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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS, COMUNICAÇÃO E ARTES

DISSERTAÇÃO

“Análise das similitudes entre: Transferência e o Circuito da Fala”


LACAN, J & SAUSSURE, F.

MESSIAS, A.L

Maceió, AL
2019
MESSIAS, A.L

“Análise das similitudes entre: Transferência e o Circuito da Fala”


LACAN, J & SAUSSURE, F.
INTRODUÇÃO:

A presente dissertação pretende propor uma análise acerca do que fora discutido
nas obras ​Curso de Linguística ​Geral1 ​de F. Saussure e ​Introdução à Leitura de
Lacan2 ​de Joel Dor, que tratam da estrutura da linguagem e a sistematização dos
signos. Buscando relacionar as semelhanças entre o que Saussure trata a respeito
do circuito da fala e o que Lacan diz a respeito do processo de transferência que
constitui uma parcela essencial no processo de estrutura da linguagem.

PALAVRAS CHAVE:​ Transferência; Signo; Significante e Significado.

1
SAUSSURE, F. ​Curso de Linguística Geral​, 27º ed, Edt. Cultrix, São Paulo.
2
​DOR, Joël​.​ ​Introdução à Leitura de Lacan: vol 1 – o inconsciente estruturado como
linguagem​. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990
A LÍNGUA & O CIRCUITO DA FALA:
Por meio da análise do capítulo III da obra Curso de Linguística Geral de F.
Saussure, vemos que a língua nos é proposta como resolução para tratar das
manifestações dualistas da linguagem, pois haveria uma dificuldade em se delimitar
o objeto de estudo da linguagem por conta de sua natureza dualista que envolve
tanto uma esfera social, quanto uma esfera individual, tanto uma esfera física,
quanto uma esfera idealista.
Saussure, coloca a língua como responsável pelo caráter de unidade da
linguagem, pois a esfera que corresponde a língua no conjunto da linguagem possui
um circuito de fala que necessita de no mínimo dois indivíduos. Nesse processo do
circuito de fala dos indivíduos, envolve fonação e audição, que retratam e exprimem
conceitos e imagens acústicas, todos esses processos começam no cérebro e são
transmitidos de um indivíduo para o outro e vice-versa.
Essa imagem verbal produzida nesse circuito não seria apenas sonora, mas
também psíquica, envolvendo tanto fatores fisiológicos como, fonação e audição,
quanto fatores físicos, como as ondas sonoras. O autor também, trata ainda de três
outras partes: Exterior (vibração dos sons emitidos) e Interior (todo o resto);
Psíquica e não-psíquica (os fatores fisiológicos); Ativa (o que é emitido para o outro
indivíduo) e passiva (o que é recebido)3.
De acordo com Saussure, a língua é uma convenção social, ela é tida como
uma parte essencial da linguagem, como um produto social da faculdade da
linguagem adotado para possibilitar o ato da linguagem. E quanto a discussão
acerca da natureza da linguagem? Não seria o que mais importa, pois, Saussure
nos explica que não é necessariamente a linguagem que é natural ao ser humano,
mas a faculdade de constituir uma língua, ou seja, é de nossa natureza construir
conjuntos de signos sistematizados para nos comunicar.
Dessa sistematização é que derivariam as construções de estruturas como a
linguagem e unidos pela linguagem, todos falariam mais ou menos os mesmos
signos. Entretanto, o caráter individual da linguagem parece ser algo relacionado

3
​Há também uma faculdade de associação e coordenação, mas está atua apenas no momento da
“organização da língua enquanto sistema”.
apenas ao desenvolvimento inicial da linguagem, enquanto que todo o resto se dá
por fatores sociais4.

O PROCESSO DE TRANSFERÊNCIA:

Tendo como referencial, a obra Introdução à Leitura de Lacan de Joel Dor,


podemos perceber que quando Lacan nos propõe “o inconsciente estruturado como
linguagem”, o que ele quer dizer com isso é que o inconsciente se estrutura de
maneira análoga a forma como se estrutura a linguagem. Nesta obra, vemos que:

“os processos psíquicos inconscientes circunscritos por Freud


encontram-se, no princípio mesmo de sua descoberta, submetidos à
dimensão psíquica da linguagem e aos pontos de apoio nos quais esta
dimensão se sustenta através da transferência.” (​DOR, Joël​. ​Introdução à
Leitura de Lacan: vol 1 – o inconsciente estruturado como linguagem​. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1990, p.11)

Joel Dor, nos mostra que o ponto crucial do retorno que Lacan faz a Freud,
diz respeito precisamente ao que é dito por Lacan em 1957, onde ele “irá
circunscrever de maneira decisiva a incidência deste retorno a Freud, cuja essência
se encontrará diretamente articulada à noção de linguagem”5. Isso quer dizer que, a
analogia que Lacan irá fazer entre os processos de estruturação do inconsciente e
da linguagem se fundamentam no ponto de apoio que sustenta a dimensão psíquica
da linguagem em que os processos psíquicos inconsciente estão submetidos, ou
seja, a transferência.
Tendo como base referencial a obra de Joel, podemos ver que a analogia
entre os processos de transferência se dá por meio da semelhança entre os
processos de condensação e deslocamento, que o inconsciente estrutura por meio
do sonho e os processos de significante e significado estruturados na linguagem,
presentes nas variações dos signos. Lacan transpõe o que Freud chama de

4
Aparentemente, o fator originário dessa união não parece ser algo igual em todos os indivíduos e
por isso, Saussure levanta a questão sobre qual seria a causa dessa “cristalização social”.
5
​DOR, Joël​.​ ​Introdução à Leitura de Lacan: vol 1 – o inconsciente estruturado como
linguagem​. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990. pg.15
condensação e deslocamento no processo da estrutura do inconsciente, para o
conceito de metáfora e metonímia.
Por meio da apresentação dos elementos linguísticos apresentados por Dor
Joel, podemos ver que os signos são segmentados entre: a arbitrariedade do signo,
a imutabilidade do signo e a alteração do signo. A analogia da atuação do
inconsciente para com o processo de estrutura da linguagem, se daria pelo que Dor
Joel nos apresenta como ​"desenfreamento do significante", que seria o “efeito de
uma alteração específica da utilização do signo linguístico, que seria, como assinala
F. de Saussure, o momento em que ‘o significante depende da livre escolha do
sujeito falante’ “ 6.

CONCLUSÃO:
Então, quais seriam as semelhanças entre o processo de transferência e o
circuito da fala? Bem, a transferência é basicamente o próprio processo do circuito
de fala, ela é o processo de troca física, fisiológica e psíquica dos significantes e
significados entre os indivíduos que promove a comunicação e por sua vez permite
que haja linguagem.
No que diz respeito a maneira como a natureza dualista da linguagem afeta a
sistematização dos signos quando abordamos o inconsciente e nos deparamos com
o desenfreamento do signo, vimos anteriormente que a estrutura da linguagem é
marcada por essa natureza dualista, que é composta por uma parte social e uma
parte individual, sendo a maior parte composta pela primeira parte, e uma parcela
inicial composta pela segunda parte. É justamente quando essas parcelas de
composição da linguagem não seguem dessa forma que se situa a problemática,
causando interferências7 na sistematização dos signos.
Pois, para que a transferência do circuito da fala ocorra de maneira a produzir
uma comunicação entre os indivíduos, ou seja, produzir linguagem, se faz
necessário uma convenção social acerca do que aqueles significantes e significados
iram dizer a respeitos do objeto em questão, isto é, do signo, para que ambos os

6
​DOR, Joël​.​ ​Introdução à Leitura de Lacan: vol 1 – o inconsciente estruturado como
linguagem​. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990, p.30
7
Essa interferência caracteriza-se pelo inconsciente atuando de maneira análoga a estrutura da
linguagem.
indivíduos possam compreender um ao outro e manter a trocar de informações
nesse circuito de fala.
Quando o caráter individual da linguagem abrange a parte que deveria ser
constituída por fatores sociais ocorre a interferência, que se dá especificamente no
que diz respeito a segmentação da arbitrariedade do signo, ou seja, quando o
indivíduo e não mais uma convenção social, passa a julgar o significante e
significado do signo. Então, quando isso ocorre, essa troca física, fisiológica e
psíquica entre significante e significado que compõem a transferência e o circuito da
fala, compondo a linguagem, se rompe e a comunicação não consegue se
estabelecer.
Por exemplo, temos dois indivíduos: A e B, quando o indivíduo A transmite
um significante, que já possui um significado convencionado socialmente, para o
indivíduo B, mas o indivíduo B ao invés de fazer uso desse significado já constituído
por fatores sociais, infere seu próprio juízo acerca do signo e instaura outro
significado para aquele significante emitido pelo indivíduo A. Com isso, o indivíduo B
acaba causando o desenfreamento do significante e impossibilitando a
comunicação, interferindo na sistematização dos signos, que constitui a natureza do
ser humano e por sua vez, inviabilizando a estruturação da linguagem.
REFERÊNCIAS:

SAUSSURE, F. ​Curso de Linguística Geral​, 27º ed, Edt. Cultrix, São Paulo. Cap.3
DOR, Joël​.​ ​Introdução à Leitura de Lacan: vol 1 – o inconsciente.

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