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APOSTILA DE ESTUDOS: PSICOPATOLOGIA GERAL (ARA1109)

JÉSSICA LIRA

▪ EMENTA:

• Introdução ao estudo da Psicopatologia e o diagnóstico de transtornos mentais.


• Processos psíquicos e suas alterações.
• O suicídio e o luto patológico e sua relação com os transtornos mentais.
• Diagnóstico diferencial e diretrizes de cuidado.

▪ OBJETIVOS:

• Sistematizar a compreensão dos princípios da psicopatologia, através do


conhecimento do percurso histórico que viabilizou a criação deste campo do
saber, para que o aluno identifique os pressupostos teóricos das diferentes escolas
que circunscrevem o campo da psicopatologia, assim como a sua relação com os
sistemas de classificação da CID11 e do DSM5.
• Identificar e reconhecer estados mentais como normais ou patológicas, analisando
os principais aspectos e contextos de suas manifestações, para o diagnóstico de
transtornos mentais, assim como para o diagnóstico diferencial.
• Interpretar os aspectos e as características das alterações das funções mentais,
avaliando e discutindo relatos de casos clínicos, para que possa compreender às
especificidades nosológicas dos transtornos mentais e dos estados alterados da
personalidade.
• Reconhecer a gravidade de condições clínicas que possam implicar no risco da
preservação da vida de pacientes, interpretando os sinais de pensamentos e
possibilidades de atos suicidas, para escolher e planejar ações e medidas de
intervenções terapêuticas eficientes.

▪ TEMAS DE APRENDIZAGEM

1. INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA PSICOPATOLOGIA E O


DIAGNÓSTICO DE TRANSTORNOS MENTAIS

1.1 Histórico e principais correntes em psicopatologia


1.2 O normal e o patológico em psicopatologia

2. SOFRIMENTO SUBJETIVO, CONCEITUAÇÃO DE TRANSTORNO E


DOENÇA MENTAL E OS SISTEMAS CLASSIFICATÓRIOS.

3. A AVALIAÇÃO/ENTREVISTA DE UM PACIENTE COM


TRANSTORNO MENTAL E O EXAME MENTAL (OU EXAME
PSÍQUICO)
4. PROCESSOS PSÍQUICOS E SUAS ALTERAÇÕES:

4.1 alterações da consciência, da atenção e da orientação


4.2 alterações da sensopercepção e da vivência do tempo e do espaço
4.3 alterações do juízo de realidade e do pensamento
4.4 alterações da afetividade e da volição

5. O SUICÍDIO E O LUTO PATOLÓGICO E SUA RELAÇÃO COM OS


TRANSTORNOS MENTAIS (CRÉDITO DIGITAL)

5.1 DEFINIÇÃO DE SUICÍDIO, TERMOS ASSOCIADOS E ESTATÍSTICAS


5.2 O SUICÍDIO COMO AGRAVO DO TRANSTORNO MENTAL E O
SUICÍDIO PRODUZIDO PELO TRANSTORNO MENTAL
5.3 SUICÍDIO, RISCOS E OS PRINCIPAIS TRANSTORNOS ASSOCIADOS
5.4 O LUTO PATOLÓGICO – IDENTIFICAÇÃO E FATORES DE RISCO

6. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL E DIRETRIZES DE CUIDADO:

6.1 O conceito de diagnóstico diferencial;


6.2 A escuta clínica no diagnóstico diferencial;
6.3 Os cuidados na diferenciação de simulação, uso de substâncias, condição médica
geral e comorbidade;
1º BIMESTRE:

INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA PSICOPATOLOGIA E O


DIAGNÓSTICO DE TRANSTORNOS MENTAIS:

PSICO PATO LOGIA

Psychê: Pathos:
“Paixão; excesso; passagem;
passividade; sofrimento;
assujeitamento; doença”.
Psýkhein
LOGOS:

“Soprar; respirar; sopro


ou princípio vital” “(...) mais que doença,
significa paixão.”
“ANIMA” LOGIA:
(Termo em latim) Patológico: o doente que
padece de paixão.

“ALMA”
LÓGICA:
“Aquilo que nos anima ; nos dá vida !” “discurso; pensamento;
narrativa;
estudo; conhecimento”.

 PSICOPATOLOGIA: um discurso representativo a respeito do pathos psíquico;


um discurso sobre o sofrimento psíquico, sobre o padecer psíquico.
- Ultrapassa a dimensão da doença mental;
- Pode nos ensinar a respeito de si próprio e, sobretudo, sobre o psiquismo em geral.

 PATHOS: o excesso traumático, o impossível de lidar que, todavia, é edificante.


- Possibilidade de transformação: sofrimento compartilhado, escutado por um outro.

 ESCUTA CLÍNICA:
▪ Sustentar a palavra do outro;
▪ Dispor-se, junto com o paciente, a uma experiência que pertence a dois; transformar,
junto com o sujeito, a narrativa em uma experiência.
▪ “Inicialmente, o contato com o paciente visa a criação de um espaço de confiança no
qual uma aposta possa se estabelecer” (VOLICH, 2005).
▪ Acolher não significa assumir a vida ou o desejo do outro. Compreender não significa
ser condescendente.
▪ O psicopatólogo não julga moralmente o seu objeto, busca apenas observar, identificar
e compreender os diversos elementos da doença mental.

 SAÚDE X DOENÇA:
- Organização Mundial de Saúde:
1947: “(...) a saúde é um estado de bem estar físico, mental e social total e não
exclusivamente a ausência de doenças”.
“Todo indivíduo tem direito de gozar de um completo bem estar físico, mental e social,
no qual o indivíduo é capaz de desenvolver as suas potencialidades criativas.”

▪ Ferraz, F; Serge, M. “O conceito de saúde”, 1997:


- Questionam a noção de saúde da O.M.S.

▪ Freud: O Mal estar na cultura (1930).


- Aborda a noção impossível da felicidade plena.
- Homens realizaram um pacto para viver em cultura: troca – parcela pulsional
por segurança social.
- A organização social e a existência dos sujeitos geram constante mal estar.

 Psicologia: priorizar o resgate do subjetivismo, questionar a atual definição de


saúde.

❖ HISTÓRICO DA PSICOPATOLOGIA:

- Termo criado por Jeremy Bentham, em 1817.


- Esquirol (trabalho publicado na França, em 1837) + Griesinger (trabalho publicado na
Alemanha, em 1845): ambos são considerados os criadores da psicopatologia.

- De maneira geral: “(...) a psicopatologia é uma disciplina científica que estuda a doença
mental em seus vários aspectos, suas causas, as alterações estruturais e funcionais
relacionadas, os métodos de investigação e suas formas de manifestações (sinais +
sintomas)”.

- Segundo Jaspers: “o objeto da psicopatologia é o fenômeno psíquico, mas só os


patológicos”. Nesse sentido, o que é patológico?

- Psicopatologia é uma ciência autônoma. Não é propriedade da Psicologia. Ela está


relacionada à múltiplas abordagens e referenciais teóricos.

- Cada contexto histórico-político teve sua psicopatologia, ou seja, suas tentativas de


“decompor” o sofrimento psíquico em seus elementos de base para, a partir daí,
compreendê-los, classificá-los, estudá-los e tratá-los.
 DEFINIÇÕES:

▪ Campbell (1986) define a psicopatologia como o ramo da ciência que trata da


natureza essencial da doença mental – suas causas, as mudanças estruturais e
funcionais associadas a ela e suas formas de manifestação.

▪ A psicopatologia, em acepção mais ampla, pode ser definida como o conjunto de


conhecimentos referentes ao adoecimento mental do ser humano.

▪ Psicopatologia fundamental: Além de sofrimento, de pathos deriva-se, também,


as palavras "paixão" e "passividade". Assim, a Psicopatologia Fundamental está
interessada num sujeito trágico que é constituído e coincide com o pathos, o
sofrimento, a paixão, a passividade. Este sujeito, que não é nem racional nem
agente e senhor de suas ações, encontra sua mais sublime representação na
tragédia grega. O que se figura na tragédia é pathos, sofrimento, paixão,
passividade que, no sentido clássico, quer dizer tudo o que se faz ou que acontece
de novo, do ponto de vista daquele ao qual acontece. Nesse sentido, quando pathos
acontece, algo da ordem do excesso, da desmesura se põe em marcha sem que o
eu possa se assenhorear desse acontecimento, a não ser como paciente, como ator.

▪ A Psicopatologia Fundamental, cujo campo conceitual é o da psicanálise,


organiza-se em torno do patei mathos esquileano: aquilo que o sofrimento ensina.
Trata-se de resgatar o pathos, como paixão, e escutar o sujeito que traz uma voz
única a respeito de seu pathos, transformando aquilo que causa sofrimento em
experiência, em ensinamento interno. Transformar o pathos em experiência
significa, também, considerá-lo não apenas como um estado transitório, mas, - e
talvez sobretudo - como "algo que alarga ou enriquece o pensamento” (Berlinck,
1998, p. 54). Cria-se um discurso sobre as paixões, sobre a passividade, sobre o
sofrimento, enfim, sobre o sujeito trágico. Encontramos aqui a essência de
Psicopatologia: o conhecimento da paixão, do sofrimento psíquico. O pathos, em
si, nada ensina, não conduzindo senão à morte. Quando a experiência é, ao mesmo
tempo, terapêutica e metapsicológica, estamos no âmbito da Psicopatologia
Fundamental.

o FATORES PARA AVALIAÇÃO DE PATOLÓGICO (QUADRO


CLÍNICO):

- Sem motivo ou motivo aparente para a manifestação dos sintomas;


- Sem controle dos sintomas manifestados; não conseguir reagir/eliminar os sintomas
manifestados;
- Recorrente; os sintomas apresentam-se por um período prolongado; os sintomas não são
passageiros;
- O quadro clínico provoca vários prejuízos (Pessoal; profissional; familiar; social;
fisiológico; etc.).
(FERREIRA, 2010)
 1DESENVOLVIMENTO DA CONCEPÇÃO DE DOENÇA MENTAL &
FORMAS DE TRATAMENTO AO LONGO DA HISTÓRIA.2

▪ HERANÇA, NA ATUALIDADE, DOS SABERES E PRÁTICAS NÃO


CIENTÍFICAS:

• A doença mental tem, ainda hoje, uma série de interpretações: mágica, religiosa,
científica – reflexo da evolução ao longo da história.
• Ideias populares e tratamentos atuais têm raízes no passado histórico.
• Tratamento supersticioso e muitas vezes cruel.
• Conceitos científicos modernos resultam de um longo desenvolvimento.

▪ DEMONOLOGIA ENTRE OS ANTIGOS:

• Idade da Pedra: “trepanação”.


• Trepanação: Operação que consiste em fazer uma abertura regular num osso,
nomeadamente nos ossos do crânio, geralmente com o auxílio de um trépano. Sin.
de trefinação.
• Sua prática remonta até o período Neolítico, como o crânio encontrado em
Ensisheim (França) com um orifício de cerca de 9 cm de diâmetro e cerca de 7000
anos de idade.
• Estudam apontam que os povos primitivos faziam essas operações para libertar os
espíritos, que seriam os responsáveis por enxaquecas, doenças mentais e epilepsia.
• Alguns crânios encontrados apresentam buracos com sinais de cicatrização e
recuperação do osso. Isto pressupõe que algumas pessoas sobreviviam às cirurgias.

 A trepanação craniana era praticada por diversos povos, com maior ou menor
frequência. Esta podia efetuar-se com:
o Intuito mágico - acreditavam que existiam espíritos causadores das doenças;
abriam buracos na calota craniana para que estes saíssem.
o Intuito cirúrgico – e por isso considerado um marco histórico – uma vez que
eram feitas junto a zonas de tumores ou fraturas, ou seja, com a intenção de
se aproximarem cirurgicamente da zona doente para intervir.

CHINESES, EGÍPCIOS, HEBREUS E GREGOS:


- Espíritos “bons” e “maus” explicavam os fenômenos da natureza;
- “Loucos”: Possessão pelo demônio;
- Tratamentos dependiam do tipo de espírito;
- Primeiro tratamento para os “loucos”: Exorcismo.
- Métodos: Preces, encantamentos, ruídos, bebidas de paladar horrível, açoites, fome.
- Primeiros tratamentos: curandeiros e xamãs.
- Grécia, China e Egito: Sacerdotes (+ humanizado e científico).

1
Referência maior: apostila de estudos sobre a psicopatologia, confeccionada pela Professora Cristina
Ferreira – Belém do Pará, 2010.
2
Referência específica: COLEMAN, J. Distúrbios psicológicos e a vida contemporânea. São Paulo:
Pioneira, 1993.
Primeiros conceitos médicos de doença mental:

Hipócrates (460-357 a.C.): “pai da medicina moderna”.


Refutou a crença de deuses e demônios no curso da doença.
Estabeleceu as causas naturais e tratamento igual às outras doenças.
Associação com a doença cerebral.
Importância da hereditariedade e da predisposição
Classificação: mania, melancolia e frenite.

Hipócrates: 04 humores: sangue, bile negra, bile amarela e fleuma:


Tabela dos Humores e suas Associações:
Sangue: significando "resistente, confidente, otimista, alegre, feliz."
Bílis amarela: bílis, significando "a qualidade ou estado do ser irascível"; colérico,
significando "irritado, irado, irascível"; bile, significando "inclinação a irritar-se, raiva
(baço)"; bilioso (mau humor), significando "ruim"; amargo, significando "rancor,
insolence"; spleen, significando "malevolência misturada e mau temperamentado"; e
ictérico (invejoso), significando "inveja, distaste, hostilidade."
Fleuma: significando “lento, indiferença, impassivo”.
Bílis negra: significando “depressivo, tendência à depressão, irascível, triste, abatido”.

Tratamentos diferenciados:

Melancolia – vida regular e tranquila, sobriedade e abstinência de todos os excessos, dieta


de vegetais, exercícios moderados e sangria.
Histeria: exclusiva das mulheres; casamento.

Platão (429-347 a.C.):


Estudo dos atos criminosos.
Tratamento mais humanizado.
Homem motivado por necessidades fisiológicas ou “apetites naturais”.
Sonhos e fantasias: imagens para satisfação do desejo.
Diferenças individuais, influências socioculturais na modelagem do pensamento e
comportamento.
Doença mental: orgânica, moral e divina.

Aristóteles (384-322 a.C.): discípulo e não seguidor de Platão.


Refutou os fatores psicológicos.
Seguiu a teoria hipocrática das perturbações da bile.

Pensamento grego e romano na antiguidade:

Alexandria (332 a.C.): centro da cultura grega; medicina com elevado nível e os templos
dedicados a Saturno eram sanatórios desenvolvidos.
IDADE MÉDIA

Idade das trevas na história da psiquiatria

▪ Início da Idade Média: caos na Europa com guerras, epidemias e fome.


▪ Os cuidados com os doentes passaram às mãos das ordens religiosas.
▪ O diagnóstico de uma doença na Idade Média não podia variar muito: a doença
era provocada pela entrada de um demônio no corpo do paciente, ou decorria de
influência da lua, de almas dos mortos, de feitiços ou pragas, quebranto ou mau
olhado.
▪ Volta da demonologia.

DEMONOLOGIA: retrocesso dos conceitos científicos.

“Loucura coletiva”: casos de histeria.


Tratamento: responsáveis: padres; locais: mosteiros.

Feitiçaria (final do século XV): dois tipos de posses: involuntária e pactual (feiticeiras).

Ressurgimento da discussão científica na Europa

▪ Início do século XVI: começo de uma atividade intelectual e científica.


▪ Demonologia e bruxaria: desafiados por homens com o domínio da religião,
física, medicina e filosofia.

Primeiros hospitais para doentes mentais (Institucionalização):

A partir do século XVI: transferência dos doentes dos mosteiros e prisões para os asilos,
porém os cuidados não melhoraram.
Tratados como animais e criminosos. Permaneceu até quase todo o século XVIII;

Asilos: mantidos pelo poder público ou por religiosos com a função de abrigo e
recolhimento dos doentes mentais, de outros tipos de doentes e dos marginalizados de
todo tipo;
Hospícios: surgem na Europa com a função de tratamento médico aos doentes sem
recursos; acolhimento e alimentação dos doentes mentais; tratamentos por pessoas sem
formação médica e por religiosos, sem propósito psiquiátrico; meios cruéis de contenção
e punição; separação dos alienados dos outros tipos de doentes ou marginalizados sociais.
Manicômios (morocômios, frenocômios): a partir do séc. XIX; por toda a Europa,
principalmente na Itália e na França; poucas mudanças cotidianas ambientais aos doentes
mentais; figura do médico alienista surge no século XIX; atendimento somente aos
doentes mentais; início do tratamento médico sistemático e especializado, com
diminuição dos maus tratos.
SEMIOLOGIA

Semiologia: Vem do grego σημειολογία (semeîon, sinal + lógos, tratado, estudo). A


Semiologia é muito importante para o diagnóstico da maioria das enfermidades.
A semiologia é a base, o pilar fundamental da atividade médica.

• A semiologia, tomada em um sentido geral, é a ciência dos signos, não se


restringindo obviamente à medicina, à psiquiatria ou à psicologia. É campo de
grande importância para o estudo da linguagem (semiótica lingüística), da música
(semiologia musical), das artes em geral e de todos os campos de conhecimento e
de atividades humanas que incluam a interação e a comunicação entre dois
interlocutores por meio de um sistema de signos.

• Entende-se por semiologia médica o estudo dos sintomas e dos sinais das doenças,
estudo este que permite ao profissional de saúde identificar alterações físicas e
mentais, ordenar os fenômenos observados, formular diagnósticos e empreender
terapêuticas. Semiologia psicopatológica é, por sua vez, o estudo dos sinais e
sintomas dos transtornos mentais.

• A semiologia psiquiátrica, o estudo dos sinais e sintomas dos transtornos mentais,


será importante para conhecermos a diferença entre sinais e sintomas.

o O signo é o elemento nuclear da semiologia; ele está para a semiologia assim


como a célula está para a biologia e o átomo para a física. O signo é um tipo de
sinal. O signo é um sinal especial, um sinal sempre provido de significação.
o Os signos de maior interesse para a psicopatologia são os sinais comportamentais
objetivos, verificáveis pela observação direta do paciente, e os sintomas, isto é, as
vivências subjetivas relatadas pelos pacientes, suas queixas e narrativas, aquilo
que o sujeito experimenta e, de alguma forma, comunica a alguém

o Sintoma: O sintoma faz parte de uma trama de representações às quais se liga e


a partir das quais adquire um sentido. O sintoma é uma atualização das
representações traumáticas. Freud (1917) associa o sintoma à vida íntima do
sujeito, demonstrando que o sintoma é uma maneira de satisfação. Sintoma é a
verdade recalcada do sujeito que se atualiza no presente.
Em resumo... os sintomas são subjetivos e aparecem nas queixas dos pacientes.
Por exemplo: dor, sentimento de tristeza, ouvir vozes.

o Sinal: os sinais são objetivos – verificáveis por observação direta. Pode ser
observado por outras pessoas. Por exemplo: solilóquio (falar sozinho). Define-se
sinal como qualquer estímulo emitido pelos objetos do mundo. Assim, por
exemplo, a fumaça é um sinal do fogo, a cor vermelha, do sangue, etc.
CONCEITO DE NORMALIDADE EM PSICOPATOLOGIA

 O que é ser normal? Você é normal?


 Normal, no dicionário, significa: 1. conforme a norma, a regra; regular. 2. que
é usual, comum; natural.
 A norma, não sendo uma média estatística, é algo individual, ou seja, uma noção
que define as capacidades de uma pessoa.
 Cada indivíduo teria sua concepção do que é normal para si, já que a média não
tolera desvios individuais que não podem ser considerados patológicos.
 Quem sabe melhor do sofrimento é o próprio sujeito e somente ele pode contar
sua experiência de adoecer.

 A doença é diferente do estado normal.


 Segundo Canguilhem (2010, p. 189), alguns dos principais critérios utilizados em
psicopatologia são:

1. Normalidade como ausência de doença: a ausência de sintomas, sinais ou de doenças


é sinônimo de saúde.
2. Normalidade ideal: estabelece-se uma norma ideal do que, supostamente, é um sujeito
sadio.
3. Normalidade estatística: o normal é aquilo que se observa com mais frequência.
4. Normalidade como bem-estar.
5. Normalidade subjetiva: o que prevalece aqui é como o sujeito se percebe em relação
ao seu estado de saúde.

 NORMAL X PATOLÓGICO:

o A delimitação entre o que pode ser considerado normal e o que deve ser tido como
"patológico" é uma questão que gera constantes discussões conceituais. No
terreno da psicopatologia, essa discussão ainda é mais relevante, já que sua
demarcação é muito mais flutuante e suas fronteiras pouco rígidas.
o (CANGUILHEM, 2000).

o Canguilhem critica a visão de que o patológico seria apenas uma variação


quantitativa do normal;
o Canguilhem questiona a visão de que doença pode ser efetivamente uma
realidade objetiva;
o Canguilhem critica a ideia de que o patológico seria apenas uma variação
quantitativa do normal. Considerando que há uma infinidade de possibilidades
fisiológicas e contextuais no processo da vida, o autor ainda afirma que
“estabelecer uma norma para que se possa afirmar a existência de saúde ou doença
apenas transforma estes conceitos em um tipo de ideal”.

o Joyce Mcdougall: o normal é uma característica ambivalente, bom e ruim ao


mesmo tempo (queremos ser originais, mas não queremos ser repudiados).

o “Normalidade”: valores morais, culturais, sociais ou apenas incidências


psicológicas, fisiológicas e biológicas?

Ver: “Em defesa de uma certa anormalidade (MCDOUGALL)”.


 A IMPORTÂNCIA DA HISTÓRIA DA LOUCURA, DE MICHAEL
FOUCAULT:

o “(...) esse fenômeno é a loucura. Mas será necessário um longo momento de


latência, quase dois séculos, para que esse novo espantalho, que sucede à lepra
nos medos seculares, suscite como ela reações de divisão, de exclusão, de
purificação que, no entanto, lhe são aparentadas de uma maneira bem evidente.”

o Antes de a loucura ser dominada, por volta da metade do século XVII, antes que
se ressuscitem, em seu favor, velhos ritos, ela tinha estado ligada, obstinadamente,
a todas as experiências maiores da Renascença.

o Em seu livro História da loucura na Idade Clássica, Foucault (2008) tem como
objetivo estudar a estrutura da exclusão dos corpos, ou seja, ele busca entender
como operam as tecnologias dessa exclusão e sua lógica interna. E qual é essa
estrutura? – A da segregação social, a da exclusão. Na Idade Média, a exclusão
atinge o leproso, o herético. A cultura clássica exclui mediante o hospital geral, a
Zuchthaus, a Workhouse, todas as instituições derivadas do leprosário. Eu quis
descrever a modificação de uma estrutura exclusiva. (Foucault, 2006, p.162-163).

o Foucault se nega a criar um novo conceito de loucura.

o Ele recusa qualquer ação do saber sobre a loucura, qualquer patologização ou


conceituação, preocupando-se principalmente com a lógica da exclusão do louco,
com as tecnologias que o retiram da sociedade. Foucault não fala o que é a loucura,
entretanto, fala da loucura, pois relata o que ela é a partir dos discursos de saberes
sobre esse objeto vindos de determinadas épocas (no caso, a Idade Média, o
Renascimento e a Idade Clássica), de determinados momentos históricos, de um
determinado saber específico, ou geral.

 O MOVIMENTO ANTIPSIQUIATRIA!

• Thomas Szasz
Expoente do movimento
Antipsiquiatria. Psiquiatra.
Professor Universitário.
Principais obras: O mito da
doença mental; Ideologia e
doença mental; A escravidão
psiquiátrica; A fabricação da
Loucura e Esquizofrenia – o
símbolo sagrado da Psiquiatria.
• Questões centrais para Dr. Szasz:
- Internação psiquiátrica;
- Medicalização dos sujeitos – sobretudo crianças;
- Patologização através de diagnósticos indiscriminado, que servem como
dispositivos de controles institucionais e que nada tem a ver com preocupações
genuínas a respeito da saúde.
- Ex: psiquiatras têm usado diagnósticos para estigmatizar e controlar:
Drapetomania – Drapetes “fugido”; mania “loucura”, “excitação”, “fúria”.

Diagnóstico legítimo: Samuel Carwright, 1851, Luisiana, EUA.

• “(...) não há nem pode haver doença mental ou tratamento psiquiátrico; a intervenção agora
designada por tratamento psiquiátrico pode ser claramente identificada como voluntária ou
involuntária: as intervenções voluntárias, as pessoas fazem por si só num esforço de mudar,
enquanto as internações involuntárias são feitas a elas num esforço de mudá-las contra sua
vontade; e a psiquiatria não é empreendimento médico, mas um empreendimento moral e
político” (O mito da doença mental)

• “(...) uma doença mental, análoga a uma doença da pele ou dos ossos, é
um defeito neurológico, não um problema existencial” (Ideologia e
doença mental)

• Quando Szasz foi à Faculdade: 6 ou 7 diagnósticos psiquiátricos. Hoje, há mais


de 300. E a cada dia, os dirigentes da APA se reúnem para catalogar outros mais.
• DSM-V: ser humano se tornou patologia psiquiátrica.
• Eliane Brum: “acordei doente mental”.
• “Birra” de criança é diagnosticável: Transtorno Disrruptivo da desregulação do
humor.
a) Explosões de raiva recorrentes e graves manifestadas pela linguagem (ex:
violência verbal) e/ou pelo comportamento (ex: agressão física a pessoas ou
propriedades) que são consideravelmente desproporcionais em intensidade ou
duração à situação de provocação.
b) As explosões de raiva ocorrem, em média, três ou mais vezes por semana.
c) O humor entre as explosões de raiva é persistentemente irritável ou zangado na
maior parte do dia, quase todos os dias, e é observável por outros (ex: pais,
professores, pares).
▪ MOVIMENTO ANTIPSIQUIATRIA:
▪ Década de 60;
▪ Característica: contestar a validade da medicina para resolver problemas da
psiquiatria;
▪ Doença mental não existe! Thomas Szasz: “nenhum comportamento pode ser
enquadrado como uma doença, tendo em vista que para designar algo como
doença, vocês devem atestar através de testes biológicos, científicos e objetivos a
existência de tal doença”.
▪ Nosologia psiquiátrica são rótulos;

David Cooper inventou o


termo “antipsiquiatria”,
mas as práticas já eram
reconhecidas.

▪ Nomes da Antipsiquiatria: David Laing; Gregory Bateson; Thomas Szasz.


▪ Entendimento majoritário e Ideias radicais: extinção completa de instituições
psiquiátricas. Extinção de qualquer nomenclatura psiquiátrica. Loucura é
construída, fabricada pelas relações de poder e também a partir de práticas
discursivas.

o David Cooper: “no hospital de doenças mentais, os corpos são assiduamente


cuidados, mas personalidades individuais são assassinadas”.
o Diversos casos de sujeitos que burlam o sistema e questionam a ordem que são
internados compulsoriamente.
o Mulheres que se rebelavam eram “histéricas” e tinham que ser contidas. Freud
revolucionou nesta área.
Nise da Silveira: importante nome no Brasil para
tratamentos psiquiátricos:
- Doente Mental: sujeito!
- Defensora da Psiquiatria mais humanista.
- Condenava: tratamento com violência, controle,
exclusão e silenciamento dos pacientes.

• Diante de tantas atrocidades cometidas pelos agentes do saber médico-


psiquiátrico, um grupo de psiquiatras contrários aos tratamentos convencionais
começaram a questionar a validade desse saber.

• Principais características do movimento Antipsiquiatria:


- Corrente que nega a psiquiatria tradicional e promove formas alternativas de
tratamento ao sofrimento psíquico.
- “Loucura” é fabricada por razões e mecanismos políticos. O M.A. sabe que a
existência do que se convencionou chamar de loucura é utilizado pelos sistemas
autoritários como forma de perseguir seus heréticos e contestadores. Assim,
considerando a natureza política da ciência psiquiátrica, anula-se o sujeito em
nome da manutenção da ordem e do bom exercício do poder.
• Em que acredita o Movimento Antipsiquiatria?
- Relações adoecidas = Sujeitos adoecidos.
- Não acreditam em internações psiquiátricas de sujeitos considerados
improdutivos.
- Regime Stalinista (União Soviética): manicômios utilizados para prender
inimigos políticos.
- O rótulo “doente mental” transforma o sujeito em improdutivo e insociável.
- Você é fruto do seu meio; Você é fruto da linguagem: prenda alguém
psicologicamente saudável em um manicômio e veja o resultado.

• Resumo: a psiquiatria tradicional se torna violenta ao criar patologias


desenfreadas e impedir que sujeitos se expressem. Reserva-se o direito de dizer a
verdade sobre o sujeito, impedindo que ele se manifeste e retirando-lhe o direito
de defender-se, pois tudo o que disser será interpretado como sintoma de sua
doença.
• Não há como somente ignorar o DSM? Não! Influencia a rede de saúde mental
mundo a fora. Define a anormalidade na sociedade. A cada “doença” criada, há
um medicamento novo.
• Szasz: “prescrever psicotrópicos para crianças é envenenamento e não
tratamento”.
- Febre tifoide é uma doença; “Spring Fever”, não! 3
▪ Experimento Rosenhan: David Rosenhan, 1972.
- Procurou um Hospital psiquiátrico, alegando ouvir: “oco”, “vazio” e “tum-tum”.
Artigo: “On being sane in insane places” (revista science) – LER!.
- Funcionários não notaram; pacientes, sim!
- Resultado: metodologia falha e prejudicial. Base: DSM.

• “Se você fala com Deus, você está rezando. Se Deus fala com você, você é
esquizofrênico!”
• Psiquiatria: sem ciência, sem
curas (Youtube -
https://www.youtube.com/watch?v=AMM5BR45KDc&t=146s).

• Psiquiatras admitem que não existem testes que comprovem qualquer doença
mental. Psiquiatras admitem que não podem curar seus pacientes, mas ainda assim
os EUA gastam anualmente 69 BILHÕES em custos de saúde mental (à época;
hoje, estes números aumentaram). Vendas internacionais chegam a 76 BILHÕES
à época; hoje, estes números aumentaram).
• “Quem se beneficia com isso?” Quem realiza os diagnósticos!
• Sobre a psiquiatria: O mito da doença mental.
- “A psiquiatria é convencionalmente definida como especialidade médica que se ocupa
do diagnóstico do tratamento das doenças mentais. Alego que essa definição, ainda hoje
amplamente aceita, situa a psiquiatria ao lado da alquimia e da astrologia, colocando-a na
categoria de pseudociência.”

3
Assistir: https://www.youtube.com/watch?v=CzQj9V0f9Vs (Thomas Szasz e o Mito da doença mental);
OS SISTEMAS DE CLASSIFICAÇÃO DOS TRANSTORNOS
MENTAIS:

• POR QUE CLASSIFICAR/DIAGNOSTICAR?

Segundo o DSM-V:

Diagnósticos confiáveis são essenciais para orientar recomendações de tratamento,


identificar taxas de prevalência para planejamento de serviços de saúde mental,
identificar grupos de pacientes para pesquisas básicas e clínicas e documentar
importantes informações sobre a saúde pública, como taxas de morbidade e mortalidade.
Na medida em que a compreensão sobre os transtornos mentais e seus tratamentos
evoluiu, profissionais médicos, pesquisadores e clínicos voltaram o foco de sua atenção
para as características de transtornos específicos e suas implicações para tratamento e
pesquisa.

Outros teóricos:

- Leva-se em consideração regimes totalitários que utilizavam diagnósticos para punir,


segregar, excluir e marginalizar pessoas.
“O diagnóstico em psiquiatria não tem valor algum, pois cada pessoa é uma realidade
única e inclassificável. O diagnóstico psiquiátrico apenas serviria para rotular as pessoas
diferentes, excêntricas, permitindo e legitimando o poder médico, o controle social sobre
o indivíduo desadaptado ou questionador”.

Contrapontos:

“O valor e o lugar do diagnóstico em psiquiatria são absolutamente semelhantes ao valor


e ao lugar do diagnóstico nas outras especialidades médicas. O diagnóstico, nessa visão,
é o elemento principal e mais importante da prática psiquiátrica.”

O que é importante considerar:

“O diagnóstico psicopatológico, com exceção dos quadros psicoorgânicos (delirium,


demências, síndromes focais, etc.), não é, de modo geral, baseado em possíveis
mecanismos etiológicos supostos pelo entrevistador. Baseia-se principalmente no perfil
de sinais e sintomas apresentados pelo paciente na história da doença e no momento da
entrevista. Por exemplo, ao ouvir do paciente ou familiar uma história de vida repleta de
sofrimentos, fatos emocionalmente dolorosos ocorridos pouco antes do eclodir dos
sintomas, a tendência natural é estabelecer o diagnóstico de um transtorno psicogênico,
como “psicose psicogênica”, “histeria”, “depressão reativa”, etc. Mas isso pode ser um
equívoco”.
Como a Psiquiatria (DSM-V) classifica transtorno mental?

“Um transtorno mental é caracterizado por uma perturbação clinicamente significativa na


cognição, na regulação emocional ou no comportamento de um indivíduo que reflete uma
disfunção nos processos psicológicos, biológicos ou de desenvolvimento subjacentes ao
funcionamento mental. Transtornos mentais estão frequentemente associados a
sofrimento ou incapacidade significativos que afetam atividades sociais, profissionais ou
outras atividades importantes. Uma resposta esperada ou aprovada culturalmente a um
estressor ou perda comum, como a morte de um ente querido, não constitui transtorno
mental. Desvios sociais de comportamento (p. ex., de natureza política, religiosa ou
sexual) e conflitos que são basicamente referentes ao indivíduo e à sociedade não são
transtornos mentais a menos que o desvio ou conflito seja o resultado de uma disfunção
no indivíduo, conforme descrito.”

DSM: manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais.

Antes da Segunda Guerra Mundial, no censo de 1880 nos EUA, sete doenças começaram
a ser catalogadas: mania, melancolia, epilepsia, monomania, demência, dipsomania e
paresia. Após a Segunda Guerra Mundial, com a necessidade de uma classificação mais
precisa e que também descrevesse características de personalidade e outros critérios,
surgiu o DSM-I, em 1952. Concomitantemente, criava-se a CID-6 (6a edição da
Classificação Internacional de Doenças da Organização Mundial da Saúde), que incluiu
pela primeira vez uma seção sobre doenças mentais: (a) dez categorias de psicoses e
psiconeuroses; e (b) sete categorias de transtornos de caráter, comportamento e
inteligência.

1. No DSM-I, aparece o uso constante do termo “reação”, pois foi bastante


influenciado pelas teorias psicobiológicas de Adolf Meyer, que propunha que os
transtornos mentais fossem reações da personalidade a fatores biológicos,
psicológicos e ambientais.

2. O DSM-II foi publicado em 1968 e não apresentou grandes modificações nas


descrições dos transtornos mentais, com exceção da retirada do termo “reação”.

3. Já o DSM-III (1980) e o DSM-III-R (1987) representaram grande revolução nos


termos e métodos para a avaliação e o diagnóstico dos transtornos mentais, com
critérios específicos para o que é um transtorno e como ele se diferencia.

4. A estrutura básica não foi drasticamente modificada nos DSM-IV (1994) e DSM-
IV-TR (2000), com a permanência das listas de critérios diagnósticos
operacionalizados.

5. Em 2013 é publicada a 5ª edição do DSM (o DSM-V) e com este veio uma grande
crise e ruptura no interior da psiquiatria. O próprio presidente do instituto nacional
de saúde mental, algumas semanas antes da publicação do mesmo, afirma através
do seu blog oficial deste instituto: “O objetivo deste novo manual, tal como nas
edições prévias, é de promover uma linguagem comum para a descrições das
psicopatologias. Embora o DSM tenha sido descrito como a bíblia desse campo,
ele é no máximo um dicionário, criando um grupo de rótulos para definir cada
uma dessas entidades. Os pacientes com transtornos mentais merecem mais do
que isso”. Com isso, podemos imaginar a condição anticlimática do DSM – V,
tendo em vista que antes mesmo do seu lançamento o mesmo estava sendo
desautorizado publicamente pelo presidente do instituto de saúde mental. E ele
diz mais: o instituto nacional de saúde mental dos EUA, não voltaria a
financiar as pesquisas psiquiátricas, que utiliza-se o DSM V como referência.

CID: classificação internacional de doenças.

- A Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados


com a Saúde determina a classificação e codificação das doenças e uma ampla
variedade de sinais, sintomas, achados anormais, denúncias, circunstâncias
sociais e causas externas de danos e/ou doença.

- A Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde


(também conhecida como Classificação Internacional de Doenças – CID 10) é
publicada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e visa padronizar a
codificação de doenças e outros problemas relacionados à saúde. A CID 10
fornece códigos relativos à classificação de doenças e de uma grande variedade
de sinais, sintomas, aspectos anormais, queixas, circunstâncias sociais e causas
externas para ferimentos ou doenças. A cada estado de saúde é atribuída uma
categoria única à qual corresponde um código CID 10.

Em suma, para a psiquiatria:

A classificação dos transtornos psiquiátricos com base nos sinais e sintomas é necessária
e útil, tornando possível a comunicação e a transmissão de conhecimento. A ausência de
critérios fisiopatológicos ou etiopatogênicos na formulação diagnóstica psiquiátrica não
a invalida; ao contrário, como essas informações ainda estão insuficientes na maioria dos
transtornos, ao nos basearmos naquilo que temos de objetivo, no estado atual do
conhecimento, garantimos a utilidade e a confiabilidade da classificação entre os
observadores. Nada impede que, com o avanço das neurociências e da genética, existam
novas possibilidades de classificação. Aliás, a contínua revisão das classificações (ainda
que baseadas fundamentalmente nos sinais e sintomas) é mais uma evidência de que a
classificação como é feita hoje não é, nem poderia ser, considerada definitiva, e sua
existência já prevê sua contínua revisão e ajuste. O psiquiatra deve utilizar os sistemas
classificatórios atuais certo de que são úteis e válidos, mas sujeitos à contínua revisão e à
inclusão de evidências etiopatogênicas ao longo do tempo.
AVALIAÇÃO MENTAL DOS PACIENTES

• Entrevista psiquiátrica:

- A avaliação do paciente, em psicopatologia, é feita principalmente por meio da


entrevista. Aqui a entrevista não pode, de forma alguma, ser vista como algo banal, um
simples perguntar ao paciente sobre alguns aspectos de sua vida.

- Função da entrevista psiquiátrica: fornecer elementos para o estabelecimento de três


aspectos fundamentais: o diagnóstico psiquiátrico (ou hipóteses diagnósticas), um
possível prognóstico e a terapêutica necessária.
- Tudo deve ser levado em consideração e observado durante a entrevista;
- Perguntamos e indagamos inclusive o que o paciente oculta durante a entrevista.
- Na entrevista deixamos o paciente livre para falar sobre absolutamente qualquer assunto:
não julgamos, não ficamos espantados, não interrompemos a fala do paciente (a não ser
com pontuações necessárias);
- A questão da transferência e contratransferência neste processo de encontro entre
paciente e psicólogo.

- A entrevista psicopatológica permite a realização dos dois principais aspectos da


avaliação:

1. “A anamnese, ou seja, o histórico dos sinais e dos sintomas que o paciente


apresenta ao longo de sua vida, seus antecedentes pessoais e familiares, assim
como de sua família e meio social.”

2. “O exame psíquico, também chamado exame do estado mental atual.”

o As três regras “de ouro” da entrevista em saúde mental

1. Pacientes organizados (mentalmente), com inteligência normal, com escolaridade


boa ou razoável, fora de um “estado psicótico”, devem ser entrevistados de forma
mais aberta, permitindo que falem e se expressem de maneira mais fluente e
espontânea. O entrevistador fala pouco, fazendo algumas pontuações para que o
paciente “conte a sua história”.

2. Pacientes desorganizados, com nível intelectual baixo, em estado psicótico ou


paranóide, “travados” por alto nível de ansiedade, devem ser entrevistados de
forma mais estruturada. Nesse caso, o entrevistador fala mais, faz perguntas mais
simples e dirigidas (perguntas fáceis de serem compreendidas e respondidas).
3. Nos primeiros contatos com pacientes muito tímidos, ansiosos ou paranóides,
deve-se fazer primeiro perguntas neutras (nome, onde mora, profissão, estado
civil, nome de familiares, etc.), para apenas, gradativamente, começar a formular
perguntas “mais quentes” (às vezes, constrangedoras para o paciente), como:
“Qual o seu problema?”, “Por que foi trazido ao hospital?”, “O que aconteceu para
que você agredisse seus familiares?”, etc. Vale a sabedoria popular que diz: “O
mingau quente se come pela beirada.
PONTOS PRIMORDIAIS PARA A ENTREVISTA:

- Um fator importante nas fases iniciais da avaliação do paciente é notar e descrever


o aspecto global do paciente, expresso pelo corpo e pela postura corporal, pela
indumentária (roupas, sapatos, etc.), pelos acessórios (colares, brincos, piercing,
etc.), por detalhes como maquiagem, perfumes, odores, marcas corporais
(tatuagens, queimaduras, etc.), porte e atitudes psicológicas específicas e globais
do paciente. A aparência do paciente, suas vestes, seu olhar, sua postura, revela
muito de seu estado mental interior e é recurso fundamental para o diagnóstico.

- A avaliação psiquiátrica inclui os dados da história da pessoa e o exame psíquico.


Esse instrumento é, em geral, anexado ao prontuário e dividido com toda a equipe
da unidade de saúde. Esse modelo que apresentamos é consagrado pela
psicopatologia e está presente, com pequenas diferenças, nos textos de
Dalgalarrondo (2008), Nunes (1996) e no Manual de psicopatologia de Cheniaux
(2014, p. 5).

- Como um guia, o que deve ser realizar nas entrevistas:

I. IDENTIFICAÇÃO;
II. QUEIXA PRINCIPAL (QP);
III. HISTÓRIA DA DOENÇA ATUAL (HDA);
IV. HISTÓRIA PESSOAL (HP);
V. HISTÓRIA FAMILIAR (HF);
VI. HISTÓRIA PATOLÓGICA PREGRESSA (HPP);
VII. EXAME PSÍQUICO (EP).

- A entrevista também permite:

1) Estabelecer o diagnóstico;
2) Indicar o tratamento.

• A anamnese psiquiátrica:

Na anamnese, o entrevistador se interessa tanto pelos sintomas objetivos como pela


vivência subjetiva do paciente em relação àqueles sintomas; pela cronologia dos
fenômenos e pelos dados pessoais e familiares. Além disso, o entrevistador permanece
atento às reações do paciente ao fazer os seus relatos. Realiza, assim, parte do exame
psíquico e da avaliação do estado mental atual durante a coleta da história (anamnese)

 EXAME DO ESTADO MENTAL:

O exame do estado mental (EEM) é o equivalente psiquiátrico do exame físico no resto


da medicina. O EEM explora todas as áreas de funcionamento mental e mostra evidências
de sinais e sintomas de doenças mentais. Os dados são obtidos ao longo de toda a
entrevista, desde os momentos iniciais da interação, considerando o que o paciente está
vestindo e sua apresentação geral.
A maior parte das informações não requer questionamento direto, e as obtidas por
observação podem dar ao médico um conjunto de dados diferente das respostas do
paciente.
- Aparência e comportamento;
- Atividade motora.;
- Fala;
- Humor: Os termos humor e afeto variam em sua definição, e alguns autores têm
recomendado combinar os dois elementos em um novo rótulo “expressão emocional”.
Tradicionalmente, o humor é definido como o estado emocional interno e continuado do
paciente. Sua experiência é subjetiva; portanto, é melhor usar as próprias palavras do
paciente para descrever seu humor. Termos como “triste”, “irritado”, “culpado” ou
“ansioso” são descrições comuns do humor.
- Afeto: difere de humor, visto que é a expressão do humor ou o que o humor do paciente
parece ser para o médico. O afeto é descrito, muitas vezes, com os seguintes elementos:
qualidade, quantidade, variação, adequação e congruência. Os termos usados para
descrever a qualidade (ou o tom) do afeto de um paciente incluem disfórico, feliz,
eutímico, irritável, irritado, agitado, choroso, soluçante e embotado. A fala é
frequentemente um sinal importante para a avaliação do afeto, mas não é exclusiva. A
quantidade de afeto é uma medida de sua intensidade. Dois pacientes descritos com afeto
deprimido podem ser muito diferentes se um for descrito como levemente deprimido e o
outro como gravemente deprimido. Pode variar entre plano, normal ou lábil.
Embotamento afetivo é um termo que tem sido usado para o afeto severamente restrito
que é observado em alguns pacientes com esquizofrenia. A adequação do afeto refere-se
a como ele está correlacionado com o ambiente. Um paciente que esteja rindo em um
momento solene durante um enterro é considerado com afeto inadequado. O afeto
também pode ser congruente ou incongruente com o humor ou o conteúdo de pensamento
do paciente. Um paciente pode relatar se sentir deprimido ou descrever um tema
depressivo, mas fazê-lo rindo, sorrindo e sem sugestão de tristeza.
- Conteúdo do pensamento.
Questões comuns para a história psiquiátrica e o estado mental:
Tema Questões Comentários e sugestões clínicas

Dados de identificação Seja direto ao obter esses dados. Solicite respostas Se o paciente não puder cooperar, obtenha as
específicas. informações com familiares ou amigos; se
encaminhado por um médico, obtenha o prontuário
médico.
Queixa principal Por que você procurou um psiquiatra? O que o Registre as respostas literalmente; uma queixa
trouxe ao hospital? Qual parece ser o problema? bizarra sugere um processo psicótico.

Quando observou que algo estava acontecendo com Faça anotações segundo as palavras do paciente o
História da doença atual você? Você estava aborrecido com alguma coisa máximo possível. Obtenha a história de
quando os sintomas começaram? Começaram de hospitalizações e tratamentos anteriores. Início
repente ou de forma gradual? repentino de sintomas pode indicar um transtorno
Transtornos clínicos induzido por drogas.
e psiquiátricos anteriores Você já perdeu a consciência? Já teve uma
convulsão? Verifique a extensão da doença, o tratamento, os
medicamentos, os desfechos, os hospitais, os
médicos. Determine se a doença tem algum
propósito adicional (ganhos secundários).

Mães mais velhas (> 35) apresentam risco elevado


História pessoal Você sabe algo sobre seu nascimento? Se sabe, de ter bebês com síndrome de Down; pais mais
quem lhe contou? Que idade tinha sua mãe quando velhos (> 45) podem fornecer espermatozoides
você nasceu? E seu pai? deficientes, que produzem déficits incluindo
esquizofrenia.
Infância Treinamento dos esfincteres? Urinava na cama? Ansiedade de separação e fobia escolar estão
Brincadeiras sexuais com amigos? Qual é sua associadas com depressão adulta; enurese está
primeira lembrança da infância? associada com atos incendiários. Lembranças da
infância antes.

Adolescentes podem se recusar a responder a Desempenho escolar fraco é um indicador sensível


Adolescência perguntas, mas elas devem ser feitas. Adultos de transtorno emocional. A esquizofrenia começa
podem distorcer lembranças de memórias com no fim da adolescência.
carga emocional. Abuso sexual?
Dependendo da queixa principal, certas áreas
Idade adulta Perguntas abertas são preferíveis. Fale-me sobre exigem uma investigação mais detalhada. Os
seu casamento. Não julgue. Que papéis a religião pacientes maníacos muitas vezes contraem dívidas
teve em sua vida, se houver uma? Qual sua ou são promíscuos. Ideias religiosas
preferência sexual? supervalorizadas estão associadas a transtorno da
personalidade paranoide.

Tem ou já teve preocupações em relação a sua Não julgue. Perguntar quando a masturbação
História sexual vida sexual? Como aprendeu a respeito de sexo? começou é melhor do que perguntar você se
Houve alguma mudança em seu impulso sexual? masturba ou já se masturbou alguma vez.

Algum membro de sua família já teve depressão? Carga genética em ansiedade, depressão,
História familiar Alcoolismo? Foi internado em sanatório? Esteve esquizofrenia. Obtenha história de medicação da
na cadeia? Descreva suas condições de vida. Tem família (medicamentos eficazes em familiares para
quarto próprio transtornos semelhantes podem ser eficazes no
paciente).
ESTADO MENTAL

Aparência geral Apresente-se e peça ao paciente que sente. No hospital, Desleixado e desarrumado nos transtornos cognitivos;
coloque sua cadeira perto da cama; não sente na cama. pupilas minúsculas no caso de vício em narcóticos;
postura retraída e curvada na depressão.

Postura fixa e comportamento bizarro na


esquizofrenia. Hiperativo com abuso de estimulantes
Você tem estado mais ativo do que o habitual? Menos (cocaína) e na mania. Retardo psicomotor na
ativo? Pode perguntar sobre maneirismos óbvios, depressão; tremores com ansiedade ou efeito colateral
como “Notei que sua mão ainda treme, você pode me de medicação (lítio). O contato visual é normalmente
Comportamento falar sobre isso?”. Preste atenção a odores, por feito durante a entrevista. Se for mínimo, atentar para
Motor exemplo, alcoolismo/cetoacidose. esquizofrenia. Observação do ambiente em estados
paranoides

Você pode comentar sobre atitude. “Você parece Desconfiança na paranoia; sedutor na histeria; apático
Atitude durante a entrevista
irritado com alguma coisa; essa é uma observação no transtorno conversivo (Ia beIle indifférence);
correta? trocadilhos (witzelsucht) nas síndromes do lobo
frontal.

Como você se sente? Como está sua disposição? Pensa Ideias suicidas em 25% dos depressivos; euforia na
Humor que a vida não vale a pena ou que você quer se mania. Despertar durante a madrugada na depressão;
prejudicar? Planeja tirar a própria vida? Quer morrer? menor necessidade de sono na mania.
Houve alguma mudança em seu sono?

❖ Perguntas usadas para testar as funções cognitivas na seção de sensório do


exame do estado mental:

1. Alerta: (Observação)

2. Orientação: Qual o seu nome? Quem sou eu? Que lugar é este? Onde se localiza? Em
que cidade estamos?

3. Concentração: Começando em 100, conte de trás para a frente de 7 em 7 (ou de 3 em


3) Diga as letras do alfabeto de trás para a frente, começando com o Z. Diga os meses do
ano de trás para a frente, começando com dezembro.

4. Memória Imediata: Repita os números comigo: 1, 4, 9, 2, 5.

5. Memória Recente: O que você comeu no café da manhã? O que você estava fazendo
antes de começarmos a conversar? Quero que você se lembre destas três coisas: pente,
rua, azul. Após alguns minutos, vou pedir para você repeti-las.
6. Memória de longo prazo: Qual era seu endereço quando você estava na 3a série?
Quem era o seu professor? O que você fez no verão entre o ensino médio e a faculdade?

7. Cálculos Se você comprar algo que custa R$ 3,75 e pagar com uma nota de R$ 5,00,
qual será o troco? Quanto custam três laranjas, se uma dúzia custa R$ 4,00?

8. Cabedal de conhecimento: Qual é a distância entre Nova York e Los Angeles? Qual
é o oceano que fica entre a América do Sul e a África?

9. Raciocínio abstrato: Que objeto não pertence a este grupo: uma tesoura, um canário
e uma aranha? Por quê? O que uma maçã e uma laranja têm em comum?
2º BIMESTRE:

PROCESSOS PSÍQUICOS E SUAS ALTERAÇÕES:

▪ ATENÇÃO, ORIENTAÇÃO E VIVÊNCIA DO TEMPO E ESPAÇO:

A orientação, segundo Dalgalarrondo (2008, p. 110), é uma das funções psíquicas mais
importantes, pois permite que saibamos quem somos e onde estamos. A capacidade de
reconhecer a si mesmo e o ambiente que nos cerca é uma função básica da atividade
mental.

Orientação autopsíquica – é a orientação do sujeito em relação a si mesmo. Revela se o


sujeito sabe quem é: nome, idade, data de nascimento, profissão, estado civil.

Orientação alopsíquica – diz respeito à capacidade de orientar-se em relação ao mundo.


Quanto ao espaço – onde estou (hospital, casa, rua), o que faço aqui (orientação
espacial). Quanto ao tempo – dia, mês e ano (orientação temporal).

▪ ALTERAÇÕES NA SENSOPERCEPÇÃO.

Conceito: alucinações são percepções na ausência de estímulos que as justifiquem.


Alucinações auditivas são aquelas encontradas com mais frequência no contexto
psiquiátrico. Outras alucinações podem incluir visuais, táteis, olfativas e gustativas
(paladar).
Logo...
- É uma alteração da percepção;
- É a percepção real de um objeto inexistente, ou seja, são percepções sem um
estímulo externo;
- Por que tal percepção é real, então? Porque ela é inabalável e se dá como uma
construção do paciente.

Tipos de alucinações:

- Alucinações auditivas: O paciente ouve vozes. Vozes estas que muitas vezes
ditam o que ele deve fazer, a isso chamamos de Automatismo Mental. Que é
diferente de Sonorização do Pensamento. Tais vozes são difamatórias.
- Alucinações visuais: são percepções visuais de objetos que não existem. Nelas,
podem ter formas definidas – alucinações visuais complexas – ou pode ter formas
não definidas – alucinações visuais elementares.

- Alucinações táteis: percepções de estímulos táteis, sem que o objeto exista. Ex:
animais que andam pelo seu braço.

- Alucinações olfativas: percepção de odores e gostos nada agradáveis. Ex: sente


gosto de fezes na boca.
- Alucinações cinestésicas: refere-se à cinética, ou seja, são movimentos. Como se
tudo estivesse se movendo dentro do seu corpo.

- Alucinações cenestésicas: o paciente acredita que há objetos dentro de seu corpo,


geralmente são objetos bizarros. Ex: o cérebro está cheio de areia.

• Na esquizofrenia, outros tipos de alucinação também podem ocorrer:

1. Sonorização do pensamento – o paciente acredita que está ouvindo os próprios


pensamentos, escuta no próprio momento em que pensa.

2. Sonorização do pensamento como vivência alucinatória-delirante – o


paciente acredita que colocaram pensamentos em sua cabeça e ele agora ouve
esses pensamentos.

3. Eco do pensamento – é a sensação que seu pensamento ecoa dentro da cabeça.

4. Publicação do pensamento – o paciente tem a certeza de que as pessoas ouvem


o ele pensa, na hora em que está pensando.

▪ PENSAMENTO E SUAS ALTERAÇÕES

O QUE É DELÍRIO?

- É uma alteração do pensamento;


- É uma falsa crença, que o sujeito defende ferozmente;
- Não há uma lógica na realidade externa;
- Não importa o que for contestado, o sujeito que delira não refuta em seu delírio.
- Ideia delirante Delírio
 Tipos de Delírios:
- Delírio de referência: o sujeito acredita que tudo o que acontece tem alguma
referência a ele.
- Delírio de prejuízo: o sujeito acredita que sofre prejuízos causados por outrem.
- Delírio de perseguição/persecutório: é similar ao de prejuízo, contudo
diferencia-se porque no de perseguição, o sujeito acredita que estão sempre
tramando contra ele, envolve toda uma trama. Querem matá-lo, envenená-lo, etc.
- Delírio de influência: o sujeito acredita que alguém ou alguma força externa
controla seus atos, sua mente, seu corpo.
- Delírio de grandeza: o sujeito acredita que tem uma habilidade que ninguém
mais possui.
- Delírio de Ciúme: o sujeito acredita que seu parceiro está sendo infiel. E acredita
que toda a qualquer relação que seu parceiro tenha, é porque está traindo-o.
- Delírio de ruína: o sujeito acredita que sua vida está repleta de desgraças,
sofrimentos, fracassos, perdas.
- Delírio hipocondríaco: o sujeito acredita que está sofrendo de uma doença
incurável e muito grave. Ou que seu corpo está apodrecido.
- Delírio de negação: o sujeito acredita que já morreu.
- Delírio de Místico: envolve temas religiosos, espirituais.
- Delírio de erótico: o sujeito acredita ser amado por uma pessoa de muita estima,
muito valor. (Mínimos detalhes são exacerbados pelo sujeito)
- Delírio autoacusação: o sujeito se auto pune por acreditar que é uma pessoa
horrível, sem nenhum valor.
- Delírio de descendência: o paciente acredita que é filho ou parente de algum
personagem ilustre e nega seus verdadeiros pais.

VÁRIOS TIPOS DE ALTERAÇÕES NOS PROCESSOS PSÍQUICOS:

▪ Alterações da consciência:

- Para a psicopatologia, a consciência constitui uma síntese ou uma integração de


todos os processos mentais em um dado momento. São características da
consciência: apresentar vivência interna; ter relação com a distinção do Eu/não
Eu; ter intencionalidade (dá significado às coisas); e ser reflexiva (possibilita
refletir sobre seus próprios conteúdos psíquicos).

- Vigilância ou nível da consciência: conceito particular da consciência


relacionado com as capacidades neurofisiológicas que possibilitam o estar em
vigília, alerta, e com o sensório claro.

- Lucidez da consciência: estado claro da consciência, diferentemente do sono e


do coma. Os processos psíquicos são experimentados na intensidade adequada.

- Campo da consciência: dimensão horizontal da consciência, relacionada com a


quantidade de conteúdos abarcados em determinado momento.
▪ Alterações da atenção:

- As alterações da atenção podem ocorrer tanto em distúrbios neurológicos e


neuropsicológicos como em
- transtornos mentais.

- Transtornos do humor (depressão e transtorno bipolar), transtorno


obsessivocompulsivo (TOC), esquizofrenia e transtorno de déficit de
atenção/hiperatividade (TDAH) são os que mais apresentam alterações da
atenção.

- Os pacientes com transtornos do humor têm importantes dificuldades de


concentração e atenção constante. São típicas certas alterações da atenção dos
estados depressivos e dos estados maníacos.

- A atenção pode estar alterada mesmo em processos fisiológicos. É o caso de


pessoas com preocupações corriqueiras, pressa, fadiga ou medo.

o Distração: estado não necessariamente patológico em que ocorre uma


superconcentração ativa sobre alguns conteúdos específicos, deixando outros de
lado, ainda que também sejam importantes. Ocorrem hipertenacidade e
hipovigilância. Por exemplo, quando um médico chega atrasado ao plantão e está
tão apressado, que não lembra o local onde estacionou o carro.

o Distratibilidade: é conhecida como labilidade da atenção. Trata-se do estado


patológico em que há dificuldade em manter voluntariamente a atenção focada
em um objeto, com extrema fluidez em direção a outros estímulos, mesmo que
insignificantes. Em outras palavras, verificam-se hipotenacidade e
hipervigilância, comuns em quadros maníacos.

▪ Alterações de volição:

- A volição, também denominada conação, agrega uma série de atividades


psíquicas que são direcionadas para a realização das ações.

- Chama-se de hipobulia a redução da vontade e da iniciativa de realizar atividades


cotidianas, principalmente no sentido de transformar planos em ações. A abulia
consiste na ausência completa da iniciativa. Ambas podem ocorrer no transtorno
depressivo, na esquizofrenia e nos quadros demenciais, por exemplo. A
hiperbulia, que consiste no aumento patológico do impulso volitivo, muitas vezes
gera comportamentos de risco ou persistência exagerados. Manifesta-se,
principalmente, em quadros maníacos.

o Impulsividade e agressividade:

- A impulsividade caracteriza-se por meio de diferentes padrões cognitivos e


comportamentais que levam a consequências disfuncionais imediatas e a
médio/longo prazos. O ato impulsivo é impensado, pouco planejado, muitas vezes
súbito e incoercível. Também se pode conceituar a impulsividade como um traço
de personalidade que inclui componentes como desejo de experimentação,
capacidade reduzida de reflexão, precipitação ao ato, intolerância a frustração e
incapacidade de postergar gratificação.42 Pode ser verificada frequentemente em
transtornos da personalidade, no transtorno do déficit de atenção/hiperatividade e
no transtorno por uso de substâncias.
- A agressividade impulsiva é um tipo de comportamento agressivo ou violento que
surge de uma incapacidade de controle dos impulsos, como no déficit intelectual.
Contrapõe-se ao conceito de agressividade planejada – modo organizado e
premeditado de violência, verificada, por exemplo, no transtorno de personalidade
antissocial.

- É possível também falar em agressividade latente, pois se pode reconhecer o


intuito agressivo mesmo que contido ou velado, mas ainda assim existente. Os
impulsos agressivo-destrutivos são episódios de violência física ou de destruição
de propriedade totalmente desproporcionais aos eventos que, supostamente,
motivaram o agressor a cometer esses atos. Ocorre no transtorno explosivo
intermitente.

- Outros fenômenos impulsivos específicos: Automutilação; Cleptomania; Jogo


patológico, etc.

▪ Alterações do pensamento:

- O curso ou fluxo do pensamento é o modo como o pensamento se conduz, de


acordo com sua velocidade e seu ritmo ao longo do tempo.

o Aceleração do pensamento (taquipsiquismo): fala rápida, com maior produção


de ideias e riqueza associativa. Típica dos estados de elevação do humor, pode
também se apresentar na esquizofrenia, nos estados de ansiedade e na intoxicação
por psicoestimulantes.

o Bloqueio ou interceptação do pensamento: o paciente interrompe seu


pensamento de maneira repentina, sem qualquer motivo aparente, deixando de
completar uma ideia e acabando uma frase pela metade. Depois, retoma por outro
assunto, sem relação com o anterior. Pode apontar que o pensamento foi de algum
modo bloqueado ou mesmo roubado de sua mente por uma força estranha (roubo
do pensamento).

▪ Alterações da afetividade:

- A afetividade é um termo psicopatológico pouco específico que engloba conceitos


como as emoções, os sentimentos e os estados de humor. Está relacionada com
vários tipos de vivência psíquicas como as sensações, os impulsos e as volições.
Também apresenta relação estreita com fenômenos somáticos, especialmente os
relacionados com as funções vegetativas e autonômicas, como digestão, sono,
sudorese, pressão arterial e ritmos cardíaco e respiratório, entre outras.

o Euforia (ou alegria patológica): estado de alegria intensa, exagerada e


desproporcional à realidade.
o Disforia: descreve um estado distímico (tanto de humor depressivo quanto
maníaco) associado a um forte componente de irritação, amargura, desgosto ou
agressividade.
o Irritabilidade patológica: conjunto de reações exageradamente desagradáveis e
agressivas em resposta a frustrações banais. Pode ocorrer em quadros orgânicos e
em diversos transtornos mentais.
o Puerilidade: estado afetivo infantilizado. Existente na esquizofrenia hebefrênica,
nos transtornos de personalidade e no déficit intelectual.
o Moria: tipo persistente de alegria pueril, ingênua e boba. Ocorre no déficit
intelectual e em quadros orgânicos (lesões de lobo frontal, quadros demenciais).
o Hipomodulação do afeto: incapacidade de sintonizar as emoções com as
ocorrências do momento.
o Embotamento afetivo: redução marcante do modo de expressar as emoções. É
característico da esquizofrenia.
o Indiferença ou frieza afetiva: falta de expressividade emocional em situações
em que se espera uma reatividade afetiva. É classicamente chamada de bela
indiferença, na histeria; pálida indiferença, na esquizofrenia; e triste indiferença,
na depressão.
o Apatia: diminuição da excitabilidade das emoções, com redução das atividades e
falta de interesse.
o Sentimento de falta de sentimento: sensação desconfortável de incapacidade
para vivenciar os sentimentos.
o Anedonia: dificuldade ou incapacidade de sentir prazer.
o Inadequação do afeto (paratimia): vivências emocionais estão fora de contexto,
havendo incongruência com relação à situação (p. ex., rir ao falar de algo triste).
Encontra-se na esquizofrenia e em quadros orgânicos.
o Ambivalência afetiva: coexistência de sentimentos contraditórios direcionados a
um mesmo estímulo ou objeto. É patológica quando ocorre de maneira muito
intensa e disfuncional. Encontra-se na esquizofrenia, nos transtornos de
personalidade e em quadros depressivos e obsessivos.
o Neotimia: experiência afetiva inteiramente nova e peculiar, ocorre em pacientes
psicóticos.
o Labilidade e incontinência: oscilação inesperada e repentina do estado afetivo.
Na incontinência, identifica-se uma causa apropriada, mas a resposta afetiva é
desproporcional.

▪ Alterações da linguagem:

- Alterações da linguagem podem ser secundárias a lesão neuronal identificável


(acidentes vasculares cerebrais, lesões expansivas, malformações arteriovenosas
etc.), principalmente quando envolvem o hemisfério dominante e certas regiões
associadas à produção e à compreensão da linguagem. Conforme a etiologia,
podem ser acompanhadas de outros comemorativos clínicos, como déficits
motores no hemicorpo contralateral ao insulto neurológico.

o Disartria: é a incapacidade de articular corretamente as palavras. Decorrente de


alterações neuronais do aparelho fonador (paresias, paralisias ou ataxias da
musculatura da fonação) ou de efeitos colaterais de alguns psicofármacos. A fala
é pastosa, “embriagada”, e pode assumir características diferentes conforme a
etiologia.
o Disfonia: alteração do timbre e da intensidade do som produzido. Em casos
extremos, em que não há emissão de qualquer som ou palavra, usa-se o termo
afonia. Causada principalmente por uma disfunção das pregas vocais ou um
defeito da respiração durante a fala.

o Dislalia: deformação, omissão ou substituição dos fonemas. Pode ter origem


orgânica associada a defeitos da língua, dos lábios, da abóbada palatina ou de
qualquer outro componente do aparelho fonador. As dislalias funcionais
apresentam origem psicogênica, por conflitos emocionais ou mesmo imitação.

o Logorreia ou verborreia. Produção aumentada e acelerada (taquifasia) da


expressão verbal. Tem-se um fluxo excessivo e incessante de palavras e frases,
expresso com uma necessidade compulsiva de fala, podendo haver perda da lógica
do discurso. Está presente em pacientes com síndromes maniatiformes,
frequentemente em conjunto com uma vontade incoercível de prolongar-se
falando (pressão para falar). A loquacidade define a situação em que há aumento
do débito verbal, mas sem prejuízo à lógica do discurso.

o Bradifasia (ou bradilalia): fala vagarosa, característica de processos nos quais


ocorre o alentecimento do curso do pensamento. Presente em quadros depressivos,
estados demenciais e esquizofrenia.

o Mutismo ou emudecimento: ausência da linguagem verbal. Pode decorrer de


inibição psíquica extrema (estupor, delirium) ou de um negativismo verbal
(tendência automática de oposição às solicitações do ambiente).

o Estereotipia verbal: repetição monótona e sem sentido comunicativo de palavras


ou trechos de frases. Encontrada nas síndromes catatônicas e demenciais (quando
são indicativas de lesões orgânicas em áreas cerebrais pré-frontais). A
verbigeração é uma produção verbal estereotipada que tende a se estender por
longos períodos. São fenômenos iterativos geralmente automáticos, espontâneos,
não direcionados a um interlocutor, de conteúdo relativamente simples. Devem
ser diferenciados daqueles decorrentes de estados afetivos intensos (verbigeração
ansiosa), como quando se repete várias vezes uma frase diante de um evento
angustiante ou catastrófico (“meu Deus, meu Deus, que desastre... meu Deus, meu
Deus, que desastre...” etc.).

o Ecolalia: é a repetição em forma de eco de palavras ou parte de palavras que o


paciente ouve em torno de si ou que lhe são direcionadas por um examinador.
Trata-se de um fenômeno involuntário e, às vezes, reproduz, inclusive, a
entonação do enunciado. Ao ser questionado “Qual seu nome?”, o paciente
responde igualmente “Qual seu nome?” ou apenas “Nome, nome, nome”. É
encontrada nos casos de síndrome catatônica, déficit intelectual, autismo e
quadros orgânicos (como demências e afasias).
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL E DIRETRIZES DE CUIDADO:

• Em medicina, diagnóstico diferencial é um método sistemático usado para


identificar doenças. É feito, essencialmente, por processo de eliminação. Nem
todo diagnóstico médico é diferencial.
• O diagnóstico diferencial pode ser definido como uma hipótese formulada pelo
médico - tendo como base a sintomatologia (sinais e sintomas) apresentada pelo
paciente durante o exame clínico - segundo a qual ele restringe o seu diagnóstico
a um grupo de possibilidades que, dadas as suas semelhanças com o quadro clínico
em questão, não podem deixar de ser elencadas como provável.
• A partir do diagnóstico diferencial, o médico pode selecionar testes terapêuticos,
ou ainda, exames complementares específicos a fim de se obter um diagnóstico
final ou de certeza.
• O processo do diagnóstico diferencial do DSM-5 pode ser discriminado em seis
passos básicos:
1) Excluir a simulação e o transtorno factício:

- O primeiro passo é excluir a simulação e o transtorno factício, porque, se o


paciente não está sendo honesto no que se refere à natureza e à gravidade de seus
sintomas, todas as apostas estão perdidas no tocante à capacidade do clínico de
chegar a um diagnóstico preciso. A maior parte do trabalho psiquiátrico depende
de um esforço colaborativo de boa-fé entre o profissional e o paciente para
descobrir a natureza e a causa dos sintomas apresentados.

- Há momentos, contudo, em que as coisas podem não ser o que parecem. Alguns
pacientes podem escolher enganar o clínico, produzindo ou fingindo os sintomas.

2) Excluir uma etiologia de substância:

- A primeira questão que deve sempre ser considerada no diagnóstico diferencial é


se os sintomas apresentados surgem a partir de uma substância que está exercendo
um efeito direto no sistema nervoso central (SNC).

- A falha na identificação de uma etiologia de substância talvez seja o erro


diagnóstico individual mais comum cometido na prática clínica. O erro é
particularmente infeliz porque a realização de um diagnóstico correto tem
implicações imediatas no tratamento.

- Por exemplo, se o clínico determina que sintomas psicóticos são devidos a


intoxicação por cocaína, não faz sentido, em geral, que o paciente comece de
imediato a tomar um medicamento antipsicótico, a não ser que os sintomas
psicóticos estejam colocando o indivíduo (ou outros) em perigo imediato

3) Excluir uma condição médica etiológica:

- Depois de excluir uma etiologia induzida por substância/medicamento, o próximo


passo é determinar se os sintomas psiquiátricos são devidos aos efeitos diretos de
uma condição médica geral.

- Praticamente qualquer apresentação psiquiátrica pode ser causada pelos efeitos


fisiológicos diretos de uma condição médica geral, e eles são considerados no
DSM-5 como um dos transtornos mentais devidos a outra condição médica (p.
ex., transtorno depressivo devido a hipotireoidismo).

4) Determinar o(s) transtorno(s) primário(s) específico(s):

- Uma vez que o uso de substância e as condições médicas gerais tenham sido
excluídos como etiologias, o próximo passo é determinar qual dentre os
transtornos mentais primários do DSM-5 melhor explica a sintomatologia
apresentada. Vários dos agrupamentos diagnósticos no DSM-5 (p. ex., transtorno
do espectro da esquizofrenia e outros transtornos psicóticos, transtornos de
ansiedade, transtornos dissociativos) são organizados em torno de uma
apresentação comum de sintomas justamente para facilitar esse diagnóstico
diferencial.

5) Diferenciar o transtorno de adaptação das outras condições especificadas


e não especificadas residuais:

- Muitas apresentações clínicas (sobretudo em ambulatórios e em unidades de


atenção primária) não se conformam aos padrões de sintomas específicos ou caem
abaixo dos limiares de gravidade ou de duração estabelecidos para qualificarem
um dos diagnósticos específicos do DSM-5. Em tais situações, se a apresentação
sintomática for grave o suficiente para causar sofrimento ou prejuízo clinicamente
significativo e representa uma disfunção biológica ou psicológica em um
indivíduo, o diagnóstico de um transtorno mental ainda é justificado, e o
diferencial se resume a um transtorno de adaptação ou às categorias residuais de
outros transtornos especificados ou transtornos não especificados.

- Se o julgamento clínico for de que os sintomas se desenvolveram como uma


resposta mal-adaptativa a um estressor psicossocial, o diagnóstico seria um
transtorno de adaptação. Se for definido que um estressor não é responsável pelo
desenvolvimento dos sintomas clinicamente significativos, a categoria relevante
de outros transtornos especificados ou transtornos não especificados pode ser
diagnosticada, com a escolha da categoria residual apropriada dependendo de qual
grupo diagnóstico do DSM-5 melhor cobre a apresentação sintomática.

- Por exemplo, se a apresentação do paciente é caracterizada por sintomas


depressivos que não se encaixam nos critérios de quaisquer transtornos incluídos
no capítulo “transtornos depressivos” do DSM-5, então outro transtorno
depressivo especificado ou transtorno depressivo não especificado é
diagnosticado (diretrizes em relação a qual dessas duas categorias se deve usar
são fornecidas no próximo parágrafo). Em razão de situações estressantes serem
um aspecto diário na vida da maioria das pessoas, o julgamento neste passo é
centrado mais em se um estressor é etiológico do que em sua presença.

6) Estabelecer o limite em relação à inexistência de transtorno mental:

- Geralmente, o último passo em cada um dos algoritmos de decisão é estabelecer


o limite entre um transtorno e a inexistência de transtorno mental. Essa decisão
não é de forma alguma a menos importante ou a mais fácil de tomar. Tomados
individualmente, muitos dos sintomas incluídos no DSM-5 são bastante presentes
e não são, por si próprios, indicativos da presença de transtorno mental.

- Durante o curso de suas vidas, muitas pessoas podem experimentar períodos de


ansiedade, depressão, insônia ou disfunção sexual que podem ser considerados
como não mais que parte esperada da condição humana. Para ficar explícito que
nem todo indivíduo nessa situação se qualifica para um diagnóstico de transtorno
mental, o DSM-5 inclui na maioria dos conjuntos de critérios um critério que
costuma ser formulado da seguinte maneira: “A perturbação causa sofrimento
significativo , do ponto de vista clínico, ou prejuízo no funcionamento social,
profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo”.

- Esse critério requer que qualquer psicopatologia deve conduzir a problemas


significativos do ponto de vista clínico, de forma a justificar um diagnóstico de
transtorno mental. Por exemplo, um diagnóstico de transtorno do desejo sexual
masculino hipoativo, o qual inclui o requisito de que o baixo desejo sexual cause
sofrimento clinicamente significativo no indivíduo, não seria feito para um
homem com pouco desejo sexual que não está em um relacionamento no momento
e que não está incomodado de modo particular com o baixo desejo.
▪ A ESCUTA CLÍNICA NO DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL:

- Freud inaugura novos tempos: o tempo da palavra como forma de acesso por parte
do homem ao desconhecido em si mesmo e o tempo da escuta que ressalta a
singularidade de sentidos da palavra enunciada. Ocupa-se, em suas produções
teóricas e em seu trabalho clínico, de palavras que desvelam e velam; que
produzem primeiro descargas e depois associações.

- Palavras que evidenciam a existência de um outro-interno, mas que também


proporcionam vias de contato com um outro-externo quando qualificado na sua
escuta. Esses tempos em Freud inauguram a singularidade de uma situação de
comunicação entre paciente e analista.

- Um chega com palavras que demandam um desejo de ser compreendido em sua


dor, o outro escuta as palavras por ver nestas as vias de acesso ao desconhecido
que habita o paciente. A situação analítica é, por excelência, uma situação de
comunicação: nela circulam demandas nem sempre lógicas ou de fácil
deciframento, mas as quais, em seu cerne, comunicam o desejo e a necessidade
de serem escutadas.

- Ao tratar da psicopatologia da vida cotidiana, Freud escreve a respeito de “falhas”


que operam no discurso: palavras esquecidas, palavras trocadas, palavras
suprimidas, palavras equivocadas. E o inconsciente mostra-se operante não
apenas no dormir, mas também na vida de vigília. Ao tratar dos chistes, Freud
detém-se em trocadilhos, piadas, aforismos: palavras que sob a égide da comédia
podem ser ditas. E o inconsciente mostra-se operante na vida de vigília, não
somente por meio da falha, mas também como “criador de novidade” (Hornstein,
2003, p. 151). Os textos freudianos dessa primeira década da psicanálise retratam,
em última análise, o domínio permanente do inconsciente sobre a totalidade da
vida consciente

- E assim a associação livre ganha destaque fundamental. De fato, a análise dos


fenômenos psicológicos normais e patológicos só se mostra possível por meio
dela, exigindo do analista, em contrapartida, uma capacidade de escuta que não
reduza os espaços simbólicos que a associação livre viabiliza. Ao paciente cabe
comunicar tudo o que lhe ocorre, sem deixar de revelar algo que lhe pareça
insignificante, vergonhoso ou doloroso, enquanto que ao analista cabe escutar o
paciente sem o privilégio, a priori, de qualquer elemento de seu discurso. Na
efetivação dessa regra fundamental instaura-se a situação analítica, abrindo
possibilidades do desvelamento da palavra

- No seio da associação livre vai se produzindo um deslocamento da imagem, do


fato como fixo, e este vai se incluindo em múltiplas imagens caleidoscópicas cujas
combinações possíveis se multiplicam e onde o ritmo, a cadência, a intensidade
maior de alguns fonemas, a excitação explícita no gaguejar de uma palavra, o
sentido duvidoso de uma frase mal construída, tudo isso vai dando tonalidades
diferentes a estas figuras que não passam desapercebidas à escuta sutil da atenção
flutuante. Ao mesmo tempo, ao ser escutado pelo analista, o próprio sujeito que
fala se escuta (Alonso, 1988, p. 2)
- Associando, o paciente fala de um outro – o inconsciente – que lhe é desconhecido
e irrompe em sua fala quando a lógica consciente se rompe. Torna-se presente,
em algum determinado momento da fala do paciente, a lógica do inconsciente, do
processo primário. A partir de sonhos, atos-falhos, chistes, esquecimentos,
ambiguidades, contradições, essa lógica vai se desvelando e os conteúdos sendo
significados com a ajuda da interpretação.

- Só é possível o diagnóstico a partir da escuta do sofrimento psíquico.

- Escuta mais direcionada: semiestruturada, por vezes.

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