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Universidade Federal Fluminense

Departamento de Ciências da Linguagem


Setor de Linguística : Linguística I
Profa. Bethania Mariani
2021.2
LINGUAGEM E LÍNGUA

(1) “A linguagem está em toda a parte. Impregna nossos pensamentos, é intermediária em


nossas relações com os outros, e se insinua até em nossos sonhos. O volume esmagador
de conhecimentos humanos é guardado e transmitido pela linguagem. A linguagem é, de
tal modo, onipresente que a aceitamos e sabemos que sem ela a sociedade, tal como a
conhecemos, seria impossível. (...) Há várias razões que justificam a aquisição de um
conhecimento acurado sobre a linguagem.” (LANGACKER, Ronald. A linguagem e sua
estrutura. RJ, Petrópolis: Vozes, 1975)

(2) “Num livro clássico de introdução à linguística, o inglês John Lyons escreveu que “a
principal dificuldade que a pessoa recém-chegada aos estudos linguísticos enfrenta é a de
não estar preparada para encarar a língua objetivamente.” Essa dificuldade se deve ao fato
de que ser humano é ser na linguagem. (...) A linguagem é o ambiente em que vivemos,
e até mais do que isso : nossa experiência com a linguagem é ainda mais radical do que
com a água, porque a água existe fora do peixe, enquanto a linguagem existe tanto fora de
nós, do nosso meio social, quanto dentro de nós, nosso cérebro. A linguagem faz parte da
nossa própria constituição física, fisiológica (constituição que inclui também nossa psique,
já que não faz sentido separar corpo e mente, que são uma coisa só).” (BAGNO, Marcos.
Língua linguagem linguística. São Paulo: Parábola, 2014)

(3) “Torna-se agora evidente que estudar a linguagem, captar a multiplicidade dos seus
aspectos e funções, é construir uma ciência e uma teoria estratificadas cujos diferentes
ramos abrangem os diferentes aspectos da linguagem, para poderem, num tempo de
síntese, fornecer um saber sempre mais preciso do funcionamento significante do homem.
Portanto é necessário conhecer tanto a linguagem vocal como a escrita, tanto a língua
como o discurso, a sistemática interna dos enunciados e a sua relação com os sujeitos da
comunicação, a lógica das mudanças históricas e a ligação entre o nível linguístico e o
real. Aproximamo-nos assim das leis específicas do trabalho simbólico.” (KRISTEVA,
Julia. História da linguagem. Lisboa: Edições 70, 1999)

(4) “A linguagem verbal é uma instituição social, ao mesmo tempo que possui aspectos
inatos. Tem traços materiais e simbólicos. É intrinsecamente ligada à consciência e à
subjetividade, mas é compartilhada por toda a comunidade dos falantes. Tem
aparentemente uma estrutura imutável, mas muda a todo momento. Pode ser um
instrumento de emancipação e de poder. Para apreendê-la enquanto objeto do
conhecimento, elaboraram-se inúmeros modelos teóricos, cuja pretensão maior foi sempre
descrever e explicar seus aspectos mais essenciais.” (CARBONI, Florence. Introdução à
linguística. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2012.)

(5) “Outras ciências trabalham com objetos dados previamente e que se podem considerar,
em seguida, de vários pontos de vista; em nosso campo, nada de semelhante ocorre.
Alguém pronuncia a palavra nu: um observador superficial será tentado a ver nela um
objeto linguístico concreto; um exame mais atento, porém, nos levará a encontrar no caso,
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objeto linguístico concreto; um exame mais atento, porém, nos levará a encontrar no caso,
uma após outra, três ou quatro coisas perfeitamente diferentes, conforme a maneira pela
qual consideramos a palavra: como som, como expressão duma ideia, como
correspondente ao latim nudum etc. Bem longe de dizer que o objeto precede o ponto de
vista, diríamos que é o ponto de vista que cria o objeto; aliás, nada nos diz de antemão que
uma dessas maneiras de considerar o fato em questão seja anterior ou superior às outras.”
(SAUSSURE, F. Curso de linguística geral. 9. ed. São Paulo: Cultrix, 1969. P. 15)

(6) “Qualquer descrição supõe uma selecção: por muito simples que à primeira vista
pareça, qualquer objecto é susceptível de se revelar infinitamente complexo. Ora a
descrição é necessariamente finita, o que significa que só poderão apresentar-se alguns
traços do objeto a descrever, traços que têm largas possibilidades de não ser os mesmos
em duas descrições de duas pessoas. Confrontado com uma árvore, um observador
apontará a majestade de sua envergadura e a imponência da sua ramificação; outro
interessar-se-á pelas rugas do tronco e pelos aspectos da folhagem; outro preocupar-se-á
com certas quantificações exactas; e um quarto observador indicará a forma característica
de cada órgão. Qualquer descrição será aceitável se for coerente, isto é, se se basear num
PONTO DE VISTA DETERMINADO. Uma vez adoptado tal ponto de vista, reter-se-ão
certos traços, ditos PERTINENTES, enquanto se afastarão outros por NÃO-
PERTINENTES. É óbvio que, na perspectiva do lenhador, a cor ou a forma das folhas não
são mais pertinentes que o poder calorífico da madeira na perspectiva do pintor. Toda a
ciência pressupõe a escolha de um ponto de vista próprio: em aritmética só os números são
pertinentes, em geometria as formas, em calorimetria as temperaturas. Assim é também
em linguística: confrontado com uma fracção qualquer do discurso, pode o acusticista
encará-la como fenómeno físico, como sucessão de vibrações que registrará graças aos
seus aparelhos e descreverá em termos de frequências e amplitudes, enquanto o fisiólogo
examinará de que modo ela foi produzida e indicará os órgãos que, desta ou daquela
maneira, entraram em jogo. Procedendo assim, o acusticista e o fisiólogo facilitarão
provavelmente, até certo ponto, o trabalho do linguista; mas, por muito longe que tenham
ido, não terão sequer chegado a pôr o pé no domínio deste último.” (MARTINET, A.
Elementos de linguística geral. Lisboa: Sá da Costa, 1972. P.3)

(7) “Com o separar a língua da fala, separa-se, ao mesmo tempo o que é social do que é
individual; o que é essencial do que é acessório e mais ou menos acidental. A língua não
constitui, pois, uma função do falante: é o produto que o indivíduo registra passivamente;
não supõe jamais premeditação, e a reflexão nela intervém somente para a atividade de
classificação, da qual trataremos na p. 142 ss. A fala é, ao contrário, um ato individual da
vontade e inteligência, no qual convém distinguir: 1o , as combinações pelas quais o
falante realiza o código da língua no propósito de exprimir seu pensamento pessoal; 2o , o
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mecanismo psicofísico que lhe permite exteriorizar essas combinações.” (SAUSSURE, F.
Primeira Parte: Princípios Gerais. In: ______. Curso de lingüística geral. São Paulo,
Cultrix, 1972 [1917], p.22.)

(8) “A ideia fundamental do curso [Curso de lingüística geral] é a de que a linguística tem
por único e verdadeiro objeto a língua considerada em si mesma. F. de Saussure distingue
a língua [langue] e a fala [parole]. A fala é o que se pode observar diretamente; é o que é
emitido ou ouvido; é sempre um fato individual, que se produz num dado momento. A
língua só pode ser conhecida através da fala e não se transmite senão pela fala. Mas ela é a
realidade mais importante; é independente do indivíduo, porque é coisa social. Essa
distinção da língua e da fala é essencial, e será preciso deixar-se penetrar por ela. [...]
Tendo por objeto somente a "língua", F. de Saussure não se dedica de bom grado ao estudo
da "fala". No entanto, é apenas estudando minuciosamente a fala que o foneticista pode
conseguir descrever a língua. Não se aborda de frente o problema, singularmente difícil,
que consiste em investigar como, observando-se a fala, pode-se definir uma língua. Ora,
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que consiste em investigar como, observando-se a fala, pode-se definir uma língua. Ora,
quantos mais os progressos da fonética permitem esclarecer a observação da fala e quanto
mais a técnica da observação dos falares se aperfeiçoa, mais embaraçoso se torna o
problema. Por outro lado, se é lícito fazer numa dada realidade um corte arbitrário para
estudá-la comodamente, não se deve imaginar que, por isso, se estudou completamente
essa realidade. É legítimo examinar um fato de língua em si mesmo e constatar, por
exemplo, que um antigo [d] está representado em germânico por um [t], e um antigo [λ]
em francês moderno, por um [ɪ]. Mas trata-se de fatos históricos que só adquirem algum
sentido quando se investiga as condições que determinaram essas mudanças. Uma
mudança que resulta do fato de que, ao adotar uma língua estrangeira, uma população
conservou seus antigos hábitos articulatórios é coisa totalmente diferente de uma mudança
que resulta de uma série de adaptações comandadas por alguma tendência, de caráter
universal, a se articular da maneira mais natural possível. Ao separar a mudança
linguística das condições externas de que ela depende, F. de Saussure a priva de realidade;
ele a reduz a uma abstração, necessariamente inexplicável. [...] E, se se quiser descrever
uma língua atualmente falada, só é possível fazê-lo levando em conta as diferenças que
resultam da diversidade das condições sociais e de toda a estrutura da sociedade
considerada.” (MEILLET, A. Resenha do Curso de Linguística Geral de Ferdinand de
Saussure. In: ______. A evolução das formas gramaticais. Seleção, tradução e notas de
Editar
Marcos comSão
Bagno. o app Documentos
Paulo: Parábola Editorial, 2020 [1917], p. 257-260).
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