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Convencer:

vencer com a ajuda de todos

A palavra que eu tomo em minhas mãos, a importância de desenvolver a capacidade


como ensina Bakhtin, não é nunca um objeto de argumentação nos estudantes do Ensi-
inerte, há sempre um coração alheio batendo
nela, uma outra intenção, uma vida diferente da
no Médio.
minha vida, com a qual eu preciso me entender.1
O encontro foi organizado pela professora
Cristovão Tezza
Sandra Fernandes Bonatto, coordenadora es-
tadual da Olimpíada no Espírito Santo, e con-
tou com a colaboração da professora Maria
Em nosso dia a dia são muitas as situações Davina Pandolfi Marques, semifinalista em
comunicativas em que temos que tomar a pala- 2008, que orientou – juntamente com o profes-
vra, afirmar, explicar, contestar, criticar, ironizar, sor Rômulo Farias de Oliveira – a realização
sustentar uma posição acerca de uma questão do jogo, tirou dúvidas e apresentou as dife-
polêmica. Ao argumentar utilizamos a palavra rentes possibilidades de uso do material.
oral ou escrita para defender um ponto de vista Os participantes – professores de língua
particular a respeito de determinado fato que portuguesa, pedagogos, técnicos de Ensino
afeta a vida das pessoas. Médio – puderam aprofundar o conhecimento
Uma boa argumentação envolve escolher as sobre a relevância da argumentação, exploran-
palavras mais apropriadas, recorrer aos recur- do as atividades que o jogo oferece e, assim,
sos que a língua oferece, planejar o modo de se prepararem para ajudar – nas escolas de
dizer, os argumentos consistentes que serão suas regiões – os professores que vão utilizar
usados para persuadir quem tem uma posição o “Q.P. Brasil” em sala de aula.
contrária à nossa. Quem argumenta aprende a
usar a força da palavra, a jogar com a emoção,
a formar a opinião do leitor ou ouvinte. Não se Q.P. Brasil: o jogo da
trata, em uma situação de risco, de acabar ou argumentação
destruir o adversário, mas trazê-lo para o seu Foi idealizado para que os jovens exercitem,
lado por meio do discurso. Assim, graças ao de forma lúdica, a capacidade de argumenta-
valor social, à consistência do argumento, é ção, uma habilidade que, como tantas outras,
possível convencer, ou seja, vencer o adversário deve ser ensinada no espaço escolar.
com a ajuda de todos. O “Q.P. Brasil” traz questões – temas da
a­tua­lidade veiculados na mídia – que podem
Por que é importante ensinar gerar discussões, controvérsia, opiniões dis-
argumentação na escola? tintas de interesse público, pois afetam a vida
Foi com essa questão provocadora que a de pessoas.
professora Ana Luiza Marcondes Garcia, O jogo está organizado em torno de doze
do Departamento de Linguística da PUC-SP, questões polêmicas e complementa as ativi-
mobilizou os sessenta educadores da Supe- dades propostas no Caderno do Professor:
rintendência Regional de Educação do Es- Pontos de vista. Em virtude do tempo de aula e
pírito Santo que participavam do encontro do interesse dos alunos, o professor não pre-
sobre o jogo “Q.P. Brasil”, a refletir sobre cisa utilizar todas as questões polêmicas.
Ele pode escolher algumas das questões se
quiser dinamizar o desenvolvimento da ativi-
Na Ponta do Lápis – ano VI – nº 14

1. “ O território do escritor”, texto apresentado no MAM-SP,


em 20 de março de 2000. dade em sala de aula.

16
A mídia e
de são
a publicida is de A maioridade
responsáve A presença e pe
As desigualdades lv deve ser redu nal
pela busca policiais reso a zi
sociais brasileiras d de 18 para 16 da
de uma ima a
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provocam a s de idade com
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de beleza? violência urbana? delinquência
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podem destruir resp ons abil izado nças
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o sociedade m s? bebidas alc de
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diminui
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permitida o consumo
?
Na Ponta do Lápis – ano VI – nº 14

Espera-se que os estudantes, por meio do jogo, possam: discutir


questões socialmente relevantes; identificar os diferentes tipos
de argumento; compreender a necessidade de buscar subsídios
para construção de seus próprios argumentos e refletir sobre a
qualidade das informações utilizadas.

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Uma brincadeira séria
É preciso que o professor conheça bem o material antes de propor essa
experiência lúdica aos seus alunos. O planejamento cuidadoso das ativi-
dades pode ajudar a aproximar os alunos das regras do jogo, favorecendo
o desenvolvimento da capacidade de argumentar.
Ao propor uma partida é importante:

explorar o material (tabuleiro, caixa com envelopes coloridos, cartas


 
de argumentação, caixinha da pontuação) antes de entrar em contato
com as regras;

 conhecer e discutir as regras do jogo;

ler atentamente a informação contida na carta para ajudá-los a entrar


 
no “universo” da questão polêmica;

examinar a questão polêmica e os argumentos presentes na carta,


 
pois nem sempre a argumentação apresentada é claramente favorá-
vel ou contrária a situação;

compreender que os argumentos apresentados na carta nem sempre


 
coincidem com o próprio ponto de vista a respeito da questão polê-
mica;

relacionar o argumento da carta com a questão polêmica para certifi-


 
car-se de que a argumentação é favorável (Sim) ou contrária (Não);

perceber questões lógico-semânticas presentes em cada situação


 
polêmica. Por exemplo: “Sim” é o que se deve permitir e “Não” o que
se deve proibir.

entender que às vezes é preciso defender uma ideia com a qual não
 
se concorda;

trabalhar a refutação, isto é, descrever um argumento para depois


 
contestá-lo, rejeitá-lo por meio da argumentação;

exercitar a competência de descentrar-se, pensar no argumento que


 
o adversário pode utilizar;

reconhecer os argumentos que são consistentes, imbatíveis, que


 
sustentam a posição assumida;

identificar os argumentos frágeis que exigem nova argumentação do


 
jogador;
Na Ponta do Lápis – ano VI – nº 14

perceber a relação lógica entre os dados apresentados na argumen-


 
tação ajuda a classificar os argumentos.

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Vamos exercitar a argumentação?
É importante que os alunos analisem a consistência da argumen-
tação, aprendam selecionar e identificar nas informações disponí-
veis os argumentos favoráveis e contrários, relacionando-os com a
questão polêmica em discussão.
Veja algumas sugestões que podem auxiliar a prática da argu-
mentação.

Providencie cópias, se possível, do quadro com a questão polêmica


 
e os argumentos.

Leia para os alunos a questão polêmica e as informações presentes


 
na carta do jogo.

Esclareça as possíveis dúvidas sobre a informação apresentada.


 
Divida os alunos em pequenos grupos.

Apresente uma lista com argumentos variados. Peça aos alunos


 
que leiam e classifiquem os argumentos favoráveis (Sim) ou
contrários (Não) à questão. Em seguida, solicite-lhes que orga-
nizem a classificação dos argumentos em uma tabela.

Números

Sim

Não

Tabela preenchida, aproveite para selecionar e circular os argumen-


tos que podem ser considerados frágeis ou mantêm uma relação
“mais distante” com a questão polêmica. Os alunos também podem
organizar esses argumentos em uma escala/reta numérica...

1 2 3 4 5

Questão polêmica
As vantagens que a internet proporciona compensam os proble-
mas que ela pode provocar?

Informação
Em 2008, 41,6 milhões de pessoas maiores de 16 anos declararam
possuir acesso à internet em casa, no trabalho, na escola, na lan
house, na biblioteca. Ao mesmo tempo em que o uso da internet
Na Ponta do Lápis – ano VI – nº 14

amplia o acesso à comunicação e dá mais rapidez às trocas de infor-


mação, começam a surgir problemas provocados pela exposição
exagerada da rede, pela dificuldade em controlar conteúdos impró-
prios para crianças e jovens, e pelas redes de pedofilia virtual.

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Argumentos favoráveis e contrários

e 4 Especialista
rática, facilidad s em leitura
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do
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de acesso à com mpensam
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Fonte: Henriqu
io
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Fonte: Marina da Mata, antropóloga
do Instituto Viver em Sociedade,
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6 Da mesma fo
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que utilizaram os rec tivo superfi ci
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ra de tecnologia no Ens
Fonte: Dora Vaz, prof esso
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Tipo de argumento
Na Ponta do Lápis – ano VI – nº 14

20
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10 No mundo do trabalho, a informa
7 É verdade que eu sa tização
ssei a usar a internet, e a internet trouxeram ganhos de
mas desde que eu pa racionali-
várias redes sociais. zação e de produt ividade, contrib
conheci mais gente, em uindo para
ligado no que rola no o bom funcionamento e a saúde
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mundo e me divirto mu
as de que eu gosto. Fonte: Revista Econo mia e Socie
plo, baixando as músic
dade.

Ensino Médio.
, 17 anos, estudante do
Fonte: Mauricio Escorel favorável contrário
favorável contrário Tipo de argumento

Tipo de argumento

11 Ferramen
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e ç a ra m a espalhar m port anto, tão ultrap
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al, como a in
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Fonte: Jornal
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Tipo de argu
men to favorável contrário

Tipo de argumento
Na Ponta do Lápis – ano VI – nº 14

Não: 2 (autoridade); 4 (evidência); 6 (comparação); 8 (exemplificação); 11 (princípio); 12 (causa e consequência).


Sim: 1 (autoridade); 3 (evidência); 5 (comparação); 7 (exemplificação); 9 (princípio); 10 (causa e consequência).
RESPOSTAS:

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Outra possibilidade é o professor analisar Ajuda na compreensão da questão polêmica?
junto com os alunos os diferentes tipos de ar- Qual a relação lógica (de princípio, exempli-
gumento. ficação, autoridade, causa e consequência,
Ele pode fazer uma leitura comentada dos comparação ou evidência) que estabelece
tipos de argumento, esclarecendo as dúvidas entre os dados, justificativas e conclusão? Há
sobre cada um deles. Em seguida, escolhe um alguma indicação no texto que ajuda a identi-
dos argumentos para exemplificar, propondo ficar o argumento?”.
perguntas que ajudem os alunos a classificar Depois da exploração oral com toda a tur-
o argumento: “O argumento usado é relevante ma, o professor organiza a turma em duplas e
para o assunto em discussão? O argumento soli­­cita-lhes que analisem e classifiquem os
está apoiado em fato concreto e consistente? argumentos.

Tipos de argumentos
Argumento de autoridade – No argumento de autoridade, o audi-
tório é levado a aceitar a validade da tese ou conclusão defendida a res-
peito de certos dados, pela credibilidade atribuída à palavra de alguém
publicamente considerado autoridade na área.

Argumento de evidência – No argumento de evidência, pretende-


se levar o auditório a admitir a tese ou conclusão, justificando-a por
meio de evidências de que ela se aplica aos dados considerados.

Argumento por comparação (analogia) – No argumento por


comparação, o argumentador pretende levar o auditório a aderir à tese
ou conclusão com o emprego de fatores de semelhança ou analogia evi-
denciados pelos dados apresentados.

Argumento por exemplificação – No argumento por exemplifica-


ção, o argumentador baseia a tese ou conclusão em exemplos represen-
tativos, os quais, por si sós, já são suficientes para justificá-la.

Argumento de princípio – No argumento de princípio, a justifica-


tiva é um princípio, ou seja, uma crença pessoal baseada numa consta-
tação (lógica, científica, ética, estética etc.) aceita como verdadeira e de
validade universal. Os dados apresentados, por sua vez, dizem respeito
a um fato isolado, mas aparentemente relacionado ao princípio em que
se acredita. Ambos ajudam o leitor a chegar a uma tese, ou conclusão,
por meio da dedução.

Argumento por causa e consequência – No argumento por


causa e consequência, a tese ou conclusão é aceita justamente por
causa ou uma conseqüência dos dados.
Na Ponta do Lápis – ano VI – nº 14

Fontes de referência do texto: Palestra da professora Ana Luiza Marcondes Garcia; Caderno do Professor:
Pontos de vista; Manual do Professor, in: Q.P. Brasil – Questões Polêmicas do Brasil: O jogo da argumentação.

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