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Queda e ascensão da supply chain

Os brasileiros têm sentido os impactos da crise nas cadeias de fornecimento globais causada por pandemia e
guerra na Ucrânia, principalmente, os setores que usam componentes eletrônicos em geral, o farmacêutico e
o agronegócio online, sem sucesso, em busca de um hormônio de reposição que sua mãe toma. E é quase
certeza que, toda vez que vai ao supermercado, você vê a conta subir na participação percentual na renda
total familiar.

Os brasileiros têm muitas dessas histórias para contar ultimamente, e não estamos sós: o mundo inteiro sofre
os efeitos da disrupção das cadeias de fornecimento – e culpa a recente pandemia e a guerra da Ucrânia por
isso. Mas será que realmente estamos entendendo os bastidores dos acontecimentos?
Com a ajuda de Ely Paiva e de Bruno Lucchi descrevemos o contexto dos três setores acima:
automobilístico, farmacêutico e alimentício. Paiva é professor da Fundação Getulio Vargas em São Paulo
(FGV-Eaesp) e editor do Journal of Supply Chain Management para a América Latina. Lucchi é diretor
técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
No caso do carro, a linha de produção da montadora parou porque faltaram os componentes eletrônicos e
lanternas. A demanda por eletrônicos disparou com a onda do trabalho remoto em massa provocada pela
covid e com a expansão das redes 5G. Já a lanterna, que vem da Moldávia, no Leste Europeu, teve o
transporte atrasado por causa da guerra. (Sim, descobrimos depender de países pequenos.) E não havia
alternativas: a última fábrica de chips do hemisfério Sul, em Porto Alegre, fechou as portas em agosto de
2021 e não estavam ao alcance fornecedores de lanternas da Colômbia, por exemplo.
Você imaginava que o comércio mundial funcionava dessa forma? Justifique sua resposta.
Quanto ao medicamento, a cadeia de fármacos do Brasil tem hoje uma dependência superior a 70% de
fornecedores de China e Índia. A pandemia aqueceu a demanda por determinados medicamentos e, como era
de se esperar, os fornecedores priorizaram os mercados domésticos. E o Brasil tinha desinvestido em
fármacos nos últimos anos, sem considerar o chamado “supply risk”. Por fim, e a inflação da comida? Não
era razoável esperar custos estáveis nos alimentos quando alguns fertilizantes registraram aumento de preço
de 200% no de demanda e à alta do custo da energia que impactou a oferta.
O leitor sabe o que foi pior? Os produtores agrícolas brasileiros, que importam 70% de seus fertilizantes, em
muitos casos ainda não tinham negociado a compra para o plantio de 2022 – que ocorre no início do ano
(embora sejam aplicados entre setembro e novembro), porque esperavam queda nos preços.
Citando três setores que sofreram alto impacto no Brasil, consideramos descritos, em sua essência, os
bastidores da crise global das supply chains. Descritos, mas ainda não explicados
Glossário:
Supply chain. É o termo guarda-chuva da gestão da cadeia de fornecimento. Inclui planejamento estratégico, procurement, sourcing,
serviços de informações;
Logística – indo até a entrega ao cliente final. Softwares SCM ajudam nessa gestão. Logística. Cuida do transporte e distribuição de
produtos, com tecnologias de monitoramento e gestão da segurança;
Procurement. É o processo inteiro de obtenção de bens e serviços, que inclui pesquisa de mercado, negociação de preços, contratos e
pagamentos, sourcing etc.
Sourcing/sortimento. Busca fornecedores considerando a necessidade da empresa e avaliando qualidade, custo, lead time, rivais,
pedido mínimo etc.
De onde veio, aonde está indo
As empresas estão se resguardando com o aumento do estoque para evitar essa falta de produtos, entendendo
que tanto as entregas como os pedidos são distorcidos por efeitos do coronavírus e da guerra na Ucrânia
sobre a produção e o transporte de insumos. E estão preparadas para atuar assim por, pelo menos, mais seis
meses.
Porém muitos gestores têm a expectativa de que, tão logo haja paz no Leste Europeu e a covid-19 fique sob
controle, haja a normalização das cadeias de fornecimento. “Não vejo perspectiva de normalização; acho que
estamos diante de um novo paradigma para a supply chain”, afirma Paulo Resende, professor de logística e
supply chain da Fundação Dom Cabral (FDC) e membro do Supply Chain Council dos EUA. Um paradigma
marcado por instabilidade e incerteza, de um lado, e empoderamento da cadeia de demanda de outro.
Em outras palavras, a instabilidade já vinha se impondo; foi identificada pelo sociólogo Zygmunt Bauman
em 1992 (a “modernidade líquida”) e confirmada pelo atentado às Torres Gêmeas em 2001. Pandemia e
guerra apenas fizeram reforçar o ambiente instável. E “logística e a supply chain não aturam instabilidades”,
como lembra Resende.
O empoderamento da cadeia de demanda, por sua vez, também já ocorria, porém “é o fenômeno menos
estudado no mundo”, na visão de Resende.
“Temos três cadeias que trabalham em total interação: a de demanda, a produtiva e a de suprimentos. Até
duas décadas atrás, as duas últimas tinham forte interação e a cadeia de demanda, formada por quem
consome – o indivíduo, as redes de varejo, os canais de distribuição –, era quase vítima das combinações
entre as duas”, diz o especialista da FDC. “Então, de repente, isso se inverteu: o mundo teve de começar a
adaptar as cadeias produtivas e de suprimentos para responder a essa cadeia de demanda. A cadeia de valor
mudou; quem define o valor hoje sou eu. É a famosa customer centricity (estratégia que busca colocar o
cliente no centro de todas as decisões tomadas pela empresa).”
Pesquise 02(duas) definições para cada tipo cadeia de demanda, cadeia produtiva e cadeia de suprimentos
seguindo o modelo apresentado a seguir;
Segundo Prado e Santos (2022) cadeia de demanda é ...........................................................
PRADO, João José Silva; SANTOS, Pedro Paulo Assis. Conceitos de Supply Chain Management. São
Paulo: Editora Nova, 2023. Modelo para citar livros.
PRADO, J. J. S.; SANTOS, P. P. A. O maior circo do mundo. Revista do Centro de Ciências Naturais e
Tecnologia – CCNT, v. 10, n. 5, p. 10 – 20, 2022. Modelo para citar artigos publicados em revistas
científicas
A luta contra a instabilidade e a necessidade de atender à cadeia de demanda fazem com que o risco de
fornecimento, ou supply risk, passe a ser extremamente relevante. Isso gera três tipos de medidas:
investimentos em tecnologia e dados, novos relacionamentos comerciais – regionais, bilaterais etc. –,
desenvolvimento de mais fornecedores locais {veja o quadro abaixo}.
Quatro cenários para a supply chain
Eles surgem num espectro que vai da globalização à localização e leva em conta o uso de tecnologia. Os
quatro cenários podem coexistir, mas hoje se acredita que o nº 3 seja o mais provável. Os cenários foram
traçados por hsm management a partir dos insights dos especialistas entrevistados
1. Global (ultra) digital. As cadeias seguem como antes da covid-19, só que com altíssima conexão e
logística cada vez mais sofisticada. Tecnologia é a matéria-prima para a supply chain de alta performance,
com mais tecnologia e mais inovações: máquinas, aviões, navios, portos têm alto nível de automação;
computadores e softwares têm muita capacidade; uso avançado de dados viabiliza uma velocidade de
resposta aos mercados impressionante. Joga-se o mesmo jogo, mas com um nível de digitalização tal que
predição e resiliência aumentam muito. O Brasil pode conseguir jogá-lo se conseguir evoluir bastante, e
rápido, no uso de tecnologias/dados e no modelo de gestão.
2. Polarização. Há dois grandes grupos de países. O primeiro se esforça para tornar as cadeias mundiais o
mais estáveis possível, com cada país desenvolvendo estratégias de relacionamento comercial multilaterais
(menos dependente de China ou Leste Europeu) e investindo mais em tecnologia, dados, inovação. O
segundo grupo de países, que cresce, rejeita a globalização e a própria economia digital. Por ter empresas
comparativamente menos digitalizadas e ser menos atuantes nas cadeias globais de produção, esses países
ficam mais à mercê da instabilidade, já que continuam a ser consumidores globais. O Brasil pode estar em
qualquer um dos dois grupos.
O autor afirma que o Brasil poderia estar em qualquer grupo, você concorda? Em qual dos grupos você sente
que o BR é mais forte? Por quê?
3. Ênfase no regional. Há um reagrupamento das cadeias de fornecimento regionais, (“reshoring”), como o
Nafta, e os volumes de compras globais diminuem. Voltam à baila os acordos bilaterais. É o cenário mais
provável, diz Pedro Moreira, da Abralog, a julgar pelas ações da América do Norte e Europa – de reduzir
dependência de fornecedores – e pela China, que já vinha buscando mais insumos nos vizinhos e na África.
O Brasil pode se sair bem se converter em acordo a proximidade com os EUA, mas Paulo Resende, da FDC,
lembra que, caso se criem “cadeias egoístas, do tipo cada um por si”, haverá deseconomia de escala e custo
maior, e talvez retrocesso tecnológico.
4. Local sensato. Fortalecem-se as cadeias produtivas e de fornecimento nacionais, mas sem fechar as
economias. O Japão e a Europa já vêm dando sinais de insourcing, ou seja, trazendo produtores de volta para
o mercado interno. O Japão, por exemplo, abriu linha de crédito para que as empresas voltassem a produzir
lá. No Brasil, esse movimento ainda é tímido. Os setores mais afetados, como o de produtos hospitalares,
estão revendo sua dependência excessiva da China e passaram a desenvolver mais produtores locais, mas
ainda falta muito para reduzir a grande ociosidade das cadeias – sobram caminhões e armazéns subocupados,
segundo a Abralog.
Você concorda com a ideia de trazer de volta para o nosso país, empresas brasileiras, que se expandiram,
construindo fábricas no exterior? Justifique sua resposta.
Como diz Cristiano Rios, sócio de supply chain da consultoria KPMG no Brasil, “agora o monitoramento da
situação financeira e operacional dos fornecedores e os algoritmos que possam trazer predição de ruptura e
precificação passam a ser extremamente relevantes para minimizar impactos de desabastecimento nas
operações”. Para Rios, “os investimentos em tecnologia de ponta e a utilização de inteligência artificial e
machine learning (é a ciência do desenvolvimento de algoritmos e modelos estatísticos que os sistemas de
computador usam para realizar tarefas sem instruções) já estão dando suporte à transformação digital das
áreas de sourcing (é o processo de encontrar, avaliar e decidir qual o fornecedor que atende aos anseios de
sua empresa e assim realizar negócios ) e procurement (é o processo de compra e venda de suprimentos e
serviços)”, no Brasil e no mundo todo.
É na direção da regionalização que governos e empresas estão se movendo. Nos EUA, por exemplo, fala-se
muito de fortalecimento das cadeias de suprimentos a partir do Nafta. “Fazia tempo que não ouvíamos a
expressão Nafta, mas o {presidente} Joe Biden tem uma política de reindustrialização do México, para estar
próximo, controlar e ter menos instabilidade logística”, afirma Resende. Também o Mercosul, até há pouco
desprezado, ensaia voltar à agenda. “Ainda não há defesa explícita do Mercosul, mas notei que na nova
promessa de redução de alíquotas de IPI {imposto sobre produtos industrializados}, em abril, logo se
preocuparam em dizer que não podem ser abaixo das alíquotas do Mercosul.”
Para Pedro Moreira, presidente da Associação Brasileira de Logística (Abralog), também já está nítido que o
mundo volta-se para uma maior regionalização. “Nunca se viu a Europa tão unida como agora. Há uma
discussão na Inglaterra de haver uma espécie de arrependimento de ter saído do bloco europeu. Boris
Johnson anda bem atuante na Europa, inclusive.”
Quanto ao Brasil, mais do que Mercosul, Moreira acredita que reforçaremos “os relacionamentos com toda
América Latina, com os Estados Unidos e com a parte ocidental da Europa. Essa tendência é uma forma de
minimizar os rompimentos e de reduzir os custos logísticos, que subiram significativamente nos últimos dois
anos”, diz ele.
Estudando comércio exterior, você percebe a ocorrência dessa busca pela redução de custos logísticos? Em
seu entendimento o que motiva esse interesse? Quais os setores se apresentam como mais interessados nessa
redução?
O presidente da Abralog ainda aponta uma tendência de “local manufacturing”, em que as indústrias estão
oferecendo suporte para o desenvolvimento de fornecedores locais, e governos tomam medidas também – no
Brasil, a intenção do governo de reduzir alíquotas de IPI visaria promover uma “reindustrialização” do País.
Yannick Laporte, CEO da Sonepar Brasil, que vem lidando diariamente com as disrupções em componentes
eletrônicos, crê que fornecedores locais brasileiros poderiam, além de atrair empresas baseadas aqui,
fornecer para outros países. “Mesmo se as coisas normalizarem, as companhias seguirão atentas a novos
fornecedores para não ficarem reféns de China e Leste Europeu”, diz. {leia mais no quadro abaixo}
Você concorda coma a afirmação feita pelo CEO da Sonepar Brasil: “Mesmo se as coisas normalizarem, as
companhias seguirão atentas a novos fornecedores para não ficarem reféns de China e Leste Europeu”? Por
quê?
Uma chance para os fornecedores nacionais CEO da Sonepar Brasil destaca agilidade e bom atendimento dos
locais
As aventuras da Sonepar Brasil para conseguir os materiais elétricos e de automação que distribui a 20 mil
empresas não estão perto de acabar. “Achávamos que as coisas iam se normalizar em 2022, mas os impactos
da guerra na Ucrânia e novos lockdowns em cidades da China devem disruptar o fornecimento de
componentes eletrônicos até o fim do ano”, diz Yannick Laporte, CEO da multinacional francesa no Brasil,
onde atua por meio de Nortel, Dimensional e Eletronor. A previsão de normalização foi empurrada para
2023.
Sempre priorizando a performance e métricas como o OTD (on time delivery - entregas no prazo), a empresa
tem trabalhado com fornecedores internacionais e locais, e vê ambos afetados pela falta de materiais. “Mas
diria que, neste momento de falta de contêineres, os nacionais têm mais agilidade e melhor atendimento”,
afirma Laporte. Para o futuro, a seu ver, o Brasil é uma boa opção de lugar para desenvolver fornecedores.
“É uma região geopolítica mais segura, tem muitos recursos naturais e uma cultura industrial de longa data”,
analisa. “Se o País continuar a modernizar sua infraestrutura e as empresas continuarem a trabalhar na
produtividade e competitividade, tem muitas oportunidades.”
Por que é necessário o BR modernizar sua infraestrutura e as empresas continuares a trabalhar na
produtividade ecompetitividade? Justifique sua resposta
Desafios brasileiros
Todos os entrevistados concordam que nosso desafio número um é a desigualdade. “Conseguimos praticar
desigualdade em educação, saúde e até em supply chain. Um centro de controle operacional de empresas no
Brasil é de última geração, mas o caminhão passa por áreas cinzas, sem qualquer comunicação”, analisa
Resende.
Você concorda com a observação feita pelo Prof. Dr. Paulo Resende (Unicamp) que “Conseguimos praticar
desigualdade em educação, saúde e até em supply chain. Um centro de controle operacional de empresas no
Brasil é de última geração, mas o caminhão passa por áreas cinzas, sem qualquer comunicação”. Por quê?
Bruno Lucchi, da CNA, enfatiza os contrastes de acesso a tecnologias. “Parte do nosso agro já tem internet
das coisas para medir a qualidade do solo em tempo real, machine learning que permite tomar decisão com
dados captados por sensores e por imagens feitas com drones, tecnologia 5G própria. O problema são as
propriedades em que o celular não pega – temos só 23% de conectividade no campo, somando os modelos
4G, 3G e 2G, segundo o Censo de 2017 –, ao longo das estradas em que ninguém passa quando chove”, diz
Lucchi.
O Brasil exibe disparidades também em modelo de gestão, lembra o presidente da Abralog. “Temos casos de
ponta de práticas, em multinacionais instaladas aqui e em grandes companhias nacionais, mas há as que
ainda engatinham no desenvolvimento logístico e na cadeia de suprimentos. A empresa que não pensa em ser
mais digital e em buscar melhoria de processo está ficando fora do jogo.”
Quais são os motivos que favorecem o surgimento de situações como: “Temos casos de ponta de práticas, em
multinacionais instaladas aqui e em grandes companhias nacionais, mas há as que ainda engatinham no
desenvolvimento logístico e na cadeia de suprimentos. A empresa que não pensa em ser mais digital e em
buscar melhoria de processo está ficando fora do jogo.”
Laporte igualmente ressalta as diferenças de maturidade de gestão nas áreas de procurement das empresas.
Entre os 20 mil clientes corporativos que Sonepar tem no Brasil, os graus de maturidade dos departamentos
de compras variam muito. “Alguns são muito avançados e estratégicos, focando total cost of ownership
{análise de todos os custos}, pedindo para trazer soluções digitais para melhorar sua eficiência,
produtividade e controle. Esses embasam suas decisões em dados e favorecem um trabalho colaborativo com
os fornecedores para solucionar melhor os problemas dos seus clientes internos”, diz o CEO. Já outras
empresas estariam bem longe disso – o foco é em preço e fim.
Isso traz à tona as vulnerabilidades específicas, em talentos de supply chain e em processos. Para Moreira,
mais profissionais precisam estar preparados para buscar soluções de forma dinâmica, criativa e colaborativa,
perdendo o medo de compartilhar informações com concorrentes para encontrar soluções conjuntas. “Impera
um darwinismo ao qual o profissional tem de se adequar com rapidez e resiliência. Não dá mais para esperar
três meses por uma decisão.”
Por que existe esta carência de profissionais? Quais causas principais desta carência? Cite as três mais
importante em seu ponto de vista.
O especialista da FDC acha que a mão de obra está mais avançada do que os processos, que requerem
investimento em tecnologia, em processamento de dados, em modelagem de software. “Temos de trabalhar
mais com o conceito de total cost ownership, entendendo que os ganhos não estão só no momento da compra
porque há custos ocultos que vão aparecer lá na ponta; fazer planejamento de demanda e suprimento (CPFR,
na sigla em inglês); ter uma integração com clientes e fornecedores: tudo depende de gente preparada, é
claro, mas também de processos. O Brasil precisa evoluir muito”, afirma Paulo Resende.
“Tudo depende de gente preparada, é claro, mas também de processos”. O ser humano é vital para o sucesso
das organizações, independente das atividades que elas desenvolvam. Quais os setores nós, brasileiros nos
destacamos? Por quê?
Os especialistas fazem coro sobre o modo de superarmos nossos desafios: é preciso ação do governo. Lucchi
cobra que políticas públicas de infraestrutura deem uma condição de igualdade ao pequeno e médio produtor.
É lamentável que, “apesar de sermos a maior bacia hidrográfica do mundo, o transporte por hidrovias seja
incipiente”, adiciona Ely Paiva, da FGV-Eaesp; a região Centro-Oeste se beneficiaria muito dele.
Quais ações você recomendaria para o governo reverter o quadro de que “é preciso mais ação do governo”?.
Justifique a cada escolha que você fizer.
O professor da FDC cobra mais estratégias nacionais. “Cadê a estratégia para reduzir nossa dependência do
papel chinês, sendo que nós vendemos celulose para a China, por exemplo?”.
Rios, da KPMG, sugere que investimentos na infraestrutura logística, linhas de financiamento específicas e
regimes especiais no âmbito tributário sejam rapidamente estudados “para que o Brasil consiga se posicionar
de forma estratégica no mercado global”.
Oportunidades do país
“Se tivermos maior participação na governança das cadeias globais, agregando valor aos produtos e fazendo
esses produtos chegarem aos mercados com maior valor agregado, vamos gerar riqueza”. Para Ely Paiva,
essa é a primeira oportunidade na mesa se fizermos uma reinvenção em supply chain.
O especialista tem exemplos. “Por incrível que pareça, o café é uma das cadeias que mais movimenta
dinheiro no mundo – alguns calculam que só perca para o petróleo – e o Brasil é o maior produtor global. No
entanto, o produtor de café no Brasil é considerado um produtor de commodity mundialmente. Imagine
mudar isso?”. O mesmo vale para proteína animal – “nossa carne é exportada quase in natura” – e para soja –
“exportamos até água”.
Você sabia que até bem pouco tempo nosso país importava cápsulas usadas nas máquinas de fazer café,
mesmo sendo o maior produtor mundial de grãos de café. Por que você acha que acontece isso?
Se houver uma melhor supply chain, a agregação de valor é a tendência natural no agronegócio, diz Bruno
Lucchi, da CNA, por haver maior procura global por produtos com diferenciais, seja no sistema produtivo,
seja de características organolépticas (percebidas pelos sentidos – olfato, visão, paladar e tato). No primeiro
caso, segundo Lucchi, é possível agregar o valor da produção sustentável, já que a área de preservação em
nossas propriedades rurais gira em torno de 33%. “Significa que, quando eu exporto soja, ela tem pelo menos
20% de reserva legal embutida, coisa que outros países produtores não têm; o mesmo ocorre com a carne.”
No caso dos diferenciais organolépticos, hoje vistos como mercados de nicho aqui, a tendência é elevar a
régua.
Uma boa notícia são os experimentos de alguns setores. A indústria de calçados vem trocando a venda de
produto de baixo custo por esforços de marcas. As de móveis e de vinhos também.
Outra boa notícia é que temos alavancas – na transformação digital em curso nas empresas, em pessoas,
energia e capacidade. Quanto às pessoas, o perfil dos gestores novos é menos do profissional sem talento que
“sonhava ter o retrato de funcionário do mês na parede por ter explorado o fornecedor” e mais do strategic
sourcing, como diz Resende. Em energia, “nossas fontes renováveis criam oportunidades de baixar custos
com logística”, afirma Moreira, além de gerarem valor ESG. Em capacidade, a Abralog cita a ociosidade na
cadeia de fornecimento do Brasil – que, se for endereçada por meio de colaboração entre players, pode ser de
grande valia.
A segunda oportunidade na mesa é um sonho – de Resende: “que a supply chain seja voltada ao
desenvolvimento regional de comunidades carentes”.
NOS ÚLTIMOS DOIS ANOS, A SUPPLY CHAIN ganhou o status estratégico que sempre mereceu ter; já é
mais importante que vendas em alguns setores. Só falta deixar de ser dominada pelas corporações do norte,
como diz Paiva, e dar chance aos países periféricos.

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