergente neutro (FDN), e amido, assim como, a
Qualquer processo que provoque a ruptura de concentração dos nutrientes digestíveis totais (NDT) das
tecidos, tais como, esmagamento, moagem etc., dietas, foram avaliados por MOURO et al. (2002),
desencadeará no mesmo efeito de liberação de HCN, utilizando quatro cabras com 100 dias de lactação. Os
diminuindo a toxidade dos produtos. Devido à alta autores concluíram que o milho pode ser totalmente
concentração de enzimas na entrecasca, a trituração da substituído pela farinha de mandioca de varredura por não
raiz integral confere também alta liberação de HCN. Têm- alterar a digestão, excreção e digestibilidade da MS, MO,
PB, FDN e CNE. O teor de NDT não variou com a

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substituição do milho pela farinha de mandioca. A meses de idade, confinadas durante 76 dias. Houve
produção e composição do leite não foram afetadas pelo diferença na ingestão de nutrientes entre as dietas, porém,
uso da farinha de mandioca. não houve efeito das fontes energéticas sobre o ganho
Ribeiro et al. (1976), citados por CAMPOS médio diário, o rendimento de carcaça e a conversão
NETO e BEM (1997), estudando melaço desidratado e alimentar. Portanto, a casca de mandioca pode substituir o
raspa de mandioca como substitutos parciais do milho em milho, como fonte de energia, sem alterar o desempenho
rações fornecidas para vacas em lactação, concluíram que de novilhas terminadas em confinamento.
é possível incluir até 50% de raspa de mandioca. O uso do bagaço de mandioca em substituição
Os resultados da substituição do milho pela (0, 33, 66 e 99%) ao milho no concentrado para bovinos
casca, farinha de varredura ou raspa de mandioca sobre em crescimento foi avaliado por RAMOS et al, (2000a).
ganho médio diário, consumo, conversão alimentar e Foram utilizados dezesseis bezerros mestiços machos
rendimento de carcaça de novilhas confinadas, foram inteiros e testados quatro tipos de concentrado associados
avaliados por MARQUES et al. (2000). A casca de ao fornecimento ad libitum de feno de aveia/azevém
mandioca substituiu, com base na MS, aproximadamente (Avena strigosa, L.; Lolium multiflorum, L.) e
50% do milho no concentrado, e a farinha de varredura e suplementação média de concentrado de 0,83% PV. Os
a raspa de mandioca substituíram em até 100% o milho no autores concluíram que o bagaço de mandioca
concentrado. Foram utilizadas 28 novilhas mestiças, com caracteriza-se como subproduto de boa utilização pela
aproximadamente 24 meses de idade e peso médio inicial microflora ruminal, apresentando coeficiente de
de 365 kg. A substituição do milho pela mandioca e seus digestibilidade da MS acima de 61% para níveis de
resíduos embora tenha reduzido o consumo de alimentos, inclusão de concentrado de até 100% em substituição ao
não alterou o ganho em peso, a conversão alimentar da milho. A utilização do bagaço de mandioca em
MS e o rendimento de carcaça dos animais. Os autores substituição ao milho no concentrado para bovinos até o
concluíram que a mandioca e seus resíduos podem ser nível de 66%, não alterou o ganho de peso médio diário e
utilizados em substituição ao milho, para animais a conversão alimentar dos animais.
confinados. Todavia, sugeriu-se, que os níveis de
substituição do milho pela farinha de varredura e raspa de
mandioca sejam melhor estudados, para evitar problemas
de consumo e acidose. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Alguns trabalhos têm relatado menor consumo
por animais quando se utiliza a farinha de varredura
(Teege e Zimmerman, 1977; Peixoto e Warner, 1993; A mandioca e seus subprodutos constituem
citados por MARQUES et al., 2000). Os autores importante alternativa para a alimentação de ruminantes e,
atribuíram esta redução ao fato de a ração ser muito via de regra, podem substituir totalmente o milho nas
pulverulenta, apresentar baixa palatabilidade e ser seca rações sem que isso implique no comprometimento do
(somente 0,6% de extrato etéreo). Desse modo, quando desempenho animal.
em contato com a saliva dos animais, formava-se uma Os estudos, de maneira geral, têm demonstrado,
substância pastosa que, ao aderir à boca dos animais que a mandioca equivale ao milho nutricionalmente,
dificultava o consumo. A utilização de rações completas sendo a tomada de decisão sobre seu uso na alimentação
pode minimizar este problema e evitar a redução no de ruminantes, fundamentada na análise do preço
consumo. instantâneo e nas anuências do mercado local. É
Os resultados da combinação de fontes importante que a comparação de preços seja efetuada com
energéticas (milho ou casca de mandioca) e fontes base na matéria seca.
protéicas (levedura ou farelo de algodão + farinha de A parte aérea da mandioca pode ser um
carne e ossos) de quatro dietas foram avaliados por importante componente na dieta de ruminantes,
PRADO et al, (2000). O tratamento com casca de principalmente em épocas do ano caracterizadas pela
mandioca substituía o milho em 100% no concentrado e a baixa disponibilidade de alimentos.
silagem de milho foi utilizada como fonte de volumoso.
Utilizou-se 28 novilhas com média de 303 kg PV e 18

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TABELA 5 : Resumo sobre a utilização da mandioca e seus subprodutos/ resíduos na alimentação de ruminantes
Tratamento Tipo Animal Fase Duração CMS GMD Produção de
(Dias) (kg/ dia) Leite
1
Milho pela farinha de varredura Bezerros 80 kg 84 2,43; 2,35; 2,26; 1,0; 1,03; 0,94; ---
(0; 25; 50; 75; 100%) + 20% feno Tifton Holandeses 2,18; 2,23 0,99; 0,86
%PV/dia
2
Milho pela farinha de varredura (0; 25; 50; Bezerros 163 kg 21 97,0; 96,6; 96,5; --- ---
75; 100%) + 20% feno Tifton Holandeses PVI 97,4; 99,5 g/
kg0,75
3
Milho pela farinha de varredura (0; 33; 67; Cabras 100 dias/ 60 1,89; 1,74; 1,73; --- 2,14; 2,00;
100%) + 40% feno alfafa Saanen lactação 1,89 kg/dia 2,06; 2,21 kg
4
Melaço desidratado e raspa de mandioca Vacas em --- --- --- --- Sem efeito
como substitutos parciais do milho lactação (até 50% de
inclusão da
raspa
mandioca)
5
Milho pela casca; farinha de varredura; raspa Novilhas 365 kg 56 2,7; 2,5; 2,1; 2,2 1,60 ---
de mandioca mestiças PVI %PV
6
Milho ou casca de mandioca desidratada Novilhas 303 kg 76 2,15; 2,09 %PV 0,79 ---
cruzadas PVI
(Limousin e
Simental x
Nelore)
7
Milho por bagaço de mandioca (0; 33; 66; Novilhos 215 kg 56 83,51; 88,16; 1,10; 0,95; ---
99%) mestiços 87,83; 83,17 1,12; 0,75
inteiros g/kg0,75
1
JORGE et al. (2002a); JORGE et al. (2002b); MOURO et al. (2002); Ribeiro et al. (1976), citados por CAMPOS NETO e BEM (1997); 5MARQUES et al. (2000) 6PRADO et al. (2000);
2 3 4
7
RAMOS et al. (2002a).

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