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FACULDADE FACULESTE

O SER E ANGÚSTIA: UMA REVISÃO DA LITERATURA EXISTENCIAL.


Maria Clara de Assis Vasconcelos Sales

RESUMO

A construção existencial da tomada de consciência é delineada ao longo da história e


elaborada por diversos autores clássicos da literatura existencialista fenomenológica e
filosófica, como Sartre, Heidegger, Vitor Frankls, dentre outros. A consciência engendrou, no
bojo da história, uma discussão acerca de como a humanidade se ver ao longo do tempo e qual
o efeito disso, quais as formas a liberdade tomou nessa mesma matriz de pensamento, e como
essa mesma condição de ser livre é vista e experienciada nos dias de hoje. Fundamentada no
pensamento da “consciência enquanto liberdade”, Sartre pousa sua ideia na subjetividade
humana, apresentando a figurada de um ser que transcende e se transforma,
responsabilizando-o por suas escolhas, enquanto um ser “condenado à liberdade”. A
necessidade de dialogar sobre o Ser e Angústia é notória, tendo em vista o tema se manifestar
esquecido ao longo da história ou mesmo pouco trabalhado pelos autores contemporâneos. O
autor faz uma reflexão sobre a busca incessante por um sentido da vida a partir da necessidade
inerente ao homem de ressignificar a existência. Objetivando, de forma mais ampla, a reflexão
existencial sobre os conceitos filosóficos de ser, ente, angústia e liberdade, e, de forma mais
específica, a elaboração do ser e do ente ao longo da história, o debate do formato de liberdade
no tempo – e como é usada hoje dentro desse mesmo estudo de ser e ente – e, por fim,
compreender a angústia gerada a partir da liberdade humana.  

PALAVRAS-CHAVE: Existencialismo Fenomenológico. Ser. Liberdade. Angústia.


Resiliência.

ABSTRACT

The existential construction of awareness is outlined throughout history and elaborated by


several classic authors of phenomenological and philosophical existentialist literature, such as
Sartre, Heidegger, Vitor Frankls, and others. In the bulge of history, awareness has engineer a
discussion about how humanity sees itself over time and what’s the effect, what means of
freedom has taken in this same matrix of thought and how this same condition of freedom is
seen and experienced nowadays. Based on the thought of "consciousness as freedom", Sartre
puts his idea down to human subjectivity, showing the figure of a being that transcends and
transforms, holding him responsible for his choices, as a being "doomed to freedom". The
dialogue about “An Anguished Crack in Being” is necessary and notorious given that it is a
theme forgotten throughout history and ist’t given much attention by contemporary writers.

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The author reflects on the incessant search for meaningful’s life based on human’s needs to
reframe the existence. Generally, the existential reflection on the philosophical concepts of
being, entity, anguish and freedom, and in a more specific way, the elaboration of being and
entity throughout history, the debate of ways of freedom in time and how it is used today
within this same study of being and entity and finally understanding the anguish generated
from human’s freedom.

KEYWORDS: Phenomenological Existentialism. Being. Freedom. Anguished. Resiliency.


1INTRODUÇÃO

“Tudo o que existe, ou confronta o homem, ou é para ele objeto passivo. É nessa
dualidade da relação com o ente – encontro ou observação – que o ser humano se
constrói. Não são duas formas de manifestação, e sim duas formas básicas de nosso
coexistir com os seres” (BUBER, 1974).

Parafraseando Martin Buber (1974), em seu pensamento sobre o sentido da educação,


é iniciada a discussão que vem sendo debatida antes mesmo da Psicologia ser considerada
uma ciência e ser reconhecida como profissão. Compreender a existência dessa ciência e
entender o que ela pode oferecer é o ponto de partida deste trabalho. Dentro das propostas
apresentadas, é discutido como a humanidade se ver ao longo da história e qual o efeito disso;
quais formas a liberdade tomou nessa mesma matriz de pensamento; e como essa mesma
liberdade é vista e experienciada nos dias de hoje.
O ser humano foi se construindo ao longo do tempo, como uma colcha de retalhos, em
que o meio influencia, direta e indiretamente, a partir da cultura em que habita, dos contextos
vivenciados na época, e da liberdade proposta. Essa construção foi moldando um modelo de
humanidade que existe hoje, e que sofreu e sofre muitas influências históricas. Antônio
Gramsci (1978a, p.38), vem questionar-se e, ao mesmo tempo, responder: “O que é o homem?
(...) ao colocarmos a pergunta ‘o que é o homem?’ queremos dizer: o que o homem pode se
tornar, isto é, se o homem pode controlar o seu próprio destino, se ele pode ‘se fazer’, se ele
pode criar a sua própria vida. Dito, portanto, que o homem é um processo (...) somos
‘criadores de nós mesmos’, da nossa vida, de nosso destino.”
“Em cada período histórico, os homens buscam valores e princípios que dêem
significado à sua vida, constroem explicações sobre seu mundo, mudam suas ações e
princípios, criam diferentes culturas, estabelecem relações sociais; por isso dizemos que o
homem é um ser em processo, um ser histórico” (UFPA, 2004). A partir dessa ideia, é
possível concluir que o homem dotado de possibilidades no tempo, torna-se fundamental às

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transformações, ou seja, cada indivíduo é construtor da sua própria vida, responsável pelas
suas modificações. Daí, parte-se para o segundo ponto: a responsabilidade diante da liberdade.
O conceito de liberdade foi, assim como ou outros conceitos citados acima, construído
e elaborado ao longo do tempo. Sendo base de pensamento para definir esse conceito, Sartre,
que se denomina existencialista, caracteriza a liberdade como a escolha que o indivíduo faz
sobre o próprio ser e o mundo. Segundo essa mesma matriz de pensamento existencialista,
todo homem é obrigado a ser livre e assumir sobre si as consequências dessa liberdade. Não
há, para Sartre (1943), o determinismo, em que o indivíduo é predeterminado por
acontecimentos do passado e das escolhas que há nele.
Desse modo, pode-se constatar que o homem é um ser-no-mundo, e que ele não se
encontra de forma estática e neutra; ao contrário disso, mostra que está em pleno movimento e
ascensão, sendo primeiramente o Nada, para depois construir sua existência diante desse nada
que é, ou seja, no primeiro momento, ele se encontra como um ser indeterminado em uma
busca incessante por entender e construir sua essência e o sentido da vida.
Quanto à Liberdade, Heidegger (1927) usa sua teoria tendo como base o conceito de
Dasein (ou liberdade), que se faz dentro da possibilidade em “Ser e Tempo”, desenvolvendo
aqui uma noção que vai além da concepção metafísica do ente humano, com a capacidade de
liberar esses mesmos entes – que seria uma característica de ser da existência –, e também
vinculado ao poder de escolha e decisão. É preciso retomar e entender alguns conceitos para
conseguir compreender o pensamento heideggeriano, como, por exemplo, o conceito de ser-
ai, que seria a possibilidade de ser livre e responsável.
A grande pergunta é: como essa discussão leva ao tema “O ser e a angústia: uma
revisão da literatura existencial”? E a resposta é devolvida com outra indagação: Como
compreender o ser sem compreender a sua construção histórica? Com isso, é importante
ressaltar que a pesquisa em questão é um tema esquecido e que ficou por conta do acaso,
sendo assim, baseados em textos de cunho filosófico, histórico, social, psicológico e de saúde.
Dentro das problemáticas discutidas no tema, estudar o homem ao longo da história e
entender sua construção social facilitará a compreensão desse mesmo indivíduo nos dias de
hoje, entendo sua formação atual, trabalhar diversas problemáticas, como a angústia acerca da
liberdade, a responsabilidade social e pessoal, as emoções, baseados em autores como Sartre,
Heidegger, Viktor Frankl’s, e outros pensadores, historiadores e filósofos.

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FIGURA 1: RELAÇÃO EXISTENCIAL ENTRE SARTRE, HEIDEGGER E

FRANKL’S

Fonte: Produção própria.

De acordo com a figura 1, é feita a descrição da relação existencial dos autores


norteadores do artigo. Na oportunidade, destaca-se alguns conceitos primários que cada autor
coloca em seu pensamento, como, por exemplo, o Existencialismo de Sartre, o Tempo de
Heidegger e o Sentido da Vida de Frankl’s; dessa forma interligados pela ideia matriz:
Existência.
O principal papel da psicologia existencial humanista é o estudo do ser e ente a partir
de uma visão holística a respeito do todo que é apresentado dentro dos settings terapêuticos.
Dessa maneira, o tema proposto visa, a partir desse entendimento, justificar diversas ações e
emoções sobre a liberdade humana e as consequências que são impostas diante da
responsabilidade.
Ademais, a essência que rege o presente artigo reside no estudo de ser e ente, a partir
de uma revisão da literatura existencial, sendo um tema bastante escasso e pouco trabalhado e
de suma importância para se compreender como se chegou a atual formação de liberdade e de
entendimento a respeito do homem.
Com isso, espera-se que o tema apontado contribua tanto para instigar novos
pesquisadores a buscar o aprofundamento nessa área de pesquisa quanto motivar ainda mais o
conhecimento sobre o homem e sua liberdade; sendo importante ressaltar aqui o vínculo
pessoal que o autor possui com o tema, o que se pode justificar pela curiosidade despertada ao
longo da carreira acadêmica com estudos e trabalhos desenvolvidos nessa área.
A partir de recortes históricos e uma revisão da literatura existencial, as questões
levantadas visam levar psicólogos humanistas, existenciais e fenomenológicos a discussões
mais pontuais em relação a essa construção de ser, entendendo o indivíduo como subjetivo,
total e particular. O ente foi se construindo ao longo da história e definindo seu lugar no
mundo, e a liberdade, da qual tem acesso. Entender a posição que se tem no mundo e como
usar essa liberdade é o motivo norteador do presente trabalho.

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Dentre esses mesmos objetivos, vale destacar a intencionalidade matriz do artigo que é
o de refletir existencialmente sobre conceitos filosóficos de ser, ente, angústia e liberdade.
Dos objetivos específicos, destaca-se o de entender a construção do ser e do ente ao longo da
história; debater o formato de liberdade elaborado no tempo e como é usada hoje, dentro
desse mesmo estudo de ser e ente; e, por fim, compreender a angústia gerada a partir da
liberdade humana.
A produção do presente artigo é iniciada com uma discussão existencial e filosófica
acerca da construção de ser e ente que foi sendo modificada e elaborada ao longo da história.
Dentro dessa mesma construção, são levantadas questões sobre a liberdade como também
sobre a angústia gerada pela responsabilidade assumida pelo indivíduo, cada indivíduo, desde
o entendimento de livre arbítrio. Apesar de ser um tema que atravessa todo um cunho
histórico e que vai além de textos e elaborações feitas acerca do ser e da angústia, delimita-se
o presente artigo ao tempo de 1927, quando Heidegger discute o conceito de Dasein em “O
ser e o Tempo”, passando por 1943, quando Jean Paul Sartre publica a primeira edição do
livro “O ser e o Nada”, até os dias atuais, com discussões em artigos e revistas contendo
revisões desses mesmos autores.
2 METODOLOGIA

O estudo em questão trata-se de uma pesquisa bibliográfica de cunho qualitativo, em


que foram realizadas buscas em plataformas virtuais, garimpando publicações nos bancos de
dados Scielo, Google acadêmico, Pepsic e BVS. Também foram necessárias as pesquisas em
livros, revistas e artigos, a fim de melhor atender aos objetivos do artigo em questão.
Foram utilizadas as palavras-chave: Existencialismo, Fenomenologia, Ser, Ente,
Liberdade, Angústia e Resiliência. Posto isso, procurou-se fazer uma análise de conteúdos
históricos, filosóficos, fenomenológicos e existenciais sobre o que as pesquisas têm revelado
sobre o tema. Os descritores usados foram: Liberdade; Angústia; Existencialismo; Resiliência;
Emoções.
Nessa busca, foram encontradas 1.500 publicações, das quais 50 foram selecionadas
através das plataformas digitais, livros e revistas, sendo mais especificamente estudado 4
autores clássicos com 7 citações a partir de livros. Desse modo, foram utilizados critérios de
inclusão de artigos nacionais, de pesquisas desenvolvidas na área de psicologia e afins. Como
se trata de uma revisão da literatura e as bases atuais estão escassas, uma vez que o assunto é

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pouco abordado na atualidade, o período de tempo selecionado inicia-se a partir das primeiras
publicações dos livros “O ser e o Tempo” (1927), quando Heidegger discute o conceito de
Dasein, passando por 1943, quando Jean Paul Sartre publica a primeira edição do livro “O ser
e o Nada”, até os dias atuais, com discussões em artigos e revistas contendo revisões desses
mesmos autores. Assim, esse material será objeto de análise do estudo. .
Para Martins e Theóphilo (2016, p. 52), a pesquisa bibliográfica trata-se de um
formato necessário para conduzir uma pesquisa científica. Essa espécie de trabalho procura
sempre explicar e discorrer um assunto, problema ou tema, com o fundamento em referências
publicadas em periódicos, enciclopédias, revistas, livros, jornais, sites, entre outros suportes,
buscando sempre conhecer e analisar as contribuições sobre determinado tema ou assunto
problema.
A análise de dados de cunho qualitativo representa um método de investigação de base
linguístico-semiótica, com caráter exploratório, cujo foco está no subjetivo do objeto
analisado. As respostas costumam não ser objetivas, ou seja, os resultados que são obtidos não
estão dentro de números exatos, mas na investigação teórica ou comportamental. Dentro do
presente artigo, são levantadas questões acerca do Ser-Ente, da liberdade do indivíduo, e da
angústia gerada por essa mesma liberdade, sendo assim apresentada como uma pesquisa
analítica qualitativa com cunho bibliográfica.

3 RESULTADOS E DISCUSSÕES

As tabelas a seguir apresentam estudos contendo os principais resultados da pesquisa


que intenciona responder a questão problema do trabalho. O estudo, baseado na revisão da
literatura acerca da existência humana, tem como base autores clássicos, mas também
profissionais da área da Psicologia e/ou afins que tratam de um estudo do Ser e a Angústia
gerada a partir da liberdade existencial.

TABELA 2: RELAÇÃO DOS AUTORES E ARTIGOS ANALISADOS COM OS


PRINCIPAIS RESULTADOS NO TÓPICO: COMPREENDENDO A EXISTÊNCIA
HUMANA.

AUTOR/ OBJETIVO RESULTADO


ANO

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SARTRE Construção Ontológica acerca da ● Superar o idealismo e o
(1943) existência do Ser. realismo;

● A consciência não seria um


local fechado em si próprio
que seria “afetada” de forma
indireta e direta pelo
mundo;

● Preparação do conceito de
liberdade;

● Construção do Ser.

RÜSEN Refletir sobre o conhecimento ● Entender a teoria da história


(2007) histórico a partir da teoria da como autocompreensão da
história. ciência da história;

● Funções práticas que a


história tem na vida do
homem;

● Consciência histórica.

RIBEIRO Valorização do ser humano, ● Entendimento de ser-no-


(2011) refletindo as novas configurações mundo;
da Gestalt-Terapia.
● Finitude existencial;

● Um ser lançado no mundo;

● Responsabilidade de ser
livre.

Fonte: Produção própria.


Sartre traz, em toda a sua construção filosófica e ontológica a respeito do homem,
fatos baseados em fenômenos que tentam explicar a construção existencial do ser, superando
todo o idealismo e o realismo. Sartre recorre a Husserl para delimitar o seu ponto de partida:

7
Husserl coloca que: Toda consciência é consciência de alguma coisa. O passo
primordial de toda filosofia deve ser, no entanto, abandonar as coisas da consciência
e atempar a verdadeira relação entre esta e o mundo. Porém, a condição que se faz
necessária e suficiente para que a consciência cognoscente seja o de descobrir seu
objeto e que seja consciência de si como sendo este aprendizado. Se minha
consciência não fosse consciência de ser consciência de mesa, seria consciência
desta mesa sem ser consciente de sê-lo, ou, se preferirmos, uma consciência
ignorante de si, uma consciência inconsciente - o que é absurdo (SARTRE, 1943, p.
16).

Em Rüsen, destaca-se a importância da compreensão histórica na vida e na construção


do ser. É necessário sempre valorizar e entender a história como uma função prática na vida
do homem. Assim, o autor pontua em sua obra a relação entre história e utopia e argumenta
que pode visualizar em ambas um superávit de expectativas, a vontade humana de querer ser
um outro ser.

O homem, quando lançado ao mundo como um ser dotado de responsabilidade no


aqui-agora, é limitado e essa sensação de finitude cresce conforme ele deseja colocar em ação
sua potencialidade existencial. Ele não sabe da sua importância, mas a vê e sente ao se
perceber em um universo cujas variáveis são infinitamente complexas (RIBEIRO, 2011).
O homem sabe que o controle sobre a infinidade complexa do universo é impossível,
e, com isso, ele imerge em um mar de dúvidas, onde suas certezas quanto às suas
potencialidades e ações naufragam, dando início ao desespero e a angústia existencial,
provadas pelo mesmo sentimento de incapacidade perante a imersão na responsabilidade. Os
indivíduos, ao longo da história e formando a atual ideia de liberdade, cravaram essa guerra
com a responsabilidade de ser livre, assumindo sobre si o peso de existir e coexistir com tudo
o que o meio propõe como influência.

TABELA 3: RELAÇÃO DOS AUTORES E ARTIGOS ANALISADOS COM OS


PRINCIPAIS RESULTADOS NO TÓPICO: O SER E O ENTE: UM ESTUDO DE SUA
CONSTRUÇÃO AO LONGO DA HISTÓRIA.

AUTOR/ OBJETIVO RESULTADO


ANO

HEIDEGGE Elaboração das questões do sentido ● Pensar filosófico acerca do


R do ser e do ser do sentido numa ser no mundo;
visão ontológica e conceito de
(1927) ● Busca por compreensão;
Dasein.
● Tomada de si e da

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consciência;

● Significado de “Ser aí”;

● Um ser lançado no mundo;

● Relacionamento do homem
com as coisas e entes;

● Autenticidade e
inautenticidades acerca do
ser.

FRANKLS Conceito de resiliência e sentido da ● Capacidade do ser de


vida. enfrentar, superar e se tornar
(1987)
mais forte diante das
experiências diversas;

● Poder de encontrar um novo


sentido;

● Movimentar-se e tornar real


o novo;

● Existência humana e sentido


de vida;.

SARTRE Responsabilidade de um ser ● Conflitos existenciais;


lançado ao mundo.
(1943) ● Um ser lançado ao mundo;

● Construção de um ser em um
mundo já criado;

● Angústia em ser responsável


por seus próprios atos;

● Dar-se conta;

● Tomada de consciência feita


a partir da angústia gerada

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pela liberdade de escolha.

Fonte: Produção própria.

Heidegger traz, em sua filosofia, a ideia de que o caminho para o conhecimento do ser
parte do próprio homem, a partir de seus próprios questionamentos e reflexões quanto à
existência. Traz ainda a diferenciação entre ser e ente, em que afirma ser o homem um “ente”
inacabado, que se constrói e reconstrói diariamente, tendo a morte como um horizonte e limite
para o futuro. O homem heideggeriano deve sempre retornar a cada momento vivido no
presente ou no passado, ou seja, a existência está assim ligada à temporalidade.

O Dasein é o lugar para iniciar respostas à questões sobre o ser porque ele,
dessemelhante dos outros tipos de entidades, sempre tem uma consciência do ser:
entes humanos são assim para quem as entidades são apresentadas em seu modo de
ser. Isso não exprime que já temos uma concepção desenvolvida sobre o que é ser,
mas, em vez disso, nosso domínio é em grande medida contida e designada, o que
Heidegger chama de “pré-ontológico”. Uma vez que o Dasein tem um entendimento
do ser, ainda que implícita e não temática, Heidegger defende que a ontologia
fundamental deve iniciar com o dever de elucidar ou articular esse entendimento
pré-ontológica do ser. Fazer isso proverá uma primeira passagem para responder a
ideia do ser em geral, uma vez que entender o Dasein, ou seja, o que é ser o tipo de
ente que somos, antecipa compreender o que incorporamos, ou seja, o ser
(CERBONE, 2013, p. 69).

Ainda em Heiddeger (1927), para compreender o homem, vê-se a definição de Dasein,


que significa “Ser aí”, um ser que é lançado num mundo que ele não escolheu, já dado e do
qual ele nada sabe a respeito. Essa mesma perspectiva heideggeriana apresenta o homem e
como ele se relaciona com as coisas e entes, que poderiam ser definidas como inautênticas ou
autênticas.
O conceito Dasein traz a existência como uma possibilidade dentro das
impossibilidades, onde nada está pronto para a presença, ela só é compreendida
sendo/existindo. Essa compreensão de ser é, em si mesma, a compreensão do ser no Dasein,
como o próprio pensamento heideggeriano retoma, deixando claro a importância da presença
na questão do ser.
A resiliência é um processo que perpassa todos os outros conceitos já citados, já que é
necessária para um bom ajustamento criativo diante das adversidades, o estar consciente de si
entendendo toda a sua construção histórica. É fato que, no meio de crises, se criam
oportunidades de enfrentamento, e é, justamente nesses contratempos, que o ser humano se
recria e se revela nas potencialidades que muitas vezes são desconhecidas.

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Um indivíduo resiliente, na maioria das vezes, encara as adversidades de forma mais
saudável, sempre conseguindo retornar a seu estado de saúde anterior à crise enfrentada.
Como pontua Frankl, o indivíduo, quando não pode mudar uma situação, quando um conflito
foge do seu controle, ao passar por isso, muda a si próprio. Esse processo de transformação é
necessário e inevitável dentro do conceito de resiliência.
Para Frankl’s (1987), olhar para fora de si, olhar para o outro, ou para uma atividade
que deve ser feita no mundo, faz parte de sua existência; e, a partir dessa ideia, surge, como
consequência, a força para resistir às adversidades.
Ao longo de toda a existência humana, o homem sempre buscou construir um sentido
para sua existência, ao que Frankl vê como busca pelo Sentido da Vida. Essa busca incessante
por sentidos, por explicações, gerou, e ainda gera, na sociedade uma angústia e vazio
existencial imenso: há muitas perguntas sem respostas, e, muitas vezes, é bem mais fácil
cristalizar do que enfrentar a respostas. Com isso, Frankl em sua obra vai além dos conceitos
freudianos sobre pulsões sexuais, explicando que o homem contemporâneo vive sem raízes e,
com isso, desmorona nas incertezas do vazio.

O ser não pode mais ser considerado apenas como um indivíduo cujo interesse
primordial é o de satisfazer os desejos, de favorecer os instintos, ou então, dentro de
alguns limites, de recongraçar entre si o id, e ego e o superego, nem a presença
humana pode ser compreendida simplesmente como o resultado de
condicionamentos ou de reflexos condicionantes. Neste sentido, ao contrário, o
homem se revela como um ser que busca um sentido. O esvaziamento dessa busca
explica muitas mazelas do nosso tempo (FRANKL, 1989, p. 11).

O homem não escolhe onde vai nascer, nem de qual classe econômica será, ou mesmo
de raça ou etnia pertencerá, ele apenas é lançado no mundo, existindo. Mas o que ele faz com
sua vida, o significado dado a existência, faz parte da liberdade da qual ele não pode fugir. As
escolhas e decisões de vida são de total e inteira responsabilidade de cada um: o que é ou vai
se tornar um dia, para o existencialista Sartre, é decisão do indivíduo, condenado a ser livre. A
liberdade é colocada como uma forma incondicional, justificando esse mesmo pensamento
sartreano: “Condenado porque não se criou a si próprio; e, no entanto, livre porque uma vez
lançado ao mundo, é responsável por tudo quanto fizer” (1978, p. 9).

TABELA 4: RELAÇÃO DOS AUTORES E ARTIGOS ANALISADOS COM OS


PRINCIPAIS RESULTADOS NO TÓPICO: A ANGÚSTIA EM SER LIVRE.

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AUTOR/ OBJETIVO RESULTADO
ANO

SARTRE Concepção de liberdade ● O homem possui o poder de


escolha;
(1943)
● “O homem está condenado a
liberdade”;

● Angústia a partir da liberdade;

● Consciência do Nada;

● Responsabilidade sobre as
escolhas.

MOURA Consciência em ser livre ● Dever ontológico de dar


sentido ao ser;
(2010)
● Bem, norma e moral;

● Funga da cristalização.

HEIDERGGE Angústia do ser lançado ao ● Formato de um traço


R mundo totalizante e construtivo da
existência do ser;
(1927)
● Dimensão ontológica da
essência humana;

● Totalidade existencial do ser-


no-mundo;

● Angústia sobre a finitude


humana.

Fonte: Produção própria.

A concepção de liberdade, segundo Sartre (1943), discorre que o homem possui o


poder de escolher o que fazer e quais opções deve tomar em sua vida; em contrapartida, esta
consciência de liberdade é aterrorizante e lhe traz um sentimento de angústia. É importante

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ressaltar que o homem é um processo em construção, e que, até chegar à consciência de si no
hoje, passou por diversas crises existenciais, sobre o que Sartre diz o indivíduo questionar-se
e perceber que existe algo de errado e passa, assim, a rever suas limitações, tomado pela
consciência do Nada.

“O homem vive de decisões e através dessas decisões, em conformidade com qual


fazer, é que o indivíduo vai apresentar a sua presença no mundo. O homem a priori
existe e, durante o processo de sua existência ele se torna e vai elaborando a
essência; ou seja, a existência precede a essência, a essência é um construtor
humano” (SARTRE, 1943).

Alicerçado nessa perspectiva, circunscreve o processo de transformação pela qual o


homem vem passando desde o primeiro dar-se conta, cuja conclusão se dá pela importância de
todo esse processo. O sentimento de angústia se volta à realidade de um ser inacabado, que é
autor e coautor de sua vida, muito embora seja incapaz de terminá-la com perfeição.

4 CONCLUSÃO

Percorrido o caminho até aqui entre ser e angústia, liberdade e responsabilidade, é


chegado ao fim este estudo, embora cientes de que o trabalho é um processo inconcluso, uma
vez que o ser se modifica e se transforma diariamente. Dessa mesma forma, a liberdade
assume suas responsabilidades nessa transformação.
Há muitas ideias e questões levantadas no decorrer da discussão literária do presente
trabalho, mas vale ressaltar aqui a real intencionalidade e propostas erguidas, que seriam tanto
a de levar o homem comum à reflexão da sua existência, da sua liberdade e da
responsabilidade diante de suas escolhas; como também de, no meio acadêmico, instigar
novas pesquisas sobre esse tema tão antigo e tão contemporâneo, e que, de certa forma, ficou
à mercê do esquecimento no tempo; além, é claro, de provocar as pessoas que não estudam
Psicologia, incorporando nelas questionamentos sobre a inconsistência do ser, a dor de sofrer
o vazio existencial e o peso da liberdade de um ser lançado ao mundo.
Esse olhar especial para o passado foi essencial para configurar e desenvolver os
temas, dar unidade as ideias de Sartre, Heidegger, Frankl´s, entre outros autores: não é, tão-
somente, a nostalgia de um estudo arcaico, mas a necessidade de se atualizar temas essenciais
para se entender a construção atual de seres tão complexos e perturbados, seres incompletos e
lançados ao mundo vazio da autenticidade.

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Dentro da contemporânea análise existencial, é importante salientar que, em meio a
tanto imediatismo e ativismo, a imagem de um ser ideal é construída e remodelada
constantemente, causando no indivíduo diversas inconstâncias na edificação de sua existência,
uma vez que o meio interfere de forma direta e as pessoas também têm influência na vida
umas das outras. No entanto, cabe levantar aqui que a forma como se assume e veste esse
modelo de existir é de total e inteira responsabilidade de cada um, pois se é livre para escolher
e filtrar o que convém. Embargado nessa discussão existencialista, o tempo tem função
fundamental, visto que o passado não determinista apresenta um futuro de possibilidades, em
que, vivendo as experiências, é-se colocado um mar de possibilidades de transformação.
Enfim, é necessário entender a liberdade como um fenômeno de abertura a
possibilidades, onde a busca pelo sentido da vida não pese pelo fato de ser responsável pelos
atos, mas o poder ser lançado ao mundo, cuja lei é ser criativo, se superar, crescer e evoluir
constantemente. O sofrimento e angústia perpassam a vida de todos, mas o modo como se
comportar e o que fazer daquela experiência é o diferencial nesse certâmen.
Assim, “Se a angústia apertar o peito e tudo parecer confuso e escuro, não se
amedronte. O essencial se revela na espera” (SANTOS, 2017, p.114).

REFERÊNCIAS

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