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Behaviorista em Ação - Psicologia Clínica e Acadêmica

O Comportamento Verbal
dezembro 12, 2012

Há muito o conceito de linguagem tem se mostrado um tema controverso no


que diz respeito a sua categorização dentro dos estudos psicológicos. Por ser uma
característica exclusivamente humana, as abordagens não-comportamentais
juntamente com o senso comum costumam separar a fala em uma categoria
diferente da de outros comportamentos não-verbais. Nesse contexto, Skinner
(1957) comenta que antes das pesquisas na Psicologia evoluírem para o campo
analítico-comportamental, sistemas extremamente elaborados já haviam se
ocupado da descrição da linguagem, tais como a gramática, a lógica, a lingüística, a
patologia da fala, entre outros. Embora tenham trazido contribuições para o
conhecimento científico atual, nenhuma dessas disciplinas conseguiu formular de
fato uma descrição apropriada que tornasse o objeto de estudo mais preciso e
simplificado. Mas afinal, seria o comportamento verbal diferente de outros tipos
de comportamento?

Dentro da história filogenética da espécie humana, um fato específico


possibilitou uma enorme ampliação no potencial de ação no ambiente social: a
evolução da musculatura vocal. Essa musculatura, em determinado momento,
passou a ficar sob controle operante, ou seja, foi controlada por suas consequências.
Assim, o comportamento vocal do homem, não mais foi caracterizado como um
padrão fixo de ação característico de espécies não humanas fato este que
padrão fixo de ação, característico de espécies não humanas, fato este que
possibilitou a diferença crucial entre as duas espécies (Skinner, 1957). Segundo
Hineline (2003) mudanças, tais como a qualidade da respiração proporcionada pelo
bipedalismo humano, permitiram a seleção de capacidades finas para a
discriminação entre vocalizações. Sendo assim, essas capacidades progrediram
paulatinamente sob a linha do tempo, e estabeleceram-se de tal forma que
permitiram ao homem, diversas outras capacidades corolárias a esse
comportamento.

Skinner (1957) quebrou uma barreira paradigmática ao postular princípios


operantes para comportamento verbal humano. O autor propõe uma explicação
simples, que torna desnecessária a busca por explicações invisíveis ou duvidosas e,
além disso, ressalta o princípio proposto por Darwin sobre continuidade entre as
espécies. Segundo o autor, comportamento verbal pode ser definido como todo
aquele que necessita de reforço mediado por outras pessoas. Por conseguinte, esse
tipo de comportamento possui efeito indireto no ambiente, por alterar o
comportamento de outros membros do grupo. Dessa forma, um sujeito (falante)
que ao emitir determinado som, como, por exemplo, “com licença”, pode afetar o
comportamento de outra pessoa (ouvinte), a qual pode perceber tal estímulo
sonoro como uma ocasião para sair do caminho da pessoa que lhe solicitou tal
comportamento. Essa relação entre falante e ouvinte foi chamada por Skinner de
episódio verbal total.
Assim, qualquer movimento capaz de afetar outro organismo pode ser
considerado verbal, tais como vocalizações, gestos, expressões faciais e a escrita. A
consequência mais básica do comportamento verbal é que através dele, os falantes
mudam o comportamento dos ouvintes. Dessa forma, o comportamento verbal
tende a acontecer em ambientes em que provavelmente será reforçado, tal como
qualquer outro tipo de comportamento (Baum, 1994).

Skinner (1957) explica que para que o comportamento verbal seja reforçado é
crucial a presença de falantes e ouvintes com treinamentos semelhantes, pois,
dessa forma, um reforço específico poderá ser disponibilizado. Além disso, as
pessoas que escutam e reforçam o comportamento do falante são consideradas por
ele como audiência e fazem parte do que o autor chama de comunidade verbal.
Sendo assim, tal tipo de comportamento possui natureza social, ou seja, necessita
de outras pessoas para ser adquirido e mantido.
Além disso, Skinner (1957) afirma que o comportamento verbal possui tantas
particularidades topográficas, que certamente necessitaria de tratamento especial,
mas, no entanto, ainda é considerado um comportamento operante como qualquer
outro. Devido a sua extrema complexidade, o autor categorizou tal comportamento
em oito diferentes operantes verbais: mando, tato, ecóico, textual, tomar ditado,
intraverbal e autoclítico. Com essa categorização o autor pretendeu facilitar a
compreensão das circunstâncias em que tais comportamentos ocorrem. Assim, os
operantes verbais ressaltam as relações funcionais existentes entre ambiente e
comportamento, deixando a topografia ou estrutura comportamental em segundo
plano.
Os operantes verbais
Dentre os operantes verbais identificados por Skinner (1957), o mando é
caracterizado por ser aquele em que o reforço é claramente especificado e está sob

controle de uma operação estabelecedora, privação ou estimulação aversiva.


Quando alguém emite o comportamento verbal, como por exemplo, “Me dê um
copo d’água, por favor!”, essa frase indica uma situação de privação do falante e
especifica o reforçador para aquele comportamento. Geralmente, o mando é
exemplificado por ações do senso comum tais como, ordens, pedidos, súplicas,
conselhos, entre outros, e funciona, principalmente em benefício do falante
(Skinner, 1957).

O tato foi definido por Skinner (1957) como uma resposta verbal controlada
por estimulação não verbal. O autor classificou dois tipos de estímulos não verbais
que controlam o tato. O primeiro refere-se às pessoas, que caracterizam a audiência
e o segundo são os objetos inanimados e acontecimentos, que caracterizam o meio
físico. A palavra “tato” foi sugerida por Skinner por derivar da palavra “contato”
com o mundo material, assim, topograficamente, tal operante verbal assemelha-se
a descrições, afirmações, conselhos e avisos. O reforço para a aquisição do tato é
generalizado ou social (p. ex. atenção) e é geralmente disponibilizado pela
comunidade verbal, a qual reforça diferencialmente o comportamento verbal de
um indivíduo. Por exemplo, uma criança ao falar “vermelho” diante de um objeto
vermelho é reforçada com a atenção dos pais que dizem “muito bem!” e assim por
diante (Skinner, 1957).
Tanto o ecóico quanto a cópia possuem como antecedente um estímulo
discriminativo verbal, similaridade formal e correspondência ponto a ponto. Ou
seja, ao escutar uma pessoa dizendo a palavra “casa”, por exemplo, o sujeito pode
responder de forma semelhante dizendo também a palavra “casa”, nesse caso, esse
seria um exemplo de ecóico. O ecóico é considerado por Skinner (1957) a forma
mais simples de comportamento verbal seguido de antecedente verbal. Esse está
presente no repertório de crianças em desenvolvimento da fala, nas rimas, em
repertórios “patológicos” como a ecolalia, entre outros. O operante verbal da cópia
caracteriza-se pelo comportamento controlado pelo antecedente verbal de uma
palavra escrita, como por exemplo, na presença da palavra escrita “casa” a pessoa
escreve de forma semelhante a mesma palavra “casa”. A diferença entre esse tipo
de operante e o ecóico, é que a cópia produz um estímulo visual e não sonoro, mas
que, não por isso, o descaracteriza como verbal.

Os operantes verbais que são controlados por antecedentes verbais, possuem


correspondência ponto a ponto, mas que não têm similaridade formal são
correspondência ponto a ponto, mas que não têm similaridade formal são
categorizados como textual e tomar ditado. O comportamento textual é mais
conhecido pelo senso comum como o comportamento de ler, ou seja, diante de uma
palavra escrita, como “livro”, por exemplo, a pessoa responde vocalmente
produzindo um padrão sonoro “livro”, correspondente ao que está escrito. O tomar
ditado constitui um comportamento semelhante ao textual, porém, oposto. O
estímulo verbal antecedente do tomar ditado é sempre um estímulo verbal sonoro,
ou seja, uma pessoa ao escutar uma palavra dita por outra, se comporta escrevendo
símbolos correspondentes, em sua cultura, ao som da palavra emitida.
O intraverbal é o operante que se caracteriza por possuir também como
antecedente um estímulo verbal, porém, não há correspondência ponto a
ponto, nem similaridade formal. Dentro de diferentes culturas encontra-se
intraverbais que estão arraigados nos repertórios verbais das pessoas, como por
exemplo, quando alguém fala “batatinha quando nasce...” e outra pessoa responde
“...esparrama pelo chão!”, ou quando alguém pergunta “em que ano foi abolida a
escravatura no Brasil?” e a outra pessoa responde “1888”. O autoclítico foi definido
por Skinner como um operante verbal que modifica o próprio comportamento
verbal e que aumenta a discriminação pela audiência das verbalizações do falante.
O autoclítico é um comportamento verbal de segunda ordem, e depende de outros
operantes verbais para ocorrer. Esse operante verbal possui classes que incluem os
autoclíticos descritivos, qualificadores, quantificadores, de relação ou de
manipulação. A frase “todos os sanduíches fazem mal à saúde” representa um
autoclítico quantificador e difere da frase “alguns sanduíches fazem mal à saúde”.
Ambas as frases esclarecem um pouco mais sobre a história do falante, e, por
conseguinte, auxiliam o ouvinte a discriminar certas particularidades de sua fala
(Skinner, 1957).
Skinner (1957) ressalta que a causação múltipla é crucial para a explicação do
comportamento verbal, ou seja, segundo o autor “a força de uma única resposta

pode ser, e usualmente é, função de mais de uma variável...” e “uma única variável
costuma afetar mais de uma resposta” (p. 273). Passos (2003) exemplifica a
causação múltipla com uma situação de laboratório na qual um estudante ao emitir
um comportamento verbal “treze”, contabilizando o número de pressões à barra de
seu sujeito experimental, está sob controle de determinado estímulo não-verbal (o
comportamento do rato), mas também está sob controle de seu próprio
comportamento verbal anterior “doze”. Portanto, nesse caso, o comportamento
verbal do estudante pode ser classificado como tato e intraverbal ao mesmo tempo.
Baum (1994) explica também que, em cada contexto uma verbalização qualquer
pode assumir diferentes efeitos sobre o ouvinte e que, em cada um deles, tal
verbalização pertenceria a uma atividade verbal diferente. Assim, no estudo do
comportamento verbal, uma correspondência ponto a ponto entre estímulo
discriminativo e atividade verbal é inexistente. Tal como em outras atividades
operantes, o comportamento verbal não pode ser definido apenas por suas
consequências, o contexto também deve ser levado em consideração.

Por : Maíra Matos Costa

Referências Bibliográficas

Baum, W. M. (1999). Compreender o Behaviorismo: Ciência, Comportamento e


Cultura. Porto Alegre. Ed: Artmed.
Hineline, P. N. (2003). When we speak of intentions. Em K. A. Lattal & P. N.
Chase (Eds.), Behavior theory and philosophy (pp. 167-185). New York: Kluwer
Academic / Plenum Publishers.
Passos, M. L. (2003) A análise funcional do comportamento verbal em Verbal
Behavior (1957) de B. F. Skinner. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e
Cognitiva, 5, 2, 195-213.

Skinner, B. F., (1957). O Comportamento Verbal.São Paulo. Ed: Cultrix.

Unknown 22 de setembro de 2015 17:24


Parabéns, Muito boa a sua escrita!

RESPONDER

Unknown 25 de agosto de 2016 07:39

Parabéns!!!! Além de muito bem escrito, seu texto é ideal para pessoas leigas
como eu. Já havia consultado diversos sites e não entendi o que eram os termos
que eu estava buscando, mas quando li sua explicação, compreendi
perfeitamente!!!!!!

RESPONDER

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