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MARCELLA DA SILVA ESTEVEZ PACHECO GUEDES

Didática

1ª Edição

Brasília/DF - 2020
Ficha catalográfica elaborada pela Bibliotecária Marjorie Gonçalves Andersen Trindade, CRB-1/2704

G924d

Guedes, Marcella da Silva Estevez Pacheco


Didática / Marcella da Silva Estevez Pacheco Guedes. – Brasília :
Alumnus, 2020.

99 p.
Recurso online: e-book
Modo de acesso: world wide web

ISBN 978-65-89227-03-8

1. Educação. I. Pedagogia. 2. Didática. I. Aprendizagem. 3. Prática de


ensino. I. e-book. II. Título.

CDU 37.02

Autores
Marcella da Silva Estevez Pacheco Guedes

Produção
Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e
Editoração
Sumário
Organização do Livro Didático........................................................................................................................................4

Introdução...............................................................................................................................................................................6

Capítulo 1
Didática: Processos Históricos....................................................................................................................................9

Capítulo 2
A Didática como Eixo Estruturante do Trabalho Docente............................................................................. 20

Capítulo 3
As Tendências Pedagógicas e a Prática Educativa........................................................................................... 30

Capítulo 4
Planejamento: ação pedagógica essencial......................................................................................................... 44

Capítulo 5
A Avaliação no Trabalho Docente.......................................................................................................................... 66

Capítulo 6
A Didática em Meio a Tempos e Possibilidades de Ressignificação da Escola...................................... 80

Referências........................................................................................................................................................................... 97
Organização do Livro Didático
Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em capítulos, de forma didática, objetiva e
coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, entre outros
recursos editoriais que visam tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também,
fontes de consulta para aprofundar seus estudos com leituras e pesquisas complementares.

A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização do Livro Didático.

Atenção

Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a


síntese/conclusão do assunto abordado.

Cuidado

Importante para diferenciar ideias e/ou conceitos, assim como ressaltar para o
aluno noções que usualmente são objeto de dúvida ou entendimento equivocado.

Importante

Indicado para ressaltar trechos importantes do texto.

Observe a Lei

Conjunto de normas que dispõem sobre determinada matéria, ou seja, ela é origem,
a fonte primária sobre um determinado assunto.

Para refletir

Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa
e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio.
É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus
sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas
conclusões.

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Organização do Livro Didático

Provocação

Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.

Saiba mais

Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões


sobre o assunto abordado.

Sintetizando

Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o


entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos.

Sugestão de estudo complementar

Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo,


discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso.

Posicionamento do autor

Importante para diferenciar ideias e/ou conceitos, assim como ressaltar para o
aluno noções que usualmente são objeto de dúvida ou entendimento equivocado.

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Introdução
Não há como pensar em implementar mudanças nas práticas pedagógicas sem investir em
currículos formativos que se constituam terreno fértil para fomento dessas práticas.

Neste Livro Didático veremos conceitos e questionamentos que têm permeado os estudos
sobre didática na contemporaneidade e que irão embasar nossa reflexão sobre a relação
entre o processo de ensinar e a aprendizagem.

Embora, na área pedagógica, a tendência para a abordagem de questões relativas à


“didática”, na maioria das vezes, tenha ficado restrita ao aspecto técnico e instrumental
de como o professor deve organizar e desenvolver o ensino de um conteúdo específico,
pretendemos, aqui, tratar o “como ensinar” do ponto de vista da relação sociedade-
educação.

O nosso objetivo principal aqui é dar instrumentos que possibilitem um olhar crítico
sobre a Didática, propondo mudanças que levem a uma escola atenta à diversidade
em seus diferentes aspectos. Para isso, no capítulo 1 – Didática: processos históricos
contextualiza o aluno com a abordagem histórica sobre a didática. Veremos que a
disciplina é fundamental para a formação de professores.

No c a p í t u l o 2 – A D i d á t i c a c o m o e i x o e s t r u t u r a n t e d o t r a b a l h o d o c e n t e
re f l e t i re m o s s o b re o f u n d a m e n t a l d a d i d á t i c a e a m u l t i d i m e n s i o n a l i d a d e d o
p ro c e s s o d e e n s i n o - a p re n d i z a g e m . A s s i m c o m o d e v e m o s c o m p re e n d e r q u e o
m é t o d o d i d á t i c o t e m d i f e re n t e s e s t r u t u ra n t e s.

No capítulo 3 – As tendências pedagógicas e a prática educativa iniciamos com uma


análise sobre a escola como espaço de construção do conhecimento. Nosso desafio é
pensar de que forma todas as mudanças relacionadas à subjetividade vêm atingindo a
educação, a escola, a prática educacional e, consequentemente, o papel e a atividade do
professor também vêm sendo colocados no centro desse debate. A análise das principais
tendências pedagógicas, as de cunho liberal e progressista, nos ajudará a compreender
e refletir sobre a situação do ensino, o lugar da escola e o papel docente na atualidade.

Já nos capítulos 4 e 5 apresentamos dois temas clássicos de interesse da Didática: o


planejamento educacional e a avaliação. No capítulo 4 – Planejamento: ação pedagógica
essencial teremos como foco o papel e a importância do planejamento na atividade
educacional. Discutiremos por que é importante e necessário planejar, a função do
planejamento na atividade educacional e sua interface com outras dimensões pedagógicas.
Veremos que o planejamento de aulas é parte fundamental da atividade docente e,

6
quando encarado como ferramenta de trabalho, e não como mera burocracia, poderá
trazer inúmeros benefícios.

O objetivo do capítulo 5 – A avaliação no trabalho docente é identificar como a avaliação


em suas diferentes dimensões pode contribuir para práticas e políticas educacionais que
tornam as escolas melhores. Em um primeiro momento, analisamos os fundamentos e
a expansão da avaliação educacional e conceitos como mediação, controle, verificação,
pedagogia do exame etc., servem de apoio às reflexões produzidas. Procuramos problematizar
os desafios da avaliação na prática escolar, tendo em vista que a avaliação é uma tarefa
didática necessária e permanente do trabalho docente, que deve acompanhar passo a passo
o processo de ensino e aprendizagem.

Po r f i m , n o c a p í t u l o 6 – A d i d á t i c a e m m e i o a t e m p o s e p o s s i b i l i d a d e s d e
ressignificação da escola, nossa intenção é discutir algumas ideias a respeito
do fenômeno educacional em nossa sociedade, hoje. Em um primeiro momento,
vamos analisar as razões pelas quais a escola, como uma organização, tem sido
considerada, nos últimos anos, objeto especial de atenção por pesquisadores de
diferentes áreas de atuação. E embora encontremos estudos diversificados sobre
a escola, procuramos evidenciar que esta instituição, por vezes, se depara com
contextos de crise e contradições e, ao mesmo tempo, com crenças que depositam
uma fé renovada na redenção dos males atuais e superação de obstáculos estruturais,
por meio do sistema educacional. Retomamos aspectos relevantes na tentativa
de refletir a respeito da função social da escola e procurando pistas no campo da
Didática Intercultural que auxiliem na ressignificação dos processos de ensino e
aprendizagem, como estratégias de superação da crise e da hegemonia da forma
escolar.

Compreender o “como ensinar” com base nas relações entre a prática social e o interior
da escola supõe refletir que a escola, para cumprir sua função pedagógica explícita de
transmitir um saber científico sobre o mundo, organiza, desenvolve e avalia o ensino
por meio de relações implícitas que são estabelecidas entre os elementos envolvidos: o
professor, o aluno, o saber, os recursos etc.

Leia, destaque os pontos mais importantes, faça perguntas ao texto. Esse conteúdo deve
ser apreendido por você de forma crítica. Ajude o seu próprio processo de aprendizagem.
Interaja com o (a) professor (a), com seus colegas e com seus pares. Debata. Reflita.
Questione. Faça isso ao longo de todo o livro. Bons estudos!

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Objetivos

» Compreender os processos históricos da Didática.

» Refletir sobre a multidimensionalidade do processo de ensino-aprendizagem.

» Caracterizar as principais tendências pedagógicas no Brasil.

» Discutir o papel e a importância do planejamento na atividade educacional.

» Problematizar os desafios da avaliação na prática escolar.

» Analisar a Didática Intercultural como estratégia de superação da crise e da


hegemonia da forma escolar.

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DIDÁTICA: PROCESSOS HISTÓRICOS
CAPÍTULO
1
Introdução do Capítulo

O capítulo 1 – Didática: processos históricos contextualiza o aluno com a abordagem


histórica sobre a didática. A disciplina é fundamental para a formação de professores.
Convidamos, você, licenciando, a se aventurar nessa jornada didática, com reflexões
constantes sobre a prática educativa e seus processos relacionados ao ensino, ao trabalho
docente, à escola e à sociedade. É muito importante que você valorize a didática como
um campo de estudos que auxilia o desenvolvimento e a realização do trabalho docente,
ampliando o seu olhar sobre os processos educativos em busca de uma educação de
qualidade. Para tanto, propomos a seguinte organização para o seu estudo no capítulo 1:
a) os processos históricos da didática; b) estudo sobre os pensadores clássicos da Didática:
Comênio, Rousseau, Pestalozzi e Herbart; c) dos jesuítas à década de 1970: a Pedagogia
Tradicional, o Escolanovismo, o Tecnicismo e a Negação da Didática.

Objetivos

» Compreender os processos históricos da Didática.

» Refletir sobre o papel dos autores clássicos da Didática na construção da disciplina.

» Analisar os contextos históricos dos jesuítas à década de 1970.

» Problematizar a Pedagogia Tradicional, o Escolanovismo e o Tecnicismo.

Os processos históricos da Didática

Para refletirmos sobre a didática, é necessário resgatar os processos históricos


pertinentes a esse campo do conhecimento a fim de que possamos compreender as
relações sócio-históricas presentes no desenvolvimento desse campo disciplinar tão
importante para a formação dos professores e suas práticas pedagógicas.

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CAPÍTULO 1 • Didática: Processos Históricos

Para Libâneo (2013), a história da didática está vinculada ao aparecimento do ensino


como atividade planejada e intencional, relacionada à instrução. Na Antiguidade Clássica
(gregos e romanos) e no período medieval foram desenvolvidas formas de ação pedagógica
em escolas, mosteiros, igrejas, universidades. No entanto, até meados do século XVII,
não podemos falar de Didática como teoria do ensino, que sistematiza o pensamento
didático e o estudo científico das formas de ensinar.

Segundo Libâneo (2013, pp. 59-60):

O termo “didática” aparece quando os adultos começam a intervir na


atividade de aprendizagem das crianças e jovens através da direção deliberada
e planejada do ensino, ao contrário das formas de intervenção mais ou
menos espontâneas de antes. Estabelecendo-se uma intenção propriamente
pedagógica na atividade de ensino, a escola se torna uma instituição, o
processo de ensino passa a ser sistematizado conforme níveis, tendo em
vista a adequação às possibilidades das crianças, às idades e ritmo de
assimilação dos estudos.

Perceba que quando surgiu uma intervenção pedagógica, com certas intencionalidades
no processo de ensino, surgiu a Didática para sistematizar o processo educativo. Quanta
responsabilidade essa sistematização pode trazer! Que processos são esses? Como essa
sistematização pode ser feita? Quais os caminhos que podem guiar as ações educativas?
Como estamos enfatizando os processos históricos da construção da Didática, é preciso
contextualizar esses processos a partir de quatro pensadores essenciais nessa história
da Didática. São eles: João Amós Comênio (1592-1670), Jean-Jacques Rousseau (1712-
1778), Henrique Pestalozzi (1746-1827) e Johann Friedrich Herbart (1766-1841). Vamos
conhecer um pouco sobre suas ideias e filosofias? Elas representam um conjunto de
pensamentos didáticos que estavam muito presentes em seus respectivos tempos
históricos. O mais surpreendente será perceber que muitos desses pensamentos ainda
estão presentes na educação brasileira contemporânea, apesar da diversidade de
pensamentos educacionais. O autor Libâneo (2013) escreveu sobre os quatro autores
em sua obra. Conheceremos esses autores através de Libâneo. Aproveite este passeio
histórico e vamos nos aventurar nesta estrada do conhecimento.

Sugestão de estudo

Pesquise na internet textos e vídeos sobre os autores em destaque. Essa pesquisa será significativa para o estudo
sobre os processos históricos da didática.

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Didática: Processos Históricos • CAPÍTULO 1

João Amós Comênio (1592-1670)

A primeira obra clássica sobre Didática é o livro Didaticta Magna, escrito por João Amós
Comênio (1592-1670), um pastor protestante, educador, que foi o primeiro a formular a
ideia da difusão dos conhecimentos a todos e a criar príncipios e regras gerais do ensino.
A didática de Comênio possuía os seguintes princípios (LIBÂNEO, 2013, pp. 60-61):

1. A finalidade da educação é conduzir à felicidade eterna com Deus, pois é uma força
poderosa de regeneração da vida humana. Todos os homens merecem a sabedoria, a
moralidade e a religião, porque todos, ao realizarem sua própria natureza, realizam os
desígnios de Deus. Portanto, a educação é um direito natural de todos.

2. Por ser parte da natureza, o homem deve ser educado de acordo com o seu
desenvolvimento natural, isto é, de acordo com as características de idade e
capacidade para o conhecimento. Consequentemente, a tarefa principal da didática
é estudar essas características e os métodos de ensino correspondentes, de acordo
com a ordem natural das coisas.

3. A assimilação dos conhecimentos não se dá instantaneamente, como se o


aluno registrasse, de forma mecânica na sua mente, a informação do professor,
como o reflexo num espelho. No ensino, em vez disso, tem um papel decisivo
a percepção sensorial das coisas. Os conhecimentos devem ser adquiridos a
partir da observação das coisas e dos fenômenos, utilizando e desenvolvendo
sistematicamente os órgãos dos sentidos.

4. O método intuitivo consiste, assim, da observação direta, pelos órgãos dos


sentidos, das coisas, para o registro das impressões na mente do aluno.
Primeiramente, as coisas, depois as palavras. O planejamento de ensino
deve obedecer ao curso da natureza infantil; por isso as coisas devem ser
ensinadas uma de cada vez. Não se deve ensinar nada que a criança não possa
compreender. Portanto, deve-se partir do conhecido para o desconhecido.

Libâneo (2013), destaca, ainda, que Comênio escreveu esses princípios no século
XVII. Nesse período, ainda predominavam as práticas escolares da Idade Média:
ensino intelectualista, verbalista e dogmático, memorização e repetição mecânica dos
ensinamentos do professor. Não havia espaço para ideias próprias dos alunos, o ensino
era separado da vida, mesmo porque ainda era grande o poder da religião na vida social.
Na conjuntura social em destaque estavam ocorrendo mudanças nas formas de produção,
com um grande desenvolvimento da ciência e da cultura. O poder da nobreza e do clero
foi dimunuindo e o da burguesia foi aumentando. Sendo assim, a exigência era para um
ensino relacionado ao mundo da produção e dos negócios e, também, um ensino que
contemplasse o livre desenvolvimento da capacidade e dos interesses individuais.

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CAPÍTULO 1 • Didática: Processos Históricos

Perceba que as ideias de Comênio foram elaboradas a partir de uma contextualização


sócio-histórica. Lembre-se sempre: qualquer produção cultural ou de conhecimento é
fruto de embates sociais mais amplos, que estão em disputa na sociedade. O conhecimento
nunca é neutro. Quem produz conhecimento está sempre se posicionando de acordo
com o olhar que enxerga o mundo.

Algumas críticas podem ser feitas a Comênio, mas o fato de ele ter se empenhado em
desenvolver métodos de instrução mais rápidos e eficientes, além de ter desejado
que todas as pessoas pudessem usufruir dos benefícios do conhecimento, tornam-o
significativo para a história da Didática.

Que críticas seriam essas? Libâneo (2013, p. 61) enfatizou-as:

(...) Comênio não escapou de algmas crenças usuais na época sobre


ensino. Embora partindo da observação e da experiência sensorial,
mantinha-se o caráter transmissor do ensino; embora procurando
adaptar o ensino às fases do desenvolvimento infantil, mantinha-se o
método único e o ensino simultâneo a todos. Além disso, sua ideia de
que a única via de acesso dos conhecimentos é a experiência sensorial
com as coisas não é suficiente, primeiro porque nossas percepções
frequentemente nos enganam, segundo porque já há uma experiência
social acumulada de conhecimentos sistematizados que não necessitam
ser descobertos novamente.

As críticas ressaltadas por Libâneo: caráter transmissor do ensino, método único e


simultâneo a todos, crença absoluta na experiência sensorial são críticas que merecem a
nossa atenção, pois elas persistem até hoje no campo da didática. Sempre que perceber
críticas aos modos de ensinar e aprender, você está diante de dilemas didáticos e, por isso,
é sempre oportuno refletir sobre eles.

Jean-Jacques Rousseau (1712-1778)

Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) preocupou-se com o livre desenvolvimento das capacidades


e interesses individuais e propôs uma concepção nova de ensino, baseada na necessidades e
interesses imediatos da criança. As ideias mais importantes de Rousseau são:

1. A preparação da criança para a vida futura deve basear-se no estudo das coisas que
correspondem à suas necessidades e interesses atuais. Antes de ensinar as ciências,
elas precisam ser levadas a despertar o gosto pelo seu estudo. Os verdadeiros
professores são a natureza, a experiência e o sentimento. O contato da criança
com o mundo que a rodeia é que desperta o interesse e suas potencialidades

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Didática: Processos Históricos • CAPÍTULO 1

naturais. Em resumo: são os interesses e necessidades imediatas do aluno que


determinam a organização do estudo e seu desenvolvimento.

2. A educação é um processo natural, ela se fundamenta no desenvolvimento


interno do aluno. As crianças são boas por natureza, elas têm uma tendência
natural para se desenvolverem.

Rousseau não elaborou uma teoria do ensino e nem colocou em prática suas ideias, mas
suas ideias estão presentes até hoje no imaginário social, evidenciado pela defesa de
algumas filosofias educacionais.

Henrique Pestalozzi (1746-1827)

Henrique Pestalozzi (1746-1827) foi um pedagogo suíço que defendeu o ensino como
meio de educação e desenvolvimento das capacidades humanas, como cultivo do
sentimento, da mente e do caráter. Pestalozzi trabalhou até o fim da vida na educação
de crianças pobres, em instituições dirigidas por ele próprio.

Pestalozzi atribuía grande importância ao método intuitivo, levando os alunos a


desenvolverem o senso de observação, análise dos objetos e fenômenos da natureza e
a capacidade da linguagem, por meio da qual se expressa em palavras o resultado das
observações. Nisto consistia a educação intelectual. O pedagogo atribuía importância
à psicologia da criança como fonte do desenvolvimento do ensino.

As ideias de Pestalozzi repercurtem até hoje no imaginário educacional e possuem


grande influência no conhecimento didático, especialmente no que se refere à psicologia
infantil. As ideias de Comênio, Rousseau e Pestalozzi influenciaram outros pedagogos,
como Herbart, cujas ideias veremos a seguir.

Johann Friedrich Herbart (1712-1778)

Johann Friedrich Herbart (1766-1841) foi um pedagogo alemão que teve muitos
discípulos e exerceu muita influência na Didática e na prática docente. É o inspirador
da pedagogia conservadora. Para Herbart, o fim da educação é a moralidade, atingida
através da instrução educativa. Educar o homem significa instruí-lo para querer o
bem, de modo que aprenda a comandar a si próprio. A principal tarefa da instrução
é introduzir ideias corretas na mente dos alunos. O professor é o arquiteto da mente.
Ele deve trazer à atenção dos alunos aquelas ideias qe deseja que os alunos dominem
em suas mentes. Desta forma, ao controlar os interesses dos alunos, o professor
vai construindo uma massa de ideias na mente, que, por sua vez, vão favorecer a

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CAPÍTULO 1 • Didática: Processos Históricos

assimilação de ideias novas. O método de ensino consiste em provocar a acumulação


de ideias na mente da criança.

O pedagogo alemão propôs a formulação de um método único de ensino, em


conformidade com as leis psicológicas do conhecimento. Herbart estabeleceu quatro
passos que deveriam ser rigorosamente seguidos:

1. o primeiro seria a preparação e a apresentação da matéria de forma clara e


completa;

2. o segundo seria a associação entre as ideias antigas e as novas;

3. o terceiro, a sistematização dos conhecimentos, tendo em vista a generalização;

4. o quarto e último passo seria a aplicação, o uso dos conhecimentos adquiridos


através de exercícios, que denominou método.

Os discípulos de Herbart desenvolveram os passos formais, ordenando-os em cinco


passos: preparação, apresentação, assimilação, generalização e aplicação. Veja que esta
fórmula didática é utilizada até os dias de hoje pela maioria dos professores. Herbart
contribui com o desenvolvimento da didática. Mas Libâneo (2013, pp. 63-64) ressalta:

O sistema pedagógico de Herbart e seus seguidores – chamados de


herbartianos – trouxe esclarecimentos válidos para a organização da
prática docente, como por exemplo: a necessidade de estruturação e
ordenação do processo de ensino, a exigência de compreensão dos assuntos
estudados e não simplesmente memorização, o significado educativo da
disciplina na formação do caráter. Entretanto, o ensino é entendido como
repasse de ideias do professor para a cabeça do aluno; os alunos devem
compreender o que o professor transmite, mas apenas com a finalidade
de reproduzir a matéria transmitida. Com isso, a aprendizagem se torna
mecânica, automática, associativa, não mobilizando a atividade mental,
a reflexão e o pensamento independente e criativo dos alunos.

Fique atento. Comênio, Rousseau, Pestalozzi e Herbart desenvolveram as bases do


pensamento pedagógico europeu e demarcaram as concepções pedagógicas que hoje
são conhecidas como Pedagogia Tradicional e Pedagogia Renovada. Estudaremos um
pouco mais sobre essas concepções no tópico seguinte.

Dos Jesuítas à Década de 1970: a Pedagogia Tradicional, o Escolanovismo, o Tecnicismo e a


Negação da Didática.

A retrospectiva histórica da didática, representada nas ideias de Comênio,


Rousseau,Pestalozzi e Herbart, já nos trazem indícios de como as ideias sobre ensinar
e aprender estavam repletas de conceitos referentes a uma melhor forma de ensinar.
Para que possamos compreender melhor os pensamentos didáticos construídos na
realidade brasileira, precisamos enfatizar os processos históricos dessa construção e,

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Didática: Processos Históricos • CAPÍTULO 1

para isso, analisaremos o período dos jesuítas até os dias de hoje. Essa análise histórica
está embasada por Veiga (2017).

O jesuítas atuaram no Brasil durante todo o período colonial, de 1549 a 1759. A ação
pedagógica dos jesuítas foi marcada pelas formas dogmáticas de pensamento, contrárias
a um pensamento mais crítico. Privilegiavam o exercício da memória e do desenvolvimento
do raciocínio, dedicavam atenção ao preparo dos padres-mestres, dando ênfase à
formação do caráter e sua formação psicológica para conhecimento de si mesmo e do
aluno. Sendo assim, não se poderia pensar em uma prática pedagógica e uma didática
que buscasse uma perspectiva transformadora na educação. ( VEIGA, 2017)

Para refletir

É importante ressaltar que no campo educacional estamos sempre falando sobre educação transformadora.
Na Didática também. Por isso, fique sempre atento às concepções pedagógicas que se dizem transformadoras.
Seja crítico: duvide, conteste, questione, reflita. Importante: são diversos os sentidos para essa educação
transformadora. A reflexão que você deve fazer é: qual é a concepção de educação transformadora defendida por
esse pensamento educacional?

De acordo com Veiga (2017), nesse período da atuação dos jesuítas, a Didática centrou-se
na Pedagogia Tradicional leiga, que estava centrada no intelecto, na essência, atribuindo
um caráter dogmático aos conteúdos; os métodos eram considerados princípios universais
e lógicos; o professor torna-se o centro do processo de aprendizagem, concebendo o aluno
como um ser passivo e receptivo. A disciplina era uma forma de garantir atenção, silêncio
e ordem. A Didática era compreendida como um conjunto de regras, visando assegurar
aos futuros professores as orientações necessárias ao trabalho docente. A atividade dos
professores, nesse caso, era vista como inteiramente autônoma face à política, dissociada
das questões entre escola e sociedade, separando, portanto, a teoria e a prática.

Na década de 1930, a sociedade brasileira sofre profundas transformações, motivadas,


basicamente, pela modificação do modelo socioeconômico. A crise mundial da economia
capitalista provoca no Brasil a crise cafeeira, instalando-se o modelo socioeconômico
de substituição de importações. Em 1932 foi lançado o Manifesto dos Pioneiros da Escola
Nova, preconizando a reconstrução social da escola na sociedade urbana e industrial.
( VEIGA, 2017)

Sugestão de estudo

Pesquise na internet sobre o Movimento dos Pioneiros da Escola Nova e perceba as concepções educacionais em
evidência no referido período. Compreender esses processos é muito importante para o professor em formação.

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CAPÍTULO 1 • Didática: Processos Históricos

O período entre 1930 e 1945 é marcado pelo equilíbrio entre as influências da


concepção humanista tradicional (representada pelos católicos) e humanista moderna
(representada pelos pioneiros). Para Saviani (1985, p. 276 apud VEIGA, 2017), a
concepção humanista moderna baseia-se em uma “visão de homem centrada na
existência, na vida, na atividade”. Há predomínio do aspecto psicológico sobre o lógico.
O escolanovismo propõe um novo tipo de homem, defende os princípios democráticos,
ou seja, todos têm direito a assim se desenvolverem. No entanto, isso é feito em uma
sociedade dividida em classes, em que são evidentes as diferenças entre o dominador
e as classes subalternas. Dessa forma, as possibilidades de se concretizar este ideal
de homem se voltam para aqueles pertencentes à classe dominante. ( VEIGA, 2017)

Perceba as críticas de Saviani às concepções do escolanovismo. Essas críticas são


pertinentes se quisermos pensar sobre a relação entre sociedade e educação. Assim,
defendemos que a educação não pode estar desvinculada de concepções críticas sobre as
realidades sociais. A despeito das concepções críticas sobre o Escolanovismo, é preciso
reconhecer que as influências educacionais dessa corrente pedagógica influenciam até
hoje a educação brasileira e, por isso, merece a nossa atenção.

A característica mais marcante do escolanovismo é a valorização da criança, vista como


ser dotado de poderes individuais, cuja liberdade, iniciativa, autonomia e interesse
devem ser respeitados. O movimento escolanovista preconizava a solução de problemas
educacionais em uma perspectiva interna da escola, sem considerar a realidade brasileira
nos seus processos político, econômico e social. O problema educacional passa a ser uma
questão escolar e técnica. A ênfase recai no ensinar bem, mesmo que a uma minoria.
( VEIGA, 2017)

Devido à predominância da influência da Pedagogia Nova na legislação educacional


e nos cursos de formação para o magistério, o professor absorveu o seu ideário.
Consequentemente, nesse momento, a Didática também sofre a sua influência, passando
a acentuar o caráter prático-técnico do processo de ensino-aprendizagem, em que teoria
e prática são justapostas. O ensino é concebido como um processo de pesquisa, partindo
do pressuposto de que os assuntos de que tratam o ensino são problemas. De acordo
com Candau (1982, p. 22 apud VEIGA, 2017), os métodos e técnicas mais difundidos
pela Didática renovada são: “centros de interesse, estudo dirigido, unidades didáticas,
métodos dos projetos, a técnica de fichas didáticas, o contrato de ensino etc..”A didática
é entendida como um conjunto de ideias e métodos, privilegiando a dimensão técnica
do processo de ensino, fundamentada nos pressupostos psicológicos, psicopedagógicos
e experimentais, cientificamente validados na experiência e constituídos em teoria,
ignorando o contexto sociopolítico-econômico. Desta forma, um novo perfil de professor
foi concebido: o professor técnico.

16
Didática: Processos Históricos • CAPÍTULO 1

No período de 1945/1960 houve um predomínio das novas ideias relacionadas ao


tecnicismo educacional. Segundo Veiga (2017), esta fase corresponde à aceleração e
diversificação do processo de substituição de importações e à penetração de capital
estrangeiro. O modelo político é baseado nos princípios da democracia liberal com
participação crescente das massas. É o Estado populista – desenvolvimentista,
representando uma aliança entre empresariado e setores populares, contra a oliquarquia.
No fim do período, começa a delinear uma polarização, deixando entrever dois
caminhos para o desenvolvimento: o de tendência populista e o de tendência
antipopulista. Entre 1948-1961, desenvolvem-se as lutas ideológicas em torno da
oposição entre escola particular e defensores da escola pública. A disseminação das
ideias novas ganha mais força com com a ação do Instituto Nacional de Estudos
Pedagógicos (Inep). As escolas católicas se inserem no movimento renovador, difundindo
o método Montessori e Lubienska.

Sugestão de estudo

Faça uma pesquisa sobre o método Montessori e Lubienska para ficar por dentro das concepções educacionais
defendidas.

É importante ressaltar que, nesta fase, o ensino de didática também se inspirava no


liberalismo e no pragmatismo, acentuando a predominância dos processos metodológicos
em detrimento da própria aquisição do conhecimento. A didática se voltava para as variáveis
do processo de ensino sem considerar o contexto político-social. Acentuava-se, dessa
forma, o enfoque renovador-tecnicista da didática na esteira do movimento escolanovista.
(VEIGA, 2017)

O período pós-1964 marcou os descaminhos da didática, pois houve uma crise


da Pedagogia Nova, com a ênfase na pedagogia tecnicista, baseada na neutralidade
científica, na racionalidade, eficiência e produtividade. Buscou-se a objetivação
d o t ra b a l h o p e d a g ó g i c o d a m e s m a m a n e i ra q u e o c o r re u n o t ra b a l h o f a b r i l .
Instalou-se na escola a divisão do trabalho sob a justificativa de produtividade,
propiciando a fragmentação do processo e, com isso, acentuando as distâncias
entre quem planeja e quem executa. O enfoque do papel da Didática a partir dos
pressupostos de Pedagogia Tecnicista procura desenvolver uma alternativa não
psicológica, situando-se no âmbito da tecnologia educacional, tendo como
preocupação básica a eficácia e a eficiência do processo de ensino. Essa didática
tem como pano de fundo um perspectiva ingênua de neutralidade científica. Na
didática tecnicista, a desvinculação entre teoria e prática é mais acentuada. O
professor torna-se mero executor de objetivos instrucionais, de estratégias de
e n s i n o e d e a va l i a ç ã o. Ac e n t u a - s e o f o r m a l i s m o d i d á t i c o a t ra v é s d o s p l a n o s

17
CAPÍTULO 1 • Didática: Processos Históricos

elaborados segundo normas prefixadas. A Didática é concebida como estratégia


para o alcance dos produtos previstos para o processo de ensino-aprendizagem.
( VEIGA, 2017)

Para refletir

A didática tecnicista é muito criticada na história da educação porque é uma concepção que limita o olhar para a
realidade social, ao enfatizar processos e técnicas no processo de ensino-aprendizagem, sem considerar a dimensão
político-social da educação. Se quiser ser um educador crítico, reflita sobre essas limitações tecnicistas sempre que
estiver diante de propostas educacionais que privilegiam a técnica em detrimento do valor social da educação.

A partir da década de 1970, ganham força as teorias crítico-reprodutivistas, que se


empenhavam em fazer a crítica da educação dominante, evidenciando as funções reais da
política educacional, acobertada pelo discurso político-pedagógico oficial. Tais estudos
crítico-reprodutivistas, apesar de considerar a educação a partir dos seus aspectos
sociais, concluem que sua função primordial é a de reproduzir as condições sociais
vigentes. Elas se empenham em fazer a denúncia do caráter reprodutor da escola. Há
uma predominância dos aspectos políticos, enquanto as questões didático-pedagógicas
são minimizadas. Em consequência, a Didática passou a fazer o discurso reprodutivista,
ou seja, a apontar o seu conteúdo ideológico, buscando sua desmistificação, de certa
forma relevante, porém relegando a segundo plano sua especificidade. ( VEIGA, 2017)

Sendo assim, a Didática nos cursos de formação de professores passou a assumir o


discurso sociológico, filosófico e histórico, secundarizando a sua dimensão técnica,
comprometendo, de certa forma, a sua identidade, acentuando uma postura pessimista
e de descrédito relativo à sua contribuição quanto à prática pedagógica do futuro
professor. Mas muito importante: pode-se perceber que se, de um lado, a teoria crítico-
reprodutivista contribuiu para acentuar uma postura de pessimismo, por outro, a atitude
crítica passou a ser exigida pelos alunos e os professores procuraram rever sua própria
prática pedagógica a fim de torná-la mais coerente com a realidade sociocultural. A
Didática é questionada e os movimentos em torno de sua revisão apontam para a busca
de novos rumos. ( VEIGA, 2017)

O percurso histórico da Didática feito até aqui indica o início das questões didáticas,
indo até a perda de especificidade da Didática. E agora? Ainda vale a pena defender
a didática na educação? Ela superou os desafios e está com uma reputação melhor
na formação de professores? Quais os principais conceitos didáticos da educação do
século XXI? No próximo capítulo estudaremos como a renovação didática da década
de 1980 influenciou o pensamento didático contemporêno, enfatizando a didática
multidimensional. É momento de renovação educacional. Está disposto a assumir esse
desafio? Então estamos juntos!

18
Didática: Processos Históricos • CAPÍTULO 1

Sintetizando

Vimos até agora que:

» A história da Didática está vinculada ao aparecimento do ensino como atividade planejada e intencional,
relacionada à instrução.

» Comênio, Rousseau, Pestalozzi e Herbart desenvolveram as bases do pensamento pedagógico europeu e


demarcaram as concepções pedagógicas que hoje são conhecidas como Pedagogia Tradicional e Pedagogia
Renovada.

» No período da atuação dos jesuítas, a Didática centrou-se na Pedagogia Tradicional leiga, que estava centrada no
intelecto.

» O período pós-1964 marcou os descaminhos da Didática, com a ênfase na pedagogia tecnicista, baseada na
racionalidade, eficiência e produtividade.

» A partir da década de 1970 a Didática passou a fazer o discurso reprodutivista, ou seja, a apontar o seu conteúdo
ideológico, buscando sua desmistificação, de certa forma, relevante, porém relegando a segundo plano sua
especificidade.

19
CAPÍTULO
A DIDÁTICA COMO EIXO
ESTRUTURANTE DO TRABALHO
DOCENTE 2
Introdução do Capítulo

Partindo das condições e necessidades predominantes no momento em que a relação


capitalista de produção emergiu no interior da sociedade feudal, e situando Comênio
como síntese dessa nova realidade, deparamos com uma nova proposta de “didática”. Esta,
ao questionar os conhecimentos, os valores e as habilidades necessários à vida humana,
questionou também a sociedade, em fase de superação, e propôs a transformação da escola
e do ensino.

Adequada a este enfoque de Comênio, ainda existe hoje no interior do conhecimento


produzido sobre didática, uma tendência em compreendê-la como arte, técnica,
ciência, disciplina ou, ainda, metodologia.

Neste capítulo, a partir deste enfoque instrumental, veremos que a didática tem ficado
restrita ao aspecto técnico do como organizar, desenvolver e avaliar o ensino.

Na década de 1980 situa-se o movimento de revisão crítica do ensino e da pesquisa em


Didática, com a necessidade de superação da perspectiva instrumental. Na prática, tal
perspectiva destaca o aspecto operacional do processo educativo, significando a ênfase
ora na transmissão do saber, ora na atividade do aluno, ora na inovação do recurso
técnico, ora no planejamento etc.

Propõe-se, então, uma Didática atenta à necessidade de favorecer a formação de


educadores críticos e conscientes do papel da educação na sociedade: a Didática
Fundamental.

Nesse contexto, ao ressignificar os processos formativos devemos colocar também a


prática pedagógica e docente escolar como objeto de análise da Didática.

20
A Didática como Eixo Estruturante do Trabalho Docente • CAPÍTULO 2

Objetivos

» Problematizar a Didática Instrumental.

» Refletir sobre o fundamental da Didática: a multidimensionalidade do processo de


ensino-aprendizagem.

» Compreender que o método didático tem diferentes estruturantes.

» Analisar os saberes da docência como processo de construção de identidade dos


futuros professores.

Uma Didática exclusivamente instrumental

No período de 1945-1960 houve predomínio das novas ideias relacionadas ao


tecnicismo educacional. A didática se voltava para as variáveis do processo de
ensino sem considerar o contexto político-social.

A concepção tecnicista está vinculada à ideologia do positivismo, que se opunha fortemente às


doutrinas revolucionárias ligadas ao pensamento socialista. Essa concepção surgiu no Brasil em
meados da década de 1950, tornando-se efetiva nos anos 1960 e predominando a partir de 1970.

Os pensadores dessa concepção desenvolviam suas teorias por meio da comprovação científica
e dos modelos tecnológicos que estavam sob o controle das elites. A política vigente deveria estar
atada ao pensamento tecnocrata e bem distante do idealismo e das paixões políticas, exigindo,
assim, governantes partidários do racionalismo. Na linha educacional, o positivismo se instala
com a adoção do modelo capitalista como proposta da prática escolar.

A escola, nessa concepção, caracterizou-se pela articulação com o sistema produtivo a fim de
dar sustento ao sistema capitalista. Enfatizando a formação para atender às necessidades do
mercado de trabalho, da indústria e da sociedade tecnológica, estabeleceu como base educacional
os dados mensuráveis e observáveis, colocando a subjetividade em segundo plano. Podemos
considerar como marco da implantação do modelo tecnicista as Leis nos 5.540/1968, que tratam
do ensino universitário, e a Lei no 5.692/1971, que trata do ensino de 1o e 2o graus.

O educador deveria ser um especialista em ordenar, executar e cumprir as demandas pedagógicas,


que sempre deveriam estar em consonância com o pensamento de produtividade da sociedade
industrial.

A prática educacional, no tocante às técnicas de ensino e à avaliação, era estruturada


por exercícios e instrução programados, módulos instrucionais e, ao final, o aluno era

21
CAPÍTULO 2 • A Didática como Eixo Estruturante do Trabalho Docente

submetido a testes objetivos, a fim de investigar se havia adquirido os comportamentos


desejados e se o mercado poderia receber o produto final da produção educacional.
Assim, havia um apego indiscriminado aos livros didáticos, elaborados com base na
tecnologia da instrução.

O que é valorizado nesta perspectiva não é o professor, mas, sim, a tecnologia.


Podemos perceber o tecnicismo como a chegada da “eficiência” ao processo de
ensino-aprendizagem ou como a lógica do mercado acionada.

Com a imposição às escolas desta concepção pelos organismos oficiais do regime


militar então vigente, conforme Libâneo (2013), houve o predomínio – e ainda hoje
predomina – nos cursos de formação de professores o uso de manuais didáticos de
cunho tecnicista, de caráter meramente instrumental.

A Didática instrumental está interessada na racionalização do ensino, no uso de meios


e técnicas mais eficazes. O sistema de instrução compõe-se das seguintes etapas:

» Especificação de objetivos instrucionais operacionalizados.

» Avaliação prévia dos alunos para estabelecer pré-requisitos para alcançar os


objetivos.

» Ensino ou organização das experiências de aprendizagem.

» Avaliação dos alunos relativa ao que se propôs nos objetivos iniciais.

O arranjo mais simplificado dessa sequência resultou na fórmula:

Instrução = objetivos + conteúdos + estratégias + avaliação.

O professor é um administrador e executor do planejamento, o meio de previsão das ações a


serem executadas e dos meios necessários para se atingir os objetivos.

Saiba mais

Ainda na década de 1970, ganham força as teorias crítico-reprodutivistas, que se empenhavam em fazer a crítica
da educação dominante, evidenciando as funções reais da política educacional, acobertada pelo discurso político-
pedagógico oficial.

Com a emergência de novas abordagens que passam a vislumbrar a escola como


uma instituição reprodutora de desigualdades, os estudos de Bowles e Gintis (1977),
Collins (1977), Bourdieu (1977) e outros, ganham destaque por atribuir à escola a
função de mantenedora de um sistema de desigualdade socialmente estruturado e
que possui como principal objetivo o de ensinar “culturas de status” (COLLINS, 1977
apud COSTA; KOSLINSKI, 2006).

22
A Didática como Eixo Estruturante do Trabalho Docente • CAPÍTULO 2

Bowles e Gintis (1977 apud COSTA; KOSLINSKI, 2006) desenvolveram alguns trabalhos a respeito da incapacidade
da escola de alterar a estratificação social americana. Os autores destacam a conexão íntima entre a desigualdade
socioeconômica e a desigualdade educacional e concluem que mesmo quando há tendências a favor de uma
educação mais igualitária, o impacto em termos de oportunidades econômicas e de renda é pequeno. Conforme
Brooke; Soares (2008), o diferencial no estudo de Bowles e Gintis é a iniciativa de tentar fornecer uma causa para
a incapacidade do sistema educacional em promover a igualdade social. Para os autores, o que a escola produz e
reproduz é uma força de trabalho estratificada, que não incorpora os elementos da integração e do desenvolvimento
pessoal, mas, sim, as diferenças necessárias para a manutenção das relações sociais desiguais da produção.

Ao proporcionar essa relação entre a educação e o mundo do trabalho, os estudos de Bordieu e Passeron (1975),
Baudelot e Establet (1971) e de outros pensadores reproducionistas, alinhavam-se com as pesquisas de Bowles e
Gintis: justificando a tese de que a escola não fazia diferença sobre o desempenho escolar de seus alunos (BROOKE;
SOARES, 2008).

De acordo com Costa (1994, p. 94), a partir do final da década de 1960, as produções francesas em educação enfocam
as desigualdades sociais como fatores estruturais inevitáveis, sendo a educação formal, neste contexto, incapaz de
gerar subsídios para reverter tais condições. Ao tratar deste quadro, o autor afirma:

Introduz-se, principalmente, o enfoque das desigualdades como algo estrutural e,


portanto, não legitimável nem passível de combate por via de ajustes educacionais.
Do otimismo reformador em torno da ação educacional, parte-se para seu
contraponto radical que, se mantém a ideia de que a educação cumpre um papel de
manutenção da sociedade, inverte a valoração associada a ele.

Diversas pesquisas com este enfoque (envolvendo o pessimismo pedagógico) foram realizadas, favorecendo a
circulação da ideia de que a escola deveria ser considerada um local de reprodução das condições sociais e de
legitimação social das classes favorecidas.

Com o avanço da concepção tecnicista e das teorias crítico-reprodutivistas em nosso


país, houve vigorosa reflexão crítica sobre a problemática educacional e pela busca de
caminhos para a promoção de uma ação educativa realmente comprometida com a
construção de uma sociedade mais justa e democrática.

Neste contexto, na década de 1980, situa-se o movimento de revisão crítica do ensino e


da pesquisa em Didática. A necessidade de superação da perspectiva instrumental foi
assinalada por Candau (2011, p. 14):

A Didática passa por um momento da revisão crítica. Tem-se a consciência


da necessidade de superar uma visão meramente instrumental e
pretensamente neutra do seu conteúdo. Trata-se de um momento de
perplexidade, de denúncia e anúncio, de busca de caminhos que têm de
ser construídos através do trabalho conjunto dos profissionais da área
com os professores de primeiro e segundo graus. É pensando a prática
pedagógica concreta, articulada com a perspectiva de transformação
social, que emergirá uma nova configuração para a Didática.

A Didática, então, também é influenciada por esse ideário, sendo pensada como um
somatório de métodos que privilegiam o caráter instrumental – prático-técnico – do ato
de ensinar e, nesse processo, teoria e prática são justapostas.

23
CAPÍTULO 2 • A Didática como Eixo Estruturante do Trabalho Docente

Pode-se conceituar a didática como um conjunto de ideias e métodos,


privilegiando a dimensão técnica do processo de ensino, fundamentada
nos pressupostos psicológicos, psicopedagógicos e experimentais,
cientificamente validados na experiência e constituídos em teorias,
ignorando o contexto sócio-político-econômico. (PAIVA, 2003, p. 89).

A construção de uma didática alternativa: a didática


fundamental

A Didática, numa perspectiva instrumental, é concebida como um conjunto de


conhecimentos técnicos sobre o “como fazer” pedagógico, conhecimentos estes
apresentados de forma universal e, consequentemente, desvinculados dos problemas
relativos ao sentido e aos fins da educação, dos conteúdos específicos, assim como
do contexto sociocultural concreto em que foram gerados. Perpassa esta visão o
pressuposto da neutralidade científica e técnica, como se, de alguma forma, explícita
ou implicitamente, poderíamos propor uma Didática formalista: “um artifício universal
para ensinar tudo a todos” (CANDAU, 2011, p. 14).

Esse formalismo tem se expressado de maneiras diferentes através da história da


Didática, mas são sempre posições formalistas do ponto de vista didático. Comênio,
quando, na sua Didactica Magna, tenta definir a Didática, ela é apresentada como
um artifício universal, em que nem o sujeito da aprendizagem, nem o objeto, nem
os diferentes conteúdos são considerados como estruturantes do método didático:
“Atrevemo-nos a propor uma Didática Magna, isto é, um artifício universal para
ensinar tudo a todos” (op. cit.). A estruturação é meramente formal e dela deriva a
perspectiva do método único.

Esse formalismo também trouxe para a Didática benefícios na organização lógica


do processo de instrução. A ênfase passa a ser colocada no aspecto lógico como
estruturante do método didático.

A Didática Escolanovista trouxe como contribuição a reação a esta postura, ao criticar


o formalismo lógico da teoria do método único, afirmando que é muito importante
para a Didática a subjetividade humana e a importância da atividade do aluno como
estruturante do método didático.

Superar certa visão reducionista do método didático, segundo Candau (2011), torna-se
incipiente, pois a tentativa de construir um método didático a partir exclusivamente de
um de seus estruturantes, seja o elemento lógico, seja o sujeito da aprendizagem, seja
o conteúdo etc. Partindo dessa realidade, o grande desafio da Didática seria assumir
que o método didático tem diferentes estruturantes e que o importante é articular esses

24
A Didática como Eixo Estruturante do Trabalho Docente • CAPÍTULO 2

diferentes estruturantes e não exclusivizar qualquer um deles, tentando considerá-lo


como o único estruturante.

O desafio para reconstrução da Didática estava lançado! De uma visão da Didática


Instrumental, centrada na aplicação de métodos e técnicas para atingir o conhecimento
científico, em busca da qualidade dos produtos, da eficiência e da eficácia, propõe-se uma
Didática atenta à necessidade de favorecer a formação de educadores críticos e conscientes
do papel da educação na sociedade: a Didática Fundamental.

Parto da afirmação da multidimensionalidade deste processo: O que


pretendo dizer? Que o processo de ensino-aprendizagem, para ser
adequadamente compreendido, precisa ser analisado de tal modo
que ar ticule consistentemente as dimensões humana, técnica e
político-social. (CANDAU, 1984, p. 21).

Em contraposição à Didática Instrumental, defende-se a Didática Fundamental, como


um campo de conhecimento que busca compreender o processo de ensino em suas
múltiplas determinações e complexidades, para intervir nele e reorientá-lo de forma a
culminar num processo de aprendizagem efetivo para a grande maioria da população.

Nesta linha, a competência técnica e o compromisso político se exigem mutuamente e


se interpenetram. Não é possível dissociar um do outro. A dimensão técnica da prática
pedagógica, objeto próprio da Didática, tem de ser pensada à luz de um projeto ético e
político-social que a oriente.

Atenção

Conforme André e Cruz (2012), a proposta da Didática Fundamental defendida por Candau (1983) representou um
amplo movimento de revisão do campo, originando, em alguns casos, posturas de negação da Didática e, em outros,
novas proposições.

É importante dizer que, na defesa de uma Didática Fundamental, Candau não nega a dimensão técnica, porém a
ressitua do ponto de vista político. No seu entender, a prática pedagógica, objeto da Didática, por ser política, exige
a competência técnica. Nessa direção, defende a interligação das dimensões humana, técnica, política e social,
que dão relevo à multidimensionalidade do processo de ensinar e aprender, objeto da Didática. Essa perspectiva
conscientemente trabalhada faria emergir o que ela chamou de Didática Fundamental.

Desta forma, a busca de eficiência não é negada e, ao assumir a


multidimensionalidade do processo de ensino-aprendizagem, temos a técnica,
a e f i c i ê n c i a e a q u a l i d a d e c o n t e x t u a l i z a d a s e a p r á t i c a p e d a g ó g i c a re p e n s a d a a
p a r t i r d e u m c o m p ro m i s s o c o m a t ra n s f o r m a ç ã o s o c i a l ( C A N D AU , 2 0 1 1 ) .

25
CAPÍTULO 2 • A Didática como Eixo Estruturante do Trabalho Docente

Saberes docentes: a didática em ação

Com o movimento de constituição do campo da Didática no Brasil, com o momento


de crise nos anos 1980, com a fase subsequente de negação e de reconstrução do
conhecimento didático e dos desdobramentos mais recentes, quando olhamos o
campo investigativo, como vem se estruturando o conhecimento didático?

Em uma metanálise de 118 pesquisas apresentadas no Gr upo de


Trabalho (GT ) de Didática da Associação Nacional de Pesquisa e
Pós-graduação em Educação (ANPEd), André (2012) verificou que,
no período de 2003 a 2011, o maior número de estudos tinha como
temas concepções, saberes, representações dos professores ou as
práticas de formação dos docentes. Se há uma inter-relação entre esses
campos de conhecimento – Didática e Formação de Professores –, há
especificidades que os distinguem. Essa superposição preocupa, pois
o objeto da Didática fica enfraquecido. O mesmo mapeamento (André,
2012) revelou que a segunda temática mais frequente nas pesquisas
era a das práticas de sala de aula, o que à primeira vista parece muito
positivo, já que o objeto próprio da Didática são as situações de ensino,
especialmente organizadas para atingir a aprendizagem efetiva dos
alunos. Entretanto, a temática das práticas vem sendo abordada nas
pesquisas de modo difuso, cobrindo uma variedade de aspectos, que
focam mais na dinâmica do cotidiano escolar como um todo do que
nas especificidades das práticas de sala de aula. (ANDRÉ e CRUZ,
2012: 446).

Embora as autoras destaquem que a temática das práticas de sala de aula esteja sendo
contemplada nas pesquisas de modo difuso, Candau (2009) destaca que o campo da Didática
passa por um momento de diversificação e está sendo desafiado por novas temáticas e
problemáticas. Dessa forma, a proposta de uma Didática que ajude o professor a entender
o processo de ensino e aprendizagem para delineá-lo a partir de um contexto situado deve
ser assumida pelos cursos de formação inicial, ainda que o caráter prescritivo, próprio da
Didática Instrumental, pareça superado.

Quando a Didática volta seu olhar para os estudos sobre o trabalho docente, estes revelam
algumas características do trabalho do professor, seus desafios e dilemas (NOGUEIRA,
2012; OLIVEIRA e VIEIRA, 2010; GATTI e BARRETTO, 2009). Esses trabalhos contribuem
para dimensionar a análise do trabalho docente, ajudando na reflexão sobre o cenário
da profissão, a formação docente e a profissionalização vivenciada por professores, a
partir de múltiplos aspectos.

Ao partirmos do pressuposto de que o magistério é baseado na interatividade,


percebemos que o professor possui como objeto de trabalho outros sujeitos, indivíduos
dotados de autonomia, vontade e liberdade: são os alunos.

26
A Didática como Eixo Estruturante do Trabalho Docente • CAPÍTULO 2

A atividade é um trabalho que deve ter uma ação em determinado contexto, em função
de um objetivo, atuando sobre um material qualquer a fim de que este possa ser
transformado com o auxílio de utensílios e técnicas. Fazendo um paralelo, atividade
docente de ensinar significa agir na classe e na escola com o objetivo de promover a
aprendizagem e a socialização dos alunos por meio da ajuda de programas, métodos,
livros, exercícios, norma, dentre outros. Para esta finalidade, são considerados dois
aspectos: os aspectos organizacionais (como o trabalho é organizado, controlado,
segmentado e planejado) e os aspectos dinâmicos da atividade docente (interações no
processo concreto do trabalho entre o professor, seus alunos, os objetivos, os recursos,
seus saberes e os resultados do trabalho). ( TARDIF e LESSARD, 2007).

Para repensar o trabalho docente nos cursos de formação inicial, devemos utilizar a
produção de pesquisas em didática a serviço da reflexão dos alunos e da constituição de
suas identidades como professores, procurando desenvolver uma atitude investigativa.
Nesse contexto, ao ressignificar os processos formativos, devemos considerar os saberes
necessários à docência, colocando a prática pedagógica e docente escolar como objeto
de análise.

Segundo Pimenta (2012, p. 20), mobilizar os saberes da docência é, pois, o primeiro passo
do campo da Didática que se propõe a mediar o processo de construção de identidade
dos futuros professores. A autora divide os saberes da docência em três categorias: a
experiência, o conhecimento e os saberes pedagógicos.

» Os saberes da docência – a experiência: quando os alunos chegam ao curso de


formação inicial já têm saberes sobre o que é ser professor. Os saberes de sua
experiência de alunos que foram de diferentes professores em toda sua vida escolar
lhes possibilita dizer quais foram os bons professores, quais eram bons em conteúdo,
mas não em didática, isto é, não sabiam ensinar. Os saberes da experiência são
também aqueles que os professores produzem no seu cotidiano docente, num
processo permanente de reflexão sobre sua prática.

» Os saberes da docência – o conhecimento: a escola, de forma que variam na sua


história, desde há muito trabalha o conhecimento. No entanto, se entendemos
que conhecer não se reduz a se informar, então nos parece que a escola (e os
professores) tem um grande trabalho a realizar com as crianças e os jovens, que
é proceder à mediação entre a sociedade da informação e os alunos, no sentido
de possibilitar-lhes, pelo desenvolvimento da reflexão, adquirirem a sabedoria
necessária à permanente construção do humano.

» Os saberes da docência – saberes pedagógicos: a formação inicial só pode se


dar a partir da aquisição da experiência dos formados e refletir-se nela. O futuro
profissional não pode constituir seu saber-fazer senão a partir de seu próprio

27
CAPÍTULO 2 • A Didática como Eixo Estruturante do Trabalho Docente

fazer. Os futuros professores poderão adquirir saberes sobre a educação e sobre


a pedagogia, mas não estarão aptos a falar em saberes pedagógicos. Estes só
se constituem a partir da prática, que os confronta e os reelabora. De acordo
com Houssaye (1995 apud PIMENTA, 2012, p. 28), “a especificidade da formação
pedagógica, tanto a inicial como a contínua, não é refletir sobre o que se vai fazer,
nem sobre o que se deve fazer, mas sobre o que se faz”.

Tardif (2001 apud GUEDES; GUEDES, 2013, p. 5) constata que o saber do professor é plural
(composto de saberes de variadas áreas do conhecimento) e estratégico (pelo impacto
que tem junto às gerações jovens, à construção de novos conhecimentos e à definição de
hegemonias no contexto social, entre outros fatores).

Assim, Tardif (op. cit.) apresenta os saberes docentes, como os compreende:

» Saberes da formação profissional – transmitidos pelas instituições de formação de


professores, pertencentes às Ciências da Educação e à ideologia pedagógica.

» Saberes disciplinares – pertencentes às variadas áreas do conhecimento.

» Saberes curriculares – correspondentes aos discursos, objetivos, conteúdos e métodos


constantes dos programas escolares, e que o professor precisa saber aplicar.

» Saberes experienciais – desenvolvidos pelos professores na sua própria


prática, no exercício das suas funções. Segundo Tardif, vão sendo incorporados
à experiência individual e coletiva através do habitus e das habilidades (do
“saber-fazer” e do “saber-ser”).

Percebemos que os quatro saberes apresentados acima são relevantes para o exercício do
magistério, e em especial, os saberes experienciais surgem como o núcleo vital do saber
docente, podendo constituir-se em propulsores para o alcance, pelos professores, do
reconhecimento da sociedade e dos grupos geradores de saberes.

A experiência docente está relacionada aos aspectos pessoais e profissionais presentes ao


longo da carreira do professor, que os ajudam a lidar com mais espontaneidade com as
situações do trabalho.

Por outro lado, ao considerar a atividade docente como expressão do saber pedagógico
e este, ao mesmo tempo, fundamento e produto da atividade docente que acontece no
contexto escolar, numa instituição social e historicamente construída, estamos dizendo
que o trabalho docente é uma prática social.

28
A Didática como Eixo Estruturante do Trabalho Docente • CAPÍTULO 2

Sintetizando

Vimos até agora que:

» Na Didática Instrumental, o que é valorizado nesta perspectiva não é o professor, mas, sim, a tecnologia.

» Com a emergência de novas abordagens crítico-reprodutivistas, elas passam a vislumbrar a escola como uma
instituição reprodutora de desigualdades.

» Na década de 1980, situa-se o movimento de revisão crítica do ensino e da pesquisa em Didática, com a
necessidade de superação da perspectiva instrumental.

» Propõe-se uma Didática atenta à necessidade de favorecer a formação de educadores críticos e conscientes do
papel da educação na sociedade: a Didática Fundamental.

» Recentemente, ao problematizar os saberes necessários à docência, a Didática tem voltado seu olhar para os
estudos sobre formação e trabalho docente.

29
CAPÍTULO
AS TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS E A
PRÁTICA EDUCATIVA 3
Introdução do Capítulo

A escola, por ser reconhecida como um espaço de construção do conhecimento e do


exercício da educação, vem sendo o centro de muitas discussões sobre a postura a ser
adotada frente às mudanças que vivemos atualmente.

Neste capítulo, iniciamos com uma reflexão sobre aspectos envolvendo a escola no interior
da sociedade de consumo, que nos mostra como a maneira de consumir acabou por
alterar as possibilidades e as formas de exercer cidadania. As identidades contemporâneas
configuram-se no consumo, dependendo daquilo que se possui ou do que se pode vir a
consumir.

No s s o d e s a f i o é p e n s a r d e q u e f o r m a t o d a s e s s a s m u d a n ç a s re l a c i o n a d a s à
s u b j e t i v i d a d e v ê m a t i n g i n d o a e d u c a ç ã o, a e s c o l a , a p r á t i c a e d u c a c i o n a l e,
consequentemente, o papel e atividade do professor também vêm sendo colocados
no centro desse debate.

Para a análise da atividade dos professores, é importante levar em consideração as


sequências didáticas como forma de organização do trabalho docente. Ensinar se
concretiza por meio de uma sequência de atividades, as quais se baseiam em normas e
códigos, consagrados pela experiência do professor ou pela tradição escolar.

A análise das principais tendências pedagógicas, as de cunho liberal e progressista, nos


ajuda a compreender e refletir sobre a situação do ensino, o lugar da escola e o papel
docente na atualidade.

Objetivos

» Refletir sobre a escola como espaço de construção do conhecimento.

» Problematizar a atividade interativa como dimensão do trabalho docente.

30
As Tendências Pedagógicas e a Prática Educativa • CAPÍTULO 3

» Compreender as sequências didáticas como forma de organização do trabalho


docente.

» Caracterizar as tendências pedagógicas no Brasil.

A escola na sociedade do consumo

A globalização e os processos de mudanças constantes impostos à sociedade vêm


produzindo certa homogeneização cultural, transformando tradições e características
típicas de determinados povos em algo descartável. Homens e mulheres da sociedade
ocidental e mesmo de alguns países da sociedade oriental têm se transformado em
seguidores de tendências, o que se reflete também no ambiente educacional.

Outra característica marcante do processo de globalização é a falta de consciência


crítica, que faz com que o ser humano deixe de se incomodar com a sua realidade e,
assim, não mais se mobilize para transformá-la. As pessoas funcionam como reflexo
de ideologias não questionadas, desvalorizando o pensar sobre o conhecimento e
sobre o novo a ser implementado, que é característico da natureza humana criadora.

Ao se tornar refém do consumo e da mídia, o ser humano se afasta da sua habilidade


natural de produzir conhecimentos e deixa de se relacionar com ideias que promovem
um contato maior com aquilo que se pode dizer mais verdadeiramente humano. Agindo
assim, as pessoas perdem parte da autonomia para construção da sua própria história.

A mídia invade nosso cotidiano. A criança e o adolescente de hoje não conheceram o


mundo de outra maneira – nasceram imersos no mundo com telefone, fax, computadores,
televisão etc. TVs ligadas a maior parte do tempo, assistidas por qualquer faixa etária,
acabam por assumir papel significativo na construção de valores culturais. A cultura
do consumo molda o campo social, construindo, desde muito cedo, a experiência da
criança e do adolescente que vai se consolidando em atitudes centradas no consumo.

Nos dias de hoje, há cada vez mais a preponderância dos processos de consumo, fazendo
com que os sujeitos sejam levados a identificar-se com coisas e objetos que os levam a
diferenciar-se dos demais, como, também, a discriminar e hierarquizar grupos sociais.

Baudrillard (1995 apud CAMPOS e SOUZA, 2003) esclarece que não é o consumo que
se organiza em torno das diferenças individuais, mas, sim, estas, assumindo a forma de
personalização, é que se organizam em torno de modelos comunicados pelo sistema de
consumo. Para esse autor, existe inicialmente a lógica da diferenciação social e, depois,
a manifestação organizada das diferenças individuais. Com isso, o sistema promove a
anulação das diferenças “reais” e transforma as pessoas em seres contraditórios através
da produção industrial da diferença.

31
CAPÍTULO 3 • As Tendências Pedagógicas e a Prática Educativa

Em suma, o que prepondera é a ilusão de que podemos realizar escolhas autênticas,


pois, de fato, todas as escolhas já estão previstas pelo sistema. O processo de
construção da identidade na cultura de consumo apresenta-se como cambiante, fluido,
fragmentado e parcial. Objetos e mercadorias são usados para demarcar as relações
sociais e determinam estilos de vida, posição social, além da maneira de as pessoas
interagirem socialmente.

Canclini (1997) mostra-nos como a maneira de consumir acabou por


alterar as possibilidades e as formas de exercer cidadania. As identidades
contemporâneas se configuram no consumo, dependendo daquilo que
se possui ou do que se pode vir a consumir. Há um descontentamento
com o que se tem, próprio do mundo globalizado, que “supõe uma
interação funcional de atividades econômicas e culturais dispersas,
bens e serviços gerados por um sistema com muitos centros, no qual
é mais importante a velocidade com que se percorre o mundo do que
as posições geográficas a partir das quais se está agindo” (p. 17). Esse
descontentamento provém da fugacidade, da obsolescência. Tudo se
torna obsoleto a todo instante. (CAMPOS e SOUZA, 2003, p. 15).

A educação não deve ser somente o ato de “envernizar” saberes, mas a preparação de
homens e mulheres para que dominem criticamente as (ou algumas) linguagens, adotando
uma postura dialético-filosófica. Só assim é possível compreender o profundo significado
da transformação de informação em conhecimento e deste em sabedoria.

Para refletir

Não são raras as críticas de teóricos que apontam o fato de que, em algumas áreas no Brasil, o ato de ensinar vem
sendo adotado e desenvolvido como um simples reproduzir e reforçar o preestabelecido, sem nenhum compromisso
com a conscientização e o questionamento sobre o que é e a quem serve. Isso tem que mudar e essa mudança pode
começar na nossa prática cotidiana.

Você, futuro professor, se considera um questionador da sua realidade?

O n o s s o d e s a f i o é p e n s a r d e q u e f o r m a t o d a s e s s a s m u d a n ç a s re l a c i o n a d a s
à subjetividade vêm atingindo a educação, a escola, a prática educacional e,
consequentemente, o professor. Afinal, a escola, por meio do seu processo de ensino,
tem um papel fundamental no mundo globalizado. Por isso é tão urgente a revisão
do processo de ensino-aprendizagem e dos conteúdos que estão sendo trabalhados.

Uma parte significativa das instituições de ensino vem sendo concebida como um
evento, um espaço-tempo em que o imediatismo e a pró-atividade vêm se tornando
palavras de ordem no processo de ensino-aprendizagem. Reduzem-se, assim, as

32
As Tendências Pedagógicas e a Prática Educativa • CAPÍTULO 3

atividades de investigação, nas quais o ensino deveria estar respaldado. O papel e a


atividade do professor também vêm sendo colocados no centro desse debate. Dessa
forma, vamos analisar a atividade dos professores de acordo um dos eixos de análise
elaborados por Tardif e Lessard (2007): o caráter interativo do trabalho docente.

A atividade interativa como dimensão do trabalho docente

Na pesquisa desenvolvida por Guedes (2014), a autora destaca que o trabalho é visto
como uma atividade para Tardif e Lessard (2007). Para os autores, existem dois pontos
de vista que merecem ser considerados. O primeiro ponto de vista diz respeito a
considerar as estruturas organizacionais nas quais a atividade é desenvolvida, estruturas
que a condicionam de diversas maneiras. Isso implica enfatizar como o trabalho é
organizado, controlado, segmentado, planejado etc. O segundo ponto de vista refere-se ao
desenvolvimento da atividade, ou seja, sobre as interações contínuas no seio do processo
concreto do trabalho, entre o trabalhador, seu produto, seus objetivos, seus recursos,
seus saberes e os resultados do trabalho. Desta forma, podemos enfatizar, conforme o
caso, os aspectos organizacionais e os aspectos dinâmicos da atividade docente.

Os autores defendem a hipótese de que o trabalho docente é interativo pelas pressões


inerentes à interação humana e pelas relações de poder e os tipos de conhecimento que
são necessários. Esse trabalho afeta diretamente as orientações e as técnicas do trabalho,
as relações com os usuários, as margens de manobra e as estratégias dos trabalhadores,
os recursos e os saberes dos trabalhadores, bem como o ambiente organizacional no
qual se desenvolvem as tarefas (GUEDES, 2014).

Para o trabalho docente, é preciso deixar claro que ensinar é atuar ao mesmo tempo
com grupos e com indivíduos, é perseguir fins imprecisos e, ao mesmo tempo, educar,
instruir etc. As tensões e os dilemas que fazem parte da profissão docente ajudam os
professores a privilegiar as relações cotidianas com os alunos e colegas de trabalho e a
distanciar-se de todos os aspectos da organização escolar que não lhes parecem ser de
sua responsabilidade.

A questão da interatividade entre professor e aluno é vista como central para Tardif
e Lessard (2007). Para eles, ensinar é trabalhar com seres humanos, sobre seres
humanos, para seres humanos. Sabemos que o objeto de estudo da Didática é o
processo de ensino, campo principal da educação escolar, e esta impregnação do
trabalho pelo “objeto humano” merece ser problematizada, pois ela é o coração da
profissão docente.

33
CAPÍTULO 3 • As Tendências Pedagógicas e a Prática Educativa

As relações com os alunos nas classes e fora delas ocupam o essencial do tempo dos
professores, formando, assim, o nó central de sua missão profissional. Mas a relação com os
alunos não se resume a uma questão de tempo passado com eles. Ela é formada, também,
por todas as tensões e as alegrias dessa profissão, bem como da identidade profissional
daqueles e daquelas que a realizam (TARDIF e LESSARD, 2007).

Para os autores em questão, a relação de inúmeros professores com os alunos e com a


profissão é, antes de tudo, uma relação afetiva. Eles amam os jovens e gostam de ensiná-los.
A tarefa de ser professor dificilmente pode ser exercida sem um mínimo de engajamento
afetivo para com o “objeto de trabalho”: os alunos.

As relações pedagógicas baseadas no diálogo e no bom relacionamento interpessoal


são importantes e necessárias. No entanto, aceitar a interatividade entre alunos e
professores não implica aceitar que o professor perca a sua identidade de professor.
A figura do professor ainda deve ser respeitada e valorizada na relação pedagógica, a
fim de que os alunos possam reconhecer essa “autoridade” no professor.

De fato, conforme Guedes (2014), essa “autoridade” reivindicada pelos professores, de


longe, seria aquela autoridade que não enxerga o aluno como elemento importante e
essencial na relação pedagógica. Pelo contrário, a ideia é de que o aluno também seja
importante nessa relação, sendo o bom relacionamento entre alunos e professores
essencial. No entanto, a identidade do professor deve estar em posição de destaque de
tal modo que ele possa ser o mediador que conduzirá a interatividade entre alunos e
professores.

Para Tardif e Lessard (2007), a autoridade reside no respeito que o professor é capaz de
impor sem coerção aos alunos. Ela está relacionada a seu papel, à missão da qual a escola o
investe, bem como à sua personalidade, seu carisma pessoal. A personalidade dos professores
muitas vezes é vista como um substituto tecnológico numa profissão não fundamentada
em saberes e técnicas formais, universais e intercambiáveis de um indivíduo ao outro. A
personalidade, nesse caso, torna-se um elemento essencial no controle do professor sobre
o seu objeto de trabalho.

Para os autores:

O professor que pode impor-se a partir do que é enquanto pessoa, que os


alunos respeitam e até apreciam ou amam, este já ultrapassou a experiência
mais terrível e difícil do ofício, no sentido de ser aceito pelos alunos e
poder ir em frente, pois já obteve a colaboração do alunado ( TARDIF E
LESSARD, 2007, p. 266).

Além da autoridade, outros dois itens são considerados como tecnologia da interação
pelos autores em destaque: a coerção e a persuasão. A coerção consiste em condutas

34
As Tendências Pedagógicas e a Prática Educativa • CAPÍTULO 3

punitivas reais e simbólicas desenvolvidas pelos professores na interação com os alunos


em sala de aula. Tanto os professores quanto as instituições escolares fazem uso da
coerção. Em sala de aula, os professores podem improvisar sinais de coerção como
uma olhada ameaçadora, uma cara feia, insultos, ironia, apontar o dedo, dentre outros.
As instituições podem controlar os alunos com: exclusão, estigmatização, isolamento,
seleção, suspensão etc.

Já a persuasão é a arte de convencer o outro a fazer alguma coisa ou acreditar em alguma


coisa. Ensinar é agir falando e, desta forma, o meio linguístico é o principal caminho
da interação entre professores e alunos. As palavras fazem com que o aluno aprenda e
a forma como o professor fala irá influenciar o aluno a aceitar as regras do jogo. Isso só
acontece se o professor conseguir persuadir o aluno para obter a sua colaboração no
processo de ensino-aprendizagem.

As três ações (autoridade, coerção e persuasão) estão presentes, em maior ou menor


grau, nas relações que os professores estabelecem com seus alunos, e tudo isso faz parte
do contexto interativo do trabalho docente.

Sequências didáticas como forma de organização do


trabalho docente

Para a análise da atividade dos professores, é importante levar em consideração as formas


de organização do trabalho docente. De acordo com Tardif e Lessard (2007, p. 277):

entrar numa sala e dar uma aula é mais que simplesmente penetrar
num espaço neutro, é ser absor vido pelas estr uturas práticas do
t ra b a l h o e s c o l a r m a rc a n d o a v i d a , a e x p e r i ê n c i a e a i d e n t i d a d e
das gerações de professores: é fazer e refazer pessoalmente essa
exper iência, apropr iar-se dela, prová-la e supor tá-la, dando-lhe
sentido para si e para os alunos.

Ao entrar em sala de aula, o professor deve colocar em prática tudo aquilo que foi
organizado por ele e pela instituição a fim de que seu trabalho se desenvolva da forma
esperada. Analisar esse contexto da organização do trabalho docente nos remete a
considerar a atividade docente importante em sua função principal: submeter os
alunos ao aprendizado. É sempre a relação de professor-aluno que está por trás dos
planejamentos e das organizações realizados. É preciso submeter certas pessoas a
certos processos exigidos na escolarização. Tais processos são marcados por disputas
e dilemas e vivenciá-los constitui um bom exemplo de como o professor lida com o
seu trabalho.

35
CAPÍTULO 3 • As Tendências Pedagógicas e a Prática Educativa

Imbernón (2004) advoga que o professor não pode ser considerado um técnico, uma vez
que se define pelo conhecimento pedagógico especializado legitimado pela ação. Trata-
se de um conhecimento prático e, portanto, mais do que o domínio de uma disciplina ou
de um conteúdo, assenta-se no modo pelo qual é construído, permitindo a inserção dos
alunos em um mundo complexo, compreendido nas suas certezas e ambiguidades. Neste
contexto, os professores, ao exercerem a atividade da docência, utilizam conhecimentos
teóricos e práticos, sempre ressignificados a partir das demandas que surgem durante a
ação da prática pedagógica.

Em que pesem todas as investigações e avaliações a respeito da for mação de


professores, tem havido uma grande dificuldade em ultrapassar os desafios que
os modelos de formação praticados têm imposto. No caso do nosso país, segundo
Morelatti et al. (2014), a maior parte dos cursos de formação inicial tem desenvolvido
um currículo formal projetado por um tipo de racionalidade denominada técnica,
porque é um modelo que estabelece uma relação linear entre conhecimento
científico/técnico e suas aplicações, ou seja, baseia-se na ideia de que a teoria
antecede a prática.

Nesta perspectiva, compreender a ação pedagógica docente supõe incidir o foco da


análise sobre os saberes da experiência e seus fundamentos, constituídos num contexto
de ensino, no qual múltiplos fatores se articulam, estabelecendo limites e controlando as
possibilidades da sua atuação.

É nesse contexto que o professor constrói seus esquemas de ação que, embora implícitos,
são os responsáveis pelo seu fazer ou pela forma particular como estabelece sua rotina de
trabalho e realiza improvisações frente à diversidade de problemas inerentes ao espaço
pedagógico da sala de aula.

Figura 1. Sequência didática.

Fonte: https://pontobiologia.com.br/como-mandar-bem-prova-didatica/aula-didatica/. Acesso em: 30/7/2019.

Sendo assim, é preciso analisar o cotidiano da sala de aula, no que diz respeito às decisões
didáticas que o professor toma. Ensinar se concretiza por meio de uma sequência de
atividades, as quais se baseiam em normas e códigos, consagrados pela experiência do
professor ou pela tradição escolar. Para Zabala (1998, p. 20),

36
As Tendências Pedagógicas e a Prática Educativa • CAPÍTULO 3

[...] as sequências de atividades de ensino/aprendizagem, ou sequências


didáticas, são uma maneira de encadear e articular as diferentes
atividades ao longo de uma unidade didática. Assim, pois, poderemos
analisar as diferentes formas de intervenção segundo as atividades que
se realizam e, principalmente, pelo sentido que adquirem quanto a
uma sequência orientada para a realização de determinados objetivos
educativos. As sequências podem indicar a função que tem cada uma
das atividades na construção do conhecimento ou da aprendizagem
de diferentes conteúdos e, portanto, avaliar a pertinência ou não de
cada uma delas, a falta de outras ou a ênfase que devemos lhe atribuir.

Os tipos de atividades propostas, a maneira como elas se situam e se articulam, o papel


que se atribui aos professores e alunos e à dinâmica grupal, e o tipo de relações que se
estabelecem na aula diferenciam as propostas didáticas e determinam características
diferenciais da prática educativa.

Após a escolha de um conteúdo ou tema pelo professor, podemos verificar sua sequência
didática ao analisar: como inicia a aula, quais os procedimentos a seguir, como conclui a
sequência, e como avalia a aprendizagem dos conceitos trabalhados. Ou seja, podemos
descrever três principais momentos de uma aula: início, desenvolvimento e avaliação
da aprendizagem dos alunos. E por meio da sequência didática, podemos também
evidenciar quem está no centro da ação da atividade, que pode ser: a primeira, tendo o
professor como foco da atividade. A segunda, focando a atividade do aluno, e a terceira,
referente a ambas, que podemos denominar de compartilhada.

No t ra b a l h o d o c e n t e, o p ro f e s s o r s e l e c i o n a e o rg a n i z a v á r i o s m é t o d o s d e
ensino e vários procedimentos didáticos em função das características de cada
matéria/conteúdo. Sendo assim, para descobrir quem é o centro da ação, baseados
em Morelatti et al. (2014), vamos apresentar algumas atividades de cada uma das três
categorias mencionadas:

» Atividades realizadas pelo professor: exposição do conteúdo (leitura, texto na lousa


etc.); exemplos/comparação/contextualização/ideia de multidisciplinaridade;
execução de experimento/atividade prática (aula de campo); aplicação de
provas escritas ou orais (avaliação dos conteúdos); avaliação de procedimentos
e atitudes/avaliação contínua; correção de exercícios, problemas etc.; retomada
de conceitos/conclusão (oral, texto, vídeo)/síntese.

» Atividades compartilhadas por professor e aluno: o professor usa uma


situação- problema (caso ou ideia a ser explorada pelo aluno); realização de
experimento; uso de texto, vídeos e tabelas; aula dialogada (consideração
ou não dos conhecimentos prévios dos alunos); discussão/debate; uso de
tecnologia; elaboração coletiva de conceitos.

37
CAPÍTULO 3 • As Tendências Pedagógicas e a Prática Educativa

» Atividades realizadas pelos alunos: leitura simples (diferentes linguagens);


pesquisas e levantamento de informações; trabalhos em grupo; resolução de
exercícios de aplicação/resposta a questionários/trabalhos; interpretação/
análise de diferentes textos (filme, tela, escultura, música, gráficos); produção de
texto; atividade prática (dramatização/teatro/produção de vídeo/jogos/oficinas/
aulas de campo/atividades artísticas ou físicas); autocorreção/autoavaliação;
seminário/exposição oral/exposição de trabalho realizado; relatórios/cartazes/
exposição de trabalhos; reescrita de texto.

Ao que parece, ainda que o professor tenha clareza da importância da participação dos
alunos nas atividades da aula, as ações dele obedecem a preferências inconscientes,
muito provavelmente advindas dos percursos da sua experiência.

Para Thompson (1984 apud MORELATTI et al., 2014), as práticas de ensino desenvolvidas
pelos professores, em alguns casos, são direcionadas por noções e preferências
inconscientes. Um exemplo de tal situação refere-se a resultados de pesquisa realizada
pela autora em que uma professora, ao ser entrevistada, prioriza, em seu discurso, a
participação dos alunos nas atividades realizadas nas aulas de Matemática, o que não
se confirma quando se observa suas aulas.

A participação dos alunos era tipicamente limitada a responder às questões


da professora, para as quais, na maioria das vezes, exigiam-se respostas
curtas e simples, e ela tinha uma tendência a desconsiderar as sugestões
dos alunos e não seguir com as ideias deles. ( THOMPSON, 1984, p. 112
apud MORELATTI et al.,, 2014).

Na pesquisa realizada por Morelatti et al. (2014), de modo geral, a análise das atividades
que os professores descrevem sobre os procedimentos que realizam ao tratarem um
conteúdo demonstra o predomínio de atividades centradas no professor em praticamente
todos os momentos da aula. Foi possível constatar que a participação dos alunos restringe-
se à execução de atividades determinadas pelo professor, tais como: leitura, pesquisa,
coleta de material, resolução de exercícios e problemas.

Para refletir

Embora observamos, nas sequências didáticas, várias tentativas de superação do modelo tradicional de ensino,
pautado na transmissão de conteúdos, a tendência de atividades na aula centradas no professor também é observada
em países como Japão, Estados Unidos e Inglaterra. Há estudos que mostram que as atividades realizadas em sala de
aula são controladas, predominantemente, pelo professor, de acordo com Jaworski e Gellert (2003 apud MORELATTI
et al., 2014). O professor explica, demonstra e dá exemplos. Estes autores entendem que os professores sentem
dificuldades para propiciar maiores interações em sala de aula.

Será que uma das razões para tais dificuldades refere-se ao receio de propor situações mais abertas, pois estas podem
ter desdobramentos que fogem do controle do professor?

38
As Tendências Pedagógicas e a Prática Educativa • CAPÍTULO 3

Torna-se importante esse exercício de analisar algumas sequências de atividades ou


sequências didáticas encontradas em nossa literatura, na tentativa de identificar padrões
implícitos nestas sequências, que possam revelar concepções de ensino empregadas
pelos professores.

Na próxima seção, vamos apresentar algumas das principais concepções ou tendências


educacionais, até porque podemos encontrar vários autores que as classificam sob várias
óticas. O nosso objetivo é identificar qual corrente teórica influencia e norteia a nossa
prática.

Vamos buscar, assim, compreender e refletir sobre a situação do ensino, o lugar da escola
e de que forma podemos aperfeiçoar ou mudar a nossa visão teórica e a prática do papel
docente na atualidade. Para isso, faremos uma breve revisão de algumas concepções
que influenciaram a educação no Brasil.

As tendências pedagógicas no Brasil

Quando discutimos sobre o desenvolvimento histórico da Didática, vimos que Comênio,


Rousseau, Pestalozzi e Herbart desenvolveram as bases do pensamento pedagógico
europeu e demarcaram as concepções pedagógicas que hoje são conhecidas como
Pedagogia Tradicional e Pedagogia Renovada. Nossa análise está embasada por Libâneo
(2013).

A Pedagogia Tradicional caracteriza as concepções de educação nas quais preponderam


a ação de agentes externos na formação do aluno, a transmissão do saber constituído
na tradição e nas grandes verdades acumuladas pela humanidade e uma concepção de
ensino como impressão de imagens propiciadas ora pela palavra do professor, ora pela
observação sensorial. A função da escola é a preparação moral e intelectual do aluno a
fim de que estes possam desempenhar variadas funções na sociedade. Com relação aos
métodos de ensino, há o predomínio da exposição oral e/ou a demonstração. Enfatiza-se,
também, os exercícios, a memorização de fórmulas e conceitos, tendo em vista formar
hábitos e disciplinar a mente.

A Pedagogia Renovada agrupa correntes que advogam a renovação escolar, opondo-se à


Pedagogia Tradicional. Entre as características desse movimento destacam-se: a valorização
da criança, dotada de liberdade e iniciativa, sujeito da sua aprendizagem e agente do seu
próprio desenvolvimento; tratamento científico do processo educacional, considerando
as etapas sucessivas do desenvolvimento biológico e psicológico; individualização do
ensino conforme os ritmos próprios de aprendizagem.

39
CAPÍTULO 3 • As Tendências Pedagógicas e a Prática Educativa

O movimento de renovação da educação, inspirado nas ideias de Rousseau, recebeu


diversas denominações como educação nova, escola nova, pedagogia ativa, escola do
trabalho.

Dentro do movimento escolanovista, desenvolveu-se nos Estados Unidos uma de suas


mais destacadas correntes, a Pedagogia Pragmática ou Progressivista, cujo principal
representante é John Dewey (1859-1952). No Brasil, as ideias de Dewey exerceram uma
significativa influência no movimento da Escola Nova, formando-se no início da década
de 1930 o Movimento dos Pioneiros da Escola Nova, liderado por Anísio Teixeira e
outros educadores. A função da escola é buscar adequar as necessidades dos indivíduos
à sociedade, logo, a escola deve retratar a vida real. As experiências de aprendizagem
devem satisfazer os interesses do aluno, bem como, às demandas sociais. Os conteúdos
de ensino se estabelecem a partir das experiências que o sujeito vivencia frente a
situações-problema. Valoriza-se, assim, as habilidades cognitivas e os processos mentais,
em detrimento aos conteúdos organizados racionalmente. Logo, busca-se “aprender a
aprender”. Com relação aos métodos de ensino, valida-se as pesquisas, as tentativas
experimentais, o levantamento de hipóteses, a resolução de problemas. Trata-se de
“aprender fazendo”, experimentando, testando, advogando a educação pela ação.

A tendência pedagógica progressivista foi a mais predominante, embora o movimento


escolanovista se desdobrou em várias correntes no Brasil, como a corrente vitalista,
representada por Montessori; a teoria interacionista, baseada na psicologia genética
de Jean Piaget etc.

Segundo Libâneo (2013), uma das correntes da Pedagogia Renovada que não tem vínculo
direto com o movimento da Escola Nova, mas que teve repercussões na Pedagogia
brasileira, e trata-se de uma tendência ainda pouco estudada entre nós, é a chamada
Pedagogia Cultural. Sua característica principal é focalizar a educação como fato da
cultura, atribuindo ao trabalho docente a tarefa de dirigir e encaminhar a formação do
educando pela apropriação de valores culturais. Tendo-se afirmado na Alemanha como
uma sólida corrente pedagógica, possui teóricos como Guilherme Dilthey, Theodor Litt
e Hermann Nohl. Já na América Latina influenciou autores como Lorenzo Luzuriaga,
Francisco Larroyo e, no Brasil, Luís Alves de Mattos e Onofre de Arruda Penteado Júnior.
Concebem a educação como atividade do próprio sujeito e consideram que os indivíduos
vivem em um mundo sociocultural, produto do próprio desenvolvimento histórico da
sociedade.

O estudo teórico da Pedagogia passa por um reavivamento e, conforme Libâneo (2013),


os autores, em geral, concordam em classificar as tendências pedagógicas no Brasil em
dois grupos, liberal e progressista.

40
As Tendências Pedagógicas e a Prática Educativa • CAPÍTULO 3

» Tendência Liberal:

› Pedagogia Tradicional

› Pedagogia Renovada => que inclui várias correntes: a progressivista, a não diretiva,
a culturalista, a piagetiana, a montessoriana e outras.

› Tecnicismo Educacional

» Tendência Progressista:

› Pedagogia Libertadora

› Pedagogia Crítico-Social dos Conteúdos

Conforme destacamos, na Pedagogia Tradicional há o predomínio da exposição oral


e/ou a demonstração, a Didática é uma disciplina normativa, em que a atividade de
ensinar é centrada no professor, que expõe e interpreta a matéria. O aluno é, assim, um
recebedor da matéria e sua tarefa é decorá-la.

Atenção

Libâneo (2013) afirma que a Didática tradicional tem resistido ao tempo, continua prevalecendo na prática escolar.
É comum nas nossas escolas atribuir-se ao ensino a tarefa de mera transmissão de conhecimentos, sobrecarregar
o aluno de conhecimentos que são decorados sem questionamento, dar somente exercícios repetitivos, impor
externamente a disciplina e usar castigos. Os conhecimentos, desprovidos de significados sociais, o intento de
formação mental, de desenvolvimento do raciocínio, ficou reduzido a práticas de memorização.

A Pedagogia Renovada inclui várias correntes: a progressivista (que se baseia na teoria


educacional de John Dewey), a não diretiva (inspirada em Carl Rogers), a culturalista,
a piagetiana, a montessoriana etc. De alguma forma, todas estão ligadas ao movimento
da pedagogia ativa que surge no final do século XIX como contraposição à Pedagogia
Tradicional.

Saiba mais

Segundo estudo feito por Castro (1984 apud LIBÂNEO, 2013), os conhecimentos e a experiência da Didática brasileira
pautam-se, em boa parte, no movimento da Escola Nova, inspirado principalmente na corrente progressivista.

Com relação ao tecnicismo educacional, embora seja considerada como uma tendência
pedagógica, inclui-se, em certo sentido, na Pedagogia Renovada (LIBÂNEO, 2013, p. 71).

Desenvolveu-se no Brasil na décadas de 1950 e 1960, inspirada na teoria behaviorista


da aprendizagem e acabou sendo imposta às escolas pelos organismos oficiais por ser

41
CAPÍTULO 3 • As Tendências Pedagógicas e a Prática Educativa

compatível com a orientação política, econômica e ideológica do regime militar então


vigente. Define uma prática pedagógica altamente controlada e dirigida pelo professor
com atividades mecânicas inseridas numa proposta educacional rígida e passível de ser
totalmente programada em detalhes. O que é valorizado nesta perspectiva não é o professor,
mas, sim, a tecnologia, e o professor passa a ser um mero especialista na aplicação de
manuais e sua criatividade fica dentro dos limites possíveis e estreitos da técnica utilizada.

Com isso, ainda hoje predomina nos cursos de formação de professores o uso de manuais
didáticos de cunho tecnicista, de caráter meramente instrumental.

Podemos perceber o tecnicismo como a chegada da “eficiência” ao processo de


ensino-aprendizagem ou como a lógica do mercado acionada: subordina a educação
à sociedade, tendo como função a preparação de recursos humanos (mão de obra
para a indústria).

As tendências de cunho progressista foram adquirindo maior solidez na década de 1980 e


também são denominadas teorias críticas da educação. Ainda nos anos de 1960 surgiram os
movimentos de educação de adultos que geraram ideias pedagógicas e práticas educacionais
de educação popular, configurando a tendência progressista libertadora.

No Brasil, Paulo Freire foi seu principal expoente, pois, a partir da Pedagogia
Libertadora, questionava as relações estabelecidas entre o homem, a natureza e os
outros homens, em uma sociedade dividida em classes. Retomou as propostas de
educação popular, refundindo seus princípios e práticas em função das possibilidades
do seu emprego na educação formal em escolas públicas, já que inicialmente tinham
caráter extraescolar, não oficial e voltadas para o atendimento da clientela adulta.
Os conteúdos de ensino são desenvolvidos a partir de temas geradores, os quais são
extraídos a partir da problematização efetiva da prática da vida dos alunos. Importa,
pois, despertar uma nova forma de relação com a experiência de vida de cada um.

A Pedagogia Crítico-Social dos Conteúdos constituiu-se como movimento pedagógico


interessado na educação popular, na valorização da escola pública e do trabalho do professor,
no ensino de qualidade para o povo e, especificamente, na acentuação da importância
do domínio dos conteúdos científicos do ensino por parte de professores e alunos, como
condição para a participação efetiva nas lutas sociais.

A função da escola é garantir a toda a sociedade a apropriação dos conteúdos


escolares básicos que tenham ressonância na vida dos alunos. Libâneo (2013) afirma
que a atuação da escola consiste na preparação do aluno para o mundo adulto e suas
contradições, fornecendo-lhe instrumental, por meio da aquisição dos conteúdos e da
socialização, para uma participação organizada e ativa no processo de democratização
da sociedade. A prática do professor é diretiva, intencional, uma vez que a este cabe,
também, estimular a tomada de consciência dos alunos.

42
As Tendências Pedagógicas e a Prática Educativa • CAPÍTULO 3

A Pedagogia Crítico-Social dos Conteúdos atribui grande importância à Didática, cujo objeto
de estudo é o processo de ensino nas suas relações e ligações com a aprendizagem. As
ações de ensinar e aprender formam uma unidade, mas cada uma tem a sua especificidade.

Atenção

Conforme Libâneo (2013), tanto a Pedagogia Libertadora como a Crítico-Social dos Conteúdos são duas
tendências pedagógicas progressistas, propondo uma educação escolar crítica a serviço das transformações sociais
e econômicas, ou seja, de superação das desigualdades sociais decorrentes das formas sociais capitalistas de
organização da sociedade. No entanto, diferem quanto a objetivos imediatos, meios e estratégias de atingir essas
metas gerais comuns.

Sintetizando

Vimos até agora que:

» O processo de construção da identidade na cultura de consumo apresenta-se como cambiante, fluido, fragmentado
e parcial.

» O trabalho docente é interativo pelas pressões inerentes à interação humana e pelas relações de poder e os tipos de
conhecimento que são necessários.

» O professor não pode ser considerado um técnico, uma vez que se define pelo conhecimento pedagógico
especializado legitimado pela ação.

» Ensinar se concretiza por meio de uma sequência de atividades, as quais se baseiam em normas e códigos,
consagrados pela experiência do professor ou pela tradição escolar.

» Existem diversas tendências educacionais que nos ajudam a compreender e refletir sobre a situação do ensino, o
lugar da escola e o papel docente na atualidade.

43
CAPÍTULO
PLANEJAMENTO: AÇÃO PEDAGÓGICA
ESSENCIAL 4
Introdução do Capítulo

Neste capítulo teremos como foco o papel e a importância do planejamento na atividade


educacional, um dos temas clássicos de interesse da Didática.

Discutiremos por que é importante e necessário planejar, a função do planejamento na


atividade educacional e sua interface com outras dimensões pedagógicas.

Também consideramos necessário abordar os principais níveis de abrangência do


planejamento, tomando por referência o contexto educacional e suas aplicações na
prática, buscando sempre a relação com as atividades curriculares.

A questão do planejamento do ensino não deve ser compreendida de maneira


mecânica, desvinculada das relações entre escola e realidade histórica. Dessa forma,
refletiremos sobre o planejamento participativo como possibilidade de trabalho
coletivo, caracterizado pela integração de todos os sujeitos e os setores de uma
instituição educativa.

No âmbito dos tipos de planejamento em educação perceberemos sua ocorrência a partir


de três níveis interdependentes: o planejamento no âmbito dos sistemas e redes de ensino;
o planejamento no âmbito da unidade escolar; e o planejamento no âmbito do ensino.

Veremos que o planejamento de aulas é parte fundamental da atividade docente e, quando


encarado como ferramenta de trabalho, e não como mera burocracia, poderá trazer
inúmeros benefícios.

Ao passo que analisaremos a relevância do planejamento como instrumento para


elaboração de políticas públicas no campo educacional.

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Planejamento: ação pedagógica essencial • CAPÍTULO 4

Objetivos

» Compreender a importância e a função do planejamento na atividade educacional.

» Analisar os principais níveis de abrangência e tipos de planejamento.

» Problematizar o planejamento participativo.

» Refletir sobre o planejamento como instrumento para elaboração de políticas públicas


no campo educacional.

O que significa planejamento?

Desde as ações mais corriqueiras de nosso cotidiano até dimensões mais complexas de
nossa vida, planejamos: o que vamos fazer amanhã, a lista de compras no supermercado,
a festa de aniversário, os rumos da carreira etc.

Planejar faz parte de nossa natureza como seres que pensam e vivem em sociedade.
Desde a vida nas cavernas, passando pela conquista de continentes desconhecidos até
a tentativa de sermos bem-sucedidos no mundo globalizado, planejar para otimizar
estratégias, tempo e recursos sempre foi questão de sobrevivência.

Figura 2. Planejamento.

Fonte: https://www.casamagalhaes.com.br. Acesso em: 18/7/2019.

O planejamento é um processo que exige sistematização, organização, decisão e previsão.


Esse processo faz parte de vários contextos da vida: faz-se planejamento urbano,
econômico, familiar, habitacional, educacional etc.

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CAPÍTULO 4 • Planejamento: ação pedagógica essencial

Importante

Sendo um ato político-pedagógico, planejar não tem neutralidade e revela intencionalidade, visões de mundo, de
sociedade e de cidadão que se pretende ajudar a formar.

Em sua origem, planejar significa projetar, traçar um plano, tencionar, organizar,


intervir, construir. Tal conceito nos remete, então, à ideia de visão prospectiva, visto
que, ao planejar, tentamos antever a concretização de uma missão.

Essa afirmação parece ser partilhada por Vasconcellos (2005, p. 70) quando este
afirma que “planejar é antecipar mentalmente uma ação (ou conjunto de ações)
a ser realizada e agir de acordo com o previsto”, tendo em vista implementar uma
transformação.

Para Padilha (2001 apud KLOSOUSKI, 2008), planejamento é um processo de busca


de equilíbrio entre meios e fins, entre recursos e objetivos, visando ao melhor
funcionamento de empresas, instituições, setores de trabalho, organizações grupais
e outras atividades humanas. Para esse autor, planejar é sempre processo de reflexão,
de tomada de decisão sobre a ação.

Já Gandin (2005) afirma que planejar é, dentre outros aspectos: transformar a realidade
numa direção escolhida; organizar a própria ação (de grupo, sobretudo); agir racionalmente;
pôr em ação um conjunto de técnicas para racionalizar a ação. É, sempre, propor ações,
atitudes, regras e rotinas que possam levar à satisfação de necessidades descobertas na
realidade (ou na prática) através da avaliação, que é a comparação do que se quer com
aquilo que existe. O autor destaca ainda mais alguns pontos essenciais quando falamos
em planejamento, conforme observamos no Quadro 1.

Quadro 1. Sentidos do planejamento.

transformar a realidade numa direção escolhida.


organizar a própria ação (de grupo, sobretudo).
implantar “um processo de intervenção na realidade”.
agir racionalmente.
dar certeza e precisão à própria ação (de grupo, sobretudo).

Planejar é... explicitar os fundamentos da ação do grupo.


pôr em ação um conjunto de técnicas para racionalizar a
ação.
realizar um conjunto orgânico de ações, proposto para
aproximar uma realidade a um ideal.
realizar o que é importante (essencial).
sobreviver... se isso for essencial (importante).

Fonte: Gandin (2014).

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Planejamento: ação pedagógica essencial • CAPÍTULO 4

Portanto, no planejamento temos em vista a ação, isto é, temos consciência de que a


elaboração é apenas um dos aspectos do processo e que há necessidade da existência
do aspecto execução e do aspecto avaliação. Sua função é tornar clara e precisa a
ação, organizar o que fazemos, sintonizar ideias, realidade e recursos para tornar mais
eficiente nossa ação. Ao passo que, temos como definida e em evidência a ideia de que
todo o autoritarismo é pernicioso e que todas as pessoas que compõem o grupo devem
participar (mais ou menos, de uma forma ou de outra) de todas as etapas, aspectos ou
momentos do processo de planejamento.

Cuidado

Embora o ato de planejar tenha como aspecto buscar a transformação da realidade, há o planejamento que muda
para manter (para conservar). Se você conserta uma casa, o que você quer é conservar, embora esteja, realmente,
mudando a realidade. Se você a derruba para construir outra, você quer transformar. Se você pune um aluno
que transgrediu alguma regra, você quer conservar; se você muda as regras, de modo participativo e baseado em
necessidades descobertas na avaliação que compara uma teoria e um querer com a prática, você quer transformar.

Para Lück (2002 apud KLOSOUSKI, 2008), o planejamento consistiria em um processo


de estruturação e organização da ação intencional, realizado mediante: análise de
informações relevantes do presente e do passado, objetivando, principalmente, o
estabelecimento de necessidades a serem atendidas; estabelecimento de estados e
situações futuros desejados; previsão de condições necessárias ao estabelecimento
desses estados e situações; escolha e determinação de uma linha de ação capaz de
produzir os resultados desejados, de forma a maximizar os meios e recursos disponíveis
para alcançá-los.

Por fim, ainda de acordo com Vasconcellos (2005), o planejamento enquanto


construção-transformação de representações é uma mediação teórica metodológica
para ação, que em função de tal mediação passa a ser consciente e intencional.
Tem por finalidade procurar fazer algo vir à tona, fazer acontecer, concretizar, e
para isto é necessário estabelecer as condições objetivas e subjetivas prevendo o
desenvolvimento da ação no tempo.

Planejar pode ser atividade de um indivíduo ou de um grupo, direcionando-os para o que


e como fazer. Sem planejamento, nossas ações caem nos riscos inerentes ao improviso. E
as implicações disso podem ser bem sérias. Afinal, uma coisa é esquecer-se de comprar
algo porque não se levou a lista ao supermercado. Outra coisa é comprometer a qualidade
de educação ofertada por falta de planejamento.

Na contemporaneidade, a escola assumiu funções que antes eram destinadas a


outras instituições como família, Igreja, mídia etc. Hoje, com as novas formas de

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CAPÍTULO 4 • Planejamento: ação pedagógica essencial

organização familiar e mudanças na própria dinâmica das relações sociais, a escola


acaba responsabilizando-se por fazer a socialização primária, já que crianças chegam
cada vez mais cedo à escola; por oportunizar o acesso à cultura, ao esporte e ao lazer;
dar assistência ou encaminhamento a atendimento multidisciplinar (Fonoaudiologia,
Psicologia, Odontologia etc.); oferecer alimentação e cuidados com a higiene etc.

Figura 3. O impacto da tecnologia nas famílias.

Fonte: http://poesiaemtrovas.blogspot.com/2014/05/trova-legenda-ate-15062014.html. Acesso em: 22/7/2019.

Todas estas funções sociais secundárias têm seu valor, afinal se a sociedade mudou, a
escola também deve mudar. Contudo, é importante que não se perca de vista a função
principal que define o papel e sentido de existência da escola: a sociedade espera e
precisa que ela seja um lugar de aprendizagem, de ampliação de referências e repertório
cognitivo.

O conhecimento que a criança traz, por vezes, impregnado de senso comum, não
deve ser desvalorizado, ignorado, desqualificado. Mas ele é ponto de partida.
Espera-se que, na escola, o aluno avance de um conhecimento popular, fragmentado,
pontual e assistemático para um patamar mais próximo do conhecimento escolar
produzido a partir da recontextualização do conhecimento científico.

A aprendizagem na escola não pode ser só para alguns, a qualquer tempo e acidental.
Ela tem que ser para todos, organizada, de forma intencional... planejada!

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Planejamento: ação pedagógica essencial • CAPÍTULO 4

Mas, por que não gostamos de planos?

Na prática pedagógica atual o processo de planejamento do ensino tem sido objeto de


constantes indagações quanto à sua validade como efetivo instrumento de melhoria
qualitativa do trabalho docente. As razões de tais indagações são múltiplas e se apresentam
em níveis diferentes na prática docente.

O planejamento, embora inerente ao ser humano para encaminhar as


questões do dia-a-dia, torna-se uma ferramenta com conceitos, modelos,
técnicas e instrumentos bem definidos a partir do começo do século
passado, com a revolução comunista que constrói a União Soviética. No
mundo capitalista, o planejamento, para as questões mais complexas
passa a ser usual nos governos, depois da segunda guerra mundial. A
partir desta adoção pelos governos, o planejamento passa a ser uma das
preocupações de instituições, grupos, movimentos, organizações não
governamentais: podemos dizer que ele se universaliza. Hoje vivemos
a segunda grande onda de planejamento. A primeira entra em crise na
década de 70. A década de 80, embora, na prática, se apresente como uma
grande resistência ao planejamento, contém os mais efetivos anos em
termos da compreensão da necessidade, do estudo, do esclarecimento
e da confirmação desta ferramenta. Como fruto disto, temos agora bem
caracterizado o planejamento como ferramenta de intervir na realidade
e, mais do que isto, diversas correntes de planejamento firmadas como
ferramentas próprias para as diversas necessidades dos grupos, das
instituições, dos movimentos, das ONGs e, até, de setores de governo,
segundo suas especificidades (GANDIN, 2005).

Embora o planejamento seja visto como ferramenta de intervenção na realidade, a


vivência do cotidiano escolar nos tem evidenciado situações bastante questionáveis nesse
sentido. Percebe-se, de início, que os objetivos educacionais propostos nos currículos
dos cursos apresentam-se confusos e desvinculados da realidade social. Os conteúdos a
serem trabalhados, por sua vez, são definidos de forma autoritária, pois os professores,
em regra, não participam dessa tarefa. Nessas condições, tendem a mostrar-se sem elos
significativos com as experiências de vida dos alunos, seus interesses e necessidades.

No contexto acima descrito, o planejamento do ensino tem se apresentado como


desvinculado da realidade social, caracterizando-se como uma ação mecânica e
burocrática do professor, pouco contribuindo para elevar a qualidade da ação pedagógica
desenvolvida no âmbito escolar.

Segundo Gandin (2005), existe um relacionamento quase cômico entre a atividade


de planejar e a de arquivar: as pessoas que se envolvem em planejamento ortodoxo
no Brasil necessitam, rapidamente, de algumas lições de arquivística. Isso porque a

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CAPÍTULO 4 • Planejamento: ação pedagógica essencial

maioria dos planos alcança, numa boa hipótese, um lugar respeitável no arquivo da
instituição a que se ligam ou no de outras, cujos membros se interessam pelo estudo
desses pretensiosos filhos da burocracia. Segundo o autor, esse descrédito e ineficácia
dos planos é consequência de alguns fatores, cuja compreensão é simples:

I. Em primeiro lugar, a própria existência do “planejador” bloqueia a execução do


plano. Parece claro que, se há “planejadores”, há “executores” e, depois, “avaliadores”.
Em geral, os “planejadores” são poucos e os “executores”, uma porção. Como
resultado, temos uma pessoa, ou algumas, apontando a direção para todo um grupo
que, se tiver consciência crítica, não aceita tal situação e que, se tiver consciência
ingênua ou mítica, pode ser levado pela força ou pelo engodo. Em qualquer destes
casos, desprestigia-se o planejamento, que tem a difícil função de organizar a ação
sem ferir a liberdade e a riqueza dos participantes de um grupo.

II. Em segundo lugar, quase como consequência, o fato de se pensar planejamento


como uma “fabricação de planos”, como um reunir ideias, como “bolar” algo –
o que é uma compreensão parcial do planejamento – limita as preocupações a
uma etapa, a da elaboração, deixando completamente esquecidas as etapas de
execução e de avaliação. Diante desta concepção, cumpre-se a missão assim
que se escreveu o plano. Quem tiver consciência de que o planejamento inclui
a execução – ou, pelo menos, que fazer um plano só tem sentido se for para
colocá-lo em prática – realizará esta parte da elaboração sob outro prisma,
incluindo aqueles elementos que forçam a execução do decidido.

III. Depois, não podemos esquecer o formalismo e a burocracia que matam tudo aquilo
em que tocam. Os experts fazem-nos preencher quadrinhos e formulários e nos
dizem que estamos planejando. Evidentemente, nem eles mesmos levam a sério
aqueles papéis e não julgam que vamos fazer algo daquilo.

IV. Há, ainda, a falta de capacitação técnica das pessoas que “planejam” ou mesmo
coordenam a feitura de planos, o que termina levando os planos à ineficácia. Se
não seguir alguns princípios fundamentais e não utilizar técnicas apropriadas à
vivência desses princípios, a escrita de planos está fadada a ser uma atividade
pouco rentável, completamente inútil ou, até, perigosa.

V. Finalmente, muitas causas externas contribuem para que o planejamento não


mereça o cuidado sério das pessoas que julgam significativas as suas ações. Essas
causas talvez apontem todas para a mesma direção: o planejamento é para a
mudança, para a transformação, o que, provavelmente, não é o desejo dos “donos”
de nenhum dos setores de atividade humana. Eles fazem propaganda para que
creiamos em coisas, para que continuemos a agir descoordenadamente, e nós
abrimos mão do planejamento de verdade.

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Planejamento: ação pedagógica essencial • CAPÍTULO 4

No meio escolar, quando se faz referência a planejamento do ensino, a ideia que passa é
aquela que identifica o processo através do qual são definidos os objetivos, o conteúdo
programático, os procedimentos de ensino, os recursos didáticos, a sistemática de avaliação
da aprendizagem, bem como a bibliografia básica a ser consultada no decorrer de um curso,
ciclo, ano ou disciplina de estudo.

Ao que parece, essa definição dos componentes do plano de ensino ao buscar a eficiência
do ensino, valorizando apenas a dimensão técnica, de maneira fragmentária e desarticulada
do todo social – padrão disseminado pela concepção tecnicista de educação – contribuiu
para esta ideia de planejamento incapaz de dinamizar e facilitar o trabalho didático.
Entretanto, o processo de planejamento visto sob uma perspectiva crítica de educação passa
a extrapolar a simples tarefa de se elaborar um documento contendo todos os componentes
tecnicamente recomendáveis, pois a instituição escolar tem o significado de local de acesso
ao saber sistematizado historicamente acumulado (SAVIANI, 1984).

Dessa forma, a questão do planejamento do ensino não deve ser compreendida de maneira
mecânica, desvinculada das relações entre escola e realidade histórica. Sob essa perspectiva,
podemos analisar que a tarefa de planejar passa a existir como uma ação pedagógica
essencial ao processo de ensino.

A partir dessa perspectiva crítica de pensar a educação, entendemos que todas as atividades
educativas devem ser planejadas tendo como referência as dimensões sociais, culturais,
políticas e econômicas que permeiam os fazeres da escola. Então, o planejamento, assim
como os demais aspectos que constituem a prática didática, vincula-se para o ideário que
preconiza a transformação social, no sentido de tornar a sociedade mais justa e igualitária.

Saiba mais

No cotidiano da escola, tal proposta se efetivaria a partir dos princípios do planejamento participativo, isto é, uma
possibilidade de trabalho coletivo, caracterizado pela integração de todos os sujeitos e os setores de uma instituição
educativa.

Essa forma de ação implica uma convivência de pessoas que discutem, decidem, executam e avaliam atividades
propostas coletivamente. A partir dessa convivência, o processo educativo passa a desenvolver mais facilmente seu
papel transformador, pois, à medida que discutem, as pessoas refletem, questionam, conscientizam-se de problemas
coletivos e decidem-se por se engajar na luta pela melhoria de suas condições de vida.

Um outro aspecto a ressaltar é que um planejamento participativo implica a eliminação da divisão do trabalho
pedagógico existente na escola. Se o fundamento básico desse processo é a integração entre a escola e o contexto
social, e seu objetivo maior é a educação do indivíduo para a vida social, a coparticipação apresenta-se como atitude
norteadora de toda a ação pedagógica (LOPES, 1992).

51
CAPÍTULO 4 • Planejamento: ação pedagógica essencial

O planejamento e a legislação educacional

O planejamento na educação é uma função prevista na legislação. No campo legal, nos arts.
12, 13 e 14 da Lei no 9.394/1996 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB),
podemos identificar atividades que dependem de planejamento.

Observe a lei

Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a
incumbência de:

I – elaborar e executar sua proposta pedagógica;

II – administrar seu pessoal e seus recursos materiais e financeiros; (...)

Art. 13. Os docentes incumbir-se-ão de:

I – participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino;

II - elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta pedagógica do estabelecimento de ensino; (...)

Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de
acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios:

I – participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola;

II – participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes. (...).

O processo de planejamento resulta no produto que é o plano.

O plano consiste em um documento utilizado para o registro de decisões,


como o que se pensa fazer, como fazer, quando fazer, com quem fazer. Todo
plano começa pela discussão sobre os fins e objetivos do que se pretende
realizar. Na educação, ele apresenta de forma organizada as decisões
tomadas em torno das práticas educativas que serão desenvolvidas.
(...) Como acompanha uma prática, está sempre sujeito a modificações
(BRASIL, 2006).

De modo geral, um planejamento eficiente apresenta as seguintes características:

» Flexibilidade: Permite ajustes diante de possíveis mudanças, sem perder sua efetividade
e identidade. Circunstâncias imprevisíveis podem exigir reformulação.

» Estabilidade: Favorece sua incorporação às rotinas da organização.

» Continuidade: Deve ter mecanismos que viabilizem sua sustentabilidade e/ou


desdobramentos.

» Simplicidade: Quanto mais complexo, mais difícil se torna sua execução.

» Exequibilidade: Deve ser viável em função dos recursos disponíveis e dos obstáculos
identificados.

52
Planejamento: ação pedagógica essencial • CAPÍTULO 4

Como se faz o planejamento nas diferentes instâncias educacionais? A seguir, veremos os


tipos de planejamento ligados ao contexto escolar.

Níveis de abrangência do planejamento


Figura 4. Tipos de Planejamento.

Fonte: https://www.contato.net/a-importancia-do-planejamento-escolar/. Acesso em: 23/7/2019.

Embora o planejamento seja um processo realizado em diferentes tipos de organização,


no campo educacional ele tem características próprias. Além desta singularidade no teor,
ele também apresenta diferenças no nível de abrangência, indo do macro (governos e
secretarias educacionais), passando pelo meso (escolas) e chegando ao micro (a sala de
aula propriamente dita).

Segundo Calazans et al. (1990), o planejamento em educação ocorre em três níveis


interdependentes: o planejamento no âmbito dos sistemas e redes de ensino; o
planejamento no âmbito da unidade escolar; e o planejamento no âmbito do ensino.

O planejamento no âmbito dos sistemas e redes de ensino

Este planejamento também é denominado Planejamento Educacional ou do Sistema


de Educação, realizado nas esferas nacional, estadual e municipal. Ele reflete as
diretrizes das políticas educacionais e legislação em vigor.

53
CAPÍTULO 4 • Planejamento: ação pedagógica essencial

Consiste na tomada de decisões sobre a educação no conjunto do desenvolvimento


geral do País. Em geral, esse tipo de planejamento apresenta objetivos em longo prazo.
O Plano Nacional de Educação (PNE) corresponde ao de maior abrangência.

Planejamento da escola

Este planejamento confere identidade própria à instituição escolar, caracterizando-se


por previsão das ações a serem realizadas, definição de necessidades a atender, objetivos
a atingir dentro das possibilidades, procedimentos e recursos a serem empregados,
tempo de execução e formas de avaliação.

Explicitam-se os referenciais teórico-metodológicos, a contextualização da comunidade


escolar nos aspectos sociais e culturais, bem como a caracterização da clientela escolar,
os objetivos educacionais gerais, a estrutura curricular, diretrizes metodológicas gerais,
o sistema de avaliação e a estrutura organizacional e administrativa.

Ele articula a atividade escolar e o contexto social da escola e deve responder às perguntas
“para quê”, “para quem” e “com o quê” a escola vai funcionar.

Neste nível de planejamento podemos destacar o Projeto Político-Pedagógico e o


Planejamento Curricular.

Saiba mais

Planejamento Curricular

Trata-se da proposta geral de aprendizagem que a escola apresenta, considerando os fundamentos das disciplinas
que integram a estrutura curricular, encaminhando, assim, os procedimentos metodológicos, selecionando os
conteúdos e as propostas de avaliação.

Embora existam diferentes abordagens que orientam a elaboração de um currículo (com foco nas competências,
centrado no conteúdo etc.), de modo geral, o planejamento curricular deve estar em consonância filosófico-
metodológica com o PPP e contemplar os seguintes aspectos:

» Bases teórico-metodológicas.

» Objetivos educacionais.

» Diretrizes gerais para nortear a elaboração do plano de ensino da escola: definição das áreas/disciplinas.

» Matriz referencial inter-relacionando competências gerais e específicas, conhecimentos e contextos para


problematização dos conhecimentos.

» Concepção e estratégias de avaliação.

» Atividades curriculares extraclasse previstas (projetos, feiras culturais etc.).

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Planejamento: ação pedagógica essencial • CAPÍTULO 4

Concepções e Referenciais para o Projeto Político-


Pedagógico (PPP)

Como podemos definir o PPP?

Para Veiga e Fonseca (2000), podemos entender o Projeto Político-Pedagógico como:

Um documento de planificação escolar que poderíamos caracterizar do


seguinte modo: de longo prazo quanto sua duração; integral quanto sua
amplitude, na medida em que abarca todos os aspectos da realidade
escolar; flexível e aberto; democrático, porque elaborado de forma
participativa e resultado de consensos.

Para Medel (2008), o projeto político-pedagógico da escola retrata sua identidade.


Será um trabalho de construção e reconstrução que exige a participação de todos. Já
para Libâneo (2000), o projeto representa a oportunidade de a direção, a coordenação
pedagógica, os professores e a comunidade tomarem sua escola nas mãos, definir seu
papel estratégico na educação das crianças e jovens, organizar suas ações, visando atingir
os objetivos a que se propõem.

Refletindo sobre esses conceitos, podemos perceber a relevância do PPP para


determinada instituição de ensino, seja ela voltada para a educação básica, superior
ou ambas. O PPP orienta a vida escolar ou acadêmica e precisa ser percebido como
um instrumento de poder. Por isso, tem como meta ser o reflexo da identidade da
instituição e estabelecer os objetivos comuns a toda a comunidade educativa.

A dimensão pedagógica desse projeto, portanto, é muito clara. Porém, cabe dedicarmos
também um espaço inicial para refletirmos sobre a dimensão política do PPP.

Assim sendo, o primeiro passo é perceber a necessidade de romper com a hierarquia


e centralização de poder. A própria legislação entende a elaboração do PPP como um
processo democrático, no qual as decisões serão tomadas em prol dos interesses de toda
a comunidade que se relaciona com a instituição de ensino. Por isso mesmo, todos os
atores dessa comunidade devem participar: alunos, professores, gestores, equipe de apoio
pedagógico, equipe de apoio administrativo, lideranças comunitárias dos arredores da
instituição etc.

Segundo Souza (apud MEDEL, 2008), o PPP deverá ser construído com clareza no que
se refere ao compromisso ético-pedagógico de contribuir para a formação e educar o
cidadão de hoje para se tornar crítico, reflexivo e criativo, capaz de atuar e ajudar a
transformar e melhorar a sociedade da qual faz parte.

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CAPÍTULO 4 • Planejamento: ação pedagógica essencial

O Pro j e t o Po l í t i c o - Pe d a g ó g i c o ( P P P ) s e r ve d e re f e r ê n c i a n o r t e a d o ra p a ra t o d o s
o s â m b i t o s d a a ç ã o e d u c a t i va d a e s c o l a . Su a e l a b o ra ç ã o, p re v i s t a n a L D B n o
9 . 3 9 4 / 1 9 9 6 , d e v e s e r f e i t a d e m o d o c o l e t i v o, p a r t i c i p a t i v o, e m d i s c u s s õ e s
p ro m ov i d a s n a c o m u n i d a d e e s c o l a r.

Ele deve retratar o que a escola é hoje, mas, também, apontar o que ela almeja ser. Deve
estar sintonizado com a realidade da escola.

Quais os eixos e dimensões de um PPP?

Segundo Medel (2008), a LDB inclui três grandes eixos relacionados à construção do PPP:

» Flexibilidade: Autonomia da instituição em organizar seu trabalho pedagógico.

» Avaliação: Aspecto fundamental a ser considerado em todos os níveis do ensino.

» Liberdade: Congrega o estímulo ao pluralismo de ideias e concepções pedagógicas,


além de enfatizar a gestão democrática de ensino.

Já com relação às dimensões, ele é um projeto, porque registra e organiza propostas de


ações a serem efetivadas em determinado período de tempo previsto. É político, por ser
a escola espaço de atuação e formação de cidadãos cujas ações têm e terão impacto na
sociedade. É pedagógico, em função da especificidade do papel da escola e por definir e
organizar as ações educativas a serviço da aprendizagem.

Embora haja uma ou outra variação, para a maioria dos especialistas, na elaboração de
seu PPP a escola deve incluir como tópicos de discussão:

» Missão da escola – aspecto filosófico.

» Caracterização da clientela.

» Dados e informações sobre a aprendizagem.

» Relação com as famílias.

» Recursos humanos e materiais.

» Diretrizes pedagógicas.

» Plano de ação.

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Planejamento: ação pedagógica essencial • CAPÍTULO 4

Sugestão de estudo

Colégio Pedro II

Vamos visualizar e analisar um PPP na prática!

O Projeto Político Pedagógico Institucional (PPPI) do Colégio Pedro II é o que representa uma escola pública, da
Educação Básica ao Ensino Superior. É um colégio muito tradicional, fundado em 2 de dezembro de 1837 e localizado
no Rio de Janeiro. Constitui-se hoje em uma autarquia federal do Ministério da Educação (MEC), cuja missão é
promover a educação de excelência, pública, gratuita e laica, por meio da indissociabilidade do ensino, da pesquisa e
da extensão, formando pessoas capazes de intervir de forma responsável na sociedade.

O PPPI do Colégio Pedro II é um documento de, aproximadamente, 550 páginas. Ele está disponível na internet, no
seguinte endereço: https://www.cp2.g12.br/.

O PPPI está disponível em: http://www.cp2.g12.br/component/content/article.html?id=2315.

Nesse momento, faça uma análise aprofundada desse PPP. Essa atividade será fundamental para que você, ao
participar das discussões que virão, tenha casos concretos como referência para fazer comparações e análises. Leia
com especial atenção os sumários, pois é uma forma excelente de perceber a estrutura geral do projeto construído,
que continua em plena atividade de elaboração e reconstrução!

Existem outros tipos de planos similares ao PPP em abrangência, mas que utilizam
como base de construção princípios similares aos dos chamados planejamentos
estratégicos nas empresas.

Um exemplo no campo educacional é o Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE)


ou Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI), orientados por “paradigmas da
gestão por resultados, enfatizando aspectos como produtividade, controle, medidas
de efetividade, eficiência etc.” (BRASIL, 2006).

Para refletir

O planejamento estratégico, como ferramenta de gestão, busca atender às necessidades das organizações para um
futuro incerto, permitindo que elas enfrentem efetivamente os desafios ambientais desta economia globalizada
que vivemos atualmente. Relaciona-se com objetivos de longo prazo e com as estratégias e ações adequadas para
alcançá-los.

O planejamento tático é feito em cada área específica da empresa e foca objetivos em médio prazo.

No planejamento operacional estão as atividades que compõem a rotina da organização, desenvolvidas em curto
prazo.

E as instituições escolares? Também dependem de um planejamento eficaz para atingir bons resultados? Esse
planejamento, no contexto educacional, tem características próprias?

57
CAPÍTULO 4 • Planejamento: ação pedagógica essencial

Figura 5. O Planejamento nas organizações.

Fonte: https://www.setting.com.br/blog/estrategia/planejamento-estrategico-metas-e-objetivos/. Acesso em: 23/7/2019.

Sugestão de estudo

Figura 6. Moneyball.

Fonte: http://www.adorocinema.com/filmes/filme-140005/. Acesso em: 26/7/2019.

O filme Moneyball (O homem que mudou o jogo) conta a história do gerente geral do time de basebol Oakland
Athletics, Billy Beane (Brad Pitt), e seu planejamento estratégico para formar um time competitivo para a temporada
de 2002, apesar do orçamento limitado.

Baseado no livro Moneyball, retrata como o planejamento e uso de análise estatística transformou a maneira como os
gerentes gerais dos times de basebol montam e escalam suas equipes.

Título original: Moneyball.

Ano de produção: 2011.

Direção: Bennett Miller.

Elenco: Brad Pitt, Jonah Hill, Philip Seymour Hoffman, Chris Pratt…

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Planejamento: ação pedagógica essencial • CAPÍTULO 4

O planejamento no âmbito do ensino

Este planejamento é elaborado pelo professor e/ou sua equipe e deve definir
objetivos específicos, os tópicos conceituais relevantes, as estratégias metodológicas,
procedimentos a serem usados na avaliação, recursos e materiais didático-pedagógicos.

Neste nível de planejamento podemos destacar o plano de curso e o plano de aula.

Em geral, o plano de curso, plano anual, plano de ensino ou plano de unidades didáticas é
elaborado pela equipe de professores de uma mesma disciplina/segmento de ensino.

Fusari (1990) alerta-nos de que a ausência de um processo de planejamento do ensino,


somada às dificuldades enfrentadas pelos docentes no cotidiano da escola, tem levado
a uma contínua improvisação pedagógica nas aulas. Para o autor, aquilo que deveria ser
uma prática eventual acaba sendo uma “regra”, prejudicando, assim, a aprendizagem
dos alunos e o próprio trabalho escolar como um todo.

Podemos dizer, de modo simplificado, que o plano de ensino consiste em um roteiro


organizado por unidades didáticas para um ano ou semestre letivo. Ele deve incluir os
seguintes componentes:

» Ementa.

» Justificativa e importância do curso.

» Objetivos.

» Competências a serem desenvolvidas.

» Conteúdo programático discriminado por bimestres.

» Métodos e técnicas de ensino.

» Recursos didáticos – incluindo novas tecnologias.

» Estratégias e critérios de avaliação.

» Referenciais teóricos.

Plano de aula

Feito pelo professor, este nível de planejamento corresponde a uma das atividades
mais importantes do trabalho docente. Conforme Fusari (1990), cada aula é um
encontro curricular, no qual, nó a nó, vai-se tecendo a rede do currículo escolar
proposto para determinada faixa etária, modalidade ou grau de ensino.

59
CAPÍTULO 4 • Planejamento: ação pedagógica essencial

Nas instituições escolares, a aula ainda é forma predominante de organização didática.


Nela se espera que a aprendizagem ocorra. E como esta, na escola, deve acontecer de
modo intencional, não se pode subestimar a importância de um bom plano de aula,
onde se faz o detalhamento do plano de ensino.

As unidades e tópicos previstos em linhas gerais, no plano de ensino, são especificadas


e sistematizadas em situações didáticas adequadas para o tempo, espaço e recursos
disponíveis.

Vale lembrar que as aulas podem ser predominantemente de introdução, desenvolvimento,


consolidação (fixação, exercícios, sistematização), revisão e avaliação.

Provocação

Além disso, é necessário desmitificar a ideia de que uma visita à fábrica, uma coleta de água no rio ou a exibição de
um vídeo não sejam aulas, não sejam situações de aprendizagem!

Logo, os planos devem estar coerentes com as diferentes aulas.

Para que haja efetivamente um bom desenvolvimento nas aprendizagens, o ideal é que
se prepare um conjunto de aulas e se faça as adequações necessárias conforme estas
forem ocorrendo na prática.

Existem diversos modelos que podem ser utilizados para a elaboração de um bom plano
de aula. Eles diferem na disposição dos itens ou, até mesmo, na forma como eles são
nomeados. Cada professor deve construir o roteiro que “funcione” em sua realidade
docente, recorrendo à literatura e outros colegas. O importante é que seja claro, exequível,
atenda às necessidades pedagógicas e favoreça o desenvolvimento de uma aula em que
a aprendizagem aconteça.

Veja a seguir uma sugestão de roteiro para plano de aula:

60
Planejamento: ação pedagógica essencial • CAPÍTULO 4

Figura 7. Plano de aula.

Instituição Escolar: __________________________ Ano: ___________

Série/Nível: ____________

Disciplina: ______________________ Turma: ____________

TEMA
(Nome do
assunto/conteúdo a
ser desenvolvido)

OBJETIVO
GERAL
(Deve começar com
verbo no infinitivo.
Normalmente os
objetivos completam
a seguinte ideia: “Ao
final da aula o aluno
será capaz de...”)

OBJETIVOS
ESPECÍFICOS
(Também devem
começar com verbo
no infinitivo. Este
item contém um
breve resumo, sob a
forma de tópicos,
contendo objetivos
mais pontuais,
relacionados aos
assuntos que serão
tratados em aula)

MATERIAL
DIDÁTICO OU
INSTRUMENTOS
(Este item contempla
as diferentes ferra-
mentas pedagógicas
que serão utilizadas
para viabilizar o
conteúdo em aula.
Ex.: retroprojetor,
televisão, vídeo,
quadro-negro,
flipchart, cartazes
etc.)

61
CAPÍTULO 4 • Planejamento: ação pedagógica essencial

ESTRATÉGIAS
DE ENSINO
(Neste item devemos
indicar a forma didática
utilizada pelo professor
para disponibilizar os
conteúdos em aula, a
partir dos instrumentos
pedagógicos anterior-
mente citados. Ex.:
Preleção verbal;
apresentação de
esquemas com o uso
do retroprojetor;
discussão de figuras
com o uso do retropro-
jetor; estudo dirigido;
dinâmica com utiliza-
ção de flipchart;
discussão do vídeo
apresentado em aula,
etc.)

AVALIAÇÃO
(No fim da aula, o
professor poderá
elaborar um tipo de
avaliação a fim de
verificar o resultado de
seu trabalho, ou seja,
verificar se os objetivos
da aula foram alcança-
dos. Ex: Exercícios;
Feedback da turma;
Trabalhos em grupo;
Sínteses da aula etc.)

REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
(livros, periódicos,
sites, artigos, filmes
etc. O último item do
plano de aula diz
respeito à base teórica
do conteúdo desenvol-
vido em aula)

Fonte: Elaboração da autora.

O planejamento como instrumento de políticas públicas na


educação

Todo o sistema educacional deve se programar e buscar alcançar alvos que permitam a
melhoria dos parâmetros da educação, mas com qualidade. O Plano Nacional de Educação

62
Planejamento: ação pedagógica essencial • CAPÍTULO 4

(PNE) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) são documentos primordiais
para a nossa educação.

O Plano Nacional de Educação (PNE) determina diretrizes, metas e estratégias para a política
educacional dos próximos dez anos (2014-2024).

O Ministério da Educação se mobilizou de forma articulada com os demais entes federados


e instâncias representativas do setor educacional, direcionando o seu trabalho em torno do
plano em um movimento inédito: referenciou seu Planejamento Estratégico Institucional e
seu Plano Tático Operacional a cada meta do PNE, envolveu todas as secretarias e autarquias
na definição das ações, dos responsáveis e dos recursos.

As diferentes definições de planejamento, em geral, coincidem no reconhecimento de


seu objetivo: direcionar a ação do Estado de forma a torná-la racional. Como modelo
teórico para a ação, ou método para sua racionalização, o planejamento envolve um
esforço metódico e consciente ao selecionar e orientar os meios e as estratégias para
atingir os fins previamente definidos, com o objetivo de aproximar a realidade do ideal
expresso pelo modelo.

O p l a n e j a m e n t o é u m p ro c e s s o q u e d e ve s e r c o n t í n u o, e n g l o b a r o p e ra ç õ e s
interdependentes e estar sujeito a revisões e modificações, uma vez que as condições
podem ser alteradas, obstáculos revelados e interpretações modificadas. Ademais,
o planejamento é um processo político, pois envolve decisões e negociações acerca
de escolhas de objetivos e caminhos para concretizá-los.

O P N E n ã o é v i n c u l a d o, a n ã o s e r p o r a n a l o g i a , a o p l a n e j a m e n t o d a o rd e m
econômica. Trata-se, sobretudo, de referência para o planejamento de um setor
da ordem social – o setor educacional.

O ano de 2014 se constituiu em um marco na história da educação brasileira, pois


foi palco da implantação do Plano Nacional de Educação (PNE 2014-2024) por meio
da promulgação da Lei n o 13.005, de 2014 no mês de junho. Sua tramitação pelo
Congresso Nacional levou quase quatro anos e se deu por um processo que englobou
forte mobilização e participação de forças organizadas do campo da educação na
proposição de ementas ao Projeto de Lei (PL) original.

O largo período de sua tramitação também pode ser o exemplo dos múltiplos e
contraditórios interesses em disputa que constituíram o campo de forças pelo qual
o projeto de lei tramitou. Esse movimento sugere o grau de importância atribuído
ao PNE, certamente o principal instrumento das políticas educativas para o decênio
2014-2024, o que nos leva a indagar a respeito da utilidade de um plano.

63
CAPÍTULO 4 • Planejamento: ação pedagógica essencial

Segundo Azevedo (2014), a ideia de um plano nacional de educação remonta às


discussões empreendidas pelo movimento dos pioneiros da educação nas primeiras
décadas do século passado, quando começou a se implantar o processo de modernização
(conservadora) da sociedade brasileira, no contexto da afirmação do processo de
industrialização.

A proposta educativa do movimento ficou registrada no Manifesto dos Pioneiros


da Educação, lançado no período, que propunha uma reconstrução educacional de
largo alcance e vastas proporções para a sociedade brasileira, o que significava o
estabelecimento de um plano unitário e de bases científicas.

Ainda de acordo com a autora, herdeiro de todos os limites e avanços que historicamente
têm marcado a educação nacional e o seu planejamento, o PNE (2014-2024) exprime, em
certa medida, o amadurecimento da sociedade brasileira no ato de pensar o seu futuro,
mas a partir de prismas que revelam a presença de elementos impostos pela ordem global
e pela síntese possível estabelecida entre tendências progressistas e conservadoras.

Sugestão de estudo

Vamos aprofundar e conhecer um pouco mais sobre as metas e estratégias contempladas no Plano Nacional de
Educação (2014-2024)?

Sem dúvida, o PNE constitui hoje um dos principais instrumentos das políticas educativas brasileiras para a década
iniciada em 2014. Em obediência ao que passou a prescrever a Constituição, por meio de suas diretrizes, metas e
estratégias, confere centralidade à busca da qualidade da educação socialmente referenciada. Portanto, a qualidade,
mais uma vez, é um alvo que se projeta atingir até 2024.

Disponível em: http://pne.mec.gov.br/.

Escolha uma das metas propostas no PNE (2014-2024). Será que a meta que você selecionou, prevista no anexo desta
lei, está sendo cumprida?

O PNE contempla em número de 20 as metas e de 254 as estratégias estabelecidas, e


estas guardam articulação entre si. Por meio da apresentação de estatísticas, têm-se
indicadores que podem permitir o acompanhamento das metas, o que é complementado
pelas possibilidades abertas para a participação das escolas, da comunidade e dos
profissionais da educação nesse processo, tendo em vista novos mecanismos de controle
social que foram estabelecidos.

Um dos exemplos marcantes é representado pela meta 20, que traduz a


aprovação da destinação de pelo menos 10% do PIB para financiamento
da educação pública, a partir de estudos que indicaram a propriedade
desse percentual para que as 19 outras metas pudessem ser alcançadas.
O documento prescreve a ampliação do: “[...] investimento público em
educação pública de forma a atingir, no mínimo, o patamar de 7% (sete

64
Planejamento: ação pedagógica essencial • CAPÍTULO 4

por cento) do Produto Interno Bruto (PIB) do País no 5° (quinto) ano de


vigência desta Lei e, no mínimo, o equivalente a 10% (dez por cento) do
PIB ao final do decênio.” (BRASIL, 2014 apud AZEVEDO, 2014, p. 274).

Figura 8. Financiamento da Educação.

Fonte: https://www.institutomillenium.org.br/artigos/o-financiamento-da-educacao/. Acesso em: 21/7/2019.

Posicionamento do autor

Quando pensamos na questão do financiamento educacional, o PNE é um plano de metas que anuncia custos e
recursos disponíveis para a educação. Em 2001, o Congresso Nacional aprovou no I PNE (2001-2010) a aplicação
de 7% do Produto Interno Bruto (PIB), para serem gastos com a educação brasileira. Porém, o Brasil aplicou o
equivalente a 4% do PIB, chegando a 5% apenas em 2009.

A insuficiência dos recursos aplicados na educação brasileira já é denunciada há várias décadas... e infelizmente,
ofertar educação de boa qualidade não é possível com poucos recursos.

Sintetizando

Vimos até agora que:

» A didática se ocupa do processo ensino/aprendizagem e, nessa perspectiva, identificamos também um dos temas
clássicos de seu interesse: o planejamento educacional.

» O planejamento é um processo que exige sistematização, organização, decisão e previsão.

» Sendo um ato político-pedagógico, planejar não tem neutralidade e revela intencionalidade, visões de mundo, de
sociedade e de cidadão que se pretende ajudar a formar.

» A questão do planejamento do ensino não deve ser compreendida de maneira mecânica, desvinculada das relações
entre escola e realidade histórica.

» No cotidiano da escola, o planejamento participativo é uma possibilidade de trabalho coletivo, caracterizado pela
integração de todos os sujeitos e os setores de uma instituição educativa.

» O planejamento em educação ocorre em três níveis interdependentes: o planejamento no âmbito dos sistemas e
redes de ensino; o planejamento no âmbito da unidade escolar e o planejamento no âmbito do ensino.

65
CAPÍTULO
A AVALIAÇÃO NO TRABALHO
DOCENTE 5
Introdução do Capítulo

Em educação, a avaliação encontrou seu lugar privilegiado, não só como prática política
e pedagógica, mas, também, como importante campo de estudo. Ganhou visibilidade e
importância estratégica com a implantação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação
Básica (Saeb).

Quando falamos em avaliação, em geral, pensamos imediatamente em provas, notas e


atividades para avaliar o que o aluno aprendeu. A avaliação dos alunos é certamente uma
atividade permanente no cotidiano dos professores. Mas por que, quase sempre, associamos
avaliação como uma atividade em que o sujeito é exclusivamente o aluno?

A avaliação educacional é um tema complexo que pode ser abordado sob diferentes
perspectivas. Apesar de sua longa presença na história da escola, ainda hoje, a avaliação
é considerada uma das atividades mais polêmicas no processo de ensino-aprendizagem.

O objetivo deste capítulo é identificar como a avaliação em suas diferentes dimensões


pode contribuir para práticas e políticas educacionais que tornam as escolas melhores.
Em um primeiro momento, analisamos os fundamentos e a expansão da avaliação
educacional e conceitos como mediação, controle, verificação, pedagogia do exame
etc., servem de apoio às reflexões produzidas. Por fim, procuramos problematizar os
desafios da avaliação na prática escolar, tendo em vista que a avaliação é uma tarefa
didática necessária e permanente do trabalho docente, que deve acompanhar passo a
passo o processo de ensino e aprendizagem.

Objetivos

» Analisar os fundamentos da avaliação educacional.

» Compreender o processo de expansão da avaliação no Brasil.

66
A Avaliação no Trabalho Docente • CAPÍTULO 5

» Refletir sobre o papel das avaliações em larga escala e a preocupação das


administrações públicas da educação e das escolas com os resultados dos processos
de ensino.

» Problematizar os desafios da avaliação na prática escolar.

Figura 9. Avaliação escolar.

Fonte: https://blog.influx.com.br/como-dizer-colar-na-prova-em-ingles. Acesso em: 24/7/2019.

Fundamentos da avaliação educacional

A avaliação educacional é um tema complexo que pode ser abordado sob diferentes
perspectivas. Apesar de sua longa presença na história da escola, ainda hoje, a avaliação
é considerada uma das atividades mais polêmicas no processo de ensino-aprendizagem.

A forma como o aluno aprende se relaciona com as atividades que o professor realiza
para que a aprendizagem aconteça e, portanto, ensino e aprendizagem se encontram
estreitamente ligados, ocorrendo quase simultaneamente. Essa proposição sugere
que há dois sujeitos da avaliação.

O campo conceitual da Avaliação é constituído historicamente e, como tal, se transforma


de acordo com os movimentos e mudanças sociais.

A avaliação educacional hoje é um campo de estudos com teorias, processos e métodos


específicos, mas, também, um campo abrangente que comporta subáreas, com
características diferentes, por exemplo: avaliação de sistemas educacionais, avaliação
de desempenho escolar em nível de sala de aula, avaliação institucional, avaliação de
programas.

67
CAPÍTULO 5 • A Avaliação no Trabalho Docente

A avaliação é uma tarefa didática necessária e permanente do trabalho docente, que


deve acompanhar passo a passo o processo de ensino e aprendizagem (LIBÂNEO, 2013).
Avaliar é um conceito abrangente, pois tem caráter subjetivo e inclui julgamento de
valores. É uma reflexão sobre o nível de qualidade do trabalho escolar tanto do professor
como dos alunos, e não se resume à realização de provas e atribuição de notas. Segundo
Luckesi (apud LIBÂNEO, 2013, p. 217):

a avaliação é uma apreciação qualitativa sobre dados relevantes do


processo de ensino e aprendizagem que auxilia o professor a tomar
decisões sobre o seu trabalho. Os dados relevantes se referem às várias
manifestações das situações didáticas, nas quais o professor e os alunos
estão empenhados em atingir os objetivos de ensino.

Libâneo (2013) afirma, então, que, podemos definir a avaliação escolar como um
componente do processo de ensino que visa, através da verificação dos resultados
obtidos, determinar a correspondência destes com os objetivos propostos e, daí, orientar
a tomada de decisões em relação às atividades didáticas seguintes.

Segundo Haydt (2006, p. 288), avaliação é “orientadora, porque indica os avanços e


dificuldades do aluno, ajudando-o a progredir na aprendizagem, orientando-o no sentido
de atingir os objetivos propostos”.

Já na definição de Silva e Brandão (2003) a avaliação é elaboração, negociação e aplicação


de critérios explícitos de análise, em um exercício metodológico, cuidadoso e preciso,
com vistas a conhecer, medir, determinar ou julgar o contexto, mérito, valor ou estado
de determinado objeto, a fim de estimular e facilitar processos de aprendizagem e de
desenvolvimento de pessoas e organizações.

Os procedimentos de avaliação são um precioso e imprescindível elemento para conhecer


o que o sistema educativo pretende em relação à aprendizagem do educando. Quando
se fala em avaliação do processo de ensino-aprendizagem, referimo-nos à verificação do
nível de aprendizagem dos alunos. Nesse enfoque, segundo Libâneo (2013), a avaliação
apresenta três tarefas: a verificação, a qualificação e a apreciação qualitativa.

» Verificação: coleta de dados sobre o aproveitamento dos alunos, por meio de provas,
exercícios, observação, entrevistas etc.

» Qualificação: comprovação dos resultados alcançados em relação aos objetivos e,


conforme o caso, atribuição de notas ou conceitos.

» Apreciação qualitativa: avaliação propriamente dita dos resultados.

68
A Avaliação no Trabalho Docente • CAPÍTULO 5

Saiba mais

Autores como Bloom (1956 apud HAYDT, 2006) categoriza essas três tarefas da avaliação como: diagnóstica,
formativa e somativa.

» Diagnóstica: verificar a presença ou ausência de pré-requisitos para novas aprendizagens. Detectar


dificuldades específicas de aprendizagem, tentando identificar suas causas. Costuma ser aplicada no início
do ano ou semestre letivos, ou no início de uma unidade de ensino.

» Formativa: possui a função de controle e de constatar se os objetivos estabelecidos foram alcançados pelos alunos.
Fornece dados para aperfeiçoar o processo de ensino-aprendizagem. Costuma ser aplicada durante o ano letivo,
isto é, ao longo do processo de ensino-aprendizagem.

» Somativa: possui a função de classificar os resultados de aprendizagem alcançados pelos alunos, de acordo com
níveis de aproveitamento estabelecidos. Costuma ser aplicada ao final de um ano ou semestre letivos, ou ao final de
uma unidade de ensino.

Relacionadas a essas três tarefas, existem três funções de avaliação que foram categorizadas
por Libâneo: pedagógico-didática, de diagnóstico e de controle.

» Pedagógico-didática: refere-se ao papel da avaliação no cumprimento dos objetivos


gerais e específicos da educação escolar.

» Diagnóstico: permite identificar progressos e dificuldades dos alunos e a atuação do


professor para melhor cumprir as exigências dos objetivos.

» Controle: refere-se aos meios e à frequência das verificações e de qualificação dos


resultados escolares, possibiltando o diagnóstico das situações didáticas. Através de
uma variedade de atividades permite ao professor observar como os alunos estão
conduzindo-se na assimilação de conhecimentos e habilidades.

Atenção

Na prática escolar cotidiana, a função de diagnóstico é mais importante porque é a que possibilita a avaliação do
cumprimento da função pedagógico-didática e a que dá sentido pedagógico à função de controle.

A expansão da avaliação educacional no Brasil

Em educação, a avaliação encontrou seu lugar privilegiado, não só como prática política
e pedagógica, mas, também, como importante campo de estudo. Ganhou visibilidade
e importância estratégica com a implantação do Sistema Nacional de Avaliação da
Educação Básica (Saeb). Mas, por que essa quantidade de atividades ligadas à Avaliação,
com tantas pessoas envolvidas, como avaliadores e avaliados, vem crescendo e sendo
tão fundamental atualmente?

69
CAPÍTULO 5 • A Avaliação no Trabalho Docente

A avaliação faz parte do nosso dia a dia, seja de maneira corriqueira, seja de modo
formal. Com significados bem particulares, está incorporada ao cotidiano de professores,
estudantes e organizações educativas e é considerada até um patrimônio das instituições
educacionais. No entanto, nas últimas décadas, com programas de bem-estar, projetos
sociais de larga escala, aplicados, principalmente, em países desenvolvidos, e mesmo com
várias restrições econômicas, também em países em desenvolvimento, a avaliação adquiriu
novas dimensões, sendo parte da agenda de política dos governos, organismos e agências
dedicadas à estruturação e à gestão dos setores públicos, organizações não governamentais
e, principalmente, nas políticas educacionais.

Embora a avaliação educacional seja um tema complexo, avaliar os alunos sempre fez parte
do processo educativo. As escolas o fazem há muito tempo. Entretanto, nos últimos 20 anos
desenvolveu-se no mundo um novo campo de estudos: a avaliação educacional. O principal
objetivo é analisar a evolução das escolas e dos sistemas educacionais, tornando possível
medir objetivamente a eficácia dos sistemas, das escolas, dos diretores e dos professores
em relação ao que é um dos objetivos centrais da educação: a aprendizagem dos alunos.

Obviamente a escola não deve se resumir a isso. A educação integral da criança e do jovem
é uma tarefa da família e da escola. Por isso, é essencial que a escola tenha muito clara
sua missão também no desenvolvimento dos princípios éticos e morais e do respeito pelo
outro, assim como no desenvolvimento da responsabilidade social da pessoa.

A discussão da avaliação educacional permite que o público brasileiro se conscientize não


só da complexa realidade da aplicação das avaliações padronizadas em larga escala, mas
também dos resultados do ensino em diferentes níveis e localidades e em comparação
com outros países. As comparações internacionais, principalmente as do Programa
Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa) também suscitaram questionamentos que
permitem perceber que os resultados fornecidos pelas avaliações educacionais estão
se firmando cada vez mais como a definição oficial da qualidade da educação oferecida
pelas escolas (GAME, 2011).

No Brasil, este campo de conhecimento só veio a merecer maior atenção, estudos e


análises críticas mais fundamentadas há relativamente pouco tempo. Por ter entrado
tardiamente no campo educacional, a avaliação também sofreu ainda os efeitos da quase
ausência de formação nos cursos de educação de profissionais especializados.

A partir da década de 1980, o Brasil se viu diante da necessidade de controlar as ações


realizadas na esfera governamental e de afirmação do projeto democrático do País. O
Governo passou, então, a construir instrumentos de monitoramento e avaliação de seus
investimentos no compromisso de demonstrar eficiência, eficácia e efetividade no emprego
de recursos públicos.

70
A Avaliação no Trabalho Docente • CAPÍTULO 5

Realizado por órgãos do governo, fundações e institutos destacam-se na avaliação do


sistema público: o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e o Instituto Nacional
de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Programas do Ministério da
Educação (MEC) concretizam planos para o resgate da qualidade do ensino no Brasil, o
que de todo só se tornará efetivo mediante a verificação de resultados significativos de
aprendizagem dos estudantes das redes públicas.

O Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) expressa metas relacionadas a


diferentes frentes de ação educacional, como a criação do Índice de Desenvolvimento
da Educação Básica (Ideb). Os índices de avaliação e as metas se articulam com os
sistemas nacionais e internacionais de financiamento, como o Fundo de Manutenção
e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb).

Saiba mais

O (novo) Fundeb

O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação


(Fundeb) atende a toda a educação básica, da creche ao ensino médio. Substituto do Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef ), que vigorou de 1997 a 2006, o
Fundeb está em vigor desde janeiro de 2007 e se estenderá até 2020.

É um importante compromisso da União com a educação básica, na medida em que aumenta em dez vezes o volume
anual dos recursos federais. Além disso, materializa a visão sistêmica da educação, pois financia todas as etapas da
educação básica e reserva recursos para os programas direcionados a jovens e adultos.

A estratégia é distribuir os recursos pelo País, levando em consideração o desenvolvimento social e econômico das
regiões – a complementação do dinheiro aplicado pela União é direcionada às regiões nas quais o investimento por
aluno seja inferior ao valor mínimo fixado para cada ano. Ou seja, o Fundeb tem como principal objetivo promover a
redistribuição dos recursos vinculados à educação.

A destinação dos investimentos é feita de acordo com o número de alunos da educação básica, com base em dados
do censo escolar do ano anterior. O acompanhamento e o controle social sobre a distribuição, a transferência e
a aplicação dos recursos do programa são feitos em escalas federal, estadual e municipal por conselhos criados
especificamente para esse fim. O Ministério da Educação promove a capacitação dos integrantes dos conselhos.

As diretrizes do Novo Fundo de Manutenção da Educação Básica (Fundeb), bem como as propostas para o novo
modelo de redistribuição dos recursos, está sendo tema de debate no Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação (FNDE). Nos encontros realizados por deputados federais e técnicos da autarquia estão sendo discutidos,
entre outros assuntos, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) no 15/2015, que prevê a inserção permanente do
Fundeb na Constituição Federal.

Saiba mais sobre o Fundeb. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/fundeb.

O Plano de Metas do Compromisso Todos pela Educação destaca especialmente


o esforço para envolver pais, alunos, professores e gestores em iniciativas que
favoreçam a permanência do aluno na escola, assim como a consecução das metas
de qualidade para a educação básica.

71
CAPÍTULO 5 • A Avaliação no Trabalho Docente

Assim, redes e escolas públicas se comprometem com um programa detalhado de


metas de desenvolvimento educacional, com ênfase na atuação social e comunitária
das unidades escolares e no trabalho orientado para os indicadores de aprendizagem
do Ideb.

Avaliações em larga escala

No campo do ensino público, a avaliação ganhou visibilidade e importância estratégica


a partir de 1990 com a implantação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação
Básica (Saeb) por meio do Ministério da Educação, em articulação com as Secretarias
Estaduais de Educação. O Saeb foi a primeira iniciativa, em escala nacional, para se
conhecer o sistema educacional brasileiro em profundidade. Ele é realizado a cada dois
anos e avalia apenas uma amostra representativa dos alunos matriculados nas séries
finais do primeiro e segundo ciclo do ensino fundamental e do ensino médio, de escolas
públicas e privadas.

O Saeb fornece dados sobre a qualidade dos sistemas educacionais do Brasil como um
todo, das regiões geográficas e dos estados. Ainda assim, identificou-se a necessidade de
se obter uma análise mais detalhada em que as escolas se “vissem” nessa avaliação e fosse
possível obter dados por estado, mas, também, para cada município e escola participante.
Para equacionar essa necessidade, em 2005, criou-se outra medida de avaliação: a Prova
Brasil que, usando a mesma metodologia, passou a ser realizada em conjunto com o Saeb
(Figura 10).

Figura 10. Estrutura do Saeb.

Fonte: http://portal.inep.gov.br. Acesso em: 26/7/2019.

O Saeb é composto por três avaliações externas em larga escala: a Aneb e a Anresc/Prova
Brasil são realizadas bianualmente, enquanto a ANA é de realização anual. A ANA foi
incorporada ao Saeb em 2013: trata-se de uma avaliação censitária envolvendo os alunos do
3o ano do Ensino Fundamental das escolas públicas, com o objetivo principal de avaliar os
níveis de alfabetização e letramento em Língua Portuguesa, alfabetização em Matemática
e condições de oferta do Ciclo de Alfabetização das redes públicas.

72
A Avaliação no Trabalho Docente • CAPÍTULO 5

A finalidade do Saeb é avaliar a qualidade do ensino oferecido pelo sistema


educacional brasileiro a partir de testes padronizados e questionários socioeconômicos,
tendo aperfeiçoado sua metodologia e adotado os procedimentos preconizados pela
Teoria da Resposta ao Item.

Saiba mais

Teoria da Resposta ao Item: modelagem estatística utilizada em medidas psicométricas, metodologia que sugere
“formas de representar a relação entre a probabilidade de um indivíduo dar uma certa resposta a um item e traços
latentes, proficiências ou habilidades na área de conhecimento avaliada” (ANDRADE, TAVARES e VALLE, 2000).

O Saeb se organiza em dois grandes eixos: o primeiro voltado ao acesso ao ensino básico
– verificado pelo atendimento à demanda de vagas através dos índices de acesso e de
escolarização e pela eficiência de taxas de produtividade, taxas de transição (promoção
e evasão) e de eficiência interna (investimentos); e o segundo eixo é relativo à qualidade,
implicando o estudo de quatro dimensões:

a. desempenho do aluno na aprendizagem de conteúdos e no desenvolvimento de


habilidades e competências;

b. nível socioeconômico dos alunos, hábitos de estudo, perfil. Condições de trabalho dos
docentes e diretores, tipo de escola, grau de autonomia da escola, matriz organizacional
da escola;

c. planejamento do ensino e da escola, projeto pedagógico, utilização do tempo escolar;


estratégias de ensino;

d. infraestrutura, espaço físico e instalações, equipamentos, recursos e materiais didáticos.

Os instrumentos de coleta são as provas realizadas pelos alunos e questionários aplicados


a alunos, professores e diretores. Nos últimos anos, agregaram-se, ao modelo geral de
avaliação, estudos de casos de situações específicas consideradas relevantes para análise
mais aprofundada de fatores contextuais intervenientes nos resultados (BRASIL/MINISTÉRIO
DA EDUCAÇÃO, 2002).

O quadro a seguir apresenta semelhanças e diferenças entre as duas avaliações, que são
conduzidas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
(Inep/MEC).

73
CAPÍTULO 5 • A Avaliação no Trabalho Docente

Quadro 2. Semelhanças e Diferenças entre o Saeb e a Prova Brasil.

Aneb/Saeb Anresc/Prova Brasil

A primeira aplicação ocorreu em 1990. A prova foi criada em 2005.

É aplicado de dois em dois anos. A última edição Sua primeira edição foi em 2005 e, em 2017,
foi em 2017. Os resultados finais da edição 2017 houve nova aplicação. Também ocorre de dois em
do Saeb foram publicizados em 2018. dois.

Alunos fazem prova de Língua Portuguesa (foco Avalia as habilidades em Língua Portuguesa (foco
em leitura) e Matemática (foco na resolução de em leitura) e Matemática (foco na resolução de
problemas). problemas).

A partir de 2013 serão realizadas provas de A partir de 2013 também serão realizadas provas
Ciências (somente para o 9o ano do Ensino de Ciências (somente para o 9o ano do Ensino
Fundamental e 3o ano do Ensino Médio). Fundamental).

Avalia estudantes de 5o e 9o anos do ensino


Avalia apenas estudantes de ensino fundamental,
fundamental e também estudantes do 3o ano do
de 5o e 9o anos.
ensino médio.

Avalia alunos da rede pública e da rede privada, A Prova Brasil avalia as escolas públicas
de escolas localizadas nas áreas urbana e rural. localizadas em área urbana e rural.

A avaliação é censitária: todos os estudantes das


A avaliação é amostral, ou seja, apenas parte
séries avaliadas, de todas as escolas públicas
dos estudantes brasileiros das séries avaliadas
urbanas e rurais do Brasil, com mais de 20 alunos
participa da prova.
na série, devem fazer a prova.

Por ser censitária, expande o alcance dos


Por ser amostral, oferece resultados de resultados oferecidos pelo Saeb. Como resultado,
desempenho apenas para o Brasil, regiões e fornece as médias de desempenho para o Brasil,
unidades da Federação. regiões e unidades da Federação, para cada um
dos municípios e escolas participantes.

Todos os alunos do Saeb e da Prova Brasil Parte das escolas que participarem da Prova
Brasil ajudará a construir também os resultados
fazem uma única avaliação. do Saeb, por meio de recorte amostral.

Oportuniza informações sistemáticas sobre


As informações produzidas pela Aneb fornecerão as unidades escolares e contribui para o
subsídios para a formulação de políticas públicas desenvolvimento, em todos os níveis educativos,
educacionais, com vistas à melhoria da qualidade de uma cultura avaliativa que estimule a
da educação. melhoria dos padrões de qualidade e equidade
da educação brasileira.

Fonte: http://provabrasil.inep.gov.br/semelhancas-e-diferencas. Acesso em: 27/11/2018.

Pesquisas de avaliação nas áreas sociais, como é o caso da educação, apontam para a
importância de construir indicadores e instrumentos capazes de captar a riqueza das
ações que acontecem nos programas. Com a expansão da avaliação de desempenho
do sistema educacional, com a Prova Brasil sendo integrada ao Saeb, avançou-se na
construção de um indicador – o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb),
a partir de 2005 (MINAYO, 2003).

74
A Avaliação no Trabalho Docente • CAPÍTULO 5

Figura 11. Evolução do Ideb.

Fonte: https://www.icapui.ce.gov.br/informa.php?id=398. Acesso em: 25/7/2019.

O Ideb integra o fluxo escolar e as médias de desempenho nas avaliações nacionais.


Possui como missão monitorar o sistema nacional de ensino e estabelecer metas bienais
de qualidade a serem atingidas pelo País, escolas, municípios e unidades da Federação. A
meta projetada pelo Ideb foi a progressão da média nacional 3,8, registrada em 2005, na
primeira fase do ensino fundamental, para um Ideb igual a 6,0 (seis) em 2022.

Apresentado em uma escala de zero a dez, sintetiza aprovação e média de desempenho


dos estudantes em língua portuguesa e matemática. O Ideb tem como finalidade a
mobilização da população em prol da educação e a correção do sistema educacional
em duas dimensões:

a. se os alunos concluintes de cada etapa escolar atingem elevadas pontuações tendo,


nessa trajetória, sucessivas reprovações, o fator fluxo será alterado;

b. se os alunos concluintes não apresentarem sucessivas reprovações, mas não


atingirem resultados satisfatórios, há, igualmente, a necessidade de melhoria do
sistema.

A preocupação com os resultados dos processos de ensino está presente atualmente nas
administrações públicas da educação e nas escolas. As avaliações de sistemas levantam
um número considerável de informações que devem ter seus usos planejados na etapa
de planejamento de modo que se decida, sobretudo, para quem e de que modo serão
disseminados tais dados.

75
CAPÍTULO 5 • A Avaliação no Trabalho Docente

As propostas de avaliação devem ser reflexo da realidade educacional e possibilitar o


autoconhecimento do sistema e o conhecimento deste pela comunidade social. Ou seja,
diante do contexto diversificado das redes públicas de ensino, a escola precisa afirmar
positivamente sua função de disseminar o conhecimento e propor novas práticas que
sejam sistemáticas e sustentáveis.

Desafios da avaliação na prática escolar


Figura 12. Avaliação da aprendizagem.

Fonte: http://www.multirio.rj.gov.br/index.php/leia/reportagens-artigos/reportagens/13257-avalia%C3%A7%C3%A3o-
para-inclus%C3%A3o-e-o-erro-como-parte-da-constru%C3%A7%C3%A3o-do-conhecimento. Acesso em: 24/9/2019.

Provocação

Considerando que os animais representados na Figura 12 formam o corpo de alunos de uma mesma sala de aula, e
as diferentes espécies representam diferentes origens culturais, é possível dizer que o método de avaliação escolhido
pelo professor da charge é justo?

O ato de avaliar está presente em todos os momentos da vida humana. A todo momento
as pessoas são obrigadas a tomar decisões que, na maioria das vezes, são definidas a
partir de julgamentos provisórios, assumidos como verdades.

O sistema escolar impõe que a avaliação, em seu sentido burocrático, resulte em um


veredicto apresentado sob a forma de nota ou conceito.

76
A Avaliação no Trabalho Docente • CAPÍTULO 5

A prática da avaliação em nossas escolas tem sido criticada sobretudo por reduzir à sua
função de controle, mediante a qual se faz uma classificação quantitativa dos alunos relativa
às notas que obtiveram nas provas.

Para refletir

A avaliação está se tornando o centro da aula, em torno do qual tudo gira. Só que em vez de centralizar a ação
nos processos de produção de conhecimento, de ensino-aprendizagem que envolvem as pesquisas e as relações
professor-aluno, tudo é voltado para a avaliação.

Os professores, em geral, utilizam, durante a maior parte do tempo, a avaliação como sistema de controle da
disciplina, das tarefas e de tudo o que acontece. No cotidiano da escola você já escutou alguma dessas colocações
ameaçadoras, tipo:

“Olha lá, logo vamos fazer uma prova”;

“Se vocês brincarem, a prova vai ser mais difícil”;

“Eu vou fazer uma prova-relâmpago”;

“Cuidado com a sua nota”;

“Vou tirar dois pontos” etc.

O tempo todo a avaliação domina o cenário da sala de aula. Não é mesmo?

Diante deste cenário, Libâneo (2013) destaca alguns equívocos que têm-se verificado na
prática escolar em relação aos objetivos, funções e papel da avaliação na melhoria das
atividades educativas.

» Equívoco 1: Tomar a avaliação unicamente como o ato de aplicar provas, atribuir


notas e classificar os alunos. O professor reduz a avaliação à cobrança daquilo que
o aluno memorizou e usa a nota somente como instrumento de controle.

» Equívoco 2: Utilizar a avaliação como recompensa aos “bons” alunos e punição aos
desinteressados ou indisciplinados.

» Equívoco 3: Os professores dispensam verificações parciais no decorrer das aulas,


por confiarem demais em seu “olho clínico”.

» Equívoco 4: Professores que rejeitam as medidas quantitativas de aprendizagem


em favor de dados qualitativos. Consideram que as provas de escolaridade são
prejudiciais ao desenvolvimento dos alunos.

» Equívoco 5: A prática da avaliação da aprendizagem no sistema de ensino


brasileiro indica que ela está direcionada por uma pedagogia do exame. Todas
as atividades dos professores e alunos estão voltadas ao treinamento de resolver
provas, tendo em vista o vestibular, o ingresso ao ensino superior.

77
CAPÍTULO 5 • A Avaliação no Trabalho Docente

Saiba mais

Entre os autores nacionais, o professor Cipriano Carlos Luckesi, vem tratando desse tema acerca da pedagogia do
exame. Em substituição à pedagogia do ensino-aprendizagem, da produção do conhecimento, encontramos, hoje,
nas escolas brasileiras, a pedagogia do exame. Esse tema originalmente foi tratado pelo professor Ángel Diaz Barriga
(1990) em seu livro Currículo e Avaliação Escolar. Este autor mostra essas inversões e como a avaliação passou a ser
o centro controlador, transformando-se em instrumento de poder do professor.

A pedagogia do exame (provas, testes, ritual da avaliação) tem-se caracterizado como uma
prática centrada numa devolução de informações. Está intimamente ligada à corrente
neoliberal de Educação entendida como transmissora do conhecimento e suas consequências
atingem todos os envolvidos no processo educacional.

A prática educativa tem se pautado nos resultados e nas metas para alcançá-los, fazendo
com que a escola perca a sua essência formadora para torná-la um ambiente corporativo
em que o resultado maior é a aprovação do aluno.

Segundo Hoffmann (2009), os professores dizem perseguir uma escola de qualidade, sendo
exigentes na avaliação; no entanto, contribuem sobremaneira para o afastamento de
milhares de crianças e jovens da escola e da universidade através do fator de reprovação
continuada.

As exigências avaliativas, desprovidas muitas vezes de significado quanto ao


desenvolvimento efetivo das crianças e dos jovens, favorecem a manutenção de uma
escola autoritária.

Devemos buscar enunciar uma necessária investigação no que diz respeito ao


significado da avaliação enquanto relação dialógica na construção do conhecimento,
privilegiando a feição de mediação sobre a de informação na avaliação do aluno e
buscando a compreensão da prática avaliativa dos professores.

Provocação

Após o estudo deste capítulo sobre avaliação escolar, como deve ser encarada a recuperação dos alunos?

78
A Avaliação no Trabalho Docente • CAPÍTULO 5

Sintetizando

Vimos até agora que:

» O campo conceitual da avaliação é constituído historicamente e, como tal, se transforma de acordo com os
movimentos e mudanças sociais.

» A avaliação é uma tarefa didática necessária e permanente do trabalho docente, que deve acompanhar passo a
passo o processo de ensino e aprendizagem.

» Existem três funções de avaliação que foram categorizadas por Libâneo (2013): pedagógico-didática, de diagnóstico
e de controle.

» O Governo passou a construir instrumentos de monitoramento e avaliação de seus investimentos e, as avaliações


em larga escala ganham importância estratégica com a implantação do Saeb.

» A prática da avaliação da aprendizagem no sistema de ensino brasileiro indica que ela está direcionada por uma
pedagogia do exame.

» Trabalhar com avaliação é importante, no sentido de que a entendamos vinculada a uma prática educacional
necessária para que se saiba como se está, enquanto aluno, professor e conjunto da escola.

79
CAPÍTULO
A DIDÁTICA EM MEIO A
TEMPOS E POSSIBILIDADES DE
RESSIGNIFICAÇÃO DA ESCOLA 6
Introdução do Capítulo

Muitas são as discussões atuais sobre o sentido da escolarização, os desafios que


enfrentam os sistemas de ensino, a problemática cotidiana da educação escolar,
particularmente o Ensino Fundamental e Médio. Uma pluralidade de questões atravessa
hoje a dinâmica escolar: universalização da escolarização, qualidade da educação,
projetos político-pedagógicos, função social da escola, formação e condições de
trabalho de professores etc.

Partindo do reconhecimento da significativa produção do campo, nos últimos anos


emergem buscas para reconfiguração da Didática, no sentido de construir abordagens
e perspectivas que ofereçam elementos para se enfrentar os desafios atuais da educação
escolar.

Nossa intenção é discutir algumas ideias a respeito do fenômeno educacional em nossa


sociedade, hoje. Em um primeiro momento, vamos analisar as razões pelas quais a
escola, como uma organização, tem sido considerada, nos últimos anos, objeto especial
de atenção por pesquisadores de diferentes áreas de atuação. E embora encontremos
estudos diversificados sobre a escola, procuramos evidenciar que esta instituição, por
vezes, se depara em meio a contextos de crise e contradições e, ao mesmo tempo, com
crenças que depositam uma fé renovada na redenção dos males atuais e superação de
obstáculos estruturais, por meio do sistema educacional.

Por fim, retomamos aspectos relevantes na tentativa de refletir a respeito da função


social da escola e procurando pistas no campo da Didática Intercultural que auxiliem na
ressignificação dos processos de ensino e aprendizagem, como estratégias de superação
da crise e da hegemonia da forma escolar.

80
A Didática em Meio a Tempos e Possibilidades de Ressignificação da Escola • CAPÍTULO 6

Objetivos

» Refletir sobre a função social da escola.

» Compreender a organização escolar como objeto (complexo) de investigação.

» Analisar a “crise mundial da educação”.

» Problematizar a Didática Intercultural Crítica.

O valor social da educação

A e d u c a ç ã o, s o b a s s u a s d i ve r s a s f o r m a s e m o d a l i d a d e s, t e m p o r m i s s ã o o
desenvolvimento do ser humano na sua dimensão social. Define-se como veículo
de culturas e de valores, como construção de um espaço de socialização, e como
caminho de preparação de um projeto comum.

Hoje, os diferentes modos de socialização escolar estão sujeitos a críticas e contestações,


em sociedades ameaçadas pela desorganização e a ruptura dos laços sociais. Os
sistemas educativos encontram-se, assim, submetidos a um conjunto diversificado de
tensões, tendo de respeitar a diversidade dos indivíduos, e ao mesmo tempo, manter
o princípio da homogeneidade que implica a necessidade de observar regras comuns.
Diante deste quadro, a educação se depara com desafios e contradições: por um lado,
é colocada na origem do agravamento de muitas exclusões sociais, mas por outro, é
a ela que se faz apelo, sendo colocada no centro da agenda política com argumentos
quase homogêneos e unânimes que destacam sua relevância na sociedade moderna.

Os sistemas educativos formais costumam ser colocados em questão, vistos como


espaços limitadores à realização pessoal, impondo aos estudantes o mesmo currículo, o
mesmo modelo cultural e intelectual, sem levar em conta as habilidades e experiências
individuais dos alunos. De acordo com as suas aptidões e os seus gostos pessoais, nem
todos conseguem retirar as mesmas vantagens dos recursos educativos comuns.

Conforme Bourdon et al. (2007), ao tomar como objeto de investigação jovens em situação
desfavorecida, estigmatizados por sua posição social na periferia de Salvador/Bahia, o
tema da educação não formal é colocado em evidência pelos autores. A pesquisa procurou
analisar os efeitos da passagem dos jovens por processos educativos alternativos sobre
suas trajetórias sociais. Foram analisadas as representações de jovens – que passaram
por oficinas de teatro ou de eletricidade, promovidas por uma associação de moradores –
tanto sobre a educação formal como sobre aquela que foi definida pelos autores como não
formal. Em um quadro de presença escassa do Estado, a educação não formal apareceu

81
CAPÍTULO 6 • A Didática em Meio a Tempos e Possibilidades de Ressignificação da Escola

como alternativa atraente e como possibilidade de aprendizado prazeroso, contrastando


marcadamente com a experiência na escola formal.

Assim, nossa intenção é discutir algumas ideias a respeito do fenômeno educacional em


nossa sociedade, hoje. Em um primeiro momento, vamos analisar as razões pelas quais a
escola, como uma organização, tem sido considerada, nos últimos anos, objeto especial
de atenção por pesquisadores de diferentes áreas de atuação. E embora encontremos
estudos diversificados sobre a escola, procuramos evidenciar que esta instituição, por
vezes, se depara em meio a contextos de crise e contradições e, ao mesmo tempo, com
crenças que depositam uma fé renovada na redenção dos males atuais e superação de
obstáculos estruturais, por meio do sistema educacional. Por fim, retomamos alguns
aspectos relevantes na tentativa de refletir a respeito da função social da escola e
procurando pistas no campo da Didática que auxiliem na ressignificação dos processos
de ensino e aprendizagem, como estratégias de superação da crise e da hegemonia da
forma escolar.

A forma escolar está sendo aqui entendida do modo como a escola atual concebe os
processos de aprender e ensinar.

É fato que tais reflexões não foram construídas sobre pesquisa empírica, porém devem ser
consideradas como um processo de diálogo a respeito de um tema importante para quem
está envolvido e disposto a pensar a educação e, de forma mais específica, a Didática no
Brasil.

A organização escolar como objeto (complexo) de


investigação
Figura 13. Organização escolar.

Fonte: https://novosalunos.com.br/. Acesso em: 27/7/2019.

82
A Didática em Meio a Tempos e Possibilidades de Ressignificação da Escola • CAPÍTULO 6

Uma revisão bibliográfica no campo educacional sobre os significados e funções


atribuídos à escola pública no Brasil não teria dificuldade em apontar a variedade de
nomes e adjetivos a ela atribuída. Conforme Gabriel (2011),

[...] muito já foi dito sobre e para ela, contra ou a favor dela. A produção
acadêmica do campo vem acumulando estudos e pesquisas sobre essa
instituição social a partir de diferentes enfoques e perspectivas teóricas.
Estudos provenientes de diversas áreas do conhecimento produzem
sentidos e verdades sobre os processos de ensino-aprendizagem, viram
ao avesso esta instituição, vasculhando suas contradições internas e
externas; predizem soluções, preconizam sua destruição ou reinvenção,
denunciam seu papel reprodutor; aclamam seu potencial transformador.
Nesses discursos, ora ela é significada como uma instituição falida, ora
como salvadora. Esses inúmeros nomes e adjetivos que atribuímos à escola
são indícios dos diferentes discursos que disputam, na fronteira, o sentido
de escola e de currículo. Muito já foi dito, mas sabemos que esse muito é
também um não-tudo. Afinal os fechamentos de sentidos (de currículo e
escola) são sempre contingenciais e precários, deixando margem para se
dizer mais; um suplemento, deslocar na fronteira e participar dos processos
de significação que definem escola pública em nosso país.

Os estudos sobre as instituições escolares possuem uma trajetória histórica que


problematizam os embates teóricos e metodológicos presentes neste tipo de investigação.
A partir da década de 1950, estudos acerca dos estabelecimentos de ensino estiveram
marcados por indagações sobre a relação entre oportunidades escolares e a origem
social dos alunos, onde era necessário não apenas evidenciar, mas desenvolver análises
e explicar a existência de mecanismos de exclusão e seletividade que operavam no
interior de um sistema educacional de feição democrática, com pretensões de oferecer
oportunidades iguais a todos ( TURA, 2003).

Estudos na área da Sociologia dos estabelecimentos escolares começaram também a


ser produzidos na tentativa de responder, dentre outras questões, à pergunta sobre a
importância dos estabelecimentos de ensino nos processos escolares e na aprendizagem
dos alunos. Produzido em meados da década de 1960 – a partir de um survey com diversos
alunos norte-americanos – os dados do relatório Coleman procuraram demonstrar
que a organização escolar teria um efeito pequeno ou quase nulo sobre o desempenho
acadêmico de seus alunos. A análise dos dados evidenciou que a variação observada
na proficiência dos alunos se encontraria explicada pela origem social e étnica dos
educandos e não dentro da escola (GAME, 2002). Ou seja, as análises desenvolvidas em
nível macro, possibilitadas por grandes levantamentos estatísticos (survey), buscavam
explicações sociológicas em práticas educativas familiares, em componentes culturais,
expectativas docentes etc. Havia a necessidade de se aprofundar o entendimento das

83
CAPÍTULO 6 • A Didática em Meio a Tempos e Possibilidades de Ressignificação da Escola

relações entre as desigualdades na sociedade e os processos de ensino-aprendizagem


que ocorriam no interior das escolas entre alunos de diferentes origens socioculturais.

Com isso, de acordo com Tura (2003), a multiplicidade de fatores envolvidos nessa
análise da ação educativa foi levando, progressivamente, os pesquisadores a se
aproximarem dos ambientes escolares, do espaço de interação entre os alunos e
professores, das condições concretas de realização do ensinar e do aprender.

A escola permanecia como uma “caixa preta”, pois os trabalhos internos das escolas, os
processos de ensino-aprendizagem que levavam aos resultados dos alunos e a organização
de suas estruturas eram menosprezados, enquanto os recursos escolares (materiais,
financeiros e recursos humanos) eram superestimados (GAME, 2002).

Saiba mais

Este termo caixa preta, amplamente divulgado na literatura pedagógica, é derivado da obscuridade em que por
muito tempo ficaram os procedimentos específicos das escolas sobre a trajetória escolar dos educandos, e suas
consequências sobre o seu desempenho. Por outro, este interesse cada vez maior pelo estudo da “caixa-preta” pode
ser atribuído à evolução da pesquisa em educação (BRANDÃO, 1989). Podemos perceber que, a partir dos anos de
1980 – em decorrência da entrada na pós-graduação de um número não desprezível de professores e técnicos de
ensino ligados, por formação e atuação, à educação básica e, em menor quantidade, ao ensino superior – foi dada
ênfase maior nas pesquisas de natureza estritamente pedagógica. Interessados em compreender a escola, ao que
tudo indica, esses pesquisadores voltaram-se, sobretudo, para a investigação de aspectos pedagógicos, revelando
forte interesse no processo de aprendizagem.

Ainda na década de 1960, de acordo com Nogueira e Nogueira (2002a), a sociologia


da educação evidenciou o papel de reprodução das desigualdades sociais que os
sistemas escolares desempenham: os estudos de Bourdieu e Passeron, de 1964 e 1967,
produziram um olhar negativo diante dos sistemas de ensino ao apontar para uma
análise sobre a reprodução e legitimação das desigualdades. Nas décadas anteriores,
um otimismo foi percebido através da ideia de que, com a passagem de uma escola
elitista para uma escola de massas, a escolarização estaria ligada a três promessas:
desenvolvimento, mobilidade social e igualdade (CANÁRIO, 2006). Houve uma mudança
no que concerne à crença no papel da escola em promover ascensão social.

No entanto, a partir dos anos 1970 e 1980, essa abordagem pessimista seria questionada e
colocada em debate. Começaram a surgir estudos qualitativos voltados para a compreensão
dos processos internos ocorridos nas escolas, na tentativa de desvendar a “caixa-preta”
das instituições escolares. Como exemplo, podemos direcionar nossa atenção para as
recentes discussões sobre o assim chamado efeito-escola, as quais chamam atenção para
o valor e a capacidade da instituição em alterar previsões acerca da trajetória escolar

84
A Didática em Meio a Tempos e Possibilidades de Ressignificação da Escola • CAPÍTULO 6

e, presumivelmente, social de sua clientela; enfatizando que as escolas podem, sim,


exercer influência sobre o aprendizado dos alunos, e não apenas atuar na legitimação
das desigualdades sociais. Para além do ambiente familiar e cultural, um conjunto de
fatores escolares (clima escolar) pode influenciar nas expectativas e no rendimento dos
alunos, de alguma forma compensando fatores sociais externos à escola. Dessa forma,
uma das mais importantes conjeturas é a possível relação existente entre o clima escolar
e o rendimento dos alunos, incluindo o desenvolvimento cognitivo e afetivo; suposição
que justifica a realização de estudos com o objetivo de gerar maior entendimento sobre
a efetividade escolar, o desenvolvimento e a aprendizagem do alunado.

A “crise da escola”: mobilidade social, esperança e


desencanto

Embora possamos nos deparar com estudos diversificados sobre a temática “escola”, nos
quais esta instituição é vislumbrada e tomada em um espaço rodeado por esperanças,
expectativas e melhoria das condições sociais, esse otimismo percebido através do papel
central da escolarização na sociedade, por vezes, se encontra em meio a contextos de
crise e de contestações.

Podemos visualizar de forma bastante clara o valor crescente que a credencial escolar
– e alguns conhecimentos e habilidades adquiridos na escola – desfruta no mundo
contemporâneo, e por outro lado, também percebemos que as crianças e os jovens vêm
tendo acesso a múltiplas referências culturais, o que implica dizer que a instituição
escolar, sozinha, não abarca as possibilidades de socialização dos jovens, ainda que ela seja
importante para a análise das condições e situações juvenis, assim como determinados
autores (CANÁRIO, 2006; RÉGNIER, 2007; BOURDON et al., 2007) apontam para o fato de
que a escola estaria perdendo valor e sentido em meio a alguns segmentos da sociedade.

Não seria uma “crise” sobre o acesso à escola, mas relacionada a um suposto benefício
que ela proporcionaria: a mobilidade social. A escolaridade vai adquirindo valor cada
vez maior em nossa sociedade, à medida que se ampliam as aspirações por mobilidade
social, posto que ela é reconhecida como mecanismo crescentemente influente na
distribuição das oportunidades sociais e profissionais.

[...] a ocorrência de uma forte mobilidade estrutural é uma marca quase


constante de virtualmente todas as sociedades que se modernizam. Com
ela, os sonhos de uma vida melhor, a busca dos eldorados, a sensação
de um futuro aberto, se revigoram. Assim como, na era moderna, a
capacidade dos indivíduos se deslocarem física e socialmente (ao menos
em pensamento) se multiplica, suas aspirações por mudança e mobilidade
social se ampliam (SCALON, 1999).

85
CAPÍTULO 6 • A Didática em Meio a Tempos e Possibilidades de Ressignificação da Escola

De forma imediata e objetiva, Canário (2006) afirma que é necessário fazer uma reflexão
sobre a “crise mundial da educação”, e de forma mais específica refletir sobre a “crise
da escola”. Em sua obra, o objetivo é desenvolver uma análise sobre a natureza dessa
“crise” e procurar enunciar pistas para a sua possível superação.

A ideia principal defendida por Canário é a de que se torna incipiente que haja uma
reinvenção da escola e do ofício de professor e, para que essa “crise” seja transposta,
deve-se ser feito, em um primeiro momento, um questionamento crítico, e em seguida,
a superação da forma escolar, ou seja, superar o modo como a escola atual concebe os
processos de aprender e ensinar.

Fundamentalmente, a “crise da escola” – ou também podemos chamar esse momento de


um certo mal-estar difuso – se intensifica a partir do final dos anos de 1960 e corresponde
a um déficit de legimitimidade (que se elevou após a massificação da educação, em que
as promessas e expectativas sociais criadas pela escola passaram a não ser atendidas
por ela) e de sentido (perda de sentido, por parte de alunos e professores, para o
trabalho que realizam) (CANÁRIO, 2006, p. 20), proveniente das mutações sofridas pela
escola ao longo do século XX. Essas mutações e a crise da instituição escolar podem ser
caracterizadas por três fatores:

a hegemonia da forma escolar – a invenção da escola instituiu um espaço e tempo


distintos, destinado às aprendizagens, e que, por vezes, a escola é vista como um modelo
baseado na ruptura com a experiência não escolar dos alunos.

» a naturalização da organização escolar – tal modalidade de organização


revela-se uniforme e estável, tendo como base uma compartimentação
e s t a n d a rd i z a d a d o s t e m p o s d e a u l a , d o s e s p a ç o s ( s a l a s d e a u l a ) , d o
agrupamento dos alunos (turmas) e dos saberes (disciplinas).

» as mudanças sofridas pela escola podem ser sintetizadas dentro de um contexto


de certezas (primeira metade do século XX) para um contexto de promessas
(pós Segunda Guerra Mundial): promessa de maior igualdade, justiça social,
mobilidade, desenvolvimento etc.; situando-se, hoje, em um contexto de
incertezas: marcado por desigualdades, desemprego estrutural, desvalorização
dos diplomas escolares etc.

As mutações sofridas permitem dar conta do percurso acelerado e contraditório


pelo qual a instituição escolar vem se deparando e enfrentando ao longo das últimas
décadas.

86
A Didática em Meio a Tempos e Possibilidades de Ressignificação da Escola • CAPÍTULO 6

Sugestão de estudo

Figura 14. Documentário “Pro dia nascer feliz”.

Fonte: https://www.livrariacultura.com.br/p/filmes/filmes/documentario/pro-dia-nascer-feliz-11016103. Acesso


27/7/2019.

O belíssimo documentário de João Jardim, Pro dia nascer feliz, realizado entre 2004 e 2005, é um dos raros filmes que
retratam com delicadeza e sensibilidade a cruel realidade da vida de adolescentes na escola. João Jardim descreve o
cotidiano de jovens em quatro escolas brasileiras. Em Pernambuco, São Paulo, Duque de Caxias/RJ e no Rio de Janeiro,
todas elas são públicas.

Há, ainda, u importante documentário sobre o qual podemos nos debruçar e refletir sobre questões que
envolvem ideias de equidade, de justiça e da missão das escolas. Disponível em: https://www.youtube.com/
watch?v=74jokEl7RQ4.

Como tentativa de superar essa crise de legitimidade da escola passa-se, primeiro, por
recriar um novo sentido para o trabalho e para a vida escolares, e, em seguida, estimular o
gosto pelo ato intelectual de aprender. Este novo sentido perpassa também pela superação
da crise de identidade profissional dos professores (mal-estar docente), gerada pelo
desencanto em relação à escola, pela escolarização massiva, emergência de novas formas
de regulação, da “invasão” da escola por problemas sociais etc.

No centro de toda essa “crise” estão os professores, destinatários privilegiados


dos discursos que os responsabilizam pelos fracassos do projeto de escolarização
massiva/generalizada. Diante desta “crise”, o professor passa a se deparar e, cada
vez mais, precisa ser capaz de lidar com a incerteza e romper com uma concepção
solitária do exercício do trabalho docente.

Canário (2006) destaca que a educação não escolar deve ser valorizada e se constituir
como ponto de referência para se atribuir sentido ao trabalho educativo, e também se
pensar e superar a hegemonia da forma escolar.

87
CAPÍTULO 6 • A Didática em Meio a Tempos e Possibilidades de Ressignificação da Escola

Para a compreensão dessa crise, a educação deve ser problematizada a partir do


aprender, em vez do ensinar; transformando os alunos em produtores de saberes,
sujeitos da aprendizagem, ultrapassando a mera condição de receptores de informação.
A educação escolar de hoje é obsoleta, porém pode vislumbrar um futuro em que
a aprendizagem (baseada na descoberta) e o processo de formação precisam ser
encarados como um processo de autoconstrução da pessoa ao longo da vida (educação
permanente) e devem ser vistos a partir da combinação de três atividades: autoformação
(nós), com atividades de heteroformação (os outros) e atividades de ecoformação (o
contexto).

Frente aos fatores geradores de insatisfação perante o funcionamento dos sistemas


escolares, chama atenção a rejeição da escola por parte de grandes grupos de alunos
para quem ela faz cada vez menos sentido. Esta insatisfação abrange modalidades
diversas de desmotivação, como absenteísmo, abandono escolar precoce, fenômenos
de contestação (violência, indisciplina), formas de recusa de aprender (iliteracia), em
suma, o refugo dos alunos em posturas de caráter marcadamente defensivo configuram
a construção de meras estratégias de sobrevivência na escola.

A partir dos anos finais da década de 1960, o mundo da educação escolar passou a ser
dominado pela problemática da inovação que deveria ser colocada em pauta na formação
de professores. Canário (2006) revela que esta inovação é importante e necessária,
em conformidade que aponte para modelos que possam consolidar uma cultura de
formação profissional permanente de professores (ação integrada entre formação inicial
e continuada). O objetivo seria formar solucionadores de problemas dentro deste quadro
de “crise”, de incertezas e imprevisibilidade, que seja capaz de ser sujeito de sua própria
aprendizagem, aprendizagem esta baseada da abstração (e não na memorização), na
experimentação (e não na aplicação), em uma visão sistêmica (que permita abarcar
fenômenos complexos) e no trabalho em equipe/colaborativo (e não na competitividade
individual; que não favoreça a permanência de uma “cultura insular”).

Canário (2006) concede-nos uma boa crítica quanto ao papel do departamento de


educação – órgãos responsáveis por fazer a gestão da formação em escolas – mais
precisamente com relação à formação continuada de professores, que seria uma área
de formação particularmente sem sentido estratégico, organizada para atender a efeitos
imediatos e que pensam a formação em termos de conhecimentos a transmitir, ao
invés de pensar com relação aos problemas a resolver e dentro de uma perspectiva de
planejamento plurianual, de longa duração.

Ao passo que as reformas educacionais propostas também são criticadas pelo autor
por se tratar de metodologias verticais e autoritárias, de mudanças impostas à periferia

88
A Didática em Meio a Tempos e Possibilidades de Ressignificação da Escola • CAPÍTULO 6

(aos docentes) de natureza tecnológica, importadas do mundo industrial, nas quais


o centro (ou seja, a administração) apenas exporta soluções de caráter paliativo.

Uma nova epistemologia do conhecimento produzido na


escola (centrada na aprendizagem)
Figura 15. Ensino-aprendizagem.

Fonte: https://educacional.cpb.com.br/conteudos/universo-educacao/o-impacto-da-comunicacao-no-processo-ensino-
aprendizagem/. Acesso em: 28/7/2019.

Ainda com relação à prática profissional e à tentativa de superação das incertezas


da formação profissional de professores, Canário (2006) ressalta a importância de
vislumbrar a perspectiva de que essa formação seja ancorada em uma “formação
centrada na escola”: deve ser baseada na formação de competências profissionais.

Para superar essa dificuldade/incerteza, o autor sugere que sejam consideradas duas
ordens de competências distintas. A primeira corresponde a competências de natureza
escolar, produzidas no contexto da formação. A segunda corresponde a competências
de natureza profissional que são produzidas no contexto do exercício profissional.

Atenção

A “formação centrada na escola” tem como finalidade principal resolver problemas e promover, de forma simultânea,
o desenvolvimento profissional dos docentes e o desenvolvimento organizacional das escolas. Essa formação
somente será construída e materializada a partir da criação e funcionamento de equipes que trabalham na
concretização de um projeto educativo. As formações de professores clássicas costumam ser dirigidas à capacitação
individual para ocupar o “posto de trabalho”, e a “formação centrada na escola” propicia uma dimensão coletiva que
permite aos indivíduos aprenderem por meio da organização como pela possibilidade de as próprias organizações
(escolares) “aprenderem” (CANÁRIO, 2006, p. 73).

89
CAPÍTULO 6 • A Didática em Meio a Tempos e Possibilidades de Ressignificação da Escola

A relevância apontada por Canário (2006) à aproximação do professor (na formação


inicial) junto ao seu futuro contexto profissional (a escola) exprime também uma
maneira de se pensar a elaboração de políticas educativas locais, mobilizando recursos
endógenos que possam recontextualizar a ação educativa.

Para superar a forma escolar, trata-se de pensar em uma nova inserção espacial da
escola, problematizando a relação da escola com o seu contexto local: “territorialização”
educativa. Através da integração e participação local (da estreita cooperação entre as
instituições de ensino e demais entidades que, mesmo não sendo escolares, assumem
responsabilidades educativas) e ao adotar o ponto de vista de quem está no terreno
(escolar), sem aceitar a exportação de soluções prontas oriundas das administrações
em nível central, a escola conseguirá passar por mudanças qualitativas.

Posicionamento do autor

O conceito de territorialização educativa aparece muito ligado à ideia de descentralização, interpretada como um
aumento da autonomia das escolas e dos seus agentes. Para que essa autonomia realmente venha se concretizar
existe a necessidade de ocorrer uma articulação da escola com os contextos social e cultural que a envolvem, pois é
assim que os alunos conseguirão relacionar a sua experiência escolar com as suas experiências de vida, construindo
um sentido para sua aprendizagem.

Para romper com a hegemonia da forma escolar, é preciso superar a visão de senso
comum que visualiza a escola como um fato “natural”, que sempre existiu/existirá.
Ela é uma instituição histórica recente que decorre da ação humana e deve ser
encarada como um fato social, afirmando, de forma hegemônica, um novo modelo
de socialização, assim como um espaço e um tempo destinados a aprender. Para
isso, Canário (2006.) se propõe a uma tentativa de traçar uma síntese do caminho
percorrido desde a invenção histórica da escola (no início da modernidade – final
do século XVIII) até os nossos dias, onde a escola foi fortemente influenciada pelos
ideais das revoluções industrial e liberal, chegando a um contexto atual sombrio,
no qual passamos por uma crise do pensamento sobre a escola, instituição marcada
como sendo um território de incertezas.

Com a emergência de uma sociedade industrial, a oferta educativa, na década de 1960,


passa a ser vista como requisito ao desenvolvimento da nação, onde o modelo escolar
ampliado às massas termina por não conseguir corresponder às promessas de maior
igualdade, mobilidade social e bem-estar generalizado. A escola começa a viver um
processo sombrio que vai da euforia ao desencanto: acompanhado também de um
processo de perda de sentido para o trabalho pedagógico desenvolvido no interior
dessa instituição.

90
A Didática em Meio a Tempos e Possibilidades de Ressignificação da Escola • CAPÍTULO 6

No início da década de 1970, críticas ao monopólio educativo criado pela escola


são vislumbradas, com o objetivo de tornar perceptível, a partir do surgimento do
movimento de educação permanente, outra diversidade de modalidades educativas
difusas, distintas do modelo escolar (educação formal), em que as pessoas são, ao
mesmo tempo, objeto-sujeito-agente de socialização: a descoberta da educação não
escolar (educação não formal – caracterizada pela flexibilidade de horários, programas
e locais, que possui por base o voluntariado e principal foco de desenvolvimento
do campo da formação de adultos); da educação informal (são situações educativas
pouco organizadas e estruturadas nas quais não se verifica a existência de uma
intencionalidade por parte dos intervenientes, sendo aquela que mais se distancia do
modelo escolar formal); e a valorização da aprendizagem experiencial (a emergência da
pessoa como sujeito da sua própria formação, apropriando-se de influências externas
que são exercidas sobre si, deslocando o enfoque do ensinar para o aprender, em que
o patrimônio experiencial de cada um representa o recurso mais importante para a
realização de novas aprendizagens) são modalidades que contribuem para a reflexão
acerca da superação da hegemonia da forma escolar.

A integração dessas modalidades e situações de educação formal, não formal e informal


(fora das salas de aula) é componente que se destina ao enriquecimento deliberado do
ambiente escolar, podendo constituir-se em uma via importante para a “reinvenção”
da escola e de suas práticas.

Figura 16. Inovação.

Fonte: https://www.itaocararj.com.br/precisamos-aprender-a-manha-de-saber-reinventar-nos/. Acesso em: 30/7/2019.

Ne s t e c o n t e x t o m a rc a d o p e l a i n c e r t ez a , a c r i s e d o s s i s t e m a s e s c o l a re s e s t á
estreitamente ligada à emergência do modelo de competência como referencial da
formação, que acompanha as mutações das organizações e do mercado de trabalho.
A noção de competência é entendida como algo que não é nem um atributo pessoal
(independente do contexto), nem o resultado de um somatór io de atividades
certificadas por diplomas escolares. Conforme Canário (2006, pp. 125-126),

91
CAPÍTULO 6 • A Didática em Meio a Tempos e Possibilidades de Ressignificação da Escola

a competência surge como algo que é da ordem do saber-mobilizar,


só compreensível e suscetível de ser produzido “em ato” (LE BOTERF,
1994). [...] Esta noção de competência leva a relativizar a importância
das formações iniciais [...] e a evidenciar as potencialidades formativas
da experiência em contexto de trabalho. [...] que responsabiliza cada
indivíduo pelos seus êxitos e pelos seus fracassos.

A partir do triunfo da noção de competência, Canário (2006) aponta, do lado positivo,


que a relação deste conceito com o mundo do trabalho foi necessária para justificar a
pertinência atual do reconhecimento de experiências adquiridas e sua integração nos
sistemas de educação e de formação. No entanto, como aspecto negativo do conceito
de competência, percebemos a crítica do autor para a relativização da importância das
formações iniciais e a institucionalização de políticas e práticas de responsabilização
individual, que se desenvolvem lado a lado com processos de avaliação permanente e
com processos de gestão individual da carreira.

Posicionamento do autor

Segundo Oliveira et al. (2004), como definição de competências profissionais temos o de um conjunto de
conhecimentos, habilidades e atitudes que capacitam um profissional a desempenhar as suas tarefas de forma
satisfatória.
Do latim, competentia significa proporção, simetria. Refere-se à capacidade de compreender determinada situação e
reagir adequadamente frente a ela: relaciona-se ao saber fazer algo.
Por outro lado, Machado (2002), ao comparar os parentescos semânticos entre competência e competitividade,
relacionando-os à disputa, aprendizagem e busca pelo conhecimento, demonstra que quando se disputa algo com
alguém se chega a uma conquista: um perde e outro ganha. Mas o conhecimento não é um bem material que se gasta
ou se vende, é um “bem” que se conquista e se “disputa” junto com o outro.
Tal reflexão nos proporciona uma ampliação no significado do termo competência no sentido de se buscar junto
com. Neste ponto, Canário (2006), através da noção de competência, busca ressaltar a importância de superar
a permanência de uma “cultura insular” na escola, que potencialize o trabalho em equipe, colaborativo (e não
contemple a competitividade individual).
Para aprender e se buscar o conhecimento junto com o outro faz-se necessária uma mudança que enfatize a
importância de um desenvolvimento de competências pessoais e profissionais que se organize em torno da
exploração colaborativa.

Para que as mudanças e a reinvenção da escola sejam alcançadas, torna-se importante


o desenvolvimento de uma “formação centrada na escola” e que aproxime/relacione o
conhecimento comum com o conhecimento científico produzido no campo da educação.

A Didática na perspectiva intercultural crítica

Se a aprendizagem dos alunos não está sendo satisfatória, é necessário refletir sobre
uma série de fatores que poderia melhorar esse problema. Segundo Gabriel (2011),

92
A Didática em Meio a Tempos e Possibilidades de Ressignificação da Escola • CAPÍTULO 6

um fator primordial e de suma importância é pensar sobre o conhecimento escolar,


que merece ser discutido e analisado nos cursos de formação de professores e nos
projetos político-pedagógicos das escolas.

A despeito das múltiplas abordagens desse campo pedagógico, a Didática defendida


é a que concebe o conhecimento escolar como um instrumento muito relevante para
se promover uma educação de qualidade, privilegiando as discussões em torno do
processo de ensino-aprendizagem.

É pertinente pensar que para a educação brasileira ganhar qualidade e os alunos


realmente aprenderem é preciso envolver os estudantes em uma dinâmica de
valorização dos conhecimentos escolares mais relevantes. Toda a escola deve se
preocupar com a aprendizagem dos alunos. E os professores devem estar preparados
para um trabalho pedagógico que realmente atenda à demanda da qualidade
educacional. Daí a necessidade de uma formação de professores condizente com
toda essa proposta.

Outro fator importante é analisar o caráter multidimensional (humano, técnico e


político-social) da Didática e sua relação com o processo de ensino e aprendizagem
( C A N D AU , 1 9 9 7 ) . A c r i s e n o s e x i g e c o m p e t ê n c i a s d i v e r s a s , a s s i m c o m o a
multidimensionalidade nos leva a pensar, interagir e transformar práticas de modo
a não segregar o que é diverso.

Dessa forma, ao compreendermos a sala de aula como espaço de múltiplas narrativas, o


processo de ressignificação da Didática – concepção, conteúdo, tratamento dos diferentes
temas e estratégias – deve ser encarado a partir da perspectiva intercultural crítica no
horizonte da formação de professores.

Esta realidade reafirma a pertinência da discussão das questões de


diferença no campo da Didática: sua presença e relevância no cotidiano
escolar não costumam ser negadas – entretanto, o que fazer, a partir desse
reconhecimento, é ainda uma questão em aberto. A diferença é “difícil”, “não
agrega”, é “conflito potencial” [...], tende a ser negativizado. A Didática que
assume a perspectiva intercultural está chamada a enfrentar essa discussão
e pensar alternativas, no sentido de evidenciar e promover a produtividade
da sala de aula heterogênea, além de contribuir para a desconstrução de
mitos. (CANDAU e LEITE, 2009, p. 82).

93
CAPÍTULO 6 • A Didática em Meio a Tempos e Possibilidades de Ressignificação da Escola

Saiba mais

Tubino (2005 apud CANDAU e KOFF, 2015) distinguiu três concepções principais de educação intercultural:

» Educação Intercultural Relacional: refere-se basicamente ao contato e intercâmbio entre culturas e sujeitos
socioculturais, entre suas distintas práticas, saberes, valores e tradições. Esta concepção tende a reduzir as relações
interculturais ao âmbito das relações interpessoais e minimiza os conflitos e as relações de poder.

» Educação Intercultural Funcional: no que diz respeito à interculturalidade funcional afirma que está orientada
a diminuir as áreas de tensão e conflito entre os diversos grupos e movimentos sociais, sem afetar a estrutura e as
relações de poder vigentes.

» Educação Intercultural Crítica: colocar estas relações de poder em questão é exatamente o foco da perspectiva
da interculturalidade crítica. Trata-se de questionar as diferenças e desigualdades construídas ao longo da história
entre diferentes grupos socioculturais, étnico-raciais, de gênero, orientação sexual, entre outros.

Parte-se da afirmação de que a interculturalidade aponta à construção de sociedades que assumam as diferenças
como constitutivas da democracia e sejam capazes de construir relações novas, verdadeiramente igualitárias entre
pessoas e grupos de diferentes referentes socioculturais.

Figura 17. Interculturalidade.

Fonte: http://www.dge.mec.pt/educacao-intercultural. Acesso em: 29/7/2019.

A proposta defendida por Candau e Koff (2015) é a de que a reinvenção da escola esteja
orientada pelos princípios de uma Educação Intercultural Crítica e, consequentemente,
esses princípios devem impregnar toda a escola/processos, afetando, portanto, todas as
suas dimensões e ações. Isso significa dizer que devemos considerar fundamental:

Promover uma educação para o reconhecimento do ‘‘outro’’, para o


diálogo entre diferentes grupos sociais e culturais. Uma educação para a
negociação cultural, que enfrenta os conflitos provocados pela assimetria
de poder entre os diferentes grupos socioculturais em nossa sociedade,
e é capaz de favorecer a construção de um projeto comum, pelo qual
as diferenças são dialeticamente integradas (CANDAU, 2009, p. 59).

94
A Didática em Meio a Tempos e Possibilidades de Ressignificação da Escola • CAPÍTULO 6

Esta proposta implica, p o r t a n t o, conceber e realizar processos de


ensino-aprendizagem contextualizados, tendo presente que os contextos são
m u l t i c u l t u ra i s. Pr o c e s s o s d e e n s i n o - a p re n d i z a g e m q u e, p o r t a n t o, a f i r m a m ,
incorporam e se enriquecem com as diferenças culturais, sem negar a busca pela
igualdade de direitos. E que também buscam promover o diálogo entre as práticas
vividas na escola e as demais práticas sociais.

Segundo Candau e Koff (2015), apostar na ideia da reinvenção da escola orientada pelos
princípios de uma Educação Intercultural Crítica significa reconhecer que a escola tem
papel relevante na perspectiva da afirmação da justiça – social, cognitiva e cultural –,
assim como da construção de relações igualitárias entre os diferentes grupos socioculturais
e da democratização da sociedade, por meio de políticas que articulam os direitos da
igualdade e da diferença.

Em suma, neste capítulo foi possível perceber a abordagem de diversas ideias e, em


especial, colaborar no sentido de pensarmos a respeito da função social da escola e,
relacionado ao campo disciplinar da Didática, Canário (2006) e Candau e Koff (2015)
nos revelam novos olhares para a tentativa em superar a hegemonia da forma escolar e
pensar a aprendizagem em si.

Conforme destacado por Candau (1997), em geral, as pesquisas no âmbito educacional


e, particularmente no campo da Didática, não privilegiam as discussões em torno do
processo de ensino-aprendizagem: na maioria da vezes, o ensino e a aprendizagem
não são preocupações centrais dos pesquisadores. Questões secundárias costumam ser
mais problematizadas e colocadas em evidência, como: violência escolar, insegurança,
diferenças, cultura, novas tecnologias, formação docente etc. O caráter multidimensional
(humano, técnico e político-social) da Didática pode proporcionar que ela possa ajudar
a repensar o ensino e a prática pedagógica à luz desses novos desafios que a sociedade
apresenta à educação.

Outra contribuição contemplada neste livro é a possibilidade de compreensão de que as


mudanças culturais e tecnológicas da sociedade do conhecimento e os novos desafios
da organização do trabalho obrigam não apenas a pensar sobre uma nova função e um
novo papel para as formações (inicial e continuada) de professores, mas, também, novos
modos de organização e distribuições dos recursos formativos que possam satisfazer
as necessidades de um sistema escolar de massa e possa atribuir significativamente
sentido ao trabalho educacional.

95
CAPÍTULO 6 • A Didática em Meio a Tempos e Possibilidades de Ressignificação da Escola

Sintetizando

Vimos até agora que:

» Os sistemas educativos encontram-se submetidos a um conjunto diversificado de tensões, tendo de respeitar a


diversidade dos indivíduos, e ao mesmo tempo, manter o princípio da homogeneidade.

» Até a década de 1980, a escola permanecia como uma “caixa preta”, pois os trabalhos internos das escolas, os
processos de ensino-aprendizagem que levavam aos resultados dos alunos e a organização de suas estruturas eram
menosprezados.

» É necessário fazer uma reflexão sobre a “crise mundial da educação”, e, de forma mais específica, sobre a “crise da
escola”.

» Com relação à tentativa de superação das incertezas da formação profissional de professores, Canário (2006)
ressalta a importância de vislumbrar a perspectiva de que essa formação seja ancorada em uma “formação
centrada na escola”.

» Segundo Candau e Koff (2015), a reinvenção da escola está orientada pelos princípios de uma Educação
Intercultural Crítica.

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