Você está na página 1de 39

JUSTIÇA 2

- episódio 5 -

Série criada e escrita por


Manuela Dias

Colaboração: Walter Daguerre


Pesquisa: Aline Maia

(23.01.23)
RETROSPECTIVA: cenas da trama no episódio 1.

1 EXT. RESTAURANTE NO PONTÃO DO LAGO SUL - DIA 1


(Dia 1) CONT da cena 50 do ep 01. Balthazar diante de
Cassiano, que está na expectativa da resposta.
BALTHAZAR
Olha, Cassiano, eu te confesso que
eu tenho muito ódio do Nestor e da
mulher dele, a dona Silvana. Eles
me reconheceram por um assalto que
eu não fiz.
(t)
E também... quando eu penso na
pessoa que reconheceu minha foto lá
naquele catálogo de suspeitos...
catálogo de pretos, né? Sem nunca
nem ter me visto, essa pessoa me
condenou por assassinato... É claro
que eu sinto raiva.
(t)
E não é raiva só por mim não. É
raiva por todos os pretos. Porque
ninguém me tira da cabeça que o que
aconteceu comigo foi racismo. Você
sabe disso... Tem gente que olha e
acha que preto é tudo igual, tudo
parecido. E aí vai lá e reconhece
qualquer um na foto.
(t)
Então, se você me perguntar se eu
tenho ódio do que aconteceu, é
claro que eu tenho. Foram sete anos
na cadeia... Eu apanhei, fiquei
doente. Não fui no enterro de minha
avó. Passei a pandemia toda preso.
(t)
Vi muita gente morrer do meu lado.
Teve um cara que morreu dormindo,
outro morreu chamando a mãe... O
Carlinhos morreu vendo a cela cheia
de borboletas.
(t)
Quando eu vi aquilo, foi a melhor
morte. É um tipo de inteligência
ficar meio doido antes de morrer.
(t)
Depois de tudo isso o coração fica
meio grosso, sabe? Calejado.
(t)
Mas eu sou uma pessoa de fé. Eu
acredito na vida.
(MORE)
2.

BALTHAZAR (CONT’D)
E é nela que eu quero me aferrar.
Não é em negócio de vingança. Minha
avó já morreu, mas eu sigo ouvindo
os conselhos dela, sussurrando no
meu ouvido.
(t)
Se eu soubesse que sua ajuda tinha
esse preço, não tinha aceitado. Mas
cada um sabe de si, também não
quero que você se ofenda porque eu
não quero te ajudar.
CASSIANO
Não... o que é isso? Não me ofendo
de jeito nenhum!
(t)
Na verdade eu fico até com inveja
de você.
(t)
Eu fiz tudo certo na minha vida,
Balthazar. E a gente é ensinado
assim, que se fizer tudo certo vem
o prêmio, vem a recompensa. Se
comer tudo, ganha sobremesa. Se
treinar muito, ganha a medalha...
Isso seria o justo. Mas quando eu
olho pra minha vida, eu vejo que a
Justiça não existe.
(t)
Uma pessoa como o Nestor não pode
se dar bem na vida... Pra mim é uma
questão de Justiça.
BALTHAZAR
Eu entendo...
CASSIANO
Mas não pense que eu vou abandonar
seu caso, porque você não quer me
ajudar.
BALTHAZAR
Não...?
CASSIANO
Claro que não. Eu comecei e vou com
você nessa até o final.
(t)
Está faltando justiça no mundo,
Balthazar, e o que eu puder fazer
pra melhor isso, eu vou fazer. Seja
melhorando a sua vida ou piorando a
vida do Nestor.
(MORE)
3.

CASSIANO (CONT’D)
(pega mil reais e dá pra
Balthazar)
Toma aqui, ó.
BALTHAZAR
O que é isso?
CASSIANO
Mil reais. Eu sei que é pouco pra
recomeçar a vida... Mas é o que eu
posso te dar e é melhor que nada.
BALTHAZAR
Eu nem sei o que dizer, Cassiano...
Olha, eu vou lhe pagar tudo isso de
volta, viu? E, não sendo pra essa
coisa de vingança, você conta
comigo, de verdade.

2 EXT. PRAIA LAGO NORTE - PÔR DO SOL 2


(Entardecer 1) (Cena conjunta: ep 8, cena 5.) Balthazar nada
sozinho. Ele emerge e submerge, nada por debaixo d’água.
A prainha de areia fica na beira do lago. Movimento de fim de
tarde. Caiaques enfileirados para aluguel, algumas pessoas
com isopor, um vendedor de algodão doce, um bar ao fundo onde
Milena conversa com Luara - sem destaque.
Balthazar, de dentro d’água rasa e sem onda, olha tudo ao seu
redor com nostalgia, enquanto o Sol se põe.

3 EXT. ESTRADA ENTRE CEILÂNDIA E BRASÍLIA / ÔNIBUS - NOITE 3


Tráfego intenso de final de dia. Balthazar dentro do ônibus,
sentado na janela, olha o trânsito lá fora.

4 EXT. ESTACIONAMENTO / MOTOBOY AMIGO - NOITE 4


(Noite 1) Estacionamento quase sem carros em Ceilândia. A
empresa Motoboy Amigo funciona em um contêiner que fica num
estacionamento. Balthazar está do lado de fora, aguarda.
Até que Larissa (agora com 25 anos) sai do contêiner junto
com um entregador, FERNANDO (27).
LARISSA
Valeu, Fernando! Arregaçou hoje.
Amanhã tâmo junto! Você está no
turno da manhã, tá?
4.

FERNANDO
Boto fé!
Fernando acena, sobe em sua moto e se afasta.
Balthazar, que estava em um canto, se revela. Larissa mal
acredita no que vê.
LARISSA
Balthazar... Eu não acredito!
Balthazar sorri. Emoção intensa. Larissa se aproxima dele. Os
dois ficam próximos, olhos nos olhos, até que Larissa abraça
Balthazar, emocionada.
LARISSA (CONT’D)
Eu não acredito que você está aqui.
BALTHAZAR
Nem eu.

LARISSA
Como você está?

BALTHAZAR
Eu estou bem.

Larissa respira e controla sua emoção. Balthazar sorri para


ela que retribui. Os dois se sentam na porta do contêiner.

BALTHAZAR (CONT’D)
Você está linda...

LARISSA
Você está... forte. Malhou foi?

Balthazar sorri doce, faz que sim - mas agora existe uma
tristeza dentro dele que não existia antes da prisão.

BALTHAZAR
E sua mãe?

LARISSA
Está bem.
(t)
Onde você está ficando?

BALTHAZAR
Aluguei um barraquinho no Sol
Nascente mesmo.

LARISSA
Alugou?
5.

BALTHAZAR
É, um amigo meu... meu advogado, na
verdade, ele me emprestou mil
reais.
LARISSA
E a casa da sua avó?
BALTHAZAR
Perdi. Foi pra leilão.
LARISSA
Não acredito...
BALTHAZAR
Mas sabe o que eu recuperei? A sua
bike!
LARISSA
Mentira!
BALTHAZAR
Sério! Vou dar um grau nela, e
deixar novinha pra te devolver.
LARISSA
Não precisa devolver, Baltha. Fica
com ela.
Larissa com dó dele, tenta não transparecer, sorri.
BALTHAZAR
Não precisa ficar com pena de mim
não, Crocância... Eu vou dar a
volta por cima, você vai ver!
LARISSA
(encantada)
Eu sei que você vai.
BALTHAZAR
Muito esparrado esse contêiner. É
uma cooperativa de entregadores,
né?
LARISSA
É... Dá um trabalho da porra!
BALTHAZAR
Você é danada, né? Tem as manha,
disse que ia se livrar dos
aplicativos e se livrou mesmo. Eu
tenho muito orgulho de você.
6.

LARISSA
Que é isso, Baltha...?
BALTHAZAR
É verdade... E, ó, quando eu
comprar uma moto vou querer entrar
pra essa cooperativa, viu?
LARISSA
(ri de nervoso)
É?
BALTHAZAR
Que foi?
LARISSA
Ah... você sabe que eu estou com o
Túlio, né?
BALTHAZAR
Fiquei sabendo... Mas não estou
querendo entrar na cooperativa do
namoro não, só das entregas mesmo.
(gosta)
Que que pega, seu namorado tem
ciúmes de mim?
LARISSA
O Túlio não tem ciúmes de você, ele
morre de ciúmes.
BALTHAZAR
(olha pra ela com muita
paixão)
Que bom. Diz pra ele ficar esperto
mesmo, que eu tô na área.
LARISSA
(gosta, também é
apaixonada por ele)
Figura...
(fax menção de ir)
Eu tenho que ir. Como eu te acho?
Qual seu telefone?
BALTHAZAR
Estou sem telefone, por enquanto.
LARISSA
Nossa, sem telefone!?
BALTHAZAR
Mas eu vou resolver. Pode deixar
que eu apareço.
7.

Larissa pega um cartão dentro da capinha de seu celular e


entrega pra Balthazar.
LARISSA
Toma, meu cartão. Quando pegar um
celular, me liga pra dar o número.
Clima entre os dois, ainda se gostam.

5 EXT. RUAS SOL NASCENTE / BARRACO BALTHAZAR - NOITE 5


Balthazar anda empurrando a bicicleta de Larissa, que agora
está velha e enferrujada, até um barraco feito de vários
materiais (telha de zinco, tapume, etc). Balthazar entra no
pequeno barraco com a bicicleta.

6 INT. BARRACO BALTHAZAR - NOITE 6


(Noite 1) O espaço é bem exíguo. Apenas uma colchonete sem
lençol no chão e uma cadeira onde ficam as poucas roupas.
Sobre folhas de jornal, Balthazar reforma a bicicleta que
está velha e enferrujada.
Em cortes descontínuos, Balthazar lixa, desamassa a roda,
pinta, troca correia, etc.

7 EXT. RUAS SOL NASCENTE - AMANHECER 7


(Dia 2) Amanhece na favela plana de chão de terra, com casas
e barracos de um andar.

8 INT. BARRACO BALTHAZAR - DIA 8


(Dia 2) Bike pronta. Balthazar acorda.

9 EXT. RUAS SOL NASCENTE - DIA 9


(Dia 2) Balthazar anda de bike, saindo do Sol Nascente.

10 EXT. SAÍDA SOL NASCENTE / RUAS DA CEILÂNDIA - DIA 10


Balthazar sai do Sol Nascente e pedala na direção do centro
da Ceilândia.
8.

11 EXT. FACHADA RESTAURANTE CANTO DO BODE / CARRO SILVANA - DIA


11
(Dia 2) Balthazar chega de bike do outro lado da rua e olha
para o restaurante, que aparenta ter prosperado.
Na porta, Silvana (agora com 55 anos) coordena a entrada de
uma fila de 4 mesas de clientes, fala algo para o maître e
sai. Silvana entra em seu carro que está na porta do
restaurante e parte.
Balthazar atravessa a rua, se aproxima do restaurante, até
que entra e fala com um jovem garçom.
BALTHAZAR
Ôpa, bom dia, amigo... Seu Galdino
está aí?
GARÇOM JOVEM
Seu Galdino? Não sei quem é não...
BALTHAZAR
Ele é dono aqui do restaurante, pai
da Dona Silvana.
GARÇOM JOVEM
Não conheço não...
BALTHAZAR
Ah... tá bom então!
Garçom retoma o trabalho. Balthazar olha por ali e vê uma
foto enquadrada de Seu Galdino ao lado das fotos do avô e do
pai. Balthazar, triste, entende que Galdino morreu.

12 EXT. PETSHOP MUJILATI - DIA 12


(Dia 2) (Cena conjunta: ep 6, cena 17.) Carolina (abalada por
seus motivos) conversa com Balthazar de forma solícita.
BALTHAZAR
Eu não estou querendo emprego não,
estou querendo é trabalhar... Posso
receber só as gorjetas das
entregas.
CAROLINA
Eu entendi, mas é que agora a
petshop está trabalhando com
entrega de aplicativo mesmo e...
(t)
Na verdade eu estou até pegando
minhas coisas, porque não vou mais
trabalhar aqui.
9.

BALTHAZAR
Entendi... Desculpa a insistência
aí, é que eu estou precisando
mesmo.
CAROLINA
Imagina! Queria poder ajudar...
Aliás, ó... por que você não volta
aí na semana que vem? Volta e
procura minha mãe, dona Júlia. Eu
vou falar de você pra ela.
BALTHAZAR
Obrigado, viu? Valeu mesmo!
Balthazar sai dali pedalando.

13 EXT. QUINTAL DE UMA CASA NO SOL NASCENTE / FACHADA CASA - DIA


13
(Dia 2) Quintal abandonado. Plantas secas. Boa parte tomada
por tralhas como resto de cama, de armário, TV velha.
Balthazar limpa o quintal, carrega as coisas velhas até o
lixo, do lado de fora do portão.
Uma Senhora de 70 anos vem de dentro da casinha com uma
garrafa d’água e um copo para Balthazar que bebe a água.
SENHORA
Aqui, meu filho, uma aguinha...
BALTHAZAR
Obrigado, viu?
SENHORA
Quanta coisa que a gente vai
juntando que nem vê!
BALTHAZAR
É verdade.
SENHORA
Quer comer uma coisinha não?
BALTHAZAR
Agora eu prefiro adiantar o
serviço. Mas, depois, se ainda
puder querer, eu lhe agradeço...
Balthazar termina de beber água e a senhora entra na casa de
novo. Ele volta a trabalhar.
10.

Em cortes descontínuos: progride o trabalho de Balthazar, que


corta as plantas secas emaranhadas, capina o terreno, e
carrega os restos de planta para o lixo em sacos plásticos
grandes.

14 EXT. RUAS SOL NASCENTE - ENTARDECER 14


Pôr do Sol na cidade.

15 EXT. QUINTAL DE UMA CASA NO SOL NASCENTE - ENTARDECER 15


Trabalho finalizado. Balthazar come um prato ali na varanda.
A senhora vem de dentro com um copo de água e fumando um
cigarro.
SENHORA
Ficou muito bom, viu? Parece outro
quintal.
BALTHAZAR
Fico feliz que a senhora tenha
gostado! E, ó, estou precisando
trabalhar. Se souber de mais alguém
querendo limpar o quintal... Não
tenho medo de trabalho pesado não.
SENHORA
Ah, isso eu vi que não tem mesmo
não! Vou pegar seu telefone...
BALTHAZAR
Então... eu ainda estou sem
telefone.
SENHORA
Vilge! Tá sem celular?
BALTHAZAR
Pois é... Mas pode falar com dona
Márcia, na padaria, que eu sempre
passo lá pra buscar recado.
SENHORA
Perainda...
A senhora entra. Balthazar ali, segue comendo. A senhora
volta com um celular antigo, com fita crepe, e um carregador.
SENHORA (CONT’D)
Ó, é antigo, eu nem sei se está
funcionando, mas deve estar, porque
estava. Tem chip e tudo...
(MORE)
11.

SENHORA (CONT’D)
O número é esse que está na fita
crepe. Fica pra você.
BALTHAZAR
A senhora vai me dar o celular?
SENHORA
Ah, hoje em dia a vida sem celular
não tem como! Ficamos tudo escravo
desse bichinho aí.
BALTHAZAR
Verdade, até pra arrumar trabalho é
difícil.
SENHORA
(dá 80 reais pra
Balthazar)
E aqui a diária.
BALTHAZAR
Não, não... que é isso? Deixa
primeiro eu ver se o celular está
funcionando. Se estiver, o serviço
de hoje está pago com sobra! Ainda
limpo esse quintal pra senhora mais
outra vez!
Pega a mão de Balthazar e bota o dinheiro dentro.
SENHORA
Aceite! Que besteira é essa? Eu vi
a trabalheira que foi isso aqui
hoje. E esse celular estava
sobrando aqui mesmo, sem uso. Todo
excesso é um tipo de furto, meu
filho. Pra quê eu vou ter dois
celulares?

16 INT. BARRACO BALTHAZAR - NOITE 16


(Noite 2) Balthazar ali, sozinho. Pluga o celular na tomada e
a luz do aparelho se acende, indica que está carregando.
Balthazar reage satisfeito. Ele aguarda o aparelho carregar,
enquanto fica ali, pensativo.

17 EXT. LUGAR LINDO / CACHOEIRA - DIA 17


(Flashback de Balthazar - sete anos antes.) Balthazar e
Larissa terminam uma caminhada até um lugar lindo, sozinhos.
Ela corre, ri para ele, que corre atrás.
12.

Os dois entram na cachoeira, mergulham.


Os dois se sentam em uma canga por ali. Larissa busca a mão
de Balthazar. Balthazar aperta a mão de Larissa. Os dois se
olham, cheios de amor e começam a se beijar.
Balthazar a Larissa transam. (Fim do FB)

18 INT. BARRACO BALTHAZAR - NOITE 18


(Noite 2) SOM de apito de celular que acaba de ligar,
conectado à tomada. Balthazar pega o cartão que Larissa lhe
deu e liga.

19 INT. CASA LARISSA / QUARTO LARISSA - NOITE 19


(Noite 2) (A casa de Larissa fica na Expansão do Setor O,
região também desfavorecida, mas já com asfalto e mais
urbanizada que o Sol Nascente.) Larissa atende.
LARISSA
Alô? Olha ele...! Sabia que você
não ia demorar pra ter um celular.
Conversa segue em INTERCUT, os dois apaixonados, cada um em
sua cama.
BALTHAZAR
Claro que não. Tive que me agilizar
pra falar com você, né?
(t)
Mas ainda nem botei crédito, vai
cair a qualquer minuto.
LARISSA
(já se arrumando)
Tem vídeo?
BALTHAZAR
Peraí...
Os dois liberam a imagem de vídeo. Se olham, muito sentimento
envolvido.
BALTHAZAR (CONT’D)
Que doninha gata, hein?

LARISSA
(ri, gosta do elogio, mas
fica sem graça)
Tô nada... Tive um dia paia demais.
(MORE)
13.

LARISSA (CONT’D)
Um dos entregadores lá da
cooperativa caiu. Machucou feio.
BALTHAZAR
Nossa... muito grave?
LARISSA
Grave não, mas machucou.
BALTHAZAR
Se precisar de alguma ajuda, você
sabe que agora eu tô aqui.
Os dois se olham, são apaixonados. Celular de Balthazar apita
com uma mensagem.
BALTHAZAR (CONT’D)
Ih, acho que vai cair...
A ligação é desligada, mas Balthazar está contente, se deita,
satisfeito.

20 EXT. RUAS SOL NASCENTE - DIA 20

(Dia 3) Amanhece na cidade. Movimento das pessoas indo pro


trabalho. As ruas com chão de barro que levanta pó. Balthazar
pedala na bicicleta em direção ao centro de Ceilândia, passa
na frente de um senhorzinho que molha a terra na frente de
sua casa com uma mangueira.

21 EXT. RUAS DA CEILÂNDIA - DIA 21

Centro de Ceilândia, ruas de asfalto. Pontos de ônibus


lotados. ônibus, carros e motos circulam.

Balthazar de bicicleta pedala pela cidade.

22 EXT. FACHADA GALPÃO APLICATIVO - DIA 22

(Dia 3) Balthazar na fila, compra o isopor de aplicativo.

23 EXT. RUAS DA CIDADE / MERCADO / FARMÁCIA - DIA 23

(Dia 3) Clipe de Balthazar trabalhando de bicicleta.


Balthazar recebe pedido no aplicativo.

Balthazar pedala com mochila do aplicativo.

Balthazar faz compra na farmácia, checa nome do remédio e


manda mensagem pelo aplicativo.
14.

Balthazar pedala, para um pouco e bebe água.


Balthazar faz entrega.
Balthazar faz compra em uma loja de conveniência em um posto
de gasolina.

24 EXT. RUA NA REGIÃO RICA DA CEILÂNDIA / FACHADA CASA NESTOR 24


-
DIA
(Dia 3) Balthazar pedala pela rua. Uma área nobre da
Ceilândia. Ele está à procura do número onde vai fazer a
entrega, até que vê uma mulher, na porta de uma casa, acenar
para ele. Balthazar faz meia volta até a casa.
É Silvana quem acena para Balthazar, mas eles não se
reconhecem de imediato. Balthazar para a bicicleta na porta
da casa e vai até Silvana com a entrega.
SILVANA
Está ruim aqui de ver o número, que
a planta cresceu.
Quando escuta a voz de Silvana, a memória de Balthazar é
acionada e ele olha para ela, reconhecendo-a.
Silvana, porém, ainda não o reconhece.
SILVANA (CONT’D)
Muito obrigada, pode deixar que eu
vou dar a gorjeta aqui no
aplicativo, viu?

Balthazar olha para Silvana e a encara. Ela segue sem


reconhecê-lo, mas estranha o olhar do entregador.

SILVANA (CONT’D)
Que foi?

BALTHAZAR
A senhora não está me reconhecendo?
Silvana se esforça, olha acuradamente para Balthazar.

SILVANA
Você que fazia a tosa da minha
cachorra lá no salão?

BALTHAZAR
Não. Eu fui entregador no
restaurante do seu pai...
(MORE)
15.

BALTHAZAR (CONT’D)
Eu sou a pessoa que você e o seu
marido mandaram pra prisão sete
anos atrás. Meu nome é Balthazar.
Silvana fica assustada.
Intervalo 1

25 EXT. FACHADA CASA NESTOR - DIA 25


(Dia 3) CONT direta da cena anterior. Silvana assustada
diante de Balthazar.
BALTHAZAR
Pode deixar que eu não vou fazer
nada não... foi coincidência o
aplicativo mandar essa entrega pra
mim.
(t)
Ou então foi uma chance que eu
merecia mesmo. Poder dizer pra
senhora que eu fui inocentado dos
dois crimes. Ficou provado na
Justiça que eu nunca roubei o
restaurante do seu pai. Nem nunca
matei ninguém.
(t)
Eu sou inocente. Sempre fui.
SILVANA
(muito constrangida)
Eu... Eu nem sei o que dizer...
BALTHAZAR
Nem precisa. Nada vai me dar de
volta os sete anos que eu perdi.
(t)
Minha avó morreu sozinha no
hospital, eu perdi minha namorada,
perdi o apartamento que a gente
morava... Perdi tudo.
(t)
E deve ser deus que está me dando
pelo menos a chance de dizer aqui,
na sua cara, que a culpa nunca foi
minha. Eu nunca fiz nada de errado.
Quem errou foi você e seu marido.
(t)
Está aqui a sua entrega. E não
precisa dar gorjeta niúma não, que
eu não quero seu dinheiro.
16.

Balthazar estende o braço com a sacola. Silvana impactada,


pega a sacola. Balthazar vai embora. Silvana digita uma senha
na fechadura eletrônica, o portão se abre e ela entra.

26 EXT. RUAS DA CEILÂNDIA - DIA 26


(Dia 3) Breve passagem de tempo. Balthazar faz entrega, faz
compras e entregas. Pedala pela cidade.

27 INT. CASA NESTOR / QUARTO NESTOR - DIA 27


(Dia 3) Nestor, animado pra farra que terá de noite, faz uma
pequena mala de roupa. Silvana por ali, o ajuda.
NESTOR
É coisa rápida, mas é importante...
Eu tenho que ir. Esses encontros
adiantam muito os negócios. Conexão
é tudo!
SILVANA
(sabe que é mentira)
Mas tem que dormir no Plano,
Nestor? Por que não volta pra casa?
Você sabe que eu odeio dormir
sozinha.
NESTOR
Mas você não está sozinha, a
empregada está aí, Silvana.
SILVANA
E ela vai fazer o quê se chegar um
ladrão aqui? Um estuprador?
NESTOR
(segue arrumando a mala)
Vai acabar tarde, benzinho. E o
Olavo já pagou hotel pra todo
mundo. É até indelicado eu não
dormir lá.
Silvana dá pijama para Nestor.
NESTOR (CONT’D)
Que foi, Silvana? Vai amarrar um
bode por causa de uma noite que eu
vou dormir fora por causa de
trabalho??
17.

SILVANA
não é isso, é que... Nestor, você
se lembra daquele rapaz que foi
preso pelo assalto lá no
restaurante do meu pai?
NESTOR
Claro, o marginalzinho... Foi preso
pelo assalto e depois ainda
descobriram que ele tinha matado
uma pessoa.
SILVANA
Então, Nestor, ele não fez nada
disso.
(t)
Hoje eu pedi um negócio no
aplicativo e acredita que foi esse
rapaz que veio fazer a entrega?
Parecia coisa do destino!
(t)
E sabe o que ele me disse? Que ele
foi inocentado dos dois crimes.
NESTOR
E você acreditou? Silvana... pelo
amor de deus! Acorda! Você não
devia nem ter ficado de conversa
com esse marginal.
SILVANA
Nestor, eu vi que ele estava
falando a verdade. A gente mandou
uma pessoa inocente pra cadeia! Ele
passou sete anos lá! E isso acabou
com a vida dele...
NESTOR
Esses “umbralzinhos” não têm nada
de inocente! Nasce tudo na beirada
do inferno, já. É uma questão de
tempo pra virar bandido.
SILVANA
Que horror! A gente acusou uma
pessoa inocente e você ainda fica
falando isso!
NESTOR
Quer o quê? Não fui eu que prendi
esse demente não, Silvana. Foi o
juiz, foi a Justiça. Eu só
reconheci o cara porque eu achei
que fosse ele!
(MORE)
18.

NESTOR (CONT’D)
Ah, pode ser que eu tenha me
enganado? Pode ser... Mas quem
nunca se enganou na vida? Errar é
humano. Agora, você quer o quê? Que
eu me sinta culpado?
SILVANA
Claro! Sentir culpa é o mínimo que
a gente pode fazer. É até um sinal
de bom caráter.
(t)
Pelo menos é sinal de que a gente
sabe que errou! A culpa é uma prova
de que a gente tem coração, Nestor.
(t)
E ainda te digo mais, eu acho que o
justo mesmo seria a gente ajudar
esse menino.
NESTOR
Ah, não começa, Silvana! Não vai
cavar essa falta pro nosso time.
SILVANA
Mas, Nestor, o rapaz perdeu a avó,
perdeu a casa, a namorada...
NESTOR
Ah tá, ele perdeu o castelo e a
Mercedes que ele tinha também? Faça-
me o favor...!
(t)
Olha aqui, Silvana, eu vou viajar.
Vou pra essa “recepção de trabalho”
com o deputado Olavo, lá em
Brasília. E você vai fazer o quê?
Vai ficar aqui quietinha, sem
inventar problema. Está me ouvindo?
Silvana oprimida. Nestor sai.

28 EXT. RUAS DA CEILÂNDIA - DIA 28


(Dia 3) Balthazar pedala com isopor do app nas costas pela
cidade plana durante o pôr-do-sol. As construções baixas, a
serra que circunda Barreiras, o sol bate no rosto de
Balthazar. Ele pedala, apesar do esforço, se sente livre e
abre os braços, dirige sem a mão no guidão. E o sol se põe no
cerrado do Oeste baiano.
19.

29 EXT. CASA NESTOR / PISCINA - DIA 29


(Dia 3) (Cena conjunta: ep 7, cena 18.) Silvana no deck da
piscina, debaixo de um umbrelone, faz as unhas com Geíza.
GEÍZA
Vai manter a francesinha, dona
Silvana?
SILVANA
(aérea)
Pode ser...
GEÍZA
A senhora está se sentindo bem?
SILVANA
Estou... estava aqui pensando numa
história que uma amiga minha
contou. Ela... Ah, ela errou muito,
sabe?
GEÍZA
Mas quem não erra?
SILVANA
Não, mas é coisa grave. Essa minha
amiga reconheceu uma pessoa como
assaltante, o rapaz acabou preso
por sete anos! Só que depois ficou
provado que ele era inocente.
GEÍZA
Que judiação...
SILVANA
Pois é, e agora, meio que apareceu
a chance dela se redimir, entende?
De ajudar o rapaz.
GEÍZA
É, se ela tem como ajudar, é sempre
bom.
SILVANA
Também acho. Não é brincadeira
botar a cabeça no travesseiro de
noite e pensar que você ajudou a
condenar um inocente. Aquilo fica
assim, martelando. Tem horas que o
remorso é tão grande que dá até
vontade de chorar.
(se emociona, intensa, mas
se controla)
(MORE)
20.

SILVANA (CONT’D)
Porque quando você ajuda a mandar
um inocente pra cadeia, fica
parecendo que você é uma pessoa má.
Silvana se emociona Geíza entende que o caso é com Silvana,
pela afetação dela. Silvana respira e disfarça.
GEÍZA
Mas de repente, a chance de fazer
alguma coisa é tudo que essa sua
amiga precisava, né?
SILVANA
É. Isso que eu acho também.
Geíza muda de assunto.
GEÍZA
Olha, dona Silvana, eu ainda não
agradeci direito, mas muito
obrigada mesmo por me abrir as
portas de novo, viu?
SILVANA
O que é isso, Geíza? Você fez
minhas unhas por mais de um ano. A
gente só parou porque você inventou
de morar com sua mãe de novo, mas
eu entendo... Mãe é mãe.
(t)
Minha filha mesmo, eu sou louca pra
ela voltar a morar comigo.
GEÍZA
Pois é, e minha mãe estava
precisando de ajuda mesmo.

30 EXT. RUAS DA CEILÂNDIA / CARRO JAYME - ENTARDECER 30


(Dia 3) Jayme dirige o carro, Nestor no carona. Vidros com
insulfilm escuro. Carro para em um sinal vermelho, Balthazar
para ao lado do carro, mas eles não se vêem.
NESTOR
Estou me sentindo de férias, sério!
Uma noitezinha no Plano, hotelzinho
pago, só no lucro... Qualquer lugar
longe de casa, hoje em dia, tá
valendo.
21.

JAYME
Mas vem cá, Nestor... Não tem
negócio de imprensa, essas coisas,
na festa não, né?
NESTOR
Jayme, a festa é só do primeiro
escalão. Tá doido? É de Olavo pra
cima! Mesmo que tivesse o risco de
vazar alguma coisa, com certeza,
não ia ser sobre a gente! Lá nós
dois somos figurantes.
JAYME
Maravilha! Eu já sou protagonista
na minha vida... O resto do tempo,
adoro ser figurante!
Os dois riem. Sinal fica verde, Carro se adianta, Balthazar
fica para trás pedalando a bike.
NESTOR
A gente vai encontrar com o
deputado na casa dele e de lá vamos
pra festa!

31 EXT. ESTRADA CEILÂNDIA-PLANO PILOTO / CARRO JAYME - 31


ENTARDECER
(Dia 3) Jayme dirige seu carro rumo ao Plano Piloto, Nestor
no carona.
NESTOR
Meu cargo é bom porque não tem
eleição, voto do povo, nada disso.
JAYME
Ah, é esse negócio de democracia..
é um atraso, né?
NESTOR
Mas eu quero crescer, porque como
administrador regional... Já tô no
topo, né? Vou lançar minha
candidatura. Quero virar deputado.
JAYME
Tô colado nessa aí.
22.

32 INT. CASA NESTOR / QUARTO NESTOR - NOITE 32


(Noite 3) Silvana sozinha na cama, se despede da filha, MARIA
EDUARDA (21), com quem fala por vídeo conferência.
SILVANA
E tá frio aí em São Paulo, filha?
MARIA EDUARDA
Tá, um gelo.
SILVANA
Ô, minha filha, tadinha... Você
sabe que, se você quiser desistir
dessa faculdade, eu sou a primeira
a lhe apoiar.
MARIA EDUARDA
(acha graça)
Que horror, mãe! Para de falar
isso!
SILVANA
Mas é verdade, Maria Eduarda... Vou
mentir?
MARIA EDUARDA
(ri da mãe)
Mãe, eu não vou desistir. Só saio
daqui formada, dona Silvana! E se
sair!
SILVANA
Como assim, “se sair”, Maria
Eduarda?
MARIA EDUARDA
(ri)
Aqui, tenho que desligar que as
meninas estão chegando e eu vou
sair. Te amo, tá?
SILVANA
Também, minha filha, te amo mais
que tudo.
Maria Eduarda desliga do outro lado. Silvana realiza sua
solidão. Ela pega um pacote aberto de biscoito e come.
Silvana liga para Nestor, aguarda, mas ele não atende, ela
manda mensagem de voz.
23.

SILVANA (CONT’D)
Oi, Nestor, falei agora com a Maria
Eduarda, acho que ela já melhorou
da crise com a faculdade, disse que
está tudo bem, enfim. Você deve
estar na reunião, depois a gente
fala.

33 INT. MANSÃO BRASÍLIA / SALÃO - NOITE 33

(Noite 3) (Cena conjunta: ep 6, cena 32; ep 8, cena 25.) A


festa é muito chique, para poucos homens, políticos muito
poderosos de 50-75 anos. Todas as garçonetes são meninas
lindas, jovens e seminuas. Climinha Kubrick do planalto.

Ao fundo estão Milena e Jordana resolvendo algum problema com


equipe do show (não ouvimos a conversa).
Em uma mesa, Nestor bebe com Jayme e Olavo.

JAYME
Isso era tudo que eu estava
precisando, fartura!

NESTOR
(nega mais uma ligação de
Silvana)
A Silvana tá de brincadeira... A
mulher passa o dia inteiro falando
comigo ao vivo, quando que saio de
perto, ela quer falar pelo
telefone?
(t)
Nem o que é bom é assim!

OLAVO
Troca o carro dela, Nestor. Ou
então manda pra um SPA. Mulher
adora spa. Elas ficam um tempo
longe e ainda dão aquela
recauchutadinha...
Kellen se aproxima com Moema (22) e Luara (agora com 28), vão
direto em Olavo.

KELLEN
Boa noite, deputado. Como vai o
senhor?

OLAVO
Melhorando conforme a noite avança.
Você é a...?
24.

KELLEN
Kellen, dona da Las Primas... Uma
agência de viagens especializada em
passagens pro paraíso.
Olavo, Nestor e Jayme riem.
OLAVO
Bem que o Saboya já tinha me falado
de você, Kellen. E estou vendo que
ele não exagerou.
KELLEN
Claro que não. Tudo que o Saboya
falou é verdade, e ainda tem muito
mais que ele não contou.
(t)
Eu trabalho na zona da surpresa,
sabe, deputado?
(t)
Vou te apresentar minhas meninas
mais tops. Luara e Moema.
Olavo olha para Luara e para Moema.
KELLEN (CONT’D)
Vocês não vão dar boa noite pro
deputado?

LUARA / MOEMA
Boa noite...

OLAVO
(a parte para Jayme e
Nestor)
Eu vou logo lá em cima... Depois de
uma certa idade, a gente tem que
primeiro comer, pra depois beber.

Olavo se levanta, passa a mão em Moema.

OLAVO (CONT’D)
Vamos, Moema?
Olavo vai em direção às escadas com Moema. Nestor de olho em
Luara.

NESTOR
E a gente, pode querer também?

KELLEN
Claro, querido! Vocês estão aqui é
pra querer mesmo. Essa é Luara. E
eu tenho mais três meninas.
25.

NESTOR
Prazer, Luara... Luara tá ótima.
Nestor oferece a perna e Luara se senta no colo dele
sorridente profissional.
NESTOR (CONT’D)
Você é muito simpática.

LUARA
Obrigada.

Jordana passa pela mesa de Jayme e Nestor, em direção ao


jardim, seguida por Milena e uma assistente do staff, vestida
de preto, com crachá e rádio de comunicação, que toma
esporro.

JORDANA
Cadê o artista, benzinho!? Seu
único trabalho era esse! E você não
fez a única coisa que foi paga pra
fazer! É incompetência o nome
disso, docinho.

Jordana, Milena e a assistente saem para o jardim.

34 INT. BARRACO BALTHAZAR - NOITE 34

(Noite 3) Balthazar faz lanche de pão com manteiga e


mortadela. Depois dissolve um pózinho de “suco” numa garrafa,
que ele sacode e serve em um copo.

35 EXT. RUAS SOL NASCENTE / RUAS DA CEILÂNDIA - DIA 35

(Dia 4) Amanhece no Sol Nascente. Moradores vão pra o


trabalho.

Movimento de começo de dia na Ceilândia.

36 EXT. ESTRADA DE TERRA / MOTO LARISSA - DIA 36

(Dia 4) Estrada vicinal de terra. Larissa em sua moto com


Balthazar na garupa (indo em direção à cachoeira).

37 EXT. LUGAR LINDO / CACHOEIRA - DIA 37

(Dia 4) Balthazar e Larissa mergulham na água, nadam e se


divertem, até que sobem em uma pedra e sentam lado a lado.
Por ali, uma canga com as mochilas deles.
26.

BALTHAZAR
Eu senti muita falta desse lugar.
LARISSA
Eu também. Nunca voltei aqui depois
da última vez que a gente veio,
antes de...
BALTHAZAR
Que bom! Nada de ficar trazendo
outro namoradinho aqui no nosso
canto.
LARISSA
Nem fala, o Túlio está...
(t)
Hoje eu falei que ia passar o dia
com minha mãe, ajudar ela numas
coisas. Mas eu odeio mentir!
BALTHAZAR
Obrigada por ter aceitado meu
convite.
LARISSA
Fazer o quê, né?
(t)
Quando eu penso que você perdeu
sete anos da sua vida...
BALTHAZAR
Sabe o que é pior? Eu não perdi
esses sete anos, eu vivi esses sete
anos. E tudo que aconteceu naquela
cadeia de alguma forma está comigo.
(t)
Eu você não sabe, eu encontrei a
dona Silvana.
LARISSA
A mãe do seu Galdino??
BALTHAZAR
É. Fui fazer uma entrega do
aplicativo, quando eu vi... ela que
tinha pedido.
LARISSA
E aí?
BALTHAZAR
Aí, eu falei pra ela que eu sou
inocente, que até a Justiça falou
que eu sou inocente.
27.

Tempo entre os dois.


LARISSA
Você tem vontade de se vingar?
BALTHAZAR
Eu queria poder dizer que não, que
eu continuo aquele cara, o neto da
dona Regina, mas...
(t)
É claro que eu tenho vontade de me
vingar, dela, do Nestor, da vida,
de tudo. Mas aí, eu escuto a voz da
minha avó dizer: chega dessa
história, menino, pra frente é que
se anda.
LARISSA
E você sabe que a dona Regina
sempre está certa, né? Pra frente é
que se anda mesmo.
Larissa faz um afago em Balthazar e o abraça. Ele retribui.
Os dois ficam muito próximos e rola um clima.
LARISSA (CONT’D)
Bora mergulhar de novo?

BALTHAZAR
Bora.

Os dois mergulham na água.

38 EXT. LUGAR BONITO / CACHOEIRA - ENTARDECER 38

(Entardecer 4) Balthazar com Larissa na canga, comem e bebem


algo. Musiquinha rolando no celular de um deles, conectado a
uma caixinha de som.

LARISSA
Não foi nada disso! Você fingiu que
a sua moto estava quebrada, pra eu
te ajudar e você se chegar em mim!

BALTHAZAR
Que caô! Eu não estava fingindo, a
moto quebrou de verdade!

LARISSA
Sim, quebrou porque você tirou uma
peça.
28.

BALTHAZAR
É... tipo a peça estava velha e
caiu na minha mão.
Os dois riem, até que a risada diminui e é substituída por um
forte clima de atração mútua.
Começa a tocar uma música específica no celular. Balthazar
aumenta o som, se levanta e estende a mão para Larissa.
BALTHAZAR (CONT’D)
Será que a doninha me concede o
prazer dessa dança?

Larissa fica tímida a princípio, mas logo se levanta e os


dois começam a dançar. Balthazar dança bem, é charmoso, joga
com Larissa. Sempre naquele olho no olho. Um joga charme pro
outro dançando, mas tudo com elegância. Até que os dois
dançam coladinhos.

39 EXT. ESTRADA DE TERRA / MOTO LARISSA - NOITE 39

(Noite 4) Estrada vicinal de terra. Larissa em sua moto com


Balthazar na garupa (na direção da Ceilândia).

40 EXT. SOL NASCENTE / MOTO LARISSA - NOITE 40

(Noite 4) Larissa dirige sua moto com Balthazar na garupa.


Ele indica uma rua para ela virar.

41 INT. BARRACO BALTHAZAR - NOITE 41

(Noite 4) Balthazar abre a porta e entra com Larissa.

BALTHAZAR
Bem vinda ao meu palácio, cuidado
pra não se perder nos corredores...

Larissa entra, clima super astral entre eles.


LARISSA
Ah, está muito mais arrumado do que
eu imaginei! Do jeito que você
falou, eu achei que não ia caber
nem nós dois aqui dentro.

BALTHAZAR
Ah, cabe... nós dois juntos sempre
cabe.
29.

LARISSA
Baltha...
Balthazar se aproxima de Larissa, olho no olho.
BALTHAZAR
O quê? Sou só eu que estou sentindo
isso...?
LARISSA
Olha aqui, você não vem aparecer
pra embolar minha vida não.
BALTHAZAR
Oxe, mas é claro que eu vou embolar
sua vida.
Larissa ri, gosta muito dele.
LARISSA
Balthazar, eu estou noiva.
BALTHAZAR
Você está noiva do Túlio??
LARISSA
Estou.
BALTHAZAR
Mas ainda não está casada, não tem
filho... A gente tem que sempre ver
o lado bom das coisas.
LARISSA
(assume tom mais sério)
Eu não posso fazer isso... É melhor
ir embora.
BALTHAZAR
Tá bom, já entendi... Não vamos
terminar um dia esparrado desse de
um jeito estranho, né?
LARISSA
(volta a ficar leve)
Como é que consegue ficar estranho
com você, hein? Eu precisava
aprender.
Balthazar sorri para Larissa que retribui. Ela dá dois
beijinhos nele e sai. Balthazar fica ali, é apaixonado.
30.

42 EXT. RUAS DA CEILÂNDIA - AMANHECER 42


(Dia 5) Amanhece na Ceilândia.

43 EXT. ESTRADA CEILÂNDIA-PLANO PILOTO / CARRO JAYME - DIA 43


Nestor dirige com Jayme no carona, os dois mortos de ressaca.
NESTOR
Tem mais água aí?
JAYME
Acabou.
NESTOR
Esse negócio de check-out às onze
da manhã não dá não. Olavo tinha
que ter pago duas diárias!
JAYME
Ah, com certeza... Quando ele
passou mal já estava de dia.
NESTOR
Não fala que isso vai dar um
rolo... Eu nunca tinha visto vazar
informação de uma festa dessas.
(t)
Me deixa lá no restaurante da
Silvana que eu quero comer um
negócio pesado pra dormir de tarde.

44 EXT. RESTAURANTE CANTO DO BODE / CARRO JAYME - DIA 44


(Dia 5) Silvana e Balthazar diante de uma moto.
SILVANA
Balthazar, eu não sou uma pessoa
ruim, que faz mal aos outros.
(t)
É claro que não tem como voltar no
tempo, mas... Eu comprei essa moto
para te dar. É uma pequena
reparação, pelo menos é alguma
coisa.
BALTHAZAR
Olha, dona Silvana, eu queria poder
não aceitar. Porque o que aconteceu
comigo não tem preço e essa moto
parece que paga, mas não paga.
31.

SILVANA
Não, não paga de jeito nenhum! Eu
sei que não paga.
BALTHAZAR
Mas eu também não estou em condição
de dizer “não” pra uma moto assim,
sem ser burro de me prejudicar.
SILVANA
Que bom, Balthazar... então você
aceita o meu presente?
Silvana pega documento da moto e assina.
SILVANA (CONT’D)
Eu já assinei, é o documento da
moto. Agora, é só você assinar
aqui. Pode ser com calma, quando
chegar em casa, que a moto já é
sua.

Ao fundo de cena, do outro lado da rua, carro de Jayme se


aproxima do restaurante e diminui a velocidade. Dentro do
carro estão Nestor, no banco do carona, e Jayme. Os dois
olham Silvana com Balthazar. Silvana, está de costas pra rua
e não vê o marido.

NESTOR
Para um pouquinho ali na frente,
Jayme, por favor, pra eu entender o
que está acontecendo...

Jayme para mais à frente. Nestor olha para Silvana, contendo


a ira.

Intervalo 2

45 EXT. RESTAURANTE CANTO DO BODE / CARRO JAYME - DIA 45

(Dia 5) CONT da cena anterior. Na porta do restaurante,


Silvana se despede de Balthazar.
SILVANA
E se você precisar de mais alguma
coisa pra se restabelecer, pode me
procurar, viu?

BALTHAZAR
Não, eu não vou precisar mais de
nada não.
32.

SILVANA
(dá chaves da moto para
Balthazar)
Aqui, as chaves... Eu te desejo
tudo de bom, viu?
BALTHAZAR
Obrigado.
Balthazar sobe na moto, liga e se afasta dirigindo.
No carro, Nestor observa ao lado de Jayme.
NESTOR
Você se incomoda de dar uma
voltinha no quarteirão. Jayme?
JAYME
Claro que não...
Jayme arranca com carro. Silvana entra no restaurante
satisfeita, sem perceber que está sendo observada.

46 EXT. RUAS DA CEILÂNDIA / CARRO JAYME - DIA 46


(Dia 5) Jayme dá a volta no quarteirão, conversa com Nestor.
JAYME
E você vai ter mesmo como ajudar
com a matéria do jornal?
NESTOR
Vou tentar... Mas controlar
jornalista é foda, eles têm essa
babaquice com negócio de ética, de
dizer a verdade.
JAYME
É... nessa horas é bom ser peixe
pequeno.
(t)
Porque saiu no jornal que tinha
cocaína no quarto do deputado.
NESTOR
Saiu, Tô te falando que jornalista
é foda. Mas eu vou quebrar esse
galho pro Olavo, que está no
hospital... Eu vou desenrolar com
a tal da Kellen, ver se a garota
dela assume o BO.
33.

JAYME
É uma boa ideia.
NESTOR
Que bom que você gostou, porque, na
verdade, é você que vai desenrolar
isso pra mim.
(t)
Tem que convencer a Kellen da
garota de programa assumir a droga
e pronto. É assim que se resolve um
problema desses, né? Quem está em
cima culpa quem está embaixo.
JAYME
É.
(já pensa em Carolina)
Eu vou gostar de conhecer a agência
Las Primas...
NESTOR
(pega celular e liga)
Oi, Silvana, estou chegando aí...
(desliga)
Pode me deixar lá.
Jayme entra na rua do restaurante e deixa Nestor na porta,
onde Silvana o aguarda fingindo que “nada aconteceu”.

47 EXT. RUAS SOL NASCENTE / BARRACO BALTHAZAR / MOTO BALTHAZAR47-


ENTARDECER
(Dia 5) Pôr-do-sol na Ceilândia. Movimento de final de tarde.

48 EXT. ESTACIONAMENTO / MOTOBOY AMIGO - ENTARDECER 48


(Dia 5) Balthazar estaciona moto na frente do contêiner e
buzina. Larissa vem de dentro.
LARISSA
Que é isso, hein?? Já está de
moto??
BALTHAZAR
Depois eu te conto o desenrolo
todo... Tá ocupada?
LARISSA
(vai até ele)
Ocupada normal.
34.

BALTHAZAR
E aí? Já estou motorizado... Tem um
lugar pra mim nessa cooperativa?
LARISSA
(mexida)
Olha, Balthazar... O Túlio já está
tipo... Ele descobriu que a gente
foi lá na cachoeira, foi o maior
caso.
BALTHAZAR
Mas a gente não fez nada de errado.
LARISSA
Sim, não fez mas...
BALTHAZAR
Queria ter feito! Isso é verdade.
Pelo menos, estou falando por mim.
LARISSA
O problema é que talvez eu também
quisesse ter feito.
BALTHAZAR
Às vezes o que a gente acha que é
um problema, pode ser a solução.
LARISSA
Eu estou falando sério! E além do
mais o Motoboy Amigo é uma
cooperativa, não sou eu que decido
quem entra. É uma votação e o Túlio
também vota, então...
BALTHAZAR
Tudo bem, eu tento! Se não rolar, é
só mais uma negativa pra minha
coleção.
Larissa ri, cedendo.
LARISSA
Você não é mole, viu!?
Balthazar sorri, ele ama Larissa.

49 INT. CASA NESTOR / QUARTO NESTOR - NOITE 49


(Noite 5) Nestor deitado, Silvana termina de se arrumar para
dormir.
35.

SILVANA
Nestor, dá pra você contar direito
a história do deputado que passou
mal? A polícia encontrou droga no
quarto foi isso?Eu vi no programa
da Tânia Aragão que o deputado
estava no quarto com uma garota de
programa e tudo. Que reunião é essa
que você foi, Nestor?
NESTOR
Isso é programa de fofoca, Silvana,
já te falei que ver essa coisas não
faz nem bem pro cérebro.
SILVANA
Fala a verdade, Nestor. Você também
ficou com uma garota de programa
nessa festa?
NESTOR
Não era uma festa, meu amorzinho...
Era uma reunião de trabalho.
Agora, se tinha serviço de
acompanhante pro super VIPs, isso
eu não sei... Porque eu não vi nada
disso...
Nestor deixa o papo morrer e olha incisivo para Silvana.
SILVANA
Que foi que você está me olhando
assim??
NESTOR
Estou aqui pensando...
SILVANA
Pensando o quê?
NESTOR
Em quanto tempo você vai levar pra
me dizer que deu uma moto de
presente pro marginalzinho.
Silvana fica lívida, não consegue falar nada.
NESTOR (CONT’D)
Você achou mesmo que eu não ia
saber? Que o dono da concessionária
não ia me ligar? Que o despachante
do cartório não ia falar comigo?
(t)
(MORE)
36.

NESTOR (CONT’D)
Eu não te falei pra não se meter
com esse marginal!??
SILVANA
O Balthazar não é um marginal.
NESTOR
(abraça, mas com perigo)
Silvana, você não vê a maldade nas
pessoas... Esse que é o seu
problema. Mas agora, eu tenho
certeza que esse moleque vai ficar
longe da gente.
SILVANA
Por que você está falando isso?
NESTOR
Por nada! Ele já conseguiu o que
queria, não conseguiu? Então,
pronto. Agora vai sumir. Você vai
ver.
(t)
E vamos dormir que está tarde.
Nestor se vira pro lado e apaga sua luz de cabeceira. Silvana
se vira pro outro e segue de olhos abertos, preocupada.

50 RUAS SOL NASCENTE / BARRACO BALTHAZAR / MOTO BALTHAZAR - 50


NOITE
(Dia 5) Noite, ruas vazias. Uma ou outra pessoa.
Balthazar carrega um grande pedaço de telha arrastando pelas
ruas. Esforço máximo.
Balthazar chega perto do seu barraco, que fica isolado.
Ele arrodeia o barraco, apoia a moto o mais próximo do
barraco possível. Depois, usa a telha para esconder a moto,
apoiando-a na lateral do barraco.

51 INT / EXT. BARRACO BALTHAZAR / FACHADA BARRACO BALTHAZAR - 51


NOITE
(Noite 5) Balthazar faz um lanche. Até que escuta o SOM de um
barulho vindo de fora. Balthazar sai para olhar e vê três
caras quebrando sua moto com ferros e pés de cabra.
BALTHAZAR
Ei! Que é isso aí? Ó minha moto aí!
37.

Balthazar sai correndo.

52 EXT. RUA SOL NASCENTE / BARRACO BALTHAZAR - NOITE 52


(Noite 5) Balthazar sai correndo e vê sua moto ser destruída
pelos três capangas de Nestor.
BALTHAZAR
Peraí! O que vocês estão fazendo
com a minha moto!?
CAPANGA 1
Você que é dono da moto, é?
BALTHAZAR
Sou. Olha o que vocês fizeram...
Capanga dá um socão em Balthazar que cambaleia.
CAPANGA 1
Ganhou presente da mulher errada,
otário!
BALTHAZAR
Eu não pedi nada! Ela que me
procurou.
Capanga 2 ataca Balthazar por trás e eles começam a espancar
Balthazar, que cai, sem a mínima condição de defesa.

53 EXT. RUAS DA CEILÂNDIA - AMANHECER 53


(Dia 6) Amanhece na cidade.

54 INT. UPA CEILÂNDIA / BAIA - DIA 54


(Dia 6) Baias separadas por cortinas. Balthazar dorme
bastante machucado, cabeça enfaixada. Ao lado dele na cama
está Cassiano em sua cadeira de rodas.
Balthazar acorda e vê Cassiano ali.
BALTHAZAR
Cassiano?
CASSIANO
Me ligaram... Parece que você tinha
meu número no bolso da calça.
38.

BALTHAZAR
Eu não pedi a moto, Cassiano... Foi
a Silvana que foi lá e comprou uma
moto pra mim.
CASSIANO
Silvana a mulher do Nestor?
BALTHAZAR
É.
CASSIANO
Então você já sabe Nestor quem
mandou fazerem isso com você??
Balthazar faz que sim. Breve silêncio.
BALTHAZAR
Você está certo, o Nestor tem que
pagar pelas coisas que ele faz.
(t)
Eu vou te ajudar a fazer Justiça.
Balthazar com ódio, Cassiano satisfeito com o novo parceiro.
Fim do episódio 5 de Justiça 2.

Você também pode gostar