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Relatório

Recurso a Jogos de Tabuleiro para o Desenvolvimento de


Competências Socio-Emocionais

Unidade Curricular: Programas Psicoeducativos para a Promoção da Saúde Psicológica

Docentes: Ana Cristina Ferreira Almeida, Joaquim Armando Gomes Alves Ferreira, Marcela
Salomé Albuquerque Andrade de Matos

Mestrado em Psicologia Organizacional

André Henriques - 2019243239


Inês Ferreira – 2019229477
Pedro Oliveira - 2017276658

Junho de 2023
2022/2023
Resumo

Jogos de tabuleiro, em especifico jogos de role-play, são cada vez mais conhecidos
como um método para a psicoterapia e aprendizagem. Aliados a outras técnicas de
psicoterapia ou metodologias de aprendizagem, estes podem ter vários resultados positivos no
desenvolvimento individual tal como no desenvolvimento de relações num grupo, tanto de
crianças, jovens ou adultos.
Ao longo deste trabalho será feita uma contextualização do que são jogos de role-
play, mais especificamente do jogo Dungeons & Dragons e do seu papel na valorização de
jogos de role-play com método terapêutico, introduzindo o primeiro estudo empírico da sua
utilização em contexto psicoterapêutico e programa atual na sua utilização em adultos

Palavras-chave: jogos de tabuleiro, jogos de role-play, Dungeons & Dragons, competências


sócio-emocionais, comunicação, aprendizagem

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Índice

Resumo............................................................................................................................................................
Introdução..............................................................................................................................................................
Contextualização ao tema......................................................................................................................................
Jogos de role-play (RPG’s) – Em que consistem............................................................................................
O sistema de Dungeons & Dragons (D&D)....................................................................................................
Limitações do Jogo como Terapêutica............................................................................................................
Competências Sócio-emocionais.....................................................................................................................
Recurso a Jogos de Tabuleiro (D&D) para o Desenvolvimento de Competências Sócio-
Emocionais............................................................................................................................................................
Estudo de caso - “Dungeons and Dragons: The Use of a Fantasy Game in the
Psychotherapeutic Treatment of a Young Adult”............................................................................................
Intervenção em adultos - “Table-top role-playing games as a therapeutic intervention
with adults to increase social connectedness”................................................................................................
Conclusão..............................................................................................................................................................
Referências bibliográficas.....................................................................................................................................

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Introdução

Atualmente, os jogos de role-play são cada vez mais conhecidos como um método
para a psicoterapia e aprendizagem. Os jogos de role-play, ou RPGs, são jogos de história
interativa, em que jogadores criam a sua personagem e a caracterizam ao longo do jogo. Um
dos RPGs mais populares é Dungeons & Dragons; neste, um dos jogadores faz o papel de
narrador da história e os restantes jogadores criam as suas personagem de acordo com regras
pré-estabelecidas numa ficha de jogo, com diferentes habilidades e sistemas de jogo,
associadas.
A utilização de Dungeons & Dragons como instrumento de apoio à psicoterapia é
recente, tendo uma das suas primeiras utilizações documentadas por Blackmon, em 1994, em
aplicação a um jovem-adulto depressivo. Contudo, a sua utilização, investigação e
documentação tem sido cada vez mais avançada, principalmente em contextos de ensino de
competências emocionais, sociais, morais e de comunicação com jovens e crianças.
Este tema foi escolhido com objetivo de aprender mais sobre a aplicação destes jogos
em programas de desenvolvimento pessoal e de desenvolvimento sócio-relacional em
organizações, contudo esta é uma área, de acordo com a pesquisa feita, ainda por explorar,
havendo pouca informação empírica e devidamente fundamentada da utilização de estas
práticas em contexto organizacional.
Tendo em conta esta limitação optamos por apresentar o estudo de Abbott, Burnett e
Stauss (2022) de uma intervenção terapêutica com jogos de role-play em adultos para
aumentar a conectividade social.

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Contextualização ao tema

Jogos de role-play (RPG’s) – Em que consistem

Tradicionalmente, jogos de role-play, ou como atualmente, são mais conhecidos,


RPG’s, consistem em histórias interativas, cooperativas, improvisadas e estruturadas, que têm
lugar na imaginação dos participantes, em que os mesmos assumem o papel da personagem
que jogam. normalmente, dispõe-se em volta de uma mesa em que se usa recurso a um lápis e
papel para registrar os acontecimentos e personagens de destaque que vão conhecendo ao
decorrer da história.
Um dos participantes voluntaria-se, ou é escolhido, para exercer a função de narrador
desta experiência recreativa não competitiva, sendo o chamado Mestre do Jogo, ou Dungeon
Master (DM)/Game Master (GM). Então, o Mestre terá como sua função criar ou modificar
cenários pré-concebidos, nos quais os outros participantes, que irão criar e/ou desempenhar o
papel da sua personagem, chamados PC’s, Personagem Jogada ou Personagem do Jogador,
irão participar, interagindo entre si. Portanto, serão os protagonistas da história que poderão,
ainda, interagir com figurantes, que serão personagens ao cargo do Mestre, as Personagens
Não Jogadores (NPC’s). Assim sendo, o grupo de participantes desenvolve dinamicamente
uma série de interacções sociais e eventos para uma experiência semelhante à do teatro de
improvisação, mas geralmente, excepto no caso do RPG de acção ao vivo (LARP), não
representam fisicamente nenhuma das actividades das suas personagens, ficando pela
narração do que desejam fazer.
Ao contrário da maioria dos jogos sociais, que são frequentemente competitivos por
natureza, a maioria dos jogos de Role-play é cooperativo, sem vencedores ou perdedores, e
potencialmente sem um fim definido para o jogo, já que depende tanto das decisões dos
personagens como do desenvolvimento da história dada pelo Mestre. Em vez disso, o objetivo
é proporcionar uma experiência mutuamente gratificante durante o tempo que os participantes
desejarem.
Assim como é muito difícil para qualquer pessoa compreender realmente a experiência
de atuar num teatro, concerto, pára-quedismo ou corrida, sem ter participado nessas
atividades, muitas pessoas têm dificuldade em compreender exatamente o que é um jogo de
role-playing sem o experimentar em primeira mão.

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No âmbito da implementação de intervenções, jogos de Role-Play têm sido utilizados
como métodos terapêuticos já há vários anos (Moursund, 2007), contudo vários ramos da
Psicologia ainda não se abriram ao potencial destes jogos como processo terapêutico.
Segundo Walton (1995), uma das potenciais causas para esta resistência encontra-se no
estigma negativo criado na década de 80 do século XX, quando se começou a associar este
tipo de jogos a rituais satânicos, tendo sido criado, por isso, várias campanhas anti-RPG, o
que levou ao seu uso ser evitado ou até mesmo banido.
Na atualidade, este tipo de programas são cada vez mais utilizados em contextos de
educação e terapia (Blackmon, 1994; Kato, 2019; Kwan, 2017; Zayas & Lewis, 1986),
principalmente para a aprendizagem de competências sócio-emocionais e comunicação,
devido ao seu potencial cooperativo e de partilha de experiências, através de um espaço
seguro (Bowman & Lieberoth, 2018).

O sistema de Dungeons & Dragons (D&D)

Dungeons & Dragons, ou o seu diminutivo D&D, é na, sua base um RPG de fantasia,
no qual os jogadores criam um personagem de acordo com regras pré-definidas, seguindo-se
pelo Livro do Jogador (Mearls & Crawford, 2014) para tal efeito. Então, na concepção da
personagem pode-se escolher a espécie, classe e passado – o background da personagem -
dentro de uma lista de possibilidades fornecidas pelo manual. Mas, para além disso, o sistema
também permite aos jogadores terem a liberdade para criarem as próprias regras – o que é
referenciado como sendo um sistema Homebrew - desde que tais decisões sejam feitas para
questões de história e que sejam, também, minimamente equilibradas, já que como já foi
referido, o objetivo não é vencer, mas cooperar com os outros jogadores para saírem de más
situações.
Então, de um modo simples, na criação da personagem ter-se-á sempre de ter em
conta, em primeiro lugar, as três componentes, espécie, classe e background, sendo que como
exemplo de espécies mais conhecidas tem-se um humano, elfo ou anão. As classes são, no
total, 12, variando no tipo de combate, se é corpo-a-corpo, longa distância, ou mesmo se é
alguém capaz de manusear magia, sendo elas: bárbaro, bardo, bruxo, clérigo, druida,
feiticeiro, lutador, mago, monge, paladino patife e patrulheiro. Referente aos backgrounds,
esta última grande parte na criação da personagem dita quem era a pessoa antes do chamado
da jornada, por exemplo, se era nobre, criminoso, soldado.

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Para além disso, a personagem também terá um conjunto de atributos, sendo eles a
Força, Destreza, Constituição, Sabedoria, Inteligência e Carisma, que irão influenciar as
capacidades do personagem. Assim sendo, a Força está ligada às capacidades físicas da
personagem, influenciando também o dano dos ataques; A Destreza está muito ligada ao quão
rápida a personagem reage; a Constituição relaciona-se com a capacidade de aguentar perante
situações exaustantes, venenos, assim como, um valor mais elevado está associado a uma
melhor defesa, de modo geral; a Sabedoria e Inteligência, apesar de parecerem, a primeiro
momento, conceitos muito semelhantes podem ser separadas como sendo a primeira o
conhecimento geral, mundano, e a segunda como conhecimento académico; por fim, o
Carisma, envolve muito a capacidade de influenciar as pessoas (persuadir, enganar).
Além destes fatores existe, também, o alinhamento: Bom e Mau, Ordeiro e Caótico,
que irão ditar como a personagem reage a acontecimentos e situações a que vai ser exposta.
Assim sendo, este funciona como matriz, ou seja, uma personagem que caia sobre o Bom, não
será Mau, mas poderá ser Ordeiro ou Caótico, ou ainda ficar entre os dois e ser Neutro, sendo
que uma personagem Boa terá como seu valor ajudar os outros, mas por outro lado, uma
personagem Má irá ver os outros como um meio para um fim; na mesma linha, uma
personagem Ordeira irá seguir a tradição e leis, enquanto que uma personagem Caótica
valoriza a sua liberdade de escolha acima de tudo. Então, consoante esta análise ao que se
deseja que sejam os valores da personagem pode-se obter alguém por exemplo Caótico Bom,
como um Robin dos Bosques, que rouba dos ricos para dar aos pobres.
Com isto, o grupo de jogadores vai, então, percorrer o mundo, criado ou narrado pelo
Mestre do Jogo, com diferentes fins, dependendo dos seus desejos e objetivos finais,
delineados pelos jogadores.
Ainda, é necessário reforçar a necessidade da capacidade para improvisar, já que as
situações irão depender, em grande parte dos casos, do resultado do lançamento de dados, por
exemplo, para tentar subir a uma árvore numa floresta para ter uma melhor visão do terreno
será necessário lançar um dado, e, consoante o resultado o personagem irá ter sucesso na
atividade ou não.

Limitações do Jogo como Terapêutica

Tendo em conta a popularidade e acessibilidade de D&D, é este o sistema que se


encontra a ser mais usado em contextos de terapia e educação, contudo, a sua popularidade
não o torna um sistema “perfeito”. Um dos pontos negativos e principais é o enviesamento

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cultural (Garcia, 2017). Embora conhecido mundialmente, este é limitado pelo conhecimento
dos escritores e designers, pelas traduções feitas e pelas experiências culturais dos jogadores,
por exemplo, não possui, ainda, uma tradução para português de Portugal, apesar de já existir
para o Brasil.
Outro ponto negativo encontra-se na robustez do sistema. Como jogo, para que o
jogador se sinta imerso na experiência e envolto na narrativa, este precisa de compreender e
estar inserido nos sistemas de jogo, neste caso, os resultados de dados, o significado dos seus
valores e as estatísticas da sua personagem (que caracterizam as suas capacidades) (Chauvin
et al, 2015). É precisamente nas estatísticas da personagem que este aspeto negativo sobressai,
por exemplo, uma personagem com um nível de Carisma baixo terá dificuldades em
comunicar, representar esta personagem pode ser difícil ou até, por vezes, ofensivo para
pessoas neuro-divergentes ou que se encontrem no espectro de autismo. Polkinghorne et. al
(2020), refere que esta limitação cria uma tensão que existe além da superfície do nome dado
à habilidade, e que a descrição da habilidade no livro de regras oficial, “Charisma measures
your ability to interact effectively with others” (Crawford, 2014, p165), se alinha com atitudes
de bullying que os jogadores podem sofrer na vida real.
Como tal, é sugerido que futuramente se crie um verdadeiro espaço seguro para jogo
terapêutico e se redesenhe certas expressões e sistemas de jogo, de maneira a melhorar a
conceptualização do jogo e relevância cultural (Zayas & Lewis, 1986; Polkinghorne et. al,
2020; Garcia, 2017).

Competências Sócio-emocionais

Antes da apresentação da parte mais prática do presente relatório, o estudo caso que
foi um marco histórico na área e devida intervenção referentes ao tema presente, será, ainda,
necessário deixar claro o que são as competências sócio-emocionais e a sua importância
durante o desenvolvimento e para o funcionamento do ser humano.
Neste sentido, as competências sócio-emocionais não são uma lista de capacidade,
mas um conceito abrangente (Danner et al., 2021) usado para descrever construtos
psicológicos como traços de personalidade (os Big Five), motivação ou valores pessoais;
sendo, na mesma medida, também, muitas vezes associadas a soft skills, pontos fortes da
pessoa, competências não-cognitivas, entre outros. De um modo geral, estas competências
descrevem capacidades funcionais que permitem aos indivíduos trabalhar de forma eficiente e
persistente, construir relações de confiança com outros, lidar com o stress e problemas que

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surjam no dia-a-dia, liderar e motivar outros e ser criativo e explorar novas ideias (Danner et
al., 2021). Ainda, por vezes ocorre de se confundir os conceitos de traços de personalidade e
estas competências, já que ambos são ideias um tanto abstratas, difíceis de definir e mensurar,
mas, como também, ambos os conceitos se interceptam, as competências sócio-emocionais
estão muito ligadas aos 5 grandes traços de personalidade (Amabilidade, Extroversão,
Neuroticismo, Conscienciosidade e Abertura à Experiência), sendo usado na investigação esta
teoria como base para mensurar estas capacidades.
Para além disso, através das competências sócio-emocionais é possível predizer um
número de efeitos e resultados/consequências ao longo da vida, como desempenho
educacional/conquistas académicas, sucesso no emprego, satisfação com a vida (Danner et al,
2021.), entre outros.

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Recurso a Jogos de Tabuleiro (D&D) para o Desenvolvimento de Competências Sócio-
Emocionais

Estudo de caso - “Dungeons and Dragons: The Use of a Fantasy Game in the
Psychotherapeutic Treatment of a Young Adult”

O estudo de caso “Dungeons and Dragons: The Use of a Fantasy Game in the
Psychotherapeutic Treatment of a Young Adult” de Blackmon (1994) utilizado foi pioneiro na
área e, devido aos seus resultados positivos, levou ao desenvolvimento de estudos posteriores,
legitimando a utilização de jogos de tabuleiro como Dungeons & Dragons para o
desenvolvimento de competências Sócio-Emocionais.
Este estudo segue a jornada de Fred, um jovem diagnosticado com depressão
ciclotímica, que tentou cometer suicídio. Este revelou uma escassez de ligações emocionais
tendo acabado em isolamento social, a sua educação precoce levou-o a um isolamento
extremo dos afectos e a um medo de fragmentação.
Sentia-se desconfortável ao lidar com terapeutas do sexo masculino devido aos
sentimentos de raiva fortes que, segundo ele, eram muito parecidos com os que tinha em
relação ao pai, que o tinha "desiludido" no passado.
Devido ao seu isolamento social, no primeiro ano de terapia, grande parte do trabalho
desenvolvido consistiu no terapeuta tentar estabelecer uma relação com Fred, uma vez que
este não tinha nem amigos, nem contactos sociais desde a sua tentativa de suicídio.
No segundo ano de terapia, Fred começou a jogar “Dungeons & Dragons com um
grupo de jovens, que de acordo com Fred, se encontravam em situações semelhantes a este.
Apesar da relutância inicial do terapeuta de incluir episódios do jogo como material nas
sessões de terapia, eventualmente incorporou o material do jogo na terapia como fantasia
deslocada e desperta.
Esta fantasia foi usada como um guia para ajudar Fred a aprender a reconhecer os seus
sentimentos e a expressar-se de forma segura e orientada. O paciente acabou por amadurecer e
desenvolver relações mais saudáveis e uma vida melhor.
Após seis meses desta abordagem, Fred foi capaz de verbalizar os sentimentos que
sentia em relação ao terapeuta e começou a abandonar a necessidade de falar através do meio
deslocado de Dungeons & Dragons.

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Ainda, Fred referiu que os seus pais o faziam sentir-se rejeitado e o castigavam através
da perda implícita de amor e atenção. Criticavam-no por ter raiva ou inveja do seu irmão
deformado. Isto fez Fred sentir que havia algo de errado consigo: "Algo de errado comigo por
ter estes sentimentos".
Com a inclusão do material de fantasia de D&D na terapia, Fred fez grandes
progressos, afirmando que tinha sido capaz de experimentar toda uma gama de sentimentos
desde ódio a amor, primeiro deslocado, depois em relação ao terapeuta, e que a atitude
tolerante e encorajadora deste, permitiu a Fred perceber que essas emoções são permitidas e
encorajadas, ajudando-o a dominar melhor os seus sentimentos.
O paciente partilhou que se sentia melhor, devido à aceitação das histórias de
Dungeons & Dragons na terapia, que permitiram que este se pudesse exprimir num ambiente
que considerava seguro e que o ajudaram a desenvolver a sua auto-estima.
Este tipo de intervenção, através da qual a fantasia é usada para ultrapassar as
dificuldades de pacientes com traços obsessivos, depressivos e borderlines para trabalharem
no sentido da mudança emocional pode ter um mérito considerável. O alto grau de
estruturação engendrado pelas regras de Dungeons & Dragons parece contornar alguns dos
riscos das terapias baseadas na fantasia, permitindo que emoções surjam dentro da terapia de
uma forma não ameaçadora.
Ao mesmo tempo, o interesse e a atenção do terapeuta podem servir como função de
aprovação, à medida que os pacientes se familiarizam com sua própria estrutura psíquica
deslocada. O uso desse jogo como um complemento à terapia pode dar aos pacientes a
oportunidade de “explorar suas masmorras mentais e matar os seus dragões psíquicos”
(Blackmon, 1994).

Intervenção em adultos - “Table-top role-playing games as a therapeutic intervention with


adults to increase social connectedness”

Abbott, Burnett e Stauss (2022) começaram a sua conceção do programa por um


interesse partilhado em D&D e foi, a partir daí que começaram a discutir os benefícios da sua
aplicação como terapêutica. O seu objetivo foi, então, criar um grupo, utilizando D&D, que
fosse capaz de ajudar os indivíduos a combater a ansiedade social, isolamento e dificuldades
de interação com o outro.
Os autores encontraram um a grande dificuldade na conceção deste estudo: embora se
encontre bastantes possíveis participantes, uma vez que cada vez mais a população

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estadunidense sofre dos problemas descritos acima (Holt-Lunstad, 2017, citado por Abbott et-
al, 2022), existe ainda pouca literatura sobre a utilização de D&D como técnica terapêutica
em adultos, particularmente com ansiedade social ou isolamento.
Como tal, para criar o grupo de estudo, os autores procuraram recrutar participantes
com um diagnóstico primário em ansiedade social e dificuldades em interações interpessoais;
depressão e socialmente isolados. Além deste critério, os autores do estudo incentivaram
participantes que se encontravam hesitantes em participar em terapia de grupo convencional.
O grupo terminou, assim, com 7 participantes, dos quais a maioria era mulheres, com
idades entre os 18 e 45 anos, sem qualquer experiência em jogos de role-play. O seu historial
de saúde mental era também diverso, com alguns membros com um histórico de traumas,
ansiedade e depressão. Importante notar que, durante o primeiro ano, todos os indivíduos
eram assíduos e participativos no grupo.
O grupo foi acompanhado por facilitadores, ao longo da criação da personagem, um
momento que os autores notam como crucial, pois é aqui que os jogadores refletem uma parte
de si, alguns membros, ao escrever a sua personagem, introduziram algum tipo de evento
doloroso ou traumático que mudou a vida da sua personagem, à imagem da sua vida.
Ao final de um ano os participantes foram entrevistados para poderem partilhar a sua
experiência. Os participantes reportaram uma experiência geralmente positiva, o projeto
ajudou-os a melhorar: na confiança, em confrontos, aceitar que erros são um acontecimento
natural, liberdade e a praticarem serem o seu melhor “eu”.
Estas melhorias foram também partilhadas para a vida real, não só se sentiam mais
confiantes como personagem e indivíduo, mas essa confiança era posta em prática. Por
exemplo, um dos participantes sentia que não havia uma conexão com o seu terapeuta, e
gostaria de experimentar outro, mas não tinha coragem para o dizer pois sentia que estaria a
“ser má”, mas, com o desenvolvimento que teve, foi capaz de terminar e procurar um novo
terapeuta com o qual está satisfeita.
Embora este estudo seja limitado no número de participantes e de dados, serve como
uma investigação exploratória para o futuro, tal como zonas em que pode ser alterado o papel
dos facilitadores ou em que áreas é necessário ter mais cuidado.

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Conclusão

O presente relatório surge, como já referido referido, por nosso interesse próprio a
explorar mais sobre o efeito de jogos de tabuleiro para o desenvolvimento humano, já que a
nossa área de estudo não nos permite da mesma forma explorar tal tema; para além disso, este
estudo foi também um método de aprendizagem e desenvolvimento pessoal, visto que, sendo
a unidade curricular presente fora da nossa área de estudos, foi também uma forma de
expandir os nossos conhecimentos às diferentes disciplinas da Psicologia.
Apesar de já ter havido uma grande evolução desde o estudo caso pioneiro (Blackmon,
1994), que levou à introdução de jogos de role-play, no caso Dungeons & Dragons, em
contexto terapêutico, tendo, ainda, este estudo as suas limitações latentes pelo contexto
cultural da época, verificamos na nossa pesquisa uma lacuna na investigação relativamente a
este tipo de programas dirigidos a adultos, como também intervenções do mesmo género em
organizações. Mas, de um modo geral, consegue-se verificar, nestes últimos anos, uma
valorização dos benefícios latentes dos jogos de tabuleiro e RPG’s.
Ainda, achamos importante apontar que apesar da investigação reportar que
intervenções dirigidas às competências sociais são benéficas para clientes que experienciam
ansiedade social ou isolamento social, ainda não grande número de investigações que
explorem o uso de jogos de tabuleiro de roleplay em função destas competências (Abbott et
al., 2022).

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