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Hermenêutica bíblica

Aula 6: Hermenêutica e a legitimidade do texto bíblico —


aplicação para os dias

Apresentação
Somente pela hermenêutica bíblica é possível realizar uma interpretação válida do texto bíblico. No entanto, o contexto
histórico, seja ele qual for, não pode usurpar a mensagem original de Deus. Nesta aula, empregaremos a hermenêutica
como um canal de atualização da mensagem divina no contexto atual.

Nesta aula, vamos compreender que a preservação da legitimidade da voz de Deus não permite que ela seja confundida
como as mais variadas interpretações oriundas da realidade histórico-cultural. O relativismo cultural é um perigo eminente
para a interpretação �dedigna da mensagem divina, colocando a interpretação acima da verdade de fé.

Objetivos
• Rea�rmar os limites do contexto histórico em relação à mensagem divina;

• Valorizar a hermenêutica bíblica como canal de preservação da legitimidade da voz de Deus;

• Reconhecer o perigo eminente do relativismo cultural na interpretação �dedigna dessa mensagem.

Primeiras palavras

"Os céus e a terra passarão, mas as minhas palavras jamais


passarão."
- Mateus, 24, 35

É evidente que, ao re�etir sobre a Bíblia, é impossível não levar em conta as muitas diferenças de tempo, espaço, cultura e
contexto que são cenários de seus relatos. Seja qual for o tempo histórico e a cultura, o Texto Sagrado continuará tendo o seu
valor e as suas mensagens, as quais, ainda que sejam interpretadas, não podem perder a essência, veracidade e originalidade
da mensagem de Deus aos homens. Frequentemente, o caráter histórico-crítico da interpretação nega a dimensão “reveladora”
da Sagrada Escritura, retirando, em alguns casos, Deus do centro.
"[...] Há uma crença de que o sentido do texto é determinado
pela “intenção” do autor e pela “recepção dos seus primeiros
leitores”. Dessa forma, cada texto tem somente um sentido
verdadeiro, que pode ser descoberto mediante o estudo
cuidadoso do contexto histórico da época de sua escrita e da
con�guração gramatical-linguística do texto. Tendo em vista,
entretanto, que o tom teológico e apologético da leitura
predomina, a análise do contexto histórico já de antemão se
coloca a serviço da con�rmação das verdades bíblicas já
conhecidas e entregues de uma vez para sempre aos santos.
Outra característica dessa abordagem é a crença na unidade
teológica da Escritura, mediante a qual os sentidos históricos
dos textos vão sendo nivelados e harmonizados a partir do
conjunto de doutrinas reconhecidas como verdadeiras e que
encontram nos escritos paulinos, principalmente, a sua fonte
primordial."
- ZABATIERO, 2006, p. 67

Interpretar os textos bíblicos a partir de referências históricas não é uma ação equivocada. Ao contrário, é uma escolha sábia
para que sejam �ltrados dados, situações, comportamentos e detalhes essenciais à compreensão da ação de Deus na história.

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A aliança de Deus com Noé


Há várias passagens que, por exemplo, expressam a aliança de Deus com o povo. Todas trazem narrativas repletas de
linguagens especí�cas e contextos diferentes, mas uma a verdade é a mesma: Deus quis escolher este povo e com ele fazer
uma aliança.

A legitimidade da voz de Deus e sua mensagem original não se confundem com as várias possibilidades de análise do
contexto. Os relatos das alianças são propícios para compreendermos o valor da interpretação hermenêutica bíblica.
Percebemos que eles são formados por vários textos redigidos em contextos diferentes e com personagens diversos, mas a
mensagem é a mesma. Deus, ao criar o homem, já registrava o seu desejo de a ele permanecer ligado: “E eu convosco
estabeleço a minha aliança, que não será mais destruída toda a carne pelas águas do dilúvio, e que não haverá mais dilúvio,
para destruir a terra”. (Gênesis 9, 11)
 A Criação de Adão, retratada por Michelangelo no teto da Capela Sistina. (Fonte: Wikipedia).

Pelo pecado, o homem se afastara de Deus, mas, após o dilúvio, Ele escolheu Noé para ser o porta-voz da primeira aliança.
Ele escolheu Noé, descendente da linhagem de sete. Apesar de ser o fruto de uma linhagem corrompida pelo pecado, este
homem foi eleito pelo Criador como o único justo para fazer essa aliança. Um homem com fraquezas e fragilidades, vindo de
uma geração pecadora, mas que, pela vontade de Deus, se tornaria um grande obediente e cumpridor dos pedidos de seu
Senhor e Criador.

Atenção

Pela idade de Noé na data de sua morte (950 anos), já é possível perceber quão necessária a hermenêutica será para a
interpretação bíblica, pois nenhuma linguagem �gurada pode abafar o aspecto essencial que um relato deseja transmitir. Não é
um relato qualquer, pois ele expressa a vontade de Deus.

Noé ouve as orientações de Deus. Em seguida, trata de cumpri-las: constrói a Arca, leva para dentro macho e fêmea das
espécies viventes e entra com sua família (esposa, �lhos e noras). É o novo início da criação.

Leitura

Acesse o conhecimento sobre a simbologia do número 40.

Abraão e a renovação dessa aliança

Após a aliança com Noé, Deus percebeu que, aos poucos, com o passar do tempo, ela foi esquecida. Ele, ainda assim, insistiu
em permanecer perto do povo: para isso, escolhe Abraão para renovar o pacto de amor.
A aliança com Abraão apresenta claramente a escolha do povo pelo único Deus. Trata-se de uma libertação da idolatria e dos
falsos deuses que muitos antepassados cultuavam.

 Arca de Noé (1846), de Edward Hicks. (Fonte: Wikimedia Commons)

Muitas foram as tribulações e os desa�os enfrentados por Abraão


para que ele se mostrasse �el à vontade de Deus. Acreditando nas
promessas divinas, o pastor, para con�rmar a sua �delidade, aceitou
sacri�car o próprio �lho 2 , Isaque 3 .

Em Gênesis 12, 1-3, Deus insiste estar próximo, escolhendo Abraão, o patriarca, para renovar a aliança. Assim, o Criador fez
dele o pai da fé. Trata-se de um texto repleto da voz de Deus. Uma mensagem direta que renova nossos sentidos da fé. Ele
parece ter sido “tão cruel” com Abraão, mas, pela análise hermenêutica, concluímos que estamos diante de uma narração que
nos questiona: como estamos vivendo a vontade de Deus e nossa vida? Nosso amor e nossa �delidade a Deus nos fazem ser
como Abraão?
Em Gênesis 12, 1-3, Deus insiste estar próximo, escolhendo Abraão, o patriarca, para renovar a aliança. Assim, o Criador fez
dele o pai da fé. Trata-se de um texto repleto da voz de Deus. Uma mensagem direta que renova nossos sentidos da fé.

Ele parece ter sido “tão cruel” com Abraão, mas, pela análise hermenêutica, concluímos que estamos diante de uma narração
que nos questiona: como estamos vivendo a vontade de Deus e nossa vida? Nosso amor e nossa �delidade a Deus nos fazem
ser como Abraão?

 A partida de Abraão, por József Molnár. (Fonte: Wikimedia Commons)

Deus e os hebreus: a escolha de Moisés


Deus não se cansa mesmo de nós, embora devamos pontuar que Ele terá de se manifestar novamente em um contexto histórico
especí�co.

Um contexto cheio de complexidades, mas também de muitos pecados. Um povo afastado da verdadeira fé. Aliança rompida,
quebrada e esquecida.

O Criador, por conta disso, teve de escolher um novo líder para renová-la mais uma vez.

Antes que Moisés soubesse dos planos de Deus para ele, um longo percurso de vida foi traçado para ele. Deus teceu sua história
com uma riqueza de detalhes.

Absolutamente tudo que está no relato bíblico acerca de Moisés nos apresenta uma verdadeira história de manifestação de fé.
Isso inclui até mesmo as �guras de linguagem, as passagens não literais e as alegorias: em todas as passagens, encontramos,
ouvimos, constatamos e comprovamos um Deus verdadeiro, que insiste em não abandonar o seu povo.

Saiba mais

Relembre a história de Moisés vendo este desenho animado.

A história de Moisés 4 é um clássico para a compreensão da história do povo de Deus. Nenhuma análise textual enfraquece a
clareza da mensagem divina. Claramente, veri�camos a interferência de Deus ao longo de toda a sua trajetória.

Depois de tantas vivências, com o povo já liberto do Egito, Deus se revela-se a Moisés no Monte Sinai:
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"E subiu Moisés a Deus, e o Senhor o chamou do monte,


dizendo: Assim falarás à casa de Jacó e anunciarás aos �lhos
de Israel: Vós tendes visto o que �z aos egípcios, como vos
levei sobre asas de águias e vos trouxe a mim; agora, pois, se
diligentemente ouvirdes a minha voz e guardardes a minha
aliança, então sereis a minha propriedade peculiar dentre
todos os povos, porque toda a terra é minha. E vós me sereis
um reino sacerdotal e o povo santo."
- Êxodo, 19, 3-6
Dessa vez, Deus faz um pacto, deixando os mandamentos encontrados em Êxodo
20, 3-17 e Deuteronômio 5, 7-21. Por meio deles, Ele quis con�rmar a aliança com
o seu povo, relembrando que, mais uma vez, o pecado tinha tomado conta deles.

 Os dez mandamentos (1638), por Spagnoletto. (Fonte: Wikipedia).

A travessia pelo deserto, depois da saída do Egito, trouxe vários sofrimentos no caminho para a terra prometida. Isso fez com
que o povo duvidasse da presença do Criador e se rebelasse contra Ele, mas Deus lhes respondeu:
"E Deus falou todas estas palavras: "Eu sou o Senhor, o teu
Deus, que te tirou do Egito, da terra da escravidão. Não terás
outros deuses além de mim. Não farás para ti nenhum ídolo,
nenhuma imagem de qualquer coisa no céu, na terra ou nas
águas debaixo da terra. Não te prostrarás diante deles nem
lhes prestarás culto, porque eu, o Senhor teu Deus, sou Deus
zeloso, que castigo os �lhos pelos pecados de seus pais até a
terceira e quarta geração daqueles que me desprezam, mas
trato com bondade até mil gerações aos que me amam e
guardam os meus mandamentos”."
- Êxodo 20, 1-6

Saiba mais

Veja o vídeo: Deus fala com Moisés no Monte Sinai (narrado por Cid Moreira).

Depois da liderança de Moisés, foi Josué que entrou com o povo hebreu na terra prometida de Canaã. Um novo tempo
começaria. Nesse período, a Bíblia relata muitas tentativas de Deus para manter seu povo �el.


Período dos juízes
(1390 a.C. até 1030 a.C.)

Para garantir isso, Ele escolheu os juízes que, por aproximadamente 410 anos, cuidaram para que essa aliança não fosse desfeita.
Eram líderes políticos, religiosos e militares que, aceitando a vontade divina, organizavam e lideravam as tribos dos hebreus.


Monarquia
(1040 a.C. até 586 a.C.)

Após o período dos juízes, a monarquia foi instaurada e até esperada pelo povo. Houve muitos reis em Israel e por todas as partes
fora de suas fronteiras. Samuel foi o último juiz de Israel, sendo sucedido por Saul, que, em 1040 a.C., iniciou o período da
monarquia.
Em 586 a.C., durante o reinado de Zedequias, os babilônios sitiaram e destruíram Jerusalém, tendo Nabucodonosor à frente.
Saul começou a reinar depois de ter obtido uma vitória militar e triunfado em outras ocasiões, embora nunca tenha conseguido
acabar com os �listeus. (1Sm 11) Lutando contra esses inimigos no Monte Gilboa, morreram tanto seus três �lhos quanto o
próprio Saul. (1Sm 31, 1-6)

A aliança renovada com Davi


Saul, então, foi sucedido por Davi, com quem Deus quis renovar a aliança que havia se rompido novamente. O Criador
continuava insistindo em �car junto com seu povo, escolhendo Davi, o mais frágil dos irmãos e o último a ser chamado para ser
entrevistado. O pequeno Davi derrotou o gigante Golias que amedrontava o povo de Israel.

"As benignidades do Senhor cantarei perpetuamente; com a


minha boca manifestarei a tua �delidade de geração em
geração. Pois disse eu: A tua benignidade será edi�cada para
sempre; tu con�rmarás a tua �delidade até nos céus, dizendo:
“Fiz uma aliança com o meu escolhido” [...]."
- Salmos 88, 1-3; 89, 1-3, grifos meus
A história de Davi nos apresenta esta mensagem divina: o pequeno com Deus é forte, mas o grande sem Deus é fraco. Uma
metáfora perfeita para explicar a mensagem que o Criador deseja transmitir. Deus se manteve e se mantém presente em toda a
história do povo eleito, o povo da aliança.

Ele é um Deus de amor, de ternura e de consolo. “Diz o Senhor: ‘Porei a minha lei no seu interior e a escreverei no seu coração; e
eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo’”. (Jeremias 31, 33)

 Coroação de David como rei de Israel (Biblioteca Nacional da França). (Fonte: Wikimedia Commons).
Em algumas circunstâncias, quando o pecado desperdiçava a sua existência, Ele se
manifestou de forma intensa, deixando nitidamente mensagens e ações a serem
realizadas. Deus nunca abandonou o seu povo. Entre uma “aliança e outra”, Ele enviou
sinais, pessoas, juízes, reis para mostrar que não estava afastado, mas o povo, ainda
assim, insistia em romper a unidade. Ele reagiu, apontando as fraquezas da humanidade
ao longo da história.

O Filho de Deus: a aliança de�nitiva


Deus cumpre a promessa de enviar o seu Filho para salvar a Humanidade. Chegou a hora da aliança de�nitiva. Trata-se de uma
história que começa com muita dor: Jesus Cristo foi perseguido da infância à morte. Quem escolheu segui-Lo também sofreria
perseguição. Para os cristãos, Jesus, Filho de Deus, se tornou homem e veio ao mundo a �m de pregar o amor ao Criador e ao
próximo. Mesmo assim, foi perseguido e morto por aqueles que não aceitavam os seus ideais. A nova aliança de Deus
conclamava:

"...à igreja dos primogênitos, cujos nomes estão escritos nos


céus, a Deus, o juiz de toda a humanidade, aos espíritos dos
justos agora perfeitos, a Jesus, mediador de uma nova
aliança, e ao sangue aspergido, que se expressa com mais
veemência do que o sangue de Abel. Cuidado! Não rejeiteis
Aquele que fala. Pois, se não escaparam os que rejeitaram
quem os advertia sobre a terra, muito mais nós, se
desprezarmos Aquele que nos admoesta dos céus."
- Hebreus 12, 23-25, grifos meus
Os judeus esperavam um restaurador que lutasse contra a opressão, um líder terreno, e não divino. Esperavam um
messias que reconquistasse o poder de Israel. Não chegou o rei que queriam, mas Deus enviou algo muito maior. Jesus
Cristo pregava sobre a conversão, o amor, a paz e um novo tempo em Deus.

 O sermão da montanha (1890), pelo pintor dinamarquês Carl Heinrich Bloch. (Fonte: Wikipedia)

Leitura

Leia aqui o sermão da montanha.

Trata-se de um claro exemplo hermenêutico: Jesus aperfeiçoou a lei


anterior.

"Não julgueis que vim abolir a lei ou os profetas. Não vim


para os abolir, mas sim para levá-los à perfeição. Pois em
verdade vos digo: passará o céu e a terra antes que
desapareça um jota, um traço da lei. Aquele que violar um
destes mandamentos, por menor que seja, e ensinar assim
aos homens, será declarado o menor no Reino dos Céus. Mas
aquele que os guardar e os ensinar será declarado grande no
Reino dos Céus. Digo-vos, pois, se vossa justiça não for maior
que a dos escribas e fariseus, não entrareis no Reino dos
Céus."
- Mateus 5,48

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Saiba mais

Veja:

• O sermão da montanha: a oração do Senhor.

• Qual a chave para entender o sermão da montanha?

A hermenêutica bíblica atualiza a mensagem divina em vários contextos. Veremos a seguir os perigos de uma atualização que
não se atenha ao propósito original de determinada mensagem.

 Contextualização × relativização: o perigo de uma leitura equivocada

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Contextualização × relativização: o perigo de uma leitura equivocada

A interpretação bíblica pode e deve ser contextualizada, mas jamais poderá abafar a voz de Deus. Em todas as épocas
históricas, foi necessário fazer contextualizações, mas, em cada uma, atuava o mesmo Deus com a mesma
mensagem e o mesmo projeto em relação à humanidade.

Assim acontece atualmente: o relativismo cultural (O relativismo cultural tem origem no multiculturalismo, que, em
primeira instância, buscou derrubar a ideia do eurocentrismo, que sempre colocou a Europa como o centro da melhor
cultura.) poderia ser um grande canal de análise bíblica, pois, conceitualmente, ele pretende compreender os fatos de
acordo com seu(s) contexto(s). No entanto, nem sempre é assim que acontece. Como muitas outras iniciativas do
cienti�cismo pós-moderno, sua aplicação indiscriminada acabou, em muitas situações, relativizando também a
essência de mensagens perenes.

A hermenêutica �losó�ca cumpre o papel do diálogo multicultural, extraindo as contribuições para a humanidade – e
esta é uma tarefa importantíssima. Dessa forma, ela contribuiu com a hermenêutica bíblica para a solidi�cação da
análise �dedigna do texto em um contexto.

Ao longo da história, sempre houve uma mistura cultural. Nunca houve uma monocultura: a Bíblia é um grande
exemplo dessa mistura, cujo pano de fundo é a história da salvação. Na Bíblia, há um só povo eleito, mas ele é
composto por muitos povos.

Então, ouvi grande voz vinda do trono dizendo: Eis o tabernáculo de Deus com os homens. Deus habitará com eles.
Eles serão Seu povo, e o próprio Deus estará com eles e será o seu Deus. [...] As nações andarão mediante a sua
luz, e os reis da terra lhe trarão o seu esplendor.

Apocalipse 21, 3; 21, 24


 Cópia da Bíblia de Gutenberg, propriedade do Congresso dos Estados Unidos. (Fonte: Wikipedia).

O relativismo cultural é perigoso por poder colocar a opinião do intérprete acima da verdade de fé. O relativismo se
contrapõe a qualquer verdade perene, pois ele opta pelo efêmero: a única verdade é não haver verdade absoluta. A
Bíblia é a verdade perene. Ela narra, preserva, guarda e divulga a verdade da aliança de Deus com o seu povo eleito.
Dessa forma, ela é um ponto de ataque do relativismo.

Quando o homem se coloca como medida de si mesmo, se instala a ditadura do relativismo. Ela esvazia a essência
dos valores cristãos, começando pela palavra de Deus. Em 2005, o então Papa Bento XVI, no discurso na abertura do
congresso eclesial diocesano na basílica de são João de Latrão, chamou a atenção para esse perigo:

Hoje, um obstáculo particularmente insidioso à obra educativa é constituído pela presença maciça, na nossa
sociedade e cultura, daquele relativismo que, nada reconhecendo como de�nitivo, deixa sozinho, como última
medida, o próprio eu com as suas decisões, e sob a aparência da liberdade torna-se para cada um uma prisão,
porque separa uns dos outros, reduzindo cada um a permanecer fechado dentro do seu "eu". Dentro de um
horizonte relativista como este não é possível, portanto, uma verdadeira educação: sem a luz da verdade, mais
cedo ou mais tarde cada pessoa está, de facto, condenada a duvidar da bondade da sua própria vida e das
relações que a constituem, do valor do seu compromisso para construir com os outros algo em comum.

BENTO XVI, 2005


A modernidade líquida funciona em oposição à modernidade sólida. A sociedade que se pauta por regras, controles,
verdades absolutas, mandamentos e qualquer outra característica fruto das instituições tradicionais ou dos valores
enfrenta cada vez mais a disseminação de uma outra ideia de sociedade, que parece promover o individualismo,
transformando tudo o que era sólido em líquido. São tempos líquidos.

O “derretimento dos sólidos”, traço permanente da modernidade, adquiriu, portanto, um novo sentido e, mais que
tudo, foi redirecionado a um novo alvo, e um dos principais efeitos desse redirecionamento foi a dissolução das
forças que poderiam ter mantido a questão da ordem e do sistema na agenda política. Os sólidos que estão para
ser lançados no cadinho e os que estão derretendo neste momento, o momento da modernidade �uida, são os
elos que entrelaçam as escolhas individuais em projetos e ações coletivas – os padrões de comunicação e
coordenação entre as políticas de vida conduzidas individualmente, de um lado, e as ações políticas de
coletividades humanas, de outro.

BAUMAN, 2001, p. 12

A hermenêutica bíblica tem a responsabilidade de não permitir que a mensagem da Bíblia também seja derretida. Além
de tantos outros valores diluídos, sabemos das notícias de várias tentativas de falsi�cação e derretimento da palavra
de Deus. Na carta encíclica Caritas in veritate, o então Papa Bento XVI elucidava essa questão:

Hoje, cresceram notavelmente as possibilidades de interacção das culturas, dando espaço a novas perspectivas de
diálogo intercultural; um diálogo que, para ser e�caz, deve ter como ponto de partida uma profunda noção da
especí�ca identidade dos vários interlocutores. No entanto, não se deve descurar o fato de que esta aumentada
transação de intercâmbios culturais traz consigo, atualmente, um duplo perigo. Em primeiro lugar, nota-se um
ecletismo cultural assumido muitas vezes sem discernimento: as culturas são simplesmente postas lado a lado e
vistas como substancialmente equivalentes e intercambiáveis umas com as outras. Isso favorece a cedência a um
relativismo que não ajuda o verdadeiro diálogo intercultural; no plano social, o relativismo cultural faz com que os
grupos culturais se juntem ou convivam, mas separados, sem autêntico diálogo e, consequentemente, sem
verdadeira integração.

BENTO, 2009

É para evitar esse cenário de equívocos que a hermenêutica bíblica atua. Ela cuida para que a verdade da mensagem
da palavra de Deus não seja relativizada pela ideia de um ecletismo cultural que esvazie a essência da verdade.

Sem a hermenêutica, o texto bíblico corre o grande e perigoso risco de ser analisado apenas como um contexto
cultural, inclusive com a separação, em muitos casos, da natureza humana, reduzindo o homem a um simples dado
cultural, como alertou Bento XVI.

O contexto cultural em que determinado fato bíblico ocorreu, as personagens envolvidas, a organização social e os
demais dados são, para hermenêutica bíblica, pontos essenciais para a preservação da mensagem original da voz de
Deus, e não pontos de aniquilamento da verdade divina daquela realidade.

Somente pela hermenêutica bíblica será possível realizar uma interpretação válida do Texto Sagrado. O contexto
histórico, seja ele qual for, não pode usurpar a mensagem original de Deus. O relativismo cultural é um perigo eminente
para a interpretação �dedigna da mensagem divina, já que pode relativizá-la, colocando a interpretação acima da
verdade de fé.
Atividade
1. A hermenêutica bíblica atualiza a ________________ nos vários contextos. A interpretação bíblica pode e deve ser
contextualizada, mas jamais poderá abafar a voz de Deus. Em todas __________________________, foi necessário fazer
contextualizações, mas, em todas elas, foi o mesmo Deus com a mesma mensagem e o mesmo projeto, que se referia à
_________________________.

Qual grupo de palavras completa com sequência lógica e coerência o fragmento acima?

a) Mensagem divina, épocas históricas, humanidade


b) Mensagem humana, manifestações, humanidade
c) Manifestação, contextualizações, comunidade
d) Humanidade, épocas históricas, igreja
e) Épocas históricas, mensagem divina, comunidade

2. Interpretar os textos bíblicos a partir de referências históricas não é uma ação equivocada. Ao contrário, é uma escolha sábia
para que sejam �ltrados dados, situações, comportamentos e detalhes essenciais à compreensão da ação de Deus na história.
São várias as passagens que expressam a aliança de Deus com o povo. Todas trazem narrativas repletas de linguagens
especí�cas e de contextos diferentes, mas só uma é a verdade:

a) Deus quis escolher um povo e com ele fazer aliança.


b) Deus escolheu muitos povos e com cada um fez uma aliança diferente.
c) O povo quis fazer uma aliança com Deus para que fosse por ele protegido.
d) O povo eleito de Deus sempre foi fiel à aliança com Deus.
e) Deus rompeu a aliança com o povo em várias épocas.

3. “A falta de uma hermenêutica da fé na abordagem da Escritura não se apresenta apenas em termos de uma ausência; o seu
lugar acaba inevitavelmente ocupado por outra hermenêutica, uma hermenêutica secularizada, positivista, cuja chave
fundamental é a convicção de que o divino não aparece na história humana. Segundo esta hermenêutica, quando parecer que
há um elemento divino, isso deve se explicar de outro modo, reduzindo tudo ao elemento humano. Consequentemente,
propõem-se interpretações que negam a historicidade dos elementos divinos.”

Este é um trecho de um documento escrito pelo Papa Bento XVI sobre a palavra de Deus. Que documento é este?

a) Exortação Apostólica Evangelii gaudium


b) Exortação apostólica Verbum domini
c) Encíclica Lumen fidei
d) Exortação apostólica gaudete et exsultate
e) Exortação apostólica amoris laetitia

Notas

Noé 1
Noé, que vem do hebraico Noach (‫)נח‬, signi�ca alívio, conforto, descanso. O Livro do Gênesis apresenta detalhadamente a sua
história. Noé é mencionado pela primeira vez em Gênesis 5, 29. Já a sua morte é relatada Gênesis 9, 29. Quando morreu, ele
tinha 950 anos.

Aceitou sacri�car o próprio �lho 2

Deus quis provar a fé de Abraão. Por isso, pediu-lhe uma prova: o sacrifício do próprio �lho. Mesmo com dor, o pastor con�ou e
obedeceu, indo ao monte oferecer Isaque em sacrifício. O anjo de Deus chamou Abraão e ordenou que não sacri�casse seu
�lho. O Criador viu que ele tinha fé e com ele fez a aliança. Deus impediu o sacrifício, pois havia prometido que Abraão seria pai
de uma descendência e que Canaã seria a terra prometida.

Isaque 3

Deus quis provar a fé de Abraão. Por isso, pediu-lhe uma prova: o sacrifício do próprio �lho. Mesmo com dor, o pastor con�ou e
obedeceu, indo ao monte oferecer Isaque em sacrifício. O anjo de Deus chamou Abraão e ordenou que não sacri�casse seu
�lho. O Criador viu que ele tinha fé e com ele fez a aliança. Deus impediu o sacrifício, pois havia prometido que Abraão seria pai
de uma descendência e que Canaã seria a terra prometida.

História de Moisés 4

Descendente de Jacó, o povo hebreu tornou-se muito numeroso e já vivia no Egito há mais de 400 anos. (Êxodo 12,40) Um
número que in�amava os egípcios de raiva. O faraó, que não conhecia a história desse povo, pois entrou no Egito com José,
endureceu ainda mais seu coração e mandou destruir o povo hebreu. Para realizar isso, mandou matar os recém-nascidos,
Referências
jogando-os no Rio Nilo. Assim desenrola-se toda a história que já conhecemos e relembramos.

____. Bíblia católica. Disponível em: https ://www .bibliacatolica .com .br/. Acesso em: 13 mai. 2019.

____. Bíblia online. Disponível em: https ://www .bibliaonline .com .br/. Acesso em: em: 13 mai. 2019.

____. Desenhos bíblicos - Moisés: do nascimento ao chamado de deus #06. In: Blessed. 12 nov. 2017. Disponível em: https
://www .youtube .com /watch ?v =WBB7wAQwgEs. Acesso em: 13 mai. 2019.

____. Êxodo 19 – Deus fala com Moisés no Monte Sinai (Bíblia em áudio - Cid Moreira). Disponível em: https ://www .youtube
.com /watch ?v=JGwuS0tVT6A. Acesso em: 13 mai. 2019.

____. O sermão da montanha. In: Bíblia online. Disponível em: https ://www .bibliaonline .com .br /acf /mt /5 /3 -16. Acesso em:
13 mai. 2019.

____. O sermão da montanha: A oração do Senhor. In: Canal mórmon. 4 abr. 2014. Disponível em: https ://www .youtube .com
/watch ?v =3QpJIxe8sz0. Acesso em: 13 mai. 2019.

BAUMAN, Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.


/hf_ben -xvi_spe_20050606_convegno -famiglia .html. Acesso em: 13 mai. 2019.

BENTO XVI. Exortação apostólica pós-sinodal Verbum domini do santo padre Bento XVI [...] na missão da Igreja. In: A Santa Sé.
30 set. 2010. Disponível em: http ://w2.vatican .va /content /benedict -xvi /pt /apost_exhortations /documents /hf_ben
-xvi_exh_20100930_verbum -domini .html. Acesso em: 13 mai. 2019.

NICODEMUS, A. Como o relativismo moderno ataca a Bíblia. Disponível em: https ://www .youtube .com /watch ?v
=RdRTcSTf4DQ. Acesso em: 13 mai. 2019.

PERSONA, M. Qual a chave para entender o sermão da montanha?. 30 out. 2015. Disponível em: https ://www .youtube .com
/watch ?v =I2tdIn8Ha8w. Acesso em: 13 mai. 2019.

SILVA, E. da. Hermenêutica bíblica. Disponível em: http ://www .sepoangol .org /herme .htm. Acesso em: 13 mai. 2019.

ZABATIERO, J. P. T. Hermenêuticas da Bíblia no mundo evangelical. In: REIMER, H.; SILVA, V. da. (Orgs.). Hermenêuticas
bíblicas: contribuições ao I Congresso Brasileiro de Pesquisa Bíblica. São Leopoldo: Oikos; Goiânia: UCG, 2006. p. 61-74.

ZEZINHO. O povo de Deus. Disponível em: https ://www .youtube .com /watch ?v =wLCyD4CnbXM. Acesso em: 13 mai. 2019.

Próxima aula

• Metodologias utilizadas para identi�cação de manchas de sangue em local de crime;

• Morfologia das gotas de sangue em local de crime.

Explore mais

Leia os trechos destes livros:

• Bíblia e hermenêutica hoje, de Anne-Marie Pelletier;

• A hermenêutica bíblica, de Paul Ricouer.

Conheça este artigo sobre hermenêutica bíblica contextual.

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