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INTRODUÇÃO

À LINGUÍSTICA

Luciana Haesbaert Balbueno


Diversidade teórica
da linguística
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Relacionar a diversidade teórica da linguística ao caráter heterogêneo


da língua.
 Identificar limitações das teorias linguísticas estudadas.
 Comparar a diversidade teórica da linguística à diversidade teórica
de outras ciências.

Introdução
Ao longo da história, várias abordagens surgiram tentando dar conta do
fenômeno linguístico. Em virtude do caráter heterogêneo da língua, diver-
sos aspectos devem ser considerados para compreendê-la. Dependendo
da abordagem, são priorizados diferentes aspectos da língua, como sociais,
cognitivos, criativos, entre outros. Da mesma forma, os dados linguísticos,
que alimentam as bases teóricas da linguística como ciência, recebem
tratamento diferenciado conforme a linha teórica que os aborda.
Com a percepção do caráter heterogêneo da língua, a diversidade
teórica passou a ser entendida em sua complementaridade. Levando
esse entendimento à prática de ensino, é necessário proporcionar e
conduzir a reflexão sobre o funcionamento da linguagem e suas variações,
considerando o uso linguístico por falantes socialmente integrados e a
produção de sentidos. Para isso, precisamos propor concepções amplas
de linguagem e de língua, para que não fiquemos apenas em uma abor-
dagem teórico-conceitual.
Neste capítulo, você vai estudar a diversidade teórica da linguística,
relacionando-a ao caráter heterogêneo da língua. Além disso, vai conhe-
cer as limitações das teorias estudadas, refletindo também como essa
diversidade teórica ocorre em outras ciências.
2 Diversidade teórica da linguística

1 Diversidade teórica e caráter heterogêneo da


língua
Existem muitos métodos e objetos para o estudo da linguística; por isso, é
difícil alcançar tanta diversidade. É difícil, por exemplo, conceituar discurso,
texto, enunciado, enunciação, sentença. Podemos, contudo, ter acesso amplo
às teorias em sua diversidade. De acordo com Saussure (1995), é o ponto de
vista que cria o objeto. O autor argumenta que a linguística tem uma natureza
heterogênea, já que existem tantos objetos quantos forem os olhares dirigidos
à linguagem. Isso quer dizer que devemos repensar a questão do objeto e do
método tendo em vista a heterogeneidade da língua.
A partir da década de 1960, as teorias baseadas na homogeneidade da
língua passaram a ser debatidas. Havia uma lógica estrutural na língua, sendo
indispensável à análise das diferentes variantes. A língua passou a ser vista
como heterogênea e diversa, “[…] ciência que se faz presente num espaço in-
terdisciplinar, na fronteira entre língua e sociedade, focalizando precipuamente
os empregos linguísticos concretos, em especial os de caráter heterogêneo”
(MOLLICA; BRAGA, 2003, p. 9). Para Labov (2008), a heterogeneidade é o
resultado natural de fatores linguísticos e sociais básicos que condicionam
a variação de forma sistemática. A heterogeneidade ordenada dos sistemas
linguísticos não compromete a estrutura desses sistemas.
A língua é um sistema complexo, e o falante, por meio de sua competência
linguística, compreende cada uma das formas concomitantes disponíveis
na língua, mesmo que não as use frequentemente. Coelho (2008, p. 2472)
afirma que o reconhecimento da heterogeneidade linguística é um grande
passo para se modificar a ideia, ainda presente, do monolinguismo, que “[…]
insiste em padronizar (a qualquer custo) a língua falada por seus habitantes”.
Fatores como status social, sexo, grau de instrução, profissão, estilo pessoal,
contexto e região, por exemplo, passaram a ser considerados ao analisar a fala
e a escrita, a partir dos estudos sociolinguísticos.
No entanto, a abordagem tradicional do ensino, em que o aceitável é falar
e escrever segundo os padrões da gramática normativa, persiste até hoje. O
estudo da língua tem sido reduzido à memorização de regras gramaticais
aplicadas, enquanto a natureza heterogênea da língua se faz presente em sala
de aula. Por isso, precisamos conscientizar os alunos que existem diferentes
variantes linguísticas, que, organizadas, atendem a diferentes contextos de
uso. De acordo com Labov (2008), a variação linguística é um fenômeno
natural de todas as línguas, condição e característica essencial própria do
sistema linguístico.
Diversidade teórica da linguística 3

Existem, portanto, diferentes linguísticas: as que buscam formalizar seu


objeto e as que concebem o próprio objeto como heterogêneos. Essas pers-
pectivas são complementares e se referem a momentos diferentes da análise
da linguagem. O segundo grupo — o que assume seu objeto heterogêneo
— contempla a língua em situações reais. São as pragmáticas, as teorias do
texto, do discurso, da enunciação. A seguir, você vai conhecer as principais
abordagens linguísticas.

Estruturalismo
O marco do nascimento do estruturalismo foi a publicação do Cours de lin-
guistique générale (Curso de linguística geral), de Ferdinand de Saussure,
em 1916. É, por isso, considerado o fundador da linguística moderna. Esse
livro teve origem nas anotações de alunos de Saussure em um curso que
ministrava na Universidade de Genebra em 1871. Seu único livro publicado
em vida foi Mémoire sur le Système Primitif des Voyelles dans les Langues
Indo-européennes (Memórias sobre o sistema primitivo das vogais nas línguas
indo-europeias), em 1879 (FRAZÃO, 2019).
Para os estruturalistas, a língua é uma estrutura, um sistema, uma organi-
zação, porque é “[…] formada por elementos coesos, inter-relacionados, que
funcionam a partir de um conjunto de regras”. Além disso, “[…] essa organi-
zação dos elementos se estrutura seguindo leis internas, ou seja, estabelecidas
dentro do próprio sistema” (MARTELOTTA, 2009, p. 114).
A língua seria, então, forma (estrutura) e não substância (matéria). Essa
substância precisa ser analisada para que se possam formular hipóteses sobre
o sistema a ela relacionado. Para Saussure, o fenômeno linguístico apresenta
duas faces que se relacionam e dependem uma da outra, o que ele chamou de
dicotomias. Veja a seguir algumas delas (MARTELOTTA, 2009).

 Língua e fala: a linguagem tem um lado social (língua) e um lado


individual (fala), sendo impossível pensar um sem o outro. O indivíduo
sozinho não pode criar nem modificar a língua.
 Sincronia e diacronia: abordagem sincrônica é a que estuda a língua em
um momento específico, sem considerá-la historicamente; abordagem
diacrônica é a que estuda a língua através do tempo, considerando-a
historicamente.
 Paradigma e sintagma: as relações sintagmáticas dizem respeito à
distribuição linear das unidades na estrutura sintática; as relações
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paradigmáticas dizem respeito à associação mental que se dá entre a


unidade linguística que ocupa determinado contexto.
 Significado e significante: a língua é um sistema de signos, que é a
unidade constituinte do sistema linguístico. O signo é formado por um
significante (imagem acústica, impressão psíquica) e um significado
(conceito).

Saussure estudou a língua como elemento fundamental da comunicação


humana e lançou as bases dos futuros estudos linguísticos, o que contribuiu
para estabelecer as bases da linguística moderna. As ciências humanas devem
muito à linguística estrutural. Uma geração de pensadores evidenciou em seus
estudos e obras a contribuição de Saussure para a organização estrutural da
linguagem. Entre eles podemos destacar: Jacques Lacan, Claude Lévi-Strauss,
Louis Althusser, Roland Barthes (MARTELOTTA, 2009).

Historicismo
Vinte anos após a publicação do Curso de linguística geral, de Saussure,
Otto Jaspersen e Herman Paul deram forma ao historicismo. Ao contrário do
estruturalismo, o historicismo entende que a linguística tem caráter histórico.
Ou seja, estuda-se a linguística considerando as variações e evoluções da
língua. Segundo Lyons (1987, p. 202), “[…] as línguas são como são porque,
no decorrer do tempo, elas estiveram sujeitas a uma variedade de forças
causativas internas e externas”.

Gerativismo
O gerativismo teve início nos Estados Unidos, no final da década de 1950,
a partir dos trabalhos de Noam Chomsky. Sua tese de doutorado, Análise
transformacional, resultou no livro Estruturas sintáticas, em 1957. No livro,
Chomsky define as origens e os limites da cognição humana.
O gerativismo foi inicialmente formulado como resposta ao modelo beha-
viorista de descrição dos fatos da linguagem. Para os behavioristas, como
Leonard Bloomfield, a linguagem humana era interpretada como um con-
dicionamento social. A repetição constante seria convertida em hábito pelo
falante. Com o gerativismo, as línguas deixaram de ser interpretadas como
um comportamento socialmente condicionado e passaram a ser analisadas
como uma faculdade mental natural.
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De acordo com Chomsky, no cérebro humano, existe uma estrutura gené-


tica que lhe dá a percepção das coisas do mundo, por isso, o aprendizado da
linguagem faz parte do indivíduo desde o seu nascimento. “Todos os falantes
são criativos, desde os analfabetos até os autores dos clássicos da literatura, já
que todos criam infinitamente frases novas, das mais simples e despretensiosas
às mais elaboradas e eruditas” (MARTELOTTA, 2009, p. 128).

Sociolinguística
A sociolinguística se firmou nos Estados Unidos na década de 1960, com
Wiliam Labov. Essa abordagem estuda a língua em seu uso real, conside-
rando as relações entre estrutura linguística e aspectos sociais e culturais da
produção linguística. Além de contribuir para a descrição e explicação de
fenômenos linguísticos, a sociolinguística também fornece subsídios para a
área do ensino de línguas.

Linguística cognitiva
Para a linguística cognitiva, a linguagem não constitui um componente autô-
nomo da mente, ou seja, não é independente de outras faculdades mentais. A
proposta é buscar uma visão integradora do fenômeno da linguagem com base
na hipótese de que não há necessidade de se distinguir conhecimento linguístico
de conhecimento não linguístico. Martelotta (2009, p. 179) explica que, “[…]
de modo geral, a proposta cognitivista leva em conta aspectos relacionados
a restrições cognitivas que incluem a captação de dados da experiência, sua
compreensão e seu armazenamento na memória, assim como a capacidade de
organização, acesso, conexão, utilização e transmissão adequada desses dados”.

Linguística textual
A linguística textual se caracteriza pelo estudo do texto e começou a se de-
senvolver na Europa durante a década de 1960. O texto é compreendido como
um evento comunicativo, com a ocorrência de operações linguísticas, sociais
e cognitivas. A linguística textual muda o tratamento linguístico em termos de
unidades menores — palavra, frase ou período —, entendendo que as relações
textuais são mais do que um somatório de itens. Isso faz do texto a unidade
comunicativa básica, o que temos a comunicar uns aos outros.
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Pragmática
Na segunda metade do século XX, existe uma virada no campo da linguística.
Muitas teorias passaram a tratar da linguagem em uso, os chamados estudos
pragmáticos. Esses estudos se originaram em áreas como semântica argumen-
tativa, linguística textual, análise do discurso, sociolinguística, entre outras.
Apresenta-se em correntes diversificadas, como o pragmatismo americano,
a teoria dos atos de fala e os estudos da comunicação.
O princípio filosófico do movimento pragmático no âmbito da linguagem é,
segundo Pinto (2004, p. 49), o de que “[…] a representação é antes linguística do
que mental”. Ele quis dizer que não existe um mundo independente da linguagem
e, portanto, a linguagem não representa o mundo. No centro dessa abordagem
está a fala, o texto, o discurso, o sentido e os sujeitos. Os estudos pragmáticos
consideram os fatores externos à língua e levam em conta os contextos de uso.
Em todas as correntes, o traço social determina a investigação do uso
da língua. Os fenômenos linguísticos, pois, não podem ser pensados fora
da prática social e longe dos seus sujeitos. Isso quer dizer que é impossível
separar linguagem e sociedade, linguagem e uso, linguagem e cultura. A
pragmática do uso argumenta que os objetos de referência são fatos construídos
socialmente e, por isso, são parte de um mundo possível. Dessa forma, o uso
é que determina se esses objetos são constitutivos de um mundo possível ou
não (VAN DIJK, 1992).
A significância de um discurso depende dos atos reais ou possíveis deno-
tados pelo discurso, uma dependência avaliada somente com base no nosso
conhecimento sobre os fatos atuais ou possíveis, em algum universo ou situação.
Isso significa que a competência pragmática é a capacidade de compreender a
intenção do locutor e está além da construção da frase ou do seu significado.
Por exemplo, imagine que você está andando na rua e alguém lhe pergunta
“Você tem horas?”. Você, muito provavelmente, não vai responder “Sim,
tenho” e continuar caminhando. Isso porque entendemos a intenção que está
por trás da pergunta e respondemos de acordo: “São 9 horas”. Portanto, a
competência pragmática revela essencialmente os objetivos da comunicação.
Em suma, as teorias pragmáticas tratam do uso da língua, do contexto social,
dos sujeitos — dos elementos que estão no exterior. Por outro lado, muitas
dessas abordagens não consideram os fatores de ordem cognitiva, simplesmente
privilegiam os aspectos sociais em detrimento dos fatores internos, biológicos
ou individuais. Essa postura tem por fundamento uma visão de língua como
fenômeno apenas social. É o que acontece com as abordagens sociolinguistas
e etnolinguistas, por exemplo.
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Semântica
A palavra semântica reporta-se fundamentalmente ao verbo grego semaíno,
que significa a ciência das significações. Ferdinand de Saussure (1995),
mencionado anteriormente nos estudos estruturalistas, a concebeu como um
estudo geral dos signos simbólicos, que seria a semiologia. A semiologia
estuda os signos na vida social. A linguística é parte da semiologia, assim
como os sinais militares, o alfabeto surdo-mudo e os ritmos simbólicos. As
leis da semiologia, portanto, são aplicadas à linguística.
Saussure (1995) afirma que o signo é produzido pelo homem e tem por
objeto comunicar alguma coisa a alguém. O signo é formado por significante e
significado, duas dicotomias também explicadas anteriormente neste capítulo.
O significante seria a imagem acústica, e o significado, o conceito.
Na análise semântica não se pode desprezar o contextual, que é o que vai
definir diferenças e estabelecer identidades. No ensino da língua, a impor-
tância da semântica é ensinar a comunicar e compreender a comunicação. A
importância dos estudos semânticos está na contextualização, pois compreende
o valor do significante e do significado e torna possível trabalhar com maior
clareza a sintaxe e a morfologia. Ao darmos ênfase especial à mudança de
significado na estrutura do enunciado, a literatura e o entendimento do texto
serão mais interessantes e prazerosos.

2 Limitações das teorias linguísticas


Como vimos, o objeto da linguística é naturalmente complexo e, dessa com-
plexidade, emergem abordagens diversas. Cada uma delas prioriza aspectos
diferentes da linguagem: contextos diferentes, evolução da língua, cognição,
fatores sociais, entre outros. Por apresentarem limitações, essas abordagens
se complementam.
Para Saussure (1995) e seus seguidores, o pensamento está subordinado à
linguagem, já que por meio da linguagem é possível dar forma ao pensamento.
A língua é “[…] um sistema de signos que exprimem ideias”, um sistema
que compreende um conjunto de regras depositado na mente dos falantes
(SAUSSURE, 1995, p. 24). Desse modo, a mente, estando em um contexto,
apropria-se dos fatos da língua. Em todas as mentes humanas há os mesmos
dados sobre a estrutura da língua.
No gerativismo de Noam Chomsky, por sua vez, surge a ideia de desenvolver
uma gramática gerativa, de acordo com os moldes da gramática universal de
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inspiração lógica. Chomsky afirma que todo falante possui uma gramática
universal internalizada que lhe possibilita formar sentenças gramaticais em
sua língua. Afirma também que todas as línguas naturais apresentam partes
em comum, apesar de serem aparentemente diferentes, mas somente o homem
possui a faculdade da linguagem. Essa faculdade torna toda criança apta a
aprender uma ou mais línguas, se não houver algum obstáculo cognitivo.
Assim, toda criança passa pelos mesmos processos e fases de aquisição da
linguagem (MARTELOTTA, 2009).
Os gerativistas defendem, ainda, que a linguagem tem um estatuto autô-
nomo, sendo uma faculdade específica e diferente de outras, porque a mente é
modular e apresenta sistemas cognitivos responsáveis por cada forma de conhe-
cimento — entre eles o conhecimento da linguagem. Além disso, em relação
à semântica, “[…] todo enunciado linguístico tem uma estrutura gramatical,
isto é, deve ser construído de acordo com regras formais que determinam se
a sequência é bem formada (gramatical) ou não (agramatical)” (MARQUES,
2003, p. 51). Assim, o significado é sintático e deve ser coerente com a estrutura
lógica, porque a língua expressa a estrutura lógica do pensamento.
Nessa visão, as regras que regem o sistema linguístico constituem o que
podemos entender por competência gramatical e, como afirma Marques (2003,
p. 51), esse domínio “[…] decorre de propriedades cognitivas inerentes à
mente humana”. Chomsky chama de desempenho linguístico os fatores
condicionantes externos, as circunstâncias socioculturais e as emoções dos
falantes, suas crenças (MARTELOTTA, 2009).
Concluímos, assim, que as vertentes estruturalista e gerativista entendem
a linguagem como representação direta do mundo ou como um espelho de
processos mentais. No primeiro caso, a estrutura da linguagem reflete a
estrutura do mundo; no segundo caso, a estrutura da linguagem reflete a
estrutura da mente. A linguagem não é vista como resultante de atividades
sociais e culturais, integradas com os processos cognitivos. Por isso, tanto o
estruturalismo quanto o gerativismo consideram o tratamento do significado
periférico, algo que pode ficar em segundo plano.
As teorias pragmáticas, diferentemente das abordagens estruturalista e
gerativista, entendem a linguagem como uma atividade ligada às variáveis
socio-históricas, culturais e cognitivas. Estudam a língua considerando o
seu uso. Portanto, as teorias pragmáticas estão trabalhando com a ideia de
linguagem como o resultado de atividades sociais, culturais e cognitivas. Os
aspectos de ordem cognitiva são hoje fundamentais, pois focalizam os contextos
de uso da linguagem, como é o caso da linguística textual, por exemplo. Já
não se pode pensar nos fenômenos linguísticos fora das categorias sociais.
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3 A diversidade teórica das ciências


A construção de uma ciência não se dá de maneira uniforme e regular ao longo
da história. Muito pelo contrário: fazer ciência constitui um processo lento
de caráter ideológico, filosófico, histórico e socialmente constituído, fruto de
uma época, e requer um período de teste para que os paradigmas se afirmem.
É um processo dialético, cujas investigações em torno de uma verdade exigem
uma série de reajustes, para se chegar a resultados confiáveis.
Quando se faz uma avaliação crítica da construção de uma teoria, é
necessário, que se lance um olhar atento às irregularidades, ainda que elas
possam estar disfarçadas sob a aparência de formulações categóricas. Dos
períodos de formulação e teste surgem os períodos em que paradigmas são
postos em uso, podendo ser confirmados ou não. No que diz respeito à ciência
da linguagem, considerando o longo período em que suas bases vêm sendo
construídas, desde a Antiguidade Clássica até o século XX, apenas no final
do século XIX se operou uma verdadeira revolução científica (KUHN, 1962,
apud DASCAL, 1978).
Uma atitude de questionamento e debate sobre os diferentes saberes é
uma necessidade recorrente. Hoje, já começamos a entender que o conheci-
mento científico, ao longo do tempo, impôs uma única maneira possível de
interpretar a realidade, anulando a possibilidade de complementar os saberes
(SANTOS, 1997).
Nessa linha de pensamento, a linguística também passa por processos de
transformação e questionamentos. Tendo a heterogeneidade como principal
característica, busca interagir com as outras ciências e buscar elementos para
se renovar constantemente. A partir da segunda metade do século XX, as
correntes linguísticas passaram a se dedicar aos estudos das situações reais de
comunicação e a observar os falantes envolvidos em atos interativos. Com o
passar do tempo, os estudos linguísticos tornam-se cada vez mais associados
a outras ciências, como geografia, antropologia, psicologia, sociologia.
Entende-se, portanto, como observamos anteriormente, que, com essa
heterogeneidade, nem sempre é fácil distinguir os objetos de estudo de uma ou
outra corrente linguística, já que em muitos momentos ocorre o encadeamento,
a justaposição de várias ciências.
10 Diversidade teórica da linguística

O artigo “A evolução dos estudos linguísticos”, de Lúcia F. Mendonça Cyranka, apresenta


o resultado do estudo reflexivo sobre algumas das principais correntes linguísticas,
desde a Antiguidade Clássica até o surgimento de novo paradigma que revolucionou
os estudos da linguagem, propiciando a abordagem dialógica, a partir da qual se
propuseram os recortes epistemológicos, que deram origem a várias linhas teóricas.
Confira no link a seguir.

https://qrgo.page.link/dc9Rt

COELHO, P. M. C. R. O tratamento da variação linguística nos livros didáticos de portu-


guês. In: MAGALHÃES, J. S.; TRAVAGLIA, L. C. (org.). Múltiplas perspectivas em linguística:
coletânea de trabalhos apresentados no XI Simpósio Nacional de Letras e Linguística
e I Simpósio Internacional de Letras e Linguística. Uberlândia: EDUFU, 2008. Disponível
em: http://www.filologia.org.br/ileel/artigos/artigo_300.pdf. Acesso em: 11 jan. 2020.
DASCAL, M. (org.). Fundamentos metodológicos da linguística. São Paulo: Global, 1978.
v. 1: Concepções gerais da teoria linguística.
FRAZÃO, D. Ferdinand de Saussure: biografia. 2019. Disponível em: https://www.ebio-
grafia.com/ferdinand_de_saussure/. Acesso em: 12 jan. 2020.
KUHN, T. The structure of scientific revolutions. Chicago: University of Chicago Press, 1962.
LABOV, W. Padrões sociolinguísticos. São Paulo: Parábola, 2008.
LYONS, J. Linguagem e linguística: uma introdução. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
1987.
MARQUES, M. H. D. Iniciação à semântica. Rio de janeiro: Jorge Zahar, 2003.
MARTELOTTA, M. E. (org.) Manual de linguística. São Paulo: Contexto, 2009.
MOLLICA, M. C.; BRAGA, M. L. (org.). Introdução à sociolinguística: o tratamento da
variação. São Paulo: Contexto, 2003.
PINTO, J. P. Pragmática. In: MUSSALIM, F.; BENTES, A. C. (org.). Introdução à linguística:
fundamentos epistemológicos. São Paulo: Cortez, 2004.
SANTOS, B. S. Um discurso sobre as ciências. Porto: Afrontamento, 1997.
Diversidade teórica da linguística 11

SAUSSURE, F. Curso de linguística geral. São Paulo: Cultrix, 1995.


VAN DIJK, T. A. Análise semântica do discurso. In: VAN DIJK, T. A. Cognição, discurso e
interação. São Paulo: Contexto, 1992.

Leitura recomendada
CYRANKA, L. F. M. Evolução dos estudos linguísticos. Revista Práticas de Linguagem, v.
4, n. 2, p. 160-198, jul./dez. 2014.

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cionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a
rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de
local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade
sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links.

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