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CAMILLA FERNANDA BORO

ELAINE OLIVEIRA MÁXIMO

TELMA PRISCILA MACHADO

FACULDADES INTEGRADAS EINSTEIN DE LIMEIRA - FIEL

OS ASPECTOS EMOCIONAIS DA PESSOA REFUGIADA NO PAÍS DE EXÍLIO.

LIMEIRA/SP
2018
CAMILLA FERNANDA BORO

ELAINE OLIVEIRA MÁXIMO

TELMA PRISCILA MACHADO

FACULDADES INTEGRADAS EINSTEIN DE LIMEIRA - FIEL

OS ASPECTOS EMOCIONAIS DA PESSOA REFUGIADA NO PAÍS DE EXÍLIO.

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado as


Faculdades Integradas Einstein de Limeira – FIEL como
exigência parcial, para obtenção do título de psicólogo.

ORIENTADORA: PROFA. ESP. MILENE BELLANGA LUCHIARI

LIMEIRA/SP
2018
Agradecimentos

Agradeço primeiramente a Deus que esteve e está comigo todos os dias da minha vida e me

proporcionou chegar até aqui. A minha família, pelo amor, apoio, incentivo e paciência.

Aos professores que me proporcionaram conhecimento e crescimento, não apenas na

construção desse trabalho, mas ao longo dos anos na faculdade, em especial à Maria de Fátima

Xavier, Tháyla Kayty Tavares Cardoso Amaral e a minha orientadora Milene Bellanga

Luchiari.

Agradeço as minhas amadas amigas Thais Oliveira e Larissa Oliveira por terem proporcionado

seus conhecimentos e dedicações aos refugiados e as minhas companheiras desse projeto

Elaine Oliveira Máximo e Telma Priscila Machado, pela dedicação, carinho, e por

aprendermos juntas a amar ainda mais os refugiados.

E por fim, a todos que de alguma forma contribuíram para essa conquista.

Camilla Fernanda Boro.


Agradecimentos

Primeiramente agradeço ao meu Deus, por ter me dado capacidade, coragem e perseverança

para que eu pudesse completar mais essa etapa da minha vida. Agradeço a minha família por

ter me proporcionado amor, apoio, companheirismo e paciência.

Aos professores que me auxiliou no meu crescimento e aprendizado, em especial à Maria de

Fátima Xavier, Tháyla Kayty Tavares Cardoso Amaral e a minha orientadora Milene Bellanga

Luchiari, que também proporcionaram a construção desse trabalho.

As minhas companheiras Camilla Boro e Telma Priscila Machado, pelo empenho, dedicação,

carinho e companheirismo que compartilhamos nesta jornada. E também a Thais Oliveira e

Larissa Oliveira por terem nos revelado a importância das pessoas refugiadas.

Elaine Oliveira Máximo.


Agradecimentos

A Deus, que me deu saúde, força e discernimento para que pudesse chegar até essa etapa da

minha vida.

Aos professores que participaram da construção desse trabalho, em especial à Maria de Fátima

Xavier, Tháyla Kayty Tavares Cardoso Amaral e a minha orientadora Milene Bellanga

Luchiari, que ofereceram grande incentivo e me auxiliaram nas dificuldades.

As minhas colegas de grupo, que se não fosse pelo apoio mútuo, o objetivo desse trabalho não

teria sido alcançado.

E a todos que direta ou indiretamente puderam me auxiliar de alguma forma durante a minha

formação.

Telma Priscila Machado.


Resumo

Além dos sentimentos de perda e a fragilidade emocional, o indivíduo refugiado deve se

adaptar a uma nova cultura, ambiente, processo de educação, entre outros. A justificativa da

elaboração deste trabalho se deve à escassez de um olhar mais voltado às questões e

necessidades emocionais das pessoas refugiadas. A partir do levantamento de publicações,

observou-se poucas produções científicas relacionada ao tema, o que gera bases deficientes

para políticas públicas destinadas a esse tipo de atenção. Desta forma, tencionou-se contribuir

para melhorias ligadas à saúde mental e à qualidade de vida desses indivíduos no país de

exílio. Foi realizada uma pesquisa qualitativa baseada em uma breve entrevista pré-

estruturada com 7 indivíduos, com idades acima de 18 anos, do sexo masculino e refugiados

no Brasil, com o objetivo de entender seus aspectos emocionais, os impactos sentidos pelo

fato de terem sido obrigados a buscar exílio no Brasil e como eles sentem que são tratados no

novo contexto em que foram inseridos. O resultado dessa pesquisa foi analisado e

interpretado à luz da teoria psicanalítica, relacionando os aspectos emocionais com os

processos de deslocamento forçado, os desafios pós-refúgio enfrentados no país de exílio e foi

discutido sobre os impasses encontrados no manejo desses refugiados. A hipótese inicial foi

de que seriam encontrados relatos significativos, possíveis traumas e fragilidades existentes

nas falas dos refugiados, tendo em vista os contratempos que provavelmente enfrentaram no

país de origem, a insuficiência das políticas migratórias e as dificuldades relacionadas à

xenofobia e outros preconceitos presentes no país de exílio.

Palavras-chave: Refúgio; saúde mental; fundado temor; perseguição; vulnerabilidade social,

psicanálise.
Sumário
APRESENTAÇÃO........................................................................................................1

1 INTRODUÇÃO.........................................................................................................3

1.1 Políticas públicas e as pessoas refugiadas.................................................................4

1.2 Refugiados e saúde mental........................................................................................7

1.3 A discriminação em um país miscigenado..............................................................11

1.4 A psicanálise e o desenvolvimento emocional........................................................15

1.5 Estágios primitivos e a função do ambiente segundo Winnicott............................17

1.6 A influência do apego, da formação e do rompimento de laços afetivos................21

2 OBJETIVOS............................................................................................................26

2.1 Objetivo Geral.........................................................................................................26

2.2 Objetivos Específicos..............................................................................................26

3 MÉTODO..................................................................................................................27

3.1 Participantes............................................................................................................27

3.2 Instrumentos............................................................................................................27

3.3 Procedimentos.........................................................................................................27

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO.............................................................................29

4.1 Os desafios da pessoa refugiada na construção do sentimento de pertença no país

de exílio.........................................................................................................................29

4.2 Estratégias emocionais para a minimização da dor e da angústia decorrentes da

distância........................................................................................................................37

4.3 A identidade representada pela história e experiências...........................................43

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................49

6 REFERÊNCIAS.......................................................................................................52

7 ANEXOS...................................................................................................................58
1

Apresentação

Mundialmente, um indivíduo refugiado costuma ser àquele que vive o fundado temor

de perseguição ou violência em seu próprio país por motivos de religião, etnia, raça, guerra

civil, catástrofes naturais ou por motivos de séria violação aos direitos humanos, ficando

exposto a situações que colocam sua vida em risco e o forçam a deixar seu país de origem

para buscar asilo no exterior. Observa-se que no país que acolhe um refugiado, o aspecto

subjetivo e emocional nem sempre é levado em conta, tendo em vista que o cuidado com as

pessoas refugiadas visa, primordialmente, o atendimento de suas necessidades físicas (Galina,

Haydu & Martins, 2017). A bagagem de sentimentos e experiências que essas pessoas

carregam tem implicações psicológicas no processo de reintegração social e varia de acordo

com cada um. Cabe ao país de exílio identificar e fornecer métodos e recursos adaptativos

para que o ambiente seja acolhedor e seguro, na intenção de minimizar ao extremo o

desconforto causado pelo deslocamento e rompimento de vínculos.

O tema em questão foi escolhido por chamar muito a atenção das pesquisadoras, visto

que se trata de um tema contemporâneo, e também pelo fato de estar acontecendo atualmente

a maior crise de refugiados desde a segunda Guerra Mundial. O presente estudo iniciou-se

abordando aspectos sobre as políticas públicas referentes ao refúgio, os desafios enfrentados e

a legislação que a embasa. As obrigações públicas possuem um regime específico, devendo

cumprir fundamentos que garantam a satisfação dos interesses públicos. Em seguida, discutiu-

se a saúde mental dos refugiados tendo em vista que a própria situação de refúgio os expõe a

riscos em termos de saúde mental, além das defasadas práticas de cuidado atuais.

Logo após, foi abordado o tema da discriminação crescente no Brasil, que além de

afetar membros da própria sociedade brasileira, também atinge pessoas que buscam exílio no

país. À temática do refúgio e da saúde mental foram acrescidos e articulados pontos da

psicanálise freudiana que são de extrema importância para a análise deste estudo, bem como

as ideias de teóricos psicodinâmicos como Winnicott e Bowlby que contribuíram para o


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embasamento deste trabalho, através dos conceitos de amadurecimento emocional, a

importância do ambiente suficientemente bom no desenvolvimento emocional, a formação e

rompimento de vínculos e a teoria do apego. O objetivo pautou-se em entender os aspectos

emocionais da pessoa refugiada, os impactos sentidos pelo fato de terem sido obrigados a

buscar exílio no Brasil e como eles sentem que são tratados no novo contexto em que foram

inseridos.

Desta forma, o resultado da pesquisa foi discutido estabelecendo-se a relação entre as

respostas obtidas e as teorias mencionadas. Por fim, foram apontadas as principais questões

levantadas na revisão bibliográfica e contestadas na prática, trazendo resultados relevantes

para o melhor acolhimento dessas pessoas no país de exílio.


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1 INTRODUÇÃO

Qual é a condição emocional de uma pessoa refugiada quando já se encontra no país

de exílio? De acordo com os dados de 2016 do Conselho Nacional de Refugiados

(CONARE), o Brasil possui 8.863 refugiados reconhecidos, entre eles pertencem a 79

nacionalidades distintas. Essas pessoas devem ser acolhidas fisicamente, com o básico para a

sobrevivência, mas muitas vezes também precisam receber um cuidado voltado à saúde

mental, pois podem acabar sofrendo pelas perdas que vivenciaram e pela violação dos seus

diretos. Diante dessa condição emocional, Galina, Haydu e Martins (2017) citam que boa

parte das pessoas refugiadas corre o risco de desenvolver transtornos que podem ser

classificados como moderados e severos.

Quando o indivíduo é obrigado a sair do seu país de origem, pode desencadear fatores

como o estresse pós-traumático e depressão, por exemplo. A partir dessa condição, é

necessária a construção de mecanismos de cuidados emocionais para acolher esses indivíduos,

não somente nas necessidades físicas, mas também psíquicas. O cuidado em saúde mental

com essas pessoas é possível através de preparos dos profissionais de saúde que lidam

diretamente com essas demandas, os quais devem se atentar para as suas adversidades

culturais, costumes, crenças e sua compreensão do sistema de saúde, doenças e cuidado.

Além do motivo do deslocamento para outro país, as pessoas refugiadas também se deparam

com mortes de parentes, massacre, violência, tortura, entre outros. O deslocamento forçado e

as experiências vividas podem ocasionar sofrimento psicológico ligado ao possível trauma

que foram submetidas no período pré-migratório (Galina, Haydu e Martins, 2017).

A Organização das Nações Unidas (ONU) possui um organismo denominado Alto

Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), cuja tarefa é auxiliar as

pessoas refugiadas enquanto permanecerem no país de acolhimento. O ACNUR, além de

auxiliar na proteção de refugiados e assegurar seus direitos, também beneficia outros grupos

de pessoas, sendo elas as pessoas apátridas (que não possuem nacionalidade ou cidadania), e
4

pessoas deslocadas dentro de seu próprio país. É válido citar que as políticas públicas

relacionadas às questões de imigração não são suficientes, pois os serviços voltados

unicamente para esse tipo de população ainda deixam a desejar (ONU, 2018).

1.1 Políticas públicas e as pessoas refugiadas.

Segundo Haydu (2016), serviços públicos são aqueles oferecidos pela Administração

ou por seus representantes para que se possam atender as necessidades primárias, que são

necessidades básicas para a sobrevivência, e secundárias, que se referem ao trabalho e estudo

da população. Esses serviços são diferenciados por terem um regime de direito público, ou

seja, devem desempenhar vários princípios que objetivam garantir a satisfação dos interesses

públicos, defendendo de modo eficaz a carência da população por meio de melhoria continua.

Existem dois elementos que abrangem a noção de serviço público: O substrato material e o

traço formal. O substrato material diz respeito aos serviços que são oferecidos à comunidade,

como água, luz, gás, transporte coletivo, etc., e o traço formal consiste na sujeição desses

serviços citados ao regime de Direito Público, pois devem ser observados em uma série de

princípios.

Esses princípios são classificados no Brasil por: Obrigatoriedade do Estado de

conceder o serviço público; Regularidade, onde o Estado deve se atualizar para manter a

melhoria contínua; Supremacia do interesse público, pretendendo acolher as necessidades da

população; Universalidade, que garante o serviço a todos de forma generalizada;

Impessoalidade, relacionado à intolerância de discriminação ou escolha entre usuários;

Continuidade, no qual não pode haver a suspenção ou interrupção dos serviços;

Transparência, que visa comunicar a população sobre o modo como o serviço foi prestado;

Motivação, onde o Estado esclarece as decisões tomadas em relação aos serviços públicos;

Modicidade das tarifas, que devem ter valores acessíveis; Eficiência, que é o controle efetivo

na prestação de serviços públicos; Cortesia, para que os indivíduos sejam tratados com
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cordialidade e sociabilidade; E por último, segurança, que deve evitar que a vida das pessoas

seja colocada em risco. Os imigrantes e refugiados estão inclusos dentro do princípio da

universalidade, no que diz respeito a desfrutar dos serviços públicos. A ordem jurídica

brasileira tem noção da sua obrigatoriedade em prover proteção aos refugiados, o que os deixa

longe da proteção estrangeira e os aproxima da proteção nacional. Desta forma, o Brasil é

obrigado a garantir aos refugiados que tenham direito aos serviços públicos, como trabalho,

educação e saúde, que são princípios básicos dos direitos humanos (Haydu, 2016).

O trabalho da ACNUR (2018) consiste em diminuir os índices de pessoas forçadas a

se deslocar, incitando os países e outras instituições a proporcionarem acesso facilitado aos

direitos humanos, a fim de resolver pacificamente os conflitos, reintegrar os refugiados aos

seus países de origem e precaver novas ocorrências de solicitação de refúgio. Muitos países

garantem os direitos e a proteção das suas populações, porém, no caso dos refugiados, a sua

própria pátria mãe se mostra incapaz dessa garantia. Esses indivíduos que estão em situações

vulneráveis não podem usufruir da proteção do seu país, pois na maioria dos casos são os

responsáveis pelas ameaças e perseguições.

Segundo Haydu (2014, p. 8) “quando essas pessoas vão para outro país e o mesmo não

a recebem e lhes garantem auxílio, podem estar condenando-as à morte ou a uma vida

intolerável”. A pessoa de refúgio não pode ser regressada a nenhum país ou fronteira onde sua

vida possa correr algum risco, desta maneira, a pedra angular é a proteção e o princípio da não

devolução do país de exílio para o país de origem do refugiado, antes que o mesmo ofereça

condições seguras para a sua sobrevivência.

O Brasil tem representado certa influência na área de acolhimento às pessoas

refugiadas desde o início da criação dos conceitos que as defendem e vale ressaltar que a lei

brasileira é declarada como uma das mais evoluídas no assunto, sendo utilizada como modelo

por países vizinhos (ACNUR, 2015). Pessoas refugiadas no Brasil devem ser amparadas pela

Lei 9.474 de 1997, que descreve uma metodologia para a determinação, suspensão ou
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extinção da condição de refugiado, deixando claro quais são os direitos e deveres dessas

pessoas e ditando quais são as medidas mais duradouras e efetivas cabíveis para essa

população.

Os pedidos de refúgio no país são analisados pelo Comitê Nacional para os

Refugiados (CONARE), órgão colegiado e ligado ao Ministério da Justiça que reúne

componentes característicos do Governo, da Sociedade Civil e das Nações Unidas para

analisar e decidir todas as solicitações de refúgio no Brasil. Antes de uma pessoa solicitar

refúgio e embarcar para o Brasil, é recomendado que ela reúna o máximo de provas referentes

ao motivo de sua imigração. Quanto mais provas ela tiver para demonstrar a perseguição

sofrida, maior é a possibilidade de o Brasil reconhecê-la na condição de refugiado (ONU,

2018).

A oportunidade de trabalho é um fator de grande valia para o sucesso da integração

dos refugiados, pois ele é o responsável pela independência financeira que atua na autoestima

e na segurança da sociedade. Uma das dificuldades dos refugiados é de fundamentar, por

meio de documentos, sua formação profissional, escolaridade, habilidades e competências, e

diante desta dificuldade, foram criados programas de identificação vocacional e treinamentos

afins para que o mercado de trabalho possa valorizar os refugiados ao invés de ignorá-los

(Barroso, 2013).

A oportunidade de um emprego, o acesso à educação, moradia, aprendizado da língua

e saúde são fatores importantes para que esse indivíduo se sinta integrado no país de exílio. O

refugiado pode escolher se integrar ou não; quando se integra, mantém sua própria cultura,

porém, faz parte de outra diferente da qual está inserido. Porém, o fato de se integrar ou não,

não depende somente do indivíduo, mas também das condições em que ele está inserido e do

tipo de relações que partilha por conviver com pessoas que não têm os mesmos valores

sociais. Desta forma, a integração é compreendida a partir das políticas do ACNUR, e que

segundo Barroso (2013, p. 6), “o seu entendimento é ampliado à medida que se começa a
7

considerar a importância do governo local e das práticas sociais e legais capazes de

influenciar esse processo”.

Segundo Galina, Haydu e Martins (2017), além de contar com a proteção física, o

refugiado tem direito à assistência básica e aos direitos fundamentais pertencentes a todo e

qualquer indivíduo proveniente de outro país e residente legal no país de refúgio. Esses

indivíduos também devem desfrutar da liberdade de pensamento, deslocamento, serem

respeitados nas decisões que refletem nas suas vidas, ter acesso aos direitos econômicos,

sociais, de trabalho, ensino e assistência médica. Haydu (2016) cita que as Organizações Não

Governamentais (ONGs), que possuem ou não colaboração do Estado, proporcionam

informações referentes à apoio jurídico, social, psicológico, documentação e cursos de língua

portuguesa, colaborando para que os serviços públicos sejam garantidos aos refugiados, mas

muitas vezes os cuidados voltados à saúde mental dessas pessoas são deixados de lado para

suprir o que geralmente é visto como emergencial.

1.2 Refugiados e a saúde mental

De acordo com Antunes (2017), nos últimos anos foi observado que o número de

refugiados só vem aumentando. Essas pessoas fazem parte de uma população que enfrenta

maior prevalência de problemas de saúde mental e que devem ter um tratamento diferenciado,

pois têm especificidades que devem ser vistas pelos profissionais e serviços de saúde em

termos de prevenção primária, secundária e terciária. O sofrimento mental e social que os

refugiados enfrentam é um problema de saúde pública global, visto que os resquícios de

violência, devido à alta prevalência e o seu impacto duradouro, precisam ser vistos

globalmente sendo um desafio em termos de saúde mental.

Antunes (2017) aponta que indivíduos que sofreram conflitos armados em seu país de

origem têm uma pior saúde mental. Vários estudos analisaram os fatores de riscos envolvidos,

entre eles a exposição a acontecimentos violentos e traumáticos, como por exemplo, o rapto e
8

a violação da integridade, assassinato de familiares e amigos, ficar incapacitado devido à

violência, escapar da própria morte, privação de alimentos e água, e de assistência médica,

deslocamento forçado e separação da comunidade e familiares. A violência frequentemente

tem um impacto a longo tempo sobre a saúde mental, incluindo um efeito indireto que pode

afetar as segundas e as terceiras gerações, sentindo o seu impacto em termos de indivíduos,

grupos e sociedade, como uma geração futura de violência.

De acordo com Haydu (2016), foi possível verificar que pessoas de diversas idades,

antes de se verem obrigadas a deixarem seu país de origem, são diariamente expostas a

situações eminentemente traumáticas, como violência física e sexual, testemunho de

atrocidades, acidentes e ferimentos corporais, conforme publicado em 2015 no Guia de

Intervenção Humanitária do Programa de Ação Mundial em Saúde Mental desenvolvida pela

ACNUR e Organização Mundial de Saúde (OMS). Desta forma, parece certo afirmar que

quando os refugiados são forçados a escapar de perseguições em seu país e se reintegrar em

outro país desconhecido, são invadidos por uma série de experiências negativas.

Segundo Haydu (2016), esses eventos traumáticos aos quais a pessoa refugiada está ou

foi exposta podem ocasionar transtornos psíquicos. As condições emocionais dessas pessoas

se constituem em especificidades e os aspectos que se destacam são principalmente o

transtorno depressivo (moderado ou severo), transtorno de estresse agudo e pós-traumático e

o Transtorno do Luto Prolongado – TLP.

Para Serafim e Melo (2010), o estresse agudo e o estresse pós-traumático são estados

graves causados pela violência e agem repercutindo em estados biológicos, psicológicos e

sociais. Para Bahls (2000), no que se refere ao transtorno depressivo, este se fundamenta nas

alterações de humor ou afeto, classificado como sintomas recorrentes a eventos estressantes

que a pessoa refugiada vivenciou. Por fim, para Delalibera e Barbosa (2011), o Transtorno do

Luto Prolongado – TLP é composto por experiências que um indivíduo teve a partir de

perdas, causando reações emocionais tanto físicas quanto comportamentais dentro de um


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tempo superior a seis meses. Esses sintomas se manifestam diante da perda de um ente

querido ou da perda da vida que levava em seu país de origem. Complicações de segundo

plano, como o uso demasiado de substâncias químicas e a ideação suicida também têm uma

prevalência significativa entre pessoas refugiadas, segundo Antunes (2017). Além disso, a

violência agregada ao terrorismo e à guerra está ligada a um grande índice no aumento de

mortalidade e morbidade por abuso de substâncias.

Antunes (2017) diz que os refugiados são grupos minoritários que tendem a procurar

com menor frequência o serviço de saúde quando comparado à do país de exílio, apresentando

sintomas somáticos e delírios que são difíceis de diagnosticar pelos profissionais da saúde.

Muitas pessoas refugiadas não entendem o conceito de medicação quando necessário e os

tratamentos em longo prazo, assim como a distinção entre cuidado primário e as suas

especialidades. Suas experiências e as diferenças culturais dificultam a aceitabilidade de

alguns tipos de cuidados, mas os serviços de saúde nunca devem esquecer o quão importante

são as intervenções preventivas nestas populações. Segundo Antunes (2017), estudos mostram

que as intervenções baseadas na comunidade, sejam em residências, escolas ou grupos, são

efetivas na melhoria da saúde mental dos refugiados. Diante desta panorama, pode-se concluir

que é de extrema importância que sejam criados serviços de atendimentos especializados, com

modelos de intervenção emocionais específicas, os quais possam suprir as necessidades

especiais destas pessoas em termo de sua saúde mental.

Durante a vinda ou a reintegração social no país de refúgio, os refugiados são

convocados a relembrar de situações que geraram sofrimento psíquico devido a gama de

informações que são solicitadas para avaliar o seu perfil durante o acolhimento no país de

exílio. Algumas instituições trabalham cuidadosamente para tentar compreender quais foram

os impactos subjetivos que essas pessoas sofreram, considerando a angústia e a dor por

deixarem seu país de origem (ACNUR, 2015). O sofrimento mental e social devido à

violência é um obstáculo a ser enfrentado pela saúde pública de modo geral.


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Vale ressaltar que o temor da perseguição ou a perseguição real que os refugiados

vivenciam em seu país de origem é algo que pode influenciar negativamente na saúde mental

e acarretar sofrimentos emocionais. O refugiado não deve esquecer a vida passada construída

em sua pátria, muito menos sua cultura deve ser deixada de lado. Para que ele tenha

capacidade de conferir sentido ao trauma sofrido, é preciso que seus próprios elementos

culturais sejam levados em consideração em um possível trabalho psicológico de luto, tal

como a esperança de dar um novo significado a sua história (Haydu, 2016).

Novos vínculos podem ser estabelecidos no país de exílio após o compartilhamento de

sua biografia, mas a criação de novos elos sociais pode ser um desafio para os que conseguem

refúgio. Diante de tais angústias, é imprescindível que haja uma assistência e apoio adequado,

nos quais essas pessoas possam ser consideradas em suas especificidades emocionais sem

torná-las vítimas ou enquadrá-las em algum transtorno mental (Haydu, 2016).

A integração local dos refugiados rodeia as proporções sociais, políticas e econômicas,

e em irrevogável instância, abrange o alcance pela figura da pessoa refugiada da

nacionalidade do país de exílio. Essa ação de integração tem apresentado oscilações de longo

prazo em seu percurso. Foi colocada em prática a partir de doações da Fundação Ford ao

ACNUR no período da Guerra Fria, e nessa época os refugiados gozavam de uma grande

carga ideológica, sendo que a integração das pessoas sujeitas à perseguição dos regimes

socialistas detinha a função de mostrar a força deste último regime. Com o fim da Guerra

Fria, as pessoas refugiadas passaram a ser concebidas como ameaças a sociedade, sendo vistas

como perigo quanto à manutenção da identidade nacional e sendo denegridos pelo racismo e

xenofobia de vários países do ocidente. Desta forma, a prática de integração local foi

extinguindo o seu espaço no âmbito do ACNUR, pois de acordo com Barroso (2013, p. 2) “é

neste momento que o repatriamento ao país de instituto de Relações Internacionais se tornou a

principal prática da agência”.


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1.3 A discriminação em um país miscigenado

O racismo e a xenofobia estão muito presentes entre a população brasileira, nação que

busca constantemente alcançar um padrão branco e europeu, impossível devido a

miscigenação ser a maior característica da cultura nacional. Segundo Silva e Fernandes

(2017), vivemos em uma sociedade preconceituosa e racista que pratica atos de discriminação

e preconceito contra a própria população, e que não obstante, realiza com frequência atos de

xenofobia contra refugiados exilados no Brasil.

Segundo Farah (2017), a Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH) revela em

números que a maioria das vítimas de racismo e xenofobia são haitianos (26,8%), e logo em

seguida, as pessoas de religião muçulmana ou árabe são as que mais recebem ataque de

preconceito (quase 16% da população). O Haiti é um dos países classificados pelo seu enorme

fluxo emigratório, que além do cenário histórico marcado pelo curso de independência da

França, também é notado pelos desastres naturais e epidemias que dificultam ainda mais sua

reconstrução e desenvolvimento.

Apesar de existir a crença social de que os refugiados procuram se abrigar em países

desenvolvidos, tradicionalmente a maioria busca exílio em países em desenvolvimento,

conforme comprovado em 2014 através do índice de 86% dos refugiados exilados nos países

em desenvolvimento. Segundo o site Público (2016), a Amnistia Internacional (AI) publicou

um relatório em 2016 acusando os países ricos de desenvolverem políticas de interesse

próprio e de egoísmo, que irão agravar ainda mais a crise de acolhimento aos refugiados.

Na sociedade brasileira, assim como em outras sociedades, o ato de discriminação

pode ser representado por brincadeiras irônicas, escárnios ou deboches, que são direcionados

em sua grande maioria às pessoas negras ou que estão à margem da sociedade, atitude

considerada pela Lei 9.459 de 1997 como um tipo de violência psicológica. Assim como

citado por Farah (2017), o primeiro artigo desta lei afirma que “serão punidos, na forma desta

lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou


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procedência nacional”. No entanto, apesar dos dados sobre o índice de discriminação contra

refugiados, quase não existem apontamentos de denúncias progredidas à Justiça ou de pessoas

que praticaram tais atos e foram condenadas.

Silva e Fernandes (2017) relatam que na sociedade brasileira, as pessoas negras muitas

vezes não são respeitadas, pois são consideradas como inferiores, perigosas e sujas. Sendo

observado que os atos de deboches, escárnios e piadas vêm se tornando cada vez mais

frequentes, principalmente com os refugiados que acabam de chegar ao Brasil que se

compõem predominantemente de pessoas negras, fica claro que novas ações nesse âmbito

precisam ser direcionadas. Devido ao crescimento do número de refugiados no país, gerou-se

a necessidade de uma ampliação ou até mesmo da criação de uma nova infraestrutura para

acolhimento dessas pessoas. Contudo, é visto que o Estado brasileiro não possui subsídios

para acolher com dignidade esses indivíduos em situação de refúgio, pois as leis e políticas

públicas voltadas a essa população não são colocadas em prática pelo governo.

Através dos desafios encontrados no Brasil, como o domínio da língua, acolhimento,

xenofobia e a discriminação racial, é que podemos tentar vislumbrar a vulnerabilidade que os

refugiados enfrentam em um contexto de exclusão social e de discriminação. Segundo Silva e

Fernandes (2017), essas circunstâncias isoladas ou em conjunto são uma barreira para que

eles se insiram na sociedade exilada ou servem como um gatilho para optarem viver excluídos

do convívio social.

Um dos primeiros desafios que devem ser vencidos para a integração dessa população

é a prestação de acolhimento satisfatório. Não é visto igualdade em contextos de maior

número de diversidade sociocultural, devido às lutas por políticas públicas adequadas e

possivelmente organizadas para que seja garantida a igualdade de tratamento e de acesso a

direitos. As pessoas refugiadas buscam se inserir como cidadãos iguais a todos os demais

habitantes de determinado território, e devido à desigualdade social, esses indivíduos que já

passaram por várias vulnerabilidades sociais, econômicas e culturais, por exemplo, são
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expostos novamente à exclusão. Essa desigualdade pode ser vista nas diferentes realidades,

como nas relações interpessoais ou profissionais (Silva & Fernandes, 2017).

Diante do poder público, de modo geral, não há acolhimento para os refugiados, essa

responsabilidade fica a cargo da sociedade civil, de ONGs e instituições religiosas. Desta

forma, construir vínculos entre as principais instituições de apoio ao refugiado auxilia na

elaboração de políticas públicas relacionadas ao tema. Farah (2017, p. 29) destaca que várias

dessas entidades oferecem serviços voluntários, que não se delimitam em apenas acolher, mas

também, em oferecer serviços de encaminhamento e mediações no emprego, curso de língua

portuguesa e auxílio na regularização dessas pessoas no território brasileiro. Quando

aprendem o português, as pessoas refugiadas adquirem maior autonomia para falar sobre as

intolerâncias sofridas no Brasil.

Segundo Farah (2017), a luta contra a xenofobia deve envolver principalmente quem

sofre com ela, em um impulso comum entre brasileiros e estrangeiros. O exercício da cultura

de paz atualmente diz respeito a abraçar a causa dos refugiados e demonstrar ação em virtude

da proximidade e troca entre os seres humanos. É importante salientar que não compete a

ninguém promover discriminação, por isso essa solidariedade não deve ser exclusiva a

determinado grupo. Independente da nacionalidade, cultura ou religião, o indispensável é a

dignidade humana, pois a imigração faz e sempre fará parte da história da humanidade.

Como fica a cargo do ACNUR proporcionar condições internacionais para a proteção

dos refugiados e inspecionar a sua execução, qualquer Estado que tenha autenticado a

Convenção de 1951 ou o Protocolo de 1967 está obrigado a cumprir as normas estipuladas

pelo Estatuto do Refugiado, produto do Programa Nacional de Direitos Humanos de 1996,

tendo como exemplo:

Não discriminar ninguém em virtude da sua raça, religião, sexo e país de origem e

respeitar o princípio do ‘non refoulement’, ou seja, não poder “devolver” ao país de

origem alguém que no mesmo possa vir a ser vítima de perseguição (Farah, 2017, p.
14

19).

A migração de árabes pode ser considerada histórica no país desde o século XIX, e por

isso é necessário compreender esse fluxo migratório para que exista condições de

implementar políticas públicas que atendam a carência deste e de outros povos que solicitam

refúgio. A intenção deve ser focalizar a diminuição dos conflitos e facilitar a integração social

dos refugiados, visando primordialmente o campo educacional para aplicar medidas que

evitem o aumento da xenofobia e preconceito contra a população refugiada no país. Assim

como Farah (2017) afirma, a educação não é apenas para transmitir conhecimento científico, é

o espaço privilegiado de desenvolver valores. É necessário que os estudos feitos por

pesquisadores nesta área abarquem a sociedade e as políticas públicas vitais para o

planejamento de ações afirmativas e agregativas.

O Brasil tornou-se, na década de 90, um país de emigrantes (Farah, 2017, p. 15), e

mesmo que não seja recomendada a expulsão ou discriminação dos brasileiros em países que

os acolhem, ainda sim os discursos xenofóbicos prevalecem dentro do país. Para combater

intolerâncias de qualquer gênero, é necessário que se realize conscientizações através de

congressos e debates, incluindo essencialmente os conceitos de promoção da não violência, da

cultura de paz e da permissão de expressões culturais dos diversos povos presentes no país.

No exílio, tanto teóricos como os próprios refugiados debatem há tempos se a

experiência de ser forçado a se deslocar de país fortalece ou atormenta mais quem a vivencia.

Alguns acreditam que a longa distância do fundado temor de perseguição e a possibilidade de

ter uma identidade renovada em uma cultura distinta é vista como algo muito útil e

proveitoso, enquanto outros afirmam que o distanciamento físico de suas raízes tem sentido

de abandono, o que promove angústia e pode levar ao suicídio (Barakat, 1987 citado por

Farah, 2017). Portanto, Lussi (2015) afirma que as políticas públicas criadas especialmente

para os refugiados reforçam a importância da integração social desta população,


15

possibilitando que seus direitos possam ser promovidos, permitindo a integração social e a

prevenção de novas violações de direitos.

Tendo em vista que este trabalho interessa-se nos aspectos da saúde mental de pessoas

refugiadas, os dados coletados serão analisados sob a perspectiva psicanalítica, cujos

principais autores utilizados são Donald Woods Winnicott e John Bowlby. Para tanto, faz-se

necessário desenvolver uma breve introdução sobre o nascimento da psicanálise.

1.4 A psicanálise e o desenvolvimento emocional.

Segundo Kahn (2015), Freud mudou grande parte da percepção das pessoas ao que

refere à compreensão de si e aos paradoxos da própria mente. Após a Segunda Guerra

Mundial, ao elaborar suas ideias e apresentá-las à Sociedade Médica de Viena por volta dos

anos 60, a popularidade de Freud cresceu e declinou constantemente, tomando um rumo em

diversas subculturas ao abordar sua compreensão sobre a mente humana. Ao longo dos anos,

seus seguidores e admiradores profissionais elaboraram concepções que favoreceram a

provisão de um ambiente mais humano e amistoso no que se refere ao cuidado com a saúde

mental. Seus seguidores abordaram e reiteraram as ideias feitas por Freud, sendo que até o

próprio realizou reformulações de suas ideias e práticas psicanalíticas ao longo de sua vida.

Vale ressaltar que a grande descoberta da psicanálise foi o inconsciente. O termo

inconsciente se origina da ideia de um lugar psíquico que dispõe de mecanismos utilizados

para conter pensamentos recalcados, muito além do que podemos, se quer, imaginar. Logo, a

partir das experiências inconscientes, o Id foi caracterizado como uma das três estruturas do

aparelho psíquico postuladas na segunda tópica de Freud (1923/2006), estrutura essa que é

inteiramente regida por uma força inconsciente, sendo um depósito de energia psíquica que

visa diminuir a tensão e o desconforto e aumentar o prazer para obter uma satisfação imediata.

Para Freud (1923/2006), o bebê é puro Id no início da vida e não é capaz de distinguir-

se da mãe. Ao longo do tempo vai se moldando com base no princípio de realidade, e a partir
16

disso, surge a ideia de ego, que basicamente é definido como um mediador entre a fantasia e o

mundo real. De início, o ego age de acordo com as exigências do Id para não ser frustrado

diante à realidade e vai se adaptando gradualmente às imposições externas, porém,

inevitavelmente todo ser humano está sujeito a pulsões que podem causar frustrações

intolerantes à consciência. Desta forma, surge o conceito do recalque, que para Freud

(1923/2006), se caracteriza como um mecanismo de defesa que busca reter no inconsciente

todas as menções e prévias das pulsões que abalariam a estabilidade psicológica do indivíduo

caso viessem à tona.

Para Freud (1972/1980, citado por Jorge, 2008), o recalque é como um bloqueio que

protege a integridade do ego, mas que rouba muito da energia psíquica do sujeito caso haja

uma séria batalha entre o conteúdo recalcado e o mediador da realidade. O recalque age como

uma defesa do ego para que ele possa suportar uma nova realidade. Esse bloqueio pode

refletir em algumas atitudes que não possuem prévias explicações no plano consciente, mas

que podem ser amenizados com o devido apoio psicológico. Assim, é possível dizer que as

necessidades do Id são mais voltadas para a satisfação imediata do prazer, ou seja, da ordem

do primitivo e fisiológico, enquanto as do ego são concebidas como necessidades sociais,

relacionadas ao amor-próprio e a respectiva reputação, visto que essa instância se forma a

partir do vínculo mãe-bebê.

Winnicott (1955d/2000), em sua teoria sobre o amadurecimento emocional, fala sobre

os estágios primitivos do desenvolvimento emocional. Afirma que grande parte dos

problemas emocionais de um ser humano está relacionada às etapas precoces do

desenvolvimento. Seu estudo se concentrou na relação mãe-bebê por acreditar que a base da

saúde mental é moldada na primeira infância pela relação com a mãe, representante do

ambiente externo. Elaborou também a ideia que as privações emocionais nos estágios

primitivos do desenvolvimento estão na base da psicose. Tais concepções decorriam da

observação das relações mais precoces entre mãe-bebê.


17

1.5 Estágios primitivos e a função do ambiente segundo Winnicott.

Winnicott (1965, citado por Rocha, 2006) diz que todo o ser humano traz consigo para a

vida um potencial genético herdado e a tendência ao amadurecimento, que fazem parte do ser

desde a sua concepção no ventre materno. O autor lembra que essa tendência não deve ser

considerada como algo óbvio, visto que seu bom desenvolvimento depende muito do apoio

oferecido pelo suporte ambiental.

Para Winnicott (1955d/2000), o bebê não pode existir sem uma mãe e sem um

ambiente, devendo haver uma relação harmoniosa entre ambos para que o primeiro evolua e

desenvolva seu potencial de crescimento e amadurecimento. Primordialmente, existe uma

indiscriminação entre interno e externo e o bebê tem a ilusão de que o seio da mãe é uma

criação sua, prolongando assim sua onipotência narcísica nos primeiros meses. Nesta fase, a

mãe ou alguém que faça seu papel é um elemento muito importante, pois é uma figura vista e

sentida pelo bebê como sendo parte dele próprio e que aos poucos pode servir de auxílio ou

não no caminho rumo à integração. Winnicott (1965, citado por Rocha, 2006) utiliza este

termo para se referir a uma parte do processo de amadurecimento do ser humano, formado

pelas experiências consideradas individuais.

Após o nascimento, o autor ressalta um estado materno importante nomeado

Preocupação Materna Primária. Esse estado condiz a uma condição especial da mãe, de

sensibilidade aumentada, que ocorre desde a gestação até os primeiros meses de vida do bebê

em que ela é capaz de se identificar com ele, fornecendo um ambiente suficientemente bom

para que ele possa se desenvolver. Consequentemente, esses cuidados resultarão no bebê o

sentimento de segurança e afeição, ou de contrapartida, um sentimento de desabrigo originado

por falta de cuidados essenciais. Ou seja, a mãe que se atenta em amparar as necessidades de

seu filho, concebe a possibilidade do bebê “experimentar momentos espontâneos e se tornar

dono das sensações correspondentes a essa etapa inicial da vida” (Winnicott, 1956/1958n,

p.403, citado por Ciccone 2013, p. 64).


18

No início da vida, o bebê está totalmente imerso na dependência absoluta do ambiente,

que precisa estar em sintonia com o bebê a fim de atender prontamente as suas necessidades.

Winnicott (1955d/2000) afirma que quando essa criança é atendida sem invasão, tendo um

espaço de tempo entre as mamadas, entre uma forma de segurar e outra, vai sendo construído

um registro de continuidade de um ser que deve ser respeitado, mantido e não invadido pelo

ambiente. Se seu potencial inato que tende ao amadurecimento for satisfatório e a mãe for

suficientemente boa, esse bebê sofrerá muito pouco com a intrusão do ambiente. Mas se os

erros ambientais não forem rapidamente corrigidos e ocorrerem com frequência, o bebê será

comprometido e seu desenvolvimento poderá entrar em colapso. As experiências que afetam a

criança no início da vida são guardadas na memória, onde acabam incitando sua confiança ou

não no mundo externo.

Segundo Fulgêncio (2006, citado por Ciccone, 2013), Winnicott adverte que quando o

ambiente opera de modo satisfatório, o processo do amadurecimento é enriquecido por um

desenvolvimento emocional saudável, ou seja, esse processo que percorre por toda a vida se

estabelece à integração, onde há uma separação entre um eu e um não-eu. Com o suporte de

um ambiente suficientemente bom, é possível que esse sujeito se reconheça como uma pessoa

integrada que se permite relacionar com outras pessoas saudavelmente. Ciccone (2013) afirma

que Winnicott procurou entender o desenvolvimento emocional a partir da observação do

vínculo mãe-bebê e de sua prática clínica, elaborando conceitos que levaram a estudos sobre o

verdadeiro e falso self.

Conforme o autor supracitado, o bebê necessita de cuidados físicos e emocionais desde

o início da vida, uma sustentação externa que garanta seu bom desenvolvimento. Mesmo que

o ambiente seja essencial, não é o único fator responsável pelo seu crescimento. Para

Monteiro (2003), dois dos mais importantes conceitos citados por Winnicott para que isso

aconteça é o holding e o handling. O holding se refere justamente à experiência física dos

primeiros cuidados, como por exemplo, sustentação do colo materno e a amamentação. Já o


19

handling é baseado na experiência que é proporcionada pela mãe, a qual se refere ao contato

desta com o bebê na intenção de facilitar a formação de ligações psicossomáticas (Monteiro,

2003). É na fase da dependência absoluta que esses cuidados são primordiais, pois é nela que

se assenta o processo de maturação, e após alguns meses de atenção especial voltada ao bebê

nesta fase, a mãe tende a retomar aos pouco à sua vida que vai se desadaptando das

necessidades iniciais do bebê (Rocha, 2006).

Então, o bebê pode caminhar para o próximo estágio do desenvolvimento emocional,

denominado por Winnicott (1965r, citado por Rocha, 2006) de dependência relativa, no qual a

mãe, a partir de sua percepção do desenvolvimento do bebê, pode passar a apresentar falhas

progressivas e benéficas às suas necessidades. Essa atitude gera no bebê uma desadaptação

gradativa em relação ao ambiente, no sentido de que ele consiga suportar por mais tempo a

ausência de alimento ou colo, por exemplo. Neste estágio, o bebê tende a perceber sua mãe

como um ser individual e separado dele, começando a se dar conta da sua dependência no

ambiente e adquirindo capacidade de relacionar-se com objetos, caso a mãe represente um

ambiente favorável. Winnicott (1971f, p.5, citado por Rocha, 2006, p.18) destaca que por ser

uma adaptação gradual, é extremamente importante que a mãe consiga representar esse

ambiente suficientemente bom por um tempo consideravelmente longo, do contrário, essa

capacidade do bebê de se relacionar com objetos pode ser perdida parcial ou totalmente.

Se a adaptação oferecida pelo ambiente for promissora, capacitará o bebê para que ele

alcance o próximo estágio do desenvolvimento emocional, conhecido como rumo à

independência. É possível alcançá-lo à medida que a mãe faz com que seu bebê seja capaz de

lidar com as complexidades do mundo. O que antes era somente o bebê e sua mãe passa a

abranger o pai, os familiares e um conjunto cada vez maior. Apesar de utilizar o termo

“rumo” à independência, Winnicott (1971f, p.3 citado por Rocha, 2006, p.18) afirma que não

existe a independência em si, pois para ele, todo ser é eternamente dependente de outro até o
20

fim de sua vida, a busca pela independência sempre será contínua mesmo quando já existir

capacidade de autocuidado.

A adequação da mãe às necessidades do bebê dá a ele a ilusão de que a realidade

externa coincide com a sua capacidade de criar. Depois de ter proporcionado a ideia de ilusão,

a mãe apresenta ao bebê a desilusão, atitude esta que faz com que a prática criativa se

internalize e torne-se fonte intrínseca do viver criativo. No que se refere à criatividade para

Winnicott (1956/1958), compreende-se que sua origem se dá no momento do nascimento,

quando o bebê busca alcançar algo que remete a uma autonomia e é própria do estar vivo.

Segundo Ciccone (2013), Winnicott correlacionou a criatividade ao viver, como algo

que é compreendido como belo e que está no indivíduo que vivenciou o amparo materno,

podendo viver em um mundo em que existe a realidade compartilhada. Portanto, a integração

e a personalização se dão em fases primitivas, as quais ocorrem para o fortalecimento do seu

ego. Na medida em que sucede o processo de diferenciação entre mãe-bebê, do verdadeiro

self se origina o gesto espontâneo, que como dito por Winnicott (1965, citado por Ciccone,

2013) somente o self verdadeiro pode ser criativo e se sentir real. Deste modo, pode-se dizer

que poder o sentimento de se sentir real decorre da criatividade do verdadeiro self, logo, flui o

sentimento de significação da vida. Consequentemente há uma relação de compartilhamento

entre o indivíduo com a realidade, e não uma relação de confronto.

Para Ciccone (2013), as relações primárias são fundamentais para as relações futuras,

e primordialmente, para a saúde mental do sujeito, do seu meio social e sociedade. A autora

fala sobre uma importante etapa do desenvolvimento emocional, que para Winnicott, se

remete ao verdadeiro self e o gesto espontâneo como sinônimo de ser criativo. Em suma, o

indivíduo que vivenciou um ambiente suficientemente bom e que pôde desfrutar das

condições maternas para constituição de si mesmo no seu desenvolvimento gradual,

experimenta uma realidade que permite o sentimento de onipotência. Esse sentimento

possibilita a criação do mundo com bases sólidas que proporcionarão o fortalecimento de um


21

ambiente que atendam às necessidades do bebê, resultando em um ambiente suficientemente

bom.

Como disse Winnicott (1970/1986h, p.23, citado por Ciccone, 2013 p.77):

A criatividade é o fazer que, gerado a partir do ser, indica que aquele que é está vivo,

viver criativamente é preservar algo de pessoal, talvez algo secreto, que é

inconfundivelmente você mesmo, no viver criativo: Não há submissão, há liberdade e

espontaneidade, há convicção de ser si mesmo.

Ou seja, a potencialidade que resulta do sentir-se real o leva ao desenvolvimento da

personalização, sentir-se o protagonista de um mundo que ele mesmo criou, que participa e

compartilha, não um mundo de infâmia. Gera um sentimento fortalecido de significados

importantes que o leva a enfrentar as dificuldades próprias do viver (Ciccone, 2013).

Além de Winnicott, é possível se basear nas obras de John Bowlby no que diz respeito

aos estudos sobre as contribuições do ambiente provido a uma pessoa para o seu

desenvolvimento psicológico.

1.6 A influência do apego, da formação e do rompimento de laços afetivos.

Bowlby (1982/1997) fala em sua obra relacionada à formação e rompimentos de laços

afetivos, sobre a teoria de ligação, destacando que os seres humanos são propensos à

formarem vínculos afetivos com outros indivíduos e lugares. Explica a ansiedade, depressão,

raiva e desligamento emocional como sendo sofrimentos ocasionados pelas separações e

perdas inesperadas.

Um estudo realizado com macacos Rhesus em 1958 por Harry e Harlow (1905-1981)

sugeriu que o apego se refere mais à segurança emocional do que à comida, ao simular duas

mães artificiais aos macacos filhotes: uma feita somente de arame, mas que fornecia leite, e

outra que também era feita com essa armação, mas que foi forrada com pano felpudo e

confortável e não disponibilizava leite aos filhotes. O resultado mostrou que os filhotes se
22

apegaram mais à mãe macia, e esta preferência mantinha-se independente de qual mãe

fornecia o alimento.

Este e outros estudos sobre o tema do apego fizeram Bowlby (1982/1997) questionar o

modelo clássico que discorria sobre a gênese dos vínculos afetivos. Este modelo era pautado

na ideia de que os vínculos se formavam no momento em que o indivíduo se dava conta de

que para satisfazer certos impulsos, como alimentação na infância e sexo na vida adulta, seria

necessária a presença de outro ser humano. Portanto, isso definia que os seres humanos

possuem duas espécies de impulsos, os primários (de dependência) e os secundários (relações

sociais).

Seu questionamento sobre o tema fez com que ele criticasse este modelo e formulasse

bases para o conceito de comportamento de ligação, que se refere a qualquer comportamento

emitido e que resulte na proximidade de um indivíduo a outro que seja considerado alguém

diferenciado dentre os demais, podendo ser generalizado quando se trata de objetos ou lugares

(Bowlby, 1982/1997). Esse conceito compreende os comportamentos de choro e apelo, por

exemplo, que acarretam muitas vezes em carinho e atenção por parte do outro. Apesar de ser

mais evidente nas crianças em seus primeiros anos de vida, o comportamento de ligação faz

parte do ser humano desde o nascimento até a morte. Na vida adulta, essas reações são

principalmente evidentes quando o indivíduo está consternado, doente ou assustado.

As questões de curto e longo prazo que norteiam as perspectivas sobre os

relacionamentos entre os seres humanos também são colocadas por Bowlby (1989) sob a luz

da teoria do apego. Essa teoria se define basicamente pela ideia de que o cuidado materno (ou

de qualquer outra figura que desempenhe esse papel) durante a infância é essencial para

impulsionar o desenvolvimento psíquico até a idade adulta. A função do apego abrange o

entendimento de que a figura a qual se está apegado é acessível e disponibiliza respostas aos

sinais, gerando sensação de cuidado e proteção, o que reforça a relação entre ambos os
23

envolvidos. Tal fenômeno é visto como um impulso biológico, condizendo com a necessidade

de proteção e segurança que visa manter o equilíbrio do organismo.

Pontes, Silva, Garotti e Magalhães (2007) ao citarem Bowlby (1969/1990), afirmam

que esse aspecto remete à definição clássica da teoria do apego, visto que diversos outros

autores posteriores a Bowlby destacaram aspectos contemporâneos derivados deste vínculo

inicial, como por exemplo, o apego e as relações conjugais, o apego e as relações entre

irmãos, apego e cultura e apego e contexto de desenvolvimento.

Bowlby (1989) diz que, a depender do tipo de acolhimento fornecido pela figura de

apego e do ambiente, o modelo interno de funcionamento e o estilo de regulação das emoções

de determinado indivíduo podem variar. O apego seguro, segundo ele, proporciona uma

formação de modelos internos definidos por reconhecimento e suporte às necessidades, os

quais se derivam das experiências sociais positivas vividas nas relações mútuas. Já no apego

inseguro, os sentimentos de reconhecimento e suporte não são proeminentes devido à

vivência de relações em que o cuidado necessitado não foi provido, o que provavelmente

desenvolve no indivíduo expectativas negativas que serão refletidas nas suas relações ao

longo da vida.

Bowlby (1982/1997) também fala sobre as consequências do rompimento de laços

afetivos. Ainda sob o olhar da perspectiva da infância, ele diz que quando a criança é retirada

dos cuidados maternos, a situação pode ocasionar num rompimento afetivo e abalar o vínculo

mãe-bebê, que a depender da idade da criança, pode levá-la a um estado composto por três

fases. O autor cita as fases de protesto, desespero e desligamento após este rompimento. Na

primeira fase, que pode durar por vários dias, a criança apresenta-se raivosa e com choro

constante, acreditando que ainda irá rever a mãe. Após isso, a criança se mantém em um clima

calmo, ainda desconfiando que verá sua mãe, mas as suas esperanças se perdem e a ela entra

na fase de desespero. Essas fases constantemente se alternam; a esperança converte-se em

desespero e o desespero é convertido em renovada esperança. Por fim, a terceira fase se


24

constitui na perda definitiva do contato materno, no qual o bebê se desliga totalmente da

lembrança da mãe, que para ele já está morta.

Já na vida adulta, as reações diante de perdas e rompimentos são praticamente

semelhantes, pois Bowlby (1982/1997) fala respectivamente sobre a fase de torpor, de

saudade e busca pela figura perdida, de desorganização e desespero e a fase de maior ou

menor grau de reorganização. Na fase de torpor, geralmente a pessoa que sofreu uma perda

muito grande mostra-se confusa e faz uso da negação por ainda encontrar-se incapaz de

admitir o que foi perdido. Esta fase pode durar dias ou até semanas, podendo ser intermitente

entre episódios de desolação e raiva acentuados.

Após essa fase, geralmente a realidade se sobressai de modo episódico e faz com que o

indivíduo se dê conta da perda pela qual esta vivendo, o que pode gerar crises de choro e ao

mesmo tempo alvoroço em relação aos pensamentos e sensações referentes ao que foi

perdido. Essas particularidades são típicas da fase de saudade, que pode também desencadear

um forte impulso de busca real pela figura perdida seguido de desorganização e desespero, o

que suscita choro e raiva, características normais do luto e que não raramente, podem durar

por anos a depender do vínculo do indivíduo com a figura perdida. Algumas pessoas tendem a

se inibir, outras, a extravasar o sofrimento na forma de gritos, tal como uma criança

abandonada, e assim como essa criança manifesta tal comportamento na intenção de que sua

mãe a escute ou que alguém a auxilie na busca pelo que foi perdido, acredita-se que com o

adulto os episódios ocorrem com o mesmo objetivo em mente, seja ele consciente ou não

(Bowlby, 1982/1997).

Por fim, a quarta fase desse processo na vida adulta, que é a de maior ou menor grau de

reorganização, é definida por uma aceitação da perda imutável e é percebido que uma nova

vida precisa ser iniciada, se referindo à redistribuição da energia do investimento objetal ao

ego, mas que não isenta uma nova ocorrência de episódios de saudade e tristeza. Lewis (2000,

citado por Dalbem & Dell'Aglio, 2005), afirma que as rupturas de vínculos são inevitáveis,
25

mas a possibilidade de crescimento e a formação de novos laços afetivos dependerão de como

essas experiências de ruptura foram vivenciadas e elaboradas pelo sujeito.


26

2 OBJETIVOS

2.1. Geral

Compreender os sentidos afetivos/emocionais atribuídos pela pessoa refugiada ao

processo de chegada ao país de exílio até sua adaptação às exigências nacionais, procurando

entender as vivências anteriores que puderam influenciar nessa inesperada transição de vida.

2.2 Específicos

✓ Verificar, por meio de entrevista semiestruturada, os aspectos emocionais da pessoa

refugiada no país de exílio.

✓ Identificar as normas de acolhimento do país de exílio.

✓ Averiguar se as pessoas entrevistadas apresentam indícios de transtornos psicológicos

em relação as experiência do refúgio.

✓ Analisar as respostas mais frequentes de acordo com os dados coletados para que se

possa fazer o levantamento das maiores dificuldades enfrentadas pelos refugiados.

Hipótese: Há prejuízos nos aspectos emocionais da pessoa refugiada no país de exílio e

surgirão relatos marcantes, possíveis traumas e fragilidades nas respostas dos participantes.
27

3 MÉTODO

3.1 Participantes

A pesquisa foi realizada com 7 indivíduos refugiados no Brasil, do sexo masculino,

com idade mínima de 18 anos e máxima de 60 anos, integrantes de uma instituição

especializada no cuidado aos refugiados. Foram incluídos aqueles que conseguiam se

comunicar na língua portuguesa, sem comprometimento cognitivo, perceptual e patologias

que pudessem comprometer na realização da entrevista.

3.2 Instrumentos

O instrumento utilizado para coleta de dados foi uma entrevista semiestruturada

(Anexo 1) com 15 questões, sendo 3 de caráter sócio-demográfico e 12 abertas. As questões

sócio-demográficas se referem à identificação do sujeito, que auxiliaram na descriminação da

amostra, já as abertas abordam as questões emocionais, sociais, econômicas e familiares. A

elaboração das questões foi realizada a partir das literaturas encontradas pelas pesquisadoras e

a entrevista teve a duração de aproximadamente 40 minutos. A intenção foi entender os

aspectos emocionais desses indivíduos, os impactos sentidos pelo fato de terem sido

obrigados a buscar exílio no Brasil e como eles sentem que são tratados no novo contexto em

que foram inseridos.

3.3 Procedimento e cuidados éticos

Para realização da pesquisa, as pesquisadoras participaram de uma apresentação

organizada mensalmente pela instituição que traz um resumo de seu trabalho e as principais

dúvidas sobre refúgio. Após a apresentação, foram verificadas as demandas e a possibilidade

da realização da pesquisa. Depois da autorização do responsável pela instituição e a

aprovação do projeto de pesquisa pelo Comitê de Ética em Pesquisa das Faculdades

Integradas Einstein de Limeira – CEP/FIEL com parecer de número 2.703.893 (Anexo 2), as
28

pesquisadoras explicaram os objetivos, procedimentos e o Termo de Consentimento Livre e

Esclarecido - TCLE (Anexo 3) para os participantes. Aqueles que assinaram o TCLE foram

convocados para a entrevista individual, que ocorreu na própria instituição e foi gravada.

Após a transcrição das gravações, o áudio foi destruído.


29

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Essa seção discorre acerca dos resultados encontrados por meio da realização da

entrevista de caráter qualitativo, acompanhada da respectiva discussão das informações

levantadas. Inicialmente, as entrevistas serão exploradas em forma de análise de conteúdo, a

qual será classificada em três temas para maior compreensão dos dados obtidos. Em seguida,

serão exibidas correlações entre os resultados e as teorias apresentadas neste trabalho.

4.1 Os desafios da pessoa refugiada na construção do sentimento de pertença no país de

exílio

O movimento migratório de refugiados no Brasil e em outras regiões do mundo

acontece há tempos, mas atualmente esse número tem crescido bastante. O ano de 2017 foi o

maior em números de pedido de refúgio, sem considerar a chegada de venezuelanos e

haitianos no Brasil (ACNUR, 2018). Essa crescente busca por exílio no país, incita a reflexão

sobre crenças relacionadas à miscigenação brasileira, algo que causa, de alguma forma, a

ideia de que aqui todos são bem aceitos, sem qualquer tipo de discriminação ou desigualdade

(Farah, 2017). Neste sentido, é possível citar o caso de haitianos e africanos que chegam ao

Brasil no intuito de viver e trabalhar em um lugar isento de preconceito, visto que na

percepção deles, um país que possui em sua população um número majoritário de pessoas

negras dificilmente iria promover a segregação dos indivíduos. Na prática, pode-se observar

que não é isso que realmente acontece, pois o número de refugiados haitianos e africanos que

sofrem ou já sofreram algum tipo de discriminação no Brasil é alarmante. A maioria dos

entrevistados ouvidos na presente pesquisa citou, como uma das maiores dificuldades

encontradas em permanecer no país de exílio, o preconceito e o racismo praticados pela

população brasileira, sendo válido ressaltar que os participantes eram negros.

O entrevistado P., natural da República Democrática do Congo e que está há 5 anos no

Brasil, declarou que em seu país de origem foi sequestrado e torturado três vezes devido a
30

questões políticas e ideológicas, logo após ter sido motivado a investigar um massacre que

aconteceu no sudeste de seu país, algo que, segundo ele, o deixou muito intrigado. Isso fez

com que P. se tornasse mais uma das vítimas do conflito que já deixou milhões de mortos no

país e que se estende há mais de 20 anos. Para ele, a questão da guerra causou uma enorme

instabilidade política no país que dura até hoje e que se agravou ainda mais após o atual

presidente da República Democrática do Congo, que está no poder desde 2001, se enjeitar a

deixar seu posto no fim de seu segundo mandato e acentuar a atuação do exército contra os

opositores do governo. Outro fator que motiva os conflitos no Congo, segundo ele, é a

exploração vertiginosa praticada por empresas estrangeiras de matérias-primas produtivas

naturais do país, principalmente de Cobalto e Coltan, utilizados em larga escala na produção

de baterias para diversos aparelhos eletrônicos, como celulares e laptops.

Segundo suas afirmações, P. presenciou diversas situações aversivas em seu país,

como estupro de mulheres, exploração e morte de inocentes. Após sua chegada no Brasil

esses assuntos lhe causavam muito sofrimento e no início procurava não falar sobre esses

acontecimentos. P. disse que apesar de ter chegado ao Brasil e não ter recebido nenhum apoio

psicológico ou emocional, conseguiu se reerguer sozinho, gradualmente, criando forças para

falar sobre os abusos que aconteceram e ainda acontecem em seu país, e que hoje em dia, a

maior dificuldade que encontra em permanecer no Brasil é ser vítima de racismo. P. afirmou:

“A cultura daqui também é diferente, sem falar que o Brasil é um país muito racista. Já

passei por alguns países diferentes, mas nunca vi racismo na mesma proporção que vejo

aqui, é um racismo velado. Aprendi o que é ser negro aqui no Brasil.”

Já outro entrevistado, A., natural do Mali, disse: “[...] aqui no Brasil não tem racismo

estampado, mas no dia a dia você sente esse racismo, sabe... No dia a dia, que você tem que

andar de metrô e senta ao lado de uma branca, percebe que a branca levanta dali, te deixa

sozinho, sentado... Em uma reunião de serviço, você chega e de repente as pessoas se retiram

da sala, deixam você sozinho. Eu sinto isso no dia a dia. Mas depois você entende que Deus
31

nos fez humanos, Deus fez a vida, a vida que todos respiram. Isso tem que passar pela

cultura, pelo entendimento das pessoas, elas precisam saber que todos somos iguais. Eu já

estou habituado.”

Em síntese, ambos disseram que a cultura do racismo parece estar tão enraizada na

população brasileira, que muitas vezes as pessoas não percebem que estão sendo racistas ao

emitir alguns comentários ou ações dirigidos a imigrantes e/ou refugiados. Assim como

Greenwald e Banaji (1995) citam, existe um termo dentro da psicologia que pode ser

associado a esse fato, chamado de “viés inconsciente”, que ocorre quando um tipo de

associação involuntária gera pressupostos, opiniões e ações que um indivíduo tem diante de

outro, decorrentes de costumes coletivos típicos da cultura. Memórias antigas de qualquer

natureza, como a da própria história de escravidão vivida no Brasil, novelas, filmes ou

conversas carregadas de estereótipos podem ser vistos como uma base para que o viés

inconsciente interfira nas decisões e opiniões cotidianas portadoras de racismo. Ou seja, para

Custódio (2015), o racismo no Brasil se reproduz em nível invisível na maioria das vezes,

algo que dificulta muito a sua erradicação da sociedade.

A hierarquia racial é parte das camadas que estruturam a pirâmide de privilégios

compositora da cultura e da sociedade (Custódio, 2015). Essa estrutura de privilégios exibe a

forma como o racismo se reflete dentro dela, sendo este um criador de obstáculos reais aos

afetados, como a dificuldade de acesso à educação e ao emprego – citada pela maioria dos

entrevistados – e também as dificuldades que muitas vezes levam o refugiado a acreditar que

não é capaz de conseguir o que deseja, fazendo-o se auto-excluir do meio em que está

inserido. Segundo uma das respostas do entrevistado A., que também já está há 5 anos no

Brasil, o maior culpado de haver essa segregação de raças é o colonizador. Ele afirmou: “O

próprio colonizador não soube diferenciar corretamente as pessoas, esse paradigma de

racismo... O principal culpado é o colonizador, os europeus. Eles não conseguiram introduzir

a irmandade entre o povo. Se você olha no tempo do ‘apartheid’, o próprio nome já diz que
32

há uma separação. E se há separação, você já declara um racismo. Você já é racista desde

então.”

Assim como as pessoas negras muitas vezes não são respeitadas porque são

consideradas como inferiores, perigosas e sujas na sociedade brasileira (Silva & Fernandes,

2017), os refugiados, principalmente os de origem africana e haitiana também se atrelam a

essa visão. Ficou perceptível durante as entrevistas que o próprio termo “refugiado”

incomodava alguns participantes. P. disse o seguinte em meio à resposta sobre as

oportunidades de emprego no Brasil: “Meu primeiro emprego foi o de carregador de caixas

na 25 de março. Não tenho vergonha de dizer que sou refugiado, pois sei que isso é somente

uma fase da vida e que vai passar, não é o que me define. [...] No meio da população em

geral existe muito preconceito com o termo ‘refugiado’, pois muitos o associam somente a

pobreza e miséria. Refúgio não é só isso. Pode ser que envolva isso em algum momento, mas

não é só isso. A ignorância da população brasileira faz com que uma pessoa refugiada se

sinta muito mal, obrigando muitos a se fecharem e não falarem que são refugiados.”

Ou seja, segundo P., a própria população brasileira não tem o conhecimento adequado

do que realmente é uma pessoa refugiada e tratam-na como fugitiva, desprovida de qualidades

e como alguém que está à margem da sociedade. Isso mostra que a falta de informação

também é uma das principais barreiras entre os brasileiros e os refugiados, pois acaba por

fortificar e disseminar preconceitos, prejudicando a integração dessas pessoas ao corpo social.

Segundo o contexto histórico do Brasil, a Lei Áurea (1888) apenas concedeu liberdade

aos negros escravizados, mas não houve implantação de nenhuma política pública para que

essas pessoas fossem integradas socialmente. Existia a idéia que o Brasil tornar-se-ia um país

de brancos e que em pouco tempo os negros não seriam mais vistos por aqui. Não foi bem

assim que ocorreu, e desta forma, esse momento histórico ainda traz vestígios ao momento

atual por simplesmente tornar genuína as derradeiras ideias racistas coloniais, enraizadas no

senso comum por não haver a preocupação de que os anos de escravidão trariam outros novos
33

tempos de preconceito racial (Soares, 2011). Ao ser questionado sobre as oportunidades de

emprego no Brasil, A. declarou: “Foi difícil arrumar um emprego bom, porque parece que

aqui todos enxergam o negro como alguém que pode fazer qualquer coisa. Revalidei meus

diplomas após 2 anos que estava aqui, mas é complicado seguir carreira, não pretendo isso

aqui.”

Isto é, muitas pessoas chegam ao país de exílio com qualificação para o mercado de

trabalho, mas não tem oportunidade de emprego na própria área, porque, além da dificuldade

com um idioma e cultura desconhecidos, o preconceito por parte de quem emprega também

acaba sendo uma barreira. Os refugiados acabam precisando recorrer a ocupações com pouca

ou nenhuma especialidade, sujeitando-se a salários muito abaixo aos que suas qualificações

normalmente mereceriam, e quem acaba perdendo com isso também é o país, que devido à

demora e à burocracia para a revalidação de diplomas, dissipa conhecimentos e contribuições

importantes que muitos refugiados poderiam oferecer.

Esta fala citada do participante pode exemplificar também o fato de que além do

racismo velado, a sociedade brasileira sofre com seu funcionamento baseado em privilégios

hierarquizados, no sentido de que existem determinados grupos de pessoas desfrutando de

oportunidades e escolhas sem importarem-se como as mesmas se dão, enquanto outros sequer

têm acesso aos mesmos benefícios. O fato de existirem grupos privilegiados na sociedade é o

que geralmente cega a visão de que nem todo mundo consegue atingir a linha de chegada com

o mesmo êxito, apesar de existir no país a liberdade de qualquer um lutar pelo que deseja

(Custódio, 2015).

Sobre a obra “As Almas da Gente Negra” do sociólogo afro-americano W. E. B. Du

Bois (1868 – 1963), Custódio (2015) cita a probabilidade de uma pessoa branca poder preferir

encarar ou não as questões que pessoas negras têm dentro da sociedade, enquanto essas

últimas sequer podem cogitar a possibilidade de escolherem lidar com isso, apenas pelo fato

de ser quem são. É neste sentido que torna-se possível identificar a hierarquia de privilégios
34

instaurada nas sociedades que abrange as diferentes esferas sociais, como assuntos

relacionados à sexualidade, gênero, classe econômica, cor da pele, entre outros.

No que se conhece a respeito da noção e da aplicabilidade dos serviços públicos no

Brasil, todos os indivíduos, sem exceção, estão inclusos no preceito da universalidade. Esse

preceito legitima e garante o acesso aos serviços públicos à toda e qualquer pessoa,

englobando também os imigrantes e refugiados, sendo que estes possuem total direito ao

trabalho, educação e saúde em solo brasileiro. Entretanto, mais uma das dificuldades bastante

citadas pelos refugiados nas entrevistas foi a de conseguir emprego no Brasil. O refugiado N.,

natural de Cuba, disse que está no Brasil há dois anos e que quando chegou aqui, precisou

desembarcar em Roraima e que a situação do Estado estava um tanto quanto conturbada

devido à chegada dos venezuelanos na mesma época. Disse que ouviu falar sobre

oportunidades de emprego em Belém do Pará e até se deslocou até o município, mas que não

obteve sucesso e acabou indo para a capital de São Paulo, onde ainda encontra-se

desempregado. Outros entrevistados também disseram que dependem ou já dependeram deste

abrigo, o que atesta que diante do poder público, de modo geral, não há acolhimento para os

refugiados. Essa responsabilidade acaba ficando a cargo da sociedade civil, de ONG’S e

instituições religiosas.

Haydu (2016) cita que a oportunidade de trabalho no país de exílio pode ser um

motivo de sucesso na integração do refugiado dentro da sociedade, pois esse fator é

basicamente o responsável pela independência financeira e é algo que reflete diretamente na

autoestima e na segurança da sociedade. Muitos entrevistados que deixaram seu país de

origem antes de terminar seus estudos – no ensino superior – também citaram a dificuldade

em voltar a estudar no Brasil, sendo que essa dificuldade está diretamente ligada ao fator do

trabalho, pois muitos alegam que necessitam de dinheiro para investirem na continuação dos

estudos.
35

O entrevistado B., que é natural do Haiti, disse que precisou interromper os estudos na

época em que ocorreu o terremoto, em 2010, e que ainda não teve oportunidades de retomar,

pois precisou fugir há 2 anos e 3 meses da terrível crise que assola seu país. “A maior

dificuldade que encontro em permanecer no Brasil é continuar os estudos e conciliar estudos

com trabalho. Por eu ter que trabalhar o dia todo, não sobra tempo para poder estudar.”

Portanto, a dificuldade de estudar no Brasil também está atrelada à questão do

trabalho, não só pelo fato de ser difícil conseguir emprego para custear os estudos, mas

também no sentido de conseguir emprego e este exigir uma carga horária extensa que impeça

o refugiado de estudar e trabalhar simultaneamente.

No contexto do refúgio, a pessoa refugiada é levada a lidar com fatos desconhecidos e

a enfrentar dificuldades que podem fazê-la sentir-se num estado de dependência. A

dependência, nesse sentido, pode ser comparada ao estágio de dependência absoluta ao qual

Winnicott (1965r, citado por Rocha, 2006) se refere, em que o bebê depende absolutamente

do ambiente para suprir suas necessidades. Inclusive, essa dependência também revelou-se

estar ligada à dificuldade de conseguir emprego, quando os entrevistados disseram que esse

fato os impossibilita de obter autonomia para suprir suas necessidades básicas, como sustento

e moradia.

A provir das condições emocionais do indivíduo, é neste momento que o holding e

o handling se tornariam de extrema importância para aliviar o sofrimento e ansiedade

provocados pela instabilidade financeira, incluindo as angústias oriundas de outros fatores que

integram o contexto de refúgio. O ambiente em que este indivíduo está inserido no país de

exílio deveria ser facilitador, amparando suas angústias e medos presentes desde o fundado

temor de perseguição ou pelas perdas e violações sofridas em seu próprio país e, de

contrapartida, ajudá-lo a enfrentar a dificuldade de se consolidar no Brasil.

Contudo, metade dos refugiados entrevistados para a pesquisa sente que não recebeu

os cuidados necessários voltados aos seus sentimentos de angústia, medo e abandono quando
36

chegaram ao Brasil, obtendo, sobretudo, o que era essencial para a sobrevivência em termos

de suprimento físico. Sabendo que as necessidades do Id são mais voltadas para o alcance do

prazer, ligadas às demandas fisiológicas, enquanto as do ego são vistas como necessidades

sociais, relacionadas à autoestima, amor-próprio e a respectiva reputação (Freud, 1972/1980,

citado por Jorge, 2008), através das respostas ficou claro que, em relação aos refugiados, as

necessidades prontamente atendidas são as necessidades do Id ao passo em que as

necessidades do ego são deixadas de lado para suprir o que geralmente é visto como

emergencial.

Os entrevistados que disseram ter sido acolhidos na chegada ao Brasil se referiram

principalmente às ONG’s e às instituições religiosas como agentes básicos de atenção à saúde

mental, mostrando mais uma vez o quanto o poder público deixa a desejar. Pode-se dizer que

essas instituições agiram no papel de mãe suficientemente boa quando os refugiados

precisaram de apoio, acolhendo-os e proporcionando um ambiente seguro em momentos de

tensão. Outro entrevistado disse não ter experienciado sentimentos ruins, pois já vinha tendo

maior afinidade com o Brasil no que se refere à oportunidade de ter contato com quem já

morava aqui e estudar sobre a cultura brasileira antes de chegar ao país: “Tenho um amigo

que já morava aqui antes de mim e que me ajudou muito quando cheguei ao Brasil. Eu já

conversava com ele pela internet para saber como estavam as coisas por aqui e também já

estudei um pouco da história do Brasil, já sabia que queria ficar em São Paulo. Não tive

problemas com sentimentos ruins quando cheguei aqui.”

Esta fala é de E., natural do Haiti e que encontra-se no Brasil há 5 anos. Três anos

após o terremoto e com o agravamento da crise de seu país, E. decidiu buscar exílio no Brasil,

mas antes preferiu e teve condições de se informar sobre o que estava por vir. A fala dele

indica que o conhecimento sobre o destino e o contato prévio com elementos do país de exílio

amenizou o desconforto da sensação de estar em solo estrangeiro. É tangível que, a depender


37

do contexto em que o refúgio se dá, não é possível que o indivíduo consiga se organizar desta

maneira para possivelmente atenuar os sentimentos negativos no exílio.

Em suma, o fato de se inserir no mercado de trabalho é de grande valia para o

refugiado, pois isso assegura sua autoestima e seu sentimento de pertencimento. Estar

empregado garante o atendimento de suas necessidades básicas, como também favorece

suplantá-lo do papel de vítima, tornando-o protagonista de sua própria história. Portanto, a

ideia de se sentirem aceitos como humanos e criarem raízes através do trabalho e dos estudos,

pode contribuir com o sentimento de pertencimento presentes no processo de integração, tão

importante no ponto de vista da saúde mental.

4.2 Estratégias emocionais para a minimização da dor e da angústia decorrentes da

distância

Em 2016, o Conselho Nacional de Refugiados (CONARE) informou que o Brasil

possuía 8.863 refugiados que são reconhecidos vindos de 79 nacionalidades distintas. Sabe-se

que este número só vem aumentando desde então, e o que é de extrema importância a ser

reconhecido é que esses indivíduos precisam ser acolhidos com o básico para a sua

sobrevivência, e em alguns casos, necessitam receber um cuidado voltado à saúde mental,

pois sofrem com as violações de seus direitos ou até mesmo pelas perdas que vivenciaram em

sua pátria mãe. Galina, Haydu e Martins (2017) relatam que boa parte dessas pessoas corre o

risco de desenvolver transtornos mentais que podem ser classificados como moderados e

severos.

Quando um indivíduo é obrigado a sair do seu próprio país, pode vir a sofrer com

depressão e estresse pós-traumático. Desta forma, é preciso criar mecanismos de cuidados

emocionais para acolher essa população. Este cuidado é possível através do preparo de

profissionais de saúde que lidam diretamente com essas demandas, levando em conta as

adversidades dos refugiados: costumes, crenças, cultura e sua compreensão do sistema de


38

saúde, cuidado e doença. Os refugiados também de deparam com massacre, mortes de

parentes, tortura, violência, entre outros. O fato de ter que sair do seu país de origem e as

experiências vividas podem ocasionar sofrimento psicológico ligado ao trauma que foram

submetidos no período pré-migratório (Galina, Haydu & Martins, 2017).

Quando a pessoa refugiada chega ao exílio, pode querer ou não se integrar. Quando a

integração acontece, é possível enxergar que a mesma mantém as suas próprias tradições,

porém é incapaz de viver a realidade que viveu em sua pátria mãe. Desta forma, a integração

dessa pessoa também depende da qualidade do ambiente em que está sendo inserida e do

tipo de relação que partilha por viver com pessoas que não tem os mesmos valores sociais

(Barroso 2013, p. 6). Diante das entrevistas realizadas, foi observado nos relatos dos

participantes que toda a dor e sofrimento por terem que deixar o seu país de origem foi

minimizada na chegada ao Brasil, tendo em vista que viviam em situação tão terrível que as

dificuldades encontradas na integração são vistas de maneira reduzida diante da dor e

sofrimento vivenciados no seu país.

O entrevistado P. declarou: “Sinto muita falta da minha família, meus amigos... Eu

estudei para ajudar meu país e quero muito fazer isso. O Brasil está muito bem em vista do

Congo, gostaria que lá fosse igual aqui na questão democrática. A corrupção que existe aqui

é somente uma questão de educação. [...] Eu sofri muito em meu país, chorei muito quando

cheguei ao Brasil. Já morei no Rio de Janeiro, mas não consegui ficar muito tempo lá, era

estranho e me fez querer muito voltar para o Congo. Quando me mudei para São Paulo não

conhecia ninguém, tive que começar do zero e senti que todo orgulho que tinha de mim

mesmo foi quebrado. Cheguei a morar em albergues junto com moradores de rua. O nada

que eu tinha quando cheguei aqui me marcou muito e me fez olhar para tudo que tinha lá no

meu país. Aprendi muito com a ‘sofrência’.”

Já o entrevistado A. disse: “Na África, nós tínhamos muitas experiências e estudamos

na escola como é fora de nosso país. Quando nós saímos para outros lugares, nós andamos
39

com uma fé que todos os lugares podem acontecer mortes e qualquer coisa má, até em nossa

casa.”

Diante destas falas, é possível observar a comparação que é feita nas situações em que

os dois países se encontram (Brasil e país de origem). Mesmo enfrentando problemas no

Brasil, como por exemplo, desemprego, moradia, dinheiro, etc., a situação do país de origem

dos refugiados é tão precária, que essas dificuldades básicas para sobrevivência são vistas de

maneira minimizada quando comparadas às dores e perdas que essas pessoas tiveram ao

deixar seu próprio país. Diante de todo e sofrimento vivido e o fato de estar em um país

desconhecido, sem sua família, cultura e amigos, os refugiados ficam impotentes em meio à

realidade em que se encontram. Como visto na fala de P., o seu Eu foi quebrado e colocado

em dúvida, frente à situação de vulnerabilidade que se encontrava. A angústia da distância e a

dor da separação dos seus entes queridos e de sua pátria mãe o fez questionar sobre o próprio

orgulho construído dentro de si.

Em frente às perdas, Bowlby (1982/1997) fala em sua teoria sobre a fase do torpor, da

busca pela figura perdida, saudade, desorganização, desespero, e a fase de menor ou maior

grau de reorganização. Quando a pessoa está nesta primeira fase, geralmente demonstra-se

confusa e faz uso da negação, pelo fato de ser incapaz de admitir o que perdeu, podendo este

sentimento perdurar por dias ou até semanas com intervalos de desolação e raiva acentuadas.

Quando essa fase acaba, o indivíduo se dá conta da realidade e da perda pela qual passou,

podendo desenvolver crises de choro e ao mesmo tempo alvoroço diante do pensamento e das

sensações ao que foi perdido. Esses comportamentos são características normais do luto e que

não raramente, podem durar anos, dependendo do vínculo que o indivíduo tem com a figura

perdida.

Pode-se notar a fase do torpor nos relatos de um dos entrevistados, R., 36 anos, natural

da Angola. R. relata que se sentiu sozinho quando chegou ao Brasil e que ao imaginar tudo o

que havia deixado para trás, sentiu um vazio dentro de si que aos poucos e vagarosamente foi
40

sendo preenchido. Foi notado que esse rompimento de vínculo não necessariamente se remete

apenas à saudade de um ente querido deixado para trás, mas também do ambiente em que

aquela pessoa ficou inserida a maior parte de sua vida. O fato de ser retirado de seu país e ser

forçado a se integrar em um ambiente desconhecido, em que é incapaz de fazer uso da sua

própria língua para se comunicar, os costumes são diferentes, as regras de convivência, leis,

trabalho, educação, entre outros são distintas, o refugiado claramente pode se sentir confuso e

angustiado no início.

Depois que esses sentimentos se acalmam, Bowlby (1982/1997) fala que o indivíduo

começa a se reorganizar e aceitar o que perdeu, sendo percebida pelo mesmo a possibilidade

de uma nova vida, que pode ser iniciada no contexto em que o mesmo está inserido, mas que

não está isento de uma nova ocorrência de episódios de tristeza e saudade. Foi o que R. viveu,

pois após se reorganizar internamente, disse que continuou seu propósito como ativista no

Brasil, visto a liberdade de expressão que o país dispõe aos cidadãos.

Os seres humanos estão propensos a formar grandes vínculos afetivos com outras

pessoas e ambientes. A ansiedade, depressão, raiva e desligamento emocional são sofrimentos

ocasionados pelas separações e perdas inesperadas. As pessoas se apegam em algo que

proporciona uma formação de modelos internos definidos por reconhecimentos e suporte às

necessidades, os quais se formam através das experiências sociais positivas vividas nas

relações mútuas ao longo da vida. Ressaltando que o temor de perseguição que as pessoas

refugiadas vivenciam é algo que pode interferir na saúde mental e acarretar sofrimentos

emocionais, é imprescindível que elas não se esqueçam da vida passada que foi formada em

sua pátria mãe e menos ainda deixem de lado sua cultura. Desta forma, é possível conferir

sentido ao trauma que foi sofrido, sendo necessário que seus próprios componentes culturais

sejam levados em consideração para um possível trabalho psicológico, tal como dar esperança

ao um novo significado a sua história e se fortalecer em meio às dificuldades (Antunes 2017).


41

O entrevistado A., 36 anos, natural do Mali, declarou que o trabalho em comunidade

no Brasil é de extrema importância para os refugiados, pois os mesmos conseguem fazer parte

de algo, onde seus valores sociais são colocados como prioridades, entre as pessoas que

também vivenciaram os mesmos problemas por terem que deixar os seus países, na medida

em que vão atribuindo os seus próprios sentidos aos traumas que vivenciaram levando em

considerações as suas próprias crenças. A. declarou: “[...] Muitos falaram que tínhamos

habilidades em restaurantes, ai eu pensei muito e abrimos um restaurante. Então, o lugar

ficou como um ponto de encontro. Muitas nacionalidades, mais de 30 se encontram lá [...]”

Segundo as afirmações, A. se fortaleceu em ajudar as pessoas que passam pelos

mesmos problemas que ele um dia viveu, por ter sido obrigado a sair do seu próprio país

devido às questões políticas. Depois de viver essas experiências, A. procura trabalhar em

comunidade no Brasil ajudando outras pessoas necessitadas, como forma de construir um

sentido a tudo que viveu e dando significado diante das perdas, angústias e sofrimentos ao

deixar seu país. Ele ainda declarou: “Qualquer momento pode acontecer de eu voltar para

meu país. Meu trabalho é muito grande aqui, eu faço vários trabalhos para a comunidade,

não só para a comunidade, mas em geral para as pessoas imigrantes e represento muito a

minha comunidade para a embaixada. Porque eu estava estudando, eu faço tudo isso para

ajudar, porque outras pessoas só vêm para trabalhar, e essa é a diferença. Eu passei muito

tempo na Cáritas, acompanhando quem precisa de ajuda e também faço parte de vários

grupos de lutas sobre os direitos humanos. Mas quando eu voltar para o meu país, eu vou

saber que eu avancei muito, porque as maiores experiências que eu precisava, graças a Deus

eu já consegui. Eu acho que, graças a Deus, estou em um bom caminho.”

Além do trabalho em comunidade que pode ser visto como uma saída para se integrar

no país e fazer sentindo em uma vida que está começando do zero, outras medidas podem ser

adotadas, como por exemplo, o uso demasiado de drogas e bebidas. Esses comportamentos

são costumeiramente manifestados pelo fato de a pessoa procurar uma resposta à perda de um
42

ente querido ou da vida que levava em seu país de origem. O uso demasiado de substâncias

químicas e a ideação suicida também têm uma prevalência significativa entre pessoas

refugiadas, e a violência agregada ao terrorismo e à guerra está ligada a um grande índice no

aumento de mortalidade e morbidade por abuso de substâncias (Antunes 2017).

O entrevistado N., de Cuba, declarou: “Eu estou em refúgio perto da rodoviária do

Tietê. Sou eu, cubano, três haitianos, um africano, um venezuelano, um colombiano e um

brasileiro. Eu quero sair, não estou acostumado a viver em uma situação assim, lá tem boa

condição, bom atendimento, mas quero sair. O ambiente é belo, não são pessoas más, só são

pessoas que foram afastadas da sociedade, mas que a noite usam muitas drogas e cachaça.

Eu penso assim: se alguma pessoa quiser, porque aqui é muito grande e com pouco recurso,

colocaria essas pessoas para trabalhar, para ter dinheiro para alimentação e até guardar

algum dinheiro. Muitos não trabalham e ficam naquilo e eu não gosto. Se você está no fundo

do buraco você tem que sair de lá não pode ficar, tem que estudar, fazer alguma coisa para

viver. “

Quando foi questionado a outro entrevistado qual era o seu maior desejo no momento,

o mesmo respondeu o seguinte: “Tomar muita cerveja, na África não tomava, aqui eu bebo.

Aqui tenho muito problema, tomo cerveja para esquecer.” (A., 29 anos e natural do Togo).

Ou seja, a depender de seus recursos internos e do suporte vindo do ambiente, a pessoa

refugiada pode encarar a realidade de forma saudável, oferecendo serviços à comunidade e

auxiliando outros refugiados a se integrarem, ou fechando-se e passando a depender de

agentes externos, como álcool e drogas para que consiga suportar a nova vida.

Winnicott (1971f, p.5, citado por Rocha, 2006) fala em sua teoria que não existe a

independência em si, pois todas as pessoas são eternamente dependentes de outra pessoa, até

o fim da vida. A busca pela independência sempre vai permanecer, mesmo quando já existe a

capacidade de autocuidado. Os relacionamentos interpessoais se fazem necessários para que o

indivíduo se sinta amparado e seja capaz de viver em um mundo em que exista a realidade
43

compartilhada. O suporte de um ambiente que seja suficientemente bom faz com que a pessoa

refugiada se reconheça como uma pessoa integrada, que pode se permitir relacionar com

outras ao decorrer do seu percurso. Haydu (2016) relata que novos vínculos podem acontecer

no país de exilio com o compartilhamento de sua biografia, mas como dito em sua própria

teoria, a criação de novos elos sociais pode ser um desafio para os que conseguem refúgio.

4.3 A identidade representada pela história e pelas experiências

Durante a reintegração dos refugiados no país de exílio, eles são submetidos a um

processo de refúgio delicado e cauteloso, pois é necessário fazê-los lembrar de situações de

profundo sofrimento emocional em consequência a um conjunto de esclarecimentos, que é

pautado para avaliar seu perfil e reger o processo de reintegração. Para que o refugiado se

sinta cômodo para comunicar o necessário, cuidadosamente as instituições responsáveis

tentam compreender os efeitos subjetivos que foram causados nessa população, considerando

a angústia e o tormento por serem obrigados a deixarem seus familiares e amigos no país de

origem. (ACNUR, 2015). A obrigatoriedade de deixar o país de origem faz indagar se essa

experiência fortalece ou atormenta mais quem vivenciou tais situações de sofrimento. Desta

forma, algumas pessoas acreditam ser algo satisfatório e benéfico estarem distantes das

perseguições e diante da oportunidade de vivenciar uma nova vida em outro país, enquanto

outras acreditam que a distância física de sua cultura e raízes é algo que causa intenso

sentimento de desamparo, abandono e até mesmo desejo de suicídio por estar longe de seu

país (Barakat, 1987 citado por Farah, 2017).

O entrevistado E.G., natural do Haiti, relatou que por pouco não morreu no terremoto

que marcou seu país, enquanto cumpria a grade curricular do seu curso de direito. Disse que

mesmo antes do terremoto, seu país já estava em um estado de calamidade. Essa experiência

fez com que o mesmo se tornasse vítima desse desastre natural e buscasse exílio em outro

país. Para ele, o Brasil lhe ofereceu uma oportunidade de recomeço, todavia, quando foi
44

questionado sobre a dúvida e a incerteza da possibilidade de voltar para a casa, E.G.

respondeu: “Tenho certeza que voltarei para casa em breve, acredito que as coisas vão

melhorar por lá e que vou poder continuar meus estudos para ter um futuro melhor.”

Quando questionado sobre seu maior desejo no momento, A., natural do Mali, respondeu: “O

meu desejo é melhorar minhas experiências, voltar ao meu país e morar lá”.

Ainda, outro entrevistado disse: “O meu desejo é de um dia voltar ao meu país. [...]

Nesta estadia que eu estou aqui, se demorar ou não demorar, mas eu tenho certeza que um

dia esse regime cai do poder e eu voltarei para casa.”

Diante dessas falas, pode-se dizer que mesmo com todo sofrimento vivenciado no país de

origem e com o auxílio que oferecido no Brasil, estes refugiados entendem que o retorno à

pátria mãe é ideal e satisfatório, sobretudo, quando seu país não se configura numa ameaça

para sua vida. Haydu (2014, p.8) descreve que, a pessoa refugiada deve retornar às suas raízes

somente quando seu país lhe proporcionar proteção e segurança para sua sobrevivência, ao

contrário, o refugiado não pode voltar ao seu país de origem ou qualquer outra nação que sua

vida corra risco.

O entrevistado P. relatou: “Há 23 anos acontece uma guerra no Congo que muita

gente não sabe. O país agora está totalmente desestruturado, e tudo isso é por causa da

tecnologia moderna. [...] Depois da segunda Guerra Mundial, não houve conflito mais

sangrento do que no Congo, lá existe o maior índice de mulheres sendo estupradas no mundo

todo. Isso tudo me revolta e me faz querer ir pra rua fazer manifestações. Não temos

liberdade de expressão no Congo, não conseguimos nos reunir para reivindicar, e se

conseguimos, somos torturados. Eu mesmo já fui torturado várias vezes. [...] Se eu não

saísse, poderia morrer. [...] Fui sequestrado e torturado por 3 vezes.”

Continuou: “Sinto falta de tudo no Congo, se tivesse condições votaria pra lá hoje

mesmo. Sinto muita falta da minha família, meus amigos... Eu estudei para ajudar meu país e

quero muito fazer isso [...]. Eu não penso na dúvida de voltar para casa. Sei que um dia eu
45

preciso voltar [...], por mais que eu goste do Brasil, nossa casa é nossa casa, não tem

comparação.”

Ainda que diante de tamanha violência e a incerteza sobre as condições de vida de seu

país, a certeza de que um dia retornarão à origem foi percebida diversas vezes durante os

relatos. É perceptível que o retorno às raízes e o ambiente em que cada indivíduo cresceu,

mesmo muitas vezes sendo tão precários, ainda é vantajoso pois remete-os às memórias

afetivas que os constituem.

A pátria mãe da pessoa refugiada, semelhantemente à mãe que deu a proteção e cuidado

ao seu filho, faz o papel de quem recebe afeição e apreço, tornando o retorno prazeroso já que

foi lá que o refugiado vivenciou seus primeiros anos de vida até, muitas vezes, a fase adulta.

Isso pode remeter à ideia de que a experiência com o país de origem, em algum momento foi

percebido como suficientemente bom, gerando um sentimento de segurança e afeição

(Winnicott, 1956/1958n, p.403, citado por Ciccone 2013, p. 64).

Como dito por R.: “Eu sempre tenho um provérbio que diz: O importante não é sair, o

importante é sair e voltar para a casa. Eu sei que um dia eu vou voltar, eu não tenho certeza

quando, mas um dia eu vou voltar.”

Essa afirmação revela o desejo de R. de voltar ao ambiente onde cresceu. Metaforicamente, o

seu país de origem representa a mãe suficientemente boa que oferece cuidados maternos ao

seu filho, como descrito por Winnicott ao falar sobre os conceitos holding e handling

(Monteiro, 2003). É importante evidenciar que nessa transição do país de origem ao país de

exílio, o refugiado traz consigo sua história e experiências que muitas vezes são utilizadas

para referenciar sua própria identidade.

Em vista dos refugiados terem afeição à pátria mãe, eles possuem uma identidade

única, cada qual com sua própria raça, nacionalidade, cultura, costume, religião e história. No

país de exílio, o refugiado conta com os direitos de assistência básica e, principalmente, ser

respeitado em suas particularidades, as escolhas que regem suas vidas, bem como, direito a
46

usufruir da liberdade de pensamento (Galina, Haydu e Martins, 2017). Por terem

experimentado situações que ocasionaram sofrimento psíquico, a pessoa refugiada muitas

vezes pode ter dificuldades para dar sentido ao trauma experimentado.

Para oferecer esse acolhimento ao refugiado em um possível trabalho psicológico, é

necessário que o mesmo entre em contato com seus próprios elementos culturais e estruturais,

ou seja, dar voz à sua experiência para que se crie uma expectativa de construir um novo olhar

e significado à sua história, renovando a sua identidade (Haydu, 2016). Nas entrevistas, a

maioria dos refugiados trouxe suas histórias que marcaram suas vidas. Histórias que

proporcionaram tanto experiências positivas quanto negativas, como vemos no relato do

entrevistado P.: “[...] Me senti revoltado e estudar fora mudou minha visão. Nós não vivemos

uma democracia em nosso país, percebi isso na Europa e comecei a lutar para tentar mudar

o mundo ou pelo menos parte dele. [...] Durante 20 anos o reino da Bélgica explorou muito o

Congo, [...] mas isso é algo que a sociedade não sabe e que me causou muita revolta. Foi

mais uma das coisas que me fez querer mudar de vida. Não temos liberdade de expressão no

Congo, não conseguimos nos reunir para reivindicar, e se conseguimos, somos torturados.

[...] Antigamente não conseguia falar sobre isso, mas hoje consigo tocar no assunto por

causa das experiências de vida que tive”.

Como dito por P., em sua luta pelo o que acreditava ser justo ao seu país, acabou

passando por experiências em que foi silenciado, ou seja, vivenciou sofrimento que

ocasionaram angústia ao falar de sua experiência, ao falar de sua história e subjetividade. Para

Freud (1923/2006), irremediavelmente todos os indivíduos estão propensos a vivenciar

situações que ocasionam frustrações severas ao inconsciente. Assim, como já descrito neste

presente trabalho, o conceito que Freud (1923/2006) denominou como recalque, se define

como um mecanismo de defesa, sendo um bloqueador do inconsciente que visa reter todas as

informações das situações que atuam abalando a instabilidade emocional do indivíduo. Como

dito pelo próprio entrevistado, ao vivenciar essa transição de país, R. foi obrigado a entrar em
47

contato com esses sentimentos desagradáveis e angústias perturbadoras que constituem sua

história, na qual hoje o mesmo é capaz de expor as experiências que representam sua

identidade.

No relato do entrevistado R., o mesmo se identificou com figuras passadas para

construir sua identidade, como declarou: “[...] Pensamos assim, se nossos avós lutaram para

essa independência, temos que ser independentes [...] Ao começarmos essa luta, pensamos na

seguinte forma: Os nossos pais que já tem experiências com essa luta, também foram vistos

como inimigos. Porque eles viram o regime que está no poder massacrar muita gente. Temos

uma data que para nós é muito importante, 27 de maio... Esse dia foi sangrento. Os

mulçumanos fazem guerra santa, aquele que não aceita o Deus deles são mortos, em Angola

era, então, aquele que não aceitasse o partido são mortos. Então começamos essa luta...

começamos a pesquisar primeiro os nossos ancestrais como Nelson Mandela, Martin Luther

king. Então visando isso, começamos a luta”.

Winnicott (1965, citado por Rocha, 2006) descreve a importância da pessoa que

representa a figura de mãe que ao longo do tempo compete subsídio na trajetória rumo à

integração. Esse processo é parte do amadurecimento humano, pois neste caminho são

elaboradas experiências individuais próprias. As experiências afetivas com outras pessoas

significativas contribuem para a formação de um sentimento de identidade, tendo em vista

que a história de relações passadas da pessoa refugiada, bem como a história de sua família,

imprimem uma marca que o identifica como único, mesmo dentre inúmeros refugiados.

Todavia, frequentemente pessoas refugiadas descrevem que mesmo com tantas

diferenças, ainda sim se identificam com os brasileiros, sendo que é essa identificação que

facilita sua adaptação, como relatado pelo entrevistado N.: “O cubano ama muito o Brasil e

quer muito o Brasil. O povo cubano assiste muitas novelas brasileiras, eles conhecem o

Brasil pelas novelas. Então, vocês têm muito, muito, muito em comum com nós. Vocês foram

colonizados pelos portugueses e nós pela Espanha. Assim, a Espanha e Portugal estão juntos.
48

O nome que vocês têm, lá nós também temos. Por exemplo: Garcia, Gonçalves... Os

portugueses são um mesclado dos espanhóis, dos ingleses, dos italianos... De tudo. Nós

somos pessoas de coração aberto, damos as mãos a qualquer pessoa, nós ajudamos... Então

nós somos iguais.”

Apesar dos refugiados se identificarem com o Brasil, percebe-se que não existe

disponibilidade dos brasileiros para uma escuta interessada sobre as histórias de vida dos

refugiados. Esse fenômeno pode ser explicado sob duas óticas: a falta de domínio da língua

portuguesa, que dificulta a comunicação e o preconceito e a discriminação que muitas vezes

impedem que haja aproximação para ocorrer esta troca de experiências.

Assim como citou Winnicott (1965, citado por Ciccone, 2013), viver criativamente é

visto como algo belo, único e individual, uma vez que houve o acolhimento e sustento

materno. Neste caminho que percorre a integração, com o fortalecimento do self, o verdadeiro

self e o gesto espontâneo são de grande importância para se sentir real. Somente com esses

subsídios o ser humano obtém sentimento de significação pela vida e de pertencimento. Ou

seja, o fluir do viver criativamente é proteger algo de pessoal e secreto, sendo obviamente

você mesmo, preservando a certeza de ser si mesmo e resguardando a espontaneidade. À vista

disso, nos relatos dos entrevistados notou-se que a identidade dos refugiados é representada

pelas suas próprias histórias, algo que para estes é de suma importância para que tenham,

quando acolhidos, uma identidade renovada no país de exílio, conservando algo de pessoal e

obtendo a convicção de serem eles mesmos.


49

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Essa pesquisa teve como objetivo principal entender de que maneira a pessoa

refugiada é vista em seus aspectos emocionais e afetivos desde o momento de sua chegada no

país de exílio até sua integração social. Chegou-se à conclusão de que apesar de existirem leis

que as acolham, na maioria das vezes elas são defasadas, no sentido de que as exigências de

adaptação nacional causam um impacto de sobrecarga nas instituições voluntárias e geram

uma demanda maior do que é suportado, prejudicando a qualidade de atendimento no

acolhimento a esses indivíduos.

Acredita-se que as políticas públicas encontradas na literatura voltadas aos refugiados

sobre direito ao trabalho e à educação, apesar de serem satisfatórias, não são praticadas pelo

poder público, como deveriam ser. O governo ainda permanece distante de suas tarefas nesse

sentido e prontamente transfere à sociedade civil a efetivação do acolhimento, abstendo-se de

tomar para si o cumprimento desta obrigação.

Foi identificada certa resistência por parte de alguns refugiados ao serem convidados a

participar da entrevista, principalmente dos que haviam chegado recentemente ao Brasil,

provavelmente por ainda não terem conferido sentido ao que viveram. Em contrapartida, os

que já estavam a mais tempo no Brasil tiveram mais facilidade ao falar de suas experiências

no país de exílio e da história de seu próprio povo. Foi percebido que a resiliência é uma

grande característica dos refugiados, pois só pelo fato de terem conseguido sair do seu país e

fugirem do fundado temor de perseguição, demonstraram superação por não aceitarem a

morte e buscarem um recomeço.

Conforme citado no decorrente estudo, existem programas de identificação vocacional

e treinamentos voltados ao mercado de trabalho para valorizar as habilidades dos refugiados,

mas foi percebido que na realidade esses programas acabam sendo pouco abrangentes, por

terem somente o apoio de instituições filantrópicas, que acabam tendo poucos recursos para
50

atender tamanha demanda e consequentemente a qualidade das normas de acolhimento

acabam sendo defasadas para auxiliar na integração social.

Apesar de não terem sido identificados indícios de transtornos psicológicos em meio

às respostas dos entrevistados, alguns comportamentos citados, como o consumo excessivo de

álcool para não entrar em contato com a realidade atual, chamaram atenção das pesquisadoras,

pois tais comportamentos podem levar a sérias complicações futuras em relação à saúde física

e mental. Um dos entrevistados citou viver em um ambiente compartilhado com outros

refugiados que fazem uso de drogas por não terem oportunidades no mercado de trabalho.

Tanto o uso de álcool quanto de drogas podem acarretar em problemas futuros, como a

dependências dessas substâncias ou até mesmo o desenvolvimento de algum transtorno

mental ou doença física, que podem levar a uma vida de sofrimento ou até a morte, fatores

que também precisam ser olhados pelo poder público no âmbito da prevenção e promoção à

saúde, da saúde e dos direitos dos refugiados.

A hipótese inicial, de acordo com a literatura levantada, era a de que havia prejuízos

nos aspectos emocionais da pessoa refugiada no país de exílio e que surgiriam relatos

significativos, possíveis traumas e fragilidades nas respostas dos participantes. De fato, tais

aspectos discorridos na análise foram observados diante dos relatos dos refugiados. Porém,

esses possíveis traumas e prejuízos não apareceram de forma clara nas entrevistas,

provavelmente devido ao fato de ter ocorrido apenas um encontro com esses indivíduos.

Acredita-se que um trabalho mais profundo em psicoterapia poderia fazer emergir resquícios

negativos das perdas e violências vivenciadas.

Acima de qualquer objetivo, o presente estudo teve como finalidade proporcionar um

olhar mais humanizado para com as pessoas refugiadas, que apesar da situação em que se

encontram, também possuem suas origens, histórias, cultura entre outros aspectos que devem

ser respeitados. Acredita-se que esse olhar rompe com os estigmas criados pela sociedade
51

brasileira em relação ao refúgio, proporcionando um trabalho voltado às questões emocionais

e que caminham em direção à integração dessas pessoas no país de exílio.

No que se refere ao papel dos cidadãos como conjunto da sociedade civil organizada,

também compete à população brasileira fortalecer as ações direcionadas aos refugiados, bem

como exigir e inspecionar o desempenho da responsabilidade do Poder Público e das

entidades internacionais, visando o cumprimento do papel de cada responsável pelo

acolhimento dos refugiados. Assim, de forma vinculada, acredita-se que aos poucos o

cumprimento e o acréscimo de políticas públicas e ações solidárias de integração aos

refugiados na dinâmica da sociedade em que estão inseridos possam ser alcançados,

assegurando condições para que a qualidade de vida dessas pessoas seja potencializada e seus

direitos de cidadania sejam respeitados em qualquer esfera social.


52

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7 ANEXOS

Anexo 1

Roteiro da entrevista semiestruturada

1. Idade:

2. Formação/Profissão:

3. Há quanto tempo está no Brasil:

4. Por que saiu do país de origem:

5. Como chegou ao Brasil:

6. Deixou familiares do país de origem? Quem?

7. Qual a maior dificuldade que encontra ao permanecer no Brasil?

8. O que mais sente falta quando pensa no seu país de origem?

9. Qual seu maior desejo no momento?

10. O que ficou mais marcado para você na sua mudança de país?

11. Após sua chegada, houveram cuidados voltados para seus sentimentos de angústias e
abandono, medo, ansiedade...?

12. Como você lida com a dúvida e a incerteza da possibilidade de voltar para casa?

13. Foi fácil para você fazer novas amizades aqui no Brasil? Como foi?

14. Como você enxerga as oportunidades no mercado de trabalho?

15. Você se sente dependente das pessoas para fazer as coisas que fazia sozinho no seu
país?
59

Anexo 2
Parecer Consubstanciado do CEP
60
61
62

Anexo 3
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE (1ª via)

Termo de Esclarecimento

Você está sendo convidado a participar como voluntário da pesquisa sobre “Os
Aspectos Emocionais da Pessoa Refugiada no País de Exílio”, pelas pesquisadoras
responsáveis Millene Bellanga Luchiari, Camilla Fernanda Boro, Elaine Oliveira Máximo e
Telma Priscila Machado. Esta pesquisa visa contribuir para o apontamento de possíveis
políticas públicas a serem adotadas para melhorar a saúde mental e qualidade de vida das
pessoas refugiadas, bem como levantar ações facilitadoras e estratégias para melhoria
contínua no cuidado para com essas pessoas. Diante disso, o objetivo será compreender a
maneira como a pessoa refugiada é considerada em seus aspectos afetivos/emocionais desde a
chegada ao país de exílio até sua adaptação às exigências nacionais, procurando entender as
vivências anteriores que puderam influenciar nessa inesperada mudança de vida.
Caso você participe, será necessário responder 15 questões sobre como se sente
no país de exílio, questões familiares, sobre relações e trabalho por meio de uma entrevista
semiestruturada com duração de no máximo 40 minutos. A mesma será gravada por áudio.
Após a coleta de dados e o registro das respostas, esse áudio será destruído. Não será
realizado qualquer procedimento invasivo e não há riscos previsíveis à sua saúde ou à sua
vida, porém pode ocorrer certo desconforto. Caso isto aconteça, você poderá fazer uma pausa
e ainda, desistir de sua participação. Não há benefícios direitos pela sua participação na
pesquisa, porém os resultados poderão contribuir para os avanços no acolhimento aos
refugiados.
Você poderá obter quaisquer esclarecimentos antes, durante ou após a realização
da pesquisa. Ainda, você poderá não participar da pesquisa ou retirar seu consentimento a
qualquer momento, sem prejuízos de qualquer natureza. Pela sua participação no estudo, você
não receberá qualquer valor em dinheiro, mas terá a garantia de que todas as despesas
necessárias para a realização da pesquisa não serão de sua responsabilidade. Ainda, você não
terá qualquer despesa por participar da pesquisa. Seu nome não aparecerá em qualquer
momento do estudo, pois você será identificado com um número.
Após ser esclarecido sobre a pesquisa, a sua participação como voluntário e
havendo uma confirmação livre e espontânea em aceitar a participar como voluntário, você
deverá assinar ao final deste documento, em duas vias. Uma das vias ficará com você e a
outra via permanecerá com as pesquisadoras responsáveis. Em caso de dúvida em relação a
esse documento, você poderá procurar o Comitê de Ética em Pesquisa das Faculdades
Integradas Einstein de Limeira, pelos Tel/Fax - CEP/FIEL (019) 3444-6612 e e-mail
cep_fiel@hotmail.com (Rua Jatobá, 200 – Vila Queiroz – 13485-021 – Limeira/SP) e, ainda,
você poderá procurar as pesquisadoras responsáveis através dos seguintes contatos: (19)
99191-3011 e e-mail: millenebellanga@yahoo.com.br (Milene), (19) 99529-2371 e e-mail:
elaine.maximo@hotmail.com (Elaine), (19) 98200-0891 e e-mail camilla.boro@hotmail.com
(Camilla) e (19) 99797-8693 e e-mail: telmapmachadok3@gmail.com (Telma).
63

Termo de consentimento livre, após esclarecimento


Eu, _______________________________________, li e/ou ouvi o
esclarecimento acima, compreendi para que serve o estudo e qual é o procedimento a que
serei submetido. A explicação que recebi esclarece os riscos e benefícios do estudo. Eu
entendi que sou livre para interromper minha participação a qualquer momento, sem justificar
minha decisão e que isso não me afetará. Sei que meu nome não será divulgado, que não terei
despesas e não receberei dinheiro por participar do estudo.
Eu concordo em participar do estudo.
Limeira, SP, ____ de __________ de 2018.

Assinatura do Voluntário
RG: _________________
CPF:_________________

Pesquisadora Responsável Pesquisadora Colaboradora


Milene Bellanga Luchiari Camilla Fernanda Boro
CPF: 328.211.348-00 CPF: 449.761.268-62

Pesquisadora Colaboradora Pesquisadora Colaboradora


Elaine Oliveira Máximo Telma Priscila Machado
CPF: 433.384.488-64 CPF: 403.612.628-84

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