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UNIASSELVI-PÓS
Programa de Pós-Graduação EAD
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090
Equipe Multidisciplinar da
Pós-Graduação EAD: Profa. Hiandra B. Götzinger Montibeller
Profa. Izilene Conceição Amaro Ewald
Profa. Jociane Stolf
Diagramação e Capa:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI
960
F122h Fabrício, Edson Lucas
História da África e dos africanos : dos primórdios ao período
pré-colonial / Edson Lucas Fabrício e Edilson Pereira Brito.
Indaial : Uniasselvi, 2012.
128 p. : il
Inclui bibliografia.
ISBN 978-85-7830-602-1
1. História da África.
I. Centro Universitário Leonardo da Vinci.
Impresso por:
Edison Lucas Fabricio
APRESENTAÇÃO.......................................................................7
CAPÍTULO 1
África: Berço da Humanidade e da Civilização – a Paisagem,
a Pré-História e as Primeiras Sociedades Agrícolas......... 9
CAPÍTULO 2
As primeiras civilizações africanas.
A África Nilótica: Egito, Núbia, Kush e Axum..................... 35
CAPÍTULO 3
De Berberes a Árabes: O Norte da África e sua
História................................................................................... 63
CAPÍTULO 4
A África Negra Pré-Colonial............................................... 89
APRESENTAÇÃO
Caro(a) pós-graduando(a):
No terceiro capítulo, vamos voltar nosso olhar para o norte da África. O norte
do continente africano é um território milenar e foi o lugar de passagem e ocupação
de diversos povos. Essa região, também conhecida Magrebe, foi o ambiente onde
viveram os berberes, passaram fenícios, gregos, romanos, bárbaros, bizantinos e
árabes, o espaço onde emergiu o grande Império de Cartago e por onde começou
o processo de islamização da África. É como uma grande encruzilhada de povos
e culturas.
Bons estudos.
Os autores.
C APÍTULO 1
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Capítulo 1 ÁFRICA: BERÇO DA HUMANIDADE E DA CIVILIZAÇÃO – A
PAISAGEM, A PRÉ-HISTÓRIA E AS PRIMEIRAS SOCIEDA-
DES AGRÍCOLAS
Contextualização
Prezado (a) pós-graduando (a), quando pensamos em “África”, qual imagem
vem à nossa mente? Miséria, fome, desnutrição, animais exóticos, belezas
naturais, florestas, desertos...
A África é muito
Muito bem. Neste capítulo, vamos compreender que a África é mais complexa do
que as imagens
muito mais complexa do que as imagens que vemos nos noticiários e
que vemos nos
que aprendemos na escola. noticiários e que
aprendemos na
A África é o berço da humanidade. Essa expressão, à primeira escola.
vista, parece retórica, mas ela guarda um significado muito importante.
Foi na África que surgiram os primeiros seres humanos e que tinham consciência
de sua humanidade. Em última instância, ao dizer que somos humanos, queremos
dizer que, através dos nossos ancestrais, temos laços de humanidade com o
continente africano.
Mas a África não é um bloco homogêneo. Neste estudo, veremos A África também é
que até o próprio nome é muito recente, se levarmos em conta os um continente rico
milhões de anos que compõem a história do continente. Para além da em diversidade
natural e cultural.
nomenclatura, a África também é um continente rico em diversidade
natural e cultural. Neste estudo, veremos que as condições ambientais,
os desertos, as florestas, acabaram por criar particularidades culturais muito
específicas.
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
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Capítulo 1 ÁFRICA: BERÇO DA HUMANIDADE E DA CIVILIZAÇÃO – A
PAISAGEM, A PRÉ-HISTÓRIA E AS PRIMEIRAS SOCIEDA-
DES AGRÍCOLAS
pessoas comuns, seus modos de vida, as formas de sociabilidade, os detalhes
aparentemente sem importância.
É essa história que vamos conhecer nas próximas páginas. Mas vamos
começar por um breve relato da constituição geográfica do continente.
Atividade de Estudos:
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
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http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=
article&id=16146.
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Capítulo 1 ÁFRICA: BERÇO DA HUMANIDADE E DA CIVILIZAÇÃO – A
PAISAGEM, A PRÉ-HISTÓRIA E AS PRIMEIRAS SOCIEDA-
DES AGRÍCOLAS
Por outro lado, há a África negra separada do norte pelo Saara. A África
subsaariana é caracterizada pela diversidade étnica, linguística e religiosa. Ao sul
do Saara, entre o Oceano Atlântico e o Índico, habitam centenas de tribos, sendo
que as línguas chegam a ser mais de duas mil e seus panteões de deuses muito
diversificados.
Muitos historiadores aceitam essa teoria das “duas áfricas”. Alberto da Costa
e Silva, um dos historiadores brasileiros mais conceituados em História da África,
afirma que “o que realmente faz da África duas Áfricas é o enorme deserto, a
estender-se do Atlântico ao Mar Vermelho” (1992, p. 7).
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&task=doc_
download&gid=658&Itemid=
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Capítulo 1 ÁFRICA: BERÇO DA HUMANIDADE E DA CIVILIZAÇÃO – A
PAISAGEM, A PRÉ-HISTÓRIA E AS PRIMEIRAS SOCIEDA-
DES AGRÍCOLAS
Os maiores desertos da África são, respectivamente, o Saara, Os maiores
com uma área que totaliza oito milhões de km², o Namibe e o Kalahari, desertos da
África são,
ao sudoeste do continente, mais voltado para o Atlântico. Segundo
respectivamente,
Alberto da Costa e Silva, “um terço da África pertence aos desertos o Saara, com uma
e aos semidesertos”. Todavia, não se pode afirmar que não há vida área que totaliza
nesses desertos, em muitos lugares há oásis, tamareiras, aloés, oito milhões de
acácias, sisal” (1992, p. 15). km², o Namibe e o
Kalahari.
Figura 1 - Mapa com as características climáticas do continente africano
Há uma longa temporada de secas, que pode chegar a oito ou O Sahel é a faixa
nove meses, na área que vai de Dacar, no Atlântico, a Massaua, no de estepes que
mar Vermelho. Esse é o clima da área conhecida como Sahel, que em margeia o deserto
árabe quer dizer “costa”, “margem”. O Sahel é a faixa de estepes que do Saara.
margeia o deserto do Saara e sua extensão pode variar conforme a
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
A vegetação do continente segue os diferentes climas. São três os São três os tipos
de vegetações
tipos de vegetações mais comuns: as florestas equatoriais, as savanas
mais comuns:
e os desertos. as florestas
equatoriais, as
As florestas equatoriais ocupam as regiões de baixa latitude, savanas e os
principalmente na parte centro ocidental do continente. Nesses desertos.
espaços, o clima é úmido e quente e as árvores podem chegar a uma
estatura de até 60 metros. Nessas florestas,
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
Atividade de Estudos:
A Pré-história Africana
Falar de pré-história africana é sempre complexo. Como dissemos no início
desse capítulo, se entendermos a pré-história como o período anterior aos
registros escritos e a escrita como único elemento que separa a História da Pré-
história, alguns territórios africanos ainda estariam na pré-história e outros há
pouquíssimo tempo teriam saído dessa condição.
Portanto, não podemos deixar de sublinhar que essa rígida divisão entre
a pré-história e a história propriamente dita é uma divisão artificial. Pois ainda
em muitas sociedades africanas não há testemunhos escritos, e muitos grupos
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Capítulo 1 ÁFRICA: BERÇO DA HUMANIDADE E DA CIVILIZAÇÃO – A
PAISAGEM, A PRÉ-HISTÓRIA E AS PRIMEIRAS SOCIEDA-
DES AGRÍCOLAS
ainda preferem viver como coletores e caçadores, mesmo convivendo Para
ao lado de grupos agrícolas e sedentários. Todavia, não podemos compreendermos
afirmar que são pré-históricos. É importante dizer que a maioria das melhor a pré-
explorações arqueológicas no continente só se iniciou a partir do história, é
século XIX e ganharam mais relevância no século XX. importante termos
consciência
da história
Antes de falarmos da pré-história africana, vamos a algumas dos tempos
informações gerais. Para compreendermos melhor a pré-história, geológicos.
é importante termos consciência da história dos tempos geológicos.
Dividimos geralmente os tempos geológicos em Eras, Períodos e Épocas.
Para nosso contexto, é importante conhecer os períodos Primário, O Quaternário
Secundário, Terciário e Quaternário. O Terciário é dividido em: abrange dois
Paleoceno, Eoceno, Oligoceno, Mioceno e Plioceno. E o Quaternário períodos:
abrange dois períodos: Pleistoceno e Holoceno. Esses dois últimos Pleistoceno e
períodos são os mais importantes, pois é neles que situamos a origem Holoceno. Esses
dois últimos
do homem. Veja o quadro abaixo:
períodos são os
mais importantes,
Figura 3 – Cronologia das Eras, Períodos e pois é neles que
Épocas de desenvolvimento da vida situamos a origem
do homem.
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Capítulo 1 ÁFRICA: BERÇO DA HUMANIDADE E DA CIVILIZAÇÃO – A
PAISAGEM, A PRÉ-HISTÓRIA E AS PRIMEIRAS SOCIEDA-
DES AGRÍCOLAS
O Homo Erectus viveu há cerca de 1,3 milhão de anos, por sua postura
ereta e estrutura esquelética é o que mais se aproxima do homem atual. Vivia
em grupos e tinha o domínio do fogo. É possível que tenha sido contemporâneo
do Australopithecus e que esse tenha sido extinto devido aos sucessivos
combates e perseguições do Homo Erectus. Foi hábil caçador e colhedor, viveu
na África central e oriental, fabricava utensílios de pedra lascada, sendo
os mais conhecidos os bifaces, ou “machados de mão”. O Homo Erectus
foi responsável pela indústria do “Acheulense”, nome que dá para a cultura
dos seixos raspados, pois se diferenciavam dos seixos lascados da indústria
Olduvaiense.
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
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Capítulo 1 ÁFRICA: BERÇO DA HUMANIDADE E DA CIVILIZAÇÃO – A
PAISAGEM, A PRÉ-HISTÓRIA E AS PRIMEIRAS SOCIEDA-
DES AGRÍCOLAS
531),
A Middle Stone Age da África Oriental já é habitada por homo Havia uma
sapiens. Nesse período, ocorre um crescimento demográfico gama variada
significativo, a ocupação de novos territórios e técnicas de caça de instrumentos
de animais de grande porte. A última das fases, a Late Stone de caça, com
Age, é marcada pela sofisticação da indústria lítica. Havia uma a utilização do
sílex, obsidiana e
gama variada de instrumentos de caça, com a utilização do sílex,
quartzo.
obsidiana e quartzo. Foi nesse período também que provavelmente
iniciou-se a utilização do arco e da flecha nas atividades de caça. Nesse
contexto, também é possível perceber uma regularidade nas habitações,
geralmente debaixo de rochas, onde houvesse proteção da chuva e do vento.
Nesses locais é possível encontrar vestígios de fogo, restos de alimentos e
pinturas rupestres.
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
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Capítulo 1 ÁFRICA: BERÇO DA HUMANIDADE E DA CIVILIZAÇÃO – A
PAISAGEM, A PRÉ-HISTÓRIA E AS PRIMEIRAS SOCIEDA-
DES AGRÍCOLAS
demográfico. Prova disso são as inúmeras inscrições rupestres.
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
O norte da África e hominídeos é mais recente. “Atualmente não parece verossímil que
a região do Magreb a presença de hominídeos no Magreb e no Saara seja tão antiga
são locais onde quanto na África oriental e meridional” (BALOUT, 2010, p. 639).
a presença de
hominídeos é mais
Ao que tudo indica, houve uma elaborada indústria de machados
recente.
de lasca que teria sido transmitida da África para a Europa. Inclusive,
entre os arqueólogos, convencionou-se chamar o complexo cultural pré-histórico
dessa região de Musteriense, que vai desde o norte da África até a Península
Ibérica, França e Itália. A partir de lascas de sílex, fazia-se a retirada do núcleo, e
dessas lascas produzia-se raspadeiras e pontas de projétil.
Atividade de Estudos:
Homo
Australopithecus Homo Habilis Homo Erectus
Sapiens-sapiens
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Capítulo 1 ÁFRICA: BERÇO DA HUMANIDADE E DA CIVILIZAÇÃO – A
PAISAGEM, A PRÉ-HISTÓRIA E AS PRIMEIRAS SOCIEDA-
DES AGRÍCOLAS
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
O primeiro local onde O primeiro local onde foram introduzidas as práticas agrícolas
foram introduzidas foram os vales dos rios Tigre, Eufrates e Nilo. No Rio Nilo havia
as práticas agrícolas
uma sofisticada técnica de drenagem e irrigação. É provável que a
foram os vales dos
rios Tigre, Eufrates agricultura só tenha chegando ao delta do Nilo por volta de 5000
e Nilo. a.C., como explica o autor abaixo.
A partir do
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Capítulo 1 ÁFRICA: BERÇO DA HUMANIDADE E DA CIVILIZAÇÃO – A
PAISAGEM, A PRÉ-HISTÓRIA E AS PRIMEIRAS SOCIEDA-
DES AGRÍCOLAS
caule e os brotos novos. Estes são cozidos como legumes;
aquele, após ser enterrado para fermentar, seco e pilado,
transforma-se numa papa ou é assado qual um pão [...]. Já
o niger ou noog produz óleo comestível. É planta corriqueira
nas terras abissínias, cultivada em pequena escala em
outros países africanos e na Índia (COSTA E SILVA, 1992,
p. 65).
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
Atividade de Estudos:
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Capítulo 1 ÁFRICA: BERÇO DA HUMANIDADE E DA CIVILIZAÇÃO – A
PAISAGEM, A PRÉ-HISTÓRIA E AS PRIMEIRAS SOCIEDA-
DES AGRÍCOLAS
Algumas Considerações
Nesse capítulo abordamos a questão do significado e da importância da
África para a História. A história africana para nós, brasileiros, tem um valor
significativo, pois nossa identidade cultural é marcada pela contribuição dos
diversos povos que vieram compulsoriamente habitar a América, por ocasião do
tráfico de escravos.
ReferÊncias
BALOUT, L. A Pré-História da África do Norte. In: KI-ZERBO, Joseph (Ed.).
História Geral da África I. Metodologia e pré-história da África. 2ª ed. rev.:
Brasília: Unesco, 2010.
CONCEIÇÃO. José Maria Nunes Pereira. África: um novo olhar. Rio de Janeiro:
CEAP, 2006. (Cadernos CEAP).
NOTEN, F. van. A Pré-História da África Central Parte II. In: KI-ZERBO, Joseph
(Ed.). História Geral da África I. Metodologia e pré-história da África. 2ª ed.
rev.: Brasília: Unesco, 2010.
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C APÍTULO 2
As primeiras Civilizações
Africanas. A África Nilótica:
Egito, Núbia, Kush e Axum
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Capítulo 3 DE BERBERES A ÁRABES: O NORTE DA ÁFRICA E SUA
HISTÓRIA
Contextualização
Prezados acadêmicos, neste capítulo a nossa proposta é O Egito esteve
estudarmos a História da África a partir das primeiras civilizações profundamente
que surgiram na região oriental. Nesse sentido, salta aos olhos a ligado ao
continente
grandiosidade e o esplendor da Civilização Egípcia. Mas, ao longo
africano, muito
deste estudo, você verá que ao sul do Egito, depois das cataratas, mais do que se
surgiram muitas culturas importantes para a história da África e do admitia até pouco
Oriente Próximo como um todo. tempo.
O Egito Antigo
A Civilização Egípcia é uma das mais importantes do mundo antigo. O Egito
é um lugar de mistério e grandiosidade, encanta e envolve todos os que dela se
aproximam. A capacidade criativa e de organização é o que mais impressiona
aqueles que estudam o Egito antigo.
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
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Capítulo 2 AS PRIMEIRAS CIVILIZAÇÕES AFRICANAS.
A ÁFRICA NILÓTICA: EGITO, NÚBIA, KUSH E AXUM
Nesse período, as várias aldeias do Alto e do Baixo Egito, que existiam nas
margens do Rio Nilo teriam sido unificadas por Menés, o primeiro faraó. No Egito
antigo havia uma enorme preocupação com a unidade do reino, pois qualquer
divisão prejudicava a exploração da natureza, as colheitas e também a construção
obras hidráulicas, monumentos, templos e pirâmides.
No Egito antigo, a pessoa do faraó era vista com distinção. O No Egito antigo, a
faraó não era apenas um herdeiro dos deuses, era a expressão do pessoa do faraó
próprio deus, o símbolo vivo da divindade. Como dissemos acima, era vista com
de acordo com a tradição, Menés teria sido primeiro faraó do Egito. distinção. O faraó
não era apenas
Através dele teria se formado primeira dinastia e graças a ele o Egito
um herdeiro dos
teria conhecido a agricultura, o artesanato e a escrita. A importância deuses, era a
simbólica do faraó era tão relevante que a própria capacidade expressão do
produtiva do Egito era atribuída a ele. Era graças ao faraó que havia próprio deus, o
boas colheitas e o Reino continuava triunfante em meio ao deserto símbolo vivo da
que o rodeava. “O Egito ostentava unidade nacional sob a chefia de divindade.
uma divindade. Porque o faraó é o exemplo clássico de um deus
encarnado num rei” (ALDRED, 1965, p. 49).
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
A mesma tese é defendida por Roland Oliver. Para esse autor, a centralização
política no Egito deve ter ocorrido na região de Hierakonpolis e Abydos. É provável
que uma das principais causas da centralização política tenha sido a competição
entre diversas famílias nobres pelo controle das regiões em que havia minas de
cobre e ouro. Para termos uma ideia da importância econômica da região entre
Hierakonpolis e Abydos, basta atentar para o nome de uma das cidades mais
importantes, Nagada, que quer dizer exatamente: “a cidade do ouro” (OLIVER,
1994, p. 69).
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Capítulo 2 AS PRIMEIRAS CIVILIZAÇÕES AFRICANAS.
A ÁFRICA NILÓTICA: EGITO, NÚBIA, KUSH E AXUM
http://egiptologianobrasil.blogspot.com.br/2010/05/quem-sao-os-
egiptologos-brasileiros.html
O rio Nilo não era apenas a principal via de transporte, era a O rio Nilo não era
espinha dorsal do Reino egípcio, aquilo que tornou possível a chamada apenas a principal
“Revolução agrícola”. Segundo Roland Oliver, todos os anos a região via de transporte,
entre as cataratas e o delta, cerca de 31000 Km², era submersa pelas era a espinha
dorsal do Reino
águas do Nilo. Dessa forma, o Egito se tornou uma das primeiras
egípcio, aquilo que
civilizações africanas a estocar alimentos e a criar toda uma estrutura tornou possível a
administrativa e estatal. É bem possível que a revolução agrícola do chamada “Revolu-
Egito seja um dos principais fatores da centralização política e da ção agrícola”.
própria formação do estado (OLIVER, 1994, p. 65).
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
As pirâmides eram
O desenvolvimento tecnológico da cultura material do Reino o símbolo da ca-
Antigo atingiu seu apogeu entre os anos 2600 e 2500 a.C., durante a IV pacidade criadora
Dinastia. O símbolo desse período de prosperidade foi a construção das do homem, da
três grandes pirâmides: Queóps, Quéfren e Miquerinos. As pirâmides capacidade de do-
minar a natureza.
eram o símbolo da capacidade criadora do homem, da capacidade de
O Egito rodeado
dominar a natureza. O Egito rodeado por desertos mostrou através da por desertos
construção das pirâmides a capacidade de congregar todos os súditos mostrou através
em objetivos do estado. da construção
das pirâmides a
Figura 7 - Pirâmides egípcias capacidade de
congregar todos
os súditos em ob-
jetivos do estado.
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
O Reino Médio terminou por volta de 1750 a.C., com a invasão dos hicsos,
tribos asiáticas vindas do norte. Esse é o Segundo Período Intermediário, também
chamado de “a grande humilhação”, pois os hicsos impuseram um domínio sobre
todo o Delta do Nilo, inclusive instalando um novo faraó, no sul, em Tebas. O
poder militar dos hicsos era bastante superior, introduziram os carros de guerra,
guerreiros com armaduras e o cavalo nos combates.
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Capítulo 2 AS PRIMEIRAS CIVILIZAÇÕES AFRICANAS.
A ÁFRICA NILÓTICA: EGITO, NÚBIA, KUSH E AXUM
Atividades de Estudos:
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
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Núbia
Até pouco tempo atrás se conhecia bem pouco sobre a região da Núbia. É
bem provável que poucas pessoas tenham ouvido falar do reino de Kush, das
cidades de Napata e Meroé. Neste texto, vamos conhecer um pouco mais sobre
esses povos que habitavam a região acima das cataratas do Nilo. Gente de pele
extremamente negra e ricos em minas de ouro e ferro.
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Capítulo 2 AS PRIMEIRAS CIVILIZAÇÕES AFRICANAS.
A ÁFRICA NILÓTICA: EGITO, NÚBIA, KUSH E AXUM
madeira etc.
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
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Capítulo 2 AS PRIMEIRAS CIVILIZAÇÕES AFRICANAS.
A ÁFRICA NILÓTICA: EGITO, NÚBIA, KUSH E AXUM
Atividade de Estudos:
O Reino Kush
A palavra “kush” apareceu pela primeira vez num texto egípcio há cerca de
2000 a.C. Segundo as fontes egípcias, esse era um reino abaixo da cidade de
Semna. A cidade de Kerma era a mais importante do reino kushita, ficava há cerca
de 16 km ao sul da Terceira Catarata e, entre 2000 e 1500 a. C., pode ter sido a
maior cidade da Núbia e é bem provável que seus habitantes sejam
Kerma também
remanescentes do Grupo C.
era um ponto
estratégico, seu
Essa é uma região isolada do Nilo e altamente fértil e foi um dos domínio permitia
lugares ideais para um povoamento autônomo e para a formação o controle de
de um Estado. A riqueza do solo não só permitiu o desenvolvimento todas as transa-
agrícola, mas também a criação de gado em larga escala. Kerma ções econômicas
entre o Egito e o
também era um ponto estratégico, seu domínio permitia o controle de
restante da África
todas as transações econômicas entre o Egito e o restante da África através do Nilo.
através do Nilo.
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
Por muito tempo pensou-se que essa cidade era apenas mais uma guarnição
do Reino egípcio. Mas hoje não há dúvidas de que a cidade de Kerma fazia parte
de um reino núbio e era habitada por homens negros.
Kerma era a capital Kerma era a capital do Reino Kush. Esse reino foi um tradicional
do Reino Kush. inimigo do Egito no período do Reino Médio. Durante o século em
Esse reino foi um que os hicsos dominaram o Egito, ocupando toda a região do Delta
tradicional inimigo do do Nilo e formando a 15ª e 16ª dinastias, os kushitas estabeleceram
Egito no período do
relações comerciais e diplomáticas com os soberanos de soberanos
Reino Médio.
hicsos e o faraó de Tebas.
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Capítulo 2 AS PRIMEIRAS CIVILIZAÇÕES AFRICANAS.
A ÁFRICA NILÓTICA: EGITO, NÚBIA, KUSH E AXUM
O reino de Kush, que abrangia toda a Núbia ao sul de Assuã, foi retomado
durante a XVIII dinastia egípcia, depois da expulsão dos hicsos.
Atividades de Estudos:
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
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Napata e Méroe
A partir do século XI, o poder do Egito começa a enfraquecer
Ao sul de Kerma,
próximo à Quarta novamente, é o início do Terceiro Período Intermediário. Ao sul de
Catarata, durante Kerma, próximo à Quarta Catarata, durante a XVIII Dinastia egípcia,
a XVIII Dinastia começa a surgir um importante centro político, é a cidade de Napata
egípcia, começa a (atual Merowe). A partir de Napata foi possível estabelecer um
surgir um importante importante reino independente no sul da Núbia. O reino cresceu a
centro político, é a
ponto de conquistar todo o sul do Egito até a cidade de Tebas, um
cidade de Napata.
importante centro religioso onde se cultuava o deus Amon.
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Capítulo 2 AS PRIMEIRAS CIVILIZAÇÕES AFRICANAS.
A ÁFRICA NILÓTICA: EGITO, NÚBIA, KUSH E AXUM
Napata eram bem pequenas e pontiagudas, a maior delas tinha apenas 29 metros
em um dos lados de sua base, enquanto que a pirâmide de Quéops, no Egito,
apresenta 228 metros na sua base (SILVA, 1994, p. 100).
O mesmo não aconteceu como seu irmão, Xabaca. Ele reclamou para si o direito
de ser faraó de todo o Egito, dessa forma tornou-se senhor de todo o vale do Nilo até
o Delta. Era a famosa 25ª dinastia do Egito, ou a “dinastia etíope”.
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
sido o primeiro rei. Dessta forma, assegurava-se que o reinado não seria exercido
por uma pessoa inexperiente.
Ao sul de Napata, há Ao sul de Napata, há cerca de 300 anos a. C., a cidade de Meroé
cerca de 300 anos surgia como uma terceira capital do Reino Kush, se considerarmos
a. C., a cidade de
Kerma a primeira e Napata a segunda. Meroé também foi chamada
Meroé surgia como
uma terceira capital de “ilha de Meroé”, pois ficava na confluência de três rios, o Nilo Azul,
do Reino Kush. o Nilo Branco e o Rio Atbara.
Tudo indica que a transferência da capital para Méroe se deu por questões
climáticas. Méroe estava numa região extremamente fértil e Napata em uma
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Capítulo 2 AS PRIMEIRAS CIVILIZAÇÕES AFRICANAS.
A ÁFRICA NILÓTICA: EGITO, NÚBIA, KUSH E AXUM
No século VIII a. C., Méroe já era uma cidade habitada. Mas foi no período
posterior ao reinado de Peíe em Napata que Méroe, de uma simples aldeia, viria a
se tornar a maior cidade de toda a Núbia. Méroe estava num ponto extremamente
estratégico, por ela passavam todas as caravanas de comerciantes com destino
ao Delta do Nilo, como também aqueles que se destinavam ao Mar Vermelho e
também aqueles com rotas para Darfur ou Cordofã, em direção ao sul da África.
Por esta razão, Méroe recebeu influência de várias regiões do mundo então
conhecido. Em Méroe, por sua proximidade com o Mar Vermelho, confluíam
culturas persas, indianas, gregas, sírias, árabes, romanas e principalmente
egípcias, as que mais marcaram a cultura meroítica.
Tudo indica que a cidade de Napata ainda permanecia como um Napata era o
centro importante, mas tinha apenas uma função religiosa. Podemos centro espiritual
dizer que Napata era o centro espiritual do Reino, o local do grande do Reino, o local
templo do deus Amon. Nela, os reis eram consagrados e sepultados, do grande templo
do deus Amon.
mas seus reinados eram exercidos a partir da cidade de Méroe. A partir
de um ano 300 a. C., os reis passaram a ser enterrados em Méroe.
Houve muitos reis em Méroe, mas sabemos muito pouco a respeito deles.
Destoando da tradição de enterrar os soberanos em Napata, Arcamani, ao que
tudo indica, teria sido o primeiro rei a ser sepultado em Méroe. Não há muitas
referências sobre os outros reis de Méroe, pois a cultura kushita abandonou a
escrita hieroglífica egípcia e desenvolveu um tipo de escrita ainda não decifrada,
também conhecida como meroítica. Enquanto não for decifrado o alfabeto meroíta,
com seus 23 sinais, pouco saberemos sobre a história de Méroe.
55
História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
O Reino kushita de O Reino kushita de Méroe conheceu seu período áureo a partir
Méroe conheceu
do século VIII a. C. Nesse período também teriam surgido a tradição
seu período áureo a
partir do século VIII das rainhas-mães ou candaces. Em várias sociedades africanas
a. C. Nesse perío- há tradições matrilineares, mas Méroe parece ter sido um dos mais
do também teriam importantes centros dessa tradição. Como dissemos antes, só nas
surgido a tradição necrópoles de Jebel Barcal foram encontradas tumbas de mais de
das rainhas-mães ou setenta rainhas.
candaces.
As candaces ocupavam um papel importante na vida social e
As candaces política do Reino kushita. Essas mulheres ocupavam cargos de
ocupavam um papel liderança no reino. Algumas eram sacerdotisas de Amon, o que
importante na vida
significava aderir ao celibato e ser eternizada através de uma esfinge
social e política do
Reino kushita. Essas real depois da morte. Ser uma candace em Méroe significava estar
mulheres ocupavam entre o poder político e o religioso. Como era a religião que legitimava
cargos de liderança a política, as candaces tinham um papel importante na definição
no reino. dos novos reis e no auxílio ao respectivo governo. Com o passar do
tempo, essas mulheres chegaram a exercer o governo também.
Pouco se sabe do fim das cidades de Napata e Méroe. Napata teria sido
invadida em 23 a. C pelos romanos que governavam a província romana do Egito.
Já a cidade de Méroe foi ocupada pelo Reino Axum por volta do ano 350 da era
cristã.
56
Capítulo 2 AS PRIMEIRAS CIVILIZAÇÕES AFRICANAS.
A ÁFRICA NILÓTICA: EGITO, NÚBIA, KUSH E AXUM
Atividades de Estudos:
O Reino de Axum
Embora o Reino de Axum não pertença à África Nilótica, achamos importante
trazê-lo para a discussão, pois há indícios de que foi esse reino que dominou
o Reino meroítico e teve um papel importante nos intercâmbios culturais e
econômicos com toda a região do Mar Vermelho e o restante da África, inclusive
tendo um papel protagonista na inserção do Cristianismo na região.
57
História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
58
Capítulo 2 AS PRIMEIRAS CIVILIZAÇÕES AFRICANAS.
A ÁFRICA NILÓTICA: EGITO, NÚBIA, KUSH E AXUM
59
História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
Atividades de Estudos:
Algumas Considerações
Nesse capítulo estudamos alguns dos aspectos mais importantes da África
nilótica. Temos consciência de que essas civilizações milenares não podem ser
retratadas em um número reduzido de páginas. Mas esse texto é um ponto de
partida, um roteiro para estudos mais aprofundados.
Ficou evidente em nosso estudo que o Egito teve, em seu passado, uma
relação muito estreita com o restante do continente africano, muito mais do que
a historiografia até pouco tempo admitia. Vale aqui registrar uma frase de Alberto
da Costa e Silva, segundo esse autor, o Egito é “uma esquina do mundo. Mas – é
bom não esquecer – uma esquina que fica na África” (SILVA, 2012, p. 138).
O Egito foi uma O Egito foi uma grande encruzilhada. Pelas águas do Nilo
grande encruzilha- não passaram apenas mercadorias, transitaram ideias, costumes,
da. Pelas águas do religiosidades, culturas. A existência do Egito dos faraós, reis
Nilo não passaram divinizados, das grandes obras hidráulicas, das grandes obras
apenas mercadorias,
arquitetônicas não foi só possível por causa do Rio Nilo. Foi possível
transitaram ideias,
costumes, religiosida- também pela capacidade inventiva e pela capacidade de organização
des, culturas. do povo egípcio.
Mas o Egito também foi possível por causa das inúmeras riquezas que
vinham da região da Núbia. Aliás, o sul do Egito, como vimos, embora seja
60
Capítulo 2 AS PRIMEIRAS CIVILIZAÇÕES AFRICANAS.
A ÁFRICA NILÓTICA: EGITO, NÚBIA, KUSH E AXUM
uma região ainda muito desconhecida nos estudos históricos, é uma região que
fascina a todos que a estudam. A influência egípcia é notória em toda a região da
Núbia e nas diversas fases do Reino Kush. Mas é impossível não reconhecer a
originalidade de tal reino, suas formas de sucessão real e as famosas candaces.
Em todos os
Em todos os reinos que estudamos nesse capítulo, a religião reinos que
ocupava um lugar central na vida social, ao mesmo tempo em que estudamos nesse
legitimava a ordem vigente, também produzia coesão e unidade social. capítulo, a religião
No Reino de Axum, o último que estudamos, vimos um dos primeiros ocupava um lugar
central na vida
relatos da introdução do Cristianismo em África. No próximo capítulo
social, ao mesmo
vamos aprofundar o papel da religião no contexto cultural da África, tempo em que le-
principalmente a partir na África mediterrânica, onde o Cristianismo e gitimava a ordem
posteriormente o Islã tiveram um papel fundamental na organização vigente, também
das sociedades. produzia coesão e
unidade social.
ReferÊncias Bibliográficas
ADAM, Shehata. A importância da Núbia: um elo entre a África central e o
Mediterrâneo. In: MOKHTAR, Gamal (Ed.). História Geral da África II. África
Antiga. 2ª ed. rev. Brasília: Unesco, 2010.
LECLANT J.O Império de Kush: Napata e Méroe. In: MOKHTAR, Gamal (Ed.).
História Geral da África II. África Antiga. 2ª ed. rev. Brasília: Unesco, 2010.
PINSKY, Jaime. As primeiras civilizações. 26ª Ed. São Paulo: Contexto, 2006.
61
História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
62
C APÍTULO 3
De Berberes a Árabes:
O Norte da África e sua
História
A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes
objetivos de aprendizagem:
64
Capítulo 3 DE BERBERES A ÁRABES: O NORTE DA ÁFRICA E SUA
HISTÓRIA
Contextualização
Caros acadêmicos, neste capítulo vamos voltar nossa atenção para o norte
da África. Esse território milenar guarda histórias e experiências de vários povos,
pelo Magrebe viveram povos berberes, passaram fenícios, gregos, romanos,
bárbaros, bizantinos, árabes. É uma grande encruzilhada de povos e culturas.
Como vimos nos capítulos anteriores, o norte da África, por muito O norte da África,
tempo, esteve muito mais ligado ao mundo mediterrânico do que ao por muito tempo,
restante do próprio continente. Neste capítulo vamos relativizar um esteve muito mais
pouco essa visão dogmática. ligado ao mundo
mediterrânico.
65
História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
Península Ibérica, a Sicília, a Sardenha, Malta, todo o sul da Itália é mais evidente.
As evidências deste intercâmbio são produtos originários do norte da África, como
marfim e ovos de avestruz, encontrados na Espanha. E da mesma forma, vasos de
cerâmica e pontas de flecha de cobre e bronze da Península Ibérica encontrados
nas regiões de Ceuta, no norte da África. Dessa forma, podemos afirmar que o
norte da África esteve inserido no mundo Mediterrâneo antes mesmo da fundação
da cidade de Cartago.
O deserto do Saara Por outro lado, é importante salientar que a história do norte
produziu um afasta- da África é marcada pelo processo de desertificação do Saara, que
mento do norte da influenciou diretamente o desenvolvimento da navegação através
África com a África
do Mediterrâneo. O deserto do Saara produziu um afastamento do
Setentrional.
norte da África com a África Setentrional. Mas não podemos falar em
isolamento, pois através do corredor de Trípoli houve uma profunda
influência das civilizações subsaarianas.
Toda a região do Mas antes de falarmos dos povos que habitavam o norte da
norte da África ficou África, convém falar sobre as designações da própria região. Toda
conhecida durante a região do norte da África ficou conhecida durante a antiguidade
a antiguidade como como Berbéria, daí a designação de berberes para os povos
Berbéria. indígenas, ou seja, autóctones que habitavam a região. O uso do
termo berbere é bastante tardio, ele surge no século VIII d. C.,
quando os árabes ocuparam a região. Segundo Kormikiari, a palavra berbere
pode ter sido originada a partir da palavra latina barbari, que designava os
povos bárbaros que invadiram o Império Romano. Ainda que essa designação
seja anacrônica, foi a que permaneceu na historiografia (KORMIKIARI, 2001,
p. 11).
Magrebe é uma pala- Magrebe é uma palavra de origem árabe e quer dizer “o tempo
vra de origem árabe e o lugar do pôr-do-sol – o oeste”. Segundo Kormikiari, essa região
e quer dizer “o tempo era uma espécie “ilha do oeste” para os conquistadores árabes, pois
e o lugar do pôr-do- estava entre o Saara – “mar de areia” – e o Mar do Mediterrâneo
-sol – o oeste”.
(KORMIKIARI, 2001, p. 10).
66
Capítulo 3 DE BERBERES A ÁRABES: O NORTE DA ÁFRICA E SUA
HISTÓRIA
67
História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
Nas narrativas dos Nas narrativas dos autores gregos e romanos, os grupos
autores gregos e indígenas berberes que ganham maior destaque são os númidas, os
romanos, os grupos getulos e os mouros.
indígenas berberes
que ganham maior
destaque são os Os númidas habitavam uma região conhecida como Numídia,
númidas, os getulos entre os anos de 200 a 50 a. C. O termo Numídia foi usado pelo
e os mouros. grego Políbio para designar a região a oeste de Cartago, entre a
Argélia, a Tunísia e o Marrocos. Os númidas estabeleceram relações
comerciais com Cartago, mas não chegaram a ser dominados por esta. Todavia,
a Numídia por diversas vezes forneceu guerreiros para lutar nas fileiras dos
68
Capítulo 3 DE BERBERES A ÁRABES: O NORTE DA ÁFRICA E SUA
HISTÓRIA
Atividades de Estudos:
69
História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
70
Capítulo 3 DE BERBERES A ÁRABES: O NORTE DA ÁFRICA E SUA
HISTÓRIA
Essas duas vitórias descritas acima nos dão indícios das razões do sucesso
do exército de Cartago. As vitórias de Cartago, em virtude do seu reduzido números
de habitantes, só foram possíveis graças ao recrutamento de mercenários e
formação de tropas aliadas. Por muito tempo os cartagineses contaram com os
serviços militares dos líbios, númidas, mouros e mercenários vindos da Espanha,
Gália, Itália e também da Grécia.
Após essa derrota, em 480 a. C., houve 70 anos de paz entre cartagineses e
gregos. Nesse período, os cartagineses buscaram ampliar sua área de influência
no norte da África, pois os gregos haviam se fortalecido comercialmente no
Mediterrâneo após a vitória sobre os persas.
Entre os séculos
Cartago fundou várias colônias desde o Estreito de Gibraltar até
IV e III a. C., a
as regiões da atual Líbia, e no Mediterrâneo continuou seu domínio cidade de Cartago
sobre algumas colônias na Península Ibérica, Ilha de Malta etc. era a mais prós-
Todas essas colônias tinham que pagar tributos sobre importações e pera do Mediter-
exportações, entregar entre 10 até 50 % da produção agrícola e ainda râneo.
71
História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
72
Capítulo 3 DE BERBERES A ÁRABES: O NORTE DA ÁFRICA E SUA
HISTÓRIA
Os reis mais famosos de Cartago foram Amilcar e seu filho Aníbal. Ambos
foram poderosos chefes militares. Amílcar nasceu em 270 a. C e Os reis mais fa-
faleceu 228 a.C, foi o comandante dos exércitos cartagineses na mosos de Cartago
primeira guerra púnica. Amilcar também foi o principal responsável foram Amilcar e
seu filho Aníbal.
pela conquista cartaginesa da península Ibérica. Aníbal era o filho mais
Ambos foram
velho de Amilcar e seu sucessor, nasceu em 248 a. C e faleceu em poderosos chefes
183 a. C. O nome Aníbal quer dizer “Baal é bondoso”. Aníbal lutou na militares.
Primeira e na Segunda Guerra Púnica.
Atividades de Estudos:
74
Capítulo 3 DE BERBERES A ÁRABES: O NORTE DA ÁFRICA E SUA
HISTÓRIA
As Guerras Púnicas
A disputa pela Sicília esteve na origem da Primeira Guerra Púnica.
A disputa pela
Por muito tempo Roma foi apenas uma entre tantas comunidades Sicília esteve na
agrícolas da Itália que tinham tratados comerciais com Cartago. origem da Primei-
Cartago era o centro de um poderoso império marítimo comercial, a ra Guerra Púnica.
cidade mais rica e poderosa de todo o Mediterrâneo. Estava localizada
numa posição estratégica entre as nações mediterrânicas e o interior da África.
Era melhor para Roma tê-la como aliada do que como inimiga.
75
História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
76
Capítulo 3 DE BERBERES A ÁRABES: O NORTE DA ÁFRICA E SUA
HISTÓRIA
Na Península Ibérica havia algumas cidades que estavam sob Segunda Guer-
a influência romana, principalmente Sagunto e Ampurias. O avanço ra Púnica, que
de Aníbal e seus exércitos sobre essas cidades foi o estopim para ocorreu entre 218
o reinício dos conflitos entre romanos e cartagineses. Era o início e 202 a. C., perfa-
zendo um período
da Segunda Guerra Púnica, que ocorreu entre 218 e 202 a. C.,
de 16 anos.
perfazendo um período de 16 anos. Cartago foi novamente derrotada e
Roma ampliou ainda mais seu império, ampliando seus domínios até a Península
Ibérica. Mas vamos a alguns detalhes do conflito.
No ano de 218 a. C., o comandante cartaginês Aníbal subiu com seu exército
a Península Ibérica, passou pelos Pirineus e cruzou os Alpes, chegando pelo
norte da Itália. Segundo Warmington,
77
História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
Aos poucos, Aníbal e seu exército ficaram isolados e sem suprimentos nas
terras italianas e dessa forma tiveram que fazer o retorno para as terras africanas.
No retorno, Aníbal encontrou as tropas romanas lideradas pelo general Cipião.
No ano de 203 a.C., os generais Aníbal e Cipião buscaram uma solução definitiva
para a guerra. Cipião desejava uma capitulação completa dos africanos, mas
Aníbal não concordou com a rendição total.
Os cartagineses Assim, em 202 a.C., iniciou-se aquela que seria a última batalha
foram vencidos em deste longo período de 16 anos de guerra. A batalha ocorreu próxima
seu próprio territó- à cidade de Zama, ao sul de Cartago. Havia aproximadamente 40 mil
rio. Cartago não foi soldados de cada lado combatente. Os cartagineses foram vencidos
invadida, mas teve
em seu próprio território. Cartago não foi invadida, mas teve que
que indenizar Roma
por causa dos custos indenizar Roma por causa dos custos de guerra.
de guerra.
Nos termos do tratado de paz, Cartago teve de se desfazer
de sua frota; seu território na África ficou desde então
limitado a uma linha que ia aproximadamente de Thabraca
(Tabarca) a Thaenae. [...] Finalmente, os cartagineses
ficaram proibidos de fazer a guerra fora da África, e
mesmo em seu próprio solo sem a autorização de Roma
(WARMINGTON, 2010, p. 495).
78
Capítulo 3 DE BERBERES A ÁRABES: O NORTE DA ÁFRICA E SUA
HISTÓRIA
Atividades de Estudos:
79
História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
80
Capítulo 3 DE BERBERES A ÁRABES: O NORTE DA ÁFRICA E SUA
HISTÓRIA
O EnfraQuecimento de Roma e as
Disputas pelo Magrebe
O Império Romano teve um crescimento sem precedentes a partir da
Segunda Guerra Púnica. A dificuldade administrativa por causa da grandiosidade
do império, as disputas políticas internas e o constante assédio dos povos
82
Capítulo 3 DE BERBERES A ÁRABES: O NORTE DA ÁFRICA E SUA
HISTÓRIA
Todas as disputas políticas e a crise que se abatia sobre o Estado Vândalo le-
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
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Capítulo 3 DE BERBERES A ÁRABES: O NORTE DA ÁFRICA E SUA
HISTÓRIA
A conquista do
A conquista do norte da África pela civilização islâmica foi
norte da África
avassaladora. Num primeiro momento, oito anos após a morte de pela civilização
Maomé, em 632, a conquista foi iniciada pelas regiões do Rio Nilo. O islâmica foi avas-
Egito, depois a Núbia e posteriormente o Sudão foram as primeiras saladora.
regiões afetadas pela expansão islâmica na África.
A conquista islâ-
A conquista islâmica do Egito foi o ponto de partida para a
mica do Egito foi
expansão para o Magrebe, mas essa região não foi facilmente o ponto de partida
conquistada, quase um século foi necessário para que os muçulmanos para a expansão
submetessem o norte da África aos seus domínios. Segundo Hrbek, para o Magrebe.
85
História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
Atividades de Estudos:
86
Capítulo 3 DE BERBERES A ÁRABES: O NORTE DA ÁFRICA E SUA
HISTÓRIA
Algumas considerações
O Magrebe sem-
Neste percurso histórico, vimos que a região do norte da África,
pre foi um espaço
o Magrebe, sempre foi uma área cobiçada por muitos povos. A onde imperou o
posição estratégica atraiu a atenção de muitas civilizações. Por esse hibridismo cultural,
motivo, o Magrebe sempre foi um espaço onde imperou o hibridismo pelo Magrebe se
cultural, pelo Magrebe se entrecruzaram culturas, povos, línguas e entrecruzaram
religiosidades. culturas, povos,
línguas e religiosi-
dades.
O Magrebe é importante não somente para a História da
África, mas para a história da humanidade como um todo. O Magrebe marcou
profundamente a identidade romana, pois era seu oposto, o diferente. O Magrebe
também marcou a história da Península Ibérica, afinal o Estreito de Gibraltar
nunca foi uma barreira entre os dois continentes, foi por ele que passaram os
cartagineses para atacar Roma pelo norte, foi por ele também que desceram os
vândalos para dominar o norte da África, e finalmente foi por ele que árabes e
mouros islamizados subiram para dominar territórios visigodos.
87
História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
ReferÊncias Bibliográficas
DESANGES, J. Os protoberberes. In: MOKHTAR, Gamal (Ed.). História Geral
da África II. África Antiga. 2ª ed. rev. Brasília: Unesco, 2010.
HRBEK, Ivan. A África no contexto da história mundial. In: FASI, Mohammed El.
(Ed.). História Geral da África III. África do século VII ao XI. Brasília: Unesco,
2010.
SALAMA, P. Parte. De Roma ao Islã. In: MOKHTAR, Gamal (Ed.). História Geral
da África II. África Antiga. 2ª ed. rev. Brasília: Unesco, 2010.
88
C APÍTULO 4
90
Capítulo 4 A ÁFRICA NEGRA PRÉ-COLONIAL
Contextualização
Caros pós-graduandos, chegamos ao último capítulo desta disciplina. Nos
capítulos anteriores, estudamos a pré-história da África e procuramos abordar a
história da África a partir dos povos e civilizações que se formaram às margens do
rio Nilo, posteriormente discutimos a importância histórica do norte da África e dos
povos que por lá habitaram e construíram sua cultura.
Essa região deu
Neste capítulo vamos abordar a história dos povos da África negra origem a diversos
ou subsaariana. Essa região deu origem a diversos reinos e impérios reinos e impérios
e foi fundamental
e foi fundamental para a história do Brasil, pois foi de seus territórios
para a história
que vieram a maioria dos escravos para trabalharem nos canaviais do Brasil, pois foi
e nas fazendas de café e construírem a riqueza brasileira. Vieram de seus territó-
principalmente da costa ocidental da África, das regiões de Angola, do rios que vieram
golfo da Guiné e de Moçambique. a maioria dos
escravos para
trabalharem nos
Portanto, estudar a história dessa região da África é compreender
canaviais e nas
a própria constituição do brasileiro, pois por quase 350 anos os negros fazendas de café
foram desterrados para com sua mão-de-obra tornarem-se o principal e construírem a
sustentáculo da economia brasileira. riqueza brasileira.
Ao lado dos sudaneses surgiram os povos bantus. Esses últimos Ao lado dos su-
daneses surgiram
ocuparam a região da África oriental e setentrional, foram importantes
os povos bantus.
reinos como o do Monomopata e o do Kongo, e foram muito importantes
na formação do Brasil, pois dessa região recebemos grande parte dos escravos
que aportaram no litoral brasileiro. Portanto, neste capítulo vamos acompanhar
um pouco a trajetória desses povos.
O Reino de Ghana
Segundo Medeiros (2010, p. 159), o desenvolvimento dos vários reinos
91
História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
Embora não tivesse O reino de Ghana era habitado pelos grupos étnicos soninquês
ligação com o mar,
e saracolês, do grupo linguístico mandinga. A capital do reino era
tinha contato com o
Saara, o grande mar Kumbi Saleh, possuía cerca de 20000 moradores e era um dos
de areia, navegá- maiores entrepostos comerciais da África ocidental. Embora não
vel apenas pelos tivesse ligação com o mar, tinha contato com o Saara, o grande mar
tuaregues, tribos de areia, navegável apenas pelos tuaregues, tribos berberes com
berberes com seus seus dromedários.
dromedários.
92
Capítulo 4 A ÁFRICA NEGRA PRÉ-COLONIAL
As informações sobre esse reino são escassas, mas tudo leva a crer que
as condições ambientais e técnicas favoreceram a ocupação dessa região, a
produção agrícola das primeiras comunidades e a formação dos reinos. Além das
condições favoráveis à atividade agrícola e pastoris, havia também uma grande
concentração de minas de ouro. Por isso, esse reino ficou conhecido como o país
do ouro.
93
História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
Sua força e prestígio Esse reino ganhou esse nome devido à sua forma de
iniciais seriam devi- organização social. O nome, gana, quer dizer “senhor da guerra”, e
dos ao fato de que era o título utilizado pelo governante do reino. “Sua força e prestígio
ele desempenhava
iniciais seriam devidos ao fato de que ele desempenhava também
também o papel de
mestre do ouro (MA- o papel de mestre do ouro” (MAESTRI, 1988, 19). A sua função era
ESTRI, 1988, 19). dividir as áreas de mineração para os clãs e receber eles o tributo
em ouro.
Toda a formação Toda a formação social do antigo Reino de Ghana era baseada
social do antigo na família clânica e patriarcal, que abrigava o patriarca, os filhos
Reino de Ghana era casados e solteiros e também os escravos. Segundo Mario Maestri,
baseada na família essas formações aldeão-familiares eram presididas por chefarias
clânica e patriarcal. que também recebiam a designação de sobas, ou seja, eram zonas
de influência de um chefe, uma determinada circunscrição política e
geográfica que estava sob o domínio de um patriarca. As famílias se ocupavam
da agricultura, do artesanato, da caça, pesca e extração mineral. A posse da terra
era coletiva. Nesse modelo familiar, o patriarca recebia tributos dos filhos e dos
demais membros do clã, administrava os bens e distribuía as esposas e dotes
familiares e, muitas vezes, estava livre dos afazeres produtivos (MAESTRI, 1988,
p. 18)
94
Capítulo 4 A ÁFRICA NEGRA PRÉ-COLONIAL
A capital de
Pela descrição de al-Bakri, a grande riqueza de Ghana era Gana é chamada
advinda da mineração aurífera. Essa riqueza teria contribuído para Kumbi Saleh. A
formação de cidades e a organização de exércitos. Sigamos o relato cidade consiste
de al-Bakri para observarmos sua descrição sobre a capital de Ghana, na reunião de
Kumbi Saleh. duas cidades que
se unem em uma
A capital de Gana é chamada Kumbi Saleh. A planície, a maior
cidade consiste na reunião de duas cidades que delas habitada
se unem em uma planície, a maior delas habitada por muçulmanos e
por muçulmanos e com doze mesquitas. Kumbi com doze mesqui-
Saleh possui também um grande número de tas. Kumbi Saleh
juízes e de homens instruídos. Ao redor de ambas
as cidades há poços de água doce e potável, e possui também
próximos a eles, terras cultivadas com vegetais. um grande núme-
ro de juízes e de
A cidade habitada pelo rei está a seis milhas da homens instruí-
outra cidade (muçulmana) e é chamada de Al- dos. Ao redor de
Ghana. A área entre as duas cidades é coberta
com casas feitas de pedra e de madeira. O rei tem ambas as cidades
um palácio e choças de formato cônico, cercadas há poços de água
por paredes. Na cidade do rei, não muito longe doce e potável, e
da corte de justiça real, há uma mesquita. Os próximos a eles,
muçulmanos que vêm em missões ao rei podem terras cultivadas
rezar ali. Há ainda uma grande avenida, que
cruza a cidade de leste a oeste (AL-BAKRI apud com vegetais.
COSTA, 2012).
As casas descritas
As informações que al-Bakri relata já nos podem dar uma noção por al-Bakri ainda
da islamização pela qual o Reino de Ghana estava passando e o lugar podem ser vistas
que os muçulmanos ocupavam nos domínios do gana. Por esse relato, atualmente em
temos a impressão que os muçulmanos foram acolhidos pacificamente várias regiões do
no reino. As casas descritas por al-Bakri ainda podem ser vistas Mali, como pode-
mos ver na figura
atualmente em várias regiões do Mali, como podemos ver na figura
abaixo.
abaixo.
95
História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
Atrás do rei ficam dez O rei adorna a si mesmo como se fosse uma mulher, usando
colares ao redor do pescoço e braceletes em seus antebraços.
pajens segurando Quando se senta diante do povo, fica sobre uma elevação
escudos e espadas, decorada com ouro e se veste com um turbante de pano fino.
ambas decoradas A corte de apelação fica em um pavilhão abobadado, com
com ouro. dez cavalos estacionados e cobertos com um tecido bordado
com ouro. Atrás do rei ficam dez pajens segurando escudos e
espadas, ambas decoradas com ouro.
96
Capítulo 4 A ÁFRICA NEGRA PRÉ-COLONIAL
cuidado, pois os relatos dos viajantes árabes devem ser relativizados e não
tomados como verdade absoluta. Mas o que podemos aferir é que a realeza de
Ghana possuía elementos que fazia com que os súditos a venerassem e nutrissem
respeito pela autoridade. Reverência de que apenas os islâmicos eram poupados.
“Tudo isso contribui para fazer da monarquia uma instituição sagrada e digna de
reverência” (MEDEIROS, 2010, p. 162). O aspecto religioso da monarquia de
Ghana pode ser visto na descrição dos funerais reais.
Os excertos de al-Bakri devem ser lidos com cautela, pois al-bakri, como
grande parte de seus colegas cronistas almorávidas, não tiveram acesso direto
aos locais que descrevem, mas basearam suas narrativas em depoimentos
orais de vários viajantes e mercadores árabes que cruzavam o Saara em busca
comércios rentáveis.
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
98
Capítulo 4 A ÁFRICA NEGRA PRÉ-COLONIAL
O Reino de Ghana atingiu seu apogeu no século XI. Nesse período, o exército
possuía cerca de 200.000 soldados, dos quais 40.000 eram arqueiros.
Estima-se que produção de ouro do Sudão fosse a principal fonte de Estima-se que
abastecimento do Mediterrâneo, chegando a cifras de 9 toneladas por produção de ouro
do Sudão fosse
ano.
a principal fonte
de abastecimento
O reino de Ghana entrou em crise quando o Islã começou sua do Mediterrâneo,
expansão nas regiões do Sudão. No entanto, Ghana ofereceu uma chegando a cifras
forte resistência até a rendição, que segundo Nei Lopes ocorreu de 9 toneladas por
por volta de 1076, quando Ghana caiu sob o domínio dos árabes ano.
almorávidas, sendo a cidade de Kumbi Saleh invadida e saqueada (2004, p. 292).
99
História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
Atividades de Estudos:
100
Capítulo 4 A ÁFRICA NEGRA PRÉ-COLONIAL
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
O Império do Mali
O Império do Mali surgiu sob o pano de fundo do declínio de Ghana. Não se
tem muitas notícias sobre o império de Mali. O que sabemos é que o senhor de
uma chefaria negra, chamado Baramendana, na atual república de O Império do Mali
Guiné, se converteu ao islamismo devido uma promessa que havia surgiu sob o pano
feito a um muçulmano. Isso ocorreu por volta do século XII. O chefe de fundo do declí-
africano, através de uma religiosidade profundamente marcada por nio de Ghana.
aspectos ligados aos elementos da natureza, não conseguia “chamar”
a chuvas necessárias para regar a agricultura de seu clã, então recebeu ajuda de
um clérigo islâmico. Assim que as águas caíram sobre as terras de sua tribo, o
chefe africano converteu-se ao Islã, assim como havia prometido. Dessa forma,
o Islamismo adentrou aos domínios do Mali e fez vários adeptos, mas sempre
convivendo com as religiões tradicionais, muitas vezes sofrendo influência delas
(MAESTRI, 1988, p. 25).
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
Os habitantes do Mali Do fato relatado acima, até cerca de um século e meio depois
eram conhecidos não temos informações sobre a região. Ao que tudo indica, nesse
como malinqueses período reinava sobre o Mali a dinastia dos keitas. Este pequeno
ou mandingas. estado era vassalo de seus vizinhos sossos, cujo soberano era
Sumanguru Kante. Os habitantes do Mali eram conhecidos como
malinqueses ou mandingas.
Segundo a tradição oral, nesse período o senhor do Mali era o keita Nare
Fa Maghon. Quando ele morreu, assumiu o trono seu filho primogênito Dankaron
Touman, mas Touman não foi o grande construtor do Império do Mali e sim seu
irmão, o famoso general Sundiata.
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Após a morte de Após a morte de Sundiata, seu filho Mansa Ulé governou de
Sundiata, seu filho 1255 até 1270. Depois de Mansa Ulé ainda reinaram Abubakar I,
Mansa Ulé governou Sakura, Abubakar II e o famoso Mansa Kanku Mussa, que teria feito
de 1255 até 1270.
notório o Mali em toda a África e Oriente Próximo, através de sua
Depois de Mansa
Ulé ainda reinaram peregrinação a Meca em 1324.
Abubakar I, Sakura,
Abubakar II e o Toda a riqueza comercial do Mali ficou comprometida a partir da
famoso Mansa Kanku viagem do mansa Kanku Mussa à Meca entre 1307 e 1332 . Acredita-
Mussa, que teria feito se que ele levou consigo cerca de 14000 servos e de 10 a 12 toneladas
notório o Mali em
de ouro. Por onde passava, mansa Mussa era recebido com honras
toda a África e Orien-
te Próximo, através e comprava casas e terrenos a fim de abrigar os peregrinos negros.
de sua peregrinação Ao retornar para seus territórios, trouxe consigo um grande número
a Meca em 1324. de sábios comerciantes clérigos muçulmanos. É nesse momento que
Tombuktu tornou-se um importante centro cultural.
Um dos cronistas árabes mais importantes deste período, Ibn Batuta (1307-
1377), esteve no Mali depois do falecimento de Mansa Musa, entre 1352 e1353.
Vejamos sua descrição da riqueza do palácio de Mali.
O rei sai por uma porta aberta num ângulo do castelo. Tem
o seu arco à mão e a aljava às costas. Traz na cabeça um
solidéu de ouro, fixado por uma pequena faixa também de
ouro, cujas extremidades são pontiagudas como facas e com
mais de um palmo de comprimento. Na maioria das vezes,
traz uma túnica vermelha e felpuda, feita com tecidos de
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Atividades de Estudos:
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Capítulo 4 A ÁFRICA NEGRA PRÉ-COLONIAL
O Império de Songai
O império de Songai foi o último grande reino a existir nas áreas O império de
que antes se constituíram os reinos de Ghana e do Mali. com Songai Songai foi o último
se interrompeu um processo de ascensão das civilizações negras na grande reino a
África ocidental. A estrutura do reino de Songai era muito parecida com existir nas áreas
os reinos anteriores, baseava-se no comércio e na tributação. que antes se
constituíram os
reinos de Ghana e
As origens do Império Songai são desconhecidas. As poucas do Mali.
informações dão conta de populações songais que viviam às margens
do rio Níger e eram divididas em dois grupos, os sorkos, que eram caçadores,
e os gous, que eram pescadores. Segundo a tradição mítica songai, o império
teria surgido a partir do nascimento de um feiticeiro chamado Faran Makan
Bote. Ele teria nascido a partir da união de um caçador sorko e de uma “mãe-
fada ligada aos espíritos das águas”. Makan Bote conseguiu unificar os caçadores
e os pescadores e ainda cumpria a função de sacerdote frente aos camponeses.
O Kanta, como era conhecido o sacerdote, era prestigiado por possuir poderes
mágicos. Segundo o mito, por volta do ano 500 teriam chegado às terras do
Kúkya, afluente do Níger, povos berberes que lutaram contra um terrível peixe-
feiticeiro, que era descendente de Makan Bote, e o príncipe berbere Za Aliamen
o teria vencido e libertado os pescadores e camponeses do terror imposto pelo
monstro. A partir desse momento, iniciou-se uma dinastia dia que duraria até 1335
(MAESTRI, 1988, p. 33).
Próximo ao ano 1000, o soberano Diá Kossoi, 15º na sucessão Gao era uma
dinástica que se iniciou com Za Aliamen, construiu em Gao a capital importante cidade
para o Império e foi o primeiro rei a aderir ao Islã. Gao era uma mercantil e chega-
va a competir com
importante cidade mercantil e chegava a competir com a cidade de
a cidade de Kumbi
Kumbi Saleh, capital de Império Mali. Gao tinha uma importância Saleh, capital de
capital para o império Songai, pois era um ponto de confluência das Império Mali.
rotas caravaneiras que cortavam o Saara.
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
um dos príncipes de Songai conseguiu escapar e voltou para libertar seu povo.
Aos poucos esse soberano foi reconquistando os territórios e fundou uma nova
dinastia, que ficou conhecida como Dinastia Soni.
Durante o século XV, Durante o século XV, o império do Mali entrou em decadência
o império do Mali e Ali, o Grande, da dinastia Soni, conquistou parte dos territórios
entrou em decadên-
mandingas, inclusive a cidade de Djenne, e formou o maior império
cia e Ali, o Grande,
da dinastia Soni, da faixa sudanesa. Ali, o Grande, estabeleceu governadores em
conquistou parte dos diversas partes do imenso território, construiu importantes obras
territórios mandingas. públicas, como canais de irrigação e até uma frota no Níger.
O Soni Ali morreu no ano de 1492. Em seu lugar reinou seu filho, mas seu
reinado foi efêmero, um ano após a morte de Ali, um antigo chefe militar chamado
Mohammed conquistou o trono de Songai. Mohammed deu origem à Dinastia
Áskia, aliou-se aos muçulmanos e escolheu seus ministros e secretários entre
sábios de Tombuctu. No ano de 1496, viajou a Meca e tornou-se o califa do Sudão
Ocidental. Durante o seu governo, Songai chegou ao apogeu de seu poderio.
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Atividade de Estudos:
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
Os Reinos Iorubas
A história desses reinos é narrada através da tradição oral.
Na ausência de
documentos escritos, Na ausência de documentos escritos, a história dos mais velhos,
a história dos mais que passa de geração para geração, juntamente com os vestígios
velhos, que passa materiais são as únicas formas de conhecer a trajetória desses
de geração para reinos que habitavam perto do rio Volta e do Baixo Níger.
geração, juntamente
com os vestígios ma-
Algumas ruas calçadas e pedaços de muros nos dão uma ideia
teriais são as únicas
formas de conhecer de como eram essas civilizações. Nelas viviam agricultores, artesãos
a trajetória desses e grupos de famílias. Todos eram submetidos aos conselhos de
reinos que habitavam um chefe. Os vestígios arqueológicos mais importantes da região,
perto do rio Volta e datados do ano 500 da era cristã, foram encontrados em Ilê Ifé, a
do Baixo Níger. principal cidade dos iorubas.
Ao lado Oio, Ilê Ifé As cidades dos iorubas eram cercadas por muralhas, nelas
era uma das cidades habitavam artífices camponeses e uma aristocracia dominante.
mais importantes, As cidades também eram independentes do poder central, os reis
pois era o local onde eram escolhidos através de uma assembleia e o seu governo era
ocorria a sagração reconhecido pelo Oni de Ilê Ifé (rei e sacerdote) (MAESTRI, 1988, p.
dos reis.
55).
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Capítulo 4 A ÁFRICA NEGRA PRÉ-COLONIAL
Dessa forma, em Ilê Ifé foi criada uma monarquia divina, onde quem
governava era o Oni, representante da divindade. O reino ioruba de Ilê Ifé possuía
aldeias, com vários chefes que prestavam obediência ao Oni, oba de Ilê Ifé. Todo
esse sistema político-religioso de Ilê Ifé foi adotado pelos povos iorubas que
habitavam ao redor do rio Volta e Níger.
Todos os obás dos reinos iorubas diziam que seus antepassados saíram
de Ilê Ifé e que por isso faziam parte de uma família real e divina. Ilê Ifé tinha
ascendência espiritual sobre quase todos os reino iorubas e era quem distribuía
os símbolos reais. Os adés, uma espécie de coroa feita de contas de coral, com
fios cobrindo o rosto de oba, foi um dos principais símbolos do poder junto com o
sistema de monarquia divina (SOUZA, 2006, p. 36).
No século XVI, os reinos iorubas ascenderam, exceto Ilê Ifé, que entrou em
declínio. Isso porque houve a presença de novos comerciantes na costa atlântica,
que traziam novas mercadorias em seus navios e que eram desejados pelos
chefes africanos. Mesmo em declínio, Ilê Ifé manteve a importância religiosa.
Todos os chefes das cidades, que teriam sido fundadas por ascendentes de
Oduduwa, iam até Ilê Ifé para terem seus poderes confirmados por Oni, o oba
mais importante política e religiosamente.
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Capítulo 4 A ÁFRICA NEGRA PRÉ-COLONIAL
Certamente as
como foram os casos do Reino do Benin, o Reino do Adomei ou Daomé
cidades de Oio
e a Confederação de reinos Ashanti. De todos esses reinos o Brasil e Ilê Ifé eram as
recebeu escravos, muitos foram identificados no Brasil como Nagôs, mais importantes
mas na verdade eram iorubas provenientes do Benin. para os iorubas.
Atividade de Estudos:
Os Povos Bantus
Os povos que habitavam abaixo da linha do Equador são Os povos que ha-
majoritariamente os grupos da família linguística bantu. Esses povos bitavam abaixo da
eram hábeis metalurgistas, principalmente na mineração de ferro. O linha do Equador
são majoritaria-
ferro era muito importante na África Central, pois permitia a fabricação
mente os grupos
de ferramentas utilizadas no trabalho agrícola. Esses primeiros da família linguísti-
metalurgistas ocuparam a África Central nos primeiros anos da era ca bantu.
cristã. Nessas sociedades o ouro ainda não tinha o valor que teria mais
tarde, com a chegada dos colonizadores. A metalurgia do ferro era muito mais
relevante, pois a economia era fundamentalmente agrícola. É interessante notar
que os grandes mestres da metalurgia brasileira serão justamente os negros que
vieram como escravos dessa região da África para o Brasil.
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
de ferro e cobre e o território era rodeado por rios: ao sul estava o rio Cuanza, ao
norte o rio Oguwé e ao leste o rio Congo.
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Capítulo 4 A ÁFRICA NEGRA PRÉ-COLONIAL
Mbanza Kongo, assim como Oio ou Ilê Ifé, era uma grande
cidade, comparável ao tamanho das capitais europeias da época. Que fazia a
ligação entre
O Mani Kongo vivia numa corte rodeada de muros e labirintos. Ali
seu reino e o
convivia com suas mulheres, filhos, parentes, conselheiros, escravos. mundo sobrena-
Os limites do reino eram traçados pelas aldeias que pagavam tributos tural, povoado
e em troca recebiam proteção para assuntos tanto deste mundo como por divindades e
para do além, pois o Mani Kongo não era apenas um líder político, mas pelos espíritos dos
acima de tudo um líder espiritual, que fazia a ligação entre seu reino e ancestrais.
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
Atividade de Estudos:
O Reino do Monomotapa
Um dos povos mais importantes que foram feitos cativos e vieram para o
Brasil foram os moçambiques. Essa denominação genérica encontrada na
documentação sobre a escravidão a partir do século XIX deixa uma curiosidade.
Quem seriam esses moçambiques?
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Capítulo 4 A ÁFRICA NEGRA PRÉ-COLONIAL
Figura 28 - Detalhe do mapa de Rigobert Bonne, 1780. Na imagem é possível ver a Ilha
de Madagascar, o golfo de Sofala, o reino do Monomopata e em seu interior o Zimbábue
Figura 28 - Detalhe do mapa de Rigobert Bonne, 1780. Na imagem é possível ver a Ilha
de Madagascar, o golfo de Sofala, o reino do Monomopata e em seu interior o Zimbábue
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
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Capítulo 4 A ÁFRICA NEGRA PRÉ-COLONIAL
No interior do reino ainda hoje podem ser vistas as enormes muralhas de pedras
que chegam a 5 m de altura por 2 m de largura. Essas enormes
muralhas foram construídas sobre terras férteis por um povo que vivia Segundo Mario
Maestri (1988, p.
da agricultura e da criação de gado. Elas são unidas somente pela
105), na língua
sobreposição de pedras, sem nenhum tipo de argamassa, são os dos povos xonas a
chamados zimbábues. Dentro das muralhas existiam casas cobertas palavra “zimbaoé”
com palha. quer dizer residên-
cia real, ou ainda,
Segundo Mario Maestri (1988, p. 105), na língua dos povos xonas lugar onde habita
o mambo.
a palavra “zimbaoé” quer dizer residência real, ou ainda, lugar onde
habita o mambo. Os xonas cultuavam uma divindade conhecida como
Mauari e tinham o mambo como chefe religioso e político. O mambo Os xonas eram
habitava o zimbábue, grande monumento de pedra datado do século comunidades
pastoris que ocu-
XI.
pavam as regiões
mineratórias mais
Os xonas eram comunidades pastoris que ocupavam as regiões abundantes e
mineratórias mais abundantes e controlavam as rotas que ligavam controlavam as
o interior e a costa litorânea. A partir do século XV, ocorreu uma rotas que ligavam
forte centralização do poder nas mãos dos mambos e um grande o interior e a costa
litorânea.
desenvolvimento comercial do litoral e do interior. Esse é momento de
maior esplendor da civilização xona. Segundo Marina de Mello e Souza
(2006, p. 40), próximo às muralhas chamadas zimbábues foram encontradas
porcelanas da China e da Índia, o que comprova a relevante atividade mercantil
desse povo.
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
Dentre os povos xo- Dentre os povos xonas, o clã dos rozuis é apresentado como
nas, o clã dos rozuis o responsável pela fundação do império. A partir de 1440, o mambo
é apresentado como rozui Mutota iniciou uma política expansionista e conquistou muitos
o responsável pela
territórios. Segundo Maestri,
fundação do império.
as conquistas terminaram envolvendo, em uma só
organização política, os vastos territórios limitados pelo
oceano índico, pelos rios Zambeze e Limpopo e pelo
deserto de Calaari. O conquistador rozui, possivelmente
apoiado pelos comerciantes islamizados, tomou o título
de muene mutapa, ou seja, “senhor das terras arrasadas”
(1988, p. 107).
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Capítulo 4 A ÁFRICA NEGRA PRÉ-COLONIAL
No Monomopata havia ouro, o que fez com que o local se tornasse uma
importante rota comercial. O ouro era extraído de maneira sazonal, durante
o intervalo entre o cultivo da terra e a criação de gado. Além do ouro, era
comercializado também sal, cobre e gado.
Quando os portu-
Quando os portugueses começaram a frequentar a costa oriental gueses começa-
da África, tomaram conhecimento dos zimbábues e da existência de ram a frequentar
um grande reino. A vontade de dominar o Reino do Monomopata era a costa oriental da
muito grande nos portugueses, pois segundo as algumas descrições África, tomaram
prévias, o reino seria rico em jazidas de ouro. Mas era bem menos rico conhecimento dos
zimbábues e da
do que portugueses imaginavam.
existência de um
grande reino.
Os portugueses receberam relatos de que havia no interior
da África um reino rico em ouro e que não era governado por
muçulmanos. Dessa forma, os primeiros contatos entre os portugueses e o
Reino do Monomotapa visavam estabelecer relações comerciais e construir
um entreposto entre a Europa e Ásia.
Religiosidades e Escravidão na
África Pré-Colonial
Atualmente, temos consciência da importância da religião na vida
social de um determinado povo. Principalmente nós brasileiros sabemos
da relevância da religião em nosso país, pois somos um povo que recebeu
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
Segundo Marina de Mello e Souza (2006, p. 46), na costa da África, que vai
do Senegal até Moçambique, lugar onde os portugueses negociavam escravos,
tudo era manipulado através de curandeiros, adivinhos, médiuns, sacerdotes, que
foram chamados pelos portugueses de curandeiros.
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Capítulo 4 A ÁFRICA NEGRA PRÉ-COLONIAL
adentraram a África pelo norte e pela costa do Índico, não conseguiram Nas mais variadas
islamizar totalmente o continente. Nas mais variadas regiões se regiões se produ-
produziram ricos sincretismos do Islã com as religiões tradicionais. ziram ricos sin-
cretismos do Islã
com as religiões
E toda essa riqueza cultural das religiões africanas veio com tradicionais.
os escravos nos quase 350 anos de tráfico atlântico. Nas regiões de
Salvador, Pernambuco e Maranhão ainda permanecem vivos os cultos africanos
dos Voduns, dos Orixás e do Tambor de Mina.
Ao lado da religio-
Ao lado da religiosidade, outro tema que chama a atenção de
sidade, outro tema
todos que se voltam para o estudo da África é a escravidão. Nesse que chama a aten-
aspecto, é importante discutir algumas questões. Principalmente para ção de todos que
nós, brasileiros, a escravidão tem um peso considerável na formação se voltam para o
de nossa sociedade, afinal a cifra chega a aproximadamente 4 milhões estudo da África é
de negros introduzidos compulsoriamente através do tráfico no Brasil a escravidão.
em quase três séculos e meio.
Mas devemos atentar para o fato de que a escravidão não foi uma criação do
sadismo português. Vejamos o que diz o grande historiador dos Annales, Fernand
Braudel.
Atividades de Estudos:
Algumas Considerações
Chegamos ao final desse capítulo e dessa disciplina. O objetivo dessa
narrativa era lançar um olhar sobre a África pré-colonial, não pretendíamos de
modo algum esgotar todos os assuntos, pois temos a consciência da incompletude
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Capítulo 4 A ÁFRICA NEGRA PRÉ-COLONIAL
de qualquer estudo histórico. Sempre haverá um novo olhar, uma nova perspectiva
e novas avaliações.
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História da África e dos Africanos: dos Primórdios ao Período Pré-Colonial
ReferÊncias Bibliográficas
ALENCASTRO, Luiz Felipe de. O trato dos viventes: Formação do Brasil no
Atlântico Sul, séculos XVI e XVII. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
LOPES, Nei. Enciclopédia brasileira da diáspora africana. São Paulo: Selo Negro,
2004.
SOUZA, Marina de Mello e. África e Brasil africano. São Paulo: Ática, 2006.
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