Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
documentário e etnográfico
fórum de antropologia e cinema
O azul do céu – novembro-dezembro 2001
Raymonde Carasco 151
Em nome da América
sobre filme de Fernando Weller
Julia Fagioli 209
Como filmar uma mulher que dança? Como, num só gesto, fazer justiça à sensu-
alidade e ao prazer que se desprendem de seus movimentos, sem transformá-la
num pedaço de carne, mas sem reduzi-la tampouco a um parágrafo dirigido à
boa consciência burguesa? No primeiro plano de Baronesa (Juliana Antunes,
2017), é preciso começar por filmá-la de lado, num arranjo formal que reúne a
barriga (onde se resolve o complicadíssimo jogo do quadradinho), o braço, parte
do quadril e dos seios; acompanhar o ritmo do funk e o frêmito do corpo em
sinuosos reenquadramentos laterais que exalam energia; e então enquadrar
o rosto de Gabriela (o colar cuidadosamente ajustado no pescoço nos diz seu
nome), seu olhar inteiramente imerso no próprio corpo e entregue à delícia da
música, até que a câmera volta à posição inicial, a canção se encerra, a moça sai
de quadro e surge o emblemático título do filme.
Já na abertura, Baronesa recusa tanto a objetificação grosseira quanto a
sintomatologia frígida, mas o olhar da realizadora se afirma não pelo que rechaça,
e sim porque encontra no mundo uma força viva e forja com ela uma proeza a
um só tempo formal e política. O filme começa como um retrato vivaz do coti-
diano de Andreia e Leidiane, moradoras da Vila Mariquinha, em Belo Horizonte,
e de seu amigo Negão. Em uma montagem que reúne fragmentos precisos e
íntegros, vemos os três em momentos de ócio, a falar sobre a vida e sonhar
com o futuro, a jogar capoeira na rua e a improvisar uma piscina na caixa d’água.
De forma cada vez mais intensa, o peso da tragédia brasileira se adensará
como uma sombra escura, que paira sobre os momentos mais lúdicos, mas
por enquanto quem reina é o desejo – na frente e atrás da câmera. Bem longe