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L I BRA S

LIBRAS
Estrutura gramatical da LIBRAS

A língua de sinais tem gramática? A


língua de sinais é mímica?

As línguas de sinais, usadas pelas comunidades surdas, são constituídas de elementos próprios e têm suas
especificidades linguísticas, tal como as línguas orais. Por isso, não se pode afirmar que uma língua de sinais
seja caracterizada por gestos ou mímicas, como se pensava anteriormente.
Uma das diferenças entre as línguas de sinais e as línguas orais é o canal de comunicação utilizado.
Enquanto as línguas orais utilizam o canal oral-auditivo, as línguas de sinais utilizam o canal viso-motor. As
línguas de sinais são estruturadas a partir de unidades mínimas que formam unidades mais complexas,
utilizadas dentro de contextos. Para se expressar na língua de sinais, é necessário atenção visual, memória
visual, discriminação visual, agilidade manual e expressão facial e corporal. As línguas de sinais são
consideradas uma forma de comunicação e expressão tão natural quanto as línguas orais. Brito (1998, p. 19)
as considera “naturais porque, como as línguas orais, surgiram espontaneamente da interação entre as
pessoas [e] permitem a expressão de qualquer significado decorrente da necessidade comunicativa e
expressiva do ser humano”.
Conforme Gesser (2009), é uma crença equivocada considerar que as línguas de sinais constituem
sistemas artificiais em que se utiliza a mímica, ou que seja um código secreto da comunidade surda. Cada
país possui sua língua de sinais com estrutura e gramática própria.
Além de estarem estruturadas em todos os níveis das línguas orais, conforme comprovam os estudos de
Stokoe (apud GESSER, 2009, p. 27), pode-se encontrar nas línguas de sinais outras características próprias
das línguas naturais, como a produtividade, a criatividade, a flexibilidade, a descontinuidade e a
arbitrariedade.
Como toda língua de sinais, a Libras possui como característica a sua estrutura linguística própria,
constituída de verbos, pronomes, advérbios, elementos de flexão em número – plural e singular –
intensificadores, quantificadores e estruturação de frases. Porém, tais mecanismos não

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seguem as regras gramaticais da língua portuguesa, oral. Na sua estrutura frasal, não se observam artigos e
preposições, e a flexão verbal não se dá como na língua oral. De certo modo, essa diversidade se verifica em
qualquer língua de sinais comparada à língua oral correspondente.
As palavras são expressas por meio de sinais considerados léxicos pela linguística e se estruturam a
partir dos mecanismos quirológicos (fonológicos), morfológicos, sintáticos, semânticos e pragmáticos,
conforme comprovam os estudos do linguista americano William Stokoe, na década de 1960 (GESSER,
2009).
As línguas de sinais podem expressar qualquer sentido, inclusive significados abstratos,
conforme expressa Brito (1998, p. 23):

A LIBRAS é dotada de uma gramática constituída a partir de elementos constitutivos das palavras ou
itens lexicais e de um léxico que se estruturam a partir de mecanismos fonológicos, morfológicos,
sintáticos, e semânticos que apresentam também especificidades, mas seguem também princípios básicos
gerais. É dotada também de componentes pragmáticos convencionais codificados no léxico e nas
estruturas da LIBRAS e de princípios pragmáticos que permitem a geração de implícitos, sentidos
metafóricos, ironias e outros significados não literais (BRITO, 1998, p. 23).

O alfabeto manual utilizado pela comunidade surda constitui um recurso considerado um empréstimo
linguístico da língua oral. Com ele, é possível formar palavras. Embora existam os sinais lexicais, muitas
vezes o alfabeto é utilizado quando não existe um sinal correspondente à palavra desejada na língua oral.
Para formar um sinal existe uma organização espacial que, conforme Quadros & Karnopp (2004),
Stokoe propôs um esquema linguístico estrutural para analisar a formação de sinais e fez a decomposição
dos sinais na ALS em três principais aspectos ou parâmetros que não carregam significados isoladamente:
configuração de mão (CM) locação (L) movimento (M). Atualmente, os estudos linguísticos identificam
os componentes ou parâmetros das línguas de sinais como: configuração das mãos (CM), movimento (M),
ponto de articulação (PA) e orientação (O). Também os componentes não manuais dos sinais, como a
expressão facial e/ou corporal são considerados parâmetros.
A configuração de mão (CM) refere-se às diversas formas que as mãos podem assumir, configurando-se
em formas correspondentes às letras do alfabeto ou não. As configurações

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aumentam à medida que surgem novos sinais. Isso ocorre devido ao fato de a Libras estar em constante
mudança.

Veja algumas configurações:

O exemplo abaixo mostra dois sinais que têm a mesma configuração de mãos:

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O ponto de articulação (PA) refere-se ao local em que incide a mão configurada: pode ser a
testa, as bochechas, os lábios, o queixo, as têmporas etc.

Os sinais correspondentes aos verbos “conhecer”


e “desculpar” têm o mesmo ponto de articulação,
mas a configuração da mão é diferente.

O sinal da palavra “hoje” não possui ponto de articulação. Neste caso, o espaço é neutro.

O movimento (M) constitui o deslocamento das mãos, que tanto pode ser de cima para baixo, da direita
para esquerda, retilíneo ou circular. Há tanto sinais estáticos quanto em movimento.

Exemplo: O sinal da palavra “família” possui


movimento circular

A orientação (O) refere-se à direção para onde se volta a palma da mão e depende do sinal e do contexto
em que ele está inserido: palma da mão virada para cima, para baixo, para a direita ou para a esquerda.

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Exemplo: No sinal da palavra “tarde”, a


palma da mão é orientada para baixo.

A expressão facial/corporal empresta naturalidade aos sinais. Porém, alguns sinais não necessitam de
expressão facial ou corporal. Veja alguns exemplos de expressões faciais.

Os sinais são formados a partir da combinação de dois ou mais parâmetros. Porém, não há sinais
correspondentes a cada uma das palavras da língua oral. Daí, a necessidade do alfabeto manual, considerado
um empréstimo linguístico das línguas orais. Considere-se também que um mesmo sinal é empregado para
expressar as diversas palavras que na língua oral apresentam o mesmo significado.
A estrutura sintática da Libras não segue as mesmas regras da língua portuguesa e, além da flexão
verbal diferenciada, não é comum o uso de artigos, preposições e conjunções. Mas não se pode afirmar
que ela seja uma língua agramatical. Na realidade, ela possui uma gramática diferenciada.
Às vezes, para expressar uma palavra em Libras, usam-se dois ou três sinais. Esses são denominados
sinais compostos:

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Por exemplo, para a palavra “melão” usam-se três sinais:

Na Libras pode-se incorporar a negação. Para isso, quando o sinal da palavra é acompanhado de
movimento, basta expressar esse movimento em sentido contrário, ou acrescentar a negação com o meneio
da cabeça, movimento também empregado para a incorporação da negação às palavras destituídas de
movimento.

A utilização lenta do alfabeto manual denomina-se datilologia. Geralmente, as pessoas surdas utilizam o
alfabeto manual rapidamente, de maneira ritmada. O seu emprego dessa forma é denominado soletração.
Para se fazer nomes pessoais, pode-se utilizar o alfabeto manual. Porém, quando uma pessoa entra para a
comunidade surda, ela recebe um sinal correspondente ao seu nome.
Outra característica da língua de sinais é a iconicidade, que corresponde ao emprego de ícones. Ícones
são aqueles sinais ou gestos que reproduzem a forma do objeto ou do ato que significam. Por exemplo: o
sinal correspondente ao verbo dançar simula alguém dançando, o de casa simula o telhado e o de fumar
simula alguém fumando. Esses e outros recursos dotaram as línguas de sinais com uma estrutura que lhes
permite a expressão de qualquer conceito, inclusive os mais

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abstratos. Desse modo, a língua de sinais tornou-se fundamental para a formação de qualquer profissional
que dá o devido valor à comunicação e que se preocupa com a inclusão social das minorias, sobretudo das
comunidades surdas.
Agora que você tem alguma noção sobre a história e a gramática da língua de sinais, vamos conhecer
um pouco sobre a tradução e a interpretação nessa língua.

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