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GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
Pouco a pouco, serão deixados de lado os problemas que eram centrais para a
psiquiatria clássica. Saber se o paciente tem alucinações, escuta vozes, imagina ser
UMA pessoa que não é, confunde realidade com fantasia, ou fazer com que o paciente
reconheça sua própria loucura deixarão de ser as questões articuladoras do saber e do
poder psiquiátrico. A teoria da degeneração permite que os pequenos desvios de
conduta, os estigmas físicos ou psíquicos e, em menor medida, os delírios
insignificantes se transformem em signos anunciadores de alienação mental. O
tratamento era sempre o internamento psiquiátrico; não existiam diferenças entre aquele
indivíduo que consegue levar uma vida familiar e de trabalho, mas não pode dominar a
compulsão em enunciar certas palavras, a mulher que escolhe alimentar-se
exclusivamente de comida vegetariana para evitar a violência contra os animais, e o
indivíduo que sofre alucinações e que a psiquiatria clássica caracterizaria como um
quadro psicótico.
Sobre essa identificação entre condutas cotidianas e patologia psiquiátrica foram se
construindo as bases epistemológicas da psiquiatria moderna.
No entanto, a degeneração não desaparece simplesmente do âmbito da psiquiatria; ela
sofre transformações, adota novos nomes, impulsiona novas estratégias de ação, mas
deixa marcas indeléveis na história da psiquiatria.
Seja com o nome de desequilíbrios, seja com o de predisposições hereditárias ou de
configurações patológicas, a psiquiatria continuará interessada em desvendar os mesmos
segredos que alentaram o programa de pesquisa das degenerações: a relação entre
patologias psiquiátricas e herança mórbida, a construção de uma psiquiatria preventiva
atenta ao caráter evolutivo das patologias e a busca pela localização cerebral de
sofrimentos psíquicos
A teoria da degeneração foi alvo de diversos questionamentos que destacavam a abusiva
extensão das alienações mentais a partir da introdução das patologias de degeneração.
Charpentier advertia em 1885 para as consequências de se aceitar, sem
questionamentos, uma classificação de doenças mentais que incluía as doenças
heredodegenerativas.
Para ele, a teoria da degeneração ou das patologias heredodegenerativas permite uma
extensão abusiva do domínio da psiquiatria, possibilita criar um grupo indefinido de
‘loucuras disparatadas’. Nessa lógica classificatória, cada conduta, gesto, tique passará a
ser indicativo de uma síndrome, resultando impossível diferenciar um adolescente
melancólico, pela influência da leitura de romances, das aberrações sexuais monstruosas
cometidas por um psicótico (apud Magnan, 1893). A teoria da degeneração permite e
legitima a existência de fronteiras difusas entre o normal e o patológico, possibilita a
ingerência do saber médico nos pequenos medos e angústias cotidianas, nos estados de
tristeza, nas situações de dúvida, enfim, nos pequenos desequilíbrios cotidianos.
Tanto na teoria da degeneração quanto na classificação de Kraepelin ou na psiquiatria
atual, existem fronteiras difusas entre o normal e o patológico, possibilitando a
ingerência da psiquiatria em todos os assuntos humanos.
A psiquiatria, a partir da teoria da degeneração, tenderá a observar as patologias mentais
em uma perspectiva temporal e evolutiva, tornando-se preventiva, o que significa que os
pequenos gestos e desvios de conduta passam a ser vistos como signos anunciadores de
alienação mental.
De acordo com Nikolas Rose (2007), que vem se colocando como grande seguidor de
Foucault e se faz forte desde a primeira metade do século XX, uma das formas de se
entender a subjetividade humana, visto que “especialmente no contexto das
sociedades liberais avançadas, era considerando nossos ‘eu interiores’ como amplos e
profundos territórios com áreas inacessíveis à consciência. Mesmo parcialmente,
seria a biologia humana, por meio dos vocábulos veiculados pela biomedicina, que
nos traria elementos para nossa construção de individualidade, organizando
identidades, juízos e ações.” Assim estaria instaurado uma mescla de discursos
oficiais de promoção de saúde, advindas da facilidade de difundir essa comunicação
por meios da mídia, fazendo situações de adoecimento e sofrimento, e também
efeitos psicológicos e físicos de práticas de aptidão física, hábitos alimentares,
alterações cirúrgicas, inscrições/perfurações corporais, uso de drogas lícitas e ilícitas
etc...
Produção de psicofármacos X produção de escuta ativa
Conclusão
Os textos de Kraepelin dão origem a diversas linhas de pesquisa que se mantêm mais
ou menos inalteradas até nossos dias. A metodologia de pesquisa dos transtornos
mentais por ele inaugurada inclui um novo modo de classificar as patologias
psiquiátricas; um interesse em aprofundar os estudos de anatomopatologia cerebral; a
multiplicação de dados estatísticos