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4300356 - Elementos e Estratégias para o Ensino de Física (2021)

Limite de 3 páginas para todo o ensaio, o excedente não será


considerado.
Questão escolhida: 1 e 3
Questão 1 -
i. Um mesmo fenômeno pode ter duas (ou mais) explicações científicas diferentes e
corretas.
iii. Há diferença entre verdade científica e verdade da natureza: a última é imutável
e universal.

Tendo como base estas duas afirmações, será necessário discutir os limites das
palavras “correto” e “verdade”. Essa discussão é importante pois, tendo decidido os
limites, as expectativas e as especulações ficam restritas a um território mais
palpável. Ainda assim, estas palavras estão repletas de subjetividade, uma vez que
estão ancoradas nas crenças e na visão de mundo de cada um. Visões estas que
podem ser mais ou menos flexíveis quanto à termos tão fortes como “verdade” e
“correto”.
Do meu ponto de vista, o termo “correto” se ampara na expectativa criada
quanto ao objeto em questão. Quando nos questionamos se uma explicação é correta,
estamos, na verdade, nos perguntando se a explicação é adequada, se atende à
expectativa criada quando foi necessária a explicação.
Para os inflexíveis, o termo “correto” estaria ligado a alcançar uma “verdade
suprema”. Se nós, através da ciência, buscamos descobrir o mundo e conhecê-lo,
como seríamos capazes de julgar se algo é correto usando este critério? O termo
correto seria inútil, uma vez que não poderíamos usá-lo já que não chegamos à
verdade suprema de nada.
Desta forma, podemos limitar o significado da palavra “correto” como aquilo
que atende à expectativa criada. Uma teoria inconsistente não atende à expectativa,
pois a sua inconsistência mostrará que ela não se adequa aos problemas motivaram
aquela explicação.
Um exemplo prático de duas explicações corretas diferentes do mesmo
fenômeno são as teorias da gravitação de Newton e Einstein. Ambas servem a
propósitos científicos, inclusive ambas são ensinadas em universidades. Desta forma,
mesmo uma tendo “substituído” a outra, ambas permanecem corretas, dentro de
certos limites de aplicação.
Já a palavra “verdade” é mais forte, pois ela carrega paralelamente uma ideia
de existência. Muitas vezes se entende que para algo precisa existir no mundo real
para ser de “verdade”. Aí entra um grande problema com a ciência, porque a ciência
cria modelos para explicar a realidade, já que esta deve ser infinitamente complexa.

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Como o modelo do Éter para explicar como as forças gravitacionais agiam à distância
sem a existência de um meio. Assim, soa como liberdade poética dizer que a ciência
chega na verdade.
Pode ser entendido como “verdade da ciência” aquilo que é aceito entre boa
parte dos cientistas de cada área, teorias sólidas que passaram por testes de
falseabilidade. E também pode se entender como “verdade da natureza” aquilo que
rege os fenômenos, tenhamos nos aproximado de conhecê-la ou não.
Delimitados estes termos, é possível debater o restante da afirmação. Será
mesmo que a “verdade da natureza” é imutável e universal? Em primeiro momento
podemos dizer que não sabemos. O conhecimento humano é limitado e não podemos
afirmar sobre a universalidade da “verdade da natureza”. Não sabemos o que ocorre
em galáxias distantes, não conseguimos nem saber o que é a matéria escura ou a
energia escura, que parecem ser a maior parte do universo. E sobre a sua
imutabilidade, as teorias atuais afirmam que o campo de Higgs não surgiu com o Big
Bang, que ele foi ativado frações de segundo após, portanto, as primeiras partículas
que surgiram não possuíam massa.

Questão 3 -

A filosofia é fundamental para qualquer cidadão. Para o médico, para o físico,


para o artista, para o professor, para o político, para o criador de animais. Porque a
filosofia é o exercício da reflexão. Sem a reflexão não existe consciência. Um ser
humano precisa ter consciência de sua realidade, sua subjetividade e da realidade e
subjetividade dos outros. Até mesmo aquele que nunca ouviu a palavra filosofia a
pratica.
Desta forma, mesmo aquele que ignora a importância da filosofia na formação
de físicos está praticando a filosofia. É a reflexão que guia o próximo passo de um
indivíduo, não existe um ser humano que consiga viver apenas respondendo a ordens
e estímulos como um robô ou como se agisse por um instinto irracional.
Assim, o ensino de filosofia pode abrir portas ou encurtar caminhos por
simplesmente apresentar reflexões que se mostraram importantes ao longo de toda a
história humana, ou por incentivar à reflexão organizada das ideias humanas. E para
o físico, que aprende que os gregos descobriram que a Terra era redonda, que os
renascentistas pensaram que a Terra girava em torno do Sol e a órbita dos planetas
era elíptica e que objetos que possuem massa deformam o espaço-tempo. O que seria
da ciência ou da física sem a filosofia. Será que alguma destas descobertas teriam sido
alcançadas?
Busco entender o que leva ao pensamento “A filosofia da ciência é tão útil para
a ciência quanto a ornitologia o é para os pássaros” de Feynman, uma vez que sem a
filosofia a ciência seria o quê? Uma mera interpretação de dados? Como os dados

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seriam interpretados sem reflexão? O que levaria à coleta de dados? Por que estes
dados e não outros?
O ensino da filosofia na física é importante para quebrar o paradigma de que o
físico é um mero repetidor de receitas, ou aplicador de fórmulas. O ensino da filosofia
é importante para estimular a reflexão sobre a própria física e sobre a função do físico
em si. Desta forma, é necessário que se debata se é mais importante formar um físico
com conhecimento técnico profundo em assuntos avançados ou um físico que tem um
nível técnico menor porém tem maior capacidade de se desenvolver como
profissional, uma vez que só o indivíduo consciente é capaz de 1) saber o que quer e
2) ir atrás daquilo que quer.

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