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2.

5 Agravamento da mortalidade
As vidas que apresentam fatores de risco mais
elevados do que as vidas normais sofrem um
acréscimo no prémio dos seguros em caso de morte,
resultante de se considerar que a sua mortalidade é
também superior (agravada). Há três métodos mais
comuns para se tratar o problema do agravamento da
mortalidade.

2.5.1 Agravamento por “age rating”

Def. 2.39: Fala-se de um agravamento da forma


“age rating” quando a companhia se limita a
considerar que a pessoa é mais velha do que
na realidade é, acrescentado alguns anos à sua
idade real nos cálculos sobre essa vida.
2.5.2 Agravamento do tipo aditivo
Aplica-se aos indivíduos que, por qualquer razão, se
colocam em situações de risco (algumas atividades
profissionais, ou desportivas, por exemplo). Nesses
casos, o agravamento não depende da idade.

Def. 2.40: Fala-se de um agravamento da forma


aditiva quando a companhia se limita a adicionar
uma constante positiva 𝜙 à força de mortalidade
associada a essa vida.

𝜇𝑥+𝑠 = 𝜇𝑥+𝑠 + 𝜙
Nestas condições,
𝑡 ′ 𝑑𝑠 𝑡
′ − ∫0 𝜇𝑥+𝑠 − ∫0 (𝜇𝑥+𝑠 +𝜙)𝑑𝑠
𝑡𝑝𝑥 =𝑒 =𝑒
𝑡 𝑡 𝑡
= 𝑒 − ∫0 𝜇𝑥+𝑠 𝑑𝑠 𝑒 − ∫0 𝜙𝑑𝑠 = 𝑒 −𝑡𝜙 𝑒 − ∫0 𝜇𝑥+𝑠 𝑑𝑠
= 𝑒 −𝑡𝜙 𝑡𝑝𝑥
2.5.3 Agravamento do tipo multiplicativo
É um método alternativo ao primeiro método, o
método de “age rating”.

Def. 2.41: Fala-se de um agravamento da forma


multiplicativa quando a companhia se limita a
multiplicar as probabilidades normais de morte por
uma constante superior a 1, ou seja,

𝑞𝑥+𝑡 = (1 + 𝑐 )𝑞𝑥+𝑡 , 𝑐 > 0.

Obviamente, tanto a constante 𝝓 como a


constante c têm que ser escolhidas de forma
adequada, depois de uma avaliação criteriosa do
risco agravado em causa.
3. Seguros e Anuidades sobre uma Vida

3.1 Avaliação dos benefícios num contrato de


seguro (em tempo contínuo e em tempo
discreto, constantes e variáveis)

Por depender da morte ou sobrevivência da pessoa


segura, o momento do pagamento e, por vezes, o
montante do benefício num contrato de seguro de
vida encontra-se rodeado de incerteza.

Assim sendo, o seu valor atual pode (e deve) ser


modelizado como uma variável aleatória, que
combina o modelo de sobrevivência adequado com
uma função também criteriosamente escolhida para
modelizar o valor temporal do dinheiro.

A maior parte do trabalho do atuário prende-se com


a necessidade de determinar um valor justo para o
prémio a cobrar pela companhia, face a uma
determinada proposta. Nos cálculos, devem ter-se
em consideração os seguintes dois fatores essenciais:

(a) O valor temporal do dinheiro


e
(b) A incerteza inerente ao pagamento futuro do
benefício, que depende da morte ou sobrevivência
da vida em causa.

Em consequência, é necessário juntar o que


se aprendeu em Cálculo Financeiro, em particular
no regime de Juro Composto, e os dois
capítulos anteriores sobre Modelos de
Sobrevivência (e o cálculo de probabilidades a
partir
(a) deles).
Relativamente ao valor temporal do dinheiro,
vai assumir-se que a taxa de juro é conhecida
e não aleatória.
Ainda que a Matemática Financeira moderna
proponha um número de modelos estocásticos
da taxa de juro que são de grande utilidade,
tais modelos não serão aplicados a este nível.
No entanto, não se assumirá sempre que a
taxa de juro é constante.
(b) Para calcular as probabilidades relevantes,
assume-se que o modelo de mortalidade
considera que esta depende apenas da idade da
pessoa segura. Note-se que, quando se assume
que a população segura é selecionada (por
meio de exames médicos, por exemplo), já se
costuma fazer a mortalidade depender da
pessoa segura e também do período de tempo
que decorreu desde a seleção.

Se bem que o tempo contínuo seja na realidade


impraticável, nos cálculos começa sempre por
assumir-se que tudo se faz em tempo contínuo, pois
é a abordagem mais natural e clara. Depois, faz-se a
necessária aproximação ao tempo discreto.
Def. 3.1: Para se efetuarem os cálculos, hipóteses
sobre a mortalidade, as taxas de juro e as despesas
inerentes à apólice são necessárias. O Termo Bases
Técnicas refere-se a essas hipóteses, usadas nos
seguros de vida e nos cálculos sobre pensões.

3.1.1 Seguro de Vida Inteira


3.1.1.1 Caso contínuo (o benefício é pago no
momento da morte da pessoa segura)
Neste tipo de contratos, o momento em que se faz o
pagamento do benefício é desconhecido, até que a
pessoa segura more e o pagamento é realmente feito.

Def. 3.2: Num contrato de seguro de vida inteira


sobre (𝑥), o valor atual de um benefício de 1
pagável no momento da morte, em 𝑇𝑥 , é uma v.a.,
seja

𝑇𝑥 −𝛿𝑇𝑥
1
𝑍=𝑣 =𝑒 ,𝑣 = , 𝛿 = 𝑙𝑛(1 + 𝑖 ).
1+𝑖
O valor esperado do valor atual, valor esperado
atualizado, ou valor atuarial vem

𝐴̅𝑥 = 𝐸 [𝑍] = 𝐸[𝑒 −𝛿𝑇𝑥 ] = ∫ 𝑒 −𝛿𝑡 𝑓𝑥 (𝑡) 𝑑𝑡


0

= ∫ 𝑒 −𝛿𝑡 𝑡𝑝𝑥 𝜇𝑥+𝑡 𝑑𝑡 .


0

(O traço sobre A indica que estamos em tempo


contínuo, o benefício pode ter que ser pago a
qualquer momento).

Se for necessário calcular a variância da v.a. valor


atual do benefício, vem

2
𝐸 [𝑍 2 ] = 𝐸 [(𝑒 −𝛿𝑡 ) ] = ∫ 𝑒 −2𝛿𝑇𝑥 𝑓𝑥 (𝑡) 𝑑𝑡
0

= ∫ 𝑒⏟−2𝛿𝑡 𝑡𝑝𝑥 𝜇𝑥+𝑡 𝑑𝑡 = 2𝐴̅𝑥


0 𝑣𝑖2
(o ‘expoente’ 2 indica que o cálculo é feito como
anteriormente, bastando ajustar a força de juro, que
passa a ser 2𝛿, ou, de forma equivalente ajustando a
taxa de juro que passa a ser 𝑗 = (1 + 𝑖)2 − 1, pois
1 1
𝑣𝑖2 = ⇔ 𝑣𝑗 = .)
(1 + 𝑖)2 [(1 + 𝑖)2 −1]
1+⏟
𝑗

A variância da v.a. ‘Valor Atual’ é

𝑉𝑎𝑟[𝑍] = 𝑉𝑎𝑟[𝑒 −𝛿𝑇𝑥 ] = 𝐸 [𝑍 2 ] − 𝐸 [𝑍]2


= 2𝐴̅𝑥 − (𝐴̅𝑥 )2

Observação 3.3: Se a soma segura for um qualquer


valor 𝑆, então o VAE (Valor Atual Esperado, ou
Valor Atuarial) é 𝑆𝑍, o que implica que

𝐸 [𝑆𝑍] = 𝑆𝐴̅𝑥 e

𝑉𝑎𝑟[𝑆𝑍] = 𝑆 2 ( 2𝐴̅𝑥 − (𝐴̅𝑥 )2 ).


Atenção: é ERRO GRAVE confundir a v.a. com
o seu valor esperado.

Exemplo 3.4

a) Uma apólice tem VAE 88 000𝐴̅50 . Explique


as condições particulares do contrato.
b) Calcule o VAE em causa para duas vidas,
sabendo que 𝜇 = 0.04 ao longo da primeira
vida e 𝜇 = 0.03 ao longo da segunda vida. A
força de juro é 𝛿 = 5% por ano.

Solução:

a) 88 000𝐴̅50 é o VAE de um seguro de vida


inteira contratado sobre uma pessoa segura de
50 anos e que paga um benefício de 88 000 no
momento da morte.
b) Representando a primeira vida por (𝑥 ) e a
segunda por (𝑦), vem
∞ ∞
𝐴̅𝑥 = ∫0 𝑒 −𝛿𝑡 𝑡𝑝𝑥 𝜇𝑥+𝑡 𝑑𝑡; 𝐴̅𝑦 = ∫0 𝑒 −𝛿𝑡 𝑡𝑝𝑦 𝜇𝑦+𝑡 𝑑𝑡;
então,
∞ 𝑡
𝐴̅50 = ∫0 𝑒 −0.05𝑡 𝑒 − ∫0 0.04𝑑𝑠 (0.04)𝑑𝑡 = 0. (4);
VAE primeira vida = 39 111.11.
∞ 𝑡
𝐴̅50 = ∫0 𝑒 −0.05𝑡 𝑒 − ∫0 0.03𝑑𝑠 (0.03)𝑑𝑡 = 0.375;
VAE segunda vida = 33 000.

Tpc: calcular a variância da v.a. ‘Valor Atual’, em


cada um dos casos.

Observação 3.5: Sendo o valor esperado de uma


v.a. que é um valor atual, o VAE de um benefício
dependente das contingências da vida humana tem
que ser calculado percorrendo todos os possíveis
momentos para o pagamento do benefício, seja com
um integral (tempo contínuo) seja com um
somatório (tempo discreto). Para isso, e em cada um
desses momentos do tempo, considera-se o produto
de três fatores:
(1) o montante do benefício nesse particular
momento;
(2) o fator de atualização financeira apropriado;
(3) a probabilidade de que o benefício seja pago
nesse momento.
Observação 3.6: Se for conhecida a distribuição da
v.a. 𝑇𝑥 , será possível obter a distribuição da v.a. Z.
De qualquer modo, é intuitivo que quanto mais nova
for a pessoa (assumindo 𝑇𝑥 valores mais elevados)
mais baixos tendem a ser os valores assumidos por
Z, pois o pagamento do benefício é tanto mais
gravoso para o segurador quanto mais cedo se faz
(quanto mais velha for a pessoa segura).

3.1.1.2 Caso discreto 1 (o benefício é pago no fim


do ano da morte da pessoa segura)

Admita-se agora que o benefício de valor 1 é pago


no final do ano da morte da pessoa segura (𝑥 ). Isto
significa que esse pagamento será feito daqui a 𝐾𝑥 +
1 anos, recordando que 𝐾𝑥 é o número de anos
completos que a pessoa sobrevive desde que a
apólice foi contratada.

Usando novamente Z para representar a v.a. ‘Valor


Atual’ do benefício neste contrato de vida inteira
tem-se a seguinte definição.

Def. 3.7: Num contrato de seguro de vida inteira


sobre (𝑥), o valor atual de um benefício de 1
pagável no fim do ano da morte, em 𝐾𝑥 + 1, é uma
v.a., seja

𝑍 = 𝑣 𝐾𝑥+1 = 𝑒 −𝛿(𝐾𝑥 +1) .

O VAE é

𝐴𝑥 = 𝐸 [𝑍] = 𝐸 [𝑣 𝐾𝑥+1 ] = ∑∞
𝑘=0 𝑣
𝑘+1 (
𝑃 𝐾𝑥 = 𝑘) =
∑∞
𝑘=0 𝑣
𝑘+1 2 3
𝑘|𝑞𝑥 = 𝑣𝑞𝑥 + 𝑣 1|𝑞𝑥 + 𝑣 2|𝑞𝑥 + ⋯ ,

(Recorde-se que 𝑃(𝐾𝑥 = 𝑘) = 𝑃(𝑘 ≤ 𝑇𝑥 < 𝑘 + 1)


𝑙𝑥+𝑘 −𝑙𝑥+𝑘+1
= 𝑘𝑝𝑥 𝑞𝑥+𝑘 = 𝑘|𝑞𝑥 = .)
𝑙𝑥

O segundo momento ordinário é


𝐸 [𝑍 2 ] = 𝐸 [(𝑣 𝐾𝑥+1 )2 ] = ∑ (𝑣 𝑘+1 )2 𝑃(𝐾𝑥 = 𝑘)


𝑘=0

= ∑ (𝑣 2 )𝑘+1 𝑘|𝑞𝑥 = 2𝐴𝑥


𝑘=0

A variância da v.a. ‘Valor Atual’ é

𝑉𝑎𝑟[𝑍] = 2𝐴𝑥 − (𝐴𝑥 )2

⇒ 𝑉𝑎𝑟[𝑆𝑍] = 𝑆 2 ( 2𝐴𝑥 − (𝐴𝑥 )2 ).

Exercício 3.8

Considerando a mortalidade da tábua modelo e uma


taxa de juro anual efetiva de 4%, calcule o VAE de
um benefício de 300 000 pago no fim do ano da
morte aos beneficiários de uma pessoa segura que
tem atualmente 102 anos.
3.1.1.3 Caso discreto 2 (o benefício é pago no fim do
mês da morte da pessoa segura)
( )
Def. 3.9: Seja 𝐾𝑥12 uma v.a. que representa o tempo
de vida futura de (𝑥), contado em meses completos,
e convertido depois em anos, isto é,

( ) ⌊12𝑇𝑥 ⌋
𝐾𝑥12 =
12

Observação 3.10:

( ) 1 2
𝐾𝑥12 ∈ {0, , , … } é obviamente uma v.a. do tipo
12 12
( )
discreto. 𝐾𝑥12 = 𝑘 indica que a vida (𝑥) morre no
1
intervalo [𝑘, 𝑘 + [, isto é, no primeiro mês, se 𝑘 =
12
1
0, no segundo mês, se 𝑘= , e assim
12

sucessivamente.
( )
Def. 3.11: A função de probabilidade de 𝐾𝑥12 é

( ) 1
𝑃 (𝐾𝑥12 = 𝑘) = 𝑃 (𝑘 ≤ 𝑇𝑥 < 𝑘 + )= 1 𝑞𝑥
12 𝑘|
12
1 2
= 𝑘𝑝𝑥 − 1 𝑝𝑥 , 𝑘 = 0, , ,…
𝑘+
12 12 12

Exemplo:

( ) ⌊549.6⌋
Se 𝑇𝑥 = 45.8 ⇒ 𝐾𝑥12 = = 45.75, 45 anos e
12

9 meses.

Def. 3.12: Num contrato de seguro de vida inteira


sobre (𝑥), o valor atual de um benefício de 1
( ) 1
pagável no fim do mês da morte, em 𝐾𝑥12 + ,é
12

uma v.a., seja


(12) 1
𝐾𝑥 +
𝑍=𝑣 12 .
O VAE é
(12) 1
( )
𝐴𝑥12 = 𝐸 [𝑍] = 𝐸 [𝑣 𝐾𝑥 +
12 ]

O segundo momento ordinário é

(12) 2
2] 𝐾𝑥 +1
𝐸 [𝑍 = 𝐸 [(𝑣 ) ]

E a variância é

2 (12) (12) 2
𝑉𝑎𝑟[𝑍] = 𝐴𝑥 − (𝐴𝑥 ) .

Observação 3.13: Esta situação é a mais exigente


em termos de cálculos, pois é necessário considerar
todos os possíveis fins de mês desde que o contrato
tem o seu início até ao fim da tabela.

Mais laborioso ainda é o cálculo da probabilidade de


o benefício ser pago em cada um desses momentos,
que obriga a recorrer à hipótese UDD e às fórmulas
vistas atrás. Por esse motivo, tem que se recorrer a
uma folha de cálculo.
No entanto, existe uma solução alternativa, muito
usada na prática, e que permite aproximar os valores
de 𝐴̅ 𝑥 (que na maior parte das situações só podem
ser calculados com o recurso a métodos numéricos, e
onde as tábuas de mortalidade não são utilizáveis) e
( )
também os valores de 𝐴𝑥12 (que, muito embora
possam ser calculados com o recurso às tábuas de
mortalidade, exigem o cálculo das probabilidades
mês a mês), a partir dos valores de 𝐴𝑥 , que são
calculados de forma muito mais imediata. As
aproximações em causa são as seguintes:
1
𝐴̅ 𝑥 ≈ (1 + 𝑖 )2 𝐴𝑥
12−1
( )
𝐴𝑥12 ≈ (1 + 𝑖 )2×12 𝐴𝑥

Mais importante ainda, estas aproximações podem


também ser aplicadas, se em vez de se falar no fim
do mês da morte, se falar no fim do trimestre da
morte, ou no fim do semestre da morte. Em geral,
tem-se
𝑚−1
( )
𝐴𝑥𝑚 ≈ (1 + 𝑖 ) 2𝑚 𝐴𝑥
1
𝐴̅ 𝑥 ≈ (1 + 𝑖 ) 𝐴𝑥 ,
2

onde m é o número de períodos em que o ano está


dividido (se em meses, 𝑚 = 12, se em trimestres
𝑚 = 4, etc.

Exercício 3.14

Considerando a mortalidade da tábua modelo e uma


taxa de juro anual efetiva de 4%, calcule o VAE
aproximado de um benefício de 300 000 pago por
morte aos beneficiários de uma pessoa segura que
tem atualmente 102 anos:

a) Admitindo que o pagamento é feito no


momento da morte.
b) Admitindo que o pagamento é feito no fim do
mês/trimestre/semestre da morte.

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