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https://youtu.

be/ZcVmS-YMM4Q

Drizz Akello
Um Recomeço.
Quando eu nasci o mundo tinha acabado de entrar
em guerra. Criar uma criança no meio de um mundo
com medo não é algo fácil, querendo ou não, uma
hora é impossível proteger ela de todo o mal. Bom,
isso não tem importância pra mim. As pessoas que
me criaram nem ao menos tentaram.

Meus pais morreram cedo, quando eu tinha 3 anos.


Nunca ouvi muito sobre eles. Eu fui criado por um
pequeno grupo que se juntou pra conseguir abrigo,
suprimentos, segurança… Pelo que eu entendi, a ideia
inicial era essa. Eles se chamavam de Ordem Crits. O
grupo era pequeno, 5 adultos (sendo dois casais e o
cara que juntou todos), 3 adolescentes e eu. Os
adolescentes eram filhos dos caras, diferente de
mim eles tinham prioridade graças ao amor dos pais.

O líder desse grupinho se chamava William. Era um


cara durão. Tinha perdido a filha e a esposa por
causa de uns bandidos que estavam saqueando comida
e mantimentos. Descobri desde cedo que a guerra
destrói a sanidade até das melhores pessoas.

E não foi diferente com a gente.


William.

Eles perceberam com o tempo que roubar trazia


mais suprimentos do que achar. E foi isso que a
Ordem Crits começou a fazer. Um grupo que a ideia
era trazer segurança pra quem quisesse entrar foi
rapidamente corrompido pela ganância e pelo caos.

Eu tinha 8 anos quando a guerra acabou… Minha


infância foi resumida em ver cidades sendo desfeitas
e a morte impregnada nas ruas. As notícias sobre
Fallen City começaram a se espalhar. Óbvio, no início
algumas pessoas que perderam totalmente as
esperanças estavam descrentes que aquilo daria
certo. E William era uma delas. Ela não queria levar o
grupo para participar de um recomeço sendo que a
gente já tinha juntado coisas demais. Tínhamos comida,
abrigo, água, até alguns jogos e coisas que
conseguimos encontrar para se divertir. Inclusive um
violão velho, que por anos minha maior válvula de
escape foi aprender a tocar aquele troço. O grupo
se dividiu, um casal queria partir com seu filho para
Fallen City e me levar junto. Eles eram legais, eu teria
topado. Mas o outro casal, seus dois filhos e o
próprio William já estavam tomados pela insanidade.
Eles proibiram o casal de ir. Para eles era difícil
demais aceitar que a guerra tinha acabado, depois
deles terem destruído tantas vidas pra sobreviver,
eles não queriam aceitar que aquilo foi em vão…
Queriam que o mundo acabasse pra culpa dos roubos
e atrocidades ser reduzida. Antes de falar o que
aconteceu, acho que é uma boa hora para
apresentar de fato a Ordem Crits.
Senhor e Senhora DeFagunds
O casal que queria ir embora. Pessoas boas. Não se
perderam com a guerra.

Astra DeFagunds
Filha do casal e minha melhor amiga.
Senhor e Senhora Viturino
Burgueses filhos da puta. Gananciosos.

Antonio Viturino Igor Viturino


Eram legais no início. Mas também se perderam…
Com o tempo… Os DeFagunds não aguentaram mais
serem proibidos de sair… E isso resultou naquele dia.

https://youtu.be/kF2R_7MKN48
(coloca essa em Loop)

Era noite. Os DeFagunds tinham arrumado suas


coisas em segredo enquanto os outros dormiam. Eles
arrumaram as minhas coisas também. Me acordaram
de madrugada para fugirmos. A casa que ficamos
era isolada, tinha janelas boas para a vigia. Tínhamos
armas para nos defender. Mas não iria ser tão fácil…
William estava paranóico com os DeFagunds saírem e
falar pra comunidade que estava se formando dos
crimes que eles cometeram na guerra. Então em
segredo ele sempre deixava alguém de vigia na
madrugada. Foi Igor que nos achou. Quando ele viu as
coisas arrumadas, apontou um rifle na nossa direção
e disse para voltarmos para dentro. Disse que não
queria, mas que caso a gente continuasse com aquilo
ele iria atirar. Ele parecia assustado. Os DeFagunds
tentaram convencê-lo a só deixar a gente ir, mas ele
disse que se isso acontecesse a punição seria pra
ele.

Senhor DeFagunds - Você não quer fazer isso, filho…


Igor - Qual é cara, só volta pra dentro. A gente tá
bem aqui.
O homem do casal virou as costas como se fosse
voltar para dentro da casa. Quando estava de costas,
em um movimento rápido ele puxou uma pistola, se
virou e atirou no garoto. Ele disse que faria de tudo
pra deixar a família dele em um lugar melhor. E ele
realmente estava disposto a fazer. O garoto caiu no
chão em choque com a mão no ferimento da bala e o
tiro acordou os outros.

A gente correu. Ouvimos tiros na nossa direção,


sendo disparados por William, Antonio e o senhor
Viturino. Uma perseguição começou. E no meio dos
tiros enquanto corríamos, um deles acertou a perna
da Astra. O que nos fez parar e pegar cobertura
nas árvores. O Senhor DeFagunds começou a trocar
tiros com os três enquanto a mãe tentava fazer uma
bandagem improvisada na bala, deixando-a alojada ali
até fugirmos. Logo após isso, ela também puxou uma
arma. O Senhor Viturino foi morto na trocação de
tiros, o que deixou Antonio furioso. Ele era um ótimo
atirador mas parecia estar tentando não matar… Até
ver a morte do pai. Ele atirou na cabeça da Senhora
DeFagunds e avançou no corpo-a-corpo contra o
Senhor DeFagunds quando ele ficou sem balas. William
se juntou à porradaria. Eles imobilizaram o senhor
DeFagunds mas Astra deu um tiro pelas costas
usando a pistola da mãe em Antonio, o que o deixou
ferido, mas não morto. Nisso, William foi jogado para
o lado e em um golpe covarde, atirou no Senhor
DeFagunds após ser jogado no chão. Antes de
morrer, ele desarmou William e jogou a arma para
mim…

E foi assim que aconteceu… Uma criança de 8 anos,


uma pistola… Em sua frente as pessoas que a
salvaram e o criaram desde antes das suas primeiras
falas. Dois mortos e dois feridos. Antonio desarmou
Astra e disse que a gente não precisava morrer. Eu
estava tremendo, com medo… William discorda de
Antonio, pega a arma de sua mão e vai caminhando
até Astra que estava no chão. Ele me ignorou. Achou
que eu não teria coragem para atirar.

Quando ele apontou a arma para Astra… Eu atirei. 3


vezes, pelas costas. Após matar o primeiro, a
adrenalina e o medo não me deixaram pensar, quando
Antonio caiu assustado, eu atirei na cabeça dele. A
Senhora Viturino chegou com Igor apoiado em seu
ombro e ao olhar aquela cena, ela puxou uma arma…
Mas eu atirei primeiro… E então sobrou Igor no chão,
com uma bala na barriga. Com medo, assustado,
pedindo clemência após a morte de todos que ele
considerava importantes… Ele se arrastava usando
suas últimas forças pra se afastar de mim… Eu fui
até ele. Apontei a arma para sua cabeça e o matei.
E esse é o dia que eu tento esquecer. Com 8 anos
eu matei 4 pessoas naquele dia. Pessoas que cuidaram
de mim, uma criança que estava sozinha. Pessoas que
apesar de tudo, me acolheram. E eu matei todos. Eu
era só uma criança… Eu não sabia o que fazer,
quando eu peguei a arma e vi minha melhor amiga em
perigo, o medo se transformou em desespero e o
desespero se transformou em raiva.

Eu e Astra seguimos viajando para Fallen City… Ela


era mais velha, tinha 15. Ela me guiou até metade do
caminho, mas morreu por causa da infecção da bala
em sua perna. Todos que eu conhecia estavam
mortos.

Antes de morrer ela me deu uma orientação para


onde ir. Foi por isso que eu consegui chegar onde
estava sendo feita a construção da cidade.

https://youtu.be/Dy1EW9VBoCQ

Eu nunca falei pra ninguém sobre aquele dia. E fui


acolhido pelos adultos do lugar. Eu nunca deixei de
sonhar com o rosto do Igor me pedindo por favor
para não atirar.

E com o tempo, eu enterrei aquele dia no fundo do


meu ser. Eu ignorei tudo que passei… Pra sempre.
Com o passar dos anos eu fiz amigos, comecei a
estudar, já um pouco tarde, enquanto havia médicos
de 18 anos eu ainda estava estudando. Eu moro em um
bar.

Seu Zé me deixa dormir no barzinho que ele tem.


Ele tem a casa própria, mas ainda sim teve o trabalho
de fazer um quartinho nos fundos só pra mim. E é
assim que eu vivo… Estudo e às vezes ajudo no bar.
Ignorando que um dia, assim como os outros, eu
também sucumbi a insanidade da guerra. E mesmo
depois de ter odiado tanto os Viturino, eu me tornei
pior que eles. Matando um por um dos meus
cuidadores… Até ficar sozinho.

E por mais que eu tente esquecer, o medo ainda


fica… Meu maior medo ainda é ficar sozinho de novo.

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