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Direito Internacional Público

Teórico-Prático (Sumário)*

22 Novembro 2022

* Este material não substitui a consulta e o estudo das referências bibliográficas presentes no Programa da UC
Operações de manutenção da paz
Operações de manutenção da paz
▪ Não se encontram previstas na CNU
▪ Designação: PEACEKEEPING
▪ Doutrina: Capítulo “Seis e Meio” (6 ½ ), entre:
− Resolução Pacífica de Conflitos (Capítulo VI da Carta)
− E a ação em caso de ameaça a paz, rutura da paz e ato de
agressão (Capítulo VII da Carta)

▪ “Invenção” das NU instrumento não coercivo de


controlo dos conflitos / aplicado a uma variedade de
operações e tarefas
▪ Elemento “inovador” e “original” aplicável quando as
soluções tradicionais não são suficientes / para afastar a
hipótese da intervenção das superpotências nos conflitos
regionais
Operações de manutenção da paz
ORIGEM DO PEACEKEEPING
• Sessão da AG de 4 de novembro de 1956
• Invasão do Canal do Suez: pelas tropas da França, Grã-Bretanha e Israel
contra o Egito
• Os Estados tinham acordado cessar-fogo e restaurar o status quo ante
• França e a Inglaterra: tinham dado a entender que aceitariam que uma força das
NU pudesse intervir para assegurar a paz
▪ Ideia do peacekeeping: Lester B. Pearson (Secretario de Estado canadiano para os assuntos Externos)
“cessar-fogo não seria suficiente para resolver os problemas
que compunham o conflito”
➢ retirada dos ingleses, franceses e israelitas
➢ estabilização da situação entre o Egito e Israel
“deveria ser montada uma força de emergência capaz de
manter as fronteiras em paz enquanto se trabalha numa solução
política”
Operações de manutenção da paz
ORIGEM DO PEACEKEEPING
▪ Sessão da AG de 4 de novembro de 1956: estabeleceu Força de Emergência
Internacional das Nações Unidas:
- para assegurar e supervisionar a cessação das hostilidades
- mandando o Secretário-Geral para criar a força de emergência
internacional

▪ Solução: UNEF – UN Emergency Force I


✓ força multinacional
✓ estacionada na fronteira entre o Egito e Israel de
forma a separá-los
✓ criou uma zona-tampão entre o Egito e Israel para
evitar incursões armadas
✓ restabelecer a lei e a ordem antes da entrega das
zonas às autoridades egípcias
✓ supervisionar e seguir a retirada das forças israelitas
do Sinai e da Faixa de Gaza
Operações de manutenção da paz
DEFINIÇÃO DE PEACEKEEPING

Uso das forças militares desprovidas, no seu exercício, do


uso normal da força, para de-escalar ou pacificar
situações de conflito

apoio militar à diplomacia


meio de conter a situação enquanto diplomatas/mediadores
procuram uma solução política
sem emprego da força armada / não pretendem alterar o
equilíbrio de forças criados pelos beligerantes
Operações de manutenção da paz
ATORES E COMPETÊNCIAS À LUZ DA CNU

▪ As operações de paz são criadas, regra geral, pelo Conselho de


Segurança

▪ Técnica multidimensional e complexa de prevenção, gestão e


resolução de conflitos
▪ NU não possuem um exército próprio / os Estados fornecem
os contingentes necessários para a operação
Operações de manutenção da paz
ATORES E COMPETÊNCIAS À LUZ DA CNU
▪ Interpretação da CNU com vista a encontrar o fundamento jurídico

ARTIGO 1º, N.º 1 DA CARTA


objetivo principal da ONU é “Manter a paz e a segurança internacionais
e para esse fim: tomar medidas coletivas eficazes para prevenir e afastar
ameaças à paz e reprimir os atos de agressão, ou outra qualquer rutura da
paz e chegar, por meios pacíficos, e em conformidade com os princípios da
justiça e do direito internacional, a um ajustamento ou solução das
controvérsias ou situações internacionais que possam levar a uma
perturbação da paz”

ARTIGO 55º DA CARTA


A ONU tem como finalidade: “criar condições de estabilidade e
bem-estar, necessárias às relações pacíficas e amistosas entre as
Nações”
Operações de manutenção da paz
ATORES E COMPETÊNCIAS À LUZ DA CNU ❖ As operações de peacekeeping são
criadas ao abrigo do
▪ Da interpretação dos artigos 1º, nº 1 e 55º da Carta se pretendeu conferir Capítulo VI da Carta
poderes aos órgãos das N.U.:
❖ As resoluções que criam uma
➢ Conselho de Segurança: operação de peacekeeping raramente
• Artigo 36º da Carta: “o CS poderá, em qualquer fase de um mencionam o capítulo específico da
conflito… recomendar procedimentos ou métodos de solução Carta
apropriados” para a resolução desse mesmo conflito
• Artigo 38º da Carta: “poderá, se todas as partes num Doutrina: artigo 40º da Carta
conflito assim o solicitarem, fazer recomendações às partes como a raiz do peacekeeping:
tendo em vista uma solução pacífica do conflito” CS pode “convidar as partes
• Artigo 33º da Carta: enumera as medidas de caráter pacífico interessadas a aceitarem as medidas
(negociação, inquérito, mediação, conciliação, arbitragem, via judicial, recurso a provisórias que lhe pareçam
organizações ou acordos regionais, ou qualquer outro meio pacífico à sua escolha) necessárias ou aconselháveis”
Operações de manutenção da paz
ATORES E COMPETÊNCIAS À LUZ DA CNU
▪ Da interpretação dos artigos 1º, nº 1 e 55º da Carta se pretendeu conferir poderes aos órgãos das N.U.:

➢ Conselho de Segurança:
- Cria a operação através de um voto formal: 9 votos afirmativos / 5 membros permanentes ou a
sua abstenção
➢ aprova um relatório: preparado pelo Secretário-Geral (prevê o mandato / duração da operação)

- Responsável pelo acompanhamento do processo de execução (cabe ao Secretário-Geral fornecer


informações sobre o que se passa no terreno)
Operações de manutenção da paz
ATORES E COMPETÊNCIAS À LUZ DA CNU
▪ Da interpretação dos artigos 1º, nº 1 e 55º da Carta se pretendeu conferir
poderes aos órgãos das N.U.:
➢ Assembleia Geral (secundário):
• Artigo 10º da Carta: confere à AG poder para discutir qualquer assunto que esteja dentro dos fins da Carta e das
suas atribuições e de fazer recomendações aos Estados Membros ou ao CS
• Artigo 11º, nº 2 Carta: especifica que a AG “poderá discutir quaisquer questões relativas à manutenção da paz e da
segurança internacionais” e que “poderá fazer recomendações relativas a quaisquer destas questões ao(s) Estado(s)
interessado(s) ou ao CS”
• Artigo 14º da Carta: afirma que a AG “poderá recomendar medidas para a solução pacífica de qualquer situação,
qualquer que seja a sua origem, que lhe pareça prejudicial ao bem-estar geral ou às relações amistosas entre as
nações”
• Artigo 22º da Carta: autoriza a AG a criar os órgãos subsidiários que julgar necessários ao desempenho das suas
funções
Operações de manutenção da paz
ATORES E COMPETÊNCIAS À LUZ DA CNU
▪ Da interpretação dos artigos 1º, nº 1 e 55º da Carta se pretendeu conferir
poderes aos órgãos das N.U.:
➢ Secretário-Geral (margem de ação política):
• Artigo 97º da Carta: pode ser interpretado como permitindo a criação de uma força das NU quando afirma que “o
Secretariado será composto do pessoal exigido pela Organização” autoriza o SG a recrutar pessoal com treino e
equipado com armas para a proteção de outros membros do Secretariado, missões no terreno, comissões de inquérito,
conciliação ou mediação e para a guarda dos arquivos e propriedade das NU.

• Artigo 98º da Carta: delegação de poderes no SG no âmbito da para criação pelo CS de uma missão de peacekeeping
➢ supervisionar as operações: esforços diplomáticos, como a mediação e as negociações
com as partes em conflito
• Artigo 99º da Carta: o SG pode chamar a atenção do CS para a necessidade de criar uma missão de peacekeeping
Operações de manutenção da paz
REQUISITOS DO PEACEKEEPING
− O oficial comandante das forças deveria ser nomeado pelas NU e seria
responsável perante a AG e/ou CS (legitimidade)
− Missão é independente em relação a qualquer Estado
− O mandato deve ser claro e exequível
− A força não deveria conter elementos oriundos dos cinco membros
permanentes do CS
− A operação deveria ter o consentimento das partes, não sendo uma
imposição a nenhuma delas
− Não deveria interferir com o equilíbrio político e militar do conflito ➢ Após 1973 foram adicionados 2 novos
requisitos:
− Deveria ser de duração breve
− Os capacetes azuis só podem usar a força em
− Estão sob o comando operacional do SG legítima defesa
− Destacadas para o terreno para ajudar a controlar a resolver conflitos − Os Estados da região onde o conflito se
internacionais (cooperação) localiza não devem participar na operação
Operações de manutenção da paz
CATEGORIAS DO PEACEKEEPING
▪ Tradicionalmente, as operações de manutenção da paz inserem-se em
duas categorias principais:
➢ missões de observação: são formadas por pessoal militar não
armado e civil − investigação dos conflitos;
− supervisão dos armistícios;
Atividades: − manutenção dos cessar-fogos;
− patrulhar zonas-tampão;
− supervisionar a retirada das tropas;
− observação de eleições

➢ forças de manutenção de paz: são compostas por forças equipadas com armas ligeiras e incluem contingentes
de infantaria plenamente equipados
− interposição ou separação de forças
Atividades:
− a manutenção da lei e da ordem
Operações de manutenção da paz
PEACEKEEPING PÓS-GUERRA FRIA
CS - ao abrigo do Capítulo VII - utilizou a força armada para
1990 lidar com um caso de agressão entre Estados (crise do Kuwait)
▪ Passa a interpretar como “ameaça à paz e a segurança internacional”:
conflitos internos armados, crises humanitárias e atendados contra
as democracias
Exemplo: Resolução do CS 688(1991) o CS descreve o êxodo curdo
(norte do Iraque) como uma ameaça à paz e a segurança internacional,
implicitamente enquadrando esta crise interna no Capítulo VII da Carta

➢ Os conflitos internos durante as décadas de 1980/1990 pautaram-se por:


− abusos massivos dos direitos humanos − as partes envolvidas correspondiam a: facções do exército, a milícias,
− pilhagem guerrilhas e grupos de bandidos o que dificultava a identificação
− aumento das violações de mulheres − a distinção entre combatente e não-combatente torna-se ténue
− violência contra as populações civis e instalações civis (como − difícil discernir entre quem é a vítima e o agressor
hospitais, escolas, centros de acolhimento dos refugiados e − as dimensões externas e internas dos conflitos tornam-se de difícil
locais de interesse cultural) demarcação devido a interferência de atores endógenos e exógenos, estatais e
privados, militares e para-militares, criminosos
Operações de manutenção da paz
NOVOS PARADIGMAS DO PEACEKEEPING
▪ Segunda geração foi designada de “Operações de Apoio à Paz” (PSO)
▪ Novas tarefas: a ajuda humanitária às populações, à reconstrução dos
países devastados pela guerra, reconstrução de infraestruturas (escolas,
hospitais, presídios), desarmamento e desmobilização dos combatentes e
ao estabelecimento de governos democráticos nos países que sofreram
conflitos.

▪ Requisitos: neutralidade, imparcialidade e consentimento (relativizadas)


➢ Principais consequências:
✓ torna-se possível a intervenção em um conflito ainda que não haja um acordo político com as
partes
✓ o uso da força por parte dos capacetes azuis
✓ intervenção num conflito local quando a autoridade estatal desapareça
Operações de manutenção da paz
▪ A operação de paz pode ter como tarefa:
Missão de Peacekeeping (prevenção / evitar a eclosão do conflito ou o seu reacendimento)
− Diplomacia preventiva ou intervenção preventiva: ação destinada a impedir a eclosão de disputas entre as partes
− Manutenção da paz: presença das NU no terreno em regra envolvendo pessoal militar e civil, com o consentimento
das partes em conflito (cessar-fogo, separação das forças no terreno)
− Operações com ênfase humanitária: em territórios onde a autoridade estatal não funciona
− Imposição da paz: poderá ser necessário o recurso à imposição da paz quando todos os outros esforços falharem
(Capítulo VII da Carta)

Missão de Peacemaking (esforços para levar as partes à conclusão de um acordo político)


− Realização da paz: ação diplomática destinada a levar as partes adversárias a um acordo negociado através dos meios
pacíficos, previstos no Capítulo VI da Carta (artigo 33º)

Missão de Peacebuilding (esforços para consolidar a paz após a conclusão da fase violenta do conflito)
− Construção da paz: trata-se de uma atividade crítica após o conflito
Intervenções armadas humanitárias
▪ As operações de peacekeeping da segunda geração criaram alguns precedentes: o da intervenção nos assuntos
internos sem o consentimento do Estado-alvo
▪ Justificativas para a intervenção:
➢ Situações de inexistência do aparelho estatal (Estados falhados)
➢ Incapacidade ou violência dos Estados sobre os seus cidadãos
➢ Guerra civil com apoio de facções externas
▪ O conceito de intervenção humanitária foi sendo desenvolvido como “RESPONSABILIDADE DE PROTEGER”
▪ A partir de 2005: consenso global de que os Estados têm a responsabilidade de proteger, quando:
✓ uma população estiver ameaçada de genocídio ✓ catástrofes naturais
✓ crimes de guerra / limpeza étnica ✓ crimes contra a humanidade
▪ Deveres dos Estados: a prevenção, a ação contra o incitamento, a capacidade de lançar alertas precoces e todo o tipo
de medidas que forem apropriadas
Cabe à comunidade internacional: a recorrer a medidas diplomáticas/humanitárias/outros meios pacíficos de
modo a proteger as populações
Se estas medidas se revelarem inadequadas: compete ao CS (Capítulo VII da Carta) decidir, caso a caso, o
uso da força
Exercício 1
O Estado “A” e o Estado “B” encontram-se sob tensão desde que o Estado “B” afirmou que parte do território do Estado
“A” lhe pertencia por direito. Neste contexto, o Presidente do Estado “B” pronunciou-se através da rede pública de
televisão do seu Estado afirmando que «os cidadãos do Estado “A” deveriam estar preparados para o dia em que tomaria
posse do que historicamente pertencia ao seu país”. O Estado “A” condenou publicamente este «ataque verbal» e
solicitou explicações. O Estado “B” manteve-se em silêncio.
Passada algumas semanas o exército do Estado “B” posicionou-se junto da fronteira com o Estado “A”, embora tenha
feito tentativa de atravessa a fronteira, não o fez.
Ao mesmo tempo, um grupo de cidadãos do Estado “B”, autoproclamados “ForceB” afirmou publicamente que como o
governo de “B” não fez nada para destruir o Estado “A”, iria tomar medidas para reconquistar o território que a seus
olhos pertencia ao Estado “B”, nomeadamente com a colocação de bombas em lugares estratégicos no Estado “A”.

Comente a situação.
Exercício 2
O Estado “S”, situado no continente africano de grande dimensão territorial e populacional, invadiu em novembro de
2021 o território do seu vizinho Estado “N” alegando que o governo deste último desenvolvia uma política desastrosa
no que se refere à conservação dos respetivos recursos hídricos, pondo em causa a futura sobrevivência do seu povo.

O Estado “S” sustentou a sua ação no quadro da ingerência humanitária.

Aprecie a situação.

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