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História da África Pré Colonização

Aula 9: O contato com os europeus a partir do século XV

Apresentação
Nessa aula, você vai identificar as razões que levaram os europeus a lançarem-se ao mar, analisará as primeiras relações
estabelecidas entre europeus e alguns povos africanos; e, ainda, vai examinar as razões que levaram à formação do tráfico
transatlântico.

Objetivo
Identificar as razões que levaram os europeus a entrarem em contato com a África Subsaariana;

Analisar parte das transformações que a chegada dos europeus trouxe para a África;

Examinar a conformação do comércio transatlântico de escravos.

Reflexão
A imagem abaixo apresenta africanos escravizados sendo levados para regiões costeiras do continente africano, local onde
seriam vendidos para o Novo Mundo. A partir dela, desenvolva as seguintes atividades:
• Elabore uma hipótese sobre as razões que fizeram com que esses homens fossem escravizados.

• Ao final desta aula, faça uma análise crítica da hipótese que você levantou, debatendo os possíveis equívocos.

Os Europeus e a Escravização
de Africanos
Os portugueses foram os primeiros europeus a explorar a
África Ocidental, a partir do início do século XV, época
conhecida como período das grandes navegações. Os
objetivos iniciais dessas explorações eram dois. De um lado,
os portugueses queriam ter acesso direto ao ouro africano
que chegava à Europa pelas mãos dos muçulmanos. De
outro, estavam interessados em participar do comércio feito
no Oceano Índico que, na época, era controlado pelos
italianos e também pelos muçulmanos.

Durante muitos anos, as rotas comerciais do Índico eram os


locais onde circulavam as mercadorias mais importantes e
mais caras para diversas regiões da Europa, do Oriente
Médio, da Ásia e do Norte da África. Os tecidos luxuosos
como a seda e veludo, especiarias como a canela e a
pimenta, e o ouro e a prata são exemplos de produtos que
eram comercializados.
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Como o Mediterrâneo, caminho mais fácil para chegar às Índias, estava sob o controle dos muçulmanos (que eram
considerados inimigos religiosos dos católicos), os portugueses resolveram contornar todo o continente africano para chegar à
Ásia. O trajeto era muito maior e muito perigoso, pois não se tinha notícia de nenhum outro povo que tivesse tentado realizar tal
façanha, mas caso os portugueses tivessem êxito nessas viagens, passariam a controlar uma nova rota comercial marítima.

O rei de Portugal e os principais comerciantes do país estavam investindo


muito dinheiro nas navegações. Além da construção dos navios, havia os
gastos com a tripulação e com o desenvolvimento de novos instrumentos de
navegação que facilitariam a orientação dos marinheiros quando estivessem
no mar.

A conquista de Ceuta, em 1415, foi um grande feito que encorajou ainda mais os portugueses. Em 1419 eles chegaram às Ilhas
da Madeira; e em 1430 ao Arquipélago dos Açores. Contudo, o ano de 1420 foi de extrema importância para Portugal, pois foi
quando conseguiu ultrapassar o Cabo do Bojador e chegar à África Subsaariana.

A partir de então, as viagens para as regiões africanas que ficavam abaixo do Saara tornaram-se frequentes. Em 1434, as
expedições portuguesas aportaram na região da Guiné que, conforme visto anteriormente, era habitada por diferentes povos
africanos como os iorubas, edos e acans. Quarenta e oito anos depois os portugueses chegaram até a região do Congo. A
partir desse primeiro contato, os portugueses e os demais europeus começaram a estabelecer importantes redes comerciais
com diferentes sociedades africanas.

Atenção

Ao contrário do que se pode imaginar, a chegada dos portugueses na África subsaariana não significou a dominação dos grupos
africanos que viviam naquela região. Embora muitos africanos tenham se assustado com o tamanho das embarcações e com a
brancura dos portugueses, esses povos eram suficientemente organizados para barrar a entrada europeia no continente.

As primeiras tentativas portuguesas de ultrapassar a região litorânea da costa ocidental africana foram impedidas tanto pelas
doenças que assolaram sua tripulação (como a febre amarela e a malária), como pelas batalhas travadas pelos africanos que,
munidos com arcos e flechas, pequenas espadas e ágeis pirogas (pequenas embarcações construídas por algumas
sociedades africanas que muito se assemelhavam às canoas) venceram as armas de fogo europeias.Já que a tentativa de
dominação não havia dado certo, a principal relação estabelecida entre os portugueses e africanos foi o comércio.

A soberania das sociedades africanas também impediu que os portugueses tivessem acesso às minas de ouro que haviam
sido descritas pelos viajantes árabes. A quantidade de ouro que os portugueses conseguiram comprar no continente africano
era muito menor do que eles haviam sonhado. Por isso, rapidamente transferiram seus interesses comerciais para outra
mercadoria: o escravo africano.
A Escravidão na África antes do Contato com os Europeus
Antes de compreender as dinâmicas que iniciaram a venda de africanos escravizados para os europeus, é preciso pontuar dois
aspectos cruciais na história da África.

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Em primeiro lugar, mesmo que isso possa parecer óbvio, os Em segundo lugar, é preciso destacar que antes mesmo da
africanos não se reconheciam como iguais, ou seja: edos, chegada dos europeus (e até mesmo antes da chegada dos
acans, congos, fulas, iorubas etc. não compartilhavam muçulmanos), diferentes povos da África praticavam a
nenhuma identidade continental. Foi o olhar eurocentrista escravidão. Contudo, esta era tida como doméstica, que
dos europeus que fez com que essa massa heterogênea precisa ser compreendida dentro dos parâmetros da África
chamada de africanos fosse tratada no singular. Tradicional.

Saiba mais

Assim como ocorreu com diversos povos europeus (como os gregos que foram escravizados pelos romanos) e sociedades
ameríndias, o africano escravizado por outro africano era visto como um ser diferente e, muitas vezes, inferior. No Império do Mali,
por exemplo, os malinquês nunca escravizaram pessoas de seu próprio povo, mas sim outros grupos africanos que consideravam
seus inimigos, como os soninquês. Os grupos que venciam as batalhas transformavam os inimigos sobreviventes em escravos e
os usavam como mão de obra na execução de tarefas variadas. Em troca do trabalho forçado e da perda de seus direitos, os
escravos recebiam comida, moradia e vestimenta dos seus novos senhores.
O sequestro também foi uma tática utilizada por sociedades
africanas a fim de obter escravos. Quando não tinham um
exército bem estruturado ou não queriam passar pelos
perigos da guerra, determinadas sociedades africanas
sequestravam pessoas das aldeias próximas,
principalmente mulheres, e as transformavam em escravos.

A principal razão para a existência da escravidão na África


se devia à falta de trabalhadores em determinadas regiões.
De nada adiantava uma aldeia ou reino possuir terras férteis
se não tivesse braços suficientes para trabalhar nelas. Por
isso, muitas guerras objetivavam a escravização de povos
vizinhos mais fracos. E quanto maior o número de pessoas
de um povo, maior era o número de escravos que ele
precisava.

No entanto, o número de escravos era pequeno nas aldeias


africanas que praticavam a escravidão. Normalmente, cada
família tinha de um a quatro escravos, quase todos
empregados nas atividades agrícolas e domésticas. Nessas
sociedades havia uma preferência pela escravidão feminina,
pois a mulher escrava produzia e reproduzia para a família
de seu proprietário.

Comentário

Por um lado, a maior parte do trabalho doméstico era feito pelas mulheres escravizadas: elas arrumavam a casa, cortavam lenha,
buscavam água, cuidavam da plantação, enfim, produziam parte importante do sustento da família de seu senhor. Ao mesmo
tempo, embora as escravas não tivessem o mesmo prestígio que as mulheres livres, elas também se tornavam concubinas ou
esposas de seus senhores, ajudando assim a reproduzir o número de membros de uma determinada família. Ainda que os filhos
dessa união não tivessem os mesmo direitos que os filhos de mulheres livres, o fato de eles ampliarem a linhagem senhorial fazia
com que não fossem considerados escravos.

Mesmo tendo sido usado em diferentes sociedades africanas, é importante lembrar que, assim como ocorreu em outras partes
do mundo, o escravo africano lutou contra sua condição. Em diversas situações, tropas militares formadas por escravos se
revoltaram contra maus-tratos. Escravos administradores muitas vezes enganaram seus senhores para obter algum tipo de
vantagem ou simplesmente para se vingar por algum castigo recebido.

No entanto, ainda que a escravidão fosse praticada por diferentes grupos africanos, havia uma grande diferença entre esse tipo
de escravidão e aquele que seria instaurado após o contato com os portugueses: o escravo da África Subsaariana não era uma
mercadoria: ele não poderia ser comprado, só obtido por meio de guerras, sequestro e nascimento. Como será explorado na
próxima aula, a transformação do escravo numa mercadoria trouxe mudanças significativas para muitas regiões africanas.

A formação das redes do tráfico


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Ainda no século XV, os portugueses compraram um grande


número de africanos que seriam vendidos para outras
sociedades europeias, ou então utilizados como mão de
obra na produção de cana-de-açúcar na Ilha da Madeira.
Para facilitar o transporte desses escravos, os portugueses
construíram o Forte de São Jorge da Mina (no atual país de
Gana), em 1482. Durante a construção, Portugal teve que
pagar altos impostos para o povo acan.

No início, os africanos escravizados eram comercializados


como outra mercadoria qualquer. As elites das sociedades
africanas que habitavam as regiões próximas ao litoral
começaram a trocar os escravos que já possuíam por
produtos vindos da Europa que lhes interessavam, como o
veludo e armas de fogo. Todavia, com esse forte os
portugueses aumentaram o lucro de suas trocas
comerciais, pois podiam estocar um grande número de
mercadorias (inclusive escravos), enquanto esperavam que
suas embarcações voltassem das viagens feitas para a
Europa.

A colonização da América fez aumentar ainda mais o interesse dos


portugueses pelos escravos africanos. A compra desses escravos,
que antes ficava restrita à região conhecida como Costa do Ouro,
começou a ser feita com outras localidades da África.

Contudo, o que era uma troca comercial feita por povos diferentes acabou se transformando em uma ampla rede de comércio
que atingiu diferentes sociedades africanas. O tráfico transatlântico de escravos foi responsável pela retirada de mais de 12
milhões de africanos no curto período de 300 anos e, na época, foi uma das empresas mais lucrativas do mundo. Entender
parte das dinâmicas desse comércio será o objetivo da próxima aula.
Referências

M'BOKOLO, Elikia. África Negra: história e civilizações. Lisboa: Vulgata, 2003.

SILVA, Alberto da Costa e. A manilha e o libambo. A África e a escravidão de 1500 a 1700, Rio de Janeiro, Nova Fronteira:
Fundação Biblioteca Nacional, 2002.

SILVA,A.C. A enxada e a lança. A África antes dos portugueses. Nova Fronteira/EDUSP. São Paulo, 1992.

Próxima aula
As etapas de escravização dos africanos;

As principais diretrizes do Tráfico Transatlântico;

O impacto da história do tráfico para o continente africano.

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