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Jan/Fev 2021
ISSN 2448-4466
www.spsp.org.br
Boletim da Sociedade de Pediatria de São Paulo
Oftalmologia
Pediátrica
www.spspeduca.org.br
Diretoria da Sociedade
de Pediatria de São Paulo
Triênio 2019-2022 Oftalmologia Pediátrica
Diretoria Executiva
Presidente
A Oftalmologia Pediátrica é a especialidade que avalia e trata a região dos olhos e
Sulim Abramovici seus anexos em bebês, crianças e adolescentes.
1o Vice-presidente Além de diagnosticar possíveis alterações visuais, essa especialidade avalia preco-
Renata Dejtiar Waksman cemente alterações que podem se tornar doenças futuras. Entretanto, é na consulta
2o Vice-presidente
Claudio Barsanti
pediátrica que as queixas dos pais e a presença de sintomas e de queixas da própria
Secretária-geral criança aparecem. Assim, o pediatra deve ter conhecimento da Oftalmologia Pediá-
Maria Fernanda B. de Almeida trica e estar atento a alterações de olhos e anexos para poder fazer o encaminha-
1o Secretário mento adequado e no tempo correto para o oftalmopediatra.
Ana Cristina Ribeiro Zollner
2o Secretário Neste número do boletim Pediatra Atualize-se temos três artigos elaborados por
Lilian dos Santos Rodrigues Sadeck membros do Departamento Científico de Oftalmologia da Sociedade de Pediatria
1o Tesoureiro de São Paulo, a saber:
Mário Roberto Hirschheimer
1. A criança que pisca muito: o que pode ser? Essa é uma queixa frequente nos consul-
2o Tesoureiro
Paulo Tadeu Falanghe tórios pediátricos e cuja etiologia é bastante diversa.
2. Alteração da visão de cores: do diagnóstico ao tratamento. Ante um paciente que apre-
Diretoria de Publicações senta alteração visual, alteração na visão de cores e fotofobia, deve-se considerar
doenças oftalmológicas e neurológicas.
Diretora
Cléa R. Leone 3. Torcicolo de origem ocular: como diferenciar? A posição anômala da cabeça pode ter
Coordenadores do Pediatra diversas causas, incluindo as afecções do sistema visual.
Atualize-se Leiam com bastante carinho estes artigos que serão extre-
Antonio Carlos Pastorino mamente úteis na clínica pediátrica.
Mário Cícero Falcão
Boa leitura!
Departamento colaborador:
Oftalmologia
Informações Técnicas
Produção editorial
Mário Cícero Falcão
Salvi Cruz
Sociedade de Pediatria
de São Paulo Editor da Diretoria de Publicações
Jornalista responsável
Paloma Ferraz (MTB 46219)
Revisão
Rafael Franco
Projeto gráfico e diagramação
Lucia Fontes
Foto de capa
© kiankhoon
depositphotos.com
Periodicidade: bimestral
A criança que pisca muito: o que pode ser?
por Márcia Keiko Uyeno Tabuse
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Versão eletrônica: www.spsp.org.br
Contato comercial
Karina Aparecida Ribeiro Dias:
karina.dias@apm.org.br
Malu Ferreira:
Alteração da visão de cores: do diagnóstico ao tratamento
por Maria Fernanda Abalem e Rosa Maria Graziano
7
malu.ferreira@apm.org.br
Contato produção
Paloma Ferraz:
paloma@spsp.org.br
Torcicolo de origem ocular: como diferenciar?
por Iara Debert
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ISSN 2448-4466
A criança que pisca muito:
o que pode ser?
Márcia Keiko Uyeno Tabuse*
A criança que pisca muito: essa é uma queixa frequente minar com uma gota de colírio de proximetacaína e fluo-
nos consultórios de pediatras e oftalmologistas e que le- resceína que irá corar alguma lesão na córnea (Figura 1).
vanta dúvidas quanto às possíveis causas. Seria urgente? Nesses casos, a retirada do corpo estranho e oclusão por 24
Algo que devemos ou não fazer um exame mais minucioso? horas trará alivio e ajudará a regeneração da córnea.
Crianças de todas as idades podem apresentar esse sinal Lactentes com fotofobia intensa, lacrimejamento e pis-
de piscar frequente e vai depender da idade, do momento car excessivo podem indicar distrofia na retina do tipo
de aparecimento e de outros sinais oculares para fazermos acromatopsia e distrofia de cones. O diagnóstico é feito
as hipóteses diagnósticas. com exames eletrofisiológicos da retina.
Durante a anamnese, perguntar sobre sintomas e sinais Outra causa mais benigna ocorre quando os cílios entram
associados como hiperemia, lacrimejamento, secreção, na parte interna das pálpebras, ou porque são muito longos
prurido e se o piscar é bilateral ou não. Além disso, obser- ou quando existe um entrópio (pálpebras viradas para den-
var discretamente se a criança apresenta, além do piscar, tro). Nesses casos, uma inspeção minuciosa com lanterna
outros tiques motores. pode detectar esses cílios e reposicioná-los (Figura 2).
Figura 1 Figura 2
Úlcera traumática na córnea corada com colírio de Entrópio de pálpebra com cílios voltados para dentro.
fluoresceína.
Fonte: https://www.msdmanuals.com/pt/profissional. Fonte: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-72802009000100010.
Figura 4 Figura 5
Nódulos de trantas no limbo. Ceratite por herpes corado com fluoresceína.
rpped.com.br
6 Pediatra Atualize-se | Ano 6 • nº 1
Alteração da visão de cores:
do diagnóstico ao tratamento
Maria Fernanda Abalem* e Rosa Maria Graziano**
O conhecimento das doenças que podem acometer o albinismo e distrofias hereditárias da retina. Neste caso,
olho e a visão, quando avaliar e o que observar permitem na consulta inicial, já podemos descartar algumas hipó-
o diagnóstico e tratamento precoces e, com isso, contri- teses diagnósticas. Com a realização da biomicroscopia
buir para a prevenção da cegueira infantil. Neste texto do segmento anterior, podemos descartar a presença de
abordaremos causas de alterações de visão de cores em albinismo, já que não observamos atrofia e transilumi-
crianças e como conduzir esses casos. nação da íris. É importante ressaltar que nem sempre o
fototipo de pele é suficiente para excluir o albinismo. É
Caso clínico comum não percebermos uma pele mais clara em famí-
Uma criança de cinco anos é levada ao oftalmologista lias de origem caucasiana, além da variedade de tipos de
pelos pais após encaminhamento pelo pediatra. Nota- albinismo.1
ram que desde cedo tem sensibilidade à luz e apresenta Com a realização da fundoscopia sob midríase, descar-
discreto “tremor” nos olhos. A mãe refere pré-natal sem tamos a presença de neuropatias anteriores, uma vez que
intercorrência. A criança nasceu de termo, sem com- a papila óptica estava normocorada. O daltonismo tam-
plicações. Na maternidade e posteriormente, o teste do bém pode ser afastado, uma vez que não cursa com foto-
olhinho apresentou reflexo vermelho normal. Apresen- fobia e nem redução da acuidade visual. O teste de Ishi-
ta desenvolvimento motor e percentil para peso e altura hara é capaz de identificar as pranchas, porém de forma
adequados para a idade. No entanto, a criança apresenta específica. No entanto, não podemos ainda excluir neu-
dificuldade para acompanhar as atividades escolares e ropatias posteriores, as quais nem sempre apresentam
apresenta alguma dificuldade para identificar cores das alterações na papila óptica. Quando há suspeita de neu-
suas roupas. A criança tem um irmão mais velho (oito ropatias posteriores, devemos prosseguir com avaliação
anos) e os pais negam casos semelhantes na família. neuropediátrica e exames de imagem, em especial a res-
No exame oftalmológico, a criança apresentou acuida- sonância nuclear magnética. Neste caso, como não obser-
de visual de 20/60 (letra de tamanho intermediário na vamos outros sinais sistêmicos e neurológicos, optamos
tabela de acuidade visual) após correção com refração por expandir a investigação para distrofias retinianas.
estática e objetiva (+1,50 dioptrias esféricas em ambos os As distrofias retinianas são um grupo heterogêneo de
olhos); motilidade ocular extrínseca sem alterações, ex- doenças hereditárias que podem ser subdiagnostica-
ceto pela presença de nistagmo horizontal leve; e reflexos das na infância e podem ocorrer como doenças isoladas
fotomotores (direto e consensual) reduzidos. No teste de ou associadas a síndromes. Do ponto de vista clínico, as
Ishihara (teste de visão de cores) não acertou nenhuma distrofias retinianas que causam predominantemente
prancha. Na biomicroscopia do segmento anterior não alteração da visão de cores e fotofobia podem ser divi-
apresentou alterações. Na fundoscopia, observamos ner- didas em: acromatopsia, que é uma distrofia de cone de
vo óptico normocorado, mácula com brilho preservado, início precoce, causada por mutações nos genes CNGB3 e
arcadas vasculares e periferia retiniana sem alterações. CNGA3; distrofias de cones, que são distrofias que se ma-
Não foram observadas lesões tumorais, lesões cicatriciais nifestam um pouco mais tardiamente, causadas por mu-
e sinais inflamatórios. tações em diversos genes, como por exemplo o KCNV2;
distrofia de cones-bastonetes, em que há degeneração de
Investigação diagnóstica ambos os tipos celulares, porém com predomínio de de-
Quando estamos diante de uma criança que apresenta generação de cones.
baixa acuidade visual desde os primeiros anos de vida, Existem formas de distrofias, como a amaurose congê-
acompanhada de alteração na visão de cores e fotofobia, nita de Leber que pode acometer crianças desde o nasci-
devemos considerar doenças de origem oftalmológica e mento e, embora o sistema de bastonetes seja mais afe-
doenças de origem neurológica. Dentre as doenças oftal- tado do que o sistema de cones, é comum observarmos
mológicas, devemos investigar daltonismo, neuropatias, redução grave da visão central e fotofobia.
A B Figura A
Atenuação da zona elipsoide de
forma bilateral e simétrica.
Figura B
Sinal de hiperautofluorescência
foveal.
grande importância, podendo ajudar na fotofobia e te momento não tem tratamentos aprovados. No entan-
baixa sensibilidade de contraste. As crianças podem to, já existem estudos em andamento envolvendo terapia
se beneficiar com lentes filtrantes tanto em condições gênica para o tratamento de acromatopsia causada por
fotópicas e escotópicas. Estas lentes são usadas para a variantes patogênicas nos genes CNGB3 e CNGA3.5 Muta-
redução da quantidade de luz que penetra nos olhos, ções no gene CNGB3 são responsáveis por 50% dos casos
proteção às radiações ultravioleta e infravermelho e de acromatopsia, enquanto mutações no gene CNGA3 são
luz visível, aumento do contraste e redução do ofus- responsáveis por 25% dos casos. Todos os estudos estão
camento. As lentes filtrantes âmbar, marrom ou cinza em fase II e prometem reduzir a fotofobia, melhorar a
são indicadas nas distrofias retinianas e comprome- visão central e reduzir a progressão da doença. Uma vez
timento de vias ópticas. Outros auxílios ópticos e não que essas terapias são gene específicas, para realização é
ópticos também podem ser empregados, como: lupas essencial a confirmação de variantes patogênicas em um
e telelupas para ampliação, condensação ou reposi- desses genes.
cionamento das imagens retinianas; material didá-
tico com letras maiores e mais grossas; optimização * Professora Assistente da Universidade de Michigan. Médica Assistente do Kellogg
Eye Center, Universidade de Michigan. Médica Assistente da Divisão de Clínica Of-
do contraste, interpondo uma folha amarela sobre o talmológica do Hospital das Clínicas da FMUSP. Pós-doutora pela Universidade de
texto para facilitar a leitura; teclados ampliados, mo- Michigan. Doutora em Oftalmologia pela Universidade de São Paulo.
nitores maiores, programas que fazem a leitura ou ** Departamento Científico de Oftalmologia da SPSP. Doutora em Oftalmologia
pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Ex-Presidente
controlam ampliação, contraste, brilho e cor confor- do Departamento de Oftalmologia Pediátrica da SPSP. Ex-Presidente da Soc. Bras.
me as necessidades individuais. de Oftalmologia Pediátrica do Conselho Brasileiro de Oftalmologia. Médica Assis-
Aconselhamento genético: por ser uma doença de tente da Divisão de Clínica Oftalmológica do Hospital das Clínicas da FMUSP.
herança autossômica recessiva, há 25% de chance do
paciente ter irmãos afetados e menos de 1% de chan- Referências
1. Abalem MF, Rao PK, Rao RC. Nystagmus and platinum hair. Jama. 2018;319:399-400.
ce de ter filhos com essa doença, considerando a mãe 2. Alahmadi BO, Omari AA, Abalem MF, et al. Contrast sensitivity deficits in patients with mutation-
não portadora da doença. -proven inherited retinal degenerations. BMC Ophthalmol. 2018;18:313.
3. Tsui E, Schempf TA, Besirli CG, et al. Imaging and testing in pediatric retina: a current review of the
literature. Int Ophthalmol Clin. 2019;59:15-37.
Perspectivas futuras 4. Dedania VS, Liu JY, Schlegel D, et al. Reliability of kinetic visual field testing in children with mutation-
-proven retinal dystrophies: implications for therapeutic clinical trials. Ophthalmic Genet. 2018;39:22-8.
A acromatopsia é uma doença genética, de herança au- 5. Bakall B, Hariprasad SM, Klein KA. Emerging gene therapy treatments for inherited retinal diseases.
Ophthalmic Surg Lasers Imaging Retina. 2018;49:472-8.
tossômica recessiva, de caráter progressivo e até o presen-
MARÇO LILÁS
ATENÇÃO AO CUIDADO DO BEBÊ PREMATURO
Campanha da Sociedade de Pediatria de São Paulo para destacar a
importância do seguimento diferenciado para os bebês prematuros