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1 O PROGRAMA DE INSTITUCIONAL DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA (PIBID) E

2 A EDUCAÇÃO INCLUSIVA: O TEATRO COMO EXPERIÊNCIA


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4 RESUMO

5 O presente trabalho surge da necessidade do SubProjeto Teatro/IFCE/Campus Fortaleza de resistir no


6 contexto escolar ao propor desenvolver suas atividades junto à Educação de Jovens e Adultos (EJA). Diante
7 desse contexto, o objetivo principal é refletir sobre a prática do ensino de teatro dentro de uma turma do EJA
8 na Escola de Ensino Médio e Tempo Integral Monsenhor Dourado. O caminho metodológico adotado foi a
9 pesquisa bibliográfica com leituras acerca do assunto e, a de campo, com aulas teórico-prática e entrevistas
10 com alunos e professoras. Conclui-se que a Teoria da Abordagem Triangular, teorizada por Ana Mae
11 Barbosa, foi o dispositivo chave que norteou como método as aulas da turma, que propunham como objetivo
12 central o simples prazer pela experiência em/com/do teatro, que vai desde o apreciar até o fazer.

13 Palavras-chave: Educação inclusiva. Ensino do teatro. Experiência estética.

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15 O interesse na pesquisa surge do desafio de lecionar aulas de teatro na Escola de
16 Ensino Médio e Tempo Integral Monsenhor Dourado para uma turma de Educação de
17 Jovens e Adultos (EJA). Os estudantes da EJA geralmente são um grupo bastante
18 heterogêneo. Chegam à escola já com uma grande bagagem de conhecimentos adquiridos
19 ao longo de histórias de vida. São donas de casa, balconistas, operários, serventes da
20 construção civil, agricultores, imigrantes de diferentes regiões do país, mais jovens ou mais
21 velhos, homens ou mulheres, neste caso em específico, a turma era composta
22 exclusivamente por alunos com Deficiência Intelectual – DI, Síndrome de Down e
23 Autismo. A qual a maioria dos alunos da turma eram DI.
24 Desde o início alguns questionamentos surgiram: De que maneira aplicar os
25 conteúdos do teatro para eles? Como orienta-los em uma possível encenação? Como
26 explicar os conceitos de ator, dramaturgia, composição cênica, cenografia, jogo teatral,
27 iluminação, teoria teatral e etc. essas e outras questões direcionaram os dois bolsistas
28 responsáveis pela turma.
29 Diante desses desafios e contexto estabeleceu-se como objetivo para este trabalho
30 refletir sobre a prática do ensino de teatro dentro de uma turma de EJA da referida escola, a
31 partir da experiência da bolsa do PIBID.
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33 Desbravando um mundo desconhecido
34 A escola possui um histórico de ser referência na educação especial, atualmente
35 concebida como educação inclusiva. A escola se divide entre turmas denominadas regular
36 e EJA. Os professores das turmas do EJA possuem formação em pedagogia e atuam como
37 polivalente.
38 A ida dos bolsistas de teatro para a turma se iniciou em março de 2017 com aulas
39 semanais. Como uma imersão num território desconhecido, os bolsistas chegam à primeira
40 aula propondo uma roda de conversa para falar de si, quem somos e o que queremos. A
41 primeira novidade para a turma era levantar da carteira para se organizar em círculo.
42 Naquele dia a aula aconteceria em roda. Os alunos demostraram timidez nesse primeiro
43 contato. Era tudo muito novo tanto para os bolsistas quanto para os alunos. Mesmo com
44 alguma dificuldade foi possível conhecer um pouco a turma e os sujeitos ali presentes.
45 No planejamento de aula foi tomada a decisão de apresentar o teatro aos alunos, por
46 meio do teatro de animação, especificamente, o teatro de bonecos com dedoches.

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2 Assim como muitos outros jogos de dramatização e faz-de-conta este recurso
3 ajuda a criança a construir a sua identidade, pois, nestes jogos, ela poderá
4 desempenhar diversos papéis sociais (mãe/filha, pai/filho, professor, médico,
5 policial, bruxa, fada, etc.) e experimentar diferentes sensações e emoções. [...] Os
6 bonecos constituem um poderoso estímulo para o desenvolvimento da linguagem
7 nas crianças pequenas, afinal, elas sempre demonstrarão interesse na audição de
8 histórias contadas pelos “amigos” bonecos. Para elas, é fascinante ver que um
9 adulto pode emprestar sua voz e seu corpo para dar vida a um personagem, bem
10 como ter a possibilidade de também assim o fazerem. (ABASTO, 2010).
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12 A segunda aula foi um elemento surpresa, contou com uma encenação de teatro de
13 bonecos realizada pelos próprios bolsistas em sala, chamada de A história de um Cajueiro,
14 os alunos reagiam a cada gesto, cada ação e cada entonação dos personagens. Tudo parecia
15 mágico para eles. Para muitos foi o primeiro contato com uma obra teatral. A terceira aula
16 foi dedicada à confecção de dedoches com o auxílio dos bolsistas e das duas professoras de
17 sala. Percebeu-se dificuldade com coordenação motora e uma necessidade de dilatação do
18 tempo-espaço da aula. O que estava planejado para uma aula, precisou de duas.
19 Uma das professoras relata “era desafio a cada dia, é sempre legal ver os bolsistas
20 trazendo atividades lúdicas, diferentes... Acho que muitos nunca fizeram coisas assim, ver
21 um teatro, dançar em roda, fazer ciranda, né?” (ARISA, 2017, trecho da entrevista).
22 O perfil da turma ia sendo desenhado pelos bolsistas aos poucos. Sempre depois
23 das aulas todos conversavam sobre como havia sido o dia. Numa tentativa de proporcionar
24 a reflexão nos alunos, a construção de suas narrativas cotidianas, muitos apresentavam
25 dificuldade na fala, na elaboração de frases e na construção de um pensamento.
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27 Metodologia
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29 Ao planejar as aulas, as preocupações como: de que maneira aplicar os conteúdos
30 do teatro para eles? Como orienta-los em uma possível encenação? Como explicar os
31 conceitos de ator, dramaturgia, composição cênica, cenografia, jogo teatral, iluminação,
32 teoria teatral e etc? Adriana Leite em seu texto sobre a pedagogia da negação auxilia ao se
33 referir aos professores ao planejar seus trabalhos/aulas:
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35 Em suma [...] eles se fecham em uma pedagogia da negação. Uma pedagogia que
36 não reconhece o potencial dos alunos, sobretudo daqueles que apresentam
37 eficiência/ou deficiência intelectual e que, consequentemente causa prejuízos
38 para as suas aprendizagens e autodeterminação. (LEITE, p. 7, 2010).
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40 A reflexão da autora suscitou pensar o planejamento das aulas a partir da
41 necessidade dos alunos. Do que eles, provavelmente não tinham experimentado, mas
42 supostamente lhes despertariam desejo e atenção.
43 Feito o planejamento, seguiu-se para a prática do que fora pensado. Os bolsistas
44 elaboraram todo o material necessário para a apresentação do esquete A história do
45 Cajueiro. Papelão, papel crepom, folhas coloridas e E.V.A para fazer a caixa cênica. Inicia-
46 se a construção do teatro! Os personagens da história foram construídos a partir de um
47 trabalho de impressão e colagem, assim nasciam os dedoches.
48 Na apresentação do esquete, já citado a cima, evidenciou-se uma fase da abordagem
49 triangular, teorizada por Ana Mae Barbosa, chamada de fase da leitura, na qual os alunos
50 vivenciaram a apreciação estética. Sobre a teoria, explica Ana Mae:

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3 Em arte-educação a Proposta Triangular, que até pode ser considerada
4 simplificadora comparada com os parâmetros das nações centrais, tem
5 correspondido à realidade do professor que temos e à necessidade de
6 instrumentalizar o aluno para o momento em que vivemos, respondendo ao valor
7 fundamental a ser buscado em nossa educação: a leitura, a alfabetização. A
8 Proposta Triangular foi experimentada no Museu de Arte Contemporânea da
9 USP de 1987 a 1993, tendo como meio a leitura de obras originais. De 1989 a
10 1992 foi experimentada também nas escolas da rede municipal de ensino de São
11 Paulo, tendo como meio reproduções de obras de arte e visitas aos originais no
12 museu. Este projeto foi iniciado no período em que Paulo Freire foi Secretário de
13 Educação do Município de São Paulo. Ainda em 1989, iniciou-se a
14 experimentação da Proposta Triangular usando-se o vídeo para a leitura da obra
15 de arte. Este último projeto, financiado e coordenado pela Fundação IOCHPE
16 envolveu uma pesquisa preliminar em Porto Alegre, RS, e deflagrou intenso
17 programa de atualização de professores em muitos Estados e cidades do Brasil.
18 O objetivo era atingir escolas no interior do país onde não há museus e onde as
19 bibliotecas têm poucos livros de arte, pois estes são muito caros no Brasil. Por
20 outro lado, dificilmente uma cidade deixa de ter um aparelho de vídeo, pelo
21 menos na prefeitura. (BARBOSA, 1995, p.62).
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23 Dessa forma, embora a teoria de Barbosa esteja voltada para pensar inicialmente as
24 artes visuais, a mesma Proposta Triangular torna-se importante e fundamental ao propor
25 uma divisão sistemática das aulas, no qual o processo de aprendizagem passeia pelos
26 caminhos do ler, apreciar e fazer o ato artístico, que cabe para qualquer área de ensino da
27 Arte.
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37 Figura 1 – Teatro de bonecos – dedoches.
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40 Assim trabalhou-se com o Teatro de Animação, no caso, o teatro de bonecos,
41 usando o dedoche a princípio. Após a apresentação foi feita uma roda de conversa para
42 falar sobre a experiência. Para a maioria da turma era o primeiro contato com uma obra de
43 arte. Muitos nunca tinham nem ouvido falar em peça de teatro, quanto mais ter visto uma.
44 A sensação de encanto se percebia no olhar e na fala de cada aluno ao expressar o que
45 tinha visto/vivido.

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1 Estava acontecendo um distencionamento nos alunos, para apresentar como seriam
2 as aulas de teatro adiante. A relação, a conversa, o contato, o sentar em círculo. Ingrid
3 Koudela propõe uma reflexão acerca:
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5 A educação não pode ficar atrelada a um conceito de educação para o trabalho. E
6 menos ainda podemos excluir a arte do conceito de produção. Ao contrário, a
7 educação e a arte exigem a ampliação do conceito de educação, incorporando
8 diversidades existentes na civilização [...] (KOUDELA, p. 290, 2014.)
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10 A aula precisou ser entendida como um momento. O aprendizado não pode se
11 resumir a uma ação de copiar e escrever. Não apenas. O contato com a arte extrapola essa
12 ação cotidiana, o contato com a arte possibilita ir além, explorar, transgredir, horizontalizar
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14 Resultados e discussão

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16 Percebeu-se uma grande timidez por parte de alguns alunos, dessa forma,
17 necessitou-se de uma dilatação no tempo das aulas/atividades. O que estava planejado para
18 ser realizado em uma única aula foi preciso de mais duas ou três para que os alunos
19 entrassem no exercício e produzissem sentido no fazer artístico.
20 As professoras responsáveis pela turma reconhecem que o trabalho desenvolvido
21 pelos bolsistas contribui fortemente para o aprendizado e interação dos alunos.
22 Sementes foram plantadas, as flores estão brotando e anunciando que vem fruto
23 muito em breve. Os resultados alcançados para maioria das pessoas que veem com um
24 olhar de fora, é algo muito pequeno, mas para aqueles alunos com tantas dificuldades cada
25 conquista que envolva sua participação, disponibilidade e ação prática mínima já faz uma
26 grande diferença.
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31 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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33 Entende-se como indispensável o contato com arte, com o que é sensível e humano.
34 A cada aula o elo, a vontade e o interesse se evidenciavam nos gestos dos alunos. O
35 despertar para a experiência com o teatro só se dilatava.
36 Para os bolsistas era sempre um novo desafio. O que vivenciar agora? A
37 preocupação com a adequação dos conteúdos do teatro para a turma nunca finda, estava e
38 está sempre no pensamento/planejamento. Assim, conclui-se que, as aulas para a turma têm
39 que ter como objetivo central o simples prazer pela experiência em/com/do teatro, que vai
40 desde o apreciar até o fazer.
41 Neste ensejo, a vivência dentro do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à
42 Docência – PIBID com o SubProjeto Teatro torna-se um ato de resistência, é como um
43 cantil de água em uma terra árida, seca e de pouca vida, mas que ao se insistir em plantar a
44 semente pode dar muitos frutos.
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1 Referências Bibliográficas
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3 ABASTO, Maria. Teatro de bonecos: um gênero teatral que inclui educação. Disponível
4 em https://goo.gl/8kycLE.

5 AMARAL, M. V. N, SILVA, M. B. Conferências em arte/educação: narrativas plurais.


6 Recife: Gráfica Flamar Editora, 2014.

7 BARBOSA, Ana Mae. Arte-educação pós-colonialista no Brasil: aprendizagem


8 triangular. Comunicação e Educação, São Paulo, v21, 59 a 64, jan./abr. 1995.

9 GOMES, Adriana Leite Verde. POULIN, Jean-Robert. FIGUEIREDO, Rita Vieira de.
10 Educação especial na perspectiva da inclusão escolar. Brasília. Ministério da educação,
11 secretaria de educação especial, 2010.

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