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PALAVRA E CONCEITO
Palavras são unidades da língua escrita e falada com significado e que podem,
sozinhas, constituir enunciado, transmitir uma mensagem, recuperar uma ideia da
memória etc. Conceito é a compreensão que temos das palavras, seu significado para
nós, para um grupo de pessoas, para a comunidade falante de cada idioma. É a
representação mental de um objeto abstrato ou de um objeto concreto, ou seja, das
coisas que existem materialmente e também das percepções, sentimentos,
apreciações.
Palavras e conceitos tem duração diferente. A palavra tem uma duração maior do que
o seu significado. Como conjunto de símbolos, letras, acentuações etc., são de longa
duração. É por isso que se torna possível resgatar sua origem através do estudo
etimológico. A palavra arquiteto, por exemplo, guarda a mesma grafia básica de sua
remota origem latina e grega, e atualmente sua grafia se mantém em vários idiomas
(architetto, arquitecto, architect, architecte, architekt...).
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de recuperar os significados da palavra arquitetura verificando como esta palavra é
aplicada nos textos. A busca de precisão nos significados e usos da palavra
ARQUITETURA, interessa para a pesquisa, o ensino e a comunicação entre os
profissionais e estudiosos do campo de conhecimento. O que é então Arquitetura?
Quais são os significados atribuídos a esta palavra? Quando falamos Arquitetura, de
que estamos falando? A que aspectos da realidade o conceito Arquitetura se refere?
ETIMOLOGIA
Arquiteto é uma palavra com origem no grego antigo, no entanto, a palavra arquitetura
não existia naquela língua. De acordo com o professor e ensaísta Elvan Silva:
“Sabemos que os gregos não tinham um termo sintético para designar aquilo que os
romanos vieram a chamar de architectura. Tal atividade, entre os gregos, era conhecida
como arcitektwnike tecne (arkhitechtonike techne), ou seja, ofício do mestre-construtor,
ou, se o desejando, arte do mestre-construtor” (SILVA, 1994, p. 141-2).
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AS PALAVRAS ARQUITETO E ARQUITETURA NOS DICIONÁRIOS
II) Arquitetura:
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II) Arquitetura – pela conceituação mais remota é a arte de compor e construir toda
sorte de edifícios, segundo as regras e proporções convenientes. Lúcio Costa, nosso
maior teórico do assunto, diz: arquitetura é construção concebida com a intenção de
ordenar plasticamente o espaço, em função de uma determinada época, de um
determinado meio, de uma determinada técnica e de um determinado programa. É a
arte que deve ser concebida e realizada no sentido de criar um espaço ao mesmo
tempo humano – pelo homem que o necessita e não vive só, mas em aglomerados,
social – pela realidade material que o origina e plástico – pela intenção deliberada que
preside o aparecimento da obra arquitetônica, que além do mais deve ser bela.
Obra muito interessante e didática na qual todos os verbetes são explicados com textos
e desenhos das autoras1. Talvez, por isso, este dicionário não apresenta definições
para as palavras Arquiteto e Arquitetura. Afinal, como ilustrar a palavra Arquiteto para
explicar o seu significado, desenhando uma figura humana? Seria, por certo, pouco
explicativo. A mesma dificuldade se apresenta para ilustrar o significado da palavra
Arquitetura com seus múltiplos significados, como está descrito acima (como ilustrar o
significado de “arte e técnica de criar espaços, compor e construir edifícios”, por
exemplo?).
O critério adotado foi o de selecionar apenas palavras que podem ter o seu significado
explicado graficamente2. Mesmo assim, uma conceituação da palavra Arquitetura é
dada por Luiz Paulo Conde na apresentação da obra: “A arquitetura – arte ou ciência
de construir prédios e cidades” (p. VII)3, e no corpo do dicionário são apresentados os
termos Arquitetura clássica, Arquitetura jesuítica, Arquitetura moderna, Arquitetura
tectônica, e Arquitetura vernacular, devidamente ilustrados, que de acordo com as
autoras referem-se a expressões ou movimentos de mais presença na arquitetura
brasileira.
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Este dicionário editado em dois volumes está disponível para download.
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Os verbetes apresentados no dicionário são acompanhados de símbolos que classificam as palavras nas
seguintes categorias: 1) Concepção arquitetônica; 2) Elemento construtivo; 3) Espaços arquitetônicos; 4)
Espaços urbanos; 5) Ferramentas e equipamentos; 6) Instalações; 7) Material de construção; 8) Movimentos
e estilos arquitetônicos; 9) Peças auxiliares da construção; 10) Profissionais da arquitetura e construção; 11)
Projeto de arquitetura; 12) Técnica construtiva; 13) Tipos de edificação.
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A definição de Arquitetura como “arte de construir”, mencionada na introdução do dicionário de Albernaz e
Lima (1997-1998), e também no dicionário Corona e Lemos (1972), é tomada de empréstimo do verbete
Arquitetura (Architecture) no Dictionnaire d’Architecture (1832) de Quatremère de Quincy (1755-1849),
(PEREIRA, 2009).
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objetos concretos, que existem ou existiram. Arquitetura jesuítica: “arquitetura religiosa
presente no século XVI e início do século XVII no Brasil. Caracteriza-se pelo volume
compacto das edificações, simplicidade de ornamentação e risco rigidamente retilíneo”
(ALBERNAZ e LIMA, 1997-1998).
Síntese
A etimologia é da palavra arquiteto, uma pessoa com uma ocupação específica, que
domina um ofício da construção de edifícios. A ideia de uma ocupação profissional é
bem mais recente, pois está associada ao processo contemporâneo de organização
social do trabalho, portanto, a ocupação laboral de arquiteto tal como a conhecemos
hoje, pouco tem a ver com o trabalho do arkhitéktõn. Contemporaneamente, a palavra
arquitetura nomeia a profissão técnica e artística daqueles que se dedicam a atividade
especializada de planejar, projetar e construir edifícios, paisagens e cidades, a
profissão dos arquitetos.
Em nosso país, a profissão é regulamentada por lei e exige para o seu exercício
formação universitária e o correspondente registro profissional nos órgãos de classe
que certificam e fiscalizam o seu exercício. As atribuições profissionais definidas na
legislação apontam como atividades do arquiteto a construção, adaptação ou reforma
de edificações ou outras que impliquem na alteração do meio-ambiente físico
construído na escala intermediária entre a edificação e o urbano. Estas atribuições
estão relacionadas à formação obtida nas faculdades de arquitetura e urbanismo.
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de projeto e construção. Portanto, se as pessoas querem um produto ou serviço de
arquitetura, este produto ou serviço somente poderá ser oferecido por um arquiteto
registrado no conselho profissional (Conselho de Arquitetura e Urbanismo – CAU).
Existe, assim em nosso país, um sistema legal que estabelece uma reserva de
mercado de trabalho profissional destinada ao exercício daqueles que tem a formação
acadêmica e certificação correspondente.
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Sendo a arquitetura uma profissão exercida a partir de formação acadêmica obtida nos
cursos universitários, este conjunto de conhecimentos constitui as matérias ministradas
nas respectivas faculdades de formação de Arquitetos e Urbanistas.
EDIFÍCIOS E ARQUITETURA
Edifícios são construções duráveis, de caráter mais ou menos permanente, limitado por
paredes e cobertura que encerram espaços nos quais é possível mover-se no seu
interior, servindo de abrigo e moradia às diferentes atividades humanas, posses e
valores (FERREIRA; 1999 / RAPOPORT, 1984).
No dicionário de Corona e Lemos (1972): Abrigo, lugar onde o homem pode ficar e que
constitua um meio de proteção contra a intempérie, chuva, vento, frio ou calor
excessivo e a neve. Toda e qualquer construção concebida com a intenção de vencer
um espaço para uso do homem, uma das funções essenciais da arquitetura. Segundo
André Wogenscky: “graças a ele (o abrigo) o homem pode viver em climas que de outra
maneira não poderiam ser suportados, em regiões que lhe seriam interditadas, tirando
dele o melhor proveito”.
Por que incluir estas duas palavras, edifício e abrigo, quando seus significados são
aparentemente iguais? Ou melhor, quando o significado da primeira inclui o significado
da segunda (todo edifício é abrigo). Regressivamente, o abrigo precede como
necessidade humana a existência de edifícios. O abrigo é uma necessidade para
habitar o mundo em suas diferentes condições ambientais; está na pré-história humana
e é anterior a fabricação de artefatos para atender a esta necessidade (humanos pré-
históricos abrigavam-se em cavernas que são coisas existentes e não construídas).
Edifícios são construções. Isto quer dizer que são coisas feitas, que mobiliza recursos
materiais, instrumentos e ferramentas, saber fazer, experiência acumulada, tradição,
conhecimento transmitido entre gerações, em síntese são produtos da cultura. A
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necessidade de abrigo está na origem cultural da arquitetura, mas a primeira resposta
não é a caverna existente na natureza, mas o primeiro artefato construído para servir
de abrigo, o primeiro edifício, construção, cabana etc. Incluímos estas duas palavras,
edifício e abrigo, para antecipar um tema que vamos tratar no Tópico 3 quando
estudarmos na tratadística clássica (1450 +/- 1850), o tema das origens culturais da
arquitetura e a cabana primitiva.
Edifícios são coisas concretas com existência no mundo material. Por isso, são
conhecidos empiricamente através da observação direta. Apreende-se através dos
sentidos da visão, do tato, e da percepção sinestésica, um edifício de cada vez (o
edifício que habitamos neste momento), ou conjunto de edifícios contíguos (os edifícios
que compõe um espaço urbano, por exemplo, a quadra onde está inserido o edifício
que habitamos). Também percebemos e avaliamos os edifícios na sua função de abrigo
através das sensações de calor ou frio, de luminosidade etc. Como afirma Edgar Graeff
(1980), “o edifício constitui o produto mais característico da arquitetura”, e
completamos, o produto material, concreto, tangível, como resultado do processo
identificado como construir, ou fazer Arquitetura.
Por outro lado, a palavra Arquitetura encerra significados que vão além do significado
da palavra edifício ou abrigo. Como bem observa Holanda e Kohlsdorf (1994),
Arquitetura é uma noção abstrata com muitos significados: “Edifícios, assentamentos
e paisagens são coisas concretas, obviamente existindo no mundo material. Outra
coisa é a Arquitetura”. A palavra, como vimos acima, tanto se refere a certa aparência
dos edifícios, como em arquitetura barroca, como também ao arranjo das partes que
constituem os edifícios, quando nos referimos a arquitetura dos edifícios, ou arquitetura
da cidade e, por analogia, à organização das partes de outros objetos como em
“arquitetura dos computadores” (remetendo a estrutura interna destes objetos). Além
disso, a palavra arquitetura também se refere ao produto, os edifícios, paisagens
modificadas e cidades, e ao processo de produção, a profissão dos arquitetos.
Como se pode constatar a partir das definições dos autores, os múltiplos significados
da palavra Arquitetura sempre remetem ao conceito de edifício. Como lembra Carlos
Lemos, para a maioria das pessoas e na linguagem corrente "a arquitetura está sempre
ligada à construção”, ainda que não se saiba exatamente como se entrelaçam os
significados dessas palavras. De qualquer modo, “as pessoas procuram achar um
vínculo entre a arquitetura e a beleza e para quase todos, então, arquitetura seria a
providência de uma construção bela” (LEMOS, 1991, p. 7).
Autores como Nikolaus Pevsner também compartilham desta ideia quando afirmam que
o termo arquitetura aplica-se somente aos edifícios cuja construção é de molde a
produzir-nos emoções de ordem estética (PEVSNER, s.d.). Portanto, “sob o critério
estético ou da arquitetura como arte, apenas uma parte do conjunto de edifícios será
considerada arquitetura: somente aqueles que, para sua concepção e construção,
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puderam contar com um arquiteto de conhecimento, sensibilidade e talento, com o local
certo, o momento certo, as condições materiais necessárias, o tempo e o dinheiro
suficientes. Em todo o processo de produção, os valores estéticos sobrepujaram os
valores utilitários ou comerciais” (COLIN, 2002, p. 23).
Até meados do século XIX, considerava-se como arquitetura os edifícios que aplicavam
na sua composição os elementos de arquitetura reinterpretados na longa tratadística
iniciada a partir do renascimento. Arquitetura, portanto, incluía-se na estética classicista
com todas as suas variações do período, desde o classicismo renascentista,
maneirismo, barroco, neoclássico, romantismo e historicismos do final do século XIX.
Esta estética como critério exclusivo de definição de arquitetura é fortemente criticada
na virada do século quando se busca a superação desta tradição e novas formas de
expressão arquitetônica. No entanto, o critério estético como definidor de obra de
arquitetura não é invalidado. Nos anos de 1920, o arquiteto Le Corbusier propunha uma
estética da máquina como mote para renovação da arquitetura. Este critério de
singularidade, de excepcionalidade, ainda tem seu valor, basta ver o que está publicado
nas revistas e sites de arquitetura que inspiram estudantes e profissionais.
Para ilustrar esta argumentação vejamos duas obras erguidas na primeira metade do
século XX que são emblemáticas para os arquitetos. Trata-se da Villa Savoye,
construída em 1928, próxima de Paris com projeto de Le Corbusier, e a Farnsworth
House, construída em 1949, no estado de Illinois – EUA, com projeto de Ludwig Mies
van der Rohe. Estas obras são conhecidas de todos os profissionais e alunos das
faculdades de arquitetura como exemplares notáveis da arquitetura moderna e que por
isso devem ser estudadas. Estão listadas e analisadas por Simon Unwin (2013), entre
os “vinte edifícios que todo arquiteto deve compreender”.
Pois bem, as duas obras não chegaram a ser habitadas pelas pessoas que contrataram
o seu projeto. Foram rejeitadas por seus proprietários e abandonadas, e por muito
tempo permaneceram fechadas (BOTTON, 2007). Nos dois casos, parece que a
expectativa estética do usuário não estava afinada com o discurso estético do arquiteto.
No entanto, mesmo que não tenham correspondido às expectativas de seus futuros
usuários, estas duas obras apresentavam importantes inovações para a prática da
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arquitetura. Nos dois casos, foram resgatadas não para o seu uso original como casas,
mas como museus de si mesmas para serem visitadas por arquitetos. Portanto, há um
pensar os edifícios e suas formas que faz avançar a própria prática da arquitetura e
com o passar do tempo também atualiza o gosto médio das pessoas fazendo com que
aquelas formas que inicialmente não coincidia com o gosto médio das pessoas, sejam
aceitas e desejadas num tempo futuro.
Há também outra dimensão na relação entre edifícios e arquitetura que não toma como
critério distintivo a excelência estética e a obra excepcional, mas inclui todos os
edifícios no universo da arquitetura, quer tenham sido projetados por arquitetos ou não.
Como advertem Holanda e Kohlsdorf (1994), “faz já algum tempo que os historiadores
da arquitetura desistiram de caracterizar projetos de edifícios realizados por não
profissionais como sendo, em princípio, desimportantes para a disciplina da
arquitetura”.
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Marcadores da palavra arquitetura
Espaço e tempo são categorias muito amplas, como, por exemplo, na expressão
arquitetura colonial brasileira, comportando outras classificações como a autoria da
obra ou a destinação de uso, ou os princípios aplicados na concepção da obra, quer
sejam intencionais e conscientes ou difusos e de domínio comum:
Formação da disciplina
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Arquitetura dos arquitetos
Como vimos acima tudo que constitui o ambiente construído interessa para estudo e
formação da arquitetura como área de conhecimento e prática. Mas, os estudiosos da
arquitetura também buscam obras isoladas que se distinguem por suas qualidades
naqueles conjuntos mais amplo de construções. Um dos critérios para identificar estas
obras é a autoria. Assim, um marcador particularmente importante para o estudo da
arquitetura é a obra produzida por arquitetos de ofício, como, por exemplo, a
Arquitetura de Oscar Niemeyer, a Arquitetura de Paulo Mendes da Rocha, ou Vilanova
Artigas, destacando a maneira de projetar e as características próprias dos edifícios
construídos.
SÍNTESE FINAL
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REFERÊNCIAS
ALBERNAZ, Maria Paula; LIMA, Cecília Modesto. Dicionário Ilustrado de Arquitetura. São Paulo:
ProEditores, 1997-1998. 2 v.
BOTTON, Alain de. A arquitetura da felicidade. Rio de Janeiro: 2007.
COLIN, Silvio. Uma introdução à arquitetura. Rio de Janeiro: UAPÊ, 2000.
CORONA, Eduardo; LEMOS, Carlos A. C. Dicionário da Arquitetura Brasileira. São Paulo: EDART, 1972.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século XXI: o dicionário da língua portuguesa.
3 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.
GRAEFF, Edgar Albuquerque. Edifício. São Paulo: Projeto, 1980. (Cadernos Brasileiros de Arquitetura, 7).
GREGOTTI, Vittorio. Território da arquitetura. São Paulo: Perspectiva, 1975. (Coleção Debates, 111).
HOLANDA, Frederico de; KOHLSDORF, Günter. Sobre o conceito de arquitetura. Brasília: UnB/Faculdade
de Arquitetura e Urbanismo, 1994 (texto mimeografado).
LEMOS, Carlos A. C. O que é arquitetura. São Paulo: Brasiliense, 1991. (Coleção Primeiros Passos, 16).
PEREIRA, Renata Baesso. A definição de Arquitetura no Dictionnaire Historique de Quatremère de Quincy.
In: Risco, revista de pesquisa em arquitetura e urbanismo, São Paulo, FAUUSP, n. 10, 2009 (p. 3-14).
PEVSNER, Nikolaus. Perspectiva da arquitectura europeia. Lisboa: Ulisseia, s.d.
RAPOPORT, Amos. Origens culturais da arquitetura. In: SNYDER, James & CATANESE, Anthony (org.).
Introdução à arquitetura. Rio de Janeiro: Campus, 1984. p. 26-42.
SILVA, Elvan. Por um estatuto terminológico para a teorização da arquitetura. In: Rev. Projeto. São Paulo,
n.120, p.130-134, ab/1989.
SILVA, Elvan. Matéria, ideia e forma: uma definição de arquitetura. Porto Alegre: Ed.
Universidade/UFRGS, 1994.
UNWIN, Simon. Vinte edifícios que todo arquiteto deve compreender. São Paulo: Editora WMF Martins
Fontes, 2013.
Set/2021.
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