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Table of Contents

Diagramas e ilustraçõ es

Introduçã o: Por que Deus?

Parte 1 — QUESTÕ ES BÁ SICAS

1. Deus e a matemá tica

2. O um e os muitos

3. Naturalismo

4. A natureza dos nú meros

Parte 2 — NOSSO CONHECIMENTO DA MATEMÁ TICA

5. As capacidades humanas

6. Necessidade e contingência

Parte 3 — ESTRUTURAS MATEMÁ TICAS SIMPLES

7. Adiçã o

8. A ideia do que vem a seguir

9. Derivando a aritmética da sucessã o

10. Multiplicaçã o

11. Simetrias

12. Conjuntos

Parte 4 — OUTROS TIPOS DE NÚ MEROS

13. Divisã o e fraçõ es

14. Subtraçã o e nú meros negativos

15. Nú meros irracionais

16. Nú meros imaginá rios

17. O infinito
Parte 5 — GEOMETRIA E MATEMÁ TICA SUPERIOR

18. Espaço e geometria

19. Matemá tica superior

Conclusã o

SUPLEMENTOS

Recursos

Apêndice A

Apêndice B

Apêndice C

Apêndice D

Apêndice E

Bibliografia
1
 

 
 
 
REDIMINDO A MATEMÁ TICA
UMA ABORDAGEM TEOCÊ NTRICA

 
 
 
 
VERN S. POYTHRESS
 
 
 

 
Redimindo a matemática é um acréscimo valioso à crescente literatura sobre a relaçã o
entre a matemá tica e a fé cristã . O tratamento de Poythress de três dimensõ es distintas da
matemá tica — como verdades abstratas transcendentes, como parte do mundo físico e
como abrangente aos seres humanos — é um acréscimo ú nico e ú til à discussã o sobre essa
relaçã o. O livro é acessível a nã o especialistas, porém mesmo aqueles bem versados nesses
assuntos encontrarã o muitas coisas que os irã o interessar e desafiar.
 
— James Bradley
Professor Emérito de Matemática, Calvin College
Autor, Mathematics Through the Eyes of Faith
Editor, Journal of the Association of Christians in the Mathematical Sciences
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Copyright © 2015, de Vern S. Poythress

Publicado originalmente em inglês sob o título

Redeeming Mathematics: A God-Centered Approach

pela Crossway

1300 Crescent Street, Wheaton, Illinois, 60187, EUA.

Todos os direitos em língua portuguesa reservados por

EDITORA MONERGISMO

SCRN 712/713, Bloco B, Loja 28 — Ed. Francisco Morato Brasília, DF, Brasil — CEP 70.760-620

www.editoramonergismo.com.br

1ª ediçã o, 2019

Traduçã o: Marcelo Herberts

Revisã o: Felipe Sabino de Araú jo Neto

Capa: Bá rbara Lima Vasconcelos

PROIBIDA A REPRODUÇÃ O POR QUAISQUER MEIOS, SALVO EM BREVES CITAÇÕ ES, COM INDICAÇÃ O DA FONTE.

 
Todas as citaçõ es bíblicas foram extraídas da versã o Almeida Revista e Atualizada (ARA) salvo indicaçã o em contrá rio.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Poythress, Vern S.

Redimindo a matemá tica: uma abordagem teô centrica / Vern S. Poythress, traduçã o Marcelo Herberts — Brasília, DF: Editora Monergismo, 2019.

Título original: Redeeming Mathematics: A God-Centered Approach

ISBN:

1. Bíblia — evidências, autoridade, etc.  2. Matemá tica — aspectos religiosos — cristianismo

      3. Matemá tica na Bíblia I. Título

CDD 230

 
 
 

Sumário
Diagramas e ilustraçõ es
Introduçã o: Por que Deus?
Parte 1 — QUESTÕ ES BÁ SICAS
1. Deus e a matemá tica
2. O um e os muitos
3. Naturalismo
4. A natureza dos nú meros
Parte 2 — NOSSO CONHECIMENTO DA MATEMÁ TICA
5. As capacidades humanas
6. Necessidade e contingência
Parte 3 — ESTRUTURAS MATEMÁ TICAS SIMPLES
7. Adiçã o
8. A ideia do que vem a seguir
9. Derivando a aritmética da sucessã o
10. Multiplicaçã o
11. Simetrias
12. Conjuntos
Parte 4 — OUTROS TIPOS DE NÚ MEROS
13. Divisão e fraçõ es
14. Subtraçã o e nú meros negativos
15. Nú meros irracionais
16. Nú meros imaginá rios
17. O infinito
Parte 5 — GEOMETRIA E MATEMÁ TICA SUPERIOR
18. Espaço e geometria
19. Matemá tica superior
Conclusã o
SUPLEMENTOS
Recursos
Apêndice A
Apêndice B
Apêndice C
Apêndice D
Apêndice E
Bibliografia

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Diagramas e ilustrações
 
 
Diagramas
4.1. As três perspectivas de Frame sobre a ética               1
4.2. 2 + 2 = 4, ilustrado por conjuntos               1
4.3. Mú ltiplos relacionamentos               1
5.1. O quadrado de Frame sobre transcendência e imanência               1
5.2. O quadrado de Frame com explicaçõ es               1
5.3. O quadrado de Frame para os nú meros               1
5.4. O quadrado de Frame para o conhecimento dos nú meros               1
8.1. Á rvore genealó gica               1
8.2. A aritmética do reló gio               1
10.1. Á rea               1
11.1. Harmonia adicional               1
15.1. Teorema pitagó rico               1
18.1. Os eixos X e Y               1
18.2. Adiçã o dentro de um sistema de coordenadas               1
D.1. Pontos em um quadrado               1
D.2. Quadrados e diferenças               1
 
Ilustrações
11.1. Rosto simétrico               1
11.2. Estrela do mar simétrica               1
11.3. Cilindro simétrico               1
11.4. Colmeia simétrica               1
13.1. O enigma do cachorro quente               1
 
 
 
 
 
 
 
 
Introdução: Por que Deus?
 
 

Teria Deus alguma coisa a ver com a matemá tica? Muitas pessoas jamais consideraram essa
questã o. Parece-lhes que as verdades da matemá tica estã o apenas “lá fora”. Na sua
[1]

opiniã o, a matemá tica nos apresenta um mundo distante das questõ es religiosas. Algumas
pessoas acham que Deus existe; outras estã o convencidas de que ele nã o existe; ainda
outras diriam que nã o sabem. Mas todas poderiam dizer que “isso nã o importa quando
olhamos para a matemá tica”.

Eu acho que importa . Neste livro pretendo mostrar por quê. Trabalho a partir da convicçã o
de que devemos honrar e glorificar a Deus em toda a vida: “Portanto, quer comais, quer
bebais ou façais outra coisa qualquer, fazei tudo para a gló ria de Deus” (1Co 10.31). A
expressã o “façais outra coisa qualquer” inclui nosso pensamento , e nosso pensamento
inclui nosso pensamento sobre a matemá tica. Além do mais, sou um seguidor de Cristo e
reconheço que Cristo é o Senhor de todas as coisas. Se ele é o Senhor de todas as coisas,
[2]

é também o Senhor da matemá tica. Mas o que isso quer dizer? Tentaremos descobrir as
implicaçõ es disso.

Estou escrevendo principalmente para as pessoas que seguem Cristo, que vieram a
conhecê-lo como o Salvador vivo e que depositam sua fé nele. Elas descobrem, a partir da
Bíblia, que o pró prio Cristo ensina que o Antigo Testamento é a palavra de Deus, o pró prio
discurso de Deus para nó s em forma escrita (veja especialmente Mt 5.17-18; 19.4-5; Jo
10.35). O Antigo Testamento prediz a vinda de Cristo (veja, por exemplo, Is 9.6-7; 11.1-5;
53.1-12; Mq 5.2). Ele também prevê a participaçã o de profetas posteriores (Dt 18.15-22).
Depois de Cristo ter completado sua obra na Terra, o Novo Testamento foi escrito com a
mesma autoridade que o Antigo Testamento. Assim, pretendo me basear na Bíblia para
entender quem Deus é e, além disso, entender o que a matemá tica é. [3]

Se você ainda nã o é um seguidor de Cristo, é ainda assim bem-vindo à leitura. Espero que o
livro seja informativo para que você aprenda quais sã o as implicaçõ es da Bíblia para a
matemá tica. Mas para se apropriar da verdade por si mesmo, você terá primeiro de aceitar
a Cristo. Deverá perguntar quem ele é e o que ele tem a dizer sobre você e o modo que
conduz sua vida. Recomendo que você comece lendo a parte da Bíblia que consiste dos
Evangelhos (Mateus, Marcos, Lucas e Joã o).

1
 
 
 
 
 
 
 
Parte 1 — QUESTÕES BÁSICAS
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
1. Deus e a matemática
 
 

Comecemos com nú meros. Podemos considerar um caso específico: 2 + 2 = 4. Isso é


verdade. Foi verdade ontem. E sempre o será . É verdade em todos os lugares do Universo.
Nã o temos de viajar para galá xias distantes para verificá -lo. Por que nã o? Simplesmente
sabemos. Por que temos essa convicçã o? Nã o é estranho? O que há em 2 + 2 = 4 que resulta
nessa convicçã o sobre a sua veracidade universal? [4]

Todos os tempos e todos os lugares

2 + 2= 4 é verdade em todos os tempos e em todos os lugares. Possuímos termos


[5]

clá ssicos para descrever essa situaçã o: a verdade é onipresente (está presente em todos os
lugares) e eterna (está aí o tempo todo). A verdade 2 + 2 = 4 tem essas duas características
ou atributos que sã o classicamente atribuídos a Deus. Quer dizer que Deus aparece em
nosso cená rio já neste ponto? É o que veremos.

Tecnicamente, a eternidade de Deus é geralmente concebida como estando “acima” ou


“além” do tempo. Mas palavras como “acima” e “além” sã o metafó ricas e apontam para
mistérios. Há , de fato, um mistério aná logo em relaçã o a 2 + 2 = 4. Se 2 + 2 = 4 é
universalmente verdadeiro, nã o está em certo sentido “além” das particularidades de
qualquer lugar ou época?

Ademais, a Bíblia aponta que Deus nã o está simplesmente “acima” do tempo, no sentido de
nã o estar sujeito à s limitaçõ es da experiência de tempo finita das criaturas, mas está “no”
tempo, no sentido de agir no tempo e interagir com suas criaturas. [6]
Da mesma forma, 2 +
2 = 4 está “acima” do tempo em sua universalidade, mas “no” tempo através da sua
aplicabilidade a cada situaçã o particular. Duas maçã s mais duas maçã s é igual a quatro
maçã s.

Os atributos divinos da verdade aritmética

Os atributos da onipresença e eternidade sã o só o começo. Num exame mais de perto,


outros atributos divinos parecem fazer parte das verdades aritméticas.

Considere o seguinte. Se 2 + 2 = 4 vale para todos os tempos, estamos pressupondo que é a


mesma verdade em todos os tempos. A verdade nã o muda com o tempo. Ela é imutá vel.
A seguir, 2 + 2 = 4 tem no fundo um cará ter ideativo. Nó s nã o vemos literalmente a verdade
de 2 + 2 = 4, mas apenas casos particulares aos quais isso se aplica: duas maçã s mais duas
maçã s. A verdade de 2 + 2 = 4 é essencialmente imaterial e invisível, mas conhecida através
de manifestaçõ es. Da mesma forma, Deus é essencialmente imaterial e invisível, mas é
conhecido através de seus atos no mundo.

A seguir, já observamos que 2 + 2 = 4 é verdade. A veracidade também é um atributo de


Deus.

O poder da verdade aritmética

A seguir, considere o atributo do poder. Os matemá ticos fazem suas formulaçõ es para
descrever propriedades dos nú meros. As propriedades já estã o lá antes de os matemá ticos
fazerem suas formulaçõ es. A formulaçã o matemá tica humana segue os fatos e é dependente
deles. Uma verdade ou regularidade aritmética deve valer para toda uma série de casos. O
matemá tico nã o pode forçar a questã o inventando uma nova propriedade, digamos, 2 + 2 =
5, e entã o forçar o Universo a se conformar à sua formulaçã o. (Claro, os símbolos escritos,
como 4 e 5 , que denotam os nú meros poderiam ter sido escolhidos de forma diferente. E
um matemá tico pode definir que um novo objeto abstrato tenha propriedades que ele,
matemá tico, escolha. Mas nó s nã o “escolhemos” as propriedades dos nú meros naturais.) Os
nú meros naturais se conformam a leis e propriedades aritméticas que já existem, leis que
sã o descobertas em vez de inventadas. As leis já devem existir. 2 + 2 = 4 deve ser realmente
vá lido. Deve ter eficá cia. Se é verdadeiramente universal, nã o pode ser violado. Duas maçã s
mais duas maçã s sempre equivale a quatro maçã s. Nenhum evento escapa da influência ou
domínio das leis aritméticas. O poder dessas leis é absoluto — na verdade, infinito. Em
linguagem clá ssica, a lei é onipotente (“todo-poderosa”).

2 + 2 = 4 é transcendente e imanente. Transcende as criaturas do mundo ao exercer poder


sobre elas, conformando-as aos seus ditados. É imanente no sentido de envolver e manter
em seu domínio até os menores elementos deste mundo. 2 + 2 = 4 transcende os
[7]

aglomerados galá cticos e está presente de forma imanente no comportamento dos elétrons
ao redor de um nú cleo de berílio. Transcendência e imanência sã o características de Deus.

O caráter pessoal da lei

A esta altura, muitos agnó sticos e ateus estarã o buscando uma forma de fugir disso.
Aparentemente o conceito-chave de verdade aritmética está começando a parecer suspeito
assim como a ideia bíblica de Deus. A fuga mais ó bvia, e a que tem salvado muitos do
desconforto espiritual, é negar que a verdade aritmética seja pessoal. Ela apenas está aí
como algo impessoal.
Ao longo dos tempos as pessoas têm buscado seguir essas rotas. Elas construíram ídolos,
substitutos de Deus. Nos tempos antigos, os ídolos frequentemente tinham a forma de
está tuas representando um deus — Poseidon, o deus do mar, ou Marte, o deus da guerra.
Hoje em dia, no mundo ocidental, somos mais sofisticados. Os ídolos agora tomam a forma
de construçõ es mentais de um deus ou substituto de Deus. O dinheiro e o prazer podem se
tornar ídolos. Assim como a “humanidade” ou “natureza”, quando recebe a fidelidade
ú ltima de uma pessoa. A “lei científica”, quando vista como impessoal, torna-se outro
substituto de Deus. A verdade aritmética, como um tipo particular de lei científica, também
é vista como impessoal. Tanto nas épocas antigas como hoje, os ídolos se conformam à
imaginaçã o de quem os cria. Os ídolos têm, com o verdadeiro Deus, semelhanças o bastante
para serem plausíveis, mas diferem no sentido de que nos deixam confortá veis e com a
satisfaçã o de manipular os substitutos que construímos.

Na verdade, porém, um olhar mais atento a 2 + 2 = 4 mostra que essa rota de fuga nã o é
realmente plausível. Lei implica um legislador. Alguém deve pensar a lei e aplicá -la, se ela
deve ser eficaz. Mas se algumas pessoas resistem a esse movimento direto à personalidade,
podemos nos mover de forma mais indireta.

Os cientistas e os matemá ticos na prá tica acreditam apaixonadamente na racionalidade das


leis científicas e leis aritméticas. Nã o estamos lidando com algo totalmente irracional,
inexplicá vel e nã o analisá vel, mas com uma legalidade que em certo sentido é acessível à
compreensã o humana. A racionalidade é uma condiçã o sine qua non para a lei científica.
Mas, como sabemos, a racionalidade pertence à s pessoas, nã o à s rochas, á rvores e criaturas
subpessoais. Se a lei é racional, como supõ em os matemá ticos, entã o também é pessoal.

Os cientistas e os matemá ticos também assumem que as leis podem ser articuladas,
expressas, comunicadas e entendidas por meio da linguagem humana. O trabalho
matemá tico nã o inclui apenas o pensamento racional, mas também a comunicaçã o
simbó lica. Ora, a lei original, a lei 2 + 2 = 4 que existe “aí fora”, nã o é conhecida por ser
escrita ou pronunciada em uma linguagem humana. Mas deve ser exprimível em linguagem
em nossa descriçã o secundá ria. Deve ser traduzível nã o só em uma, mas em muitas
linguagens humanas. Podemos explicar o significado dos símbolos e a importâ ncia e
aplicaçã o de 2 + 2 = 4 na linguagem humana, por meio de oraçõ es, frases, pará grafos
explicativos e explicaçõ es contextuais.

Em sua capacidade de ser gramaticalmente articuladas, parafraseadas, traduzidas e


ilustradas, as leis aritméticas sã o claramente como enunciaçõ es humanas. A lei é
[8]

semelhante a um enunciado, a uma linguagem. E a complexidade dos enunciados que


encontramos entre os matemá ticos, bem como entre os seres humanos em geral, nã o é
duplicada no mundo animal. [9]
A linguagem é uma das características que separam o
homem dos animais. Assim como a racionalidade, a linguagem pertence à s pessoas. Disso
resulta que as leis aritméticas sã o em essência pessoais. [10]

A incompreensibilidade da lei
Além disso, no sentido teoló gico, a lei é tanto cognoscível quanto incompreensível. Isto é,
nó s conhecemos verdades aritméticas, mas em meio a esse conhecimento permanecem
profundezas insondá veis e perguntas sem resposta nas pró prias á reas onde mais sabemos.
Por que 2 + 2 = 4 vale para todos os lugares?

A cognoscibilidade das leis está intimamente relacionada à sua racionalidade e sua


imanência exibidas na acessibilidade dos efeitos. Nó s experimentamos
incompreensibilidade no fato de que o aumento da compreensã o matemá tica só leva a
perguntas cada vez mais profundas: “Como pode ser isso?” e “Por que essa lei e nã o muitas
outras formas que a mente humana poderia imaginar?”. A profundeza e o mistério das
descobertas matemá ticas só podem produzir admiraçã o — sim, adoraçã o —, se nã o
embotarmos nossa percepçã o com a arrogâ ncia (Is 6.9-10).

Estamos divinizando a natureza?

Mas agora devemos considerar uma objeçã o. Ao afirmar que as leis aritméticas têm
atributos divinos, estamos divinizando a natureza? Isto é, estamos extraindo algo do
mundo criado e falsamente afirmando que é divino? Nã o sã o as leis aritméticas uma parte
do mundo criado? Nã o deveríamos classificá -las como criaturas em vez de Criador? [11]

Suspeito que a especificidade das leis aritméticas, sua ó bvia referência ao mundo criado,
tenha se tornado ocasiã o para muitos de nó s inferir que essas leis fazem parte do mundo
criado. Mas essa inferência é claramente invá lida. O discurso que descreve uma borboleta
nã o é ele mesmo uma borboleta ou parte de uma borboleta. O discurso que se refere ao
mundo criado nã o é necessariamente uma parte ontoló gica do mundo ao qual ele se refere.

A Bíblia aponta que Deus governa o mundo pelo seu discurso. [12]
Ele fala e isso é feito:

Mediante a palavra do SENHOR foram feitos os céus, e os corpos celestes, pelo sopro de sua boca . (Sl
33.6, NVI)

Pois ele falou , e tudo se fez; ele ordenou , e tudo passou a existir. (Sl 33.9)

Disse Deus: Haja luz; e houve luz. (Gn 1.3)

Deus também sustenta continuamente o mundo pela sua palavra: “Ele sustenta o Universo
com a sua palavra poderosa” (Hb 1.3, NTLH). A palavra de Deus tem divina sabedoria,
poder, verdade e santidade. Tem atributos divinos , pois expressa o pró prio cará ter de
Deus. Deus expressa sua pró pria divindade, ao invés de miná -la, quando fala palavras que
se dirigem ao mundo criado.

Podemos entã o concluir que o mesmo princípio se aplica em particular à s verdades


numéricas sobre o mundo. Deus governa tudo , incluindo a verdade numérica. Sua palavra
especifica o que é verdade. As maçã s num grupo de quatro maçã s sã o coisas criadas. O que
Deus diz sobre elas é divino. Em outras palavras, sua palavra especifica que 2 + 2 = 4.

A ideia-chave de que a lei para o mundo é divina é ainda mais antiga do que o surgimento
do cristianismo. Mesmo antes da vinda de Cristo as pessoas já percebiam uma profunda
regularidade no governo do mundo e se debatiam com o significado dessa regularidade.
Tantos os gregos (especialmente os estoicos) quanto os judeus (especialmente Fílon)
desenvolveram especulaçõ es sobre o logos , a “razã o” ou “verbo” divino que existe por trá s
do que é observado. Além disso, os judeus tinham o Antigo Testamento, que revela o
[13]

papel da palavra de Deus na criaçã o e na providência. Contra esse pano de fundo, Joã o 1.1
proclama: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus”.
[14]

Joã o responde à s especulaçõ es de sua época com uma revelaçã o impressionante: o Verbo (
logos ) que criou e sustenta o Universo é nã o apenas uma pessoa divina “com Deus”, mas o
pró prio Uno que se tornou encarnado: “o Verbo se fez carne” (1.14).

Deus disse “Haja luz” (Gn 1.3). Ele se referiu à luz como uma parte do mundo criado. Mas,
precisamente nessa referência, sua palavra tem poder divino para trazer a criaçã o à
existência. O efeito na criaçã o teve lugar num momento específico. Mas o plano para a
criaçã o, conforme exibido na palavra de Deus, é terno. Da mesma forma, o discurso de Deus
para nó s na Bíblia alude a vá rias partes do mundo criado, mas o discurso (em distinçã o à s
coisas à s quais se refere) é divino em poder, autoridade, majestade, justiça, eternidade e
verdade. [15]

A analogia com a encarnaçã o deveria nos dar uma pista. A segunda pessoa da Trindade, o
eterno Verbo de Deus, tornou-se homem na encarnaçã o, mas nã o cessou portanto de ser
Deus. Assim também, quando Deus fala e diz o que deve acontecer neste mundo, suas
palavras nã o cessam de ter o poder divino e a imutabilidade que pertence a Deus. Antes,
permanecem divinas e têm além disso o poder de especificar a situaçã o no que diz respeito
aos assuntos da criaçã o. A palavra de Deus permanece divina quando se torna lei, que é
uma diretiva específica com relaçã o a este mundo criado. Em particular, quando se torna
uma diretiva específica no que diz respeito a quatro maçã s na mesa da cozinha, 2 + 2 = 4
permanece sendo uma verdade divinamente ordenada.

A bondade da lei

É 2 + 2 = 4 moralmente bom? Uma verdade aritmética nã o é diretamente um preceito


moral. Mas indiretamente requer que nos conformemos a ela. Temos uma pressã o ética
para crer na verdade assim que nos tornamos convencidos dela. Também podemos dizer
que, num sentido mais amplo, é “bom” para o Universo e para nó s que 2 + 2 = 4. Isso nunca
mente. Nã o seríamos capazes de viver nem o Universo se manteria unido sem a
consistência das verdades aritméticas.

 
A beleza da lei

É 2 + 2 = 4 algo belo? Eu acho que é. Mas nem todo mundo é capaz de ver a beleza da
matemá tica. Acho que há beleza na simplicidade de 2 + 2 = 4. Isso está em harmonia com o
mundo. É algo belo que sua verdade seja exibida repetidas vezes, em quatro maçã s, quatro
lá pis e quatro cadeiras. Isso é belo em sua harmonia com outras verdades aritméticas, com
as quais pode ser combinado.

A beleza na aritmética mostra a beleza do pró prio Deus. Embora a beleza nã o tenha sido
um tema favorito nas exposiçõ es clá ssicas da doutrina de Deus, a Bíblia nos mostra um
Deus que é profundamente belo. Ele se manifesta em beleza no desenho do taberná culo, na
poesia dos salmos e na elegâ ncia das pará bolas de Cristo, assim como na beleza moral da
vida de Cristo.

A beleza do pró prio Deus é refletida no que ele tem feito. Estamos acostumados a ver
beleza em objetos particulares dentro da criaçã o, como uma borboleta, uma montanha
imponente ou um prado coberto de flores. Mas a beleza também é exibida na forma simples
e elegante de algumas das leis físicas mais bá sicas, como a lei de Newton da força, F = ma,
ou a fó rmula de Einstein relacionando massa e energia, E = mc . O mesmo vale para as
2

belezas simples na aritmética e as belezas mais profundas que os matemá ticos descobrem
na matemá tica avançada.

A retidão de 2 + 2 = 4

Outro atributo de Deus é a justiça. A justiça de Deus é exibida preeminentemente na lei


moral e na retidã o moral dos seus julgamentos, isto é, em suas recompensas e puniçõ es
baseadas na lei moral. A retidã o de Deus aparece na matemá tica? Os traços sã o um pouco
menos ó bvios, mas ainda assim estã o presentes. As pessoas podem, por exemplo, tentar
desobedecer à s leis aritméticas ao saldar as despesas no talã o de cheques. Se o fazem,
podem sofrer por isso. Há um tipo de justiça embutida na forma como as leis aritméticas
levam a consequências.

Ademais, a retidã o de Deus está intimamente relacionada com a adequaçã o dos atos de
Deus. O fato de que devemos adorar somente a Deus (Ê x 20.3) se encaixa no cará ter de
quem ele é. O fato de que os seres humanos devem imitar Deus guardando o sá bado (v. 8-
11) se encaixa no cará ter dos seres humanos feitos à imagem de Deus. As açõ es humanas
correspondem adequadamente à s açõ es de Deus.

Além disso, as puniçõ es devem ser adequadas. A morte é a penalidade adequada ou


correspondente para o assassinato (Gn 9.6). “Como você fez, assim será feito a você. A
maldade que você praticou recairá sobre você” (Ob 15, NVI). A puniçã o se encaixa no crime.
Existe uma correspondência simétrica entre a natureza do crime e a puniçã o que se encaixa
nele. Na arena da lei aritmética nã o lidamos com crimes e puniçõ es. Mas a retidã o se
[16]

expressa em simetrias, na ordem, numa adequaçã o ao cará ter da aritmética. Essa


adequaçã o está talvez intimamente relacionada à beleza. Os atributos de Deus estã o
envolvidos uns nos outros e implicam uns aos outros; assim, a beleza e a retidã o estã o
intimamente relacionadas. Se dá o mesmo com a á rea da lei aritmética. As leis aritméticas
sã o belas e adequadas, demonstrando retidã o.

A lei como sendo trinitária

Será que 2 + 2 = 4 reflete especificamente o cará ter trinitá rio de Deus? Os filó sofos têm por
vezes defendido que se pode inferir a existência de Deus, mas nã o o cará ter trinitá rio de
Deus, com base no mundo à nossa volta. Romanos 1.18-21 indica que os incrédulos
conhecem Deus, mas até que ponto? Nã o quero abordar essa questã o difícil, mas sim
refletir sobre o que podemos discernir acerca do mundo, uma vez tendo absorvido o ensino
bíblico sobre Deus.

Deus especificou por sua palavra que 2 + 2 = 4. Assim, na sua origem, a verdade de 2 + 2 = 4
é uma forma da palavra de Deus. Portanto, reflete a declaraçã o trinitá ria de Joã o 1.1, que
identifica a segunda pessoa da Trindade como o Verbo eterno. Em Joã o, Deus o Pai é o
orador do Verbo e Deus o Filho é o Verbo que é falado. Joã o 1 nã o menciona explicitamente
o Espírito Santo. Mas outras porçõ es da Escrituras associam o Espírito ao “sopro” de Deus
que enuncia a palavra.

“Os céus por sua palavra se fizeram, e, pelo sopro de sua boca , o exército deles” (Sl 33.6). A
palavra hebraica aqui para sopro é ruach , a mesma palavra que é regularmente usada para
o Espírito Santo. Na verdade, a designaçã o da terceira pessoa da Trindade como “Espírito”
(hebraico ruach ) já sugere a associaçã o que se torna mais explícita em Salmos 33.6.
Similarmente, Ezequiel 37 evoca três significados diferentes da palavra hebraica ruach , a
saber, “sopro” (v. 5, 10), “ventos” (v. 9) e “Espírito” (v. 14). A visã o em Ezequiel 37
[17]

claramente representa o Espírito Santo como o sopro de Deus que entra nos seres humanos
para dar-lhes vida. Assim, as três pessoas da Trindade estã o presentes de maneiras
distintas quando Deus fala sua Palavra. As três pessoas, portanto, estã o presentes no
discurso de Deus especificando que 2 + 2 = 4.

Podemos abordar a questã o por outro prisma. De forma penetrante, Dorothy Sayers
observa que a experiência de um autor humano escrevendo um livro contém profundas
analogias com o cará ter trinitá rio de Deus. O ato de criaçã o realizado de forma escrita
[18]

por um autor imita a açã o de Deus na criaçã o do mundo. Deus cria de acordo com sua
natureza trinitá ria. Um autor humano cria com uma Ideia, Energia e Poder, o que
corresponde misteriosamente ao envolvimento das três pessoas na criaçã o. Sem rastrear as
reflexõ es de Sayers em detalhes, podemos observar que o ato de Deus na criaçã o envolve
todas as três pessoas. Deus o Pai é o originador. Deus o Filho, como o Verbo eterno (Jo 1.1-
3), está envolvido nas palavras de comando que emanam de Deus (“Haja luz”; Gn 1.3). Deus
o Espírito paira sobre as á guas (v. 2). Salmos 104.30 diz que “quando sopras o teu fô lego, [19]

eles [os animais] sã o criados”. Além disso, a criaçã o de Adã o envolve um soprar de Deus
que alude à presença do Espírito (Gn 2.7). Embora a relaçã o entre as pessoas da Trindade
seja profundamente misteriosa, e embora todas elas estejam envolvidas em todas as açõ es
com o mundo, pode-se distinguir diferentes aspectos da açã o que pertencem
preeminentemente à s diferentes pessoas.

2 + 2 = 4 decorre da atividade de Deus, o “Autor” da criaçã o. A atividade das três pessoas


está , portanto, implícita na natureza mesma da verdade de que 2 + 2 = 4. Primeiro, 2 + 2 = 4
envolve uma racionalidade que implica a coerência do pensamento. Isso corresponde ao
termo “Ideia” de Sayers, representando o plano do Pai. Em segundo lugar, na sua aplicaçã o
ao mundo, 2 + 2 = 4 envolve uma articulaçã o, uma especificaçã o, uma expressã o do plano,
acerca de todos os detalhes de um mundo. Essa especificaçã o corresponde ao termo de
Sayers “Energia” ou “Atividade”, representando o Verbo, que é a expressã o do Pai. Em
terceiro lugar, a expressã o da verdade de que 2 + 2 = 4 envolve manter as coisas criadas
como sendo responsá veis pela verdade disso: envolve uma aplicaçã o concreta à s criaturas,
levando-as a responder à lei tal como desejado pelo Pai. Isso corresponde ao termo de
Sayers “Poder”, representando o Espírito. [20]

Deus mostrando a si mesmo

Essas relaçõ es sã o sugestivas, mas nã o precisamos neste ponto desenvolver o pensamento


além. Basta observar que, na realidade, a palavra que especifica 2 + 2 = 4 é divina. Estamos
falando do pró prio Deus e da revelaçã o de si através de sua governança do mundo. As
pessoas que trabalham com matemá tica dependem da palavra de Deus para realizar seu
trabalho. Quando analisamos o que 2 + 2 = 4 realmente é, descobrimos que a aritmética
constantemente nos confronta com o pró prio Deus, o Deus trinitá rio; estamos
constantemente dependendo de quem ele é e do que faz em conformidade com sua
natureza divina. Ao pensar sobre aritmética, estamos pensando os pensamentos de Deus
depois dele. [21]

Mas as pessoas que calculam acreditam?

Mas será que as pessoas que trabalham com nú meros realmente acreditam nisso tudo?
Acreditam e nã o acreditam. A situaçã o já havia sido descrita na Bíblia:

Porquanto o que de Deus se pode conhecer é manifesto entre eles, porque Deus lhes manifestou.
Porque os atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder, como também a sua pró pria
divindade, claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das
coisas que foram criadas. Tais homens sã o, por isso, indesculpá veis. (Rm 1.19-20)

Os céus proclamam a gló ria de Deus, e o firmamento anuncia as obras das suas mã os. Um dia discursa a
outro dia, e uma noite revela conhecimento a outra noite. (Sl 19.1-2)

 
Eles conhecem Deus. Confiam nele. Mas porque esse conhecimento é moralmente e
espiritualmente doloroso, eles também o suprimem e distorcem:

Porque, tendo conhecido a Deus, nã o o glorificaram como Deus, nem lhe renderam graças, mas os seus
pensamentos tornaram-se fú teis e o coração insensato deles obscureceu-se. Dizendo-se sá bios,
tornaram-se loucos e trocaram a gló ria do Deus imortal por imagens feitas segundo a semelhança do
homem mortal, bem como de pá ssaros, quadrú pedes e répteis. (Rm 1.21-23, NVI)

As pessoas modernas até podem nã o mais fazer ídolos na forma de imagens físicas, mas sua
pró pria ideia de leis aritméticas é uma deturpaçã o idó latra de seu conhecimento de Deus.
Elas escondem de si mesmas o fato de que a “lei” é pessoal e que sã o responsá veis perante
a Pessoa.

Mesmo em sua rebeliã o, as pessoas continuam a depender de que Deus esteja aí. Mostram
na prá tica que continuam a crer em Deus. Cornelius Van Til compara isso a um incidente
que viu em um trem, onde uma garotinha, sentada no colo do pai, deu um tapa no rosto
dele. [22]
O rebelde depende de Deus e deve estar “sentado em seu colo” para mesmo ser
capaz de se rebelar.

Nós cristãos acreditamos?

O problema, suspeito, nã o está totalmente no lado dos incrédulos. O problema também


ocorre entre os cristã os. Os cristã os têm por vezes adotado um conceito antibíblico de Deus
que o desloca um passo para fora do caminho dos nossos assuntos ordiná rios. Nó s mesmos
podemos pensar na “lei científica”, “lei natural” ou na matemá tica como uma espécie de
mecanismo có smico ou mecanismo de reló gio impessoal que faz o mundo funcionar a
maior parte do tempo, enquanto Deus está de férias. Deus só vem e age raramente, por
meio de milagres. Mas isso nã o é bíblico. “Fazes crescer a relva para os animais e as
plantas” (Sl 104.14). “Faz cair a neve como lã ” (Sl 147.16, NVI). Nã o nos esqueçamos disso.
Se recuperá ssemos uma doutrina robusta do envolvimento de Deus no cuidado diá rio de
seu mundo em cada detalhe, achar-nos-íamos numa posiçã o muito melhor para dialogar
com os ateus, que dependem desse mesmo cuidado.

Princípios para testemunhar

Para usar essa situaçã o como um ponto de partida para o testemunho, precisamos ter em
mente vá rios princípios.

Primeiro, a observaçã o de que Deus subjaz a verdade de 2 + 2 = 4 nã o tem o mesmo


formato das provas teístas tradicionais — pelo menos como amiú de compreendidas. Nã o
estamos tentando levar as pessoas a conhecer um Deus que é totalmente novo para elas.
Em vez disso, mostramos que elas já conhecem Deus como um aspecto da sua experiência
humana. Isso coloca o foco nã o no debate intelectual, mas em ser um ser humano completo.
[23]

Em segundo lugar, as pessoas negam Deus exatamente no mesmo contexto em que


dependem dele. A negaçã o de Deus brota em ú ltima aná lise nã o de defeitos intelectuais ou
da falha em ver todo o caminho de uma cadeia de raciocínio silogístico até a conclusã o, mas
da falha espiritual. Somos rebeldes contra Deus e nã o vamos servi-lo. Consequentemente,
sofremos debaixo de sua ira (Rm 1.18), o que tem efeitos intelectuais, espirituais e morais.
Aqueles que se rebelam contra Deus sã o “tolos”, de acordo com Romanos 1.22 (NTLH).

Em terceiro, é humilhante para os intelectuais serem expostos como tolos, e é ainda mais
humilhante, até psicologicamente insuportá vel, eles serem expostos como culpados de
rebeliã o contra a bondade de Deus. É de esperar que os nossos ouvintes lutem, com
tremenda efusã o de energia intelectual e espiritual, contra um resultado tã o insuportá vel.

Em quarto lugar, o pró prio evangelho, com sua mensagem de perdã o e reconciliaçã o por
meio de Cristo, oferece o ú nico remédio que pode realmente acabar com essa luta contra
Deus. Mas traz consigo a humilhaçã o derradeira: que minha restauraçã o vem inteiramente
de Deus, de fora de mim — apesar, e nã o por causa, de minhas alardeadas capacidades.
Funcionando como um clímax para tudo isso está o seguinte fato:  eu era tã o ímpio que meu
resgate custou o preço da morte do Filho de Deus.

Em quinto, abordar as pessoas dessa maneira constitui uma guerra espiritual. Os


incrédulos e idó latras estã o cativos pelo engano satâ nico (1Co 10.20; Ef 4.17-24; 2Ts 2.9-
12; 2Tm 2.25-26; Ap 12.9). Nã o se tornam livres do cativeiro de Sataná s a menos que Deus
os liberte (2Tm 2.25-26). Devemos orar a Deus e confiar em seu poder, nã o na
engenhosidade da argumentaçã o humana e na eloquência da persuasã o (1Co 2.1-5; 2Co
10.3-5).

Em sexto lugar, chegamos a esse encontro na condiçã o de pecadores. Os cristã os também


se tornam imensamente culpados quando se deixam cativar pela idolatria de considerar a
lei científica e aritmética impessoal. Dentro desse cativeiro, tomamos por certo os
benefícios e as belezas da ciência e matemá tica, pelos quais deveríamos na verdade ser
cheios de gratidã o e louvor a Deus.

Será que uma abordagem de testemunho baseada nesses princípios funciona de forma
diferente das muitas abordagens que tentam abordar os intelectuais? A mim, parece que
sim.

 
1
 

2. O um e os muitos
 
 

Os nú meros estã o relacionados a um antigo problema filosó fico, chamado problema do um


e dos muitos. Podemos também descrevê-lo como o problema da unidade e diversidade.
Como a unidade e a diversidade se encaixam? Vale a pena entender um pouco sobre esse
problema. [24]

 
O problema filosófico do um e dos muitos
 
Os filó sofos na Grécia antiga já enfrentavam o problema. Como é que a multiplicidade das
coisas que observamos se relaciona com a unidade de um mundo e a unidade pertencente a
cada membro de uma classe em particular? Como é que a unidade da classe de gatos se
relaciona com a particularidade do gato Félix e de qualquer outro gato? Parmênides e mais
tarde Plotino disseram que o um era anterior aos muitos. Mas se começarmos com uma
[25]

coisa e ela nã o tiver nenhuma diferenciaçã o, como poderá se diferenciar mais tarde ou
levar à s diferenças que sã o observadas entre as coisas no mundo? Herá clito e os atomistas
disseram que os muitos eram anteriores ao um. Mas se começarmos com muitas coisas,
como entã o poderã o ser relacionadas umas com as outras, e por que elas exibem as
características comuns de pertencerem a uma classe (como a classe de gatos)?

A filosofia medieval continuou a considerar a questã o. De um lado da disputa estavam


realistas filosó ficos. Essas pessoas diziam que categorias universais como a categoria gato
ou cavalo eram reais . (Esse tipo de realismo nã o deve ser confundido com outras visõ es
modernas chamadas pelo mesmo nome.) Assim como os seguidores de Platã o, eles
pensavam que as categorias existiam antes de qualquer gato ou cavalo em particular. As
categorias eram como padrõ es ou arquétipos originais. Eram os padrõ es universais que
explicavam por que todos os gatos compartilhavam características em comum. Cada gato,
quando vinha à existência, se conformava ao padrã o anterior da categoria universal, que
poderia ser chamada de “gatidade”.

O realismo medieval começava com a unidade de uma categoria. Como, entã o, explicava a
diversidade? Os filó sofos medievais acreditavam em Deus, e assim acreditavam que Deus
cria cada gato. Ele usa o mesmo padrã o, isto é, a condiçã o de gato. Mas se usa o mesmo
padrã o, por que cada gato nã o vem exatamente igual, assim como balas que sã o feitas
usando o mesmo molde (o mesmo padrã o)? Até mesmo balas feitas com o mesmo molde
mostram pequenas diferenças, que podem ser devidas à mistura imperfeita dos
ingredientes ou a ligeiras diferenças no processo de fabricaçã o. Entã o, uma pessoa poderia
tentar dizer que os gatos sã o diferentes porque a matéria usada para fazê-los é diferente ou
o processo de fabricaçã o mostra pequenas diferenças. Mas essa explicaçã o apenas empurra
o problema para trá s no tempo. O que gerou as diferenças na matéria? O que gerou as
diferenças nos processos? Os processos têm presumivelmente uma categoria universal
para descrever a unidade que lhes pertence. Entã o, o que leva à s diferenças quando
comparamos duas instâ ncias do mesmo processo?

Em oposiçã o aos realistas medievais estavam os nominalistas . Eles diziam que os muitos
eram anteriores ao um. Nó s começamos com muitos gatos no mundo. Entã o lhes damos um
nome comum, o nome gato . De acordo com os nominalistas, o nome nã o passa de um
nome. (A palavra nominalismo é cognata da palavra latina nomen , que significa “nome”.)
Um nome como gato nã o rotula uma categoria universal que existe aí fora no mundo. A
categoria de “gatidade” só existe aqui em nossa mente. Nó s a inventamos. E sua invençã o
depende da existência prévia dos muitos gatos que existem por aí. Claramente, os
nominalistas pensam que a diversidade de gatos vem primeiro e que a unidade da categoria
é derivada.

O nominalismo tinha o problema oposto do realismo. Seu problema era explicar a unidade.
Nó s começamos com muitos gatos. Por que há alguma coisa em comum entre os muitos
gatos, qualquer comunalidade que nos levaria a agrupá -los todos sob uma ú nica categoria
de “gato”? O nominalismo sugere que a categoria é uma invençã o nossa, nã o
correspondendo a nada que existe no mundo. Ela é simplesmente uma ideia. Uma ilusã o.
Ou, se um nominalista nã o quisesse ir tã o longe, poderia dizer mais cautelosamente que a
unidade é uma construçã o secundá ria, com base na realidade primá ria da diversidade de
gatos. Mas se começarmos com elementos que sã o puramente diversos, como poderemos
criar depois unidades? Ainda que a unidade seja pura ilusã o, precisamos explicar de onde
na ilusã o veio a unidade. Além disso, nã o é plausível afirmar que nã o existe nada de
“realmente” similar entre os diferentes gatos.

Unidade e diversidade na trindade

De acordo com o pensamento trinitá rio, a unidade e diversidade que existem no mundo
refletem a unidade e diversidade originais em Deus. Primeiro, Deus é um Deus. Ele tem um
plano unificado para o mundo. A universalidade da verdade 2 + 2 = 4 reflete essa unidade.
Deus é também três pessoas: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Essa diversidade no ser de
Deus é entã o refletida na diversidade que existe no mundo criado. As muitas instâ ncias nas
quais 2 + 2 = 4 se aplica expressam essa diversidade: quatro maçã s, quatro lá pis, quatro
cavalos etc. Deus é o original, enquanto que a unidade e diversidade no mundo criado sã o
derivadas. Entã o, podemos dizer que Deus é o arquétipo , o padrã o original, enquanto as
instâ ncias de unidade e diversidade no mundo criado sã o éctipos , derivados e dependentes
do arquétipo.

Podemos colocar isso de outra forma. Deus governa o mundo pelo discurso (Capítulo 1).
Deus tem unidade e diversidade. Assim, quando ele fala — através do Verbo de Deus, que é
a segunda pessoa da Trindade —, seu discurso tem unidade e diversidade. As unidades que
existem no discurso de Deus especificam as unidades que existem no mundo que ele fez;
suas diversidades especificam as diversidades que existem no mundo que ele fez.
Também podemos ilustrar a unidade e diversidade de uma terceira maneira. A unidade do
plano de Deus tem uma relaçã o pró xima com o Pai, a primeira pessoa da Trindade, que é a
origem desse plano. O Filho, ao se tornar encarnado, expressa a particularidade da
manifestaçã o no tempo e no espaço. Ele é, por assim dizer, uma instanciaçã o de Deus.
Assim, ele é aná logo em sua encarnaçã o ao fato de que a lei universal 2 + 2 = 4 se expressa
em casos particulares, como quatro maçã s.

Qual é o papel do Espírito Santo? Além de outros papeis, o Espírito Santo expressa por sua
presença a comunhã o entre o Pai e o Filho (Jo 3.34–35). Seu papel na comunhã o tem sido
chamado de aspecto associativo . O Espírito Santo é o arquétipo para o aspecto
[26]

associativo. Uma lei universal como 2 + 2 = 4 e os casos particulares, como quatro maçã s,
também gozam de uma relaçã o de associação . O um é inerente aos outros. Em termos
gerais, a relaçã o associativa entre o um e os muitos que representa o um é uma relaçã o
éctipa associativa.

O caráter numérico do mundo

O plano de Deus é a fonte para o cará ter numérico do mundo, assim como a fonte para
todos os aspectos do mundo. O plano de Deus é consistente com o cará ter de Deus e reflete
seu cará ter. Ele é trinitá rio em seu cará ter, e assim seu plano exibe unidade e diversidade, e
surge como resultado a unidade e diversidade no mundo.

Em Deus encontramos o fundamento para os nú meros. No mundo que Deus criou, lidamos
por vezes com uma, duas, três, quatro ou mais maçã s. Por quê? Porque existem muitas
maçã s no mundo. As maçã s têm diversidade. Também têm unidade. Todas pertencem a
uma classe, a classe das maçã s.

Quando temos quatro maçã s sobre a mesa e desejamos contar quantas há , já tomamos a
decisã o de tratar todas as maçã s sobre a mesa como membros de uma classe, a classe que
consiste das maçã s sobre a mesa. Essa classe tem sua pró pria unidade e diversidade. Tem a
unidade de ser uma classe e a diversidade das quatro maçã s na classe. As quatro maçã s
pertencem a uma classe, exibindo o aspecto associativo. A contagem só é possível quando
temos a unidade de uma classe (as quatro maçã s tomadas juntas), a diversidade dos
membros na classe (cada maçã ) e a relaçã o associativa de pertencimento: isto é, as maçã s
individuais estando associadas com as demais maçã s sobre a mesa e todas pertencendo à
mesma classe.

Em suma, na nossa experiência cotidiana, a pró pria ideia de nú mero depende de


características do mundo que incorporam unidade, diversidade e associaçõ es. Deus é o
arquétipo para a unidade, diversidade e associaçã o. O que vemos no mundo é o efeito do
verbo de Deus expressando seu plano e seu cará ter. Ele fez o mundo com uma unidade e
diversidade éctipas. A combinaçã o delas nos dá o cará ter numérico do mundo.
Temos coleçõ es de uma, duas, três, quatro ou mais maçã s. E temos coleçõ es de uma ou mais
peras, pêssegos ou lá pis. Cada classe de quatro maçã s é uma representaçã o da ideia de “ter
quatro membros”. O nú mero quatro expressa a semelhança entre todas as instâ ncias de
quatro maçã s, pêssegos e similares. No tocante a isso, o nú mero quatro é o um, mostrando
a unidade que pertence a todas as instâ ncias. As instâ ncias sã o os muitos, mostrando a
diversidade. A relaçã o entre a unidade do nú mero quatro e a diversidade de quatro maçã s,
pêssegos ou lá pis é uma relaçã o associativa. Assim, o nú mero quatro depende da unidade e
diversidade que existe na Trindade.

O mesmo, é claro, vale para qualquer outro nú mero natural: um, dois, três, quatro, e assim
por diante. Cada nú mero, como por exemplo 114, é uma unidade, e as coleçõ es de 114
maçã s ou 114 pêssegos sã o diversas representaçõ es da unidade.

Agora podemos notar outra unidade na diversidade e diversidade na unidade. Todos os


nú meros naturais juntos têm uma unidade. Sã o todos nú meros naturais! E eles têm uma
diversidade: cada um, como por exemplo 114, é distinto dos demais.

Tudo isso é tã o natural, tã o comum, que estamos acostumados a tomar como algo certo.
Mas podemos agradecer a Deus por isso. Deus fez isso assim. Porque Deus é está vel, fiel e
consistente consigo mesmo, os nú meros sã o está veis e as relaçõ es de unidade e diversidade
sã o está veis. Vivemos num mundo, ao invés de num caos absoluto. Mais especificamente,
Deus fez isso assim por seu verbo, especificando que seria assim. Deus fala. Ele fala de
acordo com seu cará ter trinitá rio. Os nú meros refletem seu cará ter. Ao refletirem seu
cará ter, eles nos mostram quem Deus é:
 
… pois o que de Deus se pode conhecer é manifesto entre eles, porque Deus lhes manifestou. Pois desde
a criaçã o do mundo os atributos invisíveis de Deus, seu eterno poder e sua natureza divina, têm sido
vistos claramente, sendo compreendidos por meio das coisas criadas, de forma que tais homens sã o
indesculpá veis. (Rm 1.19-20, NVI)

1
 

3. Naturalismo
 
 

O problema do um e dos muitos tem uma longa histó ria. Mas é ele ainda significativo em
nossos dias? Muitas pessoas diriam que nã o. Para elas, parece ser um problema artificial.
Talvez diriam que essa era uma questã o que ocupava os filó sofos antes de realmente
entendermos a natureza do mundo. Mas que nã o precisamos dessas coisas agora. Temos a
ciência para nos dar respostas.
A ciência nos dá percepçõ es fascinantes e mostra sua utilidade através dos
desdobramentos tecnoló gicos de que desfrutamos. Mas será que a ciência nos dá respostas
para as questõ es mais fundamentais? Somente se extrapolarmos a ciência para além de
suas realizaçõ es principais.

A diferença entre ciência limitada e naturalismo

No mundo ocidental de nossos dias, a filosofia do naturalismo ou materialismo veio a ter


[27]

enorme influência. O materialismo diz que o mundo consiste de matéria, energia e


movimento. Diz que nã o há Deus. Ou que, se algum tipo de deus existe, ele é irrelevante.

O naturalismo ou materialismo obtém prestígio da ciência. A ciência, é afirmado, nos diz


como as coisas realmente sã o. Ela nos diz que o Universo se resume a matéria, energia e
movimento. Mas esse tipo de argumento falha em notar uma lacuna que existe entre duas
concepçõ es de ciência. Na primeira concepçã o, a ciência como disciplina restringe sua
atençã o a matéria, energia e movimento a fim de estudá -los em profundidade. Matéria,
energia e movimento — e seus arranjos complexos em células bioló gicas, formaçõ es
geoló gicas e estrelas — tornam-se o foco de estudo.

Entã o, numa segunda concepçã o de “ciência”, esse foco para a ciência é postulado como
sendo a ú nica coisa que realmente existe. De acordo com essa segunda concepçã o, a
“ciência” nos diz que o Universo é matéria, energia e movimento e nada mais. Mas no
processo a palavra ciência mudou seu significado. As pessoas importaram para o
significado um pressuposto filosó fico, a saber, o pressuposto de que o foco escolhido para a
prá tica da ciência é o único foco legítimo e que este só deixa de fora o que nã o é importante.
Essa conclusã o nã o é realmente um produto de investigaçõ es detalhadas em química ou na
formaçã o das estrelas. É um pressuposto oculto adicional. Jamais pode ser realmente
justificada por uma experimentaçã o científica detalhada, pois essa experimentaçã o já
pressupõ e o foco limitado na matéria. Na natureza do caso, ela nã o pode fazer
pronunciamentos sobre aquilo que nã o estudou.

A ciência como algo focado

Será que a ciência pode, tendo um foco limitado, responder ao problema do um e dos
muitos? Nã o, porque o problema do um e dos muitos é um problema filosó fico que é mais
profundo que a ciência. A investigaçã o científica parte da pressuposiçã o de que o mundo é
ao mesmo tempo unificado e diversificado. A típica ciência experimental usa a
pressuposiçã o repetidamente. Um cientista compara um ú nico experimento sobre uma
partícula de matéria com outros experimentos do mesmo tipo sobre outras partículas de
matéria. Esse é um dos princípios sobre a repetiçã o de experimentos. Mas para repetir um
experimento o cientista precisa confiar no fato de que ele é identificá vel como sendo o
mesmo experimento. Deve haver uma unidade bá sica. Ao mesmo tempo, a repetiçã o implica
que há duas ou mais instâ ncias do experimento. As mú ltiplas instâ ncias mostram
diversidade. As diferentes instâ ncias representam os muitos . O cientista usa assim o
entrelaçamento do um e dos muitos. Ele o pressupõ e em vez de explicá -lo.

O materialismo tentando resolver o problema

O materialismo é a extensã o filosó fica da ciência que diz que nã o há nada exceto matéria,
energia e movimento. Será que o materialismo pode responder o problema do um e dos
muitos?

Por um lado, o materialismo diz que os seres humanos evoluíram de maneira que veem o
mundo como um e muitos. O um e os muitos surgem como parte de nossa percepçã o
subjetiva. Mas será que o mundo “aí fora” é realmente um e muitos? Ou esta é
simplesmente a forma como o “vemos”? É o nosso modo de ver simplesmente um
subproduto acidental de mutaçõ es e química em nosso cérebro? Suponhamos que nosso
modo de ver seja uma ilusã o. Entã o, o que dizer dos experimentos repetidos que os
cientistas realizam? A ideia de um experimento repetido depende do um e dos muitos e do
seu entrelaçamento. Assim, a ideia de um experimento repetido também é uma ilusã o
evolutiva e, portanto, a ciência que é construída sobre esse modo de ver é uma ilusã o. Uma
vez que o materialismo afirma estar baseado na ciência, o pró prio materialismo também é
uma ilusã o. Isso nã o é uma boa notícia para o materialismo.

De fato, a maioria dos materialistas acham que o mundo “aí fora” é um e muitos. Ao nível
das partículas materiais, existem muitas partículas. E partículas do mesmo tipo
compartilham de propriedades comuns, o que significa que existe uma unicidade ou
unidade para todas as partículas da mesma espécie.

Entã o, de onde vieram a unidade e a diversidade? Os materialistas diriam que vieram do


Big Bang , que através de processos mecâ nicos quâ nticos complexos levou à criaçã o de um
grande nú mero de partículas. Há diferentes tipos de partículas. No nível das partículas que
compõ em os á tomos, há três tipos bá sicos de partículas: pró tons, nêutrons e elétrons.
Todos eles mostram algumas similaridades de comportamento (por exemplo, todos têm
um “spin” de ½). Assim, há unidade. Mas os três tipos também diferem. Assim, há
diversidade. Há uma diversidade adicional porque há um grande nú mero de partículas de
qualquer um desses tipos.

Ou podemos entrar nos pró tons e nêutrons e dizer que cada pró ton e cada nêutron é
composto de três quarks . Os quarks (no estado atual da teoria física) sã o de seis tipos
(“sabores”), chamados caprichosamente de “up”, “down”, “strange”, “charm”, “bottom” e
“top”. Além disso, vêm em três “cores”. Vemos unidade no fato de que todos esses tipos sã o
quarks e diversidade no fato de que existem diferentes tipos de quarks .

Qual entã o é a origem dessa unidade na diversidade? Os materialistas nã o têm nenhuma


explicaçã o completa para o pró prio Big Bang , o evento inicial. Mas diriam que as leis da
física explicam a unidade e diversidade nas partículas que hoje vemos. Dado o Big Bang
mais as leis da física, eles diriam que podemos esperar ver unidade e diversidade entre as
partículas. Essa unidade e diversidade nas partículas eventualmente dá origem à unidade e
diversidade em todos os demais níveis, incluindo os níveis da observaçã o humana
ordiná ria. Isso parece bom, até fazermos mais perguntas.

De onde vêm as leis da física? Como formulaçõ es humanas, elas trazem uma enorme
unidade e diversidade incorporadas em si. Essa unidade e diversidade vêm da capacidade
dos seres humanos de entender a unidade e diversidade que existe em sua mente. Mas os
físicos chegaram à s formulaçõ es atuais interagindo com o mundo, que já tinha a unidade e
diversidade em suas partículas. A unidade e diversidade nas partículas leva à unidade e
diversidade na formulaçã o das leis. E entã o essas leis devem explicar a unidade e
diversidade nas partículas! Isso parece circular.

A resposta ó bvia é distinguir as formulaçõ es humanas das leis das pró prias leis — das leis
“aí fora” que governam o Universo. As formulaçõ es humanas sã o cronologicamente
subsequentes à existência das partículas. As partículas sã o cronologicamente subsequentes
à existência das leis “aí fora”. Assim, as leis “aí fora” explicam tudo o mais.

O que explica as leis?

As leis “aí fora” já exibem o entrelaçamento da unidade e diversidade. Em um nível baixo


existem vá rias leis, uma para cada tipo de partícula. Espera-se que a física chegue a uma
formulaçã o final e unificada, por vezes chamada de “A teoria de tudo”. Ainda que chegasse a
isso, a teoria conteria unidade e diversidade dentro de si. Seria uma teoria, e sua unicidade
exibiria unidade. Ao mesmo tempo, seria uma teoria aplicada a todos os diferentes tipos de
partículas. Os diferentes tipos de partículas representam diversidade.

Além disso, a diversidade deve também estar presente de outra maneira. A pró pria
concepçã o de “lei” física implica unidade e diversidade. Cada lei é uma unidade. E cada lei
se aplica a muitos casos particulares de fenô menos no mundo. A aplicaçã o representa sua
diversidade.

Deve estar evidente agora que as explicaçõ es físicas nã o se livram do problema filosó fico.
Apenas elevam o problema a outro nível. Ao invés de lidar com o problema no nível da
experiência humana comum, nó s o “elevamos” como um problema sobre partículas
materiais. Entã o a partir daí o elevamos como um problema sobre a natureza das leis
físicas.

Se nos concentrarmos nas leis “aí fora” como distintas das nossas formulaçõ es humanas
posteriores, as leis mostram os atributos de Deus da mesma forma que a verdade sobre 2 +
2 = 4 mostrava os atributos dele. [28]
A presença do entrelaçamento de unidade e
diversidade nas leis reflete a unidade e diversidade arquétipas de Deus. Nã o escapamos de
Deus simplesmente elevando o problema ao nível das leis.
Há um problema adicional. Para sua formulaçã o, as leis da física requerem matemá tica —
matemá tica bastante avançada. A matemá tica avançada é construída, camada sobre
camada, a partir de concepçõ es de nú mero e espaço. A investigaçã o sobre o nú mero já
havia feito o problema da unidade e diversidade aparecer em seu meio. E, claro, nossa
expressã o “camada sobre camada” implica mú ltiplas camadas, as quais implicam
diversidade (mais de uma camada) e unidade (uma unidade onde camadas mais altas sã o
construídas sobre e estã o em harmonia com camadas mais baixas). Assim, se explicarmos a
física usando a matemá tica, teremos elevado o problema da unidade e diversidade um
está gio acima, na matemá tica. Nã o o teremos “resolvido”.

Além disso, confrontamos ainda outra forma de unidade e diversidade. Existe unidade
entre a matemá tica que os físicos usam e a física à qual eles a aplicam. A matemá tica
“funciona” quando aplicada ao mundo real. Ao mesmo tempo, a matemá tica nã o é idêntica à
física. Uma parte da matemá tica tem aplicaçã o física direta, e uma parte nã o tem. Por que
existe um Universo ao qual a matemá tica se aplica?

Os naturalistas diriam que o Universo existe por causa do Big Bang . Mas nã o estamos
realmente perguntando sobre o Big Bang . Estamos perguntando “Por que existe uma lei
física, enquanto distinta da verdade puramente matemá tica?”. A Bíblia tem uma resposta
clara: pela fala, Deus trouxe o mundo à existência. Deus especificou leis que estã o em
harmonia com o cará ter dele. A harmonia interna da natureza divina é refletida na
harmonia entre a matemá tica e a física. Em contraste, o materialismo nã o tem resposta. No
materialismo as leis da física têm de funcionar como um substituto para Deus.

O materialismo é uma filosofia desajeitada. Em sua formulaçã o típica, diz que nada existe
exceto matéria, energia e movimento. Mas o que ela realmente deveria dizer, no mínimo, é
que existe matéria, energia e movimento e também leis . As leis nã o sã o nem matéria, nem
energia, nem movimento, mas algo diferente: algo imaterial, conceitual, envolvendo
matemá tica. [29]

A origem da matemática

Podemos dizer que a matemá tica se originou no fato de que há mú ltiplos objetos no
mundo? Como seres humanos, aprendemos matemá tica com a ajuda da nossa mente,
combinada com a ajuda de um ambiente que contém mú ltiplos objetos. Mas combinar
nossa mente com nosso ambiente ainda nã o produz uma explicaçã o adequada para a
matemá tica. A bem da verdade, nó s como seres humanos aprendemos matemá tica
gradualmente. Mas o materialista precisa ter a matemá tica por trá s de tudo o mais. A
matemá tica precisa estar aí antes de o Universo existir. E precisa estar em harmonia com as
leis físicas, isto é, leis que nã o sã o apenas matemá ticas, mas que na verdade controlam o
que acontece se um Universo vier a existir. Para um observador comum, essa combinaçã o
de matemá tica e leis físicas formulada na matemá tica é uma combinaçã o muito complexa
de ideias. Sã o ideias , nã o matéria. Elas soam altamente imateriais e altamente não
naturais , no sentido de que a matemá tica e as leis da física nã o sã o apenas “parte da”
natureza. Elas têm de existir em primeiro lugar para se chamar a natureza à existência.

Em suma, para o materialista ter qualquer esperança de construir uma filosofia plausível, a
matemá tica já precisa existir. Se a matemá tica na verdade testifica Deus, como
argumentamos nos capítulos anteriores, o materialismo está perdido.

Algumas pessoas têm esperado dar uma explicaçã o mais definitiva para a matemá tica
reduzindo-a à ló gica. Vamos analisar essa tentativa mais tarde. Por ora podemos nos
limitar a observar que, ainda que essa tentativa obtivesse sucesso, só empurraria o
problema do um e dos muitos de volta para a ló gica. A ló gica precisa do um e dos muitos
para que seus fundamentos funcionem. Assim, essa rota nã o resolve o problema.

1
 

4. A natureza dos números


 
 

Qual é a natureza dos nú meros? E qual é a natureza das verdades sobre os nú meros,
verdades como 2 + 2 = 4?
 
A aritmética especificada pelo discurso de Deus
Já começamos a responder a pergunta ao observar no Capítulo 1 que a verdade de 2 + 2 = 4
tem os atributos de Deus, como a onipresença, eternidade, onipotência e veracidade. Deus
falou e o mundo veio à existência. Como um aspecto de seu discurso, ele especificou o
cará ter numérico do mundo. Seu discurso reflete seu cará ter. Assim, as verdades que ele
fala têm os atributos divinos.

Mas também podemos ver que verdades como 2 + 2 = 4 sã o acessíveis à nossa mente. E
podemos ver que as verdades influenciam o mundo à nossa volta. Duas maçã s mais duas
maçã s equivalem a quatro maçã s. A verdade de 2 + 2 = 4 é transcendente da mesma forma
que o discurso de Deus transcende o mundo. Ao mesmo tempo, é imanente. Vale para as
maçã s.

Perspectivas sobre reinos

Três reinos diferentes se juntam quando olhamos para 2 + 2 = 4, a saber, o reino da lei
transcendente, o reino que consiste de coisas dentro do mundo criado (maçã s) e o reino da
nossa mente. Esses três estã o em harmonia. A bem da verdade, nossa mente nã o é infalível.
Podemos cometer erros na aritmética. Mas também podemos corrigir erros. E sabemos que
existem fó rmulas corretas e fó rmulas que nã o sã o corretas. Podemos vir a saber que 2 + 2 =
4 e que 2 + 2 nã o é igual a 5. Quando nossa mente está em bom estado de funcionamento,
ela corresponde à lei transcendente (2 + 2 = 4) e combina realidades sobre as maçã s. Por
quê?

Deus ordenou todos os três. Ele especifica as verdades gerais (2 + 2 = 4). Ele criou o mundo
com maçã s nele. E criou os seres humanos com uma mente. Os três reinos gozam de uma
harmonia fundamental entre si, porque Deus está em harmonia consigo mesmo e é
consistente consigo mesmo. Ele criou um mundo que é consistente, de acordo com o seu
plano.

Perspectivas sobre ética

As três perspectivas de John Frame sobre ética podem nos ajudar a apreciar essa harmonia.
Frame argumenta que podemos abordar questõ es de ética a partir de pelo menos três
perspectivas diferentes, com três questõ es iniciais diferentes. A perspectiva normativa
[30]

pergunta quais sã o as normas para a ética. Ela se concentra nos mandamentos de Deus,
como os Dez Mandamentos. A perspectiva situacional pergunta o que promove a gló ria de
Deus dentro da nossa situaçã o. A perspectiva existencial , também chamada de perspectiva
pessoal , pergunta quais devem ser as nossas atitudes e motivaçõ es. Ela se concentra em
nó s como pessoas.

Segundo a Bíblia, essas três perspectivas estã o em harmonia porque Deus as ordena todas.
Ele fala as normas, cria as situaçõ es e cria as pessoas que estã o nas situaçõ es. Elas nã o
apenas estã o em harmonia; cada uma também aponta para e afirma as outras duas. As
normas na Escritura nos dizem para amar o nosso pró ximo, o que é uma atitude. Entã o
dizem para prestarmos atençã o à s nossas atitudes, que sã o o foco da perspectiva
existencial. E, para amar o nosso pró ximo na açã o, temos de avaliar a situaçã o e perguntar
quais açõ es o ajudariam em sua situaçã o. Assim as normas da Bíblia nos impelem a prestar
atençã o à situaçã o. Ou suponha que comecemos com a situaçã o. Nó s pró prios estamos de
certa forma na situaçã o, e assim temos de prestar atençã o à s nossas atitudes. Essa atençã o
nos leva a usar a perspectiva existencial. Ademais, Deus é a pessoa mais importante em
nossa situaçã o. Quando prestamos atençã o a Deus, devemos atentar à s suas normas, ao que
ele quer que nossa atividade moral se pareça. Quando atentamos à s suas normas, estamos
usando a perspectiva normativa. (Veja o diagrama 4.1.)
 
 
 
 

Essas três perspectivas sã o relevantes nã o apenas para a ética, quando estreitamente


concebida, mas também para toda a vida. Toda a vida requer responsabilidade ética.
Quando usamos essas perspectivas no mundo como um todo, descobrimos que estamos
afirmando as observaçõ es já feitas sobre 2 + 2 = 4. A equaçã o 2 + 2 = 4 representa (1) uma
norma, (2) uma verdade sobre o mundo e (3) uma verdade que nó s, como seres humanos,
podemos conhecer. Ela envolve todas as três perspectivas: a normativa (lei), a situacional
(o mundo) e a existencial (nó s). Essas três estã o em harmonia. Nã o apenas estã o em
harmonia, como também levam umas à s outras. Cada uma implica as demais. Por exemplo,
a norma 2 + 2 = 4 implica que, no mundo em que vivemos, duas maçã s mais duas maçã s
sempre dará quatro maçã s. Assim, a perspectiva normativa implica a perspectiva
situacional (que inclui maçã s). Além disso, a norma 2 + 2 = 4 implica que nó s como
conhecedores devemos pensar em conformidade com a verdade 2 + 2 = 4. A perspectiva
normativa implica a perspectiva existencial.

Agora, comecemos com a perspectiva existencial. Se sabemos que 2 + 2 = 4, usando a


perspectiva existencial, sabemos que isso já era verdade mesmo antes de nó s, ou qualquer
outro ser humano que já viveu, o saber. Nosso conhecimento implica transcendência. 2 + 2
= 4 é sempre verdade. É uma norma. Portanto, a perspectiva existencial, que começa com
nossos atos de conhecer, leva à perspectiva normativa, a qual enfoca a transcendência das
verdades que conhecemos. Além disso, se sabemos que 2 + 2 = 4, podemos inferir que duas
maçã s mais duas maçã s é igual a quatro maçã s. A perspectiva existencial, que enfoca nosso
conhecimento, leva à perspectiva situacional, que enfoca as maçã s.

Perspectivas sobre os números

Podemos usar as mesmas três perspectivas sobre um determinado nú mero, como dois. É
mais fá cil se começarmos com a perspectiva situacional. O nú mero dois tem uma relaçã o
com todas as coleçõ es que possuem duas coisas. Essas coleçõ es incorporam e ilustram o
nú mero dois. Podemos considerar duas maçã s, dois lá pis, dois gatos. Essas coleçõ es estã o
no mundo. Nó s as percebemos quando usamos a perspectiva situacional. A perspectiva
situacional naturalmente nos leva a ver o nú mero dois como uma ferramenta para lidar de
maneira prá tica com as coleçõ es de coisas no mundo.

Em segundo lugar, consideremos a perspectiva existencial. Como seres humanos,


precisamos ser capazes de pensar em termos de dois para que quaisquer dessas
observaçõ es sobre o mundo nos sejam significativas. Temos a palavra dois e sabemos como
usá -la. Podemos observar coleçõ es de dois objetos e podemos refletir no que significa dizer
que há dois objetos. Temos uma concepçã o geral do significado da palavra dois . Essa
concepçã o de dois em nossa mente pode ser distinguida das coleçõ es “aí fora”. Todavia, ela
também está relacionada a coleçõ es. Nó s entendemos o significado de dois , em parte,
considerando suas relaçõ es com as coleçõ es. Na verdade, esse relacionamento representa
um exemplo do um e muitos, da unidade e diversidade. A unidade aqui é a unidade do
nú mero dois, uma unidade que existe em suas aplicaçõ es para todas as coleçõ es de duas
coisas. A diversidade é a diversidade das coleçõ es — de maçã s, lá pis, gatos e assim por
diante.

Em terceiro lugar, consideremos a perspectiva normativa sobre o nú mero dois . O nú mero


dois é comum a todas as coleçõ es de duas coisas. É o mesmo nú mero. Representa um
padrã o de pensamento geral, e existem normas para o padrã o. O nú mero dois corretamente
descreve algumas coleçõ es, mas nã o outras. E há normas para o uso do nú mero dois em
relaçã o a outros nú meros. As leis da aritmética sã o normas. Essas normas incluem todas as
verdades aritméticas em que o nú mero dois aparece. As normas precisam ser distintas de
nossa mente, pois em nossa mente (ou no ato de fazer aritmética no papel) podemos
cometer erros. As normas também precisam ser distintas do mundo, pois sã o verdades
gerais e nã o apenas coleçõ es de duas coisas no mundo.

Outras perspectivas sobre 2 + 2 = 4

Em seguida, consideremos 2 + 2 =4 a partir da perspectiva da experiência no tempo. Nó s


podemos contar objetos. Suponha que haja quatro maçã s sobre a mesa em dois grupos de
duas. Contamos um grupo: uma maçã , duas maçã s. Contamos o segundo grupo: uma maçã ,
duas maçã s. Tendo terminado, contamos toda a coleçã o: um, dois, três, quatro. Através
desse processo, verificamos que 2 + 2 = 4. Esse processo mostra que 2 + 2 = 4 tem uma
relaçã o com o tempo e o desenvolvimento temporal. De fato, o filó sofo Immanuel Kant
alegou que o conhecimento humano intuitivo do nú mero se originava da percepçã o do
tempo.

Podemos na verdade distinguir duas perspectivas distintas que enfocam o tempo. A


primeira é nossa experiência subjetiva no tempo. Fazemos contagens no tempo e temos
uma experiência subjetiva da passagem do tempo, que inclui a passagem de momentos do
tempo, ou sucessivos batimentos cardíacos, ou sucessivos passos na caminhada. Estamos
cientes do fato de que podemos contar no tempo. A segunda perspectiva é a perspectiva
sobre o mundo. O mundo “aí fora” tem organizaçã o temporal. [31]
Também podemos considerar os nú meros a partir da perspectiva do espaço. As maçã s
sobre a mesa ocupam diferentes posiçõ es no espaço. Nessa perspectiva, a verdade de 2 + 2
= 4 é ilustrada ao se considerar uma simples imagem está tica de quatro maçã s. Elas estã o aí
em dois grupos espaciais de dois. 2 + 2 = 4 significa que duas maçã s em um grupo espacial
mais duas maçã s em um segundo grupo espacial formam juntas um grupo espacial maior, e
esse grupo maior tem quatro maçã s. Assim como na perspectiva enfocando o tempo, a
perspectiva enfocando o espaço pode ser dividida em duas, dependendo se enfocamos
nossa percepçã o subjetiva do espaço (enfoque existencial) ou a organizaçã o do mundo “aí
fora” (enfoque situacional). Além disso, estamos cientes de uma norma: 2 + 2 = 4 é sempre
verdade.

A matemática nas ciências físicas

Também podemos considerar os nú meros a partir da perspectiva das ciências físicas. A


relaçã o dos nú meros com o tempo e o espaço leva ao uso dos nú meros nas ciências físicas:
física, astronomia, química, geologia e biologia. Em particular, a matemá tica desempenha
um papel poderoso na física, astronomia e química. As verdades numéricas sã o
constantemente usadas. Além disso, alguns tipos de sociologia e a psicologia experimental
usam nú meros e estatísticas como parte integrante da sua investigaçã o das regularidades
no pensamento e comportamento humanos.

Os conjuntos como uma perspectiva

Em seguida, podemos considerar 2 + 2 = 4 a partir da perspectiva dos conjuntos. Nó s


estivemos falando sobre coleçõ es de maçã s. Será que podemos generalizar a ideia de
coleçã o? Na matemá tica, conjunto é uma generalizaçã o abstrata da nossa ideia intuitiva de
coleçõ es. Para todos os efeitos, partimos de uma coleçã o e entã o “despimos” nossa mente
de toda informaçã o, exceto da informaçã o acerca do que sã o os membros da coleçã o. Na
matemá tica, um conjunto cujos elementos sã o 1 e 2 é representado colocando a lista de
elementos entre chaves: {1, 2}. Os membros ou elementos de um conjunto sã o os itens
incluídos na coleçã o. Assim, o conjunto {1, 2} possui os membros 1 e 2.

Usando conjuntos, podemos reexpressar a verdade de 2 + 2 = 4. Conforme aplicada a


conjuntos, ela significa que, se temos um conjunto com dois elementos e um segundo
conjunto com outros dois elementos que sã o distintos dos elementos do primeiro conjunto,
e entã o fazemos mais outro conjunto que contenha todos os elementos de ambos, esse
novo conjunto terá quatro elementos.

Por exemplo, suponha que na mesa temos pedaços distintos de frutas: uma maçã , um
pêssego, uma banana e uma pera. Nó s agrupamos essas frutas em dois conjuntos. O
primeiro conjunto, que chamamos de conjunto A , tem como seus membros a maçã e o
pêssego: A = {maçã , pêssego}. O segundo conjunto, que chamamos de conjunto B , tem como
seus membros a banana e a pera. B = {banana, pera}. A partir desses dois conjuntos
formamos um terceiro conjunto, T , que tem como seus membros todos os membros de A e
B . T = {maçã , pêssego, banana e pera}. Esse conjunto é chamado de conjunto união de A e
B . Em geral, o conjunto uniã o T de dois conjuntos A e B inclui todos os membros que estã o
em A ou B ou ambos. No caso específico que estamos considerando, A e B nã o têm membros
em comum. A e B têm cada um dois membros. O conjunto uniã o T tem quatro. Esse fato
ilustra o princípio de que 2 + 2 = 4. (Veja o diagrama 4.2.)
 

 
 

Será que nã o estamos com isso apenas dizendo o que já dissemos? Em alguns aspectos
parece ser a mesma coisa. Mas podemos ver que o resultado, isto é, o fato de que a uniã o T
tem quatro membros, é independente dos detalhes sobre que tipos de frutas estavam na
mesa. Podemos ver que 2 + 2 = 4 é verdade de modo geral, nã o apenas para uma escolha
particular de frutas. Podemos fazer um raciocínio geral sobre conjuntos (ignorando os
detalhes sobre quais frutas estamos usando ou sobre quais membros estamos usando que
nã o sã o frutas, mas vegetais, pedras ou outros objetos). O raciocínio geral sobre conjuntos
mostra que as verdades numéricas têm validade geral.

De fato, Alfred North Whitehead e Bertrand Russell usaram exatamente esse caminho para
tentar derivar as propriedades dos nú meros usando a ló gica como ponto de partida. A [32]

partir da ló gica eles passaram a desenvolver uma ideia de predicados. (Predicados sã o


representaçõ es abstratas de propriedades, como “é vermelho” ou “é mamífero”.) A seguir,
para cada predicado, definiram uma classe que consiste dos objetos com a propriedade
representada pelo predicado. Duas classes representam o mesmo nú mero se seus membros
podem ser colocados em uma correspondência de um para um. Dessa forma, os nú meros
podem ser representados através de classes.

Sem endossar a filosofia de Whitehead e de Russell, podemos usar a ló gica como uma
perspectiva sobre os nú meros e uma perspectiva sobre a matemá tica como um todo.
Grande parte da matemá tica superior hoje em dia é apresentada usando-se axiomas e
deduçõ es de axiomas. O rigor da ló gica formal é usado para fornecer uma base rigorosa
para a matemá tica que é apresentada. A matemá tica é de fato ló gica, e os matemá ticos
podem mostrar quã o vastas conclusõ es podem ser deduzidas a partir de simples axiomas,
se apropriadamente escolhidos.

Em seguida, podemos usar a linguagem como uma perspectiva sobre a matemá tica. Os
matemá ticos se comunicam usando a linguagem. Eles complementam a linguagem comum
com símbolos matemá ticos especiais, para que os resultados matemá ticos sejam um
produto tanto da linguagem em geral quanto da capacidade de produzir novos símbolos
com significados matemá ticos especiais. Até mesmo os símbolos “+” para “mais” e “=” para
“igual”, que usamos na fó rmula 2 + 2 = 4, sã o símbolos especiais. Há muitos outros símbolos
matemá ticos, alguns dos quais menos conhecidos porque usados apenas em á reas
especializadas ou apenas na matemá tica avançada. Os símbolos especiais sã o possíveis por
causa da flexibilidade da linguagem comum, que nos permite complementá -la com
símbolos recém-inventados e nos permite definir o significado dos novos símbolos. A
matemá tica, portanto, pode ser analisada como uma parte da linguagem natural. [33]

A matemá tica axiomá tica também pode ser analisada como um tipo de linguagem
especializada, uma linguagem formal , que tem regras especializadas para derivar
conclusõ es de premissas. A perspectiva da linguagem formalizada é ú til na aná lise da
matemá tica e está intimamente relacionada com a perspectiva da ló gica. [34]

Matemática e interação social

Também podemos considerar a relaçã o da matemá tica com a interaçã o social. Antes de
aprenderem aritmética, as crianças já desenvolveram algumas intuiçõ es bá sicas sobre os
nú meros através da interaçã o com o mundo, com seus pais e com outros. Elas sabem que
há uma diferença entre ter dois ursos de pelú cia e ter um, e podem aprender os nomes dos
primeiros nú meros — um, dois e três, e talvez mais. Com os pais ou na escola, aprendem
mais através da interaçã o social. Os professores lhes ensinam alguma aritmética, e elas
também interagem com os colegas tanto na sala de aula quanto no pá tio, onde podem à s
vezes participar de jogos que usam nú meros.

A interaçã o social também ocorre entre matemá ticos profissionais. Um matemá tico pode
interagir com colegas matemá ticos ou com cientistas na física, química, ciência da
computaçã o ou em outras ciências na busca por problemas adequados para resolver e
explorar a melhor forma de resolvê-los. Se ele desenvolve uma nova abordagem para um
problema matemá tico ou oferece uma prova de um novo teorema, interage com os
matemá ticos apresentando-lhes a abordagem ou a prova para sua inspeçã o. À s vezes
outros matemá ticos encontram uma lacuna ou problema numa prova ou até mesmo um
contraexemplo: a prova proposta falha. Os matemá ticos mostram suas limitaçõ es humanas
no fato de que um ú nico matemá tico trabalhando sozinho pode nã o ver a lacuna que os
outros encontram mais tarde. A matemá tica depende da interaçã o social para verificar o
trabalho de matemá ticos individuais.

Os professores de matemá tica também devem prestar atençã o à s questõ es pedagó gicas. De
que forma eles podem apresentar conceitos e métodos na matemá tica para que façam
sentido aos novos alunos, e como podem dar aos alunos nã o apenas fatos e regras, mas
também percepçõ es e interesse? Como um professor pode promover disciplina e ordem
numa sala de aula indisciplinada, a fim de que os alunos estejam num ambiente onde
podem se concentrar em aprender? Como os professores podem motivar alunos que nã o se
importam em perder algo do aprendizado? As pessoas sã o complicadas, e a habilidade no
ensino envolve muito mais do que competência em saber a matéria — neste caso,
competência em alguma á rea da matemá tica. [35]

A influência cultural

Também podemos considerar a influência da matemá tica em questõ es sociais e culturais


mais amplas. Algumas pessoas consideram a matemá tica um exemplo-chave de rigor e
pensamento limpo. Assim, ela se torna um modelo de como a ciência deveria agir. Ou se
torna um modelo para a ciência num segundo sentido: uma parte da ciência que use
cá lculos numéricos terá maior prestígio e receberá maior atençã o e admiraçã o do que uma
parte que nã o use nú meros. Esse efeito pode ser observado nas ciências sociais, onde
influencia alguns praticantes a preferirem estudar apenas aspectos mensurá veis ou
quantificá veis da interaçã o humana. O resultado pode ser que apenas o que é mensurá vel
conta como cientificamente “significante”. E entã o, se a ciência é também o modelo para
todo conhecimento, somente o que é mensurá vel conta como significativo para todas as
coisas da vida. Esse tipo de tendência no pensamento nã o reduz tudo a matéria e
movimento, que é o caminho seguido pela filosofia materialista, mas sim reduz tudo a
quantidades e medidas.

Podemos também perguntar qual pode ser a influência de uma concepçã o secularista de
matemá tica. Se a nossa cultura concebe a matemá tica como algo que existe aí fora
independentemente de Deus e considera Deus irrelevante para a matemá tica, essa
suposiçã o nã o tenderia a reforçar forças secularizantes em toda a sociedade? Se Deus é
irrelevante para a matemá tica, entã o talvez possa ser considerado irrelevante para todos
os demais setores da sociedade, se os conseguirmos analisar matematicamente.

Harmonia entre perspectivas

Deus ordenou que os nú meros funcionariam em relaçã o a todas as perspectivas que temos
considerado — e a outras mais também. Ele ordenou a verdade de 2 + 2 = 4 como uma
verdade permanente e universal. Também a estabeleceu em relaçã o a muitas outras
verdades: verdades da aritmética, verdades na matemá tica superior, verdades nas ciências
físicas, verdades sobre coleçõ es de maçã s, verdades sobre as pessoas em sua interaçã o
social e pedagogia e verdades sobre a influência cultural (veja o diagrama 4.3). Todas elas
gozam de harmonia umas com as outras porque se originam de um Deus que está em
harmonia consigo mesmo.

Numa abordagem filosó fica informada pelo Deus da Bíblia, podemos apreciar a riqueza do
mundo. O mundo tem muitas dimensõ es, muitas complexidades e muitas belezas. Nã o
temos necessidade de tentar explicar a riqueza do mundo derivando-a toda de um aspecto.
Nã o precisamos dizer que a aritmética gera todo o resto do mundo. Nem precisamos dizer
que a ló gica gera todas as coisas. Ou os objetos físicos. Tudo é o que é. Tudo é ú nico. E tudo
está relacionado a todas as demais coisas. O plano de Deus e o governo de Deus sobre todas
as coisas produz coerência e distinçã o. A coerência e a distinçã o representam outra
expressã o do um (coerência) e dos muitos (distinçã o).

Nada é redutível a outra coisa. Nossa abordagem se opõ e ao reducionismo , a tentativa


filosó fica de afirmar que um aspecto do mundo é o mais ú ltimo e que todas as coisas devem
ser explicadas completamente a partir desse ú nico aspecto. Para uma discussã o mais
aprofundada do princípio geral de que o mundo é rico e de que os reducionismos sã o
inadequados, devemos dirigir as pessoas para a discussã o mais completa sobre o que a
filosofia e a metafísica se parecem quando sã o reformadas pela instruçã o da Bíblia. [36]

Por exemplo, o naturalismo ou materialismo, que discutimos anteriormente (Capítulo 3),


tenta reduzir tudo ao nível material ou físico. Ele afirma que tudo é “realmente” matéria,
energia e movimento. Outra filosofia, chamada empirismo , tenta reduzir tudo à experiência
dos sentidos. Ainda outra filosofia, o idealismo , tenta reduzir tudo a ideias na mente.

Todas essas filosofias reducionistas têm dificuldades. A dificuldade mais bá sica é que as
coisas sã o diferentes umas das outras. Muito embora haja uma harmonia impressionante,
nada é realmente explicado em todas as suas dimensõ es através de um reducionismo. O
materialista alega que um arco-íris nã o é nada mais que raios de luz física agindo de acordo
com as leis físicas da refraçã o. Mas ele explicou a beleza do arco-íris? O empirista diz que o
arco-íris nã o passa de sensaçõ es visuais transmitidas ao cérebro a partir da retina e nervos
ó pticos. Ele explicou a beleza? O idealista diz que tudo está em nossa mente. Mas explicou
ele as maneiras em que o mundo à nossa volta nos surpreende?
 
 

Princípios semelhantes se aplicam quando se trata de explicar a matemá tica. Os filó sofos da
matemá tica têm buscado explicar a natureza dos nú meros e a natureza da verdade
aritmética. Mas a maioria dessas tentativas têm sido reducionistas (veja o Apêndice A). É
melhor apreciar o mundo tal como Deus o fez. Nú meros e verdades aritméticas existem em
relaçã o ao mundo como um todo, e este mundo é multidimensional. Deus o fez assim. Nã o
há razã o para lutar contra essa realidade, tentando imaginar como seriam os nú meros se
eles pudessem ser perfeitamente isolados do mundo. [37]
1
 
 
 
 
 
 
 
Parte 2 — NOSSO CONHECIMENTO DA
MATEMÁTICA
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5. As capacidades humanas
 
 
Se quisermos viajar mais longe para entender as maneiras nas quais Deus é a fonte da
matemá tica, precisamos considerar brevemente a natureza das nossas capacidades como
seres humanos. O que podemos esperar entender sobre Deus? E como?

A Bíblia indica que Deus é o Criador e nó s somos criaturas. Ele é infinito e nó s somos
finitos. Assim, nã o podemos entendê-lo exaustivamente. Na teologia, a palavra compreender
é usada num sentido técnico para expressar os limites do entendimento humano. Os
teó logos dizem que nã o podemos compreender Deus; isto é, nã o podemos entendê-lo
completamente assim como ele entende a si mesmo. Podemos, entretanto, conhecer Deus
— na verdade, de acordo com Romanos 1.19-21, todo mundo conhece Deus, mesmo
aqueles que estã o em rebeliã o contra ele e tentam suprimir o conhecimento.

A imagem de Deus

A Bíblia indica que Deus fez o homem à sua imagem (Gn 1.26–27). Nã o somos meros
produtos de processos evolutivos gradualistas, impessoais e sem propó sito. Ser feitos à
imagem de Deus implica que somos como ele. Em Gênesis 1 a Bíblia nã o entra em detalhes
sobre todos os aspectos em que somos como Deus. Mas, a partir do restante da Bíblia,
podemos ver que há muitas semelhanças. Nó s podemos raciocinar; temos um senso de
moralidade; podemos usar a linguagem; podemos fazer compromissos pessoais; e assim
por diante. Juntamente com muitas outras capacidades, como seres humanos, somos
capazes de pensar os pensamentos de Deus depois dele. Em particular, podemos saber que
2 + 2 = 4, uma verdade que está na mente de Deus antes de estar na nossa.

Por causa da distinçã o entre Criador e criatura, podemos dizer mais especificamente que
pensamos os pensamentos de Deus depois dele analogicamente . Nossos processos de
pensamento nã o sã o simplesmente idênticos aos de Deus. E nã o precisam sê-lo. Deus sabe
todas as coisas porque conhece a si mesmo e seus planos. Precisamos crescer em
conhecimento. Precisamos observar as coisas no mundo e receber instruçã o de outras
pessoas. Através da comunhã o com Deus e através da comunhã o com as pessoas que Deus
coloca em nosso caminho, Deus nos ensina conhecimento (Sl 94.10; compare com Jó 32.8).

Precisamos afirmar tanto as semelhanças quanto as diferenças entre o conhecimento de


Deus e o nosso. Usemos o exemplo de 2 + 2 = 4 para fazer isso. Deus é a origem da verdade
de 2 + 2 = 4. Isso é verdade porque ele o diz. Somos receptivos à verdade disso. Deus sabe
seu significado exaustivamente em relaçã o nã o só à s formas que isso assume em quatro
maçã s e quatro pêssegos, como também em relaçã o a qualquer outra verdade. Só sabemos
alguns desses relacionamentos, e sabemos parcialmente. Mas também sabemos
verdadeiramente. 2 + 2 = 4 é de fato totalmente verdade tanto para nó s quanto para Deus.
É verdade para nó s porque é, antes de tudo, verdade para Deus.

Transcendência e imanência

Podemos avançar na compreensã o do conhecimento humano usando algumas percepçõ es


de John Frame. Ele produziu um diagrama, agora chamado de quadrado de Frame , para
resumir a transcendência e imanência de Deus. Ele expressa a diferença entre uma
[38]

visã o cristã de transcendência e imanência, de um lado, e uma visã o nã o cristã , do outro.


(Veja o diagrama 5.1.)

Os cantos esquerdos do quadrado, rotulados de 1 e 2, representam o entendimento cristã o


da transcendência (canto 1) e da imanência (canto 2), como ensinado na Bíblia. A [39]

transcendência de Deus significa que ele tem autoridade absoluta e controla o mundo. A
imanência de Deus significa que ele está presente no mundo.

Os dois cantos direitos do quadrado, rotulados 3 e 4, representam o entendimento nã o


cristã o de transcendência (canto 3) e da imanência (canto 4). Os nã o cristã os diferem entre
si. Mas, no entender de grande parte do pensamento nã o cristã o, a transcendência de Deus
significa que ele nã o está envolvido (ou mesmo nã o existe). Ele é remoto. Um entendimento
nã o cristã o da imanência diz que Deus é idêntico ao mundo ou limitado pelo mundo. Os
dois lados horizontais do quadrado representam o fato de que existem semelhanças
superficiais entre ambos os lados. Eles podem soar iguais. Cada um pode usar as palavras
transcendência e imanência . Cada lado pode à s vezes dizer que Deus é “exaltado”
(transcendência) ou que está “pró ximo” (imanência). Mas significam coisas diferentes,
mesmo quando a linguagem é parecida. (Veja o diagrama 5.2.)

As diagonais do quadrado representam contradiçõ es. A visã o nã o cristã da transcendência


(canto 3), ao dizer que Deus nã o está envolvido, contradiz a visã o cristã sobre a imanência
(canto 2), a qual diz que ele está presente e envolvido. A visã o nã o cristã da imanência
(canto 4), ao dizer que Deus está sujeito à s limitaçõ es do mundo, contradiz a visã o cristã de
transcendência (canto 1), a qual diz que ele soberanamente controla o mundo e nã o é
limitado por este.
 

Podemos aplicar o quadrado de Frame ao entendimento de uma verdade numérica


específica, como 2 + 2 = 4. De acordo com uma visã o cristã de transcendência (canto 1), a
autoridade de Deus está por trá s da verdade de 2 + 2 = 4. Deus controla os nú meros em vez
de estar sujeito a eles. Em segundo lugar, de acordo com uma visã o cristã de imanência
(canto 2), através de sua presença no mundo, Deus mantém o mundo em conformidade
com a verdade 2 + 2 = 4. Duas maçã s mais duas maçã s equivalem a quatro maçã s porque
Deus está presente com as maçã s, expressando sua verdade divina. Deus também está
presente em nossa mente, para chegarmos ao conhecimento de que 2 + 2 = 4.

Terceiro, de acordo com uma visã o nã o cristã de transcendência (canto 3), Deus nã o está
envolvido com a verdade numérica — a verdade numérica é apenas uma abstraçã o, apenas
existe “aí fora” (ou talvez apenas “aqui dentro”, se a verdade é completamente subjetivada).
Deus também nã o está envolvido com maçã s. Essa visã o nã o cristã contradiz a visã o cristã
de imanência (canto 2). Em quarto lugar, de acordo com uma visã o nã o cristã de imanência
(canto 4), Deus é limitado pelos nú meros. Eles o controlam restringindo o que ele pode
fazer. Deus nã o tem autoridade sobre a verdade de 2 + 2 = 4. Essa visã o contradiz a visã o
cristã de transcendência (canto 1). (Veja o diagrama 5.3.)
 
 

Transcendência e imanência em questões de conhecimento

Podemos aplicar os mesmos princípios quando consideramos a questã o do conhecimento.


Deus sabe que 2 + 2 = 4. E os seres humanos sabem que 2 + 2 = 4. Qual é a relaçã o?

De acordo com uma visã o cristã de transcendência (canto 1), Deus é a fonte e conhecedor
autoritativo original de 2 + 2 = 4. Ele sabe disso exaustivamente. De acordo com uma visã o
cristã de imanência (canto 2), Deus através de sua presença torna a verdade de 2 + 2 = 4
acessível e conhecida aos seres humanos, que a conhecem de forma derivada e analó gica.

De acordo com uma visã o nã o cristã de transcendência (canto 3), Deus nã o existe ou nã o
sabe nada ou nã o está envolvido no conhecimento humano de 2 + 2 = 4. De acordo com
uma visã o nã o cristã de imanência (canto 4), nó s como seres humanos podemos ser o
padrã o para o conhecimento. Nosso conhecimento de 2 + 2 = 4, de acordo com nossos
pró prios padrõ es autô nomos, pode ser usado para especificar qual deve ser a relaçã o de
Deus com a verdade de 2 + 2 = 4. Como de praxe, a visã o nã o cristã contradiz a visã o cristã .
(Veja o diagrama 5.4.)
 
 
Muito mais poderia ser dito sobre as questõ es do conhecimento humano e do processo
humano de vir a conhecer. Devemos deixar isso para outros livros. [40]
Para o presente
propó sito é suficiente entender que o conhecimento humano de verdades numéricas, como
2 + 2 = 4, deriva do conhecimento divino arquétipo anterior. Ele é imitativo e analó gico.
Deus nos chama a louvá -lo por seu conhecimento infinito e a reconhecer sua autoridade no
conhecimento. Esse princípio inclui nosso conhecimento de que 2 + 2 = 4. Devemos
conduzir nossa vida e nosso pensamento sobre a matemá tica à luz da grandeza de Deus e
de seu ser, que é digno de louvor e gló ria.

1
 

6. Necessidade e contingência
 

Agora nos concentramos na questã o de saber se as verdades matemá ticas sã o necessá rias.
É necessá rio que 2 + 2 = 4? Ou essa verdade é apenas algo característico da maneira como
Deus criou nosso Universo? Podemos fazer perguntas semelhantes sobre outras verdades
da matemá tica, tanto verdades sobre os nú meros quanto verdades na matemá tica mais
avançada, como cá lculo e teoria dos grupos.

Uma intuição da necessidade


Como primeira reaçã o intuitiva, muitas pessoas poderiam dizer que as verdades
matemá ticas sã o necessá rias. Nã o podemos imaginar um mundo em que 2 + 2 = 4 nã o seja
verdade. As verdades matemá ticas parecem ser “bá sicas” e nã o específicas do nosso
Universo. Em contraste, a existência de maçã s ou a existência de leis físicas, como as leis do
movimento de Newton, têm uma conexã o com o mundo particular no qual vivemos.
Poderíamos imaginar um mundo em que as coisas fossem muito diferentes.

Suponha que essa intuiçã o sobre a necessidade seja correta e que as verdades matemá ticas
sã o todas necessá rias. Entã o, como essa necessidade se relaciona com Deus?

Um caminho que as pessoas tomam é conceber essa necessidade como algo independente
de Deus ou mesmo superior a Deus. Supostamente, Deus é limitado pelo fato de que ele
deve se conformar à s verdades da matemá tica, e que qualquer mundo que ele criasse teria
de se conformar à s verdades da matemá tica.

Mas a ideia de Deus ser limitado pela matemá tica faz da matemá tica algo superior a Deus, e
nesse sentido ela se torna uma espécie de “deus acima de Deus”. Sua autoridade é mais
ú ltima que Deus. Se seguirmos o ensino da Bíblia sobre Deus, isso nã o terá fundamento.
Deus é o ú nico Senhor, o Senhor definitivo. Como, entã o, poderiam as verdades
matemá ticas ser uma necessidade adicional ?

Necessidade e contingência em relação a Deus

Podemos encontrar uma resposta se refletirmos sobre o cará ter de Deus. A Bíblia indica
que Deus é onipotente , todo-poderoso. À s vezes as pessoas pensam que onipotência
significa que Deus pode fazer qualquer coisa, até mesmo algo contraditó rio ou algo
moralmente mau. Mas isso é incorreto. Deus nã o pode fazer nada que viole seu pró prio
cará ter. Por exemplo, ele nã o pode mentir:
 
Deus nã o é homem, para que minta ; nem filho de homem, para que se arrependa. (Nm 23.19)
 
… Deus que não pode mentir prometeu antes dos tempos eternos. (Tt 1.2)
 

Ele nã o pode negar-se a si mesmo (2Tm 2.13); nã o pode se contradizer; nã o pode fazer
nada moralmente mau, pois isso seria inconsistente com sua bondade.

Onipotência, entã o, nã o significa que Deus pode fazer qualquer coisa que imaginarmos, mas
que ele pode fazer qualquer coisa que queira fazer: “No céu está o nosso Deus e tudo faz
como lhe agrada ” (Sl 115.3). Visto que o que agrada a Deus ou o que Deus quer é sempre
consistente com seu cará ter, nã o há dificuldade.
Em particular, visto que Deus é racional e é a fonte da razã o humana, ele nunca faz nada
irracional. Nunca é inconsistente. É consistente consigo mesmo, e sua autoconsistência é o
fundamento da ló gica. [41]

Da mesma forma, podemos inferir que Deus é o fundamento da matemá tica. Ele é a fonte
tanto para o que é necessá rio quanto para qualquer coisa, na matemá tica, que seja
contingente.

Contingente é o que poderia ter sido de outra forma num Universo diferente ou que poderia
ter sido diferente se Deus nunca tivesse realmente criado um Universo, mas simplesmente
permanecido sozinho. A Bíblia indica que Deus é autossuficiente. Ele nã o precisa do
Universo. Nã o lhe era necessário criar alguma coisa fora de si mesmo. E, tendo decidido
criar um Universo, coube a ele decidir que tipo de Universo criaria. Assim, os detalhes deste
Universo — o fato de que tem maçã s, cavalos e nã o unicó rnios — sã o um produto da sua
livre decisã o. Eles poderiam ter sido de outra forma.

A Bíblia indica que Deus tinha um plano antes mesmo de começar a criar e que seu plano
para o Universo e para a histó ria era abrangente:
 
… predestinados segundo o propósito daquele que faz todas as coisas conforme o conselho da sua
vontade . (Ef 1.11)
 
… assim como nos escolheu, nele, antes da fundação do mundo , para sermos santos e irrepreensíveis
perante ele. (v. 4)

Visto ter Deus planejado algo, é necessário que isso aconteça. Mas essa “necessidade”
subordinada deriva de dois tipos de fontes: (1) a fidelidade de Deus, que é um aspecto do
seu cará ter eterno, e (2) o plano de Deus, que poderia ter sido diferente. Assim, esse tipo de
“necessidade” nã o está no mesmo nível das necessidades do cará ter de Deus. O cará ter de
Deus nã o poderia ser diferente do que é. Mas seu plano poderia ter sido diferente, se Deus
assim escolhesse. Os teó logos há muito têm distinguido entre um conhecimento necessário ,
que Deus tem do seu cará ter, e um conhecimento livre , que tem do seu plano e dos fatos
contingentes sobre o mundo. Em ambos os casos, Deus é o Deus absoluto.

Necessidade e contingência em relação à matemática

Quais sã o as implicaçõ es para as verdades da matemá tica? Algumas verdades da


matemá tica, ou talvez todas as verdades da matemá tica, podem ser necessá rias em um
sentido absoluto porque sã o implicaçõ es do cará ter e da autoconsistência de Deus. Mas
também devemos considerar se algumas ou todas as verdades da matemá tica podem ser
contingentes no sentido de serem um produto do plano que Deus livremente escolheu para
a criaçã o e para o desenvolvimento do mundo por ele criado.
Como observamos, a intuiçã o da maioria das pessoas tende a colocar as verdades
matemá ticas ao lado da necessidade. Mas devemos ter cuidado, pois nossas mentes nã o sã o
os senhores do mundo. Deus é o Senhor. Nossa mente é derivada. Deus fez nossa mente
para que estejamos naturalmente em sintonia com o mundo que ele criou. Mas ele poderia
ter criado um mundo muito diferente do nosso. É possível, entã o, que as verdades
matemá ticas só nos pareçam necessá rias porque estamos adaptados a um mundo em que
as verdades sã o vá lidas? É possível que Deus em seu plano tenha especificado as verdades
matemá ticas como sendo verdades contingentes sobre o nosso mundo? Poderia algum
outro mundo ter verdades diferentes? E se Deus nã o tivesse criado nenhum mundo? As
verdades matemá ticas ainda seriam vá lidas? Ou Deus só trouxe essas verdades à existência,
por assim dizer, quando planejou criar um mundo?

Conhecendo Deus

Essas questõ es sã o interessantes. Mas devemos ter cuidado ao tentar respondê-las.


Precisamos reconhecer nossas limitaçõ es como criaturas. O quadrado de Frame sobre
transcendência e imanência é relevante. Por um lado, quando usamos uma visã o cristã de
transcendência, nã o devemos presumir que podemos ditar para Deus o que é e o que nã o é
possível para ele. Como criaturas, nã o podemos ver as profundezas de Deus para saber as
exatas implicaçõ es de sua autoconsistência. Nã o podemos simplesmente nos contentar com
um nível superficial de raciocínio, no qual dizemos: “Bem, as verdades matemá ticas me
parecem necessá rias, entã o também devem ser necessá rias para Deus”. Esse tipo de
raciocínio ronda o perigo do canto 4. O canto 4 diz que usamos nossa pró pria mente como o
padrã o final para o que pode ser o caso, em vez de reconhecer que devemos nos submeter
receptivamente à superioridade de Deus (canto 1).

Segundo a visã o cristã de imanência, Deus se fez conhecido. Podemos estar confiantes com
base no que ele nos tem revelado. Entã o, podemos raciocinar sobre o status da verdade
matemá tica. Podemos observar que Deus nos revelou seu cará ter trinitá rio. Ele é um Deus
em três pessoas: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Quando dizemos “um Deus”, usamos o
nú mero um; quando dizemos “três pessoas”, usamos o nú mero três. Falamos sobre a
verdade na linguagem que Deus nos tem dado. Essa linguagem nos permite falar sobre
Deus e sobre o mundo. Deus a projetou de modo a estar adaptada ao mundo.

Assim, as pessoas poderiam ser tentadas a argumentar que as palavras um e três e seus
significados pertencem exclusivamente a este mundo, nã o se aplicando realmente a Deus.
“Deus”, argumentariam elas, “é inacessível à linguagem. Deus nã o é realmente um ou três”.
Mas agora as pessoas que falam dessa maneira fizeram uma transiçã o para o canto 3 no
quadrado de Frame. Elas dizem que Deus é incognoscível. Sua posiçã o nã o respeita o fato
de que Deus se revelou. Ele revela quem realmente é, nã o como algo falso ou substituto.
Caso contrá rio, seríamos todos idó latras, pois estaríamos adorando o que é falso em vez do
Deus verdadeiro. Se voltarmos ao canto 2, a visã o cristã de imanência, teremos de afirmar
que Deus disse ser um Deus em três pessoas. O fato de ser um Deus e o de ser três pessoas
sã o eternamente verdadeiros. Eles nã o se “tornaram” verdadeiros simplesmente porque
Deus decidiu criar um mundo e decidiu se revelar à s criaturas no mundo. Nó s realmente
conhecemos Deus. Ele realmente é um Deus. Realmente existem três pessoas, e essas três
existem eternamente. Essa verdade nos é misteriosa, pois nunca podemos compreender ou
saber exaustivamente o significado da Trindade. Mas cremos que o que Deus diz é verdade.
E estamos certos em fazê-lo. Essas coisas sobre Deus sã o eternamente verdadeiras, muito
embora nó s como criaturas só passemos a conhecê-las no decorrer do tempo e no decorrer
de nossa experiência de comunhã o com Deus.

Precisamos nos esforçar para continuar do lado esquerdo do quadrado. Nem sempre é fá cil
discernir quando começamos a oscilar para o lado direito ou quando contemporizamos
com o lado direito. É particularmente um desafio quando fazemos perguntas profundas
sobre o que é necessá rio e o que nã o é. [42]

Nã o conhecemos Deus da mesma maneira que Deus se conhece. O conhecimento de Deus é


infinitamente profundo. Deus conhece sua pró pria unidade como um só Deus de uma
maneira diferente da nossa. Ele conhece seu pró prio cará ter trinitá rio e a distinçã o de cada
pessoa da Trindade em sua pró pria maneira ú nica como Deus. As diferenças resultam da
transcendência de Deus.

Ao mesmo tempo, Deus é um Deus. A unicidade de Deus existe antes mesmo de ter havido
um mundo de criaturas que pudessem entender por si mesmas a ideia de unicidade. Da
mesma forma, Deus é três pessoas. A “trinidade” das três pessoas existe antes mesmo de
ter havido um mundo de criaturas.

Como observamos (Capítulo 2), a natureza de Deus fornece a instâ ncia original do um e dos
muitos. Ele é o arquétipo . É o padrã o original. Quando ele cria um mundo, cria de acordo
com o seu cará ter e pelo poder do seu discurso, sua Palavra. Unidade, triunidade e todas as
demais propriedades numéricas que encontramos no mundo sã o o produto do seu
discurso. Mas isso nã o implica que todos os aspectos das propriedades numéricas que
vemos sã o meramente contingentes . As propriedades numéricas têm aspectos
contingentes, no sentido de que sã o propriedades que se aplicam a casos no mundo, como
quatro maçã s e quatro pêssegos. Mas sã o ao mesmo tempo expressõ es do cará ter sá bio e
fiel de Deus. Elas também expressam a autoconsistência de Deus. A fidelidade, sabedoria e
consistência de Deus sã o necessá rias porque sã o aspectos do seu cará ter.

Nã o é necessá rio que a verdade 2 + 2 = 4 seja exemplificada num caso específico de quatro
maçã s. Mas é necessá rio, se há quatro maçã s distintas, que elas se conformem à
autoconsistência de Deus.

Parece-me que os nú meros um e três têm um papel ú nico no pró prio Deus. Também
podemos dizer que há duas outras pessoas além de Deus o Pai, e assim temos uma
manifestaçã o do nú mero dois também. Nã o temos o mesmo para o nú mero quatro ou para
nú meros maiores. Deus nã o precisa de mais de três pessoas para ser ele mesmo.
Podemos ir além desse ponto? Como de praxe, devemos ser cautelosos. Mas podemos dizer
que Deus conhece todas as possibilidades de mundos que ele poderia criar? Conheceria ele
todas essas possibilidades, ainda que tivesse decidido nunca criar um mundo, mas apenas
permanecer “sozinho”? Cautelosamente, com a voz de uma criatura, acho que sim. Caso
sim, o conhecimento de Deus incluiria o conhecimento do nú mero de criaturas que haveria
em qualquer mundo que ele decidisse criar? Acho que sim.

Se cautelosamente incluirmos em nosso cá lculo o conhecimento de Deus das


possibilidades, aparentemente podemos concluir que os nú meros existem eternamente.
Ora, o filó sofo grego Platã o pensava que conceitos abstratos, como o conceito do bem ou do
belo, existiam eternamente, independentemente de Deus. Por analogia, um imitador de
Platã o poderia postular que os nú meros como conceitos abstratos existem eternamente
como abstraçõ es, independentemente de Deus. Mas nossa visã o do cará ter absoluto de
Deus leva a outra visã o: os nú meros existem nã o como abstraçõ es platô nicas, mas como um
aspecto do conhecimento de Deus. E, por causa do princípio do um e dos muitos, podemos
dizer que eles nã o existem na mente de Deus como unidades puras, totalmente desligadas
de uma pluralidade de possíveis representaçõ es. Ao contrá rio, gozam de um
relacionamento com a pluralidade de criaturas em mundos que Deus poderia escolher
criar.

Mas ainda podemos perguntar se os nú meros teriam de ser os mesmos em todos os


mundos que Deus poderia escolher criar. O nú mero quatro tem uma representaçã o em
quatro maçã s neste mundo. Ele nã o teria a mesma representaçã o num mundo em que as
maçã s nã o existissem. O um e os muitos se entrelaçam. Assim também, o nú mero quatro se
entrelaça com suas possíveis representaçõ es neste mundo e em outros mundos possíveis.
Logo, há complexidade assim como unidade.

Admitida essa complexidade na unidade, podemos seguir adiante e perguntar se as leis da


aritmética, como 2 + 2 = 4, poderiam realmente ser diferentes em outro Universo. Poderia
Deus criar um Universo em que 2 + 2 = 5? Minha pró pria intuiçã o sugere que nã o. Mas,
claro, sou uma criatura; minha intuiçã o nã o é infalível. Se 2 + 2 = 4 é verdade em qualquer
Universo que Deus possa criar, isso nã o restringe a onipotência de Deus? Vamos lembrar o
significado de onipotência. Deus nã o pode fazer nada que seja inconsistente com o seu
cará ter. A questã o bá sica é se a consistência do cará ter de Deus implica que 2 + 2 = 4 é
verdade em qualquer Universo que ele poderia escolher criar. Vamos abordar essa questã o
somente depois de pensar mais sobre o significado dos nú meros em nosso Universo.

Isso importa?

Será que importa se os nú meros sã o eternos ou se sã o necessá rios ou contingentes? Nossas


reflexõ es neste capítulo ainda nos deixam com mistérios. Como criaturas, nã o podemos
compreender o cará ter trinitá rio de Deus. Nã o superestimemos nossas capacidades. E nã o
suponhamos que precisamos saber mais do que Deus nos fez saber e nos capacita saber.
Para a maioria dos propó sitos, basta entender que toda verdade vem de Deus, incluindo as
verdades sobre os nú meros, e que os pró prios nú meros estã o entre as dá divas que Deus
nos deu. Eles nã o sã o platonicamente independentes de Deus.

Além disso, precisamos ter certeza de que preservamos nosso entendimento da realidade
do cará ter trinitá rio de Deus. Deus é um Deus em três pessoas. As palavras um e três têm
significado quando falamos sobre Deus. Nã o devemos pensar que temos de viajar além dos
significados numéricos para descrever corretamente Deus. Nã o devemos cair em um tipo
de pensamento no qual tratamos Deus como distante e desconhecido (canto 3 do quadrado
de Frame). Por outro lado, devemos também afirmar que Deus nã o é um e três exatamente
da mesma forma que uma maçã e três maçã s. Deus é Deus e é ú nico. Nada na criaçã o nos dá
um modelo exato. Essas observaçõ es mantêm a verdade da transcendência de Deus (canto
1 do quadrado de Frame). Se pensá ssemos ter um modelo exato, estaríamos usando o
modelo para tentar conformar Deus ao nosso modo de pensar como o padrã o. Estaríamos
seguindo o padrã o da imanência nã o cristã do canto 4.

Se entendermos essas verdades, nã o precisaremos considerar os mistérios remanescentes


uma ameaça à nossa capacidade de servir a Deus.

1
 
 
 
 
 
 
 
Parte 3 — ESTRUTURAS MATEMÁTICAS SIMPLES
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

 
 
 
7. Adição
 
 

Podemos agora começar a considerar brevemente algumas das á reas específicas que fazem
parte da matemá tica. Queremos crescer glorificando e louvando a Deus nessas á reas. Uma
das á reas é a aritmética. As crianças aprendem a adicionar, subtrair, multiplicar e dividir.
Elas começam com nú meros inteiros. Mais tarde aprendem a adicionar e subtrair com
fraçõ es e decimais. O que Deus tem a ver com aprender adiçã o?
 
A aprendizagem infantil em relacionamentos
 
Como indicamos, as crianças aprendem através da interaçã o com o mundo e através da
interaçã o social com outras pessoas, especialmente professores. Assim, há uma dimensã o
social complexa em seus conhecimentos, e isso inclui seu conhecimento da adiçã o.

Algumas crianças podem aprender adiçã o por rotina. Elas memorizam a tá bua de adiçã o.
Entã o praticam, aplicando a problemas o que aprenderam:
 
Professor: 2 + 2 = ?  Criança: 4.
Professor: 2 + 1 = ?  Criança: 3.
Professor: 3 + 4 = ?  Criança: 6.  Professor: nã o, 7.  Criança: 3 + 4 = 7.
 
Mas uma criança que aprende apenas por rotina pode nã o saber nada sobre o significado de
2 ou 3 ou sobre as relaçõ es dos nú meros e da adiçã o com o mundo maior. Neste caso, a
criança nã o verá como aplicar em casos prá ticos o que aprende, como comprar maçã s no
supermercado. Aprender a tá bua de adiçã o isoladamente de tudo o mais é uma pedagogia
pobre. E torna o aprendizado mais difícil para a criança, porque ela nã o vê qual é o ponto.

Portanto, as crianças devem aprender no contexto da vida. Se assim ocorre, elas estã o
aprendendo no contexto do mundo de Deus. Estã o continuamente se fiando na coerência
do mundo que Deus estabeleceu. Estã o vendo a riqueza que Deus tem planejado em sua
sabedoria e lhes dado em sua generosidade. Como observamos no Capítulo 4, as verdades
sobre os nú meros têm mú ltiplas relaçõ es com muitas á reas de estudo. As crianças
aprendem pelo menos um pouco sobre essa grande variedade de relaçõ es e absorvem uma
boa parcela sem isso lhes ser explicitamente dito. Deus ordenou todas essas relaçõ es. Sua
sabedoria e sua generosidade sã o expressas nos nú meros. E sã o expressas nas verdades
relacionadas aos nú meros. A verdade de que 2 + 2 = 4, e cada uma das verdades que a
criança aprende, sã o verdades de Deus. Como temos observado (Capítulo 1), toda verdade
revela a onipresença, eternidade, imutabilidade, onipotência e beleza de Deus.

As crianças também estã o aprendendo no contexto do mundo. O professor lhes mostra os


exemplos de duas maçã s mais duas maçã s fazendo quatro maçã s.

As crianças absorvem a verdade usando as relaçõ es entre uma verdade, 2 + 2 = 4, e os


muitos exemplos (com maçã s). As crianças aprendem no contexto da sua pró pria
experiência subjetiva. Sã o elas que têm a experiência de “ver o ponto” ou talvez de
continuamente se debater quando nã o o viram. Podemos ver que as perspectivas
normativa, situacional e existencial sã o pertinentes. A criança aprende verdades
normativas (2 + 2 = 4) no contexto de exemplos na situaçã o (maçã s) e no contexto de sua
pró pria experiência subjetiva (exemplificando a perspectiva existencial).

Todos nó s que aprendemos aritmética aprendemos dessa maneira. Mas a aritmética


elementar se tornou uma “segunda natureza” para a maioria de nó s. Provavelmente
esquecemos os detalhes de como a aprendemos.

A maneira mais fá cil de entender a adiçã o é se concentrar antes de tudo nos objetos do
mundo e nos agrupamentos desses objetos. O professor mostra à criança dois grupos de
duas maçã s cada, ou dois grupos de dois lá pis cada.

Sabemos a partir da Bíblia que Deus criou o mundo para que haja maçã s distintas e lá pis
distintos e para que possamos agrupá -los. Sabemos que sua palavra especifica todas as
verdades sobre a aritmética e sobre as relaçõ es dessas verdades com os muitos aspectos do
mundo. Mas podemos dizer mais?

Recriação
Há muitas perspectivas que poderíamos usar para aprofundar nossa compreensã o. Eu
enfoco primeiro a recriaçã o. No princípio Deus criou o mundo, conforme descrito em
[43]

Gênesis 1. Adã o falhou em sua tarefa. Cristo veio como o Ú ltimo Adã o (1Co 15.45). Por sua
morte e ressurreiçã o, ele redimiu uma nova humanidade. Aqueles que confiam nele sã o
salvos da corrupçã o e morte que Adã o trouxe ao mundo. Eles vislumbram a ressurreiçã o
corporal dos mortos e a entrada no novo céu e na nova terra que Deus criará depois da
volta de Cristo (Ap 21.1).

O tabernáculo e o templo

Quando Cristo encarnou, “o Verbo se fez carne e habitou entre nó s, cheio de graça e de
verdade, e vimos a sua gló ria, gló ria como do unigênito do Pai” (Jo 1.14). As expressõ es da
habitaçã o e gló ria apontam para o taberná culo de Moisés (Ê x 25-40) e o templo de Salomã o
(1Rs 5-8). Essas duas estruturas eram habitaçõ es simbó licas de Deus que antecipavam a
habitaçã o final de Deus com o homem, que se daria em Cristo. Joã o 2.21 (NVI) confirma a
relaçã o entre o templo e Cristo ao dizer: “Mas o templo do qual ele falava era o seu [Cristo]
corpo ”.

A vinda de Cristo inaugurou uma recriaçã o redentora. Ele curou o cego e o coxo em
antecipaçã o à cura final do corpo, a qual será realizada no novo céu e nova terra e no novo
corpo de ressurreiçã o que os crentes receberã o no futuro, quando Cristo retornar (1Co
15.44-49).

O taberná culo do Novo Testamento e o templo de Salomã o prefiguram essas realidades.


Eles apontam para Cristo como o templo. Mas também antecipam o cará ter de “templo” da
Jerusalém celestial em Apocalipse 21: “Nã o vi templo algum na cidade [Jerusalém], pois o
Senhor Deus todo-poderoso e o Cordeiro sã o o seu templo” (v. 22, NVI). O taberná culo de
Moisés e o templo de Salomã o, portanto, têm um simbolismo que tem afinidades com a
criaçã o como um todo e em particular com o céu, como a habitaçã o de Deus. O candelabro
no taberná culo corresponde à s luzes do céu. O pã o na mesa para o pã o da presença
corresponde ao maná que vem do céu. A arca corresponde ao trono de Deus no céu, e os
querubins na arca correspondem aos querubins que cercam o trono de Deus no céu. [44]

Em suma, o taberná culo e o templo refletem a presença de Deus no céu. Deus instrui
Moisés: “Segundo tudo o que eu te mostrar para modelo do taberná culo e para modelo de
todos os seus mó veis, assim mesmo o fareis” (Ê x 25.9). Moisés recebe o padrã o no Monte
Sinai, onde Deus desce do céu. É um padrã o celestial. E é explicitamente um padrã o para
fazer “um santuá rio, para que eu possa habitar no meio deles” (v. 8). Salomã o em 1 Reis faz
do templo uma habitaçã o simbó lica para Deus, mas em sua oraçã o de dedicaçã o reconhece
que o céu, num sentido mais ú ltimo, é a morada de Deus: “Ouve dos céus, lugar da tua
habitação , e, quando ouvires, dá -lhes o teu perdã o” (1Rs 8.30, NVI). “Mas, de fato, habitaria
Deus na terra? Eis que os céus e até o céu dos céus nã o te podem conter, quanto menos esta
casa que eu edifiquei” (v. 27).
Essas estruturas têm importâ ncia para a matemá tica porque exibem relaçõ es matemá ticas
simples. No taberná culo, o Santo dos Santos tem a forma de um cubo perfeito, 10 × 10 ×
[45]

10 cô vados. O Santo Lugar tem 10 × 10 × 20 cô vados. Alguns dos mó veis também têm
proporcionalidades simples e harmoniosas em suas dimensõ es.

As proporcionalidades simples pertencem à casa pequena, que é uma imagem do céu e na


verdade de todo o Universo, como a casa grande cheia da presença de Deus (Jr 23.24;
compare com 1Rs 8.27). O fato de que a casa pequena é uma có pia ou imagem da casa
grande sugere que a casa grande também pode exibir proporcionalidades harmoniosas. E,
de fato, é o que acaba sendo verdade, como atesta o cará ter matemá tico das leis físicas
bá sicas.

Todas essas estruturas derivam de Deus. Sua beleza reflete a beleza de Deus. Suas
harmonias refletem a harmonia de Deus. Isso vale para o taberná culo e para o Universo,
como a casa em grande escala. O simbolismo pictó rico no taberná culo confirma o que
inferimos do ensino explícito da Bíblia, isto é, que os nú meros em nossa mente e os
nú meros no mundo refletem a ordem numérica que Deus especificou normativamente pelo
seu discurso. Em outras palavras, os nú meros derivam de Deus.

Imagiologia

De que forma os nú meros derivam de Deus? Mais uma vez, muitas perspectivas sã o
possíveis. Mas podemos olhar para a questã o pelas lentes fornecidas pelo tema da
imagiologia. O taberná culo é uma imagem da morada de Deus no céu. Dentro do
taberná culo, o Santo dos Santos é a imagem mais direta e intensa da presença de Deus. Nele
estã o (1) a arca, o objeto mais sagrado do mobiliá rio, (2) os querubins, que oferecem uma
imagem dos querubins que estã o na presença de Deus no céu, e (3) os Dez Mandamentos, o
discurso que Deus fez do céu, depositados dentro da arca (Ê x 25.16). O Santo Lugar é uma
imagem menos intensa. Aos sacerdotes é permitido entrar nele todos os dias, enquanto no
Santo dos Santos só pode entrar o sumo sacerdote, uma vez por ano. De certa forma, o
Santo Lugar é como a imagem de uma imagem: ele “faz imagem” do Santo dos Santos, por
ter as mesmas dimensõ es em largura e altura (10 cô vados) e ter a exata proporçã o em
comprimento: 20 cô vados, comparado aos 10 cô vados de comprimento do Santo dos
Santos. Assim como o Santo dos Santos é uma espécie de reflexo dinamicamente construído
e extensã o do céu, o Santo Lugar é uma espécie de extensã o dinâ mica do Santo dos Santos.
Ele tem uma santidade derivada, derivada porque adjacente à santidade maior do Santo
dos Santos.

20 cô vados sã o 10 mais 10. O taberná culo como um todo, composto de dois á trios juntos,
tem 30 cô vados de comprimento, ou 20 + 10 cô vados. Vemos relaçõ es aritméticas simples.
Essas relaçõ es incluem a relaçã o de adiçã o. O Santo Lugar é uma espécie de “adiçã o” ao
Santo dos Santos, e as dimensõ es se somam de maneira simples.
Esse exemplo é um exemplo-chave, pois o taberná culo é uma imagem para todo o Universo
como uma casa em grande escala. Pelo desígnio de Deus, as relaçõ es aritméticas sustentam
o taberná culo. Pode-se igualmente esperar que sustentem o Universo como um todo. As
relaçõ es de 20 cô vados = 10 + 10 cô vados e 30 cô vados de comprimento de 20 cô vados +
10 cô vados sã o exemplos-chave específicos. Ao generalizar a partir desses exemplos,
confirmamos que, pelo desígnio de Deus, as verdades aritméticas sustentam todo o
Universo.

De onde vieram todas essas harmonias projetadas? Elas vieram de Deus. Sã o “imagens”, no
sentido amplo do termo, da morada de Deus no céu. Sabemos do ensino do Novo
Testamento que a morada definitiva de Deus nã o é simplesmente sua morada no céu, mas
sua morada em Cristo: “porquanto, nele [em Cristo], habita, corporalmente, toda a
plenitude da Divindade ” (Cl 2.9).

Origens na Trindade

A palavra corporalmente mostra que o versículo em Colossenses está enfocando Cristo


como o redentor encarnado. Mas seu papel como redentor encarnado pressupõ e sua
divindade e, portanto, sua eternidade como o Verbo que era no princípio (Jo 1.1). Ele
sempre esteve com Deus. Essa eterna presença com Deus assume a forma da habitaçã o.
Jesus fala do fato de que o Pai está “nele” e ele está “no” Pai (17.21). Essa mú tua habitaçã o é
o arquétipo para a morada que o Pai e o Filho farã o nos crentes: “Se alguém me ama,
guardará a minha palavra; e meu Pai o amará , e viremos para ele e faremos nele morada ”
(14.23). Essa morada de Deus no homem acontece através do Espírito Santo: “vó s o
conheceis [o Espírito Santo], porque ele habita convosco e estará em vó s (v. 17).

Essas descriçõ es de habitaçã o vêm no contexto da redençã o. Mas quando Deus age para nos
redimir, age em harmonia com quem ele realmente é, e se revela a nó s de acordo com quem
ele é. Assim, as descriçõ es redentoras indicam nã o só que Deus existe em três pessoas, mas
também que as três pessoas habitam umas nas outras. Os teó logos deram um nome para
essa habitaçã o: coinerência .

Portanto, a coinerência de pessoas em Deus é o arquétipo da habitaçã o de Deus no céu e


entã o do taberná culo e o templo. O taberná culo é uma imagem do arquétipo.

A origem da imagiologia também é encontrada em Deus. O Filho, a segunda pessoa da


Trindade, é chamado de “a imagem de Deus” (2Co 4.4), “a imagem do Deus invisível” (Cl
1.15) e “o resplendor da gló ria de Deus e a expressã o exata do seu ser” (Hb 1.3, NVI). O
Filho, sendo a imagem original, é o arquétipo do padrã o quando Deus diz: “Façamos o
homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança” (Gn 1.26). O homem é um
subordinado ou imagem derivada, uma imagem de uma imagem. Esse padrã o é parecido
com o taberná culo, que é a imagem da habitaçã o de Deus no céu, que por sua vez é uma
imagem da habitaçã o de Deus em si mesmo na coinerência das pessoas da Trindade.
De fato, a linguagem de filiaçã o está intimamente relacionada à imagiologia. Quando Adã o
gera seu filho Sete, é dito que “gerou um filho à sua semelhança, conforme a sua imagem, e
lhe chamou Sete” (Gn 5.3). Sete indubitavelmente se parecia um pouco com seu pai, como
acontece com a maioria dos filhos, e era como ele de outras maneiras também. Essa
semelhança é um aspecto de ser um filho para um pai. Por quê? Esse padrã o de filiaçã o na
Terra faz imitaçã o (imagiologia!) do padrã o da filiaçã o eterna em Deus. A filiaçã o que o
Filho goza em relaçã o ao Pai inclui o Filho sendo a imagem do Pai. Quando criou o homem
na Terra, Deus pretendia que a relaçã o humana entre o pai e o filho fosse uma imagem da
relaçã o eterna entre Deus o Pai e Deus o Filho.

A relaçã o pai-filho na Terra é dinâ mica. Adã o gerou [“fathered”] um filho, Sete. Na
linguagem antiquada da versã o bíblica King James , ele gerou [“begat”] um filho. Essa [46]

linguagem se aplica a Deus o Pai em relaçã o ao Filho. Em Atos, a linguagem de “gerar” se


aplica ao fato de que o Pai ressuscitou o Filho dos mortos:
 
Nó s vos anunciamos o evangelho da promessa feita a nossos pais [patriarcas de Israel], como Deus a
cumpriu plenamente a nó s, seus filhos, ressuscitando a Jesus, como também está escrito no Salmo
segundo: Tu és meu Filho, eu, hoje, te gerei . (At 13.32-33)
 

A relaçã o de Deus o Pai com o Filho também foi manifestada num momento anterior,
quando Jesus encarnou:
 
Respondeu-lhe o anjo: Descerá sobre ti [Maria] o Espírito Santo, e o poder do Altíssimo te envolverá
com a sua sombra; por isso, também o ente santo que há de nascer será chamado Filho de Deus. (Lc
1.35)
 

Como já vimos, o que Deus realiza de forma redentora expressa o que ele é em seu cará ter.
Assim, os teó logos têm falado da geração eterna do Filho. A concepçã o de Jesus no ventre
de Maria ocorreu no tempo. Mas expressa no tempo uma relaçã o eterna, que nã o podemos
compreender, mas que sabemos estar de acordo com o que aconteceu no tempo quando o
Filho encarnou. O Pai gera eternamente o Filho, expressando uma relaçã o eterna entre as
duas pessoas. O Espírito Santo está presente, em coinerência, assim como estava presente
ao “descer sobre” Maria.

A geraçã o eterna do Filho também é a imagiologia eterna, em que o Pai gera o Filho como
sua imagem exata. Essa imagiologia é o arquétipo, enquanto outras ocorrências de
imagiologia sã o éctipos.

Essa realidade sobre Deus é relevante porque traça as origens da adiçã o. Um exemplo
importante de adiçã o é encontrado no taberná culo e em seus á trios. Um á trio, o Santo
Lugar, é uma adiçã o ao á trio original, o Santo dos Santos, através da imagiologia. O original
desse padrã o é encontrado na imagiologia da Trindade, que também está gerando.
Devemos aqui ter o cuidado de destacar a unicidade de Deus. Deus é o Criador, e nó s somos
criaturas. Nã o há nada como Deus. Ele é ú nico. A geraçã o e imagiologia em Deus sã o,
portanto, ú nicas. Mas é precisamente em sua unicidade, sua unicidade gloriosa, que Deus é
o arquétipo para padrõ es criados, derivados. Precisamente porque é Deus, ele pode criar
um mundo distinto de si mesmo, que reflete ou faz imagem de quem ele é. A adiçã o, no
nível de nossa concepçã o terrena, existe porque antes de tudo e fundamentalmente o Pai
gera o Filho na presença do Espírito Santo e no amor do Espírito Santo. O Filho é distinto do
Pai, nã o igual. Eles sã o duas pessoas.

É precisamente de acordo com o seu cará ter, entã o, que Deus cria um mundo em que pode
haver a adiçã o de um á trio externo do taberná culo a um á trio interno. E nó s, como
criaturas, podemos refletir sobre adicionar um á trio a outro ou uma medida a outra. 10
cô vados mais 10 cô vados equivalem a 20 cô vados .

1
 

8. A ideia do que vem a seguir


 
 

Como vimos, o padrã o para a imagiologia começa na Trindade, na medida em que o Filho é
a imagem exata do Pai. O padrã o poderia ter começado e terminado aí, porque Deus nã o
precisava ter criado um mundo. Mas ele o criou. Neste mundo ele fez mais imagens de si.
Existem mú ltiplas imagens. A imagem mais marcante é Adã o, feito “à imagem de Deus”.
Adã o gerou um filho, Sete, à sua imagem:
 
Viveu Adã o cento e trinta anos, e gerou um filho à sua semelhança , conforme a sua imagem , e lhe
chamou Sete (Gn 5.3).
 

Sete gerou Enos (v. 6), que podemos inferir ter sido feito à imagem de Deus e também à
imagem de Sete. Enos gerou Cainã (v. 9). E a linhagem continuou.

Também podemos ver um segundo tipo de processo imagioló gico com o taberná culo. O
Santo dos Santos é uma imagem do céu. O Santo Lugar é uma imagem do céu e do Santo dos
Santos. O á trio do taberná culo, cercando o taberná culo, também é um espaço sagrado, e
assim um tipo de imagem do Santo Lugar. Israel e Palestina e a terra santa sã o imagens do
taberná culo e seu á trio. E Israel deveria ser um modelo para as naçõ es, se servissem a Deus
como deveriam (Dt 4.6-8). É claro que imagens podem engendrar mais imagens. Toda a
raça humana veio à existência por um processo de geraçã o repetida, começando com Adã o.

 
Variedades de sucessão

Todos esses casos usam a ideia de “o que vem a seguir”. Sete, o filho de Adã o, é o pró ximo
depois de Adã o, e o filho de Sete é o pró ximo depois dele. O processo de imagiologia, ao
engendrar uma coisa a seguir, se torna uma fonte para aumentar repetidamente o nú mero
de coisas — o nú mero de seres humanos, num caso, e o nú mero de objetos sagrados, em
outro.

Essa ideia é claramente uma das ideias presentes quando vemos os nú meros como uma
sequência. Cada nú mero tem um pró ximo depois dele: 2 depois de 1, 3 depois de 2, 4
depois de 3, e assim por diante.

Deus exerceu criatividade ao fazer um mundo quando ele nã o lhe era uma necessidade.
Sete teve um filho, embora pudesse nã o o ter. Esses casos sã o aná logos ao caso dos
nú meros, e podemos ver os nú meros (a partir de uma das muitas perspectivas possíveis)
como a resumir um padrã o de imagiologia ou engendramento. Em sua sequência, os
nú meros representam o padrã o “do que vem a seguir” na forma de um padrã o
generalizado.

Por causa da criatividade envolvida, as sequências de engendramento podem ser de vá rios


tipos. O engendramento poderia parar apó s a primeira replicaçã o: A para B . Ou poderia
parar apó s quatro replicaçõ es: A para B para C para D para E . Ou um está gio poderia gerar
vá rios está gios posteriores: A poderia produzir B , B , B e B . Um desses elementos do
1 2 3 4

segundo está gio B , digamos B , produziria entã o C , C e C . C produz D , e assim por


1 1 2 3 2 1

diante. O processo como um todo produz um padrã o de á rvore genealó gica que vai de um
pai para todos os seus descendentes. (Veja o diagrama 8.1.)
 
Entre essas possíveis escolhas criativas, podemos escolher aquela simples, em que cada
item, uma vez produzido, imita a produçã o anterior ao produzir mais um item. Entã o
obtemos uma linha de itens:
 

Se imaginarmos a linha prosseguindo indefinidamente, teremos representado os nú meros


naturais como uma linha:

Se imaginarmos algo incomum, como voltar em algum momento para o primeiro item A ,
obtemos um modelo que pode ser o ponto de partida para o que tem sido chamado de
“aritmética do reló gio” ou “aritmética modular”. (Veja o diagrama 8.2.)
 
 

Algumas pessoas poderiam nã o querer chamar o sistema de horas de “aritmética” do


reló gio, uma vez que difere da aritmética que nos é familiar. Mas a expressã o “aritmética do
reló gio” explica intuitivamente o que está acontecendo. Num reló gio de 12 horas, depois
que chegamos à s 12 horas podemos adicionar mais uma hora e voltar para 1 hora. 12 “+” 1
= 1, quando estamos nos movendo em um reló gio. Na expressã o 12 “+” 1 = 1, coloquei o
sinal de mais + entre aspas para nos lembrarmos de que esse símbolo de “mais” nã o tem
exatamente o mesmo significado que na aritmética comum. Mas existem algumas
semelhanças fascinantes com a aritmética comum, se escolhemos estudar como adicionar e
subtrair nos reló gios.
 

Números naturais

A maneira mais simples de proceder com o que vem a seguir é ter uma pró xima coisa que
seja nova. Nó s podemos sempre parar e entã o ter uma lista de nú meros, terminando com o
ú ltimo, digamos 6. Esta lista corresponde a uma lista de 6 maçã s ou 6 coisas distintas. Se
estamos pensando em termos de nú meros, em vez de objetos específicos como maçã s,
estamos generalizando. Esse tipo de generalizaçã o, como já vimos, é um aspecto do
significado de 6. Mas agora estamos amarrando seu significado no processo de
engendramento ou imagiologia. Esse é outro aspecto do seu significado. (Deus ordena
todos os aspectos; nã o precisamos reduzi-los todos a apenas um.)

Em vez de parar em 6, podemos nos imaginar avançando indefinidamente. Já obtivemos


alguma vez a lista completa de nú meros inteiros? Nunca. Somos finitos, e assim cansamos
ou ficamos sem tempo. Mas devemos notar que temos a capacidade, como pessoas feitas à
imagem de Deus, de exercer um tipo de versã o em miniatura da transcendência. [47]

Podemos nos afastar do que temos feito e olhar de cima nossas açõ es anteriores,
considerando-as como um todo. Ao nos afastar, imaginamos como seria ter uma visã o de
Deus daquilo em que estivemos envolvidos. Continuamos finitos, mas ainda assim
imitamos Deus. Podemos imaginar, de algumas maneiras, o que significa Deus transcender
o mundo, porque podemos em forma miniaturizada “transcender” nosso entorno e nossa
tarefa imediata. Temos essa dá diva de Deus. Nó s o estamos imitando, embora no nível em
que permanecemos criaturas.

Entã o, quando nos afastamos do processo de criar uma sucessã o de nú meros, podemos ver
por nossa transcendência em miniatura que poderíamos continuar indefinidamente.
Poderíamos continuar para sempre . Nã o podemos literalmente continuar para sempre
nesta vida, mas podemos imaginar uma repetiçã o indefinida do processo de
engendramento. Podemos fazer isso porque somos feitos à imagem de Deus. Através dessa
imaginaçã o, podemos entender o que significa ser um nú mero natural ou um nú mero
inteiro. Os matemá ticos usam a expressã o número natural para descrever qualquer nú mero
na sequência que imaginamos produzir, começando com 1 e continuando indefinidamente.

Os pensamentos de Deus

Nossa ideia da sequência de nú meros nã o é independente de Deus. Estamos tentando


pensar os pensamentos de Deus depois dele, analogicamente. Deus é o pensador original.
Nossos pensamentos nunca o surpreendem. Ele já os pensou. Ele sabe o fim desde o
princípio (Is 46.10).

Podemos inferir, entã o, que Deus conhece os nú meros naturais. Ele sabe todos eles, antes
mesmo de criar a humanidade. Ele revela seus pensamentos a nó s enquanto estudamos os
nú meros. [48]
Podemos agora voltar à questã o dos nú meros dentro de outros universos que Deus poderia
criar. Poderia o sistema de nú meros naturais e o sistema de adiçã o em relaçã o aos nú meros
naturais ser diferente em outro mundo? Vimos, no caso da aritmética do reló gio, que
mesmo neste mundo há em certo sentido mais de um “sistema” de “aritmética”. E a á rvore
genealó gica indica que existem muitos “sistemas” possíveis de sucessã o. Mas quando as
pessoas perguntam sobre os nú meros em outro universo, provavelmente nã o estã o
perguntando esse tipo de coisa. Estã o perguntando sobre nú meros naturais, os nú meros
que nos sã o familiares na aritmética comum. Também podemos assumir que nã o estã o
meramente perguntando sobre notações alternativas ou sistemas de símbolos para
designar os nú meros em texto escrito. Podemos designar os nú meros usando numerais
romanos: I, II, III, IV, V, VI, VII, etc. Ou poderíamos soletrar os nomes: um, dois, três, quatro,
cinco… Essas variaçõ es sã o interessantes. Mas será que em outro mundo as verdades sobre
os nú meros permaneceriam as mesmas?

O que queremos dizer por nú meros naturais está intimamente relacionado ao conceito de
sequência de nú meros naturais. E isso está ligado à nossa capacidade, por uma
transcendência em miniatura, de ver os nú meros como uma sequência indefinidamente
estendida. Essa sequência está baseada na imitaçã o da imagiologia ou processo de
“engendramento”, que começa com 1 sendo sucedido por 2. Nó s imitamos o processo vez
apó s vez. Todo esse pensamento está enraizado em Deus, que é o Deus trinitá rio. Deus
continua o mesmo. Assim, há uma estabilidade e confiabilidade em relaçã o à sequência
numérica. As verdades aritméticas sempre e em todos os lugares permanecem verdadeiras.
Porque têm seu fundamento em Deus e no Filho, que é a imagem eterna de Deus, podemos
concluir que as verdades sã o necessá rias, uma vez que seguimos o caminho de pensar os
pensamentos de Deus depois dele analogicamente.

Mas é preciso cautela. Nosso entendimento dos nú meros está conectado nã o só com a
mente de Deus, mas também com nossas experiências de quatro maçã s e quatro pêssegos.
Maçã s e pêssegos poderiam nã o existir em outro Universo, e a aplicaçã o das verdades
aritméticas a maçã s e pêssegos nã o faria sentido se essas frutas em particular nã o
existissem. As leis ainda se aplicariam a uvas ou peras se estas frutas existissem, ou a
raposas ou folhas de grama. Ainda podemos aplicar as verdades se imaginarmos alguma
nova fruta que nã o existe. Mas isso é diferente. Por causa do entrelaçamento entre o um e
os muitos, devemos resistir à ideia de que podemos separar completamente o
conhecimento dos nú meros do conhecimento das formas como eles sã o ilustrados na
prá tica, neste mundo.

1
 

9. Derivando a aritmética da sucessão


 
 

A ideia de sucessã o pode ser usada como um ponto de partida para derivar toda a
aritmética. Em 1889, Giuseppe Peano, baseando-se no trabalho de predecessores, tratou a
relaçã o da sucessã o como algo fundamental. Partindo dessa relaçã o, ele formulou axiomas
precisos a partir dos quais poderia deduzir todas as verdades elementares da aritmética
comum.

Os axiomas de Peano

A relaçã o de sucessor pode ser descrita usando o símbolo especial S . Para expressar o fato
de que 2 é o sucessor de 1, escrevemos que S1 = 2. Assim também, S2 = 3, S3 = 4 e S4 = 5.
Para nã o bagunçar a formulaçã o dos axiomas, podemos assumir que cada nú mero natural é
nomeado usando-se apenas o símbolo 1 e o símbolo S para sucessor. Logo, o nú mero 3 é
SS1, com duas ocorrências do símbolo S . 4 é SSS1. E assim por diante. Para nú meros
maiores, essa notaçã o se torna inconveniente. Mas o ponto nã o é ter uma notaçã o eficiente,
mas axiomas simples.

Aqui estã o os axiomas: [49]

 
1. 1 é um nú mero natural
2. O sucessor de qualquer nú mero natural também é um nú mero natural: isto é, para todos os nú meros naturais
n , S n é um nú mero natural.
3. Nenhum nú mero natural tem 1 como seu sucessor: para todos os nú meros n , S n ≠ 1.
4. Nã o há dois nú meros naturais com o mesmo sucessor: se m ≠ n , S m ≠ S n .
5. Suponha que M designe qualquer propriedade [50]
que possa ou nã o valer para um determinado nú mero n .
Suponha que (a) M é verdade para 1 e (b) se M é verdade para um nú mero n , também é verdade para S n .
Entã o M é verdade para todos os nú meros naturais.
 

Esses cinco axiomas, simples quanto possam parecer, podem ser usados para definir adiçã o
e multiplicaçã o e depois para deduzir todos os resultados elementares da aritmética
comum (veja o Apêndice C). É uma conquista impressionante alguém ter encontrado uma
forma de representar a aritmética de maneira tã o simples. Existe uma beleza na
simplicidade dos axiomas, e naturalmente essa beleza é um reflexo de Deus.

Nó s já discutimos o fato de que os nú meros gozam de uma grande variedade de relaçõ es


com muitos aspectos da vida (Capítulo 4). A relaçã o com os axiomas de Peano é uma dessas
relaçõ es. A utilidade dos axiomas nã o significa que os nú meros sã o reduzidos a axiomas;
antes, dada a nossa filosofia antirreducionista, significa que os nú meros gozam de relaçõ es
ló gicas com esses axiomas ou com outros axiomas que possamos escolher. Há muitas
escolhas possíveis de axiomas que levariam aos mesmos resultados. Os axiomas de Peano
sã o de certa forma os mais simples. Mas eles gozam de relaçõ es com outros axiomas. Por
exemplo, um possível conjunto alternativo de axiomas começa com zero em vez de um
como o menor nú mero. O axioma 3 tem entã o de ser ajustado para dizer que nenhum
nú mero tem zero como seu sucessor. Todos os demais axiomas permanecem os mesmos.
Esse novo sistema de axiomas resulta, claro, em uma definiçã o ligeiramente diferente dos
nú meros naturais, uma vez que com o novo conjunto de axiomas o zero é incluído entre os
nú meros naturais. Mas as propriedades dos nú meros sã o as mesmas. Também poderíamos
escolher um conjunto de axiomas nos quais a adiçã o e a multiplicaçã o já estã o definidas.
Todas as possibilidades de diferentes axiomas residem na mente de Deus antes que nó s,
seres humanos, comecemos a pensar neles. Eles gozam de relaçõ es com conjuntos
alternativos de axiomas, de acordo com a sabedoria e autoconsistência de Deus. Nessa á rea,
como em todas as demais, podemos louvar a Deus por sua sabedoria e riqueza.

Além disso, podemos observar que para entender os axiomas de Peano corretamente já
precisamos saber sobre os nú meros. As verdades sobre os nú meros podem ser derivadas
dos axiomas de Peano, mas os axiomas de Peano também podem ser derivados de verdades
sobre os nú meros. A relaçã o de sucessor pode ser vista como um caso especial de adiçã o: S
n para qualquer nú mero n pode ser visto como uma notaçã o alternativa para o conceito de
adiçã o por 1 que já temos em mente. S n é uma forma abreviada para n + 1. Ou considere a
notaçã o de Peano para o nú mero 4, a saber, SSS1. Temos de ser capazes de contar o
nú mero de ocorrências do símbolo S na expressã o. Assim, quando começamos, já somos
dependentes dos nú meros e da contagem.

Os fundamentos dos axiomas de Peano

Podemos considerar os axiomas de Peano um por um e refletir de que maneiras eles têm
fundamento no cará ter de Deus. Comecemos com o axioma 1:
 
1. 1 é um nú mero natural
 

Esse axioma faz sentido num mundo em que Deus ordenou os padrõ es das verdades
aritméticas. Esses padrõ es têm seu arquétipo ou origem na autoconsistência de Deus. O
nú mero 1 tem sua origem arquétipa na unidade de Deus, que é um só Deus.
 
2. O sucessor de qualquer nú mero natural também é um nú mero natural: isto é, para todos os nú meros
naturais n , S n é um nú mero natural.
 

O axioma 2 tem suas raízes na ideia de sucessã o ou “do que vem a seguir”. Indicamos no
capítulo anterior como essa ideia tem suas raízes na imagiologia e no “engendramento”, os
quais remontam ao Filho, que é a imagem original, arquétipa, gerada pelo Pai em uma
geraçã o eterna.
 
3. Nenhum nú mero natural tem 1 como seu sucessor: para todos os nú meros n , S n ≠ 1.
 

O axioma 3 especifica que nã o estamos lidando com a aritmética do reló gio. A sucessã o de
nú meros nunca circula para retornar ao começo. Esse princípio ocorre quando cada rodada
de produçã o de um sucessor imita a primeira rodada produzindo um novo sucessor ao
invés de repetir um mais antigo. A ideia de novidade remonta à novidade que ocorreu
quando Deus criou o mundo.
 
4. Nã o há dois nú meros naturais com o mesmo sucessor: se m ≠ n , S m ≠ S n .
 

O axioma 4, assim como o axioma 3, especifica que cada novo sucessor é de fato
genuinamente novo.
 
5. Suponha que M designe qualquer propriedade que possa ou nã o valer para um determinado nú mero
n . Suponha que (a) M é verdade para 1 e (b) se M é verdade para um nú mero n , também é verdade
para S n . Entã o M é verdade para todos os nú meros naturais.

O axioma 5 é claramente um axioma fundamental, pois envolve implicitamente toda a


sucessã o de nú meros naturais. Ele é chamado de axioma da indução matemática . O
processo da induçã o matemá tica é uma forma de raciocínio que começa com uma
propriedade particular M e quer mostrar que ela é verdadeira para todos os nú meros
naturais. Ela estabelece a verdade geral sobre M ao seguir os dois passos (a) e (b). Os
passos (a) e (b) sã o suficientes, pois usando esses passos podemos ver como a propriedade
pode ser estabelecida para cada nú mero natural em sucessã o.

Vejamos como isso funciona. Suponha que os passos (a) e (b) sã o verdadeiros para uma
propriedade específica M . Raciocinamos da seguinte forma:
 
1. M é verdade para 1 (pelo passo (a)).
2a. Se M é verdade para 1, M é verdade para 2 = S1 (pelo passo (b)).
2b. M é verdade para 2 (a partir das linhas 1 e 2a).
3a. Se M é verdade para 2, M é verdade para 3 = S2 (pelo passo (b)).
3b. M é verdade para 3 (a partir das linhas 2b e 3a).
4a. Se M é verdade para 3, M é verdade para 4 = S3 (pelo passo (b)).
4b. M é verdade para 4 (a partir das linhas 3b e 4a).
5a. Se M é verdade para 4, M é verdade para 5 = S4 (pelo passo (b)).
5b. M é verdade para 5 (a partir das linhas 4b e 5a).

Repetindo esse processo um nú mero suficiente de vezes, podemos demonstrar que M é


verdadeiro para qualquer nú mero natural que escolhermos. O elemento distinto no axioma
5 é dizer que ele é entã o verdadeiro nã o apenas para um determinado nú mero que
escolhermos, mas para todos os nú meros naturais. Essa conclusã o só é possível se
observarmos o padrã o geral. Nó s nos afastamos do processo de raciocínio e vemos um
padrã o geral. Extrapolamos o padrã o, avançando para a série de nú meros, e vemos que o
princípio engloba todos eles. No processo de raciocínio, usamos nossa capacidade de ter
uma transcendência em miniatura, de ver um todo mesmo quando ele é indefinidamente
estendido. Estamos imitando a mente de Deus. Somos finitos, mas com esse tipo de
projeçã o para frente dependemos da infinitude de Deus. (Para exemplos usando a
[51]

induçã o matemá tica, veja os Apêndices C e D.)

Assim, todos os axiomas de Peano refletem a sabedoria e a grandeza de Deus, cada axioma
à sua maneira. Quando raciocinamos sobre aritmética, raciocinamos imitando o
conhecimento prévio que Deus tem de toda verdade, incluindo a verdade aritmética.
Louvado seja o Senhor!

Também podemos observar que esses axiomas estã o em harmonia com todas as verdades
individuais da aritmética e que tanto os axiomas quanto as verdades individuais estã o em
harmonia com o mundo que Deus fez, onde duas maçã s mais duas maçã s equivale a quatro
maçã s. E todas essas á reas juntas estã o em harmonia com as mentes humanas, pois somos
feitos à imagem de Deus. Porque compartilhamos de sua imagem, podemos ensinar a
pró xima geraçã o a conhecer as verdades em harmonia com o que sabemos e em harmonia
com o que Deus sabe. Deus está em harmonia consigo mesmo e ordena um mundo que
reflete a harmonia de Deus.

1
 

10. Multiplicação
 

Como a adiçã o, a multiplicaçã o é estabelecida por Deus e se origina em Deus.

As proporções no tabernáculo e no templo

Podemos voltar a considerar o taberná culo de Moisés e o templo de Salomã o. Os á trios no


taberná culo e no templo mostram proporcionalidades simples em suas dimensõ es. O Santo
Lugar no taberná culo tem 10 × 10 × 20 cô vados, em comparaçã o com o Santo dos Santos,
10 × 10 × 10 cô vados. O Santo Lugar pode ser visto como uma imagem ou adiçã o ao Santo
dos Santos, dando-nos um exemplo de adiçã o. Também pode ser visto como um á trio
obtido, figurativamente falando, multiplicando-se o Santo dos Santos por dois em
comprimento. As proporçõ es simples mostram uma harmonia. Essa harmonia reflete no
nível criado a harmonia eterna que existe entre as pessoas da Trindade. [52]

O taberná culo e o templo mostram mú ltiplos padrõ es. As relaçõ es entre o Santo dos Santos
e o Santo Lugar mostram padrõ es numéricos, como vimos. Também mostram padrõ es
espaciais. O Santo dos Santos é um cubo perfeito, com comprimento, largura e altura de 10
cô vados. Essas dimensõ es compõ em um espaço no qual pode haver padrõ es de movimento
e atividade humana, como um sacerdote que entra e realiza seus deveres. O mobiliá rio
mostra padrõ es de suporte físico. E o taberná culo exibe beleza em seu mobiliá rio. Os
mú ltiplos aspectos, como o numérico, o espacial, o físico e o belo combinam todos em uma
ú nica estrutura.

Essa combinaçã o de aspectos também ocorre no mundo maior que Deus fez. Os aspectos
quantitativos e espaciais do mundo estã o interligados a muitos outros aspectos, de acordo
com o desígnio de Deus. A implicaçã o é que Deus em sua sabedoria fez o mundo como um
todo. A combinaçã o em um todo, assim como os aspectos individuais quando contemplados
separadamente, exibem a sabedoria de Deus. Os aspectos quantitativos e espaciais, que
formam o material para a reflexã o matemá tica, estã o interligados com muitos outros
aspectos. A matemá tica nã o é mais ú ltima ou menos ú ltima do que muitos outros aspectos.
Assim, nã o devemos cair na tentaçã o de ou glorificar a matemá tica, ou desprezá -la como
algo sem importâ ncia.

Também podemos notar que a multiplicaçã o está intimamente relacionada à adiçã o.


Adicionar um nú mero a si mesmo é equivalente a multiplicar o nú mero por dois: 3 + 3 = 3 ×
2 = 6. Adicionar um nú mero a si mesmo num total de quatro ocorrências do nú mero é
equivalente a multiplicar por 4:

3 + 3 + 3 + 3 = 3 × 4 = 12.

Essa propriedade pode ser usada como uma definiçã o de multiplicaçã o, se quisermos (veja
o Apêndice C). Ou podemos usar uma perspectiva na qual começamos com a adiçã o e a
multiplicaçã o como operaçõ es distintas e entã o mostramos que elas se entrelaçam
harmoniosamente.

A multiplicação no mundo que Deus fez

As propriedades multiplicativas encontram materializaçõ es e ilustraçõ es de muitas


maneiras no mundo que Deus fez. Por exemplo, a á rea de um retâ ngulo é o comprimento
multiplicado pela largura (diagrama 10.1).
Muitas leis físicas bá sicas envolvem a matemá tica da multiplicaçã o. Uma das leis mais
famosas é a segunda lei de Newton do movimento,

F = ma .

Ela diz que a força F é igual à massa m multiplicada pela aceleraçã o a . A famosa equaçã o de
Einstein

E = mc 2

diz que a energia E é igual à massa m multiplicada pela velocidade da luz c multiplicada por
c uma segunda vez (o quadrado).
 

A multiplicação de animais

Gênesis 1 descreve o ordenamento do mundo por Deus. Entre seus comandos, ele
especifica que os animais e a humanidade devem se multiplicar :
 
E Deus os abençoou, dizendo: Sede fecundos, multiplicai-vos e enchei as á guas dos mares; e, na terra, se
multipliquem as aves. (v. 22)
 
E Deus os abençoou e lhes [seres humanos] disse: Sede fecundos, multiplicai-vos , enchei a terra e
sujeitai-a; dominai… (v. 28)
 
Claro, os versículos aqui nã o estã o descrevendo a “multiplicaçã o” num sentido técnico
matemá tico. O significado é mais geral: Deus está dirigindo os animais e os seres humanos
para que aumentem em nú mero. Mas quando prestamos atençã o em como esse aumento
ocorre, descobrimos uma relaçã o com a multiplicaçã o no sentido matemá tico. Uma espécie
nã o aumenta meramente quando cada par produz uma ú nica nova descendência. Um ú nico
par pode produzir vá rios descendentes, e esses descendentes podem, por sua vez, cada
qual produzir vá rios descendentes.

Suponha simplificarmos isso, e imaginemos uma situaçã o em que um par de cavalos produz
quatro descendentes. A segunda geraçã o tem quatro cavalos, duas vezes quantos há na
primeira geraçã o. Se esses quatro cavalos formarem pares, cada um dos pares poderá
produzir quatro descendentes na terceira geraçã o, com um total de oito cavalos na terceira
geraçã o. Há duas vezes mais na terceira geraçã o do que na segunda. Se repetirmos o
padrã o, poderemos ter duas vezes oito, ou 16 cavalos na quarta geraçã o. Na 10ª geraçã o
seriam 1024 cavalos, e na 20ª geraçã o 1.048.576. Na 30ª geraçã o poderia haver
1.073.741.824, mais de um bilhã o de cavalos. Os nú meros se tornam enormes. Podemos ver
uma dramá tica diferença entre esse tipo de multiplicaçã o e um simples processo de adiçã o
onde, por exemplo, adicionamos um novo cavalo a cada geraçã o.

O padrã o de reproduçã o que Deus estabeleceu reflete verdades matemá ticas que têm seu
fundamento em Deus. Entre essas verdades estã o verdades que se referem à multiplicaçã o.
Podemos ver que as verdades sobre a multiplicaçã o estã o integralmente relacionadas com
as perspectivas normativa, situacional e existencial. Primeiro, a perspectiva normativa leva
ao enfoque nas verdades da multiplicaçã o como verdades gerais que valem para cavalos,
gatos ou quaisquer outros objetos que escolhemos contar. A multiplicaçã o funciona em
geral, e podemos logicamente derivar verdades da multiplicaçã o a partir de simples
axiomas de partida (veja o Apêndice C). Em segundo, a perspectiva situacional leva ao
enfoque de como a multiplicaçã o funciona com cavalos, gatos e outros objetos. Em terceiro,
a perspectiva existencial leva ao enfoque da nossa capacidade como pessoas de entender
como a multiplicaçã o funciona e como ela é significativa. As três perspectivas se
harmonizam, de acordo com o desígnio de Deus.

Podemos agradecer a Deus que, desta e de muitas outras maneiras, ele dá aos seres
humanos a capacidade de nã o só entender as maravilhas de seu mundo, mas também de
usar padrõ es aritméticos regulares para nosso benefício, como por exemplo quando nos
ocupamos em fazer criar animais.

1
 

11. Simetrias
 
 
Dentro da matemá tica podemos encontrar muitas simetrias. Vamos refletir sobre algumas
delas.

O que é simetria?

Uma simetria é exibida sempre que um tipo de mudança no ponto de vista deixa algo
fundamentalmente igual. Por exemplo, o corpo humano tem simetria bilateral : uma pessoa
parece igual defronte a um espelho, embora o espelho inverta as posiçõ es dos lados
esquerdo e direito. Os olhos esquerdo e direito correspondem; as mã os esquerda e direita
correspondem; as pernas esquerda e direita correspondem. (Veja a fig. 11.1.)
 

Em contraste, uma estrela do mar tem o que se chama de simetria radial . A estrela do mar
tem cinco braços, todos com a mesma forma. Assim, girar a estrela do mar em torno de seu
centro por 1/5 de uma revoluçã o completa deixa a estrela parecendo do jeito que era antes.
A estrela do mar tem além disso uma simetria de espelho , mostrada pelo fato de que parece
igual em frente a um espelho. (Veja a fig. 11.2.)
 

Uma minhoca tem simetria cilíndrica, de modo que parece igual apó s qualquer quantidade
de rolamento. (Veja a fig. 11.3.)
 

As células de um favo de mel mostram uma simetria sêxtupla. A rotaçã o por um â ngulo de
60 graus ou qualquer mú ltiplo de 60 graus deixa a estrutura igual. As células também
parecem iguais defronte a um espelho. (Veja a fig. 11.4.)
 

A origem da simetria em Deus

Neste mundo existem simetrias por causa do plano de Deus. Ele as criou. No pró prio Deus
há um arquétipo de simetria, a saber, o fato de que todas as três pessoas da Trindade sã o
igualmente Deus. As três pessoas sã o distintas umas das outras e seus papeis sã o distintos
em relaçã o uns aos outros, mas todos compartilham as características de Deus —
eternidade, onipotência, onisciência, onipresença, fidelidade, bondade. Eles sã o
“simétricos” em relaçã o a essas características. Essa simetria é o arquétipo. Todas as
simetrias terrenas sã o éctipas, reflexos criados.

A simetria tem uma relaçã o pró xima com a beleza. As pessoas tendem a pensar que um
rosto humano com simetria é mais bonito do que um que carece de simetria em algum
ponto. As belezas neste mundo refletem a beleza arquétipa de Deus.

 
Simetrias na aritmética

A aritmética mostra simetrias simples. Cada uma dessas simetrias reflete em ú ltima aná lise
a beleza de Deus.

A adiçã o é comutativa , significando que a ordem de dois nú meros nã o faz diferença:


 
1 + 3 = 3 + 1 = 4;
2 + 3 = 3 + 2 = 5;
5 + 7 = 7 + 5 = 12;
6 + 9 = 9 + 6 = 15.
 

(Para uma demonstraçã o da comutatividade, veja o Apêndice C.) Essa propriedade é uma
simetria em relaçã o à ordem na adiçã o.

A adiçã o é associativa , significando que o agrupamento de três nú meros nã o faz diferença:


 
(1 + 2) + 4 = 1 + (2 + 4);
(2 + 1) + 5 = 2 + (1 + 5);
(7 + 3) + 2 = 7 + (3 + 2).
 

(Para uma demonstraçã o da associatividade, veja o Apêndice C.) Essa propriedade é mais
uma simetria em relaçã o ao agrupamento na adiçã o.

Juntas, a comutatividade e a associatividade na adiçã o implicam que a ordem de adiçã o nã o


faz diferença, ainda que uma longa sequência de nú meros seja adicionada. (Veja o diagrama
11.1.)
 
 

Assim, há uma simetria complexa no fato de que um rearranjo da ordem deixa a soma igual.
A multiplicaçã o é comutativa.
 
2 × 3 = 3 × 2 = 6;
3 × 4 = 4 × 3 = 12;
3 × 7 = 7 × 3 = 21;
5 × 11 = 11 × 5 = 55.
 

Essa comutatividade é uma simetria para a multiplicaçã o.

A multiplicaçã o é associativa:
 
(2 × 3) × 4 = 2 × (3 × 4) = 24;
(2 × 5) × 3 = 2 × (5 × 3) = 30;
(3 × 6) × 4 = 3 × (6 × 4) = 72.
 

Podemos apreciar todas essas simetrias como belezas que Deus colocou dentro da
aritmética para o nosso deleite. Simetrias e belezas muito mais complexas nos aguardam na
matemá tica. Quanto mais se viaja no estudo da matemá tica, mais há e mais devemos ser
estimulados a louvar a Deus. Um excelente material é encontrado em James Nickel,
Mathematics: Is God Silent? [53]

1
 

12. Conjuntos
 
 

Os conjuntos sã o amplamente utilizados na matemá tica. E algumas pessoas já tentaram


reduzir toda a matemá tica à teoria dos conjuntos. Assim, precisamos refletir sobre a
natureza dos conjuntos como objetos matemá ticos.

O que é um conjunto?

Conjunto é uma coleçã o de objetos. Podemos indicar o conjunto que temos em mente
simplesmente listando os objetos que estã o na coleçã o. Por exemplo, a coleçã o composta de
maçã #1, maçã #2 e pêssego #1 é um conjunto. Quando há apenas alguns itens na coleçã o,
podemos descrever o conjunto colocando a lista de itens entre chaves. O conjunto S que
consiste de três objetos, maçã #1, maçã #2 e pêssego #1, é descrito assim:
S = {maçã #1, maçã #2, pêssego #1}.

Os objetos em um conjunto sã o chamados de membros ou elementos do conjunto. O símbolo


∈ é usado para denotar filiaçã o a um conjunto. A expressã o[54]

(maçã #2) ∈ S

Significa que a maçã #2 é um membro do conjunto S .

Conjunto é uma coleçã o na qual ignoramos todas as informaçõ es exceto a informaçã o sobre
os objetos que ele tem como seus membros. O conceito técnico de conjunto é “cego” para
todas as informaçõ es extras e todas as relaçõ es e associaçõ es extras que temos em mente a
partir de nossa vida como um todo. Assim, o conjunto é o mesmo conjunto, nã o importa a
ordem que escolhamos para listar os elementos e nã o importa quantas vezes listemos o
mesmo elemento:

{maçã #1, maçã #2, pêssego #1} = {pêssego #1, maçã #1, maçã #2} = {maçã #2, maçã #2, maçã #2,
maçã #1, pêssego #1, maçã #2, maçã #1}.

A ideia do conjunto distingue por abstraçã o mental apenas aquelas propriedades em que
estamos nos concentrando, e para os conjuntos a propriedade-chave é a filiaçã o ao
conjunto. As propriedades gerais de um conjunto que o tornam um conjunto representam a
abstraçã o, enquanto os casos específicos de conjuntos, como o conjunto {maçã #1, maçã #2,
pêssego #1}, representam as ilustraçõ es ou representaçõ es concretas da abstraçã o. A
abstraçã o tem uma só natureza, enquanto as representaçõ es sã o muitas. Por causa da igual
ultimidade do um e dos muitos, a abstraçã o e suas representaçõ es estã o combinadas, cada
qual ajudando a definir a outra.

Se há muitos membros num conjunto, pode ser mais eficiente descrever o conjunto
descrevendo as propriedades que sã o verdadeiras para cada membro do conjunto. Por
exemplo, o conjunto de todos os nú meros ímpares menores que 100 pode ser descrito em
português comum, assim como fizemos. Há também um modo padrã o de os matemá ticos
escreverem a descriçã o de forma abreviada:

o conjunto de nú meros ímpares menores que 100 = { x | x é um nú mero natural e x < 100 e x é ímpar}

O símbolo de barra “|” significa “tal que”. A notaçã o { x | x é ímpar} significa “o conjunto de
todos os elementos x tal que x é ímpar”.

 
Os fundamentos em Deus para os conjuntos

Como de costume, o fundamento para a ideia dos conjuntos está em Deus. Vejamos como. A
ideia de conjunto depende de três princípios: (1) cada elemento do conjunto é distinguível
e fixo — é bem definido; (2) há um critério claro para distinguir quais objetos estã o no
conjunto e quais nã o estã o; (3) há uma relaçã o de pertencimento ou “filiaçã o”, segundo a
qual os elementos que atendem ao critério de estar no conjunto sã o considerados membros
ou elementos do conjunto. A relaçã o de pertencimento é denotada pelo símbolo especial ∈.

Os princípios (1) e (2) dependem da possibilidade de se fazer distinçõ es. Como podemos
fazer distinçõ es? Deus é distinto. Ele é um Deus. E Deus é três pessoas. As três pessoas sã o
distinguíveis umas das outras. Ao mesmo tempo, as três pessoas estã o combinadas: cada
pessoa é Deus. Cada pessoa, poderíamos dizer, é um membro da deidade. Vimos no Capítulo
2 que as três pessoas da Trindade nos dã o o arquétipo para três princípios: classificaçã o,
representaçã o e associaçã o. O princípio da classificaçã o é o arquétipo para critérios de
distinçõ es. O princípio da representaçã o é o arquétipo para a individualidade pertencente
aos elementos que atendem ou nã o aos critérios. E o princípio da associaçã o é o arquétipo
para a relaçã o de pertencimento ou filiaçã o. Todos os três princípios se entrelaçam. Nã o
podemos realmente ter um sem os demais. Todos os três pressupõ em os demais, em
harmonia com o fato de que todas as três pessoas da Trindade estã o combinadas como um
só Deus.

Deus, dissemos, é o arquétipo. Quando Deus criou o mundo, criou éctipos que refletem sua
sabedoria, fidelidade e conhecimento. Na descriçã o em Gênesis 1 podemos ver, entre
outras coisas, que Deus faz distinções :

… e fez separação entre a luz e as trevas. Chamou Deus à luz Dia e às trevas, Noite. (Gn 1.4-5)

E disse Deus: Haja firmamento no meio das á guas e separação entre á guas e á guas. Fez, pois, Deus o
firmamento e separação entre as á guas debaixo do firmamento e as á guas sobre o firmamento. E assim
se fez. E chamou Deus ao firmamento Céus. (v. 6-8)

Disse também Deus: Ajuntem-se as á guas debaixo dos céus num só lugar, e apareça a porçã o seca. E
assim se fez. À porçã o seca chamou Deus Terra e ao ajuntamento das á guas, Mares. (v. 9-10)

Disse também Deus: Haja luzeiros no firmamento dos céus, para fazerem separação entre o dia e a
noite; e sejam eles para sinais, para estações , para dias e anos . (v. 14)

Ocorrem distinçõ es entre as coisas que Deus fez porque Deus chama as distinçõ es à
existência. Os nomes que ele dá , como Dia, Noite, Céus e Terra, definem elementos distintos
dentro do mundo. Ele separa coisas, o que faz com que as coisas separadas sejam entã o
distinguíveis. Entre outras coisas, essas coisas distinguíveis podem entã o funcionar como
elementos distintos dentro de um conjunto.
Gênesis 1 está descrevendo a obra divina da criaçã o em termos de uma visã o geral. Mas
essa visã o geral, ao ilustrar o uso de distinçõ es, implica um princípio mais geral. Deus
especifica todas as distinçõ es que existem. Nó s como seres humanos podemos pensar os
pensamentos de Deus depois dele. Quando fazemos isso, confiamos nas distinçõ es que já
estã o em vigor, porque Deus as especificou.

Em nossos dias, existem muitas línguas no mundo. Elas incluem diferentes vocabulá rios, e
os vocabulá rios podem à s vezes se concentrar em diferentes tipos de distinçã o. Os
vocabulá rios nem sempre correspondem uns aos outros. Mas quaisquer que sejam as
distinçõ es que existam em qualquer língua, Deus pensou nelas de antemã o.

A ideia do conjunto utiliza distinçõ es de uma maneira simples e limpa. Elimina todos os
outros tipos de detalhes sobre as coisas que existem no mundo de Deus e apresenta a ideia
simples de ser ou nã o membro de um conjunto. Ou um item está dentro do conjunto, por
ser um membro, ou está fora do conjunto, por nã o ser um membro. Essa distinçã o dentro-
fora é uma separaçã o. Nó s elaboramos ou “criamos” a separaçã o quando definimos um
conjunto específico com maçã #1, maçã #2 e pêssego #1 como seus membros. Somos
“criativos”. Mas, claro, nossa criatividade é derivada. Somos feitos à imagem de Deus, nosso
Criador. Deus já pensou em todas as distinçõ es e separaçõ es antes de nó s.

As perspectivas sobre os conjuntos

Os conjuntos podem ser entendidos usando-se as perspectivas normativa, situacional e


existencial. A perspectiva normativa enfoca as propriedades normativas dos conjuntos. As
verdades específicas sã o vá lidas para os conjuntos. Essas verdades têm uma fonte
transcendente — vêm em ú ltima aná lise da autoconsistência de Deus e dependem do fato
de que Deus especificou distinçõ es e separaçõ es.

Em segundo lugar, a perspectiva situacional enfoca a situaçã o: os objetos no mundo que


Deus criou. Podemos tratar esses objetos, como maçã s e pêssegos, como membros de
coleçõ es. As verdades sobre os conjuntos valem para essas coleçõ es que existem no mundo.

Em terceiro lugar, a perspectiva existencial enfoca as pessoas. Como seres humanos,


devemos ser capazes de apreender o significado de falar sobre uma coleçã o ou falar sobre
seus membros. Devemos ser capazes de usar nossa mente para pensar sobre distinçõ es e
ter clareza em nossa mente sobre que distinçõ es estamos usando a qualquer momento.

Como de costume, essas três perspectivas levam umas à s outras. Em nossa mente,
pensamos sobre o mundo. Assim, a perspectiva existencial leva à perspectiva situacional. E
quando pensamos sobre o mundo, pressupomos normas, incluindo normas para o que é
verdade acerca dos conjuntos. Isto é, nosso pensamento inclui a consciência de normas, e
assim somos levados à perspectiva normativa. As normas valem para as coisas no mundo, e
assim a perspectiva normativa leva à perspectiva situacional. As normas valem para como
devemos pensar, e assim a perspectiva normativa leva à perspectiva existencial.
As três perspectivas se harmonizam porque Deus as ordenou todas. Ele especifica as
normas; cria o mundo; e cria seres humanos à sua imagem.

Conjuntos e números

Sã o os conjuntos uma parte do fundamento dos nú meros? Como já apontamos, é comum os


matemá ticos contemporâ neos considerarem a teoria dos conjuntos um “fundamento” para
tudo o mais. O que isso geralmente significa é que os matemá ticos podem começar com
axiomas para conjuntos e “construir” ou derivar todas as verdades sobre a matemá tica a
partir desse ponto de partida. Nosso ponto de vista aqui é antirreducionista. A
derivabilidade dos axiomas mostra a fascinante relaçã o entre os conjuntos e os nú meros e
exibe a sabedoria de Deus em ordenar uma relaçã o. Mas as relaçõ es sã o ricas e
multidimensionais.

Por exemplo, já estamos tacitamente usando o que sabemos sobre as características


numéricas do mundo quando pensamos em conjuntos. Cada elemento de um conjunto é um
elemento. A singularidade do elemento já pressupõ e o nú mero um. Se há mais de um
elemento no conjunto, a distinçã o entre os elementos nos dá dois ou três elementos no
conjunto. Nó s sabemos disso mesmo que nã o o mencionemos.

Nã o podemos pensar em conjuntos sem pensar os pensamentos de Deus depois dele.


Devemos ter uma espécie de comunhã o com Deus, ainda que estejamos moral e
espiritualmente em rebeliã o contra ele. Nessa comunhã o com Deus, já sabemos algo sobre
nú meros.

Também podemos ver que no pró prio Deus encontramos nú meros (um Deus; três pessoas)
e distinçõ es (distinçõ es entre as pessoas). Nenhum é “anterior” ao outro, pois ambos
pertencem a Deus desde a eternidade. A numeraçã o pressupõ e distinçõ es entre as pessoas
que enumeramos. Por outro lado, as distinçõ es pressupõ em a ideia de unidade e
diversidade, que é numérica.

Assim, podemos olhar para o assunto de pelo menos duas maneiras opostas. Por um lado, a
ideia da distinçã o depende da ideia “anterior” dos nú meros. Ou podemos ver os nú meros
como dependendo da ideia “anterior” da distinçã o. As duas na verdade andam juntas. No
Apêndice E damos uma breve descriçã o de uma direçã o que existe de dependência. Os
nú meros podem ser vistos como dependentes da ideia de distinçã o que está presente na
ideia de conjunto. Entã o, podemos explorar como a teoria elementar dos conjuntos pode
fornecer axiomas que levam à s propriedades dos nú meros.

1
 
 
 
 
 
 
 
Parte 4 — OUTROS TIPOS DE NÚMEROS
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
13. Divisão e frações
 
 

Os nú meros inteiros 1, 2, 3, 4, … sã o mais fá ceis de entender, pois se aplicam a coleçõ es de


maçã s ou pêssegos. Mas existem outros tipos de nú meros, como as fraçõ es. Qual é a
natureza das fraçõ es? O matemá tico Leopold Kronecker supostamente teria dito: “Deus fez
os nú meros inteiros; tudo o mais é obra do homem”. Será mesmo? Ou será que Deus nos
deu as fraçõ es e outros tipos de nú meros também?

Divisão

As fraçõ es sã o ú teis quando temos de lidar com a divisã o de alguma quantidade. Entã o,
pensemos agora sobre a divisã o. A divisã o desfaz o resultado de uma multiplicaçã o. Assim,
considere um caso envolvendo multiplicaçã o. Suponha que o supermercado venda pacotes
contendo 12 cachorros-quentes. Nó s compramos 3 pacotes. Quantos cachorros-quentes
temos? O princípio da adiçã o diz que podemos somar os cachorros-quentes de cada pacote,
totalizando 12 + 12 + 12 = 36 cachorros-quentes. Adicionar 12 a si mesmo num total de
três ocorrências do nú mero 12 é o mesmo que multiplicar 12 por 3.
 
12 + 12 + 12 = 12 × 3 = 36.
 
O que estamos vendo até aqui é a harmonia ordenada por Deus entre a adiçã o e a
multiplicaçã o e a harmonia entre a aritmética, por um lado, e a natureza do mundo (o
mundo com seus cachorros-quentes), por outro.

Agora, coloquemos um problema que requer pensar na outra direçã o. Suponha que
estamos planejando uma festa com 18 convidados e estimamos que eles vã o comer dois
cachorros-quentes cada. Quantos pacotes temos de comprar no supermercado? Primeiro
fazemos uma multiplicaçã o: 18 convidados vezes 2 cachorros-quentes por convidado dá 36
cachorros-quentes. Se os cachorros-quentes vêm em pacotes de 12, quantos pacotes
precisamos comprar? Com 12 cachorros-quentes por pacote, um pacote nos dará 12
cachorros-quentes; 2 pacotes nos darã o 12 × 2 = 24; 3 pacotes nos darã o 12 × 3 = 36
cachorros-quentes; e assim por diante. Obter uma resposta para o problema envolve
“desfazer” o problema de multiplicaçã o 12 × 3 = 36, para concluir que 3 pacotes sã o
suficientes para fornecer 36 cachorros-quentes para a festa.
Esse tipo de problema surge frequentemente, e por isso as pessoas inventaram uma
notaçã o para a divisã o: 36 ÷ 12 = 3 ou 36/12 = 3. Quando analisamos a divisã o, podemos
ver que ela exibe aspectos normativos, situacionais e existenciais. Na perspectiva
normativa, existem regras para realizar a divisã o e regras para a relaçã o entre a divisã o e a
multiplicaçã o. Há também regras que envolvem harmonias entre a divisã o e a adiçã o. Por
exemplo, dividir primeiro por um nú mero e entã o por outro é o mesmo que dividir pelo
produto dos dois nú meros:
 
(36/3)/4 = 36/(3 × 4) = 3
(20/2)/5 = 20/(2 × 5) = 2.
 

Dividir uma soma de dois nú meros por um nú mero d tem o mesmo resultado que dividir
cada um dos dois nú meros originais na soma pelo mesmo nú mero d e em seguida
adicionar:
 
36/3 = (12 + 24)/3 = (12/3) + (24/3) = 4 + 8 = 12.
10/2 = (8 + 2)/2 = (8/2) + (2/2) = 4 + 1 = 5.
 

Na perspectiva situacional, a divisã o se aplica a situaçõ es no mundo, como a situaçã o com


nossos 36 cachorros-quentes.

Existencialmente, nó s como seres humanos podemos entender em nossa mente o problema


do cachorro-quente e realizar um processo de divisã o que nos leve a uma resposta. Assim
que temos a resposta, interagimos com o mundo ao comprar os cachorros-quentes e —
junto dos convidados — comê-los. Como de praxe, Deus ordena a harmonia entre as três
perspectivas.

Também podemos observar a presença de um entrelaçamento entre o um e os muitos. O


um neste caso é a verdade geral de que 36 ÷ 12 = 3. Os muitos sã o as muitas ocorrências no
mundo onde essa relaçã o numérica é exibida — com cachorros-quentes, pã ezinhos de
cachorro-quente, rodelas de hambú rguer, coxas de frango, e assim por diante. Como de
praxe, o entrelaçamento do um e dos muitos depende de Deus e tem seu arquétipo em
Deus.

Também podemos observar que há um tipo de simetria entre a divisã o e a multiplicaçã o.


Nó s dissemos que a divisã o “desfaz” a multiplicaçã o. As duas operaçõ es da multiplicaçã o e
divisã o sã o dois lados de uma mesma moeda. Se a divisã o desfaz a multiplicaçã o, a
multiplicaçã o também desfaz a divisã o. Se dividimos 36 por 12 para obter 3, podemos
voltar a 36 multiplicando 3 por 12. A simetria neste mundo deriva de Deus, que é o
arquétipo da beleza.

Outra simetria sobre a divisã o surge porque a divisã o pode ser vista a partir de duas
perspectivas diferentes. Considere mais uma vez o problema do cachorro-quente, onde
[55]

sabemos que precisamos de um total de 36 cachorros-quentes. Quando os compramos, eles


vêm em pacotes de 12. Ora, 36/12 = 3. Assim, sabemos que precisamos comprar 3 pacotes.
Mas suponha que o nosso problema é que temos 36 cachorros-quentes e 12 pessoas que
irã o comê-los. Quantos cachorros-quentes cada pessoa irá comer? Obtemos a resposta da
mesma maneira: 36/12 = 3. Cada pessoa terá 3 cachorros-quentes.

Os dois problemas têm a mesma soluçã o na aritmética. Em ambos os casos, temos de


dividir 36 por 12. Mas no mundo de cachorros-quentes, pacotes e pessoas, os dois
problemas sã o bem diferentes. O problema da compra envolve dividir 36 cachorros-
quentes em pilhas de 12 cachorros-quentes cada e perguntar quantas pilhas haverá . O
problema de comer envolve dividir 36 cachorros-quentes em 12 pilhas, uma pilha por
pessoa, e perguntar quantos cachorros-quentes cada pessoa terá . Os dois problemas têm a
mesma resposta numérica, isto é, 3. Essa mesma resposta é um tipo de simetria no mundo,
uma simetria em dividir 36 cachorros-quentes em 12 pilhas ou dividi-los em pilhas, cada
qual consistindo de 12 cachorros-quentes.

O mesmo, claro, vale para outros casos de divisã o. 20 cachorros-quentes divididos em 5


pilhas resulta em cada pilha tendo 4 cachorros-quentes (20/5 = 4). 20 cachorros-quentes
divididos em pilhas com 5 em cada pilha resulta em 4 pilhas (20/5 = 4).

Se representarmos pictoricamente o problema da divisã o por meio de um arranjo


retangular de cachorros-quentes, podemos ver que essa simetria sempre existirá (fig. 13.1).

Os cachorros-quentes sã o arranjados em quatro filas de 5 cachorros-quentes cada, para um


total de 20 cachorros-quentes (5 × 4 = 20). Se cada fila é uma “pilha”, temos quatro pilhas
com cinco cachorros-quentes em cada pilha. Se, por outro lado, cada coluna é uma pilha,
temos cinco pilhas com quatro cachorros-quentes em cada pilha.
 
 
Frações e divisão
 

Consideremos agora as fraçõ es. Suponha que temos uma torta que queremos dividir entre
seis pessoas. Este é um problema semelhante ao problema de dividir 36 cachorros-quentes
em pacotes de 12. Mas começamos com apenas um item, uma ú nica torta, em vez de 36. A
resposta é que cortamos a torta. Deus nos deu poder para cortar as coisas que estã o no
mundo. E nos deu uma mente que pode pensar em como fazê-lo para que as fatias
resultantes sejam quase iguais.

Dividimos a torta em seis fatias. Quando a torta está em fatias, podemos adotar uma nova
perspectiva na qual tratamos as fatias como objetos individuais e toda a torta como uma
coleçã o de 6 fatias. (Nossa capacidade de usar mú ltiplas perspectivas vem de Deus.) Se
temos 6 fatias e queremos dividi-las igualmente entre 6 pessoas, com procedemos?
Precisamos dividir o total de 6 fatias pelo nú mero de pessoas, isto é, 6 pessoas. 6 fatias
divididas por 6 pessoas é 6/6 ou 1. Cada pessoa receberá 1 fatia.

Mas agora também podemos voltar à perspectiva original, onde consideramos a torta como
um todo. A torta é 1 item. De 6 pessoas, quanto é que cada uma recebe? Recebe 1/6.
Oralmente dizemos “um sexto”. Escrever ou dizer assim estende a notaçã o da divisã o em
fraçõ es.

De um ponto de vista, nó s é quem criamos essa notaçã o estendida. “Inventamos” a fraçã o


1/6 para aumentar nossa capacidade de falar sobre o processo de cortar coisas. Há um
pingo de verdade na declaraçã o atribuída a Kronecker, de que “tudo o mais é obra do
homem”. A humanidade é criativa, e nó s “inventamos” fraçõ es. Mas quem nos deu nossa
criatividade? Somos feitos à imagem de Deus, que é o Criador original. Deus nã o é
surpreendido quando chegamos com a ideia das fraçõ es. Ele pensou nelas antes de nó s. E
fez certas coisas no mundo que se dividem naturalmente em pedaços menores. Por
exemplo, depois que uma laranja é separada em gomos, divide-se naturalmente em seçõ es.
Conchas de marisco se dividem naturalmente em duas.

As fraçõ es exibem o mesmo entrelaçamento de três perspectivas que observamos nos


cachorros-quentes. Elas não sã o uma mera invençã o subjetiva para nos entreter ou manter
nossa mente ocupada com alguma frivolidade. A bem da verdade, entendemos as fraçõ es
mentalmente : este é o foco da perspectiva existencial. Mas também sabemos que há
normas para se lidar corretamente com as fraçõ es. Teremos muitas poucas fatias, ou entã o
fatias demais, se calcularmos erroneamente quando nos dispusermos a cortar a torta.
(Pense na ideia de cortar três bolos de casamento em fatias para 200 convidados. É melhor
fazermos nossa aritmética corretamente, ou podemos passar vergonha por nã o ter fatias
suficientes para todos os convidados.) Existem normas para o sucesso, e essas normas sã o
o foco da perspectiva normativa. Por fim, na perspectiva situacional nos concentramos na
torta. Ela precisa ser cortada.

As três perspectivas sã o coerentes porque Deus ordenou as três e assegurou que fossem
coerentes. É por isso que podemos cortar uma torta de uma maneira razoá vel.
Se Deus ordenou as três perspectivas sobre as fraçõ es, é um erro reduzir as três
perspectivas a uma, qual seja, a perspectiva existencial. Se pensá ssemos que a perspectiva
existencial fosse ú ltima, poderíamos concluir que as fraçõ es sã o totalmente “uma obra do
homem”. Isto é, acabamos de inventá -las em nossa mente e elas só existem porque as
inventamos. Mas essa alegaçã o exclusiva sobre a invençã o humana nã o explica por que as
fraçõ es funcionam bem quando estamos cortando tortas ou bolos de casamento. Nem
explica por que nã o podemos simplesmente inventar quaisquer regras que queremos para
trabalhar com fraçõ es. As regras sã o normas. Elas precisam ser o que sã o para que
coincidam com o que se aplica ao mundo (a perspectiva situacional) e se aplica à nossa
mente (a perspectiva existencial).

De muitas maneiras, as normas para as fraçõ es coincidem com as normas para outras
formas de divisã o. Por exemplo, a fraçã o de uma fraçã o tem como seu denominador o
produto dos denominadores nas duas etapas de fazer uma fraçã o:
 
(3/8)/4 = 3/(8 × 4) = 3/32.
(1/3)/5 = 1/(3 × 5) = 1/15.
 

A adiçã o de fraçõ es satisfaz uma lei “distributiva” que é semelhante ao que ocorre na
multiplicaçã o e divisã o de nú meros inteiros.
 
(3 + 4)/8 = (3/8) + (4/8).
(1 + 3)/6 = (1/6) + (3/6).
 

Essas verdades sã o similares a:


 
(3 + 4) × 8 = 3 × 8 + 4 × 8
(1 + 3) × 6 = 1 × 6 + 3 × 6
 

Em todo esse raciocínio, quer de uma perspectiva normativa, situacional ou existencial,


nossa mente nã o está trabalhando em independência de Deus. Deus está presente conosco.
Ele está presente para a salvaçã o com aqueles que creem em Cristo. Mas também está
presente em graça comum com aqueles que se rebelam contra ele. Eles também podem
pensar os pensamentos de Deus depois dele. A “invençã o” de fraçõ es é uma invençã o
capacitada por Deus. Nã o é “meramente” humana.

Regras para frações

Quando as crianças aprendem a lidar com fraçõ es, devem aprender mú ltiplas relaçõ es e
mú ltiplos aspectos. As fraçõ es têm relaçõ es com o mundo no qual fatiamos tortas. Têm
relaçõ es com a nossa mente. Têm relaçõ es com a linguagem e especialmente com os
símbolos matemá ticos que usamos ao “fazer” fraçõ es no papel. Têm relaçõ es com os
cá lculos feitos nas ciências. Têm relaçõ es com os vá rios tipos de matemá tica avançada que
têm belezas pró prias, mas que nem todo mundo precisa aprender. Apreciar fraçõ es
significa apreciar um mundo rico de relaçõ es que Deus ordenou.

Dentro desse contexto, as crianças aprendem normas — regras. Existem regras informais
para o modo como as fraçõ es escritas se relacionam com o mundo de fatiar tortas. Existem
regras mais formais para calcular com fraçõ es. Como multiplicamos duas fraçõ es? Como
somamos duas fraçõ es com o mesmo denominador (1/7 + 3/7)? Como somamos duas ou
mais fraçõ es com diferentes denominadores (1/6 + 1/2 + 1/9)? Essas regras devem ter
coerência com o mundo. Se 1/6 + 1/2 + 1/9 = 3/18 + 9/18 + 2/18 = 14/18 = 7/9 no papel,
também é verdade que 1/6 de uma torta mais 1/2 de uma torta mais 1/9 de uma torta
fazem no total 7/9 de uma torta? É verdade. Louvado seja o Senhor por sua sabedoria!

1
 

14. Subtração e números negativos


 

Nosso pró ximo tó pico sã o os nú meros negativos. Podemos fazer, sobre os nú meros
negativos, a mesma pergunta que fizemos sobre as fraçõ es: sã o eles reais? Para algumas
pessoas os nú meros negativos parecem ainda mais suspeitos que as fraçõ es. Elas
perguntam: “Pode haver uma coleçã o com um nú mero negativo de membros? Se nã o pode,
nã o seriam os nú meros negativos um produto da imaginaçã o dos matemá ticos?”. E quanto
ao dito de Kronecker, “Deus fez os nú meros inteiros; tudo o mais é obra do homem”? Sã o os
nú meros negativos uma obra do homem?

Contabilidades, orçamentos e dívidas

As situaçõ es no mundo ilustram a ideia de contar negativamente. Quando uma família ou


governo está tentando equilibrar seu orçamento, lida com renda e despesas. A renda é
“positiva”. As despesas sã o “negativas”. O orçamento está “equilibrado” se a renda e as
despesas empatam. Ainda melhor do que um orçamento equilibrado é aquele em que há
um pequeno excedente: a renda é maior que as despesas, como um amortecedor. O
excedente no orçamento é a diferença entre a renda e as despesas, calculada por subtração .

Por exemplo, suponha que a renda mensal de uma família seja R$ 2.000,00 e as despesas
totais, R$ 1.900,00. Qual é o excedente no final do mês? Nó s nos fiamos no fato de que Deus
estabeleceu regularidades financeiras neste mundo. O dinheiro nã o desaparece no ar; nem
se materializa do nada. A quantia total de dinheiro que entra durante o mês (a renda de R$
2.000,00) deve ir para algum lugar. Parte sai de casa para pagar as despesas. O resto, o
excedente, ainda estará aí no final do mês. Portanto, as despesas mais o excedente é igual à
renda. R$1.900,00 mais o excedente dá R$ 2.000,00. Entã o, quanto é o excedente?

R$ 100,00 é a quantia certa para completar o problema de adiçã o: R$ 1.900,00 + R$ 100,00


= R$ 2.000,00. Situaçõ es como essa sã o comuns. Entã o, as escolas ensinam à s crianças
como resolver o problema por subtraçã o. A subtraçã o desfaz a adiçã o. Se R$ 1.900,00 + R$
100,00 = R$ 2.000,00, entã o R$ 2.000,00 − R$ 100 = R$ 1.900,00 e R$ 2.000,00 − R$
1.900,00 = R$ 100.

Podemos aplicar as perspectivas normativa, situacional e existencial à subtraçã o. Primeiro,


considere a perspectiva normativa. Há regras ou normas para a subtraçã o correta. Se nã o
seguirmos as regras, o dinheiro ao final do mês nã o corresponderá ao que calculamos. Em
segundo lugar, na perspectiva situacional nos concentramos na situaçã o, que envolve renda
e despesas. Há apenas muito dinheiro. Em terceiro, na perspectiva existencial nos
concentramos nas pessoas. Neste caso, a pessoa envolvida na situaçã o está fazendo um
cá lculo, mentalmente ou no papel. A pessoa tem de entender o significado da subtraçã o e
sua relaçã o com o problema de estimar o excedente ao final do mês. Tem também de
conhecer as regras da subtraçã o para que seu trabalho dê o resultado correto.

Como de praxe, podemos observar que Deus ordenou as três perspectivas. Ele colocou em
prá tica as normas; criou a situaçã o; e criou as pessoas que podem pensar seus
pensamentos depois dele. Ele ordenou as três de maneira a estarem em harmonia. Aquele
que faz um orçamento depende da harmonia na elaboraçã o do orçamento. O ponto aqui é
que, embora de algumas maneiras a subtraçã o seja conceitualmente mais complexa do que
a adiçã o, tanto a adiçã o quanto a subtraçã o se devem a Deus.

Também podemos ver o princípio do um e dos muitos. O um neste caso é o princípio geral
de que 2.000,00 − 1.900,00 = 100. Os muitos sã o os muitos casos no mundo aos quais essa
verdade aritmética se aplica: um orçamento familiar, um orçamento de negó cios, um
levantamento de negó cios, a colheita de um fazendeiro. O um e os muitos se entrelaçam,
com base em seu fundamento em Deus.

Números negativos

Agora podemos introduzir os nú meros negativos. Suponha que em um mês a renda de uma
família seja R$ 2.000,00 e as despesas R$ 2.100,00. Qual é o excedente? A regra diz que o
excedente é a diferença entre a renda e as despesas, isto é, R$ 2.000,00 − R$ 2.100,00. Mas
esse nã o é mais exatamente o mesmo tipo de problema de subtraçã o, porque as despesas
sã o maiores que a renda. Dizemos que a família nã o tem um excedente, mas um déficit de
R$ 100,00. Se a família tivesse feito uma poupança, poderia usá -la para sair do aperto.
Digamos que subtraia R$ 100,00 de um total economizado de R$ 500,00, ficando com R$
400,00 na poupança. Por outro lado, quando ela tem um excedente de R$ 100,00 num mês,
pode depositá -lo na poupança, e se começou com R$ 400,00 na poupança, terá R$ 400,00 +
R$ 100,00 = R$ 500,00.

O excedente funciona como uma adiçã o à poupança ou ao dinheiro em caixa. O déficit é


como uma subtraçã o. É negativo. Também podemos imaginar a família entrando em dívida,
devendo R$ 100,00 a um amigo, ao banco ou a uma empresa de cartã o de crédito. A dívida
também é um valor negativo, pois é algo de que a família deve se recuperar para chegar a
uma situaçã o livre de dívidas. Ela só pode se livrar das dívidas contrabalançando as dívidas
com ganhos.

Há muitas situaçõ es como essa. Essas situaçõ es no mundo sã o uma justificativa para o
conceito de nú mero negativo. Nú mero negativo é simplesmente um nú mero no “outro
lado” ou o lado negativo de uma contabilidade ou orçamento ou sistema de rastreio de
quantidades. No processo total de cá lculo ele será subtraído do total, enquanto os nú meros
no lado positivo serã o acrescentados. Em virtude das propriedades comutativa e
associativa da adiçã o, nã o faz diferença que ordem usamos para fazer as adiçõ es e
subtraçõ es. Cada caso de orçamento ou sistema de rastreio é uma representaçã o particular
do princípio dos nú meros negativos.

Uma ilustraçã o particularmente ú til dos nú meros negativos usa a reta numérica. Ela é tã o
ú til que os professores frequentemente a usam para ensinar o conceito de nú mero negativo
em sala de aula. A reta numérica é como uma fita métrica com marcaçõ es para nú meros
sucessivos: 1, 2, 3, etc. Os nú meros ficam maiores indo para a direita. À esquerda de 1 está
0, que corresponde a um orçamento equilibrado. À esquerda de 0 está − 1, que pode
significar 1 dó lar de dívida ou a falta de 1 em uma quantidade necessá ria. À esquerda de − 1
está − 2, entã o − 3, e assim por diante. Nessa direçã o a pessoa fica mais endividada. A
distâ ncia entre dois nú meros na linha representa quanto alguém teria de ganhar ou perder
para ir de uma posiçã o para outra.

Como de praxe, podemos aplicar as perspectivas normativa, situacional e existencial a essa


representaçã o através de uma reta numérica. A perspectiva normativa enfoca as regras
para somar e subtrair na reta numérica e a coerência entre três representaçõ es. Temos (1)
a representaçã o espacial através de uma linha; (2) a representaçã o numérica através de
nú meros no papel; e (3) a representaçã o mental através de ideias na mente das pessoas. A
perspectiva situacional enfoca orçamentos, levantamentos e outras situaçõ es no mundo
onde pode haver adiçã o a e subtraçã o de um valor total. A perspectiva existencial enfoca a
compreensã o das pessoas de como funciona uma reta numérica e como funcionam os
orçamentos.

Uma das propriedades “suspeitas” de um nú mero negativo é que o negativo de um negativo


é um positivo: − ( − 2) = 2. Essa regra parece contrá ria à intuiçã o para muitas pessoas,
quando a escutam pela primeira vez. Mas ela tem um exemplo no mundo. Se Bill deve R$
5,00 a Charlie, sua situaçã o é representada pelo nú mero − 5. O sinal de menos está aí
porque Bill está abaixo do zero, por estar em dívida. E se Bill adiciona mais R$ 2,00 à sua
dívida, isso é representado pela adiçã o de − 2. O sinal negativo indica que o 2 é um 2
debitado, em vez de um crédito de 2. ( − 5) + ( − 2) = − 7, para um total de R$ 7,00 de dívida
(o sinal negativo em 7 também indica dívida). Mas suponha que Charlie diga a Bill que
perdoará R$ 2,00 da dívida de R$ 5,00. O perdã o é o negativo do aumento da dívida. É a
negaçã o de − 2, ou − ( − 2). Bill está agora apenas R$ 3,00 em dívida. − 5 − ( − 2) = − 3. O
resultado líquido é o mesmo que se tivesse recebido R$ 2,00 como crédito, isto é, um 2
positivo.

Uma explicaçã o alternativa diria que a regra − ( − 2) = 2 é a ú nica forma de preservar as leis
normais da adiçã o e subtraçã o. Suponha que escrevamos 6 − 3 = 3. Isso também pode ser
escrito como 6 − (1 + 2) = 3 ou 6 − 1 − 2 = 3. Quando jogamos o parêntese, o sinal de menos
que precede o parêntese tem de ser aplicado a todos os nú meros dentro dos parênteses.
Com efeito, uma entrada de vá rios nú meros, como 1 e 2, um apó s o outro, no lado do débito
da contabilidade tem o mesmo resultado que calcular a soma de todos os débitos
normalmente (1 + 2) e entã o colocar a soma resultante no lado do débito ( − (1 + 2) = − 3).
Ora, observe que 6 − (5 − 2) = 3. Se levarmos a cabo a mesma regra sobre aplicar o sinal de
menos, resultará que 6 − 5 − ( − 2) = 3, que é simplificado como 1 − ( − 2) = 3. Claramente,
isso só funcionará se − ( − 2) = 2.

A explicaçã o com Bill e Charlie é orientada para a situaçã o da dívida e usa a perspectiva
situacional para explicar a razã o de − ( − 2) = 2. A explicaçã o em termos de leis de adiçã o
usa a perspectiva normativa. Ambas levam à mesma conclusã o, porque Deus ordenou a
harmonia nos nú meros.

A natureza dos números negativos

Os nú meros negativos, assim como os nú meros racionais, podem parecer um tipo de


“invençã o” humana quando os comparamos ao ponto de partida com os nú meros inteiros
positivos. Eles envolvem um esforço adicional na compreensã o humana. Esse esforço faz
parte do foco da perspectiva existencial. Também envolvem uma invençã o em notaçã o
(usando o sinal de subtraçã o “ − ” de uma nova maneira). Essa invençã o de notaçã o é algo
que nó s como pessoas fazemos, e por isso está em foco na perspectiva existencial. Mas o
envolvimento das outras duas perspectivas mostra que os nú meros negativos nã o sã o mera
invençã o. Eles correspondem a normas e a situaçõ es no mundo. Além disso, Deus já sabia
dessa “invençã o” antes dos seres humanos. Os seres humanos estã o pensando os
pensamentos de Deus depois dele. Segue-se que os nú meros negativos têm uma realidade,
em relaçã o aos propó sitos a que servem nos orçamentos, nas mensuraçõ es físicas e em
outras á reas de estudo.

Zero

Observaçõ es similares podem ser feitas sobre a “invençã o” do zero. Ter uma notaçã o para o
zero é uma parte importante do sistema decimal de notaçã o, que nos permite escrever de
forma compacta nú meros maiores como 20 e 1,003. O zero tem uma relaçã o com a notaçã o,
com nossa mente (a perspectiva existencial), com normas (2 + 0 = 2) e com as situaçõ es no
mundo (um orçamento equilibrado tem excedente 0 e déficit 0). Essas perspectivas se
harmonizam de acordo com o plano de Deus.
 

1
 

15. Números irracionais


 
 

A seguir, consideramos os nú meros irracionais. O nome irracional já dá pistas de uma


histó ria na qual as pessoas tinham dificuldade com eles. A maioria dos matemá ticos os
considera totalmente racionais, no sentido comum da palavra, mas o ró tulo histó rico
irracional “pegou”.

Definições de números racionais e irracionais

Número racional é um nú mero que pode ser expresso como uma razã o a/b de dois nú meros
inteiros a e b . Os nú meros racionais incluem nú meros inteiros (3, 11, 524), nú meros
negativos ( − 2, − 13), fraçõ es (1/3, 2/19), fraçõ es impró prias (fraçõ es maiores do que 1:
12/5, 14/3), fraçõ es negativas ( − 1/3, − 12/5) e nú meros mistos (2 ½, 5 ¾). (Nú meros
mistos sã o apenas uma forma alternativa de escrever fraçõ es impró prias: 2 ½ = 5/2.)

Número irracional é um nú mero que nã o é racional, mas que ainda representa uma
quantidade. A raiz quadrada de 2, designada por √2, é um desses nú meros. É definido como
o nú mero cujo quadrado é 2; isto é, quando multiplicado por si mesmo, o resultado é 2.
 
√2 × √2 = (√2) 2 = 2.
 

A raiz quadrada de 3, designada por √3, é outro nú mero irracional. √3 × √3 = 3. No entanto,


a raiz quadrada de 4 é racional. √4 = 2, porque 2 × 2 = 4 e 2 é racional.

Como sabemos se uma raiz quadrada é racional ou irracional? Pode ser demonstrado por
um argumento estritamente matemá tico que a raiz quadrada de qualquer nú mero inteiro é
irracional, exceto quando o nú mero inteiro com o qual começamos é um quadrado perfeito,
isto é, quando é o quadrado de algum outro nú mero inteiro.
Os antigos gregos associados à escola pitagó rica descobriram a dificuldade com os nú meros
irracionais. A dificuldade está ligada ao teorema pitagó rico, que diz que em qualquer
triâ ngulo retâ ngulo o quadrado do comprimento da hipotenusa é igual à soma dos
quadrados dos lados (diagrama 15.1).
 

Se os dois lados tiverem o comprimento de uma unidade cada, o quadrado da hipotenusa


deve ser 1 + 1 = 2. A pró pria hipotenusa deve entã o ter um comprimento igual à raiz
2 2

quadrada de 2, que é irracional. Esse resultado perturbou os pitagó ricos, pois eles tinham o
desejo filosó fico de ver todo o Universo em termos de razõ es de nú meros, e a raiz quadrada
de 2 nã o poderia ser expressa como uma razã o de nú meros inteiros.

Podemos dizer algo coerente sobre a raiz quadrada de 2? Podemos dizer


aproximadamente, usando decimais. A notaçã o decimal é uma maneira conveniente de
escrever nú meros em termos de potências de 10. Por exemplo, 536 significa 5 centenas (5
× 100), mais 3 dezenas (3 × 10), mais 6 (6 × 1). Esse procedimento pode ser estendido para
lidar com fraçõ es. Assim, 1/2 é 0,5 ou 5 dezenas (5 × 1/10). 1/4 é 0,25 ou 2 dezenas (2 ×
1/10 ou 2 × 0,1) mais 5 centésimos (5 × 1/100 ou 5 × 0,01). 1/3 é 0,33333… A
representaçã o decimal para 1/3 nã o termina: a sequência de três segue infinitamente. Mas
1/3 pode ser aproximado para qualquer grau desejado de precisã o ao se incluir suficientes
casas decimais. E é isso o que é geralmente feito com calculadoras eletrô nicas (embora as
operaçõ es internas de uma calculadora convertam a representaçã o decimal para
representaçã o biná ria e entã o, ao final do cá lculo, reconvertam para decimais).

Todas as fraçõ es podem ser representadas em notaçã o decimal. Alguns decimais terminam
(1/8 = 0,125). Outros seguem infinitamente (1/6 = 0,166666…). Os que seguem
infinitamente repetem um padrã o. Assim, 1/9 = 0,11111… O padrã o pode ter vá rios dígitos:
 
1/7 = 0,142857142857142857142857142857142857142857…
 

Em contraste, a representaçã o decimal de um nú mero irracional nã o repete:


 
√2 = 1,4142135623730950488…
√3 = 1,73205080756887729353…
√4 = 2,00000 (racional)
√5 = 2,23606797749978969641…
 

Pode parecer que os nú meros irracionais nã o estã o “sob controle”, já que nã o podemos
representá -los exatamente numa expansã o decimal. Mas de certo modo nã o podemos fazer
isso para muitos nú meros racionais, como 1/3 ou 1/7, já que a expansã o decimal segue
eternamente. Além disso, para raízes quadradas, raízes cú bicas ou muitos outros nú meros
irracionais, podemos programar um computador para calcular o valor para qualquer grau
desejado de precisã o.

O conceito de precisã o crescente inclui a ideia de viajar em direçã o a um limite que nunca é
alcançado. Ele tem uma afinidade com o que observamos anteriormente sobre nossa
concepçã o de nú meros naturais. Nó s nunca chegamos ao fim ou completamos o processo
de listar os nú meros naturais. Da mesma forma, nunca chegamos ao fim da expansã o
decimal de √2. Nossa finitude torna impossível realmente chegar ao fim. Mesmo assim, por
uma imitaçã o da transcendência de Deus, podemos conceber um processo indefinidamente
estendido. O nú mero irracional é um tipo de empacotamento do processo inteiro, uma vez
que o concebemos como um todo. Assim, estamos confiando na infinitude de Deus como o
fundamento para a nossa concepçã o de nú meros irracionais.

Irracionais no mundo?

Existem instâ ncias ou materializaçõ es de nú meros irracionais no mundo? Nó s podemos


cortar uma maçã em 4 pedaços, cada um dos quais sendo 1/4 de uma maçã . Mas
poderíamos ter √2 maçã s? Nã o parece ser o caso. Porque somos finitos, nã o podemos fazer
uma divisã o infinitamente nítida, quer de uma maçã , quer de uma vareta de mediçã o. As
hipotenusas de alguns triâ ngulos retâ ngulos nos oferecem casos onde ocorrem nú meros
irracionais. Mas o triâ ngulo retâ ngulo é uma idealizaçã o. Os triâ ngulos que desenhamos no
papel nã o têm linhas perfeitamente retas, as linhas nã o sã o infinitamente finas e nã o
podemos garantir que o â ngulo da base é exatamente um â ngulo reto. Ainda que
pudéssemos garantir todas essas coisas, nã o poderíamos garantir que os dois lados teriam
exatamente o mesmo comprimento. [56]

Claramente, podemos conceber nú meros irracionais em nossa mente. E podemos


estabelecer formas de calcular seus valores. Além disso, os nú meros irracionais podem
ocorrer indiretamente em teorias científicas sobre o mundo. Quando as teorias
[57]

científicas combinam bem com os experimentos, ficamos assegurados de que eles têm
relevâ ncia para o mundo.

Contudo, os nú meros irracionais nã o têm o “imediatismo” de relevâ ncia para o mundo que
podemos ilustrar com fraçõ es pequenas como 1/2 ou 2/3. Mas considere a fraçã o
2,056,197,131/5,414,760,808,353. Ela tem relevâ ncia imediata? Se nã o tem, é menos ou
mais “real” do que o nú mero irracional √2?

Deus nos fez à sua imagem. Quando tentamos pensar seus pensamentos depois dele,
podemos nos ver pensando além do imediatismo do nosso ambiente. Podemos ampliar
nosso entendimento e compreender o significado de uma fraçã o como
2,056,197,131/5,414,760,808,353, que nunca teremos oportunidade de usar de forma
prá tica. Da mesma forma, podemos compreender o significado de √2.

Entã o, por que nú meros como √2 foram chamados de irracionais ? Talvez uma fonte de
desconforto esteja no sentimento de que uma pessoa nunca poderia dominar um nú mero
como esse. Ela nunca poderia controlá -lo completamente em sua mente através de um
conhecimento direto da totalidade de sua representaçã o decimal. Mas se reconhecemos
Deus como a fonte de todo o nosso conhecimento, devemos reconhecer que nunca podemos
dominar completamente nada ! Há um mistério em todo o nosso conhecimento, pois todo
ele reflete Deus, que é infinito. Os nú meros irracionais apenas ilustram de forma mais ó bvia
o mistério.

Perspectivas

Podemos ver a mã o de Deus nos nú meros irracionais. Ele forneceu três perspectivas. Na
perspectiva normativa, temos regras ou normas fixas para os nú meros irracionais.
Podemos dar regras para calcular seus valores de forma tã o precisa quanto o desejarmos.
Podemos dar regras para usá -los em cá lculos. Na perspectiva situacional, vemos que eles
[58]

têm relevâ ncia para o mundo indiretamente, através de teorias científicas que os utilizam.
Na perspectiva existencial, podemos ver que, como seres humanos, podemos entender
tanto as regras quanto as aplicaçõ es para o mundo.

Como de praxe, a harmonia de Deus consigo mesmo garante a harmonia entre as três
perspectivas. Deus nos deu o fascínio e mistério dos nú meros irracionais como um aspecto
de um mundo rico e de mentes ricas que pensam sobre o mundo.

1
 

16. Números imaginários


 
 

A seguir, consideramos os números imaginários . A partir do nosso levantamento anterior


de diferentes tipos de nú meros, o padrã o deve ser claro. À medida que seguimos, viajamos
para mais longe do mundo da experiência cotidiana. Mas Deus dá coerência a essas regiõ es
mais distantes, assim como faz com a experiência cotidiana. Ele sabe tudo sobre essas
coisas antes de nó s, e sua pró pria coerência arquétipa provê o fundamento. Nó s podemos
desfrutar de cada á rea da matemá tica como um dom dele. Quando vemos beleza, podemos
agradecer-lhe e louvá -lo, pois ela reflete a beleza original dele.

O que são números imaginários?

A expressã o número imaginário evoca a dificuldade que as pessoas encontraram


historicamente na tentativa de decidir sobre a legitimidade de uma nova regiã o da
matemá tica. Ela é de fato nova, na comparaçã o com tudo o que discutimos até agora.
Historicamente, os nú meros imaginá rios eram nú meros “fabricados”, deliberadamente
introduzidos como um produto “artificial” para fornecer soluçõ es a equaçõ es que de outra
forma nã o teriam soluçõ es ou nã o teriam soluçõ es suficientes.

Considere a equaçã o
 
x 2 = −1
 

Podemos encontrar uma soluçã o? Isto é, podemos encontrar um nú mero x cujo quadrado
seja − 1? O quadrado de 1 é 1. O quadrado de − 1 também é 1, pois o produto de dois
nú meros negativos é positivo: ( − 1) × ( − 1) = 1. Nã o ajudará buscar uma soluçã o entre
nú meros racionais ou irracionais, já que todo quadrado de um nú mero positivo ou negativo
é positivo. Poderíamos dizer, portanto, que a equaçã o “nã o tem soluçã o”.

Mas os matemá ticos tentaram ver o que aconteceria se “inventassem” uma soluçã o, de uma
maneira aná loga à extensã o do sistema numérico de nú meros inteiros para fraçõ es, daí
para nú meros negativos e daí para nú meros irracionais. Os matemá ticos simplesmente
inventaram um novo símbolo. O símbolo padrã o é i . Os matemá ticos definem i como um
“nú mero” cujo quadrado é − 1. Eles assumem que, assim como para os nú meros ordiná rios,
as mesmas leis bá sicas valem para esse novo “nú mero”. (Note que, ao se referir à s leis, eles
usam a perspectiva normativa.)

Uma vez que temos i , podemos formar mú ltiplos de i : 2 i , i /4 e i √3. Estes também sã o
nú meros imaginá rios. A expressã o número complexo é o nome dado a nú meros formados
pela adiçã o de um nú mero real (racional ou irracional) a algum mú ltiplo de i . Por exemplo,
2 + 5 i , 1 − 3 i , 1/2 + 3 i /2 e √3 + i √2 sã o nú meros complexos. Os nú meros que nã o
envolvem i sã o chamados de números reais , para indicar que sã o distintos dos nú meros
complexos.

As leis normais da aritmética relativas à adiçã o, subtraçã o, multiplicaçã o e divisã o ainda


valem para esses novos nú meros, os nú meros complexos. Usando nú meros complexos, os
matemá ticos podem fornecer soluçõ es a qualquer equaçã o algébrica. Por exemplo,
admitindo nú meros complexos, eles podem mostrar que qualquer equaçã o quadrá tica ax + 2
bx + c = 0 tem exatamente duas soluçõ es (ou uma soluçã o ocorrendo duas vezes). Algumas
equaçõ es quadrá ticas já têm soluçõ es usando nú meros reais. Por exemplo, 2x + 3x + 1 = 0
2

tem duas soluçõ es, x = − 1 e x = − 1/2. Mas outras equaçõ es, como x + 1 = 0 ou x + x + 1 = 0
2 2

nã o têm soluçõ es usando apenas nú meros reais. Da mesma forma, se admitimos nú meros
complexos, qualquer equaçã o cú bica ax + bx + cx + d = 0 tem exatamente três soluçõ es
3 2

(ou uma soluçã o ocorrendo três vezes, ou duas soluçõ es, uma das quais ocorrendo duas
vezes). Por outro lado, se nos recusamos a usar nú meros complexos, as equaçõ es
quadrá ticas podem ter ou nã o soluçã o. Os nú meros complexos conquistaram o coraçã o dos
matemá ticos nã o só por causa desse belo resultado, mas também por causa de muitas
outras belezas que existem na teoria das funçõ es complexas.

Os nú meros complexos também conquistaram o coraçã o dos cientistas através das


aplicaçõ es no mundo da ciência. Particularmente notá vel é a mecâ nica quâ ntica, que usa os
nú meros complexos de uma maneira indispensá vel. Por que essa “invençã o” da mente dos
matemá ticos, que estavam à procura de belezas no mundo da matemá tica abstrata, deveria
séculos mais tarde encontrar aplicaçõ es na física? Deus em sua sabedoria fez isso assim.

Perspectivas sobre os números imaginários

Como de praxe, podemos considerar os nú meros imaginá rios a partir das perspectivas
normativa, situacional e existencial. A perspectiva normativa observa que os nú meros
imaginá rios e os nú meros complexos obedecem à s mesmas leis bá sicas dos nú meros
ordiná rios e se comportam de forma consistente. As belas propriedades desses nú meros
vêm de Deus, que é belo. Essa é uma garantia de que esses nú meros sã o “reais”, pois sã o
conhecidos por Deus, em vez de apenas “imaginá rios”.

A perspectiva situacional observa as aplicaçõ es dos nú meros imaginá rios ao mundo da


ciência. Existe coerência entre as leis normativas e o modo como o mundo funciona.

A perspectiva existencial observa que podemos coerentemente entender e raciocinar sobre


esses nú meros. Nosso raciocínio, quando feito corretamente (normativamente!), está em
harmonia com as normas objetivas de Deus e com o mundo.

1
 

17. O infinito
 

 
O infinito é um nú mero? Já lidamos com a ideia do infinito em conexã o com o sistema
numérico natural. A lista de nú meros naturais, 1, 2, 3, … se estende indefinidamente.
Poderíamos dizer que segue “eternamente” ou que existe um nú mero infinito de nú meros
naturais. No apêndice sobre a teoria dos conjuntos (Apêndice E), consideramos os
conjuntos infinitos, alguns dos quais sendo em certo sentido até “maiores” que o conjunto
de nú meros inteiros nã o negativos. Como devemos considerar a ideia do infinito?

Os limites humanos

A ideia do infinito leva diretamente à discussã o anterior que tivemos sobre o conhecimento
humano em comparaçã o com o conhecimento de Deus (Capítulo 5). Somos finitos. Ao
mesmo tempo, conhecemos o Deus infinito. Podemos conhecer o infinito conhecendo Deus.
Nosso conhecimento é genuíno, assim como nosso conhecimento sobre Deus é genuíno,
sem ser exaustivo. Nã o compreendemos Deus, no sentido especial da palavra compreender .
Nem conseguimos dominar nosso conhecimento sobre ele, nem sabemos tudo o que ele
sabe, nem o sabemos da mesma maneira que ele. Há um mistério para nó s, pois Deus
excede o nosso alcance.

As mesmas verdades sã o relevantes quando consideramos o infinito na matemá tica. Como


seres humanos finitos, nunca chegamos ao fim da sequência de nú meros naturais. Nunca
esgotamos o infinito. Pelo contrá rio, ao imitar a transcendência de Deus em nosso nível
finito, vemos o padrã o geral de progressã o na sequência numérica e imaginamos sua
extensã o indefinida. O mesmo tipo de princípio se aplica a todos os casos em que a ideia de
infinito surge na matemá tica. O infinito é um tipo de limite ou extrapolaçã o da nossa mente,
e sabemos suficientemente bem, quando refletimos sobre o nosso conhecimento, que
nunca o alcançamos literalmente. Todavia, podemos trabalhar com a ideia, pois Deus nos
deu a capacidade de fazê-lo como pessoas criadas à sua imagem.

A teoria dos conjuntos moderna (Apêndice E) nã o nos deu um infinito, mas muitos. Além do
conjunto de nú meros naturais existem conjuntos adicionais, como o conjunto potência do
conjunto de nú meros naturais e os conjuntos potências construídos no topo disso, que se
estendem para cima indefinidamente. A teoria dos conjuntos pode definir quando dois
conjuntos representam o “mesmo nível” de infinito, isto é, quando podemos estabelecer
uma correspondência de um-para-um entre os membros dos dois conjuntos. Mas também
pode ser mostrado que existem conjuntos “maiores” que nã o estã o em correspondência de
um-para-um com os nú meros naturais. Os detalhes devem ser deixados para as
tecnicidades da teoria dos conjuntos. Mas o resultado é que há toda uma série de conjuntos
infinitos cada vez maiores.

O que fazemos com essas ideias? Alguns matemá ticos, os “finitistas”, suspeitam de todos os
infinitos, mesmo o menor, a infinidade de nú meros naturais. Outros abraçam toda a série
de infinitos maiores com deleite. Eu estou mais perto do ú ltimo grupo, pois vejo a beleza da
infinidade arquétipa de Deus refletida nas torres dos infinitos na teoria dos conjuntos. Deus
é bom e nos deu muitas maravilhas. As maravilhas incluem nã o só as belezas das
montanhas, das flores e do pô r-do-sol, mas — para aqueles que têm a capacidade de
apreciá -las — as belezas da matemá tica e as belezas desses infinitos na teoria dos
conjuntos. Tudo é devido a Deus. Podemos abraçar esses infinitos como uma dá diva e nos
regozijar.

Ao mesmo tempo, tenho uma simpatia pelos finitistas. Eles têm um argumento — uma
ponta de verdade a seu favor. Sã o, com razã o, sensíveis à questã o das limitaçõ es humanas e
da finitude humana. Eles corretamente entendem que ninguém que é ser humano pode
compreender ou exaurir o infinito. Os conjuntos que sã o chamados “infinitos” sã o
manipulados pelos matemá ticos, pois temos símbolos e regras para manipulaçã o. As regras
representam verdades sobre a transcendência em miniatura e sua imitaçã o da
transcendência de Deus. Mas elas nã o criam literalmente conjuntos infinitos como se
fossem objetos no mundo, contendo, digamos, um nú mero infinito de á tomos. (Só existe um
nú mero finito de á tomos dentro do Universo visível.)

Quando raciocinamos sobre conjuntos infinitos, estamos continuamente projetando além


das nossas limitaçõ es, com base na analogia entre nossa mente e a mente de Deus. Nã o
entendemos de forma plena o que estamos fazendo. E de fato nos primeiros dias da teoria
dos conjuntos infinitos, conforme desenvolvida por Georg Cantor, os investigadores
confrontaram paradoxos. [59]
É fá cil produzir uma contradiçã o se deixarmos nosso
raciocínio fugir de nó s e nã o atuarmos com moderaçã o. A histó ria da teoria dos conjuntos
no século XX pode ser entendida em grande parte como uma histó ria de explorar e lutar
com nossas limitaçõ es e de como podemos evitar contradiçõ es em nosso raciocínio
enquanto ampliamos nosso raciocínio para domínios que nunca podemos totalmente
dominar.

Exploraremos melhor esse reino quando o fizermos para a gló ria de Deus e para o seu
louvor.

1
 
 
 
 
 
 
 
Parte 5 — GEOMETRIA E MATEMÁTICA SUPERIOR
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

18. Espaço e geometria


 
 

Agora vamos nos voltar para considerar a geometria. Como ela se relaciona com Deus?
Podemos confiantemente assumir que ela se deve a Deus, mas podemos dizer mais coisas?

Espaço

A geometria, como subdisciplina dentro da matemá tica, recebe algumas de suas motivaçõ es
da nossa experiência ordiná ria do espaço. Os antigos egípcios e babilô nios, na preparaçã o
para seus grandes projetos de construçã o, tiveram de trabalhar relaçõ es e mediçõ es
espaciais com cuidado, e observaçõ es geométricas de ordem prá tica podem ser
encontradas já em 1900 a.C. A geometria parece ter tido uma origem prá tica em conexã o
com as mediçõ es no espaço. Chegou a uma formulaçã o rigorosa clá ssica em Elementos de
Euclides.

Assim, comecemos com a ideia de espaço. A descriçã o da criaçã o em Gênesis 1 implica que
Deus ordenou a estrutura espacial do mundo no qual vivemos. Em geral, Gênesis 1 enfoca
coisas e açõ es dentro do espaço e nã o no pró prio espaço. Mas isso nã o indica que Deus
“separou” grandes regiõ es. Deus separou os céus da terra em Gênesis 1.6-8 e o mar da terra
seca nos versículos 9-10. Em Gênesis 1 como um todo Deus criou uma habitaçã o de grande
escala, que é preenchida com sua presença (Jr 23.24).

O taberná culo de Moisés, como observamos (Capítulos 7-8), é uma habitaçã o em miniatura,
uma “có pia” ou “imagem” da habitaçã o maior de Deus nos céus e no Universo como um
todo. O taberná culo exibe relaçõ es numéricas e proporçõ es numéricas simples. Ao mesmo
tempo, exibe relaçõ es espaciais e proporçõ es espaciais nos dois á trios e em alguns itens de
mobiliá rio (a mesa para o pã o da presença tem 1 por 2 por 1 cô vados). Assim, o
taberná culo nos convida a ver uma relaçã o entre suas formas e a “forma” do mundo maior,
incluindo suas características espaciais.

Podemos perguntar sobre o arquétipo para o taberná culo. Os á trios do taberná culo sã o
imagens ou sombras da habitaçã o celestial de Deus entre os anjos. E essa habitaçã o teria
uma raiz mais profunda? Teria. O taberná culo e os céus apontam ambos para Cristo, que é a
habitaçã o de Deus (Jo 1.14; 2.21). O Novo Testamento indica ainda que a comunhã o de
Cristo com Deus o Pai existia antes de o mundo começar (Jo 1.1). Essa comunhã o assume a
forma de habitação . Joã o 17.21 indica que o Pai está no Filho e o Filho está no Pai, num
contexto que reflete de volta as relaçõ es trinitá rias eternas (17.5, 24).

Essa habitaçã o mú tua, que inclui o Espírito Santo, é chamada de coinerência . Uma vez que
Deus é ú nico e infinito, a habitaçã o das pessoas da Trindade umas nas outras é algo
misterioso para nó s. Não é uma relaçã o espacial da forma que experimentamos no mundo
criado. Deus nã o é espacialmente divisível, como se uma parte dele pudesse estar aqui e
outra ali. A relaçã o nã o é de fato “espacial” se o que queremos dizer com “espaço” é
determinado apenas por nossa experiência de espaço no mundo criado.

Significa isso que a linguagem da habitaçã o nã o significa nada de fato? Nã o, ela tem um
significado para nó s. Está indicando que há uma analogia , mas nã o identidade, entre a
habitaçã o no taberná culo ou habitaçã o do Espírito Santo num crente (Jo 17.23; compare
com 14.16-17, 23) e a habitaçã o arquétipa entre as pessoas da Trindade. O arquétipo, como
de praxe, nã o é igual ao éctipo. Todavia há uma relaçã o entre os dois, como indicado pelas
expressõ es usadas. Nó s nã o podemos compreender essa relaçã o porque somos finitos e
Deus é Deus. Mas podemos entender a realidade da analogia entre a habitaçã o do Espírito
Santo em nó s e o símbolo do Antigo Testamento do templo: “Será que vocês nã o sabem que
o corpo de vocês é o templo do Espírito Santo, que vive em vocês e lhes foi dado por Deus?”
(1Co 6.19, NTLH). O templo, por sua vez, como já observamos, evoca analogias com o
taberná culo de Moisés, com a habitaçã o celestial de Deus, e entã o finalmente com o
arquétipo, a coinerência das pessoas da Trindade.
Podemos levar a analogia um passo adiante e nos mover da imagem do templo para o
Universo como um todo. O Universo é a habitaçã o em grande escala de Deus. Entã o, o
cará ter espacial do Universo tem seu arquétipo em Deus e, mais especificamente, tem um
arquétipo na coinerência de pessoas na Trindade.

As leis do espaço: geometria

O espaço reflete a presença de Deus e assim atesta seu Criador. E as leis acerca do espaço,
como as leis da geometria, têm sua origem, como todas as leis, no discurso de Deus.

Mas de que tipo de espaço estamos falando? Aqui devemos ver que a geometria euclidiana,
tal como axiomatizada por Euclides e posteriormente refinada por matemá ticos como
David Hilbert, está relacionada ao espaço como nó s o experienciamos, mas é uma
idealizaçã o. Se desenharmos uma linha no papel, ela nã o é perfeitamente reta, ainda que
usemos uma régua para nos ajudar. Ela também nã o é perfeitamente fina (sem largura).
Sua interseçã o com uma segunda linha nã o é um ponto adimensional, mas um pouco de
tinta ou um pouco de grafite de lá pis que cobre uma pequena á rea. A ideia do ponto
adimensional e a ideia da linha sem largura sã o extrapolaçõ es para evitar as distraçõ es e
complexidades envolvidas com linhas de 0,2 mm de largura.

A geometria de Euclides ilustra o entrelaçamento do um e dos muitos. Considere um


teorema específico na geometria de Euclides, a saber, o teorema de que os dois â ngulos da
base de um triâ ngulo isó sceles sã o iguais. (Triâ ngulo isó sceles é um triâ ngulo em que dois
dos lados sã o de igual magnitude. Os dois â ngulos opostos a esses dois lados sã o entã o
também de igual magnitude.) Esse teorema é um teorema geral . Devemos entender que ele
vale para todos os casos específicos de triâ ngulos isó sceles, de vá rios tamanhos e formas.
Os casos específicos sã o muitos. A verdade ú nica é uma só . Nó s entendemos o significado
da verdade ú nica através de suas muitas ilustraçõ es, e dessa forma entendemos o
significado completo da propriedade dos â ngulos iguais de um determinado triâ ngulo
quando o vemos em relaçã o com o teorema geral. O teorema geral torna possível nã o
precisarmos repetir nosso raciocínio toda vez que temos um novo caso de triâ ngulo
isó sceles. Como observamos anteriormente (Capítulo 2), esse entrelaçamento do um e dos
muitos depende de Deus.

No século XX a situaçã o acabou se revelando ainda mais complicada. A teoria geral da


relatividade de Einstein postulava que o espaço (juntamente com o tempo, que é tratado
como uma quarta dimensã o nã o estritamente isolá vel das dimensõ es espaciais) é curvo,
nã o euclidiano. O famoso postulado paralelo de Euclides acabaria, acerca do espaço no qual
realmente vivemos, nã o sendo estritamente verdadeiro. A descoberta de geometrias
[60]

nã o euclidianas (onde o postulado paralelo nã o se confirmava) chocou as intuiçõ es de


muitos matemá ticos, e os físicos ficaram ainda mais chocados quando ouviram de Einstein
que essas geometrias nã o euclidianas tinham relevâ ncia para o mundo real.

 
Perspectivas sobre o espaço e a geometria

O que um cristã o deve pensar? Vemos aqui uma relaçã o complexa entre as três
perspectivas de John Frame. Para a perspectiva existencial, as intuiçõ es humanas estã o em
foco. As intuiçõ es, até o trabalho em postulados nã o euclidianos no século XIX, diziam que o
espaço tinha de ser euclidiano. Mas, evidentemente, as intuiçõ es haviam sido treinadas por
centenas de anos de domínio pelos Elementos de Euclides, o texto clá ssico sobre geometria.
Se as pessoas parassem para observar, teriam o tempo todo percebido que Euclides
apresentara uma idealizaçã o e que os teoremas de Euclides exibiam o mistério do
entrelaçamento do um e dos muitos. Essas características poderiam tornar mais fá cil
reconhecer que Deus pode agir como quiser e que o mundo no qual vivemos poderia nã o
ser euclidiano.

A perspectiva normativa de Frame enfoca as leis da geometria. Mas as leis que Euclides
formulou sã o uma idealizaçã o. Portanto se aproximam do que Deus ordenou, mas nã o
necessariamente coincidem com o que ele ordenou que fosse verdade para o mundo. Essa
aproximaçã o, claro, estava na mente de Deus antes de estar em nossa mente. Deus a
preparou como um trampolim no processo pelo qual os seres humanos cresceriam na
compreensã o do mundo de Deus e cresceriam no louvor a Deus. A formulaçã o de Euclides
ainda é ú til como um sistema axiomá tico para o mundo da mente e é usada hoje por físicos
e matemá ticos que estã o bem conscientes de que ela nã o corresponde perfeitamente com o
mundo à nossa volta.

Finalmente, consideramos a perspectiva situacional. Essa perspectiva enfoca o mundo.


Aqui é onde apreciamos o mundo tal como nos foi dado por Deus e consentimos em
acreditar que ele é nã o euclidiano, de acordo com a descriçã o de Einstein. Também
devemos reconhecer que a descriçã o de Einstein tampouco é ú ltima. É uma idealizaçã o
perspicaz de alguns aspectos do mundo, nã o de todos. Se levarmos a sério o fato de que
Deus fez um mundo de grande riqueza, evitamos a tentaçã o de ser reducionistas sobre o
espaço e a geometria e sobre outros campos.

Geometria analítica

Outra questã o nos confronta, a saber, a relaçã o entre o espaço e os nú meros. Há uma rica
relaçã o. René Descartes inventou a geometria analítica, que era uma maneira rigorosa de
descrever linhas e formas no espaço usando ferramentas numéricas algébricas. Para cada
ponto no espaço bidimensional é atribuído um par de nú meros ( x , y ), onde x é a distâ ncia
do ponto de um eixo vertical fixo e y é a distâ ncia do ponto de um eixo horizontal fixo
(diagrama 18.1).
 
 

Esse arranjo técnico permite que as pessoas usem nú meros nã o apenas para falar sobre um
ú nico ponto, mas também sobre uma linha reta, um círculo, uma elipse, uma pará bola e
outros objetos geométricos. O arranjo desvelou muitas harmonias belas entre os dois
reinos, o reino do nú mero e o reino do espaço.

Você pode imaginar que essas harmonias sã o uma tentaçã o para algumas pessoas, no
sentido de que podem tentar reduzir o espaço a nú meros. O espaço, no entender delas,
consiste apenas de nú meros em outro formato. Mas nossa experiência ordiná ria contradiz
essa afirmaçã o. Se levarmos Deus em conta, poderemos inferir que Deus nos dá uma
experiência ordiná ria, e nã o apenas a aná lise matemá tica posterior, como um aspecto ou
forma da realidade. Portanto, a tentativa filosó fica reducionista nã o se justifica. Em vez
disso, devemos dizer que Deus ordenou a harmonia entre os dois reinos. A harmonia é tã o
meticulosa que as propriedades de um podem ser deduzidas a partir do outro. As relaçõ es
nã o seguem apenas um caminho, dos nú meros para a geometria. Também é possível
representar verdades numéricas de uma forma geométrica. Por exemplo, a adiçã o de dois
nú meros pode ser representada no espaço usando-se uma reta numérica. Temos um
segmento de reta, de comprimento 2, para representar o nú mero 2 e outro segmento de
reta, de comprimento 3, para representar o nú mero 3. Quando os tomamos de cabo a rabo,
o comprimento total é 5.
 
 
 

Números reais

Uma das questõ es que surgem quando olhamos para o espaço é a questã o da continuidade.
Podemos imaginar nos movendo gradualmente ao longo de uma linha até chegarmos ao
nosso destino. O movimento gradual é um movimento contínuo, sem solavancos ou pausas.
Essa percepçã o leva por extrapolaçã o à ideia de o espaço sendo infinitamente divisível e
suave entre quaisquer divisõ es, por diminutas que sejam. Os pontos ao longo de uma linha
sã o compará veis a nú meros reais, expressos em expansõ es decimais infinitamente longas.
Ambos os infinitos, o do espaço e o do tempo, sã o idealizaçõ es. Como de praxe, podemos
reconhecer nossa finitude. Mas também podemos reconhecer que temos uma capacidade,
dada por Deus, de explorar essas idealizaçõ es e ver o que acontece. A partir dessas fontes
vem a teoria das variá veis reais.

E trata-se de uma bela teoria. Ela se baseia nas intuiçõ es provenientes tanto da nossa
experiência dos nú meros quanto da nossa experiência do espaço. Mas a teoria também
viaja além delas. E os matemá ticos tentam tornar “rigorosas” as maneiras em que eles
viajam além delas. No desenvolvimento da teoria das variá veis reais, assim como no
desenvolvimento da teoria dos conjuntos, foram encontrados paradoxos quando a mente
humana tentou avançar em direçã o ao infinito. É melhor deixar a histó ria desses
desenvolvimentos para outros livros. Os paradoxos mostram uma vez mais o mistério
associado ao nosso ser finito e também à nossa capacidade de pensar os pensamentos de
Deus depois dele.

1
 

19. Matemática superior


 
 

Ao longo dos séculos, os matemá ticos desenvolveram cada vez mais subdisciplinas e
continuaram a desvelar belezas extraordiná rias, assim como ordiná rias, em novos
resultados. Essas á reas mais novas de exploraçã o sã o todas dá divas de Deus e todas elas
refletem a beleza, sabedoria e fidelidade de Deus. Todas elas se tornam, para aqueles que
vieram a amar a Deus através da obra de Cristo, motivos de louvor.

Subdisciplinas
As novas subdisciplinas têm surgido principalmente através de processos que envolvem o
reconhecimento de padrõ es comuns e estruturas comuns pertencentes a mais de uma
instâ ncia dentro de ramos já existentes da matemá tica. Por exemplo, a á lgebra elementar é
construída sobre a aritmética ao ver padrõ es comuns em muitas instâ ncias em que lidamos
com nú meros. A á lgebra abstrata é desenvolvida sobre a á lgebra elementar e generaliza a
partir de padrõ es vistos em operaçõ es algébricas comuns, como a adiçã o e a multiplicaçã o.

No discernimento de padrõ es comuns, vemos uma dependência do entrelaçamento do um e


dos muitos. O um, neste caso, é o padrã o comum. Os muitos sã o as instâ ncias que ilustram
ou exibem o padrã o. A abstraçã o, que é uma característica comum da matemá tica, é um
processo de se concentrar no um, o padrã o comum, em meio aos muitos.

Até certo ponto, a matemá tica também foi influenciada pelos problemas matemá ticos
apresentados dentro da física e de outras ciências. Vemos no relacionamento entre a
matemá tica e as ciências uma confirmaçã o da harmonia entre as disciplinas, uma harmonia
que remonta a Deus, que ordenou todas elas.

O discreto e o contínuo

A partir da diferença entre estruturas que sã o discretas e estruturas que sã o contínuas ,


surge uma importante distinçã o de subcampos dentro da matemá tica. Grosso modo,
[61]

uma estrutura discreta é aquela em que cada elemento individual é isolado de todos os
demais. Estrutura contínua é aquela em que os elementos individuais pertencem a um todo
no qual se pode mover continuamente de um elemento para outro. Nenhum elemento é
isolado. Estruturas discretas têm uma relaçã o pró xima com nú meros inteiros, que sã o os
casos mais intuitivamente acessíveis de estrutura discreta. Cada nú mero é distinto dos seus
vizinhos. Estruturas contínuas têm uma relaçã o pró xima com espaço e geometria. Nosso
ponto de partida intuitivo para entender a ideia da continuidade usa imagens do espaço.

Álgebra , no sentido mais geral, é o estudo de estruturas discretas. Geometria e topologia ,


que é um tipo de generalizaçã o da geometria comum, estuda estruturas contínuas. Mas os
dois lados se enriquecem mutuamente através da interaçã o. A geometria algébrica e a
topologia algébrica mostram por seus nomes que sã o disciplinas de combinaçã o. A aná lise
real e complexa usa a ideia da continuidade de uma maneira vital, mas ainda lida com
elementos que sã o de tipo numérico. Entã o, essas disciplinas mostram a fecundidade do
cruzamento. A teoria analítica dos nú meros usa a aná lise real e complexa no processo de
responder questõ es sobre os nú meros naturais. Também envolve uma interaçã o do
contínuo (“aná lise”) com o discreto (os nú meros naturais).

Dependência de Deus
Todas essas disciplinas contam com um ponto de partida que envolve nossas intuiçõ es
sobre os nú meros, ou nossas intuiçõ es sobre o espaço, ou ambas. As disciplinas também
mostram uma interaçã o das perspectivas normativa, situacional e existencial. A perspectiva
normativa é a mais comum para usar na exposiçã o da matemá tica, pois os livros didá ticos e
as explicaçõ es se concentram em demonstrar as verdades sobre a matemá tica. Ao mesmo
tempo, os problemas e exercícios mostram como aplicar as verdades a exemplos
específicos. E muitas á reas da matemá tica superior têm aplicaçõ es nas ciências, de modo
que a perspectiva situacional é aqui apropriada. Quando observamos que a matemá tica
depende de nossas intuiçõ es sobre nú meros e espaço e da nossa capacidade de abstrair e
generalizar a partir de exemplos específicos, estamos nos concentrando nas capacidades
dos seres humanos, e assim estamos usando a perspectiva existencial.

As disciplinas transversais também dependem repetidamente da harmonia intrínseca entre


nú mero e espaço. Como já observamos, essa harmonia remonta a Deus, que ordenou
ambos. A distinçã o entre nú mero e espaço é a distinçã o mais notá vel que está ligada pela
harmonia ordenada por Deus. Mas em sentido mais amplo podemos ver distinçõ es menos
notá veis em toda a matemá tica. Cada nú mero é o que é e tem propriedades distintas.

Por exemplo, o nú mero dois é par, enquanto três é ímpar. Dois é o ú nico primo par
(nú mero primo é um nú mero que nã o tem divisores inteiros positivos, exceto um e ele
mesmo). Três é o menor nú mero triangular nã o trivial (nú mero triangular é um nú mero
que é a soma de nú meros inteiros sucessivos, começando com 1. Três é um nú mero
triangular porque 3 = 1 + 2. O pró ximo nú mero triangular depois de 3 é 6 = 1 + 2 + 3). Cada
nú mero tem algumas propriedades que sã o exclusivas dele.

Além disso, cada tipo de nú mero, como fraçõ es ou nú meros negativos, tem sua pró pria
singularidade. De acordo com nossa postura antirreducionista (Capítulo 4), cada coisa é o
que é — e nã o é exaustivamente redutível a nenhuma outra coisa. Uma abordagem
[62]

antirreducionista deveria positivamente apreciar cada objeto matemá tico, assim como cada
flor de cravo, cada esquilo, cada carvalho e cada pessoa. Nó s afirmamos os muitos, e nã o
simplesmente o um, como objetos de apreciaçã o. À medida que nossa apreciaçã o aumenta,
nosso louvor a Deus também deveria aumentar. A sabedoria, infinitude e beleza de Deus
sã o refletidas nas coisas que ele fez e nas mentes que ele fez.
 

1
 

Conclusão
 
 
Quando Deus criou o mundo, também ordenou todas as características do mundo. É ele
quem especifica todas as verdades sobre o mundo, incluindo as verdades da matemá tica.

O discurso de Deus revela o seu cará ter. Seu discurso é divino, com características divinas,
e esse discurso inclui verdades sobre a matemá tica. Porque cada aspecto deste mundo
revela o cará ter de Deus, é uma questã o delicada o que reflete a necessidade do cará ter de
Deus e quem ele é e, por outro lado, o que reflete a contingência das decisõ es que Deus fez
para criar um mundo como o que desfrutamos.

Em todo caso, o mundo reflete o cará ter de Deus e revela Deus, de modo que deveríamos
responder em adoraçã o e louvor. Cristo o Senhor nã o é apenas o Criador do mundo, mas
também seu Redentor. Através da fé nele podemos nos reconciliar com Deus e deixar de
suprimir a verdade sobre Deus que ele revela no mundo. Mas o processo de recuperaçã o é
gradual. A Bíblia descreve, como um aspecto do processo, a renovaçã o da mente:

Rogo-vos, pois, irmã os, pelas misericó rdias de Deus, que apresenteis o vosso corpo por sacrifício vivo,
santo e agradá vel a Deus, que é o vosso culto racional. E nã o vos conformeis com este século, mas
transformai-vos pela renovação da vossa mente , para que experimenteis qual seja a boa, agradá vel e
perfeita vontade de Deus. (Rm 12.1-2)

Como parte da renovaçã o da nossa mente, precisamos ser renovados em nosso


pensamento sobre a matemá tica. Cada vez mais, precisamos vê-la como uma dá diva de
Deus que reflete o doador — e dar graças com uma devoçã o cada vez maior. Que este livro
possa ajudar no processo.

1
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUPLEMENTOS
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Recursos
 
 

Este livro representa um começo, nã o um fim. Outras pessoas já escreveram sobre a


relevâ ncia da fé cristã na matemá tica, e ainda outras escreverã o mais no futuro. Um
recurso importante é encontrado no livro de James Nickel, Mathematics: Is God Silent?
[Matemá tica: Deus está em silêncio?], que contém nã o só muita informaçã o histó rica,
[63]

mas também ilustraçõ es que sã o ú teis para o ensino da matemá tica. Há também um artigo
anterior, Vern S. Poythress, “A Biblical View of Mathematics” [Uma visã o bíblica da
matemá tica]. [64]

Recursos para o ensino e para discussõ es adicionais também podem ser encontrados junto
à Associaçã o para Cristã os nas Ciências Matemá ticas. Essa associaçã o fornece um fó rum
para discussõ es relacionadas à fé cristã , teologia, matemá tica e á reas afins, como a ciência
da computaçã o. Ela tem vá rios recursos, incluindo um website ,
http://www.acmsonline.org/, um jornal (Journal of the ACMS) e uma conferência bienal
(em anos ímpares).

Steve Bishop compilou uma bibliografia online para livros e artigos sobre cristianismo e
matemá tica. Ela remete a uma bibliografia mais extensa e antiga (1983) de Gene B.
[65]

Chase e Calvin Jongsma. [66]

Sou grato por dois escritos de D. H. Th. Vollenhoven que originalmente chamaram
[67]

minha atençã o para as questõ es do entendimento da matemá tica de um ponto de vista


cristã o.

Aqueles que querem colocar o pensamento cristã o sobre a matemá tica dentro de um
contexto maior podem consultar alguns dos meus livros que consideram esse contexto
maior: ciência ( Redimindo a ciência ), probabilidade ( O acaso e a soberania de Deus ),
filosofia ( Redimindo a filosofia ) e cosmovisõ es ( Inerrância e cosmovisão ).
[68]

 
 

1
 

Apêndice A
 
Teorias seculares sobre os fundamentos da
matemática
 
 

Por muito tempo as pessoas preocupadas com a filosofia da matemá tica têm discutido no
que consiste realmente a matemá tica e o que sã o os nú meros. Na maior parte dessa
discussã o Deus esteve ausente do cená rio. E isso cria dificuldades. A principal dificuldade é
que omitir Deus falsifica o cená rio nã o apenas na matemá tica, mas também, de fato, em
qualquer coisa que quisermos estudar. Deus é onipresente, todo-presente. Ele está
presente em todo o mundo e em todos os aspectos do mundo. Além disso, é governante
soberano sobre o mundo, de modo que tudo lhe deve sua existência. Deixá -lo de fora
significa deixar de fora a fonte primá ria da existência e do significado.

Reducionismos
As pessoas, no entanto, fizeram isso. Na á rea da filosofia da matemá tica, isso resultou em
reducionismo. A matemá tica fica “reduzida” a alguns aspectos do mundo. A histó ria da
filosofia tem visto vá rios concorrentes principais para a explicaçã o da matemá tica:
platonismo, empirismo, logicismo, intuicionismo, formalismo e predicativismo. Cada um
[69]

deles tem um ponto de partida favorito. Esse ponto de partida se torna a plataforma
preferida para explicar tudo o mais na matemá tica.

O platonismo começa com um reino ideal, que contém ideias abstratas, incluindo os
nú meros e todas as verdades matemá ticas. Esse reino abstrato supostamente existe antes
de o matemá tico começar seu trabalho. O empirismo começa com a experiência sensorial,
como a experiência de ver quatro maçã s. O logicismo começa com a ló gica. O intuicionismo
começa com a subjetividade humana e especialmente com as intuiçõ es mentais sobre os
nú meros e objetos matemá ticos. O formalismo começa com a linguagem, especialmente
com as linguagens formais elaboradas usadas na teoria da prova matemá tica. O
predicativismo, uma visã o de certa forma intermediá ria entre o platonismo e o
intuicionismo, aceita os nú meros inteiros 1, 2, 3… como nã o problemá ticos. Eles podem ser
aceitos ou por causa de sua existência platô nica, ou através da intuiçã o. O predicativismo só
aceita objetos matemá ticos mais complexos quando esses objetos podem ser “construídos”
gradualmente a partir dos nú meros naturais, por um ou mais está gios.

De acordo com o platonismo, a matemá tica deriva realmente do reino ideal da verdade. De
acordo com o empirismo, a matemá tica surge a partir das generalizaçõ es humanas,
começando com a experiência sensorial de objetos contá veis e objetos espacialmente
estendidos. De acordo com o logicismo, a matemá tica deriva da ló gica. E assim por diante
para os outros pontos de vista.

Podemos ver que cada uma dessas abordagens reduz a matemá tica ao seu ponto de partida
favorito. Essas abordagens esperam explicar o conjunto da matemá tica como uma
derivaçã o nã o problemá tica desse ponto de partida focal. Mas algumas das abordagens, ao
que parece, têm lacunas nas suas explicaçõ es que nã o podem ser preenchidas. Outras têm
implausibilidades. E todas sofrem de uma falha em explicar plenamente o cará ter
multidimensional da matemá tica que experimentamos na prática à medida que usamos a
matemá tica no que se refere ao mundo e no que se refere a uma variedade de reinos de
pensamentos. Deus ordenou um mundo com diversidade. Embora o mundo exiba
harmonias entre a física e a matemá tica, entre a contagem e o espaço, e assim por diante,
essas harmonias nã o dissolvem a riqueza.

Algumas das abordagens filosó ficas podem ser classificadas usando-se as três perspectivas
de Frame sobre ética. O platonismo e o logicismo têm uma afinidade com a perspectiva
normativa. Postulam normas para a matemá tica, normas que se originam ou de um reino
ideal (platonismo), ou da ló gica (logicismo). O empirismo na matemá tica tem uma
afinidade com a perspectiva situacional. Enfoca os laços entre a matemá tica e o mundo que
experienciamos. O intuicionismo tem uma afinidade com a perspectiva existencial. Começa
com a mente humana e enfoca suas intuiçõ es subjetivas sobre os nú meros. O formalismo e
o predicativismo sã o mais difíceis de classificar. O formalismo tem um foco nas linguagens
formais, que possuem características que sã o normativas (regras para derivaçõ es) e
características que sã o externas à subjetividade humana (os símbolos da linguagem escrita
estã o “no mundo”, na situaçã o). O predicativismo acredita tanto em normas — na
existência objetiva de objetos matemá ticos menos complexos — quanto na necessidade de
cuidado para nos certificar das nossas intuiçõ es com objetos menos complexos antes de
elaborar intuiçõ es mais complexas.

Consideremos agora brevemente algumas das dificuldades envolvidas nas vá rias


abordagens seculares.

Platonismo

O platonismo diz que os nú meros e a matemá tica pertencem a um reino de ideias abstratas,
um reino que já existe antes de os matemá ticos começarem a estudá -lo. Em seu trabalho
cotidiano, a maioria dos matemá ticos tende a operar com premissas que se assemelham ao
platonismo. Eles assumem que os objetos que estudam existem e que a verdade sobre eles
está “aí fora” para ser obtida. Além disso, de um ponto de vista cristã o, podemos dizer que o
platonismo está perto da verdade. Deus já conhece todos os objetos matemá ticos e todas as
verdades matemá ticas antes que os seres humanos comecem suas investigaçõ es. Entã o, os
objetos e as verdades estã o “aí fora”, isto é, na mente de Deus.

O platonismo se originou do filó sofo grego Platã o, que defendia que o conhecimento
humano genuíno é o conhecimento de formas ou ideias abstratas — a ideia do bem, a ideia
da justiça, a ideia da beleza e assim por diante. Os nú meros naturais, as verdades sobre os
nú meros e as verdades sobre a geometria podem ser facilmente adicionados à lista de
ideias. Platã o concebia as ideias como conceitos abstratos que existem independentemente
de tudo o mais.

Além da visã o original de Platã o existem possíveis modificaçõ es. Os pensadores cristã os
que queriam adotar Platã o alteraram a visã o dele colocando as ideias na mente de Deus.
Vamos discutir essa visã o cristianizada no apêndice a seguir.

O platonismo secular para a matemá tica começou a se meter em apuros no final do século
XIX, quando os ló gicos descobriram paradoxos ló gicos que abalaram a confiança na
capacidade dos seres humanos de acessar um alegado reino platô nico. Os paradoxos
incluíam o paradoxo de Russell sobre o conjunto que consiste de todos os conjuntos que
nã o contêm a si mesmos. Esse conjunto contém a si mesmo? Responder sim ou nã o leva a
uma contradiçã o. As pessoas também encontraram o paradoxo do “conjunto de todos os
conjuntos”. Esse conjunto inclui a si mesmo? Entã o tem de ser maior do que ele mesmo. [70]

Se os matemá ticos podiam através de sua intuiçã o acessar diretamente o reino platô nico
dos ideais matemá ticos, por que eles mesmos à s vezes produziram contradiçõ es na forma
desses paradoxos? E se nã o podiam acessar o reino platô nico, que serventia houve em
postular sua existência?
O cristã o tem um tipo diferente de resposta. Nó s distinguimos entre nosso pró prio
conhecimento e intuiçã o, por um lado, e o conhecimento de Deus, por outro. Nosso pró prio
tropeço em paradoxos apenas mostra as limitaçõ es do conhecimento humano finito. Nã o é
um fracasso de Deus, que permanece consistente consigo mesmo.

Além desses problemas, o platonismo nã o explica realmente por que existe uma harmonia
entre três perspectivas sobre a matemá tica. A perspectiva normativa enfoca o reino das
ideias abstratas; a perspectiva situacional enfoca a utilidade da matemá tica no mundo à
nossa volta; e a perspectiva existencial enfoca nossa capacidade de entender a matemá tica
e nosso entendimento intuitivo de conceitos matemá ticos bá sicos, como o conceito de
nú mero. Por que estas três concordam entre si? O platonismo tem de introduzir outro
fator: Platã o postulou um criador (o “demiurgo”) para fazer as coisas no mundo segundo o
modelo das ideias originais abstratas.

Empirismo

Uma segunda abordagem filosó fica é o empirismo. O empirismo na matemá tica se esforça
para derivar a matemá tica a partir da experiência sensorial. O empirismo teve o seu pior
momento no século XX. Pode parecer plausível começar com a experiência ordiná ria de ver
os objetos no mundo. Mas já confrontamos o problema do um e dos muitos. Mais cedo
explicamos como nossa mente pode generalizar a partir das experiências de duas maçã s
para o nú mero dois, que na comparaçã o com as duas maçã s é uma abstraçã o. O nú mero
dois é o “um”, em relaçã o aos muitos exemplos específicos de duas maçã s e dois pêssegos.
Esse processo de generalizaçã o depende da relaçã o do um com os muitos. Assim, o
empirismo também se baseia nessa relaçã o, a qual nã o pode explicar.

Além disso, a matemá tica avançada tem aplicaçõ es na física, e parece impossível explicar
essa aplicabilidade começando meramente com os fatos simples sobre duas maçã s ou
quatro maçã s. O crescimento de intensas aplicaçõ es matemá ticas no século XX diminuiu a
plausibilidade do empirismo.

A resposta cristã é diferente. Deus fez um mundo que está em conformidade com as leis
aritméticas e geométricas. É natural para nó s, como criaturas corporalizadas, começar a
partir das experiências deste mundo. Mas quando começamos, o fazemos com uma mente
criada à imagem de Deus. Assim, nossa mente está em sintonia com o mundo. E podemos
generalizar a partir das nossas experiências porque nossa mente está em sintonia com a
mente de Deus também. Podemos ver o funcionamento coerente das três perspectivas de
Frame. Na perspectiva normativa, observamos que nossa mente está em sintonia com a
mente de Deus. Na perspectiva situacional, observamos que nossa mente está em sintonia
com o mundo, que Deus fez. E na perspectiva existencial observamos que é a nossa mente, a
mente de pessoas feitas à imagem de Deus, que fazem matemá tica.

 
Logicismo

O logicismo está associado ao trabalho de Alfred North Whitehead e Bertrand Russell. Eles
juntaram esforços para escrever a obra em três volumes Principia Mathematica , na qual
[71]

esperavam começar com princípios puramente ló gicos e derivar toda a matemá tica a partir
desses princípios. Mas eles precisavam incluir um “axioma do infinito”, que postulava a
existência de um nú mero infinito de objetos. Esse princípio nã o parecia ser simplesmente
uma questã o de ló gica. Além disso, em 1930 o programa esfriou. Kurt Gö del mostrou que
nenhuma lista específica de axiomas poderia captar todas as verdades matemá ticas sobre
os nú meros inteiros. A matemá tica nã o podia ser derivada da ló gica somente.
[72] [73]

Intuicionismo

O intuicionismo foi uma rota na filosofia da matemá tica iniciada por L. E. J. Brouwer. De[74]

acordo com o intuicionismo, a matemá tica é criaçã o da mente humana. O foco na mente
humana é semelhante à perspectiva existencial de Frame. Mas essa perspectiva é forçada a
funcionar dentro de um contexto nã o cristã o, como é evidente no fato de que a mente
humana, nã o a mente divina, se torna o padrã o para a verdade. Como poderíamos esperar,
há dificuldades.

Segundo Brouwer, nenhuma declaraçã o matemá tica deve ser considerada verdadeira ou
falsa até que tenha sido provada ou refutada. O intuicionismo é mais famoso porque nega a
lei do terceiro excluído, isto é, que uma proposiçã o deve ser ou verdadeira, ou falsa. Como
alguém poderia negar a lei do terceiro excluído? Brouwer estava preocupado com
proposiçõ es matemá ticas cuja verdade ainda é desconhecida no presente. Uma dessas
proposiçõ es, chamada conjectura de Goldbach, diz que todo nú mero par maior que 2 é a
soma de dois nú meros primos. [75]
Até o ano de 2014, quando este livro foi publicado,
ninguém sabia se a conjectura de Goldbach era verdadeira. Nenhum contraexemplo foi
encontrado, mas tampouco foi provado por alguém que ela é verdadeira para todo nú mero
par maior que 2. De acordo com a visã o de Brouwer, a conjectura de Goldbach nã o deve ser
considerada nem verdadeira nem falsa até que encontremos um contraexemplo ou uma
prova.

As suposiçõ es intuicionistas levaram a exploraçõ es frutíferas na ló gica. Mesmo sem aceitar


as convicçõ es metafísicas de Brouwer sobre a matemá tica, um ló gico pode explorar o que
pode e nã o pode ser deduzido uma vez que evitamos usar a lei do terceiro excluído como
uma dada suposiçã o. O intuicionismo também introduziu a ideia frutífera da prova
construtiva . Grosso modo, uma prova que não é construtiva mostra que alguns objetos
matemá ticos postulados existem, mas nã o “constró i” ou escolhe realmente o objeto. Em vez
disso, a prova prossegue mostrando que a nã o existência de tal objeto levaria a uma
contradiçã o. A matemá tica clá ssica aceita tanto as provas construtivas quanto as nã o
construtivas, enquanto o intuicionismo só aceita as provas construtivas. Todos os
matemá ticos concordam que existe uma diferença e que essa diferença é ló gica e
matematicamente interessante. Assim, todos os matemá ticos podem a princípio se sentir
livres para estudar e buscar provas construtivas. A disputa é sobre o status metafísico das
provas nã o construtivas.

Assim, o intuicionismo levou a algumas ideias matemá ticas frutíferas. Mas, como filosofia,
tem dificuldades.

Em primeiro lugar, um intuicionismo de tipo brouweriano nã o fornece uma base


matemá tica adequada para partes da aná lise matemá tica que sã o regularmente usadas na
ciência. Ele nã o explica realmente esse tipo de aplicabilidade nem tampouco fornece
endosso para se usar a matemá tica da forma como os cientistas a usam. Os cientistas,
consequentemente, nã o prestam atençã o no intuicionismo. E mesmo a maioria dos
matemá ticos quer os benefícios de domínios da matemá tica que nã o podem ser
demonstrados usando-se princípios intuicionistas.

Em segundo lugar, a principal afirmaçã o intuicionista, de que uma proposiçã o nã o é nem


verdadeira nem falsa até que seja provada ou refutada, é contraintuitiva e parece, no
entender de muitas pessoas, confundir verdade com prova. A verdade diz respeito ao que é
real. A prova diz respeito ao que os seres humanos podem provar ou demonstrar ser real.

Como exemplo, considere o ú ltimo teorema de Fermat. Este famoso teorema foi
conjecturado como verdade por Pierre de Fermat em 1637, mas só foi provado em 1994
por Andrew Wiles. Diria o intuicionismo de Brouwer que o teorema nã o era nem
verdadeiro nem falso até ser provado em 1994? Essa maneira de colocá -lo parece redefinir
o significado normal de “verdadeiro” e “falso”. Certamente, de acordo com nosso jeito
comum de falar, o teorema era verdadeiro em 1637, mas nenhum ser humano sabia que era
verdadeiro até Wiles produzir uma prova em 1994. Mesmo entã o, o resto do mundo nã o
sabia que ele era verdadeiro até Wiles publicar a prova em 1995.

O intuicionismo tentou evitar essa dificuldade falando de um “ideal matemá tico”. O ideal
matemá tico pode correr à frente do que sabemos hoje, mas ainda nã o pode completar um
processo infinito. A dificuldade aqui é que nosso conhecimento limitado nã o nos permite
dizer o que o ideal matemá tico pode realizar. Ele nos deixa na situaçã o em que algumas
proposiçõ es matemá ticas sã o verdadeiras e conhecidas como verdadeiras, outras sã o
verdadeiras mas ainda nã o conhecidas como verdadeiras e ainda outras nã o sã o
conhecidas pelos seres humanos. Só a terceira categoria é vista como nem verdadeira nem
falsa.

Há uma ponta de verdade no intuicionismo. Se nenhum ser humano sabe se uma


proposiçã o matemá tica em particular é verdadeira, sequer sabemos ao certo se temos uma
ideia clara do que significaria ela ser verdadeira. O intuicionismo luta com problemas que
surgem das limitaçõ es do conhecimento humano e da finitude da mente humana.
Infelizmente, como filosofia, nã o traz em cena a infinitude da mente de Deus. Ele parece
assumir que as mentes humanas sã o os determinantes ú ltimos da verdade, em vez de
imitadores da verdade que Deus já conhece. Com essa pressuposiçã o, conclui que uma
proposiçã o nã o pode ser verdadeira a menos que algum ser humano possa vir a saber que é
verdadeira.
 

Formalismo

A filosofia do formalismo diz que a matemá tica é o estudo de linguagens formais e


“sistemas formais” em que há axiomas e regras para a deduçã o. A matemá tica explora o que
pode ser deduzido a partir dos axiomas escolhidos.

Muito trabalho fascinante pode ser realizado no estudo das deduçõ es e provas. Mas esse
estudo é apenas um aspecto de toda a matemá tica. O formalismo por si só nã o explica por
que certos axiomas sã o escolhidos preferivelmente a outros. Os axiomas que sã o escolhidos
sã o aqueles frutíferos. Os axiomas correspondem ao mundo ou correspondem a certas
porçõ es da matemá tica já realizadas menos formalmente. O formalismo nã o leva em conta
essas relaçõ es que se estendem fora do sistema formal e que sã o a principal razã o que
motivou seu estudo.

O formalismo tampouco explica as maneiras nas quais os matemá ticos buscam novos
resultados e novos teoremas. Eles nã o apenas manipulam símbolos formais de acordo com
regras formais. Usam concepçõ es e imagens intuitivas que os guiam na busca por uma
prova mais formal. Assim, mesmo quando os resultados matemá ticos sã o formalizados
posteriormente, a formalizaçã o só capta um aspecto do todo. Ela nã o lida bem com a
perspectiva existencial, que inclui as intuiçõ es dos matemá ticos, nem com a perspectiva
situacional, que inclui a aplicabilidade da matemá tica para o mundo.

A prova de Gö del teve um efeito sobre o formalismo assim como sobre o logicismo. Ela
estabeleceu nã o apenas que nã o se pode construir a matemá tica totalmente sobre a ló gica,
mas também que nã o se pode construí-la totalmente sobre uma formalizaçã o dos axiomas
dentro da linguagem formal. [76]

Predicativismo

O predicativismo é uma abordagem filosó fica mais complexa e, portanto, mais difícil de
explicar em termos simples. Ele aceita os nú meros naturais como um dado. Os nú meros
naturais sã o dados ou por nossa intuiçã o, ou por um reino platô nico ou por ambos. Mas o
predicativismo tenta evitar os paradoxos, como o paradoxo de Russell, sendo modesto
[77]

sobre quais conjuntos podem ser elaborados usando-se os nú meros naturais como base.

Por exemplo, o predicativismo aceita pela intuiçã o o conjunto cujos membros sã o todos
nú meros naturais. Também aceita o conjunto dos nú meros pares positivos, pois esse
conjunto pode ser definido como um subconjunto dos nú meros naturais usando-se uma
propriedade claramente definida (“par”). Ele nã o aceita, porém, um conjunto que seja
definido de uma maneira que já refira implicitamente ao conjunto em questã o. Essa
definiçã o é chamada de impredicativo . [78]
A modéstia é compreensível, visto que, quando as pessoas se tornam excessivamente
confiantes de que suas intuiçõ es devem corresponder ao reino platô nico, surgem
paradoxos. Mas o predicativismo é menos uma filosofia completa do que um programa que
recomenda certo tipo de modéstia. Ele nã o explica a multiplicidade de relacionamentos que
temos visto entre a matemá tica mental (a perspectiva existencial), a matemá tica aplicada
ao mundo (a perspectiva situacional) e a matemá tica como reflexo de uma norma
transcendente (a perspectiva normativa).

Outras abordagens filosóficas

Também podemos mencionar brevemente algumas outras abordagens filosó ficas para a
matemá tica. Primeiro, William van Orman Quine defendia uma metodologia filosó fica que
veio a ser chamada de naturalismo filosófico . Ele sugeriu que nosso melhor
[79]

conhecimento era o das teorias científicas e que a filosofia deveria obter suas pistas do
conhecimento científico. Na filosofia da matemá tica, essa abordagem significa que
aceitamos a matemá tica que é usada nas ciências. Essa abordagem tem a desvantagem
ó bvia de que deixa nã o examinados os fundamentos da ciência.

Outra posiçã o, o estruturalismo , diz que a matemá tica nã o descreve “entidades” em um


reino abstrato e platô nico, mas estruturas , que sã o caracterizadas por leis e relaçõ es. Os
nú meros naturais, por exemplo, sã o uma estrutura com regras para adiçã o e multiplicaçã o,
e podemos acrescentar relaçõ es mais complexas a essas regras (por exemplo: expoentes,
nú meros primos, fatoraçã o, representaçã o numérica na base 10 ou base 2).

Essa posiçã o tem uma afinidade com a posiçã o multiperspectiva que adotamos. Existem
mú ltiplas relaçõ es entre os nú meros, a mente humana e o mundo. Mas, por si só , o
estruturalismo nã o explica por que, nos estudos matemá ticos, algumas estruturas com
algumas leis sã o privilegiadas acima de outras. Portanto, sua explicaçã o ainda é
unidimensional.

Outra posiçã o, o nominalismo, tenta dispensar totalmente as entidades abstratas como os


nú meros e tenta lidar apenas com representaçõ es concretas, que arrola para desempenhar
os papeis anteriormente desempenhados pelas entidades abstratas. Mas essa posiçã o tem
dificuldades. É acometida, para começar, pelas mesmas dificuldades que acometem o
nominalismo medieval (Capítulo 2). Além disso, nã o representa bem a atividade dos
matemá ticos, que pensam em abstraçõ es.

Resumo

Além dos problemas mais especializados, as filosofias seculares compartilham deste


mesmo grande problema: suprimem a revelaçã o do cará ter de Deus na matemá tica (Rm
1.18-23).
1
 

Apêndice B
 
Modificaçõ es cristã s das filosofias da matemá tica
 
 

Agora vamos considerar as maneiras nas quais os cristã os tentaram responder as questõ es
na filosofia da matemá tica — questõ es sobre a natureza dos nú meros e dos objetos
matemá ticos e sobre a natureza das verdades matemá ticas. Há duas abordagens principais
tradicionais: o platonismo modificado e o empirismo modificado. [80]

Platonismo cristianizado

Os pensadores cristã os que queriam adotar Platã o modificaram a visã o dele ao colocarem o
reino platô nico das ideias na mente de Deus. Segundo esse pensamento, a ideia platô nica
do bem existe na mente de Deus. Assim se dá com a ideia de justiça e com a ideia de um
cavalo. Quando aplicada à aritmética, essa abordagem implica que os nú meros e as
verdades sobre os nú meros têm sua existência original na mente de Deus.

A alteraçã o cristã do platonismo é uma melhoria em relaçã o ao pró prio pensamento de


Platã o. Por um lado, ela personaliza a verdade, fazendo com que as verdades nã o sejam
abstraçõ es impessoais mas verdades dentro de uma mente pessoal, a mente de Deus. Ela
também evita o problema que seria gerado se os nú meros e as verdades sobre os nú meros
fossem realidades eternas independentes de Deus. Se o fossem, pareceriam sugerir que sã o
absolutos adicionais ao lado de Deus. Competiriam com Deus pela ultimidade. Mas as
verdades na mente de Deus obviamente nã o competem com ele.

O platonismo cristianizado também tem uma resposta parcial para as questõ es sobre a
relaçã o entre a matemá tica como norma, a matemá tica como aplicá vel ao mundo e a
matemá tica como operaçõ es mentais na mente do homem. Essas três correspondem
respectivamente à s perspectivas normativa, situacional e existencial de Frame. As filosofias
seculares da matemá tica têm uma dificuldade profunda para explicar como as três se
harmonizam (Apêndice A acima). O platonismo cristianizado, por outro lado, pode dizer
que elas se harmonizam porque Deus usa as ideias numéricas em sua mente quando cria o
mundo, autorizando assim a perspectiva situacional. E ele faz o homem à imagem de Deus,
com a mente do homem em harmonia com a mente de Deus, e estabelece assim a harmonia
entre a matemá tica normativa na mente de Deus e a matemá tica existencial na mente do
homem.

Entretanto, o platonismo cristianizado ainda tem dificuldades. Ele sofre por nã o ter lidado
totalmente com o problema do um e dos muitos (veja o Capítulo 2). O platonismo
cristianizado faz do um, isto é, a ideia original que está na mente de Deus, anterior ao
muitos, isto é, os cavalos, gatos ou outras coisas criadas que incorporam a ideia. Assim
também, em relaçã o aos nú meros, o platonismo cristianizado diz que o nú mero abstrato 2
que existe na mente de Deus é a ideia original e as coleçõ es de duas maçã s e duas peras que
existem no mundo sã o derivadas da ideia. A unidade do nú mero 2 é anterior à diversidade
de coleçõ es de dois objetos no mundo.

Pensemos nesse problema. O plano de Deus para o mundo existe antes do mundo. O mundo
deriva de seu plano. Mas seu plano inclui tanto unidade quanto diversidade. Deus planejou
criar as espécies de cavalo assim como todos os cavalos individuais pertencentes à s
espécies. Da mesma forma, seu plano inclui tanto o nú mero 2 quanto a diversidade de
coleçõ es de dois objetos. Deus em seguida executa seu plano e o concretiza no tempo ao
criar tanto as espécies quanto alguns cavalos individuais. Ele executa seu plano em relaçã o
aos nú meros ao criar um mundo em que há coleçõ es de duas maçã s e duas peras. Essas
coleçõ es sã o “os muitos”. O que é comum à s coleçõ es, isto é, serem coleçõ es de dois objetos,
é “o um”. Assim, numa visã o cristã mais consistente, o um e os muitos sã o igualmente
ú ltimos.

Há ainda outras dificuldades com o platonismo cristã o, acerca de sua concepçã o da


natureza das ideias, que postula estarem na mente de Deus. Ele nã o articula
[81]

completamente o fato de que Deus é Criador e que nó s somos criaturas de modo que as
ideias em nossa mente nã o esgotam as ideias na mente de Deus.

O quadrado de Frame sobre transcendência e imanência, discutido previamente (Capítulo


5), é relevante. De acordo com uma visã o nã o cristã de imanência divina, nossas ideias,
quando verdadeiras, sã o virtualmente idênticas à s ideias na mente de Deus. Nossa pró pria
mente pode servir como padrã o. Embora um cristã o naturalmente negaria esse princípio
na maioria dos casos, será que nossa mente serve como o padrã o final na á rea dos nú meros
e da matemá tica? Será que nossa ideia do nú mero 2 é idêntica à ideia na mente de Deus?
Como pode ser idêntica sem englobar um conhecimento de todas as muitas relaçõ es
dimensionais que existem entre os nú meros e outras coisas? E se nã o é idêntica à ideia de
Deus, existe um conhecimento humano genuíno de 2?

O platonismo sempre sofreu com o problema de que o tipo de conhecimento que ele
postula, para que seja de fato conhecimento, deve ser virtualmente um conhecimento das
ideias eternas divinizado. O platonismo, mesmo o platonismo cristianizado, corre o risco de
romper a distinçã o Criador-criatura e cair na imanência nã o cristã . O platonismo
cristianizado na matemá tica corre o mesmo risco no que diz respeito à s ideias matemá ticas
e verdades matemá ticas.

Empirismo cristianizado
O empirismo cristianizado é a outra das principais abordagens para a filosofia cristã da
matemá tica. O empirismo cristianizado surgiu mais proeminentemente com uma tradiçã o
chamada de filosofia cosmonômica . A filosofia cosmonô mica é uma tradiçã o rica e
complexa, que nã o podemos discutir plenamente aqui. [82]

Podemos esboçar brevemente a principal posiçã o cosmonô mica, simplificando em alguns


pontos. A filosofia cosmonô mica, em uma de suas formas comuns, diz que os nú meros e as
verdades sobre os nú meros fazem parte da ordem criada. O mesmo princípio vale para o
espaço e para as verdades sobre o espaço. As verdades sobre os nú meros e o espaço foram
criadas e nã o sã o eternas. Essa forma de construir os nú meros conspicuamente evita as
dificuldades do platonismo, que tem de postular a eternidade dos nú meros e das ideias
sobre o espaço, correndo assim o risco de produzir uma segunda eternidade competindo
com a eternidade de Deus. Na filosofia cosmonô mica nã o pode haver tal competiçã o,
porque só Deus é eterno, enquanto os nú meros e o espaço nã o o sã o. (Deus sabe desde a
eternidade o que vai criar, mas isso é outro assunto.)

A filosofia cosmonô mica distingue dois aspectos da ordem criada: (1) as coisas criadas,
como rochas, plantas, animais e seres humanos, e (2) as leis que governam as coisas
criadas. As coleçõ es de duas maçã s ou duas peras sã o coisas criadas. As leis que governam
as coleçõ es de duas coisas, como a lei de que 2 + 2 = 4, sã o leis e não coisas. Existem muitos
tipos de leis, as quais governam os nú meros, o espaço, o movimento, as interaçõ es físicas, a
linguagem, e assim por diante. Juntas, essas leis sã o as leis do cosmo — daí o termo
cosmonômica , que vem de duas palavras gregas, para cosmo e para lei.

A filosofia cosmonô mica é semelhante ao empirismo, na sua visã o dos nú meros, pois afirma
que os nú meros sã o, antes de tudo, características do mundo à nossa volta. Nó s
aprendemos, a partir do mundo, o que os nú meros sã o. Mas essa filosofia evita muitos dos
problemas do empirismo secular. Ela pode afirmar todas as três perspectivas de Frame em
harmonia, pois reconhece Deus como o Criador. Deus criou as leis em relaçã o aos nú meros
(perspectiva normativa); Deus criou as coisas criadas que estã o sujeitas à s leis (perspectiva
situacional); e Deus criou os seres humanos à imagem de Deus (perspectiva existencial).
Uma vez que os seres humanos sã o feitos à imagem de Deus, eles podem interpretar
fielmente o que veem no mundo, incluindo o que veem sobre a sua natureza quantitativa. O
mesmo princípio vale para o espaço assim como para a quantidade. E a partir daí o
princípio pode ser estendido para toda a matemá tica, que representa formas mais
complicadas da lei que Deus ordenou para o cosmo.

A filosofia cosmonô mica também pode dar uma resposta para o problema do um e dos
muitos. Deus criou os dois aspectos do mundo. Assim, nenhum precisa ser anterior ao
outro. (Essa soluçã o é diferente do platonismo cristianizado, que dá uma prioridade
definitiva para o um, a ideia original na mente de Deus.) Por outro lado, um crítico poderia
se perguntar se a forma com que a filosofia cosmonô mica dá sua descriçã o da criaçã o
envolve alguma priorizaçã o sutil do um e dos muitos. Em relaçã o à s muitas coisas criadas
que governa, a lei parece ser uma. Desde que governa os muitos, é em certo sentido
anterior a eles.
Uma abordagem baseada na Bíblia pode afirmar que o discurso de Deus especifica toda a
criaçã o. Especifica tanto os princípios gerais, que expressam unidades, quanto os itens e
eventos individuais, que expressam diversidades. Mas a maioria das exposiçõ es da filosofia
cosmonô mica nã o parecem ter tomado esse caminho ao discutir as leis para o cosmo. Elas
tratam a lei como geral, nã o especificamente como uma lei para uma coleçã o de duas maçã s
específicas. Mas talvez isso seja apenas uma preferência superficial.

A filosofia cosmonô mica tem apelo porque é mais “modesta” sobre como conhecemos a
mente de Deus. Como seres humanos, só conhecemos a mente de Deus no contexto do
mundo que Deus criou e no contexto da nossa pró pria mente finita. Na verdade, nunca
temos uma visã o divina direta das ideias que estã o na mente de Deus. Nem temos uma
visã o direta dos nú meros como um tipo de ideia que supostamente existe na mente de
Deus. Como, de fato, sabemos como é a “organizaçã o” da mente de Deus? A filosofia
cosmonô mica nos aconselharia a descer ao nível terreno e evitar especulaçõ es que nã o sã o
adequadas para nó s como criaturas, que vivem debaixo e nã o acima das leis de Deus.

A dificuldade aqui é o oposto do platonismo cristianizado. A dificuldade é que podemos


inadvertidamente cair em uma forma de transcendência nã o cristã . Se nã o formos
cuidadosos, podemos adotar uma forma de pensar na qual pensamos que Deus é
incognoscível e distante, está por trá s da lei, embora a lei seja a ú nica coisa que podemos de
fato acessar. Se, por exemplo, o nú mero 3 é criado e nã o eterno, como podemos dizer que
Deus é três pessoas? Poderíamos dizer que para nó s, que estamos debaixo da lei, ele parece
ser três pessoas. Mas Deus, que está por trá s da lei, nã o pode realmente ser três pessoas,
pois a condiçã o de três nã o é eterna. Tampouco podemos entender o que significaria o
Verbo estar com Deus eternamente, pois isso envolve usar uma distinçã o entre o Verbo e
Deus, como duas pessoas, e envolve assim o nú mero 2, que alegadamente é uma mera
criaçã o de Deus e nã o existe eternamente.

As pessoas que desenvolveram a filosofia cosmonô mica eram crentes em Cristo que
mantinham crenças trinitá rias ortodoxas. Fico feliz que o tenham feito. E também confio
que genuinamente pretendiam que a filosofia cosmonô mica fosse compatível com a crença
trinitá ria e com a cognoscibilidade de Deus, no sentido de uma visã o cristã de imanência,
isto é, o canto #2 do quadrado de Frame. Mas a filosofia que eles articularam deixou esse
ponto incerto, na melhor das hipó teses. A discussã o que a filosofia faz da lei é obscura. A
obscuridade, a meu ver, parece infelizmente deixar a porta aberta a uma interpretaçã o
onde na verdade ficamos vítimas do pensamento nã o cristã o sobre a transcendência e
imanência de Deus. E essa obscuridade afeta a filosofia da matemá tica, assim como todas as
á reas do pensamento.

Ademais, se cairmos em uma visã o nã o cristã da transcendência de Deus, facilmente


também seremos vítimas de uma visã o nã o cristã da imanência de Deus. Ilustremos como o
raciocínio poderia se dar. Suponha que Jill assume que Deus está além dos nú meros,
porque as leis sã o criadas. Ela entã o raciocina que os nú meros pertencem a nó s como seres
humanos que interagem com o cosmo. Como o cosmo é criado de maneira unificada, o
pró prio pensamento dela sobre os nú meros pode, pelo menos à parte da Queda, servir
como um padrã o. Ela percebe que nã o precisa alegar que ela mesma é o padrã o
absolutamente ú ltimo que pertence somente a Deus. Em vez disso, a posiçã o que ela ocupa
é a posiçã o de um padrã o pró ximo. É , todavia, o ú nico padrã o de que ela realmente precisa
no mundo, pois foi criada por Deus para se conformar plenamente em seu pensamento à
maneira como o mundo é. Assim, nesse aspecto, ela pode ser mestre em seu pensamento.

Ora, Jill se põ e a confrontar a revelaçã o de Deus para ela na Escritura. Raciocina


(falsamente, aliá s) que ainda pode ser mestre, pois quando a palavra vem a ela, vem dentro
da ordem có smica. Portanto, segundo seu raciocínio, ela pode usar seus padrõ es normais
para os nú meros ao examinar a Escritura. E também conclui, portanto, que a teologia
trinitá ria é falsa porque nã o se conforma de maneira racional e transparente aos padrõ es
pré-estabelecidos dela.

Assim, ela chega a uma visã o nã o cristã de imanência na qual suas ideias sobre os nú meros
servem como padrã o e sã o usadas para julgar supostas reivindicaçõ es da revelaçã o divina.

Devo enfatizar que os filó sofos cosmonô micos, como crentes cristã os ortodoxos, nã o
queriam nenhuma dessas linhas de raciocínio. Ao desenvolver o raciocínio de Jill, estou
ilustrando os perigos que resultam quando permanecemos pouco claros sobre a diferença
entre as formas cristã e nã o cristã de transcendência e imanência. E essas diferenças
afetam o raciocínio sobre a ordem quantitativa das coisas.

Assim, precisamos manter a distinçã o Criador-criatura e manter o que a acompanha, uma


visã o cristã de transcendência e imanência. Quando pensamos em matemá tica, essa visã o
precisa permanecer no lugar. Os pensamentos de Deus sã o superiores aos nossos
(transcendência cristã ); ademais, seu poder e sua revelaçã o nos dã o genuíno acesso aos
seus pensamentos (imanência cristã ). O mundo moderno está acostumado a pensar sobre
um nível, nã o dois — ele ignora a distinçã o Criador-criatura. Romper com esse modo
moderno de pensar pode exigir esforço, mas é um aspecto integrante de sermos seguidores
fieis de Cristo.

1
 

Apêndice C
 
Aritmética derivada
 
 
No Capítulo 9 apresentamos os axiomas de Peano. Com esses axiomas como ponto de
partida, podemos definir a adiçã o e a multiplicaçã o e derivar verdades aritméticas.
Ilustramos o processo aqui apenas como um começo.
 

Adição

Podemos definir adiçã o usando a relaçã o de sucessã o, simbolizada por S (como explicado
no Capítulo 9). Em nossas definiçõ es, os símbolos m e n designam nú meros naturais.
 
(a) Defina m + 1 para ser S m , o sucessor de m : m + 1 = S m . Isto é, a operaçã o de adicionar 1 a m tem
como resultado o sucessor de m .
(b) Defina m + S n = S( m + n ). Isto é, uma vez que a adiçã o com n foi definida, a operaçã o de adicionar
o sucessor de n (S n ) a m é definida como o sucessor do nú mero obtido pela adiçã o de n a m .
 
Essas duas definiçõ es juntas permitem definir a adiçã o para todos os nú meros naturais m e
n . Por quê? Porque, nã o importa quã o grande seja n , podemos gradualmente chegar a ele
partindo da definiçã o (a) e entã o usando repetidamente (b). O uso repetido de (b) na
verdade usa o princípio da induçã o matemá tica. A propriedade M neste caso é a seguinte: M
é verificado verdadeiro para o nú mero n se o processo de adicionar o nú mero n a outros
nú meros ( m ) foi definido. A propriedade M claramente se aplica a n = 1 por causa da
definiçã o (a). E a definiçã o (b) implica que a propriedade M sempre se aplicará ao sucessor
de n , uma vez que se aplique a n .
 
 
2+2=4
Passemos agora a mostrar que 2 + 2 = 4. Ora, 2 é definido como sendo o sucessor de 1: 2 =
S1. Entã o, 3 é definido como sendo o segundo sucessor de 1: 3 = S2 = SS1. Por fim, 4 é
definido como sendo o terceiro sucessor de 1: 4 = S3 = SS2 = SSS1.
 
2 + 1 = S1 + 1 (pela definiçã o de 2) = SS1 (pela definiçã o (a)) = 3 (pela definiçã o de 3).
2 + 2 = 2 + S1 (pela definiçã o de 2) = S(2 + 1) (pela definiçã o (b)) = S3 (pela  linha anterior) = 4 (pela
definição de 4).
 

Se queremos estabelecer os resultados para nú meros maiores, só leva mais tempo.


Considere por exemplo alguns casos envolvendo a adiçã o ao nú mero 3:
 
1. 3 + 1 = S3 (por (a)) = 4 (pela definição de 4).
2. 3 + 2 = 3 + S1 = S(3 + 1) (por (b)) = S4 (pela linha 1 acima) = SSSS1 (pela definiçã o de 4) = 5 (pela
definição de 5).
3. 3 + 3 = 3 + SS1 (pela definiçã o de 3) = S(3 + S1) (por (b)) = S(3 + 2) = S5 (pela linha 2) = 6 (pela
definição de 6).
4. 3 + 4 = 3 + SSS1 (pela definiçã o de 4) = S(3 + SS1) (por (b)) = S(3 + 3) (pela definiçã o de 3) = S6 (pela
linha 3) = 7 (pela definição de 7).
5. 3 + 5 = 3 + S4 = S(3 + 4) (por (b)) = S7 = 8 (pela definiçã o de 8).
 
 
A lei associativa para adição
 

Tentemos estabelecer um resultado geral:


 
Teorema: para todos os nú meros naturais k , m e n , ( k + m ) + n = k + ( m + n ).
 

Esse teorema é chamado de lei associativa para adiçã o.

Tentemos primeiro estabelecer o resultado mais simples de que ( k + m ) + 1 = k + ( m + 1).


Vamos chamá -lo de lema (um resultado que será usado mais tarde).
 
Lema: ( k + m ) + 1 = k + ( m + 1).
 

Prova: Usamos a induçã o matemá tica, onde tratamos k como fixo e tentamos passar pelos
nú meros m começando com m = 1. Este processo é chamado de indução em m . Neste caso,
a propriedade M para a induçã o matemá tica é a propriedade de que ( k + m ) + 1 = k + ( m +
1).

Passo (a). O princípio ( k + m ) + 1 = k + ( m + 1) é verdadeiro quando m = 1?


 
k + (1 + 1) = k + S1 (pela definição de adiçã o por 1 na definiçã o (a)) = S( k + 1) (por (b)) = ( k + 1) + 1
(pela definiçã o de adiçã o por 1).
 

Passo (b). Dado que o princípio é verdadeiro para m , isto é, que ( k + m ) + 1 = k + ( m + 1),
é verdadeiro para m + 1?
 
( k + ( m + 1)) + 1 = ( k + S m ) + 1 = S( k + m ) + 1 (pela definiçã o de adiçã o) = SS( k + m ) = S(( k + m
) + 1) = S( k + ( m + 1)) (por suposiçã o) = k + S( m + 1) (pela definiçã o de adiçã o) = k + (( m + 1) + 1).
 

Agora estamos prontos para tentar estabelecer o princípio geral, ( k + m ) + n = k + ( m + n ).


Usamos a induçã o em n , começando com n = 1.

Passo (a). O princípio ( k + m ) + n = k + ( m + n ) é vá lido quando n = 1?


 
( k + m ) + 1 = k + ( m + 1), conforme estabelecido no lema.
 

Passo (b). Assuma que o princípio é vá lido para n . Podemos estabelecê-lo para n + 1?

 
( k + m ) + ( n + 1) = (( k + m ) + n ) + 1 (pelo lema) = ( k + ( m + n )) + 1 (por suposiçã o) = S( k + ( m
+ n )) = k + S( m + n ) (pela definiçã o de adiçã o) = k + ( m + S n ) (pela definiçã o de adiçã o) = k + ( m +
( n + 1)).
 

Assim, o princípio vale para ( n + 1). Desde que seguimos os passos (a) e (b), concluímos
por induçã o matemá tica que o princípio vale para todos os nú meros.
 

A lei comutativa de adição

Aqui está um segundo teorema:


 
Teorema: m + n = n + m .
 

Este teorema é chamado de lei comutativa para adiçã o. Mais uma vez podemos usar um
lema:
 
Lema: m + 1 = 1 + m .
 

Prova: Por induçã o em m .

Passo (a). O lema é vá lido quando m = 1?


 
1 + 1 = 1 + 1.
 
Passo (b). Suponha que o lema seja vá lido para m . Tentamos estabelecê-lo para m + 1.
 
( m + 1) + 1 = S( m + 1) = S(1 + m ) (por suposição) = (1 + m ) + 1 = 1 + ( m + 1) (pela lei associativa).
 
Agora estamos prontos para provar o princípio geral da lei comutativa, m + n = n + m .
Fazemos isso pela induçã o em n .
 
Passo (a). A lei comutativa é vá lida quando n = 1?
 
m + 1 = 1 + m , que é exatamente o lema já provado.
 
Passo (b). Assumindo que m + n = n + m , podemos mostrar que é verdadeiro para n + 1?
 
m + ( n + 1) = m + S n = S( m + n ) (pela definiçã o de adiçã o) = S( n + m ) (por suposição) = n + S m
(pela definiçã o de adiçã o) = n + ( m + 1) = n + (1 + m ) (pelo lema) = ( n + 1) + m (pela lei associativa).
 
 

Definindo multiplicação

De maneira semelhante, podemos definir multiplicaçã o e provar suas propriedades.


Seguiremos apenas um pouco no processo.
 
(a) Defina m × 1 para ser m : m × 1 = m . Isto é, a operaçã o de multiplicar m por 1 tem como resultado
o pró prio m .
(b) Defina m × S n = ( m × n ) + m . Isto é, uma vez definida a multiplicaçã o por n ( m × n ), a
multiplicaçã o por S n (ou n + 1) é definida adicionando-se m ao resultado anterior m × n .
 

O resultado líquido dessas definiçõ es é que m × n é o resultado da adiçã o de m a si mesmo


para um total de n có pias de m .

Usando essa definiçã o, podemos mostrar que 2 × 2 = 4.


 
2 × 2 = 2 × S1 (pela definiçã o de 2) = (2 × 1) + 2 (pela definiçã o da parte de multiplicaçã o (b)) = 2 + 2
(pela definiçã o da parte de multiplicaçã o (a)) = 4.
 
 

Conclusão

Esses exercícios podem parecer entediantes. Mas mostram que as verdades elementares da
aritmética podem ser derivadas de princípios mais simples, a saber, os axiomas de Peano.
Em harmonia com o nosso princípio de antirreducionismo (Capítulo 4), nã o dizemos que
esse procedimento “reduz” os nú meros aos axiomas de Peano. Em vez disso, os axiomas de
Peano mostram um tipo de relaçã o rica entre os nú meros e entre as verdades aritméticas e
as derivaçõ es ló gicas. Poderíamos virar o processo ao contrá rio e dizer que, ao selecionar
certas verdades, os axiomas de Peano sã o “derivados” das verdades da aritmética. Para
servir mais tarde como axiomas, as verdades que selecionamos devem juntas ser o bastante
para se derivar o resto.

1
 

Apêndice D
 
Induçã o matemá tica
 
 

Incluímos outras ilustraçõ es de induçã o matemá tica.

Soma de números ímpares

A soma dos primeiros n nú meros ímpares é n × n = n . Podemos verificar a verdade dessa


2

afirmaçã o testando os primeiros casos:


 
1=1×1=1 2 .
1+3=4=2×2=2 2 .
1+3+5=9=3×3=3 2 .
1 + 3 + 5 + 7 = 16 = 4 × 4 = 4 2 .
 

Mas como verificaríamos a verdade para cada caso? Nunca podemos completar o processo. Esse tipo de situaçã o deixa
claro o valor da induçã o matemá tica.

Procedemos por induçã o em n . O passo (a) consiste em verificar a verdade para o valor n = 1. Já fizemos isso acima: 1 = 1
×1=1 2 .

O passo (b) começa assumindo que o princípio é vá lido para o nú mero n e em seguida tenta estabelecê-lo para n + 1.
Suponha que

 
1 + 3 + … + (2 n - 1) = n 2 .
 

Agora tente fazer o pró ximo caso, para n + 1.

 
1 + 3 + … + (2 n - 1) + (2 n + 1) = ?
 

Como os primeiros n termos nessa soma sã o iguais aos da equaçã o anterior, podemos substituir n 2
pela soma dos
primeiros n termos:

 
1 + 3 + … + (2 n - 1) + (2 n + 1) = n 2 + (2 n + 1) = n 2 + 2 n + 1 = ( n + 1) 2 .
 

Isso mostra que a formula vale para n + 1. Assim, pelo princípio da induçã o matemá tica, a fó rmula vale para todo n , seja
qual for.
O princípio da induçã o matemá tica nos permite evitar de fazer um nú mero infinito de cá lculos distintos. Nó s podemos
entender e usar esse princípio porque somos feitos à imagem de Deus e podemos transcender as particularidades de um
cá lculo individual para compreender o padrã o geral.

Usando o resultado da soma de nú meros ímpares temos uma maneira maravilhosamente fá cil de calcular a soma de
nú meros pares.

 
A soma dos primeiros n nú meros pares é n 2 + n .
 

Poderíamos estabelecer essa fó rmula usando a indução em n . Mas existe uma maneira mais simples de fazer isso.
Considere novamente a soma dos primeiros n nú meros ímpares.

 
1 + 3 + 5 + … + (2 n - 1) = n 2 .
 

Agora adicione 1 a cada um desses n nú meros:

 
(1 + 1) + (3 + 1) + (5 + 1) + … + ((2 n - 1) + 1) ou
     2     +     4     +     6      + … +          2 n
 

O resultado é a soma dos primeiros n nú meros pares. Visto que chegamos a essa soma ao adicionar um total de n 1 à
soma original, que foi n 2 , a soma dos primeiros n nú meros pares deve ser a soma n 2 dos primeiros n nú meros ímpares
mais um n adicional, para um total de n 2 + n . Assim

 
2+4+6+…+2 n = n 2 + n .
 

Se tomarmos a soma dos primeiros n nú meros pares e dividirmos termo a termo por 2, obteremos:

 
2/2 + 4/2 + 6/2 + … + 2 n /2 = 1 + 2 + 3 + … + n = ( n 2 + n )/2 = n ( n + 1)/2.
 

Ou seja, a soma dos primeiros n nú meros é n ( n + 1)/2. Esse resultado também poderia ser obtido diretamente por
indução matemá tica. [83]
Deus ordenou harmonias maravilhosas, fornecendo vá rias maneiras nas quais os mesmos
resultados podem ser verificados.

 
 
A soma dos quadrados
 

A soma dos quadrados dos primeiros n nú meros é n ( n + 1)(2 n + 1)/6. Mais uma vez, podemos verificar os primeiros
casos:

 
1 2 = 1 = 1(1 + 1)(2 × 1 + 1)/6.
1 2 + 2 2 = 1 + 4 = 5 = 2(2 + 1)(2 × 2 + 1)/6.
1 2 + 2 2 + 3 2 = 1 + 4 + 9 = 14 = 3(3 + 1)(2 × 3 + 1)/6.
1 2 + 2 2 + 3 2 + 4 2 = 1 + 4 + 9 + 16 = 30 = 4(4 + 1)(2 × 4 + 1)/6.
 

Agora, tentemos mostrar que isso é sempre verdade.

Passo (a). Mostre que isso é verdade para n = 1. Já mostramos acima.

Passo (b). Suponha que isso é verdade para n . Isto é, suponha que

 
1 2 + 2 2 + 3 2 + … + n 2 = n ( n + 1)(2 n + 1)/6.
 

A soma para n + 1 é

 
1 2 + 2 2 + 3 2 + … + n 2 + ( n + 1) 2 = n ( n + 1)(2 n + 1)/6 + ( n + 1) 2
(supondo que a fó rmula vale para n ).
 

Reagrupando,

 
n ( n + 1)(2 n + 1)/6 + ( n + 1) 2 = [ n ( n + 1)(2 n + 1) + 6( n + 1) 2 ]/6
= ( n + 1)[ n (2 n + 1) + 6( n + 1)]/6 = ( n + 1)[2 n 2 + n + 6 n + 6]/6
= ( n + 1)( n + 2)(2 n + 3)/6 = ( n + 1)(( n + 1) + 1)(2( n + 1) + 1)/6,
 

que confirma que a fó rmula vale para n + 1. Por induçã o, vale para todo n .

 
 
Mais perspectivas sobre a soma de números ímpares
 

Podemos usar outras perspectivas para mostrar que a soma dos primeiros n nú meros ímpares é n 2 . Aqui está a soma:

 
1 + 3 + 5 + … + (2 n - 3) + (2 n - 1)
 

Escreva a mesma soma na ordem inversa e coloque essa nova soma diretamente sob a
primeira:
 
     1     +       3     +       5    +  … + (2 n - 3) + (2 n - 1)
(2 n - 1) + (2 n - 3) + (2 n - 5) + … +       3     +      1
 

Agora adicione as duas linhas, termo a termo:


 
2 n    +    2 n    +    2 n    + … +    2 n    +    2 n
 

Visto que começamos com n nú meros ímpares, há n có pias de 2 n , para um total de 2 n . 2

Esse total é o resultado da adiçã o da soma original de n nú meros ímpares a si mesmo.


Portanto, a soma de n nú meros ímpares é metade de 2 n , ou n . 2 2

Uma segunda perspectiva sobre a mesma soma usa um diagrama pictó rico que nos permite
ver a verdade aritmética (diagrama D.1).

No diagrama, as regiõ es em forma de L contêm um nú mero ímpar de pontos. Os nú meros


ímpares se somam para fazer uma regiã o quadrada contendo um nú mero de pontos que é
um nú mero quadrado. Por exemplo, o nú mero de pontos na regiã o quadrada com 5 pontos
de um lado é 5 . A inspeçã o do diagrama nos mostra que o mesmo nú mero de pontos é
2

também 1 + 3 + 5 + 7 + 9 = 5 . 2

Uma terceira perspectiva sobre o mesmo problema enfoca a diferença entre n e o 2

quadrado seguinte, ( n + 1) . E ( n + 1) , quando multiplicado, é igual a n + 2 n + 1. Assim,


2 2 2

 
( n + 1) 2 - n 2 = 2 n + 1,
 

que é um nú mero ímpar. À medida que n aumenta, as diferenças entre os quadrados sã o os


nú meros ímpares sucessivos. Se começarmos com n = 1, obteremos o resultado de que 2 - 2

1 = 3. Se arranjarmos os quadrados numa linha com suas diferenças abaixo, obteremos o


2

diagrama D.2. Cada quadrado é 1 (o primeiro quadrado) mais a soma de todas as diferenças
à sua esquerda e abaixo dele. Esse diagrama nos permite observar de relance o resultado
da induçã o matemá tica, onde assumimos a verdade para n e tentamos estabelecê-la para n
+ 1.
 
 

As mú ltiplas perspectivas pelas quais se pode olhar a soma de nú meros ímpares mostram a
riqueza das verdades que Deus ordenou.

1
 

Apêndice E
 
Teoria elementar dos conjuntos
 
 

No Capítulo 12, indicamos que os conjuntos podem ser usados para introduzir axiomas dos
quais podem ser derivadas as verdades da aritmética. Gostaríamos de explorar os
primeiros passos nesse processo.

Existem vá rias possibilidades de iniciar axiomas. A teoria dos conjuntos de Zermelo-


Fraenkel , trabalho de Ernst Zermelo e Abraham Fraenkel no início do século XX, acabou
[84]

se tornando o ponto de partida mais comum. Apresentaremos alguns dos axiomas deles.
Mas tanto quando possível expressaremos o significado dos axiomas em linguagem comum,
de modo que até os leitores sem formaçã o em matemá tica poderã o entender o ponto
central.
 

O axioma da extensão

O axioma da extensão diz que dois conjuntos sã o idênticos se contêm os mesmos elementos.

Esse axioma indica que o conceito de conjunto é um conceito “despido”. Nó s ignoramos


todo tipo de informaçã o, exceto as especificaçõ es dos elementos que pertencem ao
conjunto.

O axioma depende da nossa capacidade, como seres humanos feitos à imagem de Deus, de
ver o padrã o geral comum a muitas coleçõ es concretas e de produzir um conceito que se
concentre apenas no que é comum. Por exemplo, se temos duas maçã s repousando sobre
uma mesa, podemos pensar nas maçã s em mais de um sentido. Se nos concentramos em
seu passado, podemos observar que elas vieram da mesma sacola comprada no
supermercado. Ou foram escolhidas da mesma á rvore. Se nos concentramos no presente,
podemos observar que elas estã o ambas sobre a mesa. Se nos concentramos no seu futuro,
podemos observar que serã o comidas como parte de uma salada ou parte de uma torta de
maçã . Em termos de significado completo, podemos ter vá rias “coleçõ es” — a coleçã o de
maçã s da mesma sacola, ou a coleçã o de maçã s sobre a mesa, ou a coleçã o de maçã s que
formarã o a mesma torta. Se, por outro lado, removermos o significado extra, teremos um
“conjunto” de duas maçã s. O “conjunto”, no sentido técnico, depende apenas de quais sã o os
seus membros, nã o de qualquer conhecimento extra sobre os membros e o motivo por que
sã o considerados parte de uma ú nica coleçã o.

O conceito de conjunto também depende do nosso conhecimento do que significa ser “o


mesmo” elemento. Por exemplo, temos de ser capazes de identificar uma maçã como sendo
a “mesma” maçã , mesmo ela amadurecendo com o tempo. Como indicamos no Capítulo 12,
o conceito de “ser o mesmo elemento” já usa a ideia de unidade na diversidade. A unidade é
a unidade da “mesma” maçã . A diversidade — ou pelo menos um tipo de diversidade — é
visível no processo de amadurecimento ao longo do tempo. Neste uso da unidade e
diversidade, já dependemos do nosso entendimento dos nú meros. A unidade é a unidade
de uma coisa; a diversidade é a diversidade de mais de uma fase da coisa. Já dependemos
do nosso entendimento pré-teorético das coleçõ es. Devemos entender tacitamente o que
significa ter duas maçã s sobre a mesa e mentalmente considerá -las de forma conjunta.

O axioma do conjunto vazio

O axioma do conjunto vazio diz que existe um conjunto sem membros. Esse conjunto é
convencionalmente designado por ∅, sendo também chamado de conjunto nulo .

Esse axioma nã o é tã o intuitivo. Um “conjunto” sem membros é de fato um conjunto? Ou


nã o é nada? A concepçã o de conjunto nulo é aná loga à concepçã o do nú mero zero. O
nú mero zero é um nú mero? Ou nã o é nada? A decisã o, de certa forma, cabe a nó s —
depende de quã o ampla queremos tornar nossa pró pria concepçã o de “conjunto”. Podemos
entender o conceito de conjunto nulo mais intuitivamente se pensarmos no processo de
“subtrair fora” um membro de um conjunto que tenha mais de um membro com o qual
começar. Suponha que começamos com um conjunto com dois membros: {2, 3}. Se
omitirmos o membro 3, obteremos um segundo conjunto, o conjunto cujo ú nico membro é
2: {2}. Parece razoá vel admitir que, ao também omitir 2, poderíamos ter um terceiro
conjunto, em cujo caso colocamos {} sem membros. (O símbolo ∅ é costumeiramente usado
em vez do símbolo {}, mas isso é mera questã o de notaçã o.)

Vemos um aná logo desse conceito de conjunto nulo no relato da criaçã o em Gênesis 1.
Gênesis 1 descreve a situaçã o inicial como “A terra, porém, estava sem forma e vazia” (v. 2).
O contexto mostra que algumas coisas estavam presentes: a pró pria terra, as á guas e o
Espírito de Deus. Mas a terra estava fazia de plantas e animais, o tipo de suprimento
discreto do qual mais tarde desfrutaria. A linguagem em Gênesis é uma linguagem comum,
nã o a linguagem técnica da matemá tica. Mas implica que Deus projetou um mundo onde o
conceito de coleçã o de suprimentos para o mundo é apropriado. E, num ponto inicial no
tempo, essa coleçã o de suprimentos estava vazia. Deus, ao nos fazer à sua imagem, deu-nos
a capacidade de pensar em termos de conjunto vazio.

O axioma dos pares

O axioma dos pares diz que, se temos dois elementos ou conjuntos a e b , há um conjunto
cujos membros sã o a e b : { a , b }.

Esse axioma parece tã o simples que alguém poderia se perguntar por que está de fato
incluído. Uma das razõ es para se ter axiomas é tornar todas as suposiçõ es explícitas e nã o
deixar que nada que esteja senso usado seja uma suposiçã o implícita extra. O axioma dos
pares significa que, se já temos alguns conjuntos a e b , podemos construir mais. Uma das
consequências é que se a é um conjunto, { a , a } é um conjunto. Mas { a , a } é ao mesmo
tempo como { a } (pois tem apenas um membro, a ). Será que a é igual a { a }? Nã o. { a } tem
um membro, a saber, a . Se a é um conjunto, ele pode ter muitos membros ou nenhum
(pode ser um conjunto nulo). Assim, em geral a ≠ { a }.

Deus nos dá a capacidade de fazer distinçõ es. Entre as distinçõ es que podemos fazer está
uma em que distinguimos dois itens a e b de todos os outros itens possíveis. Estamos
pressupondo nossa capacidade de fazer distinçõ es. Também pressupomos que, depois de
fazer uma distinçã o, podemos ter um grupo de itens que estã o “dentro” e sã o distintos de
todo o resto do mundo. Além disso, a capacidade de agrupar dois itens, depois de já termos
um, exibe um caso de aditividade. Estamos na verdade pressupondo a ideia de adiçã o, que
remonta a Deus.

O axioma dos subconjuntos


O axioma dos subconjuntos diz que se temos um conjunto A , há um conjunto B que consiste
de todos os membros de A que têm uma propriedade adicional específica (além de estarem
em A ).

Por exemplo, suponha que A é o conjunto de nú meros ímpares menores que 10: A = {1, 3, 5,
7, 9}. Admita que B consiste daqueles membros de A que sã o quadrados perfeitos. 1 = 1 × 1,
entã o 1 é um quadrado perfeito. 9 = 3 × 3, entã o 9 é um quadrado perfeito. Os outros
nú meros, 3, 5 e 7, nã o sã o quadrados perfeitos. Entã o B = {1, 9}. O axioma dos subconjuntos
diz que se o conjunto A existe, B também existe.

Esse axioma depende da nossa compreensã o de como, pela especificaçã o de uma


propriedade adicional, separar alguns mas nã o todos os membros de um conjunto. A
propriedade adicional separa alguns elementos do resto. É uma distinçã o. A ideia da
distinçã o, como vimos, tem suas raízes em Deus (Capítulo 12).

O axioma do conjunto soma (união)

Suponha que começamos com um conjunto A . O axioma do conjunto soma diz que podemos
“totalizar” todos os elementos que sã o membros de todos os membros de A e fazer um
ú nico conjunto que tenha todos eles como seus membros.

Essa ideia pode ser confusa. Assim, consideremos um exemplo. Admita que o conjunto A
tem como seus membros vá rios outros conjuntos B , C e D . Ou seja, A = { B , C , D }.  O
conjunto soma de A é o conjunto U que consiste de todos os elementos que sã o membros de
B ou C ou D (incluindo elementos que sã o membros de mais de um desses três). Ou seja,

 
U = { x | x ∈ B ou x ∈ C ou x ∈ D }.
 

Esse conjunto soma de A é denotado como ∪ A = U . Assim


 
∪ A = U = { x | x ∈ B ou x ∈ C ou x ∈ D } = { x | para algum y , x ∈ y ∈ A }
 

O símbolo ∪ também é usado de outra maneira relacionada para indicar a uniã o B ∪ C , de


dois conjuntos B e C . A uniã o é o conjunto cujos membros sã o os elementos que estã o em
B , em C ou em ambos. Se B e C sã o conjuntos, o axioma dos pares diz que { B , C } é um
conjunto. Entã o o axioma do conjunto soma diz que ∪{ B , C } existe. ∪{ B , C } é o mesmo
que B ∪ C .

O axioma do conjunto soma diz que podemos reunir todos os membros de uma lista de
conjuntos. Formamos criativamente uma nova coleçã o. Essa criatividade é uma imagem da
criatividade divina. Esse axioma, junto com outros, nos permite formar conjuntos com cada
vez mais membros. Ao fazê-lo, usamos a ideia do que vem a seguir. Em particular, podemos
produzir uma série de conjuntos que imitam juntos a série de nú meros naturais. Vejamos
como.

Produzindo uma sequência de conjuntos

Correspondendo ao nú mero zero, teremos o conjunto vazio ∅. O conjunto vazio existe, de


acordo com o axioma do conjunto nulo. Tem zero elementos. Começaremos com o nú mero
zero, e nã o com o nú mero um, para que mais tarde cada nú mero n corresponda a um
conjunto com exatamente n elementos. O conjunto vazio, com 0 elementos, corresponde ao
nú mero zero.

Como o conjunto vazio existe, o axioma dos pares implica que o conjunto {∅, ∅} existe.
Como o elemento ∅ é idêntico a si mesmo, o conjunto {∅, ∅} é o mesmo que {∅}. Ele tem um
elemento nele, a saber, ∅. A este conjunto corresponderá o nú mero 1.

Como ∅ e {∅} existem, o axioma dos pares implica que o conjunto {∅, {∅}} existe. É o
conjunto com dois elementos, ∅ e {∅}. Os dois elementos nã o sã o idênticos, já que ∅ nã o
tem membros e {∅} tem um membro (a saber, ∅). É ó bvio, neste está gio, que devemos fazer
uma distinçã o cuidadosa entre um conjunto e os elementos que sã o seus membros. O
conjunto {∅, {∅}} corresponderá ao nú mero 2.

Como {∅} e {∅, {∅}} existem, o axioma dos pares diz que existe um conjunto
 
{{∅}, {∅, {∅}}}.
 

Novamente, usando o axioma dos pares, existe um conjunto


 
{{∅}, {{∅}, {∅, {∅}}}}.
 

O axioma do conjunto soma, aplicado a {{∅}, {{∅}, {∅, {∅}}}}, implica a existência de
 
∪{{∅}, {{∅}, {∅, {∅}}}} = {∅, {∅}, {∅, {∅}}}
 

Esse conjunto tem três membros: ∅, {∅} e {∅, {∅}}. Ele corresponderá ao nú mero 3.

Esse processo é laborioso, mas produzimos conjuntos com 0, 1, 2 e 3 elementos,


respectivamente. Poderíamos continuar e produzir conjuntos com ainda mais elementos.
Para ver o ponto rapidamente podemos adotar a opçã o, usada à s vezes na teoria dos
conjuntos, de usar conjuntos como nomes de nú meros (ou nú meros como nomes para
alguns conjuntos, o que equivale à mesma coisa). Para os propó sitos da teoria, um nú mero
é identificado com o conjunto. Assim, por exemplo, o nú mero 0 se torna uma abreviaçã o
para o conjunto vazio ∅: 0 = ∅. O nú mero 1 se torna uma abreviaçã o para {∅}: 1 = {∅} = {0}.
O nú mero 2 se torna uma abreviaçã o para {∅, {∅}}: 2 = {∅, {∅}} = {0, 1}. E o nú mero 3 se
torna uma abreviaçã o para {∅, {∅}, {∅, {∅}}}: 3 = {∅, {∅}, {∅, {∅}}} = {0, 1, 2}. Essa notaçã o
nos permite facilmente ver um padrã o. Podemos continuar o padrã o: 4 = {0, 1, 2, 3}; 5 = {0,
1, 2, 3, 4}; 6 = {0, 1, 2, 3, 4, 5}. Podemos ver (por transcendência imitativa) que o mesmo
padrã o nos permite produzir um nú mero tã o grande quanto desejarmos. Podemos
estender a sequência indefinidamente.

Em geral, se usamos essa convençã o para os nú meros, o sucessor do nú mero n é n ∪ { n }.


Uma vez que temos uma relaçã o sucessora, podemos prosseguir para definir a adiçã o e a
multiplicaçã o, como no Apêndice C. Mas como axioma também precisamos incluir alguma
forma do princípio da induçã o matemá tica.

O axioma do infinito

Até aqui, fomos capazes de construir conjuntos com um nú mero finito de elementos. Para
obter recursos para a aritmética, a teoria dos conjuntos precisa de um axioma do infinito .
Este axioma pode tomar a forma de se dizer que existe um conjunto que inclui como
membros todos os conjuntos 0, 1, 2, 3, …. O conjunto mínimo com essa propriedade é o
conjunto de nú meros inteiros nã o negativos, convencionalmente designado como ℕ. (No
contexto da teoria dos conjuntos, também designado como ω.) [85]

Os Capítulos 8 e 9 demonstram de que modo confiamos em Deus para a ideia de uma


sequência indefinidamente estendida. A infinitude de Deus é o fundamento ú ltimo para
nossa capacidade de pensar em uma sequência indefinidamente estendida — uma
sequência infinita. As mesmas observaçõ es se aplicam aqui. Quer pensemos diretamente
em termos de nú meros, quer pensemos em termos de conjuntos que usaremos para
representar os nú meros, os mesmos recursos sã o necessá rios, e esses recursos têm seu
fundamento ú ltimo em Deus.

O axioma do conjunto potência

A teoria dos conjuntos de Zermelo-Fraenkel inclui outros axiomas, que entram em jogo
principalmente na produçã o de conjuntos maiores, que sã o ú teis na teoria dos nú meros
reais e na teoria avançada dos conjuntos. O primeiro desses axiomas é chamado de axioma
do conjunto potência . Para entendê-lo, devemos primeiro definir o significado de
subconjunto . Um subconjunto de um conjunto A é um conjunto B cujos membros sã o
membros de A . Assim, por exemplo, {1, 3} é um subconjunto de {1, 2, 3}.

O axioma do conjunto potência diz que, se temos um conjunto A , existe outro conjunto, o
conjunto potência de A , cujos membros sã o todos os subconjuntos de A . Por exemplo, se A
é {1, 2, 3}, o conjunto potência de A é o conjunto de todos os subconjuntos de A ou {∅, {1},
{2}, {3}, {1, 2}, {1, 3}, {2, 3}, {1, 2, 3}}. Por convençã o, o conjunto potência de A é denotado
como P ( A ). Aplicando repetidamente o axioma do conjunto potência, pode-se produzir
rapidamente conjuntos bastante grandes. O conjunto potência do conjunto {1, 2, 3} com 3
membros tem 2 = 8 membros. O conjunto potência de um conjunto com 8 membros tem 2
3 8

= 256 membros. O conjunto potência de um conjunto com 256 membros tem 2 membros, 256

que é aproximadamente 10 , 1 seguido de 77 zeros.


77

A ideia de conjunto potência mostra outro uso do poder humano para a transcendência
imitativa (veja os capítulos 8 e 9). Quando temos um conjunto A , recuamos e nos
imaginamos colecionando elementos para um novo conjunto mais extenso consistindo de
todos os subconjuntos de A . No processo fazemos “sobressair” o conjunto A . Imitamos
Deus, cuja visã o de todas as coisas é abrangente e que sobressai a elas em sua infinitude.

O axioma da substituição

O axioma da substituição diz, grosso modo, que se temos um conjunto A e temos uma forma
de correlacionar cada membro x em A com um conjunto ú nico B , há um conjunto cujos
x

membros sã o todos os conjuntos B . Este axioma é chamado de axioma da substituiçã o


x

porque a ideia bá sica é “substituir” cada membro x em A com o conjunto correlacionado B . x

O resultado da substituiçã o é um novo conjunto.

Aqui está um exemplo. Admita A = {1, 2, 3, 4}. Admita que os nú meros 1, 2, 3 e 4 estã o
correlacionados respectivamente aos conjuntos {1}, {1, 2}, {1, 2, 3, 4, 5} e {1, 2, 3, 4, 5, 6, 7,
8}. Além disso, há um conjunto que tem as “substituiçõ es” em vez dos membros originais 1,
2, 3, e 4 como seus membros. O novo conjunto tem como seus membros {1}, {1, 2}, {1, 2, 3,
4, 5} e {1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8}; ou seja, é o conjunto {{1}, {1, 2}, {1, 2, 3, 4, 5}, {1, 2, 3, 4, 5, 6, 7,
8}}.

O axioma da substituiçã o pressupõ e nossa capacidade de fazer essas correlaçõ es e de


antever um segundo novo conjunto com os itens correlacionados como seus membros. A
correspondência entre os membros de A e os demais conjuntos pode ser vista como um
tipo de simetria, dependendo em ú ltima aná lise da simetria original em Deus. Estamos
pensando os pensamentos de Deus depois dele de uma maneira complexa.

Quando usamos um exemplo como esse, pode nã o parecer muito impressionante. Mas
quando o axioma da substituiçã o é usado em conexã o com os outros axiomas, pode levar a
novos conjuntos que sã o maiores do que qualquer conjunto produzido por outros meios,
pois os conjuntos correlacionados com os membros de A podem ser muito grandes.

Consideremos um exemplo. Comece com o conjunto de nú meros inteiros nã o negativos,


designado ω. Usando o axioma do conjunto potência, produza sucessivos conjuntos
potência de ω: ω, P (ω), P ( P (ω)), P ( P ( P (ω))) e assim por diante. Será que existe um
conjunto maior que todos os conjuntos nesta lista? Sem o axioma da substituiçã o nã o
podemos garantir que haverá um conjunto da forma
 
{ω, P (ω), P ( P (ω)), P ( P ( P (ω))), … }.

Agora simplesmente correlacionamos 0 com ω, 1 com P (ω), 2 com P ( P (ω)), 3 com P ( P (


P (ω))) e assim por diante. Usando essa correlaçã o e o fato de que o conjunto ω (= {0, 1, 2,
3, … }) existe, o axioma da substituiçã o nos permite concluir que {ω, P (ω), P ( P (ω)), P ( P (
P (ω))), … } existe. Designe esse novo conjunto como M . Esse novo conjunto tem apenas
tantos membros quantos nú meros inteiros nã o negativos existem. Mas o conjunto soma ∪
M é muito grande, incluindo no caso todos os subconjuntos de todos os conjuntos potência
na sequência começando com ω. Uma vez que tenhamos o grande conjunto ∪ M , o axioma
do conjunto potência nos permite concluir que todo o P (∪ M ), P ( P (∪ M )), P ( P ( P (∪
M ))), … existe. Visto que podemos correlacionar 0, 1, 2, 3, … com a sequência ∪ M , P (∪ M ),
P ( P (∪ M )), … , há um novo conjunto cujos membros sã o a sequência inteira: {∪ M , P (∪
M ), P ( P (∪ M )), … }.

Nesse processo, podemos observar o uso repetido da transcendência imitativa. A cada


passo em que produzimos conjuntos maiores, vamos além ou “transcendemos” a posiçã o
na qual já havíamos chegado.

O axioma da escolha

O axioma final que discutiremos é chamado de axioma da escolha . O axioma da escolha nã o


fazia parte da lista original de axiomas proposta por Zermelo e Fraenkel. Ele está sujeito a
mais debates, e alguns filó sofos e matemá ticos têm expressado desconforto com ele. Os
intuicionistas o rejeitam.

O axioma da escolha diz, grosso modo, que se temos um conjunto A cujos membros sã o
conjuntos nã o vazios, podemos achar uma forma de escolher, de cada conjunto, um
elemento designado que seja membro de A . Este axioma pode soar trivial. Se os conjuntos
de membros sã o nã o vazios, isso significa que cada um deles tem pelo menos um membro,
e nó s escolhemos um. Mas se estamos lidando com um conjunto infinito A , como o
conjunto de nú meros naturais, nunca podemos completar o processo. O axioma da escolha
nã o é uma consequência ló gica dos outros axiomas. Mas parece razoá vel. Por quê? Estamos
mais uma vez usando nossa capacidade de transcendência imitativa. Apesar de nunca
podermos na prá tica completar o processo de escolher um elemento de cada conjunto
entre um nú mero infinito de conjuntos, podemos imaginar isso sendo feito. Nó s
extrapolamos o infinito, por assim dizer. Apesar de sermos finitos, somos imitadores
imaginativos do infinito. Temos uma ideia do infinito. Agimos assim porque somos feitos à
imagem de Deus e o estamos imitando.
1
 

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(Summer 2011 Edition). Editado por Edward N. Zalta.
http://plato.stanford.edu/archives/sum2011/entries/brouwer/. Acessado em 18 de junho
de 2014.

Van Til, Cornelius. The Defense of the Faith , 2ª ed. rev. e condensada. Philadelphia:
Presbyterian & Reformed, 1963.

Vollenhoven, Dirk H. Theodoor. “Problemen en richtingen in de wijsbegeerte der


wiskunde” [Problems and Directions in the Philosophy of Mathematics]. Philosophia
Reformata 1 (1936): 162-187.

———. De wijsbegeerte der wiskunde van theïstisch standpunt [The Philosophy of


Mathematics from a Theistic Standpoint]. Amsterdam: Van Soest, 1918.

Whitehead, Alfred North e Bertrand Russell. Principia Mathematica , 2ª ed., 3 vols.


Cambridge: Cambridge University Press, 1927.
 

[1]
Outras pessoas acham que as verdades da aritmética estã o “aqui dentro”, isto é, que sã o itens do mobiliá rio mental.
Nó s certamente temos conceitos mentais sobre matemá tica. Mas, como veremos mais adiante, a matemá tica nã o deve ser
reduzida a esse polo da experiência subjetiva.
[2]
Fui encorajado aqui por Abraham Kuyper, que desafiou as pessoas a pensar sobre o senhorio universal de Cristo em
Lectures on Calvinism: Six Lectures Delivered at Princeton University under Auspices of the L. P. Stone Foundation (Grand
Rapids, MI: Eerdmans, 1931). Veja Vern S. Poythress, Redimindo a filosofia: uma abordagem teocêntrica às grandes
questões (Brasília: Monergismo, 2018), Apêndice A.
[3]
Para uma discussã o ampliada sobre a natureza da Bíblia, muitos livros estã o disponíveis. Veja especialmente John M.
Frame, A doutrina da Palavra de Deus (Sã o Paulo: Cultura Cristã , 2013). Para uma discussão sobre o conjunto mais amplo
de compromissos com os quais devemos estudar a Bíblia, veja Poythress, Redimindo a filosofia ; e Vern S. Poythress,
Inerrancy and Worldview: Answering Modern Challenges to the Bible (Wheaton, IL: Crossway, 2012).
[4]
Alguns relativistas e multiculturalistas poderiam alegar que até mesmo a verdade de 2+2=4 é “relativa” à cultura. Mas
em sua vida prá tica eles mostram que têm confiança nessas verdades.
[5]
A aná lise subsequente da verdade tomado emprestado ideias e formulaçõ es de Vern S. Poythress, Redimindo a ciência:
uma abordagem teocêntrica (Brasília: Monergismo, 2019), capítulos 1 e 14.
[6]
John M. Frame, A doutrina de Deus (Sã o Paulo: Cultura Cristã , 2014), p. 412-434.
[7]
Sobre a visã o bíblica da transcendência e imanência, veja John M. Frame, A doutrina do conhecimento de Deus (Sã o
Paulo: Cultura Cristã , 2010), especialmente p. 13-15; e Frame, A doutrina de Deus , especialmente p. 107-115. Sobre a
relaçã o com a filosofia cosmonô mica, veja Poythress, Redimindo a filosofia , apêndice A.
[8]
Vern S. Poythress, “Tagmemic Analysis of Elementary Algebra”, Semiotica 17/2 (1976): 131-151.
[9]
Os uivos e sinais dos animais mimetizam certos aspectos limitados da linguagem humana. E os chimpanzés podem ser
ensinados a responder a símbolos com significado. Mas isso ainda está longe da complexa gramá tica e significado da
linguagem humana. Veja, por exemplo, Stephen R. Anderson, Doctor Dolittle’s Delusion: Animals and the Uniqueness of
Human Language (New Haven, CT: Yale University Press, 2004).
[10]
Na sua capacidade de sofrer transformaçã o e reformulação, as leis científicas também mostram uma analogia com a
capacidade da linguagem humana de representar mú ltiplas perspectivas. Para mais informaçõ es sobre o cará ter
semelhante à linguagem da lei científica e da matemá tica, veja Vern S. Poythress, “Science as Allegory”, Journal of the
American Scientific Affiliation 35/2 (1983): 65-71, http://www.frame-poythress.org/science-as-allegory/, acessado em
18 de junho de 2014; Vern S. Poythress, “Newton’s Laws as Allegory”, Journal of the American Scientific Affiliation 35/3
(1983): 156-161, http://www.frame-poythress.org/ newtons-laws-as-allegory/, acessado em 18 de junho de 2014; Vern
S. Poythress, “Mathematics as Rhyme”, Journal of the American Scientific Affiliation 35/4 (1983): 196-203,
http://www.frame-poythress.org /mathematics-as-rhyme/, acessado em 18 de junho de 2014.
[11]
Em conformidade com a Bíblia (especialmente Gênesis 1), afirmamos que Deus e o mundo criado sã o distintos. Deus
nã o deve ser identificado com a criaçã o ou qualquer parte dela nem a criaçã o é uma “parte” de Deus. A Bíblia repudia
todas as formas de panteísmo e panenteísmo.
[12]
Veja a discussão em Poythress, Redimindo a ciência , capítulo 1.
[13]
Veja R. B. Edwards, “Word”, em Geoffrey W. Bromiley et al ., eds., The International Standard Bible Encyclopedia , 4
volumes (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1988), 4:1103-1107, e a literatura associada.
[14]
“No princípio era aquele que é a Palavra”, conforme a traduçã o da NVI. [N. do T.]
[15]
Sobre o cará ter divino da palavra de Deus, veja Vern S. Poythress, God-Centered Biblical Interpretation (Phillipsburg,
NJ: Presbyterian & Reformed, 1999), p. 32-36.
[16]
Veja a extensa discussã o sobre a punição justa em Vern S. Poythress, The Shadow of Christ in the Law of Moses
(Phillipsburg, NJ: Presbyterian & Reformed, 1995), p. 119-249.
[17]
Na versã o usada pelo autor. A ARA traz “farei entrar o espírito” e “o espírito entrou neles”, respectivamente. [N. do T.]
[18]
Dorothy Sayers, The Mind of the Maker (New York: Harcourt, Brace, 1941), especialmente p. 33-46. [Edição brasileira:
A mente do Criador (São Paulo: É Realizaçõ es, 2015).]
[19]
“Seu Espírito”, na versã o usada pelo autor. [N. do T.]
[20]
Veja também John Milbank, The Word Made Strange: Theology, Language, Culture (Oxford: Blackwell, 1997), sobre as
raízes trinitá rias da comunicaçã o.
[21]
Veja Poythress, God-Centered Biblical Interpretation , p. 31-50.
[22]
Cornelius Van Til, “Transcendent Critique of Theoretical Thought” (Resposta de C. Van Til), em Jerusalem and Athens:
Critical Discussions on the Theology and Apologetics of Cornelius Van Til , ed. E. R. Geehan (s. l.: Presbyterian & Reformed,
1971), p. 98. Sobre a dependência que os rebeldes têm de Deus, veja Cornelius Van Til, The Defense of the Faith , 2ª ed.
(Philadelphia: Presbyterian & Reformed, 1963); e a exposiçã o de John M. Frame, Apologética para a glória de Deus: uma
introdução (São Paulo: Cultura Cristã , 2011).
[23]
Uma percepçã o bastante valiosa sobre os fundamentos da apologética deve ser encontrada na tradiçã o da apologética
transcendental fundada por Cornelius Van Til. Veja Van Til, Defense of the Faith ; e Frame, Apologética para a glória de
Deus: uma introdução .
[24]
Veja Cornelius Van Til, The Defense of the Faith , 2ª ed. rev. e condensada (Philadelphia: Presbyterian & Reformed,
1963), p. 25-26; Vern S. Poythress, Logic: A God-Centered Approach to the Foundation of Western Thought (Wheaton, IL:
Crossway, 2013), capítulo 18.
[25]
Vou simplificar. Parmênides e Herá clito são amplamente conhecidos por suas posiçõ es contrastantes sobre a natureza
da mudança. Parmênides disse que o que era real nunca mudava e, portanto, que a mudança era uma ilusã o. Herá clito
disse que tudo mudava. Essas duas posiçõ es exibem o problema do um e dos muitos dentro do quadro do tempo. Filó sofos
posteriores enfocaram o problema do um e dos muitos tal como exibido nas classes de coisas. O que é comum a qualquer
coisa dentro de uma classe é o um; os muitos membros da classe sã o os muitos. O que é logicamente anterior: a condição
de gato (o um) ou a pluralidade de gatos (os muitos)?
[26]
Veja a discussão adicional em Vern S. Poythress, “Reforming Logic and Ontology in the Light of the Trinity: An
Application of Van Til’s Idea of Analogy”, Westminster Theological Journal 57/1 (1995): 187-219, reimpresso em
Poythress, Logic , apêndice F5; Poythress, Logic , capítulo 18.
[27]
O termo naturalismo é algumas vezes usado mais amplamente para descrever qualquer filosofia que diga que o
mundo da “natureza” é tudo o que há . (Essa visã o implica que nã o há Deus.) Materialismo é uma forma particular de
naturalismo que diz que a natureza se reduz a matéria e movimento. Por questã o de simplicidade, estaremos usando os
dois termos como virtuais sinô nimos. Para complicar a questã o ainda mais, a palavra materialismo também é usada para
descrever um compromisso e fascínio com o dinheiro e as coisas materiais. Esse tipo de compromisso é um problema
sério em nossos tempos, mas está fora do escopo de nossa discussã o.
[28]
Poythress, Redimindo a ciência , capítulo 1.
[29]
Sobre o materialismo, veja também Poythress, Inerrancy and Worldview , capítulo 3 e as pá ginas 229-230.
[30]
John M. Frame, Perspectives on the Word of God: An Introduction to Christian Ethics (Eugene, OR: Wipf & Stock, 1999);
John M. Frame, A doutrina da vida cristã (Sã o Paulo: Cultura Cristã , 2013).
[31]
Immanuel Kant afirmava que nosso senso subjetivo de estrutura temporal era derivado das categorias da nossa
mente, nã o da natureza do mundo como ele é em si mesmo. Para uma crítica dessa abordagem, veja Poythress, Logic ,
apêndice F1. O tempo se manifesta tanto subjetivamente (a perspectiva existencial) quanto no mundo (a perspectiva
situacional).
[32]
Alfred North Whitehead e Bertrand Russell, Principia Mathematica , 2ª ed., 3 vols. (Cambridge: Cambridge University
Press, 1927).
[33]
Poythress, “Tagmemic Analysis of Elementary Algebra”.
[34]
Poythress, Logic , capítulos 55-57.
[35]
Um material ú til sobre os aspectos sociais, pedagó gicos e culturais da matemá tica pode ser encontrado em Russell W.
Howell e W. James Bradley, eds., Mathematics in a Postmodern Age: A Christian Perspective (Grand Rapids, MI/Cambridge:
Eerdmans, 2001).
[36]
Poythress, Redimindo a filosofia .
[37]
A tentativa aná loga de isolar a verdade ló gica do mundo é discutida em Poythress, Logic .
[38]
John M. Frame, A doutrina do conhecimento de Deus (São Paulo: Cultura Cristã , 2010), p. 30.
[39]
É importante entender que muitas pessoas hoje que afirmariam ser cristã s sã o confusas e nã o pensam e vivem
consistentemente de acordo com uma visã o cristã de transcendência e imanência. De fato, professores “cristã os” que
representam formas modernistas de cristianismo podem ensinar de acordo com o lado direito do quadrado, a visão nã o
cristã .
[40]
Veja Frame, A doutrina do conhecimento de Deus ; Poythress, Redimindo a filosofia ; Esther Lightcap Meek, Longing to
Know (Grand Rapids, MI: Brazos, 2003).
[41]
Poythress, Logic , especialmente o capítulo 13.
[42]
Sobre necessidade, veja também Poythress, Logic , capítulos 65-66.
[43]
Discuto esse tema e temas relacionados com o taberná culo em Poythress, Redimindo a ciência , capítulos 11, 12, 17 e
20. Sobre as implicaçõ es para a matemá tica, veja ibid ., capítulo 22.
[44]
Veja também Poythress, Shadow of Christ in the Law of Moses , capítulos 1-5, 8.
[45]
Veja também Poythress, Redimindo a ciência , capítulo 20.
[46]
O autor compara fathered e begat no original em inglês, que no português podem ser igualmente traduzidos como
gerou . [N. do T.]
[47]
Veja também Poythress, Logic , capítulo 45.
[48]
Sobre o envolvimento de Deus no conhecimento de tipo comum, veja ibid ., capítulo 15.
[49]
A título de complementaçã o técnica, os axiomas também teriam de incluir axiomas descrevendo as propriedades da
relaçã o de igualdade =. Os axiomas de Peano são usados de vá rias formas, nem todas logicamente equivalentes.
[50]
Há complexidades sobre o que é admitido ser uma “propriedade” M . Se admitirmos apenas propriedades que podem
ser expressas usando uma linguagem ló gica formal com quantificaçã o de primeira ordem, teremos o suficiente para
estabelecer muitas verdades elementares da aritmética, mas nã o o suficiente para definir de modo ú nico tudo sobre os
nú meros naturais. Devemos deixar essas questõ es para livros mais avançados sobre a axiomatizaçã o da aritmética.
[51]
No que se refere à induçã o matemá tica, veja também Poythress, Logic , capítulo 45.
[52]
Veja mais em Poythress, Redimindo a ciência , capítulos 20-22.
[53]
James Nickel, Mathematics: Is God Silent? (Vallecito, CA: Ross, 2001).
[54]
O símbolo ∈ é uma forma da letra grega épsilon. Mas como caractere unicode , é distinto do alfabeto grego. Para essa
finalidade sã o usados os caracteres U2208 e U220A.
[55]
Devo essa percepção a Gene Chase.
[56]
Além disso, a teoria geral da relatividade de Einstein implica que um triâ ngulo no mundo real é ligeiramente
“curvado” por um campo gravitacional, como o campo produzido pela Terra (ou mesmo o campo produzido pelo corpo de
um observador). Assim, as propriedades da geometria euclidiana nã o se aplicam de forma precisa aos triâ ngulos em
nosso Universo.
[57]
Em particular, √2 ocorre na mecâ nica quâ ntica em conexã o com o princípio da superposição. Não parece ser algo
dispensá vel.
[58]
No caso dos nú meros irracionais, pode-se demonstrar que há exceçõ es a esse tipo de regra, embora nã o saibamos de
uma receita para calculá -las.
[59]
Veja Poythress, Logic , apêndices A1 e E2.
[60]
Veja Poythress, Logic , capítulo 54.
[61]
Veja Willem Kuyk, Complementarity in Mathematics: A First Introduction to the Foundations of Mathematics and Its
History (Dordrecht-Holland/Boston: Reidel, 1977).
[62]
Para o contexto mais amplo do antirreducionismo, veja Poythress, Redimindo a filosofia ; Poythress, Teologia
sinfônica: a validade das múltiplas perspectivas em teologia (Sã o Paulo: Vida Nova, 2016).
[63]
James Nickel, Mathematics: Is God Silent? ed. rev. (Vallecito, CA: Ross, 2001).
[64]
Vern S. Poythress, “A Biblical View of Mathematics”, em Gary North, ed., Foundations of Christian Scholarship: Essays in
the Van Til Perspective (Vallecito, CA: Ross, 1976), 158-188; http://www.frame-poythress.org/a-biblical-view-of-
mathematics/, acessado em 29 de dezembro de 2012.
[65]
Steve Bishop, “A Bibliography for a Christian Approach to Mathematics” (7 de junho de 2008);
http://www.scribd.com/doc/3268416/A-bibliography-for-a-Christian-approach-to-mathematics, acessado em 17 de
setembro de 2012.
[66]
Gene Chase e Calvin Jongsma, “Bibliography of Christianity and Mathematics, 1st edition 1983”;
https://www.asa3.org/ASA/topics/Mathematics/1983Bibliography.html, acessado em 30 de julho de 2012. Essa
bibliografia foi publicada pela Dordt College Press em 1983, mas está agora fora de catá logo.
[67]
D. H. Th. Vollenhoven, “Problemen en richtingen in de wijsbegeerte der wiskunde” [Problemas e orientaçõ es na
filosofia da matemá tica], Philosophia Reformata 1 (1936): 162-187; D. H. Th. Vollenhoven, De wijsbegeerte der wiskunde
van theïstisch standpunt [A filosofia da matemá tica de um ponto de vista teísta] (Amsterdam: Van Soest, 1918). Sobre a
filosofia da lei-ideia, veja Poythress, Redimindo a filosofia , apêndice A.
[68]
Poythress, Redimindo a ciência ; Poythress, Chance and the Sovereignty of God: A God-Centered Approach to Probability
and Random Events (Wheaton, IL: Crossway, 2014); Poythress, Redimindo a filosofia ; Poythress, Inerrancy and Worldview .
[69]
Leon Horsten, “Philosophy of Mathematics”, The Stanford Encyclopedia of Philosophy (Spring 2014 Edition), ed.
Edward N. Zalta, http://plato.stanford.edu/archives/spr2014/entries/philosophy-mathematics/, acessado em 18 de
junho de 2014.
[70]
Poythress, Logic , apêndice A1.
[71]
Alfred North Whitehead e Bertrand Russell, Principia Mathematica , 2ª ed., 3 vols. (Cambridge: Cambridge University
Press, 1927).
[72]
Poythress, Logic , capítulo 56 e apêndice D1.
[73]
O ano de 1983 viu o nascimento do neologicismo , que escapava das restriçõ es de Gö del usando suposiçõ es mais
poderosas e uma ló gica mais poderosa (Horsten, “Philosophy of Mathematics”, §2.1). Mas os críticos reclamaram que
essas suposiçõ es fundacionais implicitamente somavam a aritmética à ló gica, nã o havendo assim nenhuma genuína
“reduçã o” à ló gica.
[74]
Poythress, Logic , capítulo 64; Mark van Atten, “Luitzen Egbertus Jan Brouwer”, The Stanford Encyclopedia of
Philosophy (Summer 2011 Edition), ed. Edward N. Zalta, http://plato.stanford.edu/archives/sum2011/entries/brouwer/,
acessado em 18 de junho de 2014; Rosalie Iemhoff, “Intuitionism in the Philosophy of Mathematics”, The Stanford
Encyclopedia of Philosophy (Spring 2014 Edition), ed. Edward N. Zalta,
http://plato.stanford.edu/archives/spr2014/entries/intuitionism/, acessado em 18 de junho de 2014.
[75]
Nú mero primo é um nú mero inteiro cujos ú nicos divisores sã o 1 e o pró prio nú mero primo. Assim, 3 é primo porque
seus ú nicos divisores sã o 1 e 3. 5 e 7 também são primos. 4 nã o é, pois tem 2 como um divisor. 9 nã o é, pois tem 3 como
um divisor.
[76]
Poythress, Logic , capítulos 55-58 e apêndice D1.
[77]
Ibid ., apêndice A1.
[78]
Horsten, “Philosophy of Mathematics”, §2.4.
[79]
Ibid ., §3.2.
[80]
James Bradley e Russell Howell, Mathematics through the Eyes of Faith (New York: HarperOne, 2011), capítulo 10,
221-243. Eu digo que o empirismo “tradicional” mas modificado, conforme representado pela filosofia cosmonô mica, é
relativamente recente (século XX) quando comparado com o platonismo modificado, que remonta a Santo Agostinho.
[81]
Poythress, Logic , parte I.C.
[82]
Veja Poythress, Redimindo a filosofia , apêndice A.
[83]
Veja Poythress, Redimindo a Ciência , apêndice 2.
[84]
Thomas Jech, “Set Theory”, The Stanford Encyclopedia of Philosophy (Winter 2011 Edition) , ed. Edward N. Zalta,
http://plato.stanford.edu/archives/win2011/entries/set-theory/, §4, acessado em 18 de junho de 2014.
[85]
O símbolo ℕ é o unicode U2115. ω, a ú ltima letra do alfabeto grego, é o unicode U03C9.

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