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Aula 2º

SENEGÂMBIA

Mapa do Senegal, Senegambia e Madagascar (1852). Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:1852_Levassuer_Map_of_Senegal,_


Senegambia,_and_Madagascar_-_Geographicus_-_Senegal-levasseur-1852.jpg. Acesso em: 11 dez.2019.

Em mim, há quedas de águas, sobre mim, Não acredito na riqueza material fácil e rápida para
caminham cursos de rios. A maioria dos rios da África todos os africanos. Mas acredito no ideal de riqueza
nasce no planalto dos olhos. espiritual através da promoção da cultura. Eu hoje
Por isso, eu caminho de mãos dadas com a flora e a escrevo o coração da África.
fauna. Nunca me separo da África porque a trago dentro de
Sou savana africana de mim mesmo. A poesia africana mim.
é para se vestir dela e correr poemas pelo mundo. África é dentro de mim.
E eu escrevo para justificar a poesia africana. Morgado Mbalate

Caros(as) alunos(as), a percepção que, de uma forma geral, se tem do continente africano é que
este se compõe de sociedades “primitivas” e sem muitas variedades. Isso não condiz com a variedade,
riqueza e complexidade desses variados grupos culturais que ocupam a África. Na aula de hoje, iremos
conhecer uma das suas sociedades mais complexas da Idade Média, a Senegâmbia.
Bons estudos!

Objetivos de aprendizagem

Ao término desta aula, vocês serão capazes de:

• perceber que as sociedades africanas possuem uma grande variedade entre si;
• verificar que muitas dessas sociedades possuem uma grande complexidade em suas estruturas;
• comparar as sociedades africanas com as europeias, percebendo que não há inferioridade, de nenhuma natureza, das
primeiras em relação as segundas;
• constatar a complexidade do Reino da Senegâmbia.
História da África 12

Seções de estudo

1. A conquista de Ceuta e norte da África


2. Reino dos Jalofos

1 - A conquista de Ceuta e do norte


da África

Figura 6: Expansão do islamismo no continente africano. Disponível em: https://


br.pinterest.com/pin/348395721167368960/?lp=true. Acesso em: 07 dez. 2019.

Por volta de 1050, tem início na Europa o movimento


bélico-religioso conhecido como Cruzadas. Ele possui
algumas finalidades como: expandir o cristianismo e
desenvolver o comércio europeu para o leste. Se, do ponto
de vista religioso, esse movimento não obteve um grande
sucesso, do ponto de vista comercial foi bastante exitoso.
O continente africano, com as Cruzadas, passou a ser
mais conhecido do universo europeu. Esse conhecimento
Figura 5: Senegâmbia. Disponível em: http://www.emersonkent.com/map_archive/
conseguiu despertar o interesse pelas riquezas que
slave_trade_world_map_2_1401_1600.htm. Acesso em: 07 dez. 2019. circulavam entre as sociedades africanas e asiáticas, como
as especiarias, o marfim e os metais preciosos.
As relações entre o continente africano e europeu
remetem a longa data. Segundo Alberto da Costa e Silva Com o progresso tecnológico os portugueses
(2011) é possível verificar a presença da cultura europeia conseguem desenvolver as caravelas, que permitem
na África desde o início da Era Cristã. Ainda no século I, a navegação fora do litoral, além de criar a bússola e o
existem narrativas bíblicas sobre a pregação de apóstolos astrolábio, com ajuda da Escola de Sagres (Escola que
cristãos em terras africanas. ajuda a aprimorar a tecnologia náutica). Desse modo, os
No século IV, é identificada a presença de um diálogo portugueses deixam de fazer a navegação de cabotagem,
possibilitando a navegação contra o vento, oceano adentro,
cultural entre sociedades desses continentes através do
partindo, assim, para a viagem em buscas de riquezas
“donatismo”. Esse ritual, de base africana, compreende o
africanas.
sepultamento de líderes político-religiosos sob altares onde
se realizavam cultos. Essa apropriação cultural europeia se Mal chegados, os portugueses deram-se conta
mantém através de muitos séculos. da importância desse comércio de cabotagem,
No século VII, com a diáspora islâmica, ocorre uma do qual, a o contrário do que sucedia com o
ocupação, em um primeiro momento no extremo norte, que entrava pelo interior, podiam participar
com eficiência e vantagem, pois as caravelas
do continente africano por esses povos originários da
(e até os barcos menores a que tiveram de
Península Arábica. Com o passar dos séculos a presença recorrer em certas passagens do litoral)
islâmica se tornou preponderante em boa parte da África, venciam os espaços em muito menor tempo
se constituindo importante elemento da cultura de diversos do que as canoas (COSTA E SILVA, 2001,
desses povos. p. 145-146).
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barcos, tinham-se como de menor preço:
gomas, couros de cabra, peles e óleo de leão-
marinho. Era pelos escravos que se esperava
no porto algarvio de Lagos – a festa pela
chegada das caravelas atingia o auge com a
repartição do butim humano – e era pelos
escravos que os portugueses desciam nas
praias africanas (COSTA E SILVA, 2011, p.
108).

D. João de Portugal concordou em organizar uma


poderosa armada que fosse conquistar a próspera cidade
marroquina. Eram mais de 200 navios, pequenos e grandes,
de velas ao vento. Nem todos chegaram ao destino porque o
leme de muitos deles não resistiu à força da tempestade que
Figura 7: Escola de Sagres. Disponível em: https://pt.slideshare.net/MARLENE82/
descobrimentos-em-4. Acesso em: 07 dez. 2019. os atirou para Algeciras (município de Portugal). Porém,
apesar do contratempo, a conquista foi um sucesso militar.
Em 1415, os portugueses chegam a Ceuta do Marrocos. Eles conseguiram dominar Ceuta.
Como faltavam cereais e ouro na Europa, e os portugueses O primeiro contato se dá na Senegâmbia (onde se
sabiam onde encontrar estas riquezas, inicia-se a busca. encontrava o rio Senegal e o rio Gâmbia, dois grandes
Um dos lugares mais conhecidos e até mais próximos reinos), na qual os portugueses só conseguiram ficar no
era Ceuta, Praça do Norte da África e bom mercado aonde continente porque fizeram parcerias com as elites africanas.
chegavam caravanas de negociantes por diversas rotas que Muitos conflitos se originaram desta tentativa de
atravessavam o deserto do Sara. aproximação dos portugueses, um deles foi com os mandigas
(grupo de exímios arqueiros). Nas disputas de poder, os
europeus se deram mal, devido ao fato de os mandigas
serem excelentes arqueiros. Enquanto os portugueses
vinham com tiros de pólvora, que demandam um tempo
de carregamento entre um tiro e outro, os nativos vinham
com flechadas, que não demandavam o mesmo tempo de
carregamento, pois eram mais rápidas.
Outro conflito foi entre portugueses e niomincas.
Enquanto as caravelas dos portugueses eram grandes e
não davam muitas voltas, os niomincas eram bons e ágeis
canoeiros, ou seja, a tecnologia de guerra dos africanos era
muito melhor que a dos europeus.
Após contato dos portugueses com o Ceuta do
Marrocos, os mesmos se deslocam em direção sul do
continente, para o Reino de Uolofo ou Jalofo, buscando
novos contatos.
Figura 8: Localização do Ceuta do Marrocos. Disponível em: https://
ocaisdamemoria.com/2018/08/22/portugal-conquista-ceuta-aos-mouros/. Acesso
em: 07 dez. 2019. 2 - Reino dos Jalofos
Os portugueses chegam ao Ceuta do Marrocos, em Reino do Sul do Senegal tem 500 quilômetros de
busca de metais preciosos, especiarias e marfim. Porém, os extensão, sendo quase do tamanho de toda a Europa em
africanos não estavam dispostos a dar isso aos portugueses. um reino africano. Nenhum estado europeu moderno é do
Os africanos oferecem escravos, em troca dos tecidos tamanho territorial de Jalofo.
europeus, elemento importante para as primeiras trocas A estrutura era império, composto de diversas etnias
comerciais. Os portugueses percebem, então, que só (Mandigas, Tucolor, Fulas, Mouros, Sereres etc.). Esse
conseguiram se manter no continente se fizerem parceria império se assemelha ao sistema de vassalagem. Vassalagem
com a elite africana.
é um sistema medieval europeu, no qual os vassalos são
O escravo era o bem mais valioso ao alcance os nobres e reis feudais. Nesse sistema, há um rei que não
dos navegadores, enquanto não se descobriam é soberano e, sim, suserano, ou seja, dependia de outros
os caminhos para o metal amarelo. As outras senhores e nobres para governar. O rei então, não é
mercadorias que logravam levar para os absolutista, ele depende do sistema de vassalagem.
História da África 14

Retomando a aula

Chegamos, assim, ao final da segunda aula. Espera-


se que agora tenha ficado mais claro o entendimento
de vocês sobre a complexidade dos povos que
habitaram historicamente o continente africano. O
Reino da Senegâmbia é um exemplo do contato entre o continente
africano e europeu. Os reinos da Senegâmbia demonstram por meio
de suas estruturas geográfica, econômica, social e histórica, sua
Figura 9: Reino dos Jalofos. Fonte: COSTA E SILVA, Alberto da. A manilha e o sujeição ao processo histórico, como senhores das suas vontades.
libambo: a África e a escravidão, de 1500 a 1700. Rio de Janeiro, Nova Fronteira,
2. ed., 2011, p. 1056. Isso demonstra que o resultado do contato entre africanos e
europeus foi muito mais uma relação de interesse de ambos. Vamos,
No continente africano são encontrados grupos de então, recordar:
vassalagem, como Jalofo, Ualo, Caior, Baol e Sine. A hierarquia
social dos Jalofos era composta por: 1 – A conquista de Ceuta e norte da África

• Famílias reais; Nesta seção, vimos que a ocupação de Ceuta e do norte


• Aristocracia; do continente africano ocorre desde o século I, quando as
• Nobreza; diásporas islâmicas e os portugueses iniciam sua migração
• Homens livres (camponeses); e ocupação pelo extremo norte da África. Os portugueses
• Castas Profissionais hereditárias como, ferreiros, buscam no norte-africano expandir o cristianismo e o comércio
ceramistas, parteiras (mulheres), joalheiros, europeu. Esse primeiro contato se dá, principalmente, após
curtidores, alfaiates, contadores de história e jograis alianças comercias entre portugueses e elites africanas.
(griots); 2 - Reino dos Jalofos
• E, na base, os escravos.
Nessa seção, apreendemos sobre o Reino dos Jalofos,
Para os jalofos havia diferenças entre os escravos, que importante sociedade escravista e comercial do norte da
poderiam ser: escravos de famílias reais, de nascimento África. O Reino dos Jalofos mantive forte comércio com os
e capturados. Os escravos das famílias reais tinham uma portugueses e comercializavam, principalmente, ouro, ferro,
vida mais confortável, ocupavam cargos administrativos e noz-de-cola e escravos.
compunham exércitos. Os escravos de nascimento eram
incorporados mais facilmente à família. Já aqueles capturados
eram maltratados, vendidos e até mortos. Vale a pena
No Reino Jalofo, a religiosidade era marcada pelo
islamismo e culto aos antepassados. A maioria da população
prestava cultos aos antepassados, realizavam sacrifícios para
alcançar fertilidade e chuva. Embora os nobres tivessem
aderido ao islamismo, principalmente, por relações de poder,
continuavam praticando a religião tradicional. Parte da
Vale a pena ler
aristocracia era islâmica e maior parte da população rendia
culto aos ancestrais. COSTA E SILVA, A. da. A manilha e o libambo: a África e
Com a incorporação do islamismo na região do Deserto a escravidão, de1500 a 1700. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
do Saara os africanos passaram a juntar à cultura árabe a cultura 2. ed. 2011.
tradicional. Surgindo muitos viajantes, escritores, cronistas, MILLER, J. C. O Atlântico escravista: açúcar, escravos
historiadores e geógrafos descrevendo essas sociedades. e engenhos. Afro-Ásia. n. 19-20, p. 9-36, 1997. Disponível
A rota atlântica portuguesa possibilitou uma abertura de em: https://portalseer.ufba.br/index.php/afroasia/
comércio atlântico. O comércio que antes era continental passa article/view/20946. Acesso em: 07 dez. 2019.
a ser também costeiro. Comercializando com os portugueses, VAINFAS, Ronaldo; SOUZA, Marina de Mello.
noz-de-cola, sal, ferro e escravos. Os centros de comércio são Catolização e poder no tempo do tráfico: o reino
Níger, Tombuctu, Futa Jalom. do Congo da conversão coroada ao movimento
O desejo dos europeus era o ouro, mas a oferta do antoniano, séculos XV-XVIII. Revista Tempos, n. 6,
Senegal eram escravos. As trocas se davam entre produtos 1998. Disponível em: http://www.historia.uff.br/
que os portugueses traziam em troca dos escravos. No século tempo/artigos_dossie/artg6-7.pdf. Acesso em: 07 dez.
XVI, com o declínio do Império Jalofo, os portugueses se 2019.
deslocam para outros reinos, em busca de contatos.
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Vale a pena acessar

A conquista de Ceuta. Disponível em:


https://ocaisdamemoria.com/2018/08/22/
portugal-conquista-ceuta-aos-mouros/. Acesso em: 07 dez.
2019.
História geral da África. Disponível
em: http://www.unesco.org/new/pt/
brasilia/education/inclusive-education/general-history-of-
africa/. Acesso em: 07 dez. 2019.
Instrumentos naúticos. Disponível em:
h t t p s : / / w w w. g o o g l e . c o m / s e a r c h ? q = b %
C3%BAssola+astrol%C3%A1bio+e+quadrante. Acesso
em: 07 dez. 2019.

Vale a pena assistir


Vídeo - Tombuctu: a cidade dos livros. Disponível em:
https://www.youtube.com/vwatch?v=mMlzLDkGVRo.
Acesso em: 07 dez. 2019.

Minhas anotações
História da África

Minhas anotações

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