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O estudo da Antiguidade: fontes e investigação

Prof. Alexandre Moraes

Descrição

Fundamentar o conhecimento necessário para o desenvolvimento de


saberes, investigações e pesquisa em história antiga.

Propósito

Obter ferramentas para o futuro profissional possa reconhecer as bases


e desenvolver conhecimentos em história antiga.

Objetivos
Módulo 1

A história antiga

Reconhecer a definição de história antiga e sua historiografia.

Módulo 2

Vestígios e documentos
Identificar documentos e vestígios investigáveis em história antiga.

Módulo 3

Pesquisa em história antiga: a escrita


Identificar documentos referentes à história antiga.

Introdução
A Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (RIHGB) foi
lançada no país em 1839. Muitos historiadores argumentam que
esse periódico foi um dos movimentos mais importantes para a
formalização da pesquisa histórica no Brasil, razão pela qual
continua sendo um documento bastante examinado.

Não deixa de ser curioso que, em seu Tomo I, tenha sido publicado,
além de estatutos, atas e outros registros da instituição, o relatório
de uma expedição científica encomendada pelo próprio IHGB para
elucidar a misteriosa inscrição na Pedra da Gávea, localizada na
capital do Rio de Janeiro. Aquela inscrição poderia mudar a história
do país.

Muitos defendiam que os sulcos visíveis na rocha seriam resultado


da ação do homem — no caso, dos fenícios. Conhecidos por sua
perícia marítima, esses povos da Antiguidade teriam cruzado o
Atlântico e atingido nosso litoral antes dos portugueses.

Aquele texto, localizado em ponto estratégico, teria sido um recurso


dos povos antigos para registrar o feito heroico para a posteridade.
Faltava, porém, decifrá-lo. A expedição buscaria não apenas
documentar a inscrição fenícia (vide a imagem ao final do texto),
mas também averiguar se as marcas eram resultantes da
sedimentação da rocha ou entalhes feitos por escribas.

Quando se entende que toda a história de um território constitui


“história nacional”, ainda que no passado não existisse tal “nação”,
é preciso identificar os heróis fundadores, os primeiros
conquistadores e os povos cujas técnicas avançadas permitiram
alavancar a sociedade para o suposto caminho do progresso.

A expedição concluiu que aquelas ranhuras eram efeitos da própria


rocha, e não a intervenção humana de um passado remoto. Apesar
disso, até hoje há especulações sobre esse tema em blogs, sites
conspiratórios e vídeos de YouTube.

A chance de um brasileiro estar caminhando pelas ruas e encontrar


um artefato da Antiguidade é praticamente nula. Não existe uma
pirâmide egípcia perdida no meio da selva amazônica, um aqueduto
romano no sertão da Paraíba ou uma sepultura grega no centro de
São Paulo.

Mesmo os documentos materiais da Antiguidade que chegaram ao


Brasil por outras vias, como a coleção da imperatriz Teresa Cristina
de Borbone, esposa de D. Pedro II, não estão disponíveis nesse
momento: trabalhadores e trabalhadoras, afinal, ainda lutam para
recuperar parte do acervo consumido pelas chamas do incêndio do
Museu Nacional da UFRJ que ocorreu em setembro de 2018.

No território que hoje chamamos de Brasil, em nenhum momento do


passado viveram os povos e as sociedades que estudamos em
história antiga. Não será absurdo se, nesse momento, você estiver
se perguntando: “Por que então devo estudar história antiga se
nasci no Brasil?”.

Ao longo deste conteúdo, você conhecerá alguns bons motivos.

Reprodução da inscrição na Pedra da Gávea, no Rio de Janeiro, feita por uma expedição
financiada pela RIHGB.
1 - A história antiga
Ao final deste módulo, esperamos que você reconheça a definição de história antiga e sua
historiografia.

Introdução à história antiga


Quando começa nossa história?
Tal pergunta, que parece de simples solução para a gente, é irrespondível
para boa parte das pessoas. Veja o caso português. O Reino de Portugal
foi fundado em 1139, durante a reconquista cristã, quando D. Afonso
Henriques foi aclamado rei após a vitória contra os mouros.
Condado Portucalense.

As fronteiras portuguesas — as mais antigas da Europa — foram


estabelecidas em 1297.

Essas datas, contudo, não impedem que pensemos nas experiências


históricas que envolveram o Condado Portucalense, formado em 868
entre os rios Minho e Douro, ou mesmo na ocupação romana no século
III a.C.

Desse modo, a pergunta “Quando começa a história de Portugal?” só


pode ser respondida após o estabelecimento de rígidos critérios. A
começar por uma reflexão nada simples:

De que “Portugal” se está falando?

Mesmo que não se admita um recuo tão distante para falar do


“nascimento” de Portugal, os portugueses convivem com vestígios da
Antiguidade.

As ruínas de Conímbriga, localizadas a 17km da cidade de Coimbra, ou


a Fonte do ídolo, construída por volta do século I d.C., onde hoje fica a
rua do Raio na freguesia de São José de São Lázaro, em Braga, norte de
Portugal.
Fonte do ídolo (século I) - Bracara Augusta, Portugal.

O vínculo dos portugueses com a Antiguidade, assim como o dos


demais europeus, se justifica por causa de uma relação com o território?
Não há como negar que esse é um aspecto.

Em alguns casos, ainda que distantes da Europa, percebe-se que até


mesmo a ideia de ancestralidade permanece viva. Em história, uma
explicação simples raramente é suficiente para se entender fenômenos
complexos. Pelo mesmo motivo, não existem explicações monocausais.

Os gregos e os romanos não se tornaram “os primeiros


europeus” por força da natureza ou por uma relação
afetiva com seu patrimônio histórico. Para entender
esse processo, o chamado eurocentrismo precisa ser
levado em consideração.

Eurocentrismo e os estudos clássicos


Para abordarmos o começo de “nossa história”, não sofremos da mesma
dificuldade dos portugueses. Se alguém nos pergunta, somos
imediatamente levados a responder que:
Sabemos, portanto, não apenas o nome e o sobrenome do responsável
por esse acontecimento, mas também o dia, o ano e o local.

Aliás, essa foi a primeira pergunta de história que muitos de nós


aprendemos a responder — em muitos casos, testados quando éramos
crianças por aquele familiar inconveniente. A questão também guarda
consigo uma inconveniência bem conhecida:

Algo só é descoberto na perspectiva de alguém.

Para que alguma coisa seja desvelada, reconhecida, é preciso um estado


de ignorância prévia. Os europeus ignoravam a existência do nosso
continente; assim, o dia e o local que eles usam de referência como fim
desse período de ignorância são os mesmos que tomamos como
pontapé de nossa história, condenada à eterna juventude se comparada
com a maturidade dos europeus, para quem ela já existia.
Nesse sentido, não é exagerado dizer que, por muito tempo, a noção de
história quase se confundia com ideias, como “civilização” ou
“progresso”. Comunidades autóctones, como a dos indígenas das
Américas, só passaram a ter direito à história quando os europeus
sancionaram sua existência.

Essa forma de entender a experiência social não é um


dado objetivo e inquestionável: trata-se de uma
escolha política que ajudou a consolidar o poder
europeu no Ocidente, sobretudo a partir do século XVI.

Como defende o historiador Kostas Vlassopoulos, a história da Grécia


não é tratada como a de uma área do Mediterrâneo por meio dos
tempos, pois “torna-se parte de uma cadeia de evolução histórica que
começa no Oriente próximo, se move para a Grécia, passa por Roma
antes de se mover para a Idade Média e para o mundo ocidental
moderno”. Pode-se dizer também que essa "Europa moderna, desde 1492
‘centro’ da história mundial [...] pela primeira vez na história, fez todas as
outras culturas como sua 'periferia'" (VLASSOPOULOS apud MORAES,
2017, p. 6, grifos nossos).

Esse movimento costuma ser explicado a partir da noção de


eurocentrismo.
Mas... O que é o eurocentrismo? expand_more

Como a palavra sugere, o eurocentrismo tem a ver com a posição


central ocupada pela Europa não apenas na forma como a nossa
história é entendida, mas sobretudo pelos efeitos materiais que
resultam da exploração colonial e da influência que exercem em
nossas visões de mundo e práticas cotidianas.
Muitos entenderam que "o eurocentrismo é um fenômeno
especificamente moderno cujas raízes não vão além do Renascimento e
que se difundiu no século XIX. Nesse sentido, constitui uma dimensão
da cultura e da ideologia do mundo capitalista moderno" (AMIN, 1989, p.
1).

O eurocentrismo produz mais efeitos colaterais do que podemos


imaginar, incluindo nossa relação com o tempo. Como nossa “história
nacional” não costuma recuar mais de 500 anos, a relação com os
passados mais distantes fica bastante opaca. Vejamos um exemplo:

Exemplo

Não aprendemos a pensar em termos de milênio. Muitas pessoas


chegam a confundir até mesmo as datas: estudantes experientes por
vezes cometem o lapso de inverter a cronologia, julgando que o século
VIII a.C., por exemplo, é mais recente que o século V a.C.

Além disso, acabamos imaginando que a única história possível é a


história das nações. Trata-se de um limitador grosseiro, haja vista que a
ideia de “nação” não é anistórica.

É preciso evitar ainda a ideia enganosa de que o território é a medida


primeira para se estudar o passado. Nem todos que viveram no atual
território europeu foram europeus: a Europa, afinal, também não é um
fato da natureza, uma realidade que existe desde que o mundo é mundo.

Representação da Idade Média.

Ainda que o nome desse continente seja de origem grega, como bem
mostrou o historiador francês Jacques Le Goff, a época em que se deu a
gênese da Europa como realidade e representação é a Idade Média (LE
GOFF, 2007, p. 28). Em outras palavras, a noção de unidade associada
ao continente europeu, talvez uma quimera até os dias de hoje, não
existiu na Antiguidade.

É claro que existem convenções. Muitos dizem, por exemplo, que o


primeiro "homem europeu" viveu em Atapuerca, na Espanha, há cerca de
1,2 milhão de anos.

Caso levássemos essa ideia ao pé da letra (ou como os jornais


costumam noticiar), deveríamos admitir que os europeus existem antes
mesmo da espécie da qual descendemos, a Homo sapiens sapiens.

Então por que os europeus tomam o passado greco-romano


como se fosse seu passado nacional?

Usos do passado
Muitas pessoas têm dificuldade para entender como a história pode
mudar; afinal, os acontecimentos do passado não podem ser alterados.
Tal dificuldade é criada pelo fato de muitos não distinguirem a disciplina
história do passado, seu principal foco de interesse.

História não é sinônimo de passado, ainda que muitas vezes ela assim
ressoe. É precisamente por isso que a história muda sem que o passado
se altere.

Por vezes:

flag Novas descobertas explicam fatos até então pouco


conhecidos.

flag Interpretações, métodos e teorias novas trazem


questões pouco exploradas.
Os problemas da vida contemporânea, enfim, lançam novas perguntas.
Estudamos atualmente, por exemplo, as relações de gênero na Grécia
Antiga, pois esse problema se tornou visível no mundo contemporâneo
graças aos movimentos feministas.

Não é que a história “pode mudar”: ela deve mudar.

Uma das mudanças mais interessantes nos últimos anos no campo da


história antiga foram as investigações sobre os chamados usos do
passado. É necessário entender que o conhecimento que temos dos
fatos depende de tradições e interpretações históricas produzidas acerca
deles ao longo dos séculos.

Essas leituras não são apenas subjetivas, mas também podem estar no
núcleo de intensas disputas políticas.

Afinal, existiu holocausto na Segunda Guerra Mundial (1939-1945)?

Em 1964, houve um golpe ou uma revolução no Brasil?


O monumento deve ficar ou não de pé?

A lista é longa e inclui falsificações grosseiras, anacronismos e


negacionismos absurdos. Em suma, muitas questões do passado são
recuperadas no presente para instaurar ou legitimar relações de poder.

Como afirma o historiador Glaydson José da Silva:

Tem se procurado perceber na


historiografia sobre o mundo antigo,
hoje, que imagens e lógicas
históricas, em maior ou menor grau,
estão comprometidas com o
contemporâneo, o que consiste em
pensar não a história simplesmente,
mas suas próprias tradições
interpretativas.

(SILVA, 2007, p. 29)

Essa é uma chave importante para se entender como os povos antigos


se tornaram parte do passado nacional europeu, já que a ideia de
“Europa” não estava assim posta na Antiguidade.

Ainda que a noção de Europa tenha sua gênese na Idade Média, a


recuperação entusiástica do passado greco-romano acontece um pouco
mais tarde, já no Renascimento. Nessa mesma época, espanhóis e
portugueses exploravam as navegações de longo curso em busca de
rotas comerciais.
Apresentação aos reis católicos quando Colombo retornou da América.

No final do século XV, em outubro de 1492, Cristóvão Colombo atingiu a


região do Caribe. Seu Diário de bordo — cujo original se perdeu, só
restando uma transcrição feita pelo padre Las Casas — é um documento
que mostra como a Antiguidade esteve presente na forma como os
europeus interpretaram a “descoberta” das Américas. O navegador
genovês, apesar de sua educação considerada rudimentar, era leitor de
textos greco-romanos.

Saiba mais

Em Sevilla, na Espanha, alguns exemplares de sua biblioteca particular


foram conservados. Existe uma versão impressa em Veneza, em 1489,
da Naturalis historia, de Plínio, o Velho, naturalista romano que escreveu
por volta de 79 d.C. É bem provável que, por ser um ávido defensor da fé
cristã, Colombo conhecesse bem a Bíblia Sagrada. Sabe-se também, por
força de anotações, que ele leu um exemplar de Vidas paralelas, de
Plutarco.

Além de muitas analogias que Cristóvão Colombo fez e da concepção de


que o atual continente americano poderia ser o Éden na Terra, é bem
possível que um episódio particular seja explicado pela influência do
mundo greco-romano em suas leituras de mundo.

Em 4 de novembro de 1492, ele teria escrito em seu Diário que alguns


nativos temiam uma tribo bastante hostil que vivia nas proximidades.
Homens com apenas um olho e focinho de cachorro, eles devorariam os
inimigos e beberiam o sangue. Após 22 dias, essa tribo assustadora
voltou a ser mencionada, sendo agora chamada de Caniba ou Canima.

Representação da ação de Odisseu cegando o gigante Polifemo.

O enfrentamento, que teria acontecido dias depois, não envolveu


nenhum ser monstruoso.

Mas não deixa de ser curioso que um episódio similar, que também
relatava um gigante de um olho só com hábitos antropofágicos, seja
conhecido desde a Grécia Antiga:

O famoso caso do ciclope Polifemo.

A Odisseia é considerada, ao lado da Ilíada, a narrativa complexa mais


antiga do Ocidente. Composto oralmente entre os séculos IX e VIII a.C. e
atribuído ao poeta cego Homero, esse poema épico narra o retorno de
Odisseu (também conhecido como Ulisses) após a guerra de Tróia.

Vamos conhecer um pouco mais dessa história?

A Odisseia expand_more
Sua navegação pelo Mar Mediterrâneo durou uma década por
força de um acontecimento inusitado: em determinado momento,
quando estavam quase sem suprimentos, o herói e seus
companheiros aportaram em uma ilha tão próspera e fértil que
nem era preciso plantar para tudo dar: “Tudo cresce e dá fruto
sem se arar ou plantar o solo”.

Nessa ilha, porém, vivia um ser monstruoso, um gigante de um


olho só, que prendeu e devorou diversos companheiros de
Odisseu. Antes que todos morressem, o herói elaborou um plano
que lhes permitiu escapar após cegar o único olho do ciclope. O
gigante Polifemo, porém, era filho de Posêidon, deus dos mares, e
prometeu vingar a injúria ao filho, impedindo Odisseu de
reencontrar sua família.

Famosa desde a Antiguidade, essa história também é mencionada em


Naturalis historia. Como destacamos, sabe-se que Cristóvão Colombo
tinha um exemplar dessa obra.

Não é equivocado supor que esse encontro hostil com os nativos norte-
americanos tenha sido narrado com elementos tradicionais da história
de Odisseu, o herói navegador com quem o próprio Colombo quis se
associar. Ambos teriam enfrentado os perigos no mar e gigantes
antropofágicos para a defesa de uma causa maior:

Para Odisseu Para Colombo


close
Sobreviver e recuperar a Buscar ouro e espalhar
soberania de seu a fé cristã em nome do
palácio em Ítaca. rei e da rainha da
Espanha.
Nessa analogia com a literatura antiga usada por Colombo para atribuir
valor ao seu empreendimento e explicar o feito, os nativos ameríndios
ocupavam o lugar do monstro antropofágico duramente combatido.
Odisseu, aliás, também acumulou inúmeros tesouros ao longo de seu
périplo.

História e historiografia sobre a


história antiga
A história antiga que temos
Essa sequência de fatos ligados ao eurocentrismo produziu efeitos
estruturais no pensamento histórico. A própria forma com que dividimos
a longa duração, incluindo os currículos escolares, é oriunda de um
modelo quadripartite francês que separa a experiência humana em:

Idade Antiga
Idade Média
Idade Moderna
Idade Contemporânea
Na sequência assim ordenada, em que ponto “nossa” história, com
meros 500 anos, poderia estar alocada? Não tivemos Antiguidade ou
Idade Média? As populações que viviam no Brasil antes dos europeus
têm direito à história? Caso tenham, seria correto dizer que a “história
antiga do Brasil”, que eventualmente terminaria em 1500, teria ocorrido
enquanto a Europa atingia a Idade Moderna?
Qualquer tentativa de solução gera alguma defasagem,
pois essa forma de organizar o tempo, que se ajusta ao
passado europeu, foi assimilada por nós graças à
imensa simpatia que nossas elites coloniais
mantiveram com o Velho Continente.

A história antiga que queremos


Parece que chegamos a um beco sem saída.

Por um lado... Por outro lado...

Muitos entendem que A recusa em estudar


só estudamos história esses temas por eles
antiga no Brasil por serem eurocêntricos só
força da tradição close reforça o próprio
eurocêntrica. eurocentrismo, já que
essa “Europa” não
existia na Antiguidade.

A questão, porém, não envolve a simples decisão de “estudar ou não


estudar” o tema, como se isso fosse uma mera luta entre a ignorância
estratégica e o conhecimento pernicioso. Há boas razões para se
investigar a história antiga no Brasil.

A posição do GPS na hora de nosso nascimento não parece ser o melhor


critério para decidir o que vamos estudar, até porque gregos e romanos
foram tão europeus quanto latino-americanos! Como vimos, mesmo
para pensar os primeiros passos da construção de nosso “passado
nacional”, é preciso entender a influência exercida pela tradição clássica.

A segmentação quadripartite, há pouco mencionada,


cria a falsa impressão de que a mudança de período
histórico presume o desaparecimento completo das
culturas anteriores.

A Antiguidade não é um capítulo encerrado da história da humanidade,


seja pela influência que exerce em nossas concepções de mundo, seja
porque ela foi historicamente revisitada por força de relações de poder.

Por essas e outras razões, era bastante frequente, no círculo de


historiadores que estudam a Antiguidade em nosso país, a seguinte
frase:

No Brasil, aprende-se que


Adão foi o primeiro homem e
o segundo, Cabral.
(THEML; BUSTAMANTE, 2005, p. 9)

Afinal, a profunda valorização da história nacional fazia com que todos


os eventos anteriores ao século XVI fossem identificados como parte de
um passado que não nos dizia respeito. Mas ainda existem outros bons
motivos.

Um deles, também ligado aos usos do passado ou à recepção dos


clássicos, é que as sociedades antigas permanecem sendo um objeto de
interesse público. Quase toda semana algum acontecimento nos meios
noticiosos faz referência, direta ou indireta, ao passado dos povos
antigos.

Saiba mais
Em 2015, o termo “catilinárias” chamou a atenção do público por ter sido
usado pela Polícia Federal para designar a operação que levou à cadeia,
entre outros, o então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo
Cunha (MDB). Catilina, político romano de origem patrícia do século I
a.C., foi acusado pelo orador e cônsul romano Marco Túlio Cícero de
conspiração.

A lista de exemplos é vertiginosa na indústria cultural.

Encarte do filme Cleópatra (1963, Joseph L. Mankiewicz).

Seria impossível para nós enumerar todos os jogos eletrônicos e de


tabuleiro, as novelas históricas, os romances, as séries, os filmes, as
músicas, as peças de teatro, as óperas e tudo mais que não apenas
fazem referência ao mundo antigo, mas que também são ambientados
em passados distantes ou que envolvem alguma recriação
contemporânea.

Para que você entenda melhor, vamos citar um exemplo. Há, pelo menos,
200 filmes produzidos pelo cinema internacional apenas sobre
Cleópatra, rainha egípcia do século I a.C. conhecida, entre outras coisas,
por seu poder político.

Conhecer e saber refletir historicamente sobre o mundo antigo não


funciona apenas como erudição seletiva para apreciar produtos da dita
“cultura erudita” ou da cultura popular: também serve pra ler, interpretar e
refletir não sobre o que significam esses produtos, e sim sobre como eles
significam.

Muitos historiadores também optam por referendar a lógica do legado.


Em outras palavras, conviria estudar história antiga para entender, por
exemplo, por qual motivo falamos português, a última flor do Lácio,
como escreveu Olavo Bilac, fazendo referência ao latim, língua da qual a
nossa se desdobrou.

video_library
Última flor do Lácio
Neste vídeo, apresentaremos o poema Última flor do Lácio do poeta
Olavo Bilac.

O mesmo princípio é usado para recordar, por vezes insistentemente, que


a democracia, o teatro, os Jogos Olímpicos, a medicina e tudo mais que
parece próprio ao mundo dito “civilizado” teria sido inaugurado pelos
gregos. Não nos esqueçamos do Egito e da Mesopotâmia, igualmente
lembrados, inclusive por sobrevivências curiosas.

Máscara de teatro representando o tipo do Primeiro Escravo da Nova Comédia. Mármore


pentélico, século II a.C., do Portão Dipylon em Atenas.

O problema não é só a confusão frequente entre coincidência e


continuidade, mas também a ideia básica de que o conhecimento
histórico se destina a reconhecer a origem de fatos que, na prática, nem
precisam ser conhecidos para fazerem sentido:

Quem, afinal, precisa conhecer o teatro grego para apreciar


um espetáculo moderno?

A lógica do legado, muito utilizada em livros didáticos de história


voltados para a educação básica, é um bom incentivo para dar
visibilidade aos povos antigos, mas corre-se o risco de confundir
conhecimento com acúmulo de informações. Essa prática, se não for
bem cuidada, poderá levar até a confusões e equívocos.

Exemplo
A democracia, de fato, se consolidou na Atenas Clássica, mas ela é
bastante diferente das democracias dos séculos XX e XXI.
Dizer que a democracia nasceu em Atenas não resolverá muita coisa se
o debate terminar na mera informação. Essa talvez seja a melhor de
todas as razões que temos para se estudar a história antiga:

flag Produzir comparações.

flag Buscar respostas possíveis para dilemas e conflitos


do nosso tempo e observar contrastes.

flag Analisar formas de organizar a vida em sociedade e


tudo mais de que precisamos não apenas para
saber como mulheres e homens viveram no
passado, mas também para colocar nossa própria
vida em perspectiva.

Como dizia o professor Ciro Flamarion Cardoso (1998), são


“interessantíssimas experiências humanas” que não podem ser
ignoradas, tampouco tomadas como monopólio intelectual de um ou de
outro. O primeiro homem não foi Adão, assim como o segundo também
não era Cabral.

video_library
Pesquisando em história antiga
Neste vídeo, contaremos a história da Ilíada e como a história foi
investigada ao longo do tempo no Brasil.

Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

O passado é uma medida que interessa aos grupos de poder.


Dependendo de como se conta, o papel atribuído ganha um novo
sentido. Na história antiga que queremos, devemos considerar que

a história é um objeto de interesse público e faz


A parte da construção do imaginário de nossa
sociedade.

é preciso recuperar o passado da humanidade,


B
mostrando sua longa trajetória.

C
é necessário reconstruir o passado, contando a
absoluta verdade como ele era.

é preciso abandonar a história antiga; afinal, o Brasil


D
não a teve, e é só um movimento eurocentrista.

é necessário focar os grandes personagens, isto é,


E
figuras de relevo que formaram a humanidade.

Parabéns! A alternativa A está correta.

A história não é algo linear. Ela, na verdade, tem relação com os


observadores e suas construções de valores. Tampouco se trata da
construção de um grupo ou de um valor universal, e sim da
dinâmica de como a sociedade se reconhece.

Questão 2

O passado brasileiro, ainda que não tenha convivido de forma direta


com o que é chamado de história antiga, especialmente com o olhar
concentrado na Europa, teve importância em nossa organização e
nossas ideias, pois

a tradição portuguesa era marcada e influenciada


A
por valores desse passado.

a história antiga, sendo inscrita no tempo, também


B
existiu no Brasil.

C
a história da humanidade é única, estando sempre
voltada para as civilizações mais desenvolvidas.

a tradição histórica serve para que os cidadãos


D
sejam formados com os valores corretos.

a tradição religiosa brasileira precisa da história


E antiga para explicar o valor compartilhado em nossa
sociedade.

Parabéns! A alternativa A está correta.

Temos uma grande discussão sobre como o passado pode ser


usado. A grande questão é que precisamos notar a lógica em
diálogo com a sociedade, e não a construção e os seus maus usos.
Por isso, a única possibilidade é perceber a nossa dinâmica social.

2 - Vestígios e documentos
Ao final deste módulo, esperamos que você identifique documentos e vestígios investigáveis
em história antiga.

Em busca dos vestígios da história


O principal critério usado para distinguir o homem dos demais animais é
a capacidade de mobilizar a natureza em seu favor, ou seja, cultivar.
Essa é, como Terry Eagleton apontou, a mais antiga acepção da palavra
“cultura”: oriunda do latim culter, ela designa, entre outras coisas, a relha
de um arado (EAGLETON, 2005, p. 10).

Desse modo, uma das características mais imediatas da condição


humana é a habilidade de extrair elementos disponíveis no ambiente e
moldá-los para fazê-los assumir uma forma diferente da original.
Vejamos a seguir alguns exemplos:

Quando cortamos uma árvore e entalhamos a madeira para criar


uma ferramenta, produzimos cultura.

Quando fundimos o ferro e damos a ele a forma de uma faca,


produzimos cultura.

Quando lascamos uma pedra para que haja um encaixe perfeito


para construir uma habitação, produzimos cultura.

Muito do que se produz ao alterar a natureza se degrada mais


vagarosamente que a vida humana. Logo, o criador deixa para trás a
criatura, que pode ou não ser usada por outros sujeitos.

Vestígios da cidade perdida Angkor Wat, no Camboja.

Do ponto de vista da história antiga, podemos denominar vestígio tudo


aquilo que mulheres e homens produziram e que sobreviveram às
próprias vidas desses indivíduos. Palavra de origem latina, “vestígio” (em
latim vestigiu) pode ser entendido como sinônimo de rastro, pegada,
sinal, indício ou pista.

O vestígio é, portanto, a marca de uma existência: ele


afirma metafisicamente tanto a vida quanto a morte de
seu criador. Assim como deixaremos vestígios,
inúmeras sociedades, por mais remotas ou recentes
que sejam, também deixaram, provando que elas já
existiram em determinado tempo e espaço.

Seria impossível catalogar todos os vestígios que poderiam ser


encontrados. Eis alguns deles:

Ferramentas

Armas

Edifícios

Cerâmicas

Pinturas
Túmulos

Vestimentas

Textos escritos

Muitos desses vestígios são capazes de nos informar a respeito da vida


de quem os produziu. É justamente nesse ponto que se dá aquilo que
convém à história e que caracteriza o ofício do historiador:

Investigar, compreender, discutir e refletir, com base em


vestígios legados por indivíduos próximos ou distantes
no tempo, as características da vida em sociedade que
eles parecem exibir.

O vestígio comuta-se então naquilo que tradicionalmente designamos


como documento. A palavra, originária do latim documentu, é, por sua
vez, uma extensão do vocábulo docere, que significa “ensinar” ou
“mostrar”.

De modo bastante rudimentar, pode-se dizer que um documento


histórico é todo vestígio material capaz de fornecer ao analista indícios
sobre a experiência social de agrupamentos humanos. Nesse sentido,
todo documento é um vestígio, mas nem todo vestígio é um documento.

O documento é um vestígio potencialmente capaz de


“ensinar”.
Essa acepção, é claro, deixa muita coisa de fora.

Muitos historiadores analisam os resultados de exames osteológicos


feitos a partir de amostras de ossos escavados em espaços funerários.

Não parece razoável admitir que nós, seres humanos, a partir de nossos
corpos, devamos ser avaliados com as mesmas diretrizes utilizadas para
a análise de objetos ordinários, como joias ou latrinas.

Restos humanos mumificados, Nazca, Peru, América do Sul.

Apesar disso — e para o bem do argumento —, é preciso lembrar que a


maneira como enterramos nossos semelhantes costuma ser identificada
com uma das primeiras marcas de cultura. Os corpos, afinal, não valem
apenas por suas informações biológicas, e sim pela forma como foram
enterrados, a posição em que se encontram, o lugar escolhido, os objetos
ou as plantas colocados na sepultura e tudo aquilo que atribui um valor
simbólico a um fato óbvio e cotidiano como a morte.

Para o antropólogo José Carlos Rodrigues:

O enterro e outras formas de


se lidar com o corpo morto
são um meio de a
comunidade assegurar a seus
membros que o indivíduo
morto caminha na direção da
ocupação do seu lugar
determinado devidamente
sob controle.
(RODRIGUES, 2006, p. 95)

Como veremos neste texto, os enterramentos permitiram a sobrevivência


de inúmeros vestígios que se tornaram importantes documentos para a
investigação do passado dos povos da Antiguidade.

O papel de Atenas
A rica senhora ateniense
Quando lemos uma peça do teatro grego, certamente estamos diante de
um discurso autêntico. Os gregos antigos conheciam Medeia, Édipo,
Héracles, Alceste, Clitemnestra e outras famosas personagens que nos
ajudam a entender suas concepções de mundo e até aspectos da vida
cotidiana deles.

No entanto, muitos se ressentem pelo fato de que tais personagens não


foram exatamente de “carne e osso”. Mesmo sujeitos que existiram de
fato, sendo conhecidos por sua notabilidade, acabam assumindo certa
dimensão literária nesse translado da Antiguidade para o presente.

A regra não vale apenas para os gregos:

Nomes como Cleópatra, Otávio Augusto, Júlio César,


Ramsés II, Tutancâmon, Nabucodonosor II e tantos
outros acabam ressoando como personagens de uma
história distante, e não como gente que sangra como
nós.

Raramente, aliás, conhecemos seus locais de enterramento. O mesmo


não se pode dizer quando arqueólogos identificam e escavam uma
sepultura.
Novas informações trazem outros problemas e perguntas. É o caso de
uma sepultura famosa descoberta no Cerâmico, bairro que abrigava uma
conhecida necrópole no subúrbio de Atenas.

Tumba H16:6: buraco com uma urna e oferendas como encontradas.

Os debates ficaram muito concentrados em um artefato particular: a


ânfora de estilo geométrico que guardava os restos mortais. Em 1932,
ano em que os trabalhos foram suspensos, uma região demarcada ficou
por ser explorada.

Os arqueólogos, sob a supervisão de Gerald V. Lalonde, se concentraram


em analisar precisamente esse espaço. Foi descoberta nele uma tumba
de aproximadamente 850 a.C. onde estava enterrada uma mulher.

O enterramento era bem mais luxuoso que a média, incluindo joias de


ouro, marfim, faianças egípcias e outros objetos que mostravam o
apreço por bens importados.

Os trabalhos foram suspensos


As escavações foram retomadas em 1967 após longos anos de
interrupção.

Ânfora em estilo geométrico encontrada na tumba e que continha os restos mortais


analisados.

O cadáver da tumba H16:6 ficou conhecido como A rich athenian lady,


ou seja, como pertencente a uma rica senhora ateniense.

Os primeiros exames mostraram que nenhum grânulo de terra foi


identificado junto aos restos mortais. Sabe-se, assim, que nenhum objeto
contaminou o material e que nada foi alocado posteriormente.

Além disso, acreditava-se que a ânfora da imagem ao lado possuía um


formato usado apenas por homens, fato bastante curioso que exigiu a
revisão de algumas interpretações tradicionais.
Os ossos encontrados nessa cerâmica foram analisados por J. Lawrence
Angel em setembro do mesmo ano. O único material de origem humana
então encontrado foi o da própria mulher. Os demais ossos pertenciam a
animais carbonizados, os quais, pela estimativa, garantiram
aproximadamente 70kg de carne para a festa fúnebre que precedeu o
enterramento.

Na época de Lawrence, os estudos priorizavam a análise tipológica do


crânio; assim, outros materiais biológicos não foram sequer
examinados. Estudos mais recentes garantiram informações adicionais
e, atualmente, temos os seguintes dados:

arrow_forward_ios Essa mulher tinha aproximadamente 70kg.

arrow_forward_ios Ela tinha 1,55m de altura.

arrow_forward_ios Ela tinha cerca de 35 anos na época da morte.

arrow_forward_ios Foram necessários mais ou menos 120kg de


madeira para cremá-la.

Não foram encontrados indícios de que ela tivesse tido doenças, traumas
ou hipertrofia muscular significativa. Descobriu-se ainda que alguns
ossos não pertenciam a ela nem a qualquer animal encontrado.

No estudo inicial, diante das dúvidas, os analistas optaram pela hipótese


de esses ossos serem de um animal impossível de identificar. Um
fragmento do fêmur e uma porção da pélvis, no entanto, ajudaram a
sanar a dúvida. Eles são estruturas ósseas necessárias para a
locomoção bípede — razão pela qual só poderiam pertencer a um ser
humano — e que, pelo tamanho, eram de uma pessoa de até 36 semanas
de idade.

Demais evidências mostraram que não se tratava de um bebê natimorto.


A rica senhora ateniense estava grávida quando morreu, e não faltavam
mais do que oito semanas para o fim da gestação. Tais informações
foram encontradas pelo fato de o corpo da mulher ter protegido
relativamente os ossos do bebê do fogo da pira fúnebre.

A análise osteológica obteve, no entanto, uma leitura diferente. A


ausência de lesões visíveis torna a causa mortis impossível de
identificar. No entanto, as gravidezes nessa idade tornavam o parto mais
arriscado no mundo antigo, o que pode ter gerado ou agravado as
condições para a morte prematura da mãe e do bebê.

A ausência de marcas degenerativas, baixa hipertrofia muscular, hérnias


de disco não identificadas e artroses pouco avançadas sugerem que ela
era uma mulher das classes mais abastadas.

Como as tumbas do período são bem menos ricas, é possível que fosse
esposa de um rei, sacerdote ou algum sujeito rico e influente para
garantir um fausto banquete para honrar a esposa e seus filhos tão
aguardados (afinal, as gestações costumavam acontecer antes mesmo
dos 18 anos).

Até mesmo a avaliação do crânio, feita com recursos que Lawrence não
dispunha, permitiu a reconstrução facial dessa rica senhora ateniense
por meio de técnicas de desenho forense.

A aparência dela não devia ser muito diferente da proposta na imagem.

Reconstrução facial da rica mulher ateniense feita com técnicas forenses. Desenho de Graham
Houston, 2001.

Essa reconstrução facial não é um vestígio produzido por alguém da


Antiguidade.

Os documentos para o estudo da Antiguidade


Outro exemplo famoso vem Pompeia. Em 79 d.C., o vulcão Vesúvio
entrou em erupção e soterrou a cidade.

O Monte Vesúvio e ruínas da antiga cidade de Pompeia.

As pessoas e os animais que morreram foram cobertos pelas cinzas e


pedra-pomes. O material biológico se desfez com o calor ou se
decompôs com o tempo, mas os formatos de mais de mil corpos foram
preservados, criando uma espécie de molde.

O arqueólogo Giuseppe Fiorelli desenvolveu um método bastante


conhecido: ele passou a injetar gesso nessas “fôrmas”. Muitos corpos
ficaram em posições bastante estranhas, pois se contorceram com o
calor de mais de 260°C.

De todo modo, esses moldes (atualmente feitos com uma resina)


mostram a posição em que as pessoas se encontravam no momento da
morte. Até mesmo algumas expressões faciais foram reconstruídas.

Moldes em gesso de vítimas do vulcão Vesúvio, em Pompeia (79 a.C.).

O desenho forense da rica senhora ateniense e os moldes humanos em


gesso ou resina produzidos a partir das cinzas do Vesúvio não são
vestígios da Antiguidade, mas não deixam de ser recursos para que
possamos interpretar o passado dos povos antigos.

O mesmo princípio seria aplicável aos textos escritos. Pouquíssimos


documentos literários do mundo greco-romano chegaram até nós
diretamente.

Exemplo
Hieróglifos egípcios presentes em tumbas ou tabletes de escrita
cuneiforme oriundos da Mesopotâmia são inequivocamente originais —
milhares, aliás, seguem esperando tradução.

Em situação diversa — e também a título de exemplo —, diversas


tragédias gregas ou diálogos de oradores romanos só sobreviveram por
meio de copistas medievais, os quais, por sua vez, também não devem
ter tido contato com o documento “original”. Aliás, as próprias traduções
para línguas modernas também representam uma intervenção:

O livro de Eurípides que sacamos da prateleira de uma


livraria nunca foi sequer um “livro” na Antiguidade,
quanto mais reproduzido aos montes em língua
portuguesa.

Se levarmos essa lógica até as últimas consequências, veremos que


mesmo as fotografias de documentos disponibilizadas em sites de
museus são apenas cópias digitais de um objeto retirado de seu lugar de
origem e destituído de sua função para se tornar uma relíquia que excita
nossa curiosidade intelectual.

Todas essas questões, às quais outras tantas poderiam ser somadas,


são suficientes para mostrar como a definição de uma documentação
histórica pode ser complexa. As mudanças conceituais e técnicas são
capazes de produzir não apenas novos documentos (e novas definições,
por correspondência), mas também chegar a conclusões diferentes e
gerar outras perguntas.

Em suma, o documento isoladamente não diz nada: ele


precisa ser provocado e analisado.

Saber provocar o documento, lançar perguntas e reconhecer suas


especificidades são tarefas fascinantes, mantendo a história não apenas
viva, mas também em permanente transformação.
Caminhos do investigar
Saber provocar
Muitos já o fizeram, mas é realmente difícil evitar o clichê que compara o
ofício do historiador com os trabalhos de um detetive. Ambos, por assim
dizer, buscam entender fatos já acontecidos por meio de um esforço
cauteloso de investigação. Não conseguimos fugir sequer das
coincidências vocabulares: vestígio, documento, evidência, pesquisa,
entrevista, testemunho, hipótese, método e por aí vai.

Há, no entanto, uma diferença fundamental:

search auto_stories
O detetive O historiador

Está interessado no close Está preocupado com


reconhecimento preciso os fatos e
dos fatos para principalmente com
desvendar uma trama. seus sentidos.

Para facilitar nosso entendimento, consideraremos a analogia do


detetive.

Imagine-se diante de um escritório que foi assaltado. O ladrão deixou


dois vestígios:

Vestígio I
Uma marca de sapato no tapete macio que decorava a sala.
Vestígio II
A tampa de uma caneta Montblanc que ele acidentalmente deixou
cair durante a fuga.

Apenas com esses dois indícios, o detetive consegue descartar algumas


possibilidades. Pelas características da pegada, sabe-se de antemão que
o calçado pertencia a um homem alto e pesado tanto pelo comprimento
da marca como pela pressão que a pisada exerceu sobre o tapete.

Ainda que os sinais do solado fossem fragmentários, percebia-se que era


um sapato social pouco desgastado, indicativo de riqueza reforçado pela
tampa da caríssima caneta Montblanc que o dono do escritório sabia
não ser sua. Salvo a hipótese de terem forjado essas pistas, sabe-se a
princípio que é mais provável que o ladrão seja um homem rico da
empresa ou de fora, e não as mulheres que ocupam postos de direção ou
empregados da limpeza.

Essa sequência de deduções, simples na sua aparência, é muito mais


refinada do que podemos imaginar. Vejamos a seguir a linha de
raciocínio para se chegar nas conclusões anteriores:

Análise do sapato expand_more

Para reconhecer o sapato, foi preciso conhecer razoavelmente o


universo de calçados disponíveis.

Só assim foi possível saber que não se tratava de uma sandália,


de um salto alto ou do tênis que compõe o uniforme dos
funcionários. Aquela pegada fez sentido pelo que era, mas só o
fez por sabermos o que ela não era.

Análise do tapete expand_more


Da mesma forma, foi preciso reconhecer e testar o impacto que
algumas pisadas faziam no tapete, mensurando desde a
profundidade até o tipo de deformação provocada no tecido. Foi
assim que se deduziu que ela era de uma pessoa pesada, já que
adultos com até 80kg produziram nela deformações bem menos
visíveis.

Análise da caneta expand_more

Por fim, foi preciso saber que a Montblanc é uma marca cara e,
portanto, inacessível a pessoas mais pobres. Uma pesquisa
simples permitiu identificar que aquela tampa pertencia a uma
caneta com edição limitada no valor de R$21 mil.

Com uma lista dos compradores da caneta Montblanc — decerto poucos


—, já seria possível identificar o provável criminoso, mas a empresa
certamente não a forneceria. O caminho da investigação foi descobrir
que homem alto e rico o suficiente para andar com essa caneta esteve
no prédio no dia do assalto.

Para isso, pôde-se recorrer ao controle de entradas da portaria, às


entrevistas com funcionários e às imagens das câmeras de vídeo. Os
erros cometidos pelo ladrão inexperiente — identificado posteriormente
como um concorrente da empresa — só foram reconhecidos pelo fato de
o detetive ter considerado uma série de variáveis e ter feito uso de alguns
métodos.

Vejamos a seguir os métodos utilizados pelo detetive:


No caso do calçado...
Ele considerou, não um vestígio deixado pelo criminoso, e sim a fôrma
que o sapato produziu ao tensionar o tapete.

No caso da tampa da caneta...


Ele soube que se tratava de alguém abastado pelo valor do objeto
material importado.

Observando apenas o princípio investigativo, é tentador associar a


pegada no tapete aos moldes humanos de Pompeia e a tampa da
Montblanc às faianças egípcias da rica senhora ateniense, mas não é
sobre isso.

Trata-se, na verdade, de:

arrow_forward_ios Conhecer as sociedades antigas.

arrow_forward_ios Investigar sua cultura material.

arrow_forward_ios Consultar os registros.


arrow_forward_ios Ambientar-se com as linguagens.

Significa, enfim, pesquisar a história dos povos antigos para que um


artefato ordinário não seja entendido como um objeto religioso, da
mesma forma que seria terrível para a investigação confundir a
Montblanc com uma caneta esferográfica comum.

Para encerrar a analogia, por mais que todos os indícios tenham sido
considerados, a confirmação do suspeito não se deu apenas pelas
características dos objetos encontrados, mas também por entrevistas,
imagens de vídeos e listas de ingressantes documentadas na portaria.

Variar a documentação, portanto, é uma boa prática


para atingir conclusões mais interessantes.

Aqui certamente terminariam as comparações se o trabalho do detetive e


do historiador fossem, de fato, idênticos. Contratado para descobrir o
culpado, aquele profissional teria dado por encerrada sua investigação.
O historiador, pelo contrário, recolheria todos esses dados para iniciar —
quem sabe? — uma pesquisa sobre a espionagem corporativa e as
dinâmicas do capitalismo financeiro do século XXI.

O documento não é o princípio, tampouco o fim do trabalho do


historiador. Na verdade, ele constitui uma parte importantíssima que
merece nossa atenção e que caminha ao lado de nossas preocupações.

video_library
O uso e abuso da história antiga
Neste vídeo, faremos um debate sobre o mal uso da documentação e os
desafios e possibilidades no século XXI.

O epínetro de Erétria
Vamos permanecer em Atenas, mas cerca de 420 anos após a morte da
rica senhora. Enquanto ela permanecia enterrada para ser descoberta
somente pelos arqueólogos do século XX, muitas coisas aconteciam na
superfície da cidade.

Imagem de Péricles discursando no final do primeiro ano da Guerra do Peloponeso em Atenas.

Em seu passado recente, essa cidade tinha se estabelecido como uma


das pólis mais poderosas da Grécia Antiga, sobretudo por sua
participação na vitória contra os persas, pela poderosa frota que
garantia sua hegemonia no Mar Egeu e pela enorme campanha política
que fez para louvar os próprios méritos. Naquele momento, no entanto,
ela estava envolvida na Guerra do Peloponeso e vivia uma epidemia que
dizimava seus cidadãos.

Epínetro do Pintor de Erétria, de aproximadamente 425 a.C., com a temática de cena de


casamento em figuras vermelhas.

Em 438 a.C., o tragediógrafo Eurípides encenava em um festival de verão


sua conhecida Alceste, peça de teatro tantas vezes adaptada ao longo
dos séculos.

Oito anos depois (ou um pouco mais), entre 430 e 425 a.C., um oleiro
produzia uma peça de cerâmica conhecida como Epínetro de Erétria
(THEML, 2000), que também representava, por meio de imagens, a
história de Alceste.

Vejamos a imagem anterior com mais detalhe:

Foto ampliada.

Eurípides não inventou a história, mas é bem possível que tenha dado
um grande incentivo para aumentar sua popularidade.

Vamos entender um pouco mais sobre a peça de teatro Alceste!

Alceste expand_more

A peça encenada no Teatro de Dionísio, em 438 a.C., narra o


destino do rei tebano Admeto, condenado a morrer caso alguém
não se dispusesse a ir em seu lugar.

Todos recusaram a troca, incluindo seu pai. A única que aceitou


dar a vida por ele foi sua recatada esposa, Alceste, que temia
deixar seus filhos órfãos e viver viúva. O destino se cumpre, e a
protagonista morre.

Pouco depois, Héracles chega ao palácio de Tebas e é recebido


como hóspede por Admeto. Sem saber do luto, bebe e come em
demasia no banquete. Quando é advertido acerca da morte da
rainha, ele faz a catábasis (descida) ao Hades e resgata Alceste,
que permanece sob um véu negro e calada por três dias. Ambos
eram necessários para se purificar da mácula do mundo dos
mortos.

Quem conhece um pouquinho a fama dos homens atenienses já deve ter


entendido o motivo da popularidade. Em uma sociedade marcada por
discursos masculinos bastante prescritivos em relação ao
comportamento feminino, é compreensível que essa história tenha sido
acolhida com tanto entusiasmo.

As virtudes de Alceste eram imensas do ponto de vista masculino:

Esposa dedicada
Ela aceitava sofrer por seu marido e era a melhor das esposas, gloriosa,
dedicada, devotada e corajosa, sabendo ainda ter uma morte honrada.

Boa mãe
Ela também era uma mãe preocupada e atenta observadora das
necessidades do oîkos, ou seja, do espaço doméstico.

Alceste era, portanto, um ideal de mulher segundo as aspirações


masculinas. É bem possível que algum marido, ansioso por elogiar sua
esposa ou aspirando ensiná-la a se comportar da forma que julgava
correta, tenha encomendado essa curiosa cerâmica para que Alceste
servisse de inspiração à sua amada.

Curiosidade
O que torna esse documento ainda mais interessante é o fato de que
aquela parte superior áspera, em forma de escama de peixe, servia para
cardar o fio de lã para a tecelagem, atribuição tradicional dada às
esposas dos atenienses. A forma de telha servia para que a cerâmica
ficasse bem ajustada à coxa da mulher, que a utilizaria sentada para ir
aprimorando o fio.

Como era um trabalho lento, é possível que a dona original dessa peça
tenha ficado horas sentada diante dessa imagem de Alceste, que, de
alguma forma, a fazia lembrar o tempo inteiro que tipo de esposa ela
deveria ser: a que dá a vida em favor de seu marido.

Mas essa não parece ser a pergunta mais interessante. Hoje em dia, por
força da historiografia vinculada a questões feministas, os debates
acerca das relações de gênero se tornaram necessários e inescapáveis.
Não há dúvidas de que a imagem sugere um esforço pedagógico do
provável marido que a presenteou com o epínetro para ajustar a esposa
à ideologia masculina. No entanto, se ela se comportasse como
esperado pelos homens, para que insistir tanto nesse discurso?

Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

Sobre que vestígios atuar? Como definir o que é importante para


história e o que não é? Ao estudar história antiga, somos
convidados a perceber que

A o passado de nossa civilização é o que importa.

B o valor do objeto é construído.

C temos de buscar nossas origens.

D o valor está em quem escreve a história.

Atenas e a senhora ateniense são o berço da


E
sociedade.

Parabéns! A alternativa B está correta.


A provocação é se você entendeu o que é o objeto da história, como
o discurso é trabalhado e o passado, um valor social. Se percebeu
isso, o estudo atendeu a seu papel.

Questão 2

A história grega é um exercício de construir a sua história, enquanto


nossa fragilidade é acreditar. Quando vemos a construção de
Eurípedes sobre a história de Alceste, podemos acreditar no que o
autor diz ou construir um debate sobre

a idealização do comportamento feminino e como o


A
homem é “herói” em relação a esse comportamento.

B as concepções de inferno da sociedade ateniense.

como Alceste esperou o retorno de seu amor até a


C morte, mostrando o padrão de comportamento
feminino.

o fato de reconhecer como mal absoluto por conta


D
da volúpia e do controle necessário.

como mostra o ideal masculino com a grande herói,


E
Alceste.

Parabéns! A alternativa A está correta.


A leitura vai perceber que Alceste é a esposa sacrificada que aceita
trocar de lugar com seu marido, mesmo que se condene à morte. O
sujeito, bêbado, ainda que provoque seu resgate, não deixa de
apontar a inconsequência de, como mulher, ter abandonado seu
papel de esposa e mãe. Por isso, mantém o tom crítico, dando pistas
de como uma mulher é vista na sociedade ateniense.

3 - Pesquisa em história antiga: a escrita


Ao final deste módulo, esperamos que você identifique documentos referentes à história
antiga.

A leitura dos documentos


Ler os povos antigos
O detetive que encontra dois vestígios em uma investigação já sabe, de
antemão, que cada um deles exigirá um tratamento diferente. Uma
pegada, por exemplo, precisa ser fotografada e bem registrada dada a
sua natureza efêmera. Uma tampa de caneta deixada por equívoco pelo
ladrão, por sua vez, pode ser recolhida e analisada em laboratório.

Da mesma forma, os historiadores precisam levar em


consideração que os documentos e suas linguagens
devem ser respeitados em suas especificidades.

Uma moeda que circulava de mão em mão comunicava sua mensagem


de forma diferente de uma poesia oral, que só podia ser conhecida caso
o poeta estivesse performando diante de seu público.

Por muito tempo, a historiografia considerou que apenas textos escritos


eram documentos históricos. O valor de verdade associado à escrita faz
parte de nossa tradição, embora um analista experiente bem saiba que o
“papel aceita qualquer coisa” e que o escrito deve ser observado com
igual desconfiança.

Apesar disso, os documentos literários foram não apenas


exaustivamente examinados, mas também investidos de tal valor que se
tornaram uma medida referencial para a própria noção de
documentação histórica. As historiografias das últimas décadas,
entretanto, mostraram a importância de se dilatar essa restrição.

Além da análise de fontes literárias, que permanece vívida e em boa


forma, muitos saberes estabelecem um diálogo para enriquecer nossas
interpretações acerca da vida em sociedade no mundo antigo.

A ideia de que a história antiga é um terreno de


escassez documental já não tem tanta popularidade,
ainda que o volume absoluto de informações, por
razões óbvias, seja pequeno se comparado ao de
outros períodos históricos.

O trabalho do analista não se resume a tratar as informações da


Antiguidade e traduzi-las para que elas façam sentido ao leitor
contemporâneo. Mas essa distância intransponível, longe de ser um
problema, é parte constitutiva do próprio exercício histórico. É a partir
dela que somos capazes de estabelecer relações e nos permitir
surpreender com algumas semelhanças e diferenças nas experiências de
vida em sociedade.

Diversidade dos usos da escrita


A diversidade de usos
Basicamente a serviço das administrações palacianas, a escrita passou
a conhecer novos usos. Na própria Ilíada (Canto VI, p. 168-170),
atualmente situada no século VIII a.C. pela maioria dos especialistas,
existe a menção a um uso diferente dela: em famoso diálogo com
Diomedes, o adversário Glauco menciona uma mensagem escrita em
tabuinhas com símbolos funestos decidindo a morte de um personagem
da história que narrava.

Na Grécia Antiga, sua língua escrita, que constou no currículo de muitas


escolas do Brasil e do mundo, curiosamente não tinha para os gregos
antigos o valor que julgamos — pelo menos se for considerada a ênfase
dada a ela por muitas décadas nesses sistemas educacionais.

Ainda que sua língua tenha sido inventada por volta do


século VIII a.C. a partir do alfabeto fenício, as pólis
gregas foram sociedades de cultura oral; em boa parte
do tempo, a escrita era usada a serviço da fala, ou seja,
como recurso para a posterior oralização.

A própria noção de inteligência e sabedoria que comumente se associa a


sujeitos letrados em sociedades escassamente alfabetizadas não parece
ser razoável: a oratória, isto é, saber falar bem em público, era um sinal
de distinção social muito mais valorizado.
Como lembra Rosalind Thomas (2005, p. 44), “Sócrates conduzia suas
pesquisas filosóficas por meio de conversas e debates, e nada escreveu”.
Já Platão, seu discípulo, “atacou a palavra escrita como um meio
inadequado para a verdadeira educação e a filosofia: é possível que ele
tenha publicado sua obra em forma de diálogo com o intuito de recriar a
atmosfera do discurso e do debate orais”.

Estátua do antigo filósofo grego Platão em Atenas.

Essa percepção fez um autor especializado no tema, Eric Havelock,


revisar o título que deu a um de seus principais trabalhos: A revolução da
escrita na Grécia e suas consequências culturais. A escrita, afinal, não
promoveu uma revolução na Grécia Antiga. Não obstante, seria falso
sugerir que ela não teve um lugar de importância.

Leis permanentes, comuns a todos sem depender da palavra de


determinado governante, ganham força com a escrita pública em
tabuletas de pedra ou mesmo de madeira, como fez o legislador Sólon
em 594 a.C. A seguir veremos outras maneiras inusitadas do uso da
escrita:

Óstrakon expand_more

Um uso bastante inusitado da escrita pode ser encontrado em


Atenas, no período clássico (século V a IV a.C.), com o
ostracismo (prática em que os cidadãos votavam para exilar por
10 anos alguém que tivesse atentado contra a cidade), que era
assim chamado por causa do óstrakon, um pedaço de cerâmica
no qual se escrevia o nome do sujeito em julgamento político.

Óstraco com o nome de Címon, estadista ateniense condenado ao exílio (486 ou 461
a.C.). Ancient Agora Museum in Athens.

Katádesmoi expand_more
Outro uso bastante inusitado da escrita no período clássico de
Atenas é atestado pelos chamados katádesmoi, pequenas
lâminas de chumbo utilizadas para fazer imprecações.
Depositadas em frestas nas paredes das casas dos inimigos ou
em corpos enterrados nos cemitérios, esse expediente buscava
causar mal ao adversário por meio de fórmulas mágicas escritas.

Instrumento associado a “feitiçaria" ou um diálogo com Hecate, da família de


grandes feiticeiras como Circe e Medeia, em que os homens buscavam seus serviços
contra seus inimigos.

Defixiones expand_more

O método katádesmoi também era empregado no Império


Romano. Os defixiones eram igualmente endereçados a
divindades do submundo ou almas proscritas (ladrões, suicidas
etc.) para que interviessem e atuassem conforme o responsável
pela maldição esperava.

A imagem a seguir apresenta uma placa de chumbo, encontrada


na região da atual Inglaterra durante o período romano (século II
d.C.), na qual se lê um texto bastante esclarecedor: "Amaldiçoo
Tretia Maria e sua vida, mente, memória, fígado e pulmões
misturados, e suas palavras, pensamentos e memória; assim, ela
será incapaz de falar das coisas que estão escondidas, nem será
capaz ... nem ...". Nota-se inclusive que o defixio tem sete
perfurações, tática usada para aumentar o poder do feitiço.

Defixio localizado na Inglaterra com maldição dirigida a Tretia Maria. Século II d.C.
Acervo do Museu Britânico.
Romanos e a identidade pela escrita
A desconfiança que os gregos nutriram por séculos em relação à escrita
não teve o mesmo eco em Roma. Seria equivocado, contudo, imaginar
os romanos como uma sociedade que dependesse em última instância
do saber escrito.

Famoso filósofo e político, Marco Túlio Cícero seguiu sua vida pública
(cursus honorum) com uma oratória fina e bem-posta. A maioria dos
cidadãos do Império, na cidade e no campo, era iletrada, mas isso não
lhes gerava grande dificuldade.

Fachada da Biblioteca de Celso após reconstrução em 1978.

No entanto, os usos da escrita em Roma foram bem mais expressivos. A


existência de bibliotecas públicas é um indicativo disso, sobretudo
porque elas foram construídas não apenas na capital.

A Biblioteca de Celso, por exemplo, foi erigida em Éfeso no século II d.C.


O monumento era uma homenagem ao senador Tibério Júlio Celso
Polemeano, que fora governador daquela província.

Construída para armazenar 12 mil rolos de papiro, ela foi financiada com
recursos do próprio Celso, que também foi sepultado no local.

Um incêndio ocorrido durante um terremoto no ano de 262 destruiu o


prédio e seu interior. Suas ruínas, situadas em território turco, recebem a
atenção de milhares de turistas todos os anos. O edifício foi
representado inclusive na nota turca de 20 milhões que circulou entre
2001 e 2005, apresentada na imagem adiante.

Reprodução do verso da nota turca que circulou entre 2001 e 2005 com a imagem da Biblioteca
de Celso.

Roma também é muito lembrada pela grande quantidade de inscrições


públicas. Algumas, de caráter monumental, se tornaram notabilizadas
por sua tipografia usada para divulgar decretos oficiais e celebrações
diversas e para louvar méritos particulares, sobretudo de imperadores.
Veremos a seguir um exemplo:

A coluna de Trajano expand_more

A coluna de Trajano, construída sob as ordens do imperador


homônimo e concluída em 114, se trata de uma referência
interessante. Erguida para celebrar as vitórias militares contra os
dácios, ela possui 38 metros de altura e é rodeada por cenas em
baixo relevo que narram o brutal extermínio dos adversários.

Em sua base, contudo, destaca-se uma inscrição, lembrada, entre


outros aspectos, por ser um dos exemplares de letra romana mais
recordados pelos tipógrafos contemporâneos.

A coluna de Trajano à esquerda e inscrição na coluna com exemplo das letras que se
desdobraram na família romana das tipografias modernas à direita.

Observando a inscrição na colunada de Trajano podemos perceber o


contraste de escrita entre as hastes e as serifas triangulares das
maiúsculas. Isso permanece muito popular, especialmente na área
editorial. A fonte Times New Roman, criada em 1931 para o jornal inglês
The times, é a fonte mais utilizada ao redor do mundo e recebe esse
nome por ser uma leitura da tipografia clássica da Roma Antiga.

As inscrições públicas de Roma não eram apenas monumentais. Muitas


pessoas, inclusive aquelas escravizadas, registravam nas paredes das
ruas fatos comuns a todos nós, típicos da vida cotidiana.

Saiba mais
As inscrições nas paredes são chamadas de grafites justamente em
função do instrumento usado na escrita da época, o graphium, que
possuía uma ponta dura que permitia o desenho das formas desejadas.
A escrita traçada nas paredes (graphio inscripta) era muito mais comum
do que os vestígios que sobreviveram podem sugerir: além de efêmeras,
as paredes não costumam permanecer intocadas por séculos.

Em Roma, existiram até os chamados dealbatores, trabalhadores


dedicados a limpar as paredes, a fim de que, como ocorre até hoje em
dia, quaisquer informações indesejadas cedessem espaço a anúncio de
produtos, campanhas eleitorais etc.

Em Pompeia, graças à erupção do Vesúvio, muitas paredes


permaneceram de pé, assim como diversos grafites seguiram
preservados. Com eles, somos levados a conhecer muitas questões da
vida comum, com as pessoas envolvidas em relações sociais por vezes
bastante íntimas.

Uma história de muitas imagens


No caso egípcio, segundo o argumento apresentado, seria impossível
separar os textos escritos das imagens. Tomado em sentido radical, esse
princípio poderia ser ampliado para além do Egito, embora seja
necessário considerar que são linguagens diferentes e que, por isso,
comunicam de modos distintos.

Escrita egípcia.

Essa lógica também pode ser observada nos dias atuais: há questões
que comunicam de forma muito mais eficiente por imagem do que por
texto. Por exemplo, a fotografia de uma criança com fome não comunica
a mensagem da mesma forma que um discurso escrito o faria por mais
minucioso e detalhista que ele fosse.

Não se trata de a imagem ser suporte do texto e vice-versa. Na verdade,


ambas atuam de forma conjunta para produzir o efeito discursivo
almejado. O desejo de ofender alguém por meio de inscrições parietais
poderia exigir esse duplo recurso.
Exemplo
Foi o caso do autor de um grafite que desenhou um homem se
masturbando. Como o desenho não era suficientemente alusivo, ele
optou por nomear o representado com a inscrição Felicio tomintare, isto
é, “Felício masturba-se”.

Os historiadores da Antiguidade frequentemente oscilavam entre a


sensação de se sentirem muito parecidos ou muito diferentes dos povos
antigos, atuando em um jogo de alteridade e comparação próprio das
ciências humanas e sociais. Grafites com mensagens e imagens
parecidas com a que o pompeiano escreveu sobre Felício no século I d.C.
podem ser facilmente encontrados em ruas das cidades e prédios
públicos atuais, principalmente em portas de banheiros.

Ainda que nenhum documento seja “transparente”, ou seja, óbvio em


relação à maneira como ele significa, alguns geram mais dificuldades
precisamente porque apresentam visões de mundo e contextos sociais
muito diferentes dos nossos.

A sensação de que somos muito diferentes dos povos


antigos pode, aliás, ser tão enganadora quanto a de que
somos semelhantes.

Desconfiar de nossas visões de mundo é sempre uma boa decisão,


sobretudo quando estudamos documentos da vida material e discursos
imagéticos. Afinal, a imagem de um falo associado à felicidade não é
tão absurda como seria para os antigos um símbolo óbvio para nós,
como o famoso triângulo amarelo com um raio em seu interior que alerta
para o risco de um choque elétrico, por exemplo.

O discurso imagético, assim como as palavras isoladas de seu cenário


de enunciação, pode ser pobre do ponto de vista conceitual tanto
atualmente quanto o era na Antiguidade. O desenho de uma caveira nos
informará muito pouco se não soubermos o local onde ele foi colocado
ou se ele não estiver associado a outro símbolo, como é o caso do
triângulo com raio.
A tradição que valorizou fontes literárias fez com que desenvolvêssemos
mais versatilidade na leitura de textos escritos do que na de imagens.
Parte desse problema se verifica no uso muitas vezes inocente de figuras
em livros e artigos com mera função estética, ilustrações que não são
analisadas como documentação e que, por vezes, nem fazem referência
clara ao texto.

Exemplo de imagem meramente ilustrativa.

Além disso, somos inclinados a reconhecer a imagem a partir do


paradigma fotográfico, ignorando se tratar de um esforço técnico e
intelectual que exigiu conhecimento, reflexão, criatividade e sobretudo
escolha. Mesmo a fotografia, diferentemente do que muita gente pensa,
não significa o “congelamento” da realidade: o fotógrafo observa a luz,
define o ângulo e escolhe a câmera, determinando o que será retratado
em detrimento de outras tantas possibilidades disponíveis a seu redor.

Imagem é discurso — e nenhum discurso é ingênuo.

As sociedades antigas eram bastante expressivas visualmente. Em


nossos dias, é fácil produzir imagens, já que dispomos de câmeras,
tintas variadas, ferramentas e recursos tecnológicos diversos, inclusive
os digitais.

Na Antiguidade, isso não era um trabalho simples. Por esse motivo, a


grande quantidade de imagens que sobreviveu ao fim daquela era
testemunha como os povos desse período investiam nas narrativas
iconográficas.

Os imperadores romanos também estavam conscientes do valor político


das imagens. As moedas foram vistas como um excelente suporte para
as representações que exaltavam as virtudes do retratado,
principalmente porque passavam de mão em mão e ainda era possível,
por assim dizer, “segmentar a audiência”.

Exemplo
Um áureo, moeda com grande quantidade de ouro no século I a.C., não
chegava às mesmas mãos que faziam circular os denários de prata pela
cidade latina.

Como lembra Paulo Martins (2011, p. 54), Roma vivia em 49 a.C. uma
grave crise econômica provocada pelas guerras civis. Para intervir no
problema, o então imperador Júlio César iniciou uma reforma monetária
que visava restringir o entesouramento do dinheiro, aumentando a
circulação de moedas.

Em 44 a.C., começaram a circular moedas com sua efígie laureada


(símbolo de vitória) e inscrições, por exemplo, CAESAR IMPER[ATOR],
como se lê no exemplar adiante. No anverso, havia uma representação
da deusa Vênus — da qual a gens Iulia, a família de César, alegava
descender — a carregar a vitória em uma das mãos e uma lança na
outra.

Denário de prata de Júlio César, século I a.C. British Museum of London.

Otávio Augusto, sobrinho-neto de Júlio César, também fez um uso


bastante amplo das imagens. Sua vitória na política romana foi
avassaladora, com as seguintes conquistas:

arrow_forward_ios Dissipar as sucessivas guerras civis.

arrow_forward_ios Ampliar o Império.


arrow_forward_ios Melhorar as condições econômicas.

arrow_forward_ios Garantir, após sua morte, em 14 d.C., que os 250


anos seguintes do Império Romano não fossem
marcados por conflitos internos significativos
(período conhecido como pax romana).

As várias “versões de Augusto” que circularam pelo Império,


disseminando sua imagem e presentificando a figura dele, não parecem
uma variável de pouca importância para explicar seu poder pessoal. As
muitas expressões e os tipos sociais associados à mesma pessoa
sugerem pouca preocupação com o modelo de referência ou a
consciência de que a maioria dos habitantes do Império jamais se
aproximaria dele para cobrar a perícia do escultor.

A versão mais famosa, sem dúvida, é a de Augusto de Prima Porta.


Encontrada na casa de Lívia, sua última esposa, ela é a cópia de um
original de bronze perdido. Com mais de dois metros de altura e pesando
uma tonelada, essa estátua foi descoberta em abril de 1863 e se tornou
uma das mais famosas do mundo.

No entanto, ainda que haja alguns traços regulares, a aparência dela não
é nada similar à de outras estátuas, como aquela na qual o imperador
está representado como o poderoso deus Júpiter, na que figura como um
general montado em seu cavalo (ainda que jamais tenha participado de
batalhas) e até mesmo na que está representado como como um faraó
seguindo a famosa lei da frontalidade, como se vê em uma parede do
templo egípcio de Kalabsha, na Núbia.

Veja a seguir a sequencia de imagens mostrando as versões de Augusto:


Augusto de Prima Porta. Museu do Vaticano.
Augusto como Júpiter. Hermitage, Rússia.
Augusto Equestre. Museu Nacional de Arqueologia, Atenas, Grécia.
Augusto como faraó. Templo de Kalabsha, Núbia.

Discursos em imagens
A documentação escrita que chegou até nós, salvo algumas exceções,
costuma representar as aspirações e as visões de mundo das elites.
Como vimos, saber ler e escrever, ainda que não fosse uma exigência
para a vida prática, costumava ser um privilégio das elites em boa parte
do mundo antigo.

As imagens e os documentos arqueológicos, ao contrário, tendem a ser


mais disseminadas: ainda que feitas sob a encomenda por algum
sujeito abastado, os responsáveis pela produção costumavam ser
trabalhadores especializados de classes populares, o que certamente
influenciava os discursos imagéticos.

Fragmento representando a vida cotidiana na Pompeia.

O fato de a leitura das imagens dispensar o longo período de formação


necessário para dominar as linguagens escritas permitiu não apenas
ampliar o público, ela foi além, englobando também os temas,
assegurando-nos a possibilidade de estudar as práticas laborais, a vida
cotidiana e muitos outros aspectos sociais de estratos da população
normalmente sub-representados em escritos.

As imagens também têm se mostrado um recurso importante para se


analisar contatos e diálogos entre sociedades antigas. A ideia de
“nação”, por princípio, não fazia sentido na Antiguidade. Graças
principalmente aos nacionalismos europeus do século XX, entretanto,
muitos historiadores foram induzidos ou optaram por uma abordagem
que emulava essa lógica moderna no mundo antigo.

O efeito mais visível disso é que cada grande


sociedade antiga foi estudada em estado de
isolamento esplêndido, exceto no caso das guerras,
situação em que forçosamente era preciso lembrar da
existência de vizinhos ilustres.

A globalização, que entrou em nosso debate público há uns 30 anos,


estimulou a historiografia a repensar esse paradigma nacional e a refletir
acerca das influências mútuas e do modo como as culturas dialogavam
entre si.

video_library
A iconografia do poder no mundo
antigo
Neste vídeo, abordaremos o estudo da construção das iconografia de
poder, pensando em imperadores, reis dos reis e faraós.

Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

“Imagens diversas produzidas pela capacidade artística humana


também nos informam sobre o passado das sociedades, sobre suas
sensações, seu trabalho, suas paisagens, caminhos, cidades e
guerras.”

Fonte: BITTENCOURT, C. M. F. Ensino de História: fundamentos e


métodos. São Paulo: Cortez, 2004. p. 353-354.

A autora Circe Bittencourt destaca a utilização de documentos não


escritos, algo que, para a história antiga, é vital. Sobre sua
utilização, é correto afirmar que

se apela principalmente para a familiaridade e a


A atratividade como forma de encantar o aluno e não
exige conhecimento prévio do professor.

aponta para a inovação da introdução do cinema


B como material didático e sua importância por já
estar inserido no cotidiano dos educandos.

exige pesquisa dos educandos, levando o ensino de


C história a outro patamar e mostrando que fazer
história prescinde de profissionais da área.

o aluno, no trabalho com a cultura material, precisa


D se afastar da própria bagagem cultural para produzir
uma análise criteriosa do objeto.

tais documentos podem ser transformados em


materiais didáticos, desde que se esteja atento às
E
suas formas e às linguagens específicas para
produzir e veicular informações.

Parabéns! A alternativa E está correta.

Os documentos não escritos, especialmente as fontes visuais,


possuem um grande apelo de atração; por isso, elas eram usados
politicamente. Tratava-se de formas comunicativas e com um viés
de guarda maior que as relações construídas na
contemporaneidade.

Questão 2
“O documento não é inócuo. É, antes de mais nada, o resultado de
uma montagem, consciente ou inconsciente, da história, da época,
da sociedade que o produziram, mas também das épocas
sucessivas durante as quais continuou a viver, talvez esquecido,
durante as quais continuou a ser manipulado, ainda que pelo
silêncio.”

Fonte: LE GOFF, J. História e memória. 5 ed. Campinas: Unicamp,


2003. p. 526.

Sobre as considerações postas por Le Goff, é correto afirmar que a


documentação imagética “oficial”, como a numismática, para o
historiador de Antiguidade

constitui a prova da realidade para história antiga


A
dada a escassez de materiais escritos oficiais.

possui escassas formas de serem categorizadas,


B cujas nuances se mostram de forma estática
conforme os elementos presentes nos documentos.

é a forma de lidar com aquilo que foi preservado


C devido ao seu valor histórico, destacando as suas
potenciais funções científica, social e cultural.

representa, sendo selecionado de alguns grupos, e


D tais vestígios podem ser tradados como os
verdadeiros marcos históricos primordiais.

integra uma noção de conjunto de documentos que


precisa levar em consideração as ações de coleta,
E
processamento técnico, guarda, cursamento e o que
aquela disseminação de informações representava.

Parabéns! A alternativa E está correta.

A ideia de que o documento remete a uma verdade, constituindo, por


conta disso, uma prova dos acontecimentos “verdadeiros” da
história, durou tempo bastante para que ainda hoje consiga
influenciar a forma com que as pessoas tratam a história. Esse
“privilégio” documental era reservado principalmente para os
documentos escritos de caráter oficial de governos e instituições. Na
contemporaneidade, já vem sendo aplicada uma visão sobre
documentos que inclui uma variedade de materiais, os quais, por
sua vez, devem ser analisados, cruzados e interpretados de maneira
viva.

Considerações finais
Como fechar um assunto tão complexo? Com um exemplo provocativo:
a história antiga não é a história restrita de um passado que deve ser
buscado como origem do homem. Ela integra, na verdade, parte dos
imaginários construídos das sociedades ocidentais de que fazemos
parte.

Como verificamos neste conteúdo, sua busca não se dá pela visão de


uma verdade, de um passado, e sim por uma constante investigação. Por
ser tão complexa, vital e presente, sem estar voltada para o
eurocentrismo histórico, essa investigação continua sendo fundamental
para a construção crítica do amante de história.

Para fecharmos nosso material, vamos ouvir agora um podcast diferente


que nos ajudará a entender mais sobre essa história.
headset
Podcast
Como fechar um tema tão complexo? Com um exemplo provocativo.

Explore +
Vamos ver alguns documentos que nos ajudam a entender a história
antiga:

Coleção de textos e documentos organizada por Jaime Pinsky:


PINSKY, J. (Org.). 100 textos de história antiga. v. 1. Coleção textos
e documentos. São Paulo: Contexto, 2003.

Uma antologia fantástica de documentos:


ANTIGA, III Historiografia; RECONSTRUÇÃO DA HISTÓRIA ANTIGA, I.
V. A. CÓDIGO: HST 5202.

Uma edição bem disponível da Ilíada:


HOMERO. Ilíada. Organização de A. Baricco. v. 526. Anagrama.
2015.

Uma sugestão para Eneida:


VIRGÍLIO. Eneida. Tradução de Carlos Alberto Nunes e organização
de João Angelo Oliva Neto. São Paulo: Editora 34, 2014.
Referências
AMIN, S. El eurocentrismo: crítica de una ideología. Madrid: Siglo
Veintiuno Editores, 1989.

BENTIVOGLIO, J. História no Brasil Imperial: a produção historiográfica


na RIHGB. História: questões & debates, v. 63, n. 2, jul./dez. 2015, p. 287-
315.

CARDOSO, C. F. Escrita, sistema canônico e literatura no Antigo Egito. In:


BAKOS, M. M.; POZZER, K. M, p. III Jornada de Estudos do Oriente Antigo:
línguas, escritas e imaginário. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1998, p. 95-144.

MORAES, A. S. de. Etnicidade: cultura e política. Revista Hélade, v. 3, n. 2,


2017, p. 4-6.

EAGLETON, T. A ideia de cultura. São Paulo: Unesp, 2005.

HAVELOCK, E. A revolução da escrita na Grécia e suas consequências


culturais. Rio de Janeiro: Paz & Terra, 1996.

HOMERO. Odisseia. Tradução de Frederico Lourenço; Introdução de


Bernard Knox. São Paulo: Companhia das Letras/Penguin, 2011.

INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO BRASILEIRO. A inscripção da


Gavia - mandada examinar pelo Instituto Historico e Geographico
Brazileiro. Tomo I. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1908.

LE GOFF, J. As raízes medievais da Europa. Petrópolis: Vozes, 2007.

LISTON, M. A; PAPADOPOULOS, J. K. The "Rich Athenian Lady" was


pregnant: the anthropology of a geometric tomb reconsidered. Hesperia:
The Journal of the American School of Classical Studies at Athens, v. 73,
n. 1, jan./mar. 2004, p. 7-38

MARTINS, P. Imagem e poder: considerações sobre a representação de


Otávio Augusto. São Paulo: Edusp, 2011.

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