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História Trágico Marítima – “As aventuras de Jorge de Albuquerque Coelho (1565)”

I
A História Trágico-Marítima é um conjunto de histórias de naufrágios ocorridos
sobretudo na segunda metade do século XVI que Bernardo Gomes de Brito decidiu
compilar e publicar em 2 volumes estes relatos que foram escritos pelos próprios
sobreviventes e apresentam a face negra dos descobrimentos, a tragédia em vez da
glória. Um desses relatos é o naufrágio por que passou Jorge de Albuquerque Coelho,
narrado por Bento Teixeira Pinto, um sobrevivente da nau Santo António. Em 1565 a
tripulação deu início à viagem entre o Brasil e Portugal, mas logo à saída encalhou e foi
obrigada a regressar. Apesar do acidente ser considerado por muitos um mau
presságio, depois de concertada a nau voltou a partir. Durante a viagem a tripulação
foi atacada pelos franceses, mas Jorge de Albuquerque tentou defendê-la durante 3
dias, apesar da escassez de homens e armamento. Quando os franceses abordaram a
nau mostraram uma dominação pela ousadia e bravura do fidalgo português.
Enquanto este pensava num plano para recuperar embarcação, início de uma violenta
tempestade que destruiu quase por completo afastando-a da nau francesa. Durante
vários dias sobreviveram no mar praticamente sem alimentos, sem velas e sem leme,
mas com muita fé em Cristo e na Virgem Maria.
Quando toda a esperança já parecia ter desaparecido e alguns marinheiros
queriam ceder à tentação diabólica de comer carne humana, foi avistada terra e uma
barca veio socorrer os poucos sobreviventes.

Coletânea de relatos de naufrágios e desastres marítimos das naus portuguesas

Naufrágios e desastres ocorridos durante os séculos XVI e XVII

Na carreira da India ou nas travessias atlânticas

 Bernardo Gomes de Brito compilou uma antologia de naufrágios, onde


publicou doze relatos, organizados em dois volumes, em 1735 e 1736, durante
o reinado de D. João V.
História Trágico-Marítima:

 Interesse histórico-literário;

Característica dos relatos

Cariz testemunhal

Vivacidade dos relatos


Dramatismo da narração
Realismo nas descrições
Reflexão sobre a fragilidade da vida
Religiosidade

 Popularidade

 Sucesso Editorial

Causas dos naufrágios apontados nos relatos:

 Largada fora de época regulada pelas normas;

 Excessivas dimensões e má construção das embarcações;

 Cargas excessivas e má distribuição nas embarcações;

 Tempestades;

 Equipamentos deficientes;

 Inexperiência dos pilotos;

 Falta de cooperação entre os navios;

 Os ataques de piratas, corsários ou navios estrangeiros;

Simbolismo do naufrágio:

 Metáfora

Da efemeridade da vida humana;


Das dificuldades da vida humana.
Visão barroca da vida humana:

 O Homem enquanto ser que se encontra numa permanente viagem, ser peregrina pelo
mundo;

 O Homem como mortal, temente a Deus e consciente da sua fragilidade.

Descrição das atitudes humanas nos relatos:

 Condição psicológica dos tripulantes e dos passageiros;

 Desorientação e desespero na situação de naufrágio;

 Momentos de agonia;

 Reação à morte iminente;

 Apelos à divindade nos momentos limite;

 Atitudes individuais (os heróis dos relatos);

 Atitudes de grupos de personagens.

Os Lusíadas e a História Trágico Marítima

Os Lusíadas e a História Trágico-Marítima têm em comum os descobrimentos e


a conquista dos mares pelos portugueses. A epopeia camoniana destaca a vertente
mais heroica e gloriosa. N’Os Lusíadas é a viagem de ida a que mais interessa, o que
motiva os navegadores é a busca de algo novo, da aventura, do oriente enquanto,
símbolo da origem e do conhecimento. O herói português destaca-se por ter
conseguido ultrapassar os limites de um mar revolto e traiçoeiro, alcançando desta
forma o estatuto de figura mítica. A História Trágico-Marítima enfatiza a face mais
sombria e trágica das conquistas marítimas e a narrativa centra-se principalmente nas
viagens de regresso. São frequentes nestas histórias alusões à cobiça e à ganância,
enquanto causa de muitos naufrágios, uma vez que as embarcações viajavam mal
equipadas e com excesso de carga, mas também se faz referência à coragem e à
determinação dos muitos portugueses que apesar da fragilidade conseguem
sobreviver a grandes tragédias.

Resumindo, Os Lusíadas e a História Trágico-Marítima apresentam visões


diferentes dos descobrimentos. A epopeia de Camões destaca o lado heroico e dá uma
visão positiva da expansão marítima apresentando os feitos grandiosos dos
portugueses. A História Trágico-Marítima enfatiza lado do trágico e foca o sofrimento
causado pela ganância, pela cobiça, apresentando os portugueses como corajosos e
determinados face às vicissitudes da natureza.
História Trágico-Marítima: "As terríveis aventuras de Jorge de Albuquerque Coelho
(1565)

A História Trágico-Marítima é um conjunto de histórias de naufrágios ocorridos


sobretudo na segunda metade do século XVI que Bernardo Gomes de Brito decidiu
compilar e publicar em 2 volumes estes relatos que foram escritos pelos próprios
sobreviventes e apresentam a face negra dos descobrimentos, a tragédia em vez da
glória. Um desses relatos é o naufrágio por que passou Jorge de Albuquerque Coelho,
narrado por Bento Teixeira Pinto, um sobrevivente da nau Santo António. Em 1565 a
tripulação deu início à viagem entre o Brasil e Portugal, mas logo à saída encalhou e foi
obrigada a regressar. Apesar do acidente ser considerado por muitos um mau
presságio, depois de concertada a nau voltou a partir. Durante a viagem a tripulação
foi atacada pelos franceses, mas Jorge de Albuquerque tentou defendê-la durante 3
dias, apesar da escassez de homens e armamento. Quando os franceses abordaram a
nau mostraram uma dominação pela ousadia e bravura do fidalgo português.
Enquanto este pensava num plano para recuperar embarcação, início de uma violenta
tempestade que destruiu quase por completo afastando-a da nau francesa. Durante
vários dias sobreviveram no mar praticamente sem alimentos, sem velas e sem leme,
mas com muita fé em Cristo e na Virgem Maria. Quando toda a esperança já parecia
ter desaparecido e alguns marinheiros queriam ceder à tentação diabólica de comer
carne humana, foi avistada terra e uma barca veio socorrer os poucos sobreviventes.
Análise de um excerto

A tempestade

Às dez, escureceu por completo; parecia noite. O negro mar, em redor, todo se
cobria de espumas brancas; o estrondo era tanto, - do mar e do vento, - que uns aos outros se
não ouviam.

Nisto, levanta-se de lá uma vaga altíssima, toda negra por baixo, corada de
espumas; e, dando na proa com um borbotão (lufada) do vento, galga sobre ela, a submerge, a
arrasa. Estrondeando e partindo, leva o mastro do traquete com a sua verga e enxárcia; leva a
cavadeira, o castelo da proa, as âncoras; estilhaçada a ponte, o batel, o beque ( parte mais
avançada da proa), arrebatando pessoas, mantimentos, pipas. Tudo se quebra e lá vai no
escuro. A nau, até o mastro grande, fica submerso, e mais de meia hora debaixo de água.

Os sobreviventes, que se arrastam pávidos, confluem a um padre que se acha a


bordo e atropela as rezas e as confissões.

Um relâmpago risca, ilumina a treva: veem-se todos de joelho, com as mãos no


ar, a pedir misericórdia e a clamar por Deus.

Jorge de Albuquerque, como de costume, falava aos outros para lhes dar
coragem. Confiassem em Deus, - e ao mesmo tempo fossem dando à bomba, esgotando a
água que invadira o convés.
História Trágico-Marítima, Narrativas de Naufrágios da Época das Conquistas (adpt. António Sérgio), Porto, Porto
Editora, 2015, - pág. 124

Tema: Tempestade

Quais são as principais ideias do texto?

 1ª Ideia – Tempestade e danos provocados – “Às dez (…) debaixo de água”

 2ª Ideia – “Os sobreviventes (…) invadira o convés.”

Reação dos marinheiros (desespero, confissão pública de pecados)


Reação de Jorge de Albuquerque Coelho (calma, firmeza, na liderança)

Que recursos contribuem para conferir visualismo à descrição da tempestade?

 Vocabulário sugestivo (sensações visuais e auditivas) – “escureceu por completo”;


“espumas brancas”; “todo negro”; “Estrondeando”; “Um relâmpago rasga, ilumina a
treva”
 Presente histórico – valor de personificação

 Gerúndio – valor de continuidade

 Enumeração

 Metáfora

Qual é o Universo de Referência representado no excerto?

 Viagem de regresso de Jorge de Albuquerque Coelho e restantes marinheiros a


Portugal no ano de 1565;

Acontecimento verídico
Relato com caracter dramático, suscetível de emocionar a opinião pública
Viagem associada às aventuras e desventuras dos Descobrimentos

Tópicos de Análise

 Integrado no capítulo V da obra mencionada, este texto apresenta as seguintes


características:

Foca um acontecimento verídico, com caracter dramático, suscetível de


emocionar a opinião pública, associado às aventuras e desventuras dos
Descobrimentos (neste caso o alto mar);
Os acontecimentos narrados apresentam semelhanças relativamente aos
acontecimentos contados noutros relatos de naufrágios (descrição da
tempestade em que a nau se encontra envolvida e dos danos que daí derivam,
apresentação de cenas de desespero e confissões públicas de pecados);

 Em termos estilísticos, a descrição da tempestade é feita com base em vários recursos,


que imprimem ritmo e dramatismo ao relato:

Vocabulário expressivo relacionado sobretudo com sensações visuais–


“escureceu por completo”; “espumas brancas”
Presente histórico – valor de personificação – “levanta-se”; “leva”; “estilhaça”
Gerúndio – valor de continuidade – “dando”; “arrebatando”
Enumeração – “estilhaça a ponte, o batel, o beque, arrebatando pessoas e
mantimentos”
Metáfora – “Um relâmpago risca, ilumina a treva”

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