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POLÍTICA SOCIAL
GUARULHOS – SP
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 3
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13 Política contemporânea ........................................................................................ 58
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1 INTRODUÇÃO
Prezado aluno!
O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante
ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável -
um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma
pergunta , para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum
é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a
resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas
poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em
tempo hábil.
Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa
disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das
avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que
lhe convier para isso.
A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser
seguida e prazos definidos para as atividades.
Bons estudos!
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2 OS TEÓRICOS DO ABSOLUTISMO
www.todamateria.com.br/absolutismo
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O sistema monárquico absolutista foi uma forma de organização política forjada
para conformar as instâncias de privilégios e as relações de poder às novas demandas
econômicas, políticas e sociais, emergentes com as transformações ocorridas nos
séculos XV, XVI e XVII. Ou seja, houve uma exigência de um poder central e soberano
para se adequar às exigências daquele período, marcado por guerras civis,
enfrentamentos entre a burguesia e a nobreza e de mudanças significativas do
aspecto econômico. Lembremos que a definição de “Absolutismo” para as monarquias
do século XVI e XVII não é contemporânea a esses acontecimentos, sendo um termo
difundindo no vocabulário político francês ao final do século XVIII e, na Inglaterra, em
começos do século XIX, em função da adoção de uma nova forma de estado, o liberal:
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Do ponto de vista das tradições intelectuais, as obras renascentistas que se
dedicam a refletir sobre a política e o poder ainda operam em um mundo cristão, ou
seja, a relação entre a política e a religião está presente de alguma maneira. Conforme
Chauí (2000, documento on-line), as teorias medievais são teocráticas, enquanto as
da renascença buscam outras explicações sore o poder para além da noção do divino;
“[...] no entanto, embora recusem a teocracia, não podem recusar uma outra ideia
cristã, qual seja, a de que o poder político só é legítimo se for justo e só será justo se
estiver de acordo com a vontade de Deus e a Providência divina. Assim, elementos
de teologia continuam presentes nas formulações teóricas da política”. Temos, então,
um pensamento político na modernidade constituído por duas vertentes: aqueles
teóricos que buscavam legitimar a autoridade do soberano a partir de fundamentos
religiosos, tais como o direito divino, e aqueles que se apoiam em argumentos lógicos
e racionais, afastando a moral da política. Tomadas em conjunto, e levando-se em
consideração sua conjuntura de produção, as obras dos “teóricos absolutistas” podem
ser caracterizadas, de acordo com Marilena Chauí (2000), a partir de dois elementos:
as mudanças ocorridas na cultura, na economia, na política e na
sociedade evidenciaram a existência de grupos (burgueses,
assalariados, camponeses) que não podiam invocar noções de dinastia,
família, linhagem ou sangue para explicar por que existiam e por que
haviam mudado de posição social, mas só podiam invocar a si mesmos
como indivíduos;
a existência de conflitos entre esses indivíduos e entre eles e os demais
estamentos da sociedade moderna demonstravam que a imagem de
uma comunidade cristã, fraterna, una e indivisível eram uma construção
que não correspondia à realidade.
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e Estado Civil”. É nessa grande mudança cultural, que atingiu a Europa Ocidental de
formas e em períodos distintos, que se insere o pensamento de Maquiavel, que, em
sua obra O Príncipe, traz reflexões sobre a possível separação entre moral e política;
de Thomas Hobbes, autor de Leviatã, que lança as bases da teoria contratualista para
a superação do estado de natureza; de Jean Bodin e sua obra, República, teórico da
origem divina do monarca; e de Jacques Bossuet, autor de Política Segundo a
Sagrada Escritura, que afirmava que todo o poder é legítimo e que rebelar-se contra
ele seria um sacrilégio. Vamos estudar um pouco mais sobre o pensamento desses
autores e as diferenças entre eles a seguir.
Ainda que Nicolau Maquiavel e Thomas Hobbes tenham vivido em locais e momentos
diferentes, suas preocupações intelectuais são semelhantes no que diz respeito ao
Estado como gestor dos conflitos inerentes à política, evitando as facções políticas,
como no caso de Maquiavel, ou a guerra de todos contra todos, como afirmado por
Hobbes. A seguir, veremos um pouco mais sobre o pensamento de ambos os autores.
Fonte: filosofianaescola.com/filosofos/maquiavel/
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Maquiavel nasceu em Florença, em 1469. Naquele momento, a Península
Itálica encontrava-se dividida em uma série de pequenos Estados, com diferenças
signifi cativas em relação à sua cultura e seus regimes políticos e, por consequência,
sujeitos a confl itos e invasões estrangeiras.
Fonte: www.arqnet.pt/portal/teoria/hobbes
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em luta permanente, vigorando a guerra de todos contra todos, que deu origem à
expressão “o homem é o lobo do homem”. Nessa situação, o medo é imperativo, já
que a vida não tem garantias, principalmente o medo da morte violenta. Como forma
de cessar essa situação de ameaça, estabelece-se um “contrato” entre os seres
humanos, passando-se à sociedade civil, isto é, ao Estado Civil, criando o poder
político e as leis. O “contrato social” estabelece que os indivíduos renunciam à
liberdade natural e à posse natural de bens, riquezas e armas e concordam em
transferir a um terceiro — o soberano — o poder para criar e aplicar as leis, tornando-
se autoridade política.
O contrato social funda a soberania. Aqui, há um retorno ao direito romano e
ao direito natural, principalmente na ideia de que todo indivíduo, por natureza, tem
direito à vida e à liberdade. “Por natureza, todos são livres, ainda que, por natureza,
uns sejam mais fortes e outros mais fracos. Um contrato ou um pacto, dizia a teoria
jurídica romana, só tem validade se as partes contratantes forem livres e iguais e se
voluntária e livremente derem seu consentimento ao que está sendo pactuado”
(CHAUÍ, 2000, documento on-line).
Outro dos grandes defensores do Estado contratual foi Thomas Hobbes, que
em sua obra Leviatã afirmou que todo Estado nasce do contrato mútuo entre
os homens. Estes, quando em estado de natureza, viveriam em constante
conflito e situação de guerra. Assim sendo, para garantir a ordem,
considerada a única forma de a sociedade prosperar, os indivíduos faziam
um acordo em que todos abdicavam de suas liberdades em favor de um
representante, o rei, que, por sua vez, se encarregaria de garantir a ordem.
Nessas teses, que explicam o Estado a partir de acordos e da concordância
entre reis e povo, todavia, a vontade do rei e do Estado sempre é superior à
do povo e, logo, deve ser obedecida sem resistência. Somente com a
Ilustração, no século XVIII, essas teorias seriam revistas para apresentar o
governo como representante da vontade popular. No Absolutismo, todavia,
rei e Estado se sobrepõem ao povo (SILVA; SILVA, 2009, p. 12).
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4.1 Jacques Bossuet
Fonte: www.grupoescolar.com/pesquisa/jacques-bossuet
Assim, concebeu sua teoria afirmando que o poder absoluto dos reis remontaria
a Davi e Salomão, que teriam sido ungidos por Deus, ou seja, os monarcas seriam
reis por direito divino. De acordo com seu pensamento, rebelar-se contra o poder do
monarca equivaleria a revoltar-se contra Deus. Bossuet escreveu os seis primeiros
livros da Política de 1677 a 1679, após a Revolução Inglesa de 1640 e a Fronda (1648-
1653). Nessas guerras civis, os revoltosos defendiam a limitação da soberania real a
partir da ideia contratualista e, quando os reis deixavam de agir corretamente, o
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contrato poderia ser anulado. A preocupação de Bossuet, portanto, reside na
condenação das guerras civis, na eliminação de qualquer direito de resistência dos
súditos perante os governantes estabelecidos e no reforço à soberania dos reis.
(OLIVEIRA, 2009) Não somente nas obras em que aborda diretamente as questões
políticas, mas também nas obras de cunho histórico, existe uma justificativa na
fundação do Estado como um ato de Deus de manifestação de sua vontade, e são
citados como exemplos os impérios chinês, egípcio e pérsio. A ideia de providência
divina perpassa toda a obra e o rei é apresentado, ao mesmo tempo, como governador
civil e sumo-sacerdote, representante de Deus na Terra. De acordo com Chevallier
(1999 apud LIMA, 2015, documento on-line):
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4.2 Jean Bodin
Fonte: www.todamateria.com.br/jean-bodin
Jean Bodin nasceu na França por volta de 1530, em uma família burguesa, de
prósperos artesãos. Formou-se em direito, dedicando-se ao direito civil, e, em Paris,
trabalhou como advogado da corte. Suas obras são reflexões jurídicas, que versam
sobre a separação entre Estado e governo e apresentam como inovação a
sistematização da noção de soberania.
O problema para Bodin estaria na confusão feita até então entre Estado e
governo. O termo “Estado” designa as três formas de ordenamento político
que uma República pode assumir com base no número de pessoas que
detém a soberania. Já o governo indica a maneira pela qual esse poder é
exercido – assumindo as formas legítima, despótica ou tirânica, de acordo
com a relação do soberano com as leis e com seus súditos – e a maneira
pela qual esse poder é conferido – assumindo as formas aristocrática,
democrática ou harmônica, conforme o grau de participação dos súditos nos
cargos públicos. As diversas combinações dessas possibilidades resultariam
na grande variedade de formas de governo que têm sido confundidas com as
formas de Estado (VIANNA, 2010, p. 65-66).
Bodin, no século XVI, foi o primeiro teórico a afirmar que no Estado deve haver
um poder soberano, isto é, um foco de autoridade que possa resolver todas as
pendências e arbitrar qualquer decisão. Sua obra Da República, publicada em 1576,
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aborda muitos temas de teoria política, incluindo as discussões sobre o direito divino
dos reis e a soberania, temas pelos quais a obra de Bodin costuma ser recuperada
como uma “teoria” sobre o Absolutismo.
Da República costuma ser utilizada para comparar a situação da Inglaterra e
da França absolutista, já que, quando Bodin a escreve, “[...] o reino da França estava
fraturado devido às facções nobiliárquicas das guerras confessionais, cada uma das
quais tentando impor as suas prerrogativas locais ou regionais de poder, respeitando
ou não as deliberações régias conforme os seus interesses e conveniências
particulares e, portanto, estavam desviadas de qualquer princípio de bem comum”
(VIANNA, 2010, documento on-line). Dessa forma, era imperativo ratificar o poder do
rei, acima de qualquer facção.
Diferentemente de Bossuet, Hobbes ou Maquiavel, para Bodin, a centralização
do poder e o fortalecimento da figura do monarca ocorre por meio do direito, com a
entrega pelos indivíduos de seus direitos individuais a um “Deus mortal”, o Estado.
Para ele, esse estado é regido por três conjuntos de leis: a lei moral (ou seja, os
valores do indivíduo), a lei doméstica (aplicada pelo chefe da família) e a lei civil, à
qual todos os membros da sociedade civil devem obediência. De acordo com Barros
(2009, documento on-line):
[...] não basta para Bodin a simples união de vários grupos sociais, nem a
comunhão de bens e de interesses, nem a existência das mesmas leis e de
instituições dirigidas pelo princípio da justiça. São condições necessárias,
sem dúvida, mas não suficientes. É preciso acima de tudo o estabelecimento
de um poder capaz de assegurar a coesão entre os membros da sociedade,
reunindo-os e integrando-os num só corpo.
[...] soberano deve estar livre diante das leis que estabeleceu, porque
ninguém pode obrigar-se a si mesmo, e das leis que foram estabelecidas por
seus predecessores, porque, se fosse obrigado a cumpri-las, seu poder não
seria absoluto. O soberano deve ter o poder de criar, corrigir e anular as leis
civis de acordo unicamente com sua vontade. Como a lei imposta por Deus à
natureza tem seu fundamento na livre vontade divina, a lei civil, embora possa
estar fundamentada em boas razões, retira também sua autoridade da livre
vontade do soberano (BARROS, 2009, documento on-line).
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Além da construção dessa definição de soberania, Bodin legou aos seus
contemporâneos uma justificativa para a monarquia como melhor forma de sistema
político para o exercício da soberania, que se fundamenta em três pontos:
a monarquia é o melhor sistema político para o exercício da soberania a
partir de uma análise histórica, que evidenciou a predileção dessa forma
de governo pelos povos da antiguidade;
a monarquia é a melhor forma de governo pelas leis de Deus;
a monarquia, por ter apenas um soberano, facilita o exercício e o direito
à soberania.
Fonte: brasilescola.uol.com
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classificação entre formação originária e formação derivada (AZAMBUJA, 2008). A
primeira estaria relacionada ao avanço na organização de um agrupamento pela
primeira oportunidade, isto é, sem que houvesse uma ordem política anterior. A
segunda diz respeito a situações em que novos Estado surgem a partir de outros já
existentes. Nesse caso, falamos em fracionamento (quando uma parte do território de
um Estado é desmembrada e se constitui um novo Estado) ou em união (quando dois
ou mais Estados se reúnem para formar um novo Estado).
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imposta pelo vencedor para manter a dominação do vencido (AZAMBUJA, 2008). É
também denominada teoria da violência ou teoria da conquista.
Origem econômica — considera que a reunião do sujeito em torno de um
aparato de poder organizado decorre de motivos econômicos. Assim, o Estado
proporciona a reunião de variados interesses, já que ninguém é bastante em si. Mais
do que isso, essa teoria destaca que o Estado proporciona a divisão do trabalho e a
integração de diversas atividades diferentes. Alguns autores, como Marx e Engels,
vão ao extremo dessa teoria para explicar as razões pelas quais o Estado autoriza
tantas desigualdades: na sua origem econômica, ele institucionalizou a propriedade
privada, o acúmulo de patrimônio, a divisão de classe e, por consequência, a luta entre
elas. Sobre o tema, confira a crítica de Darcy Azambuja (2008, p. 103):
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origem e a legitimação do Estado são uma decorrência do contrato entre os indivíduos
(MORAIS; STRECK, 2010). O pensamento contratualista, entretanto, não é uniforme,
merecendo especial atenção as ideias de Hobbes, Locke e Rousseau.
Fonte: conversadeportugues.com.br
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desvinculado o poder dos indivíduos, tem aberto o caminho para o
arraigamento de sua soberania (MORAIS; STRECK, 2010, p. 34).
Assim, em Hobbes, o Estado “já nasce com poderes supremos” (DINIZ, 2001,
p. 152). Reafirmamos que, para Hobbes, é a manutenção do pacto social que
possibilita a existência de paz entre o grupo social. As condições para o cumprimento
do contrato, por sua vez, são uma providência do soberano — autorizado a “velar para
que o temor ao castigo seja uma força maior que o fascínio exercido pelo desejo de
qualquer vantagem possa esperar de uma violação do contrato” (DINIZ, 2010, p. 161).
Com efeito, para Hobbes, a submissão absoluta é o preço a ser pago pelo súdito pela
salvação trazida pelo Estado (DIAS, 2013). Por essa razão, o seu pensamento é
inspiração do modelo absolutista. Ao pensamento de Hobbes, contrapõe-se Locke —
defensor das liberdades individuais e fervoroso antagonista do modelo absolutista.
Para ele, no estado de natureza, o homem já possui um domínio racional de suas
paixões e seus interesses, de modo que não se pode considerar a existência de uma
guerra potencial. Pelo contrário, nesse estágio inicial da sociedade, há uma paz
relativa que permite ao homem identificar os seus limites e reconhecer a existência de
alguns direitos. De fato, no pensamento de Locke, existem diversos direitos inatos ao
homem, como a vida, a liberdade e a propriedade. Falta, porém, uma força coercitiva
apta a solucionar conflitos que possam surgir (MORAIS; STRECK, 2010).
A necessidade de uma força coercitiva para assegurar a proteção dos direitos
inatos ao homem conduz à elaboração de um pacto entre os integrantes da sociedade.
Surge, então, o contrato social como ferramenta de legitimação do poder e de
manutenção dos direitos naturais. Assim, o pacto se sustenta na necessidade de
proteção de direitos previamente existentes e na sua proteção contra possíveis
conflitos. Surgem, assim, o estado civil e a fonte da autoridade estatal. Verificamos,
nesse panorama, o caráter individualista de Locke: o surgimento do estado civil se dá
para resguardar os direitos naturais de cada sujeito (MORAIS; STRECK, 2010), em
especial, a propriedade (APPIO, 2005). O poder do Estado, nessa linha, já surge
limitado aos direitos naturais antes existentes.
Como podemos perceber, enquanto Hobbes via no Estado um ente
plenipotente, Locke identifica no Estado um ente com poder delimitado. Por essa
razão, defende ele que os sujeitos do contrato podem se opor ao Estado quando
houver violação a direitos naturais. Existe, pois, direito de resistência na sociedade
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política defendida por Locke (MORAIS; STRECK, 2010). Ainda, para ele, quando já
instaurados a sociedade e o Estado, além do limite inicial decorrente dos direitos
naturais, deverá ser observado o princípio da maioria. Assim, haverá uma
proeminência do Poder Legislativo sobre o Poder Executivo (MORAIS; STRECK,
2010). Além disso, a observância da lei é impositiva, porque é fundada no próprio
contrato social — o deixar de seguir a lei criado pelo Poder Legislativo é o mesmo que
querer retornar ao estado natural (APPIO, 2005).
O pensamento de Rousseau também é digno de referência, já que confirma a
evolução da origem do Estado de um modelo absolutista para um modelo
democrático. Com Rousseau, a tese do estado de natureza apenas facilita o
entendimento da sociedade. Na realidade, a formação de uma sociedade teria maior
caráter histórico. É célebre a sua afirmação de que, quando o primeiro homem
reivindicou propriedade e os demais, ingênuos, aceitaram, teria surgido a sociedade.
Assim, a noção de estado de natureza é emprestada apenas para ilustrar o contrato
social e a legitimidade do poder social.
Na compreensão de Rousseau, para manter a liberdade e a igualdade do
indivíduo, propõe-se que o contrato social seja uma entrega do particular (vontade
individual) para o geral (vontade geral), de modo que, quando ocorre a incursão no
estado civil, não há uma abdicação da liberdade, mas sim uma entrega dela para toda
a comunidade. E, como o sujeito faz parte do grupo social, não há qualquer perda.
Pelo contrário, no pacto social, o indivíduo mantém a sua condição de liberdade e
igualdade. É, pois, no princípio da vontade geral que reside a legitimidade do poder
em Rousseau (MORAIS; STRECK, 2010). Nessa linha de entendimento, o poder não
decorre da submissão a um terceiro, mas da união havida entre iguais. Trata-se de
concepção na qual cada um renuncia a seus interesses particulares em detrimento da
coletividade. Confira:
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A primordial contribuição desse pensamento é o tom democrático: é
indispensável o respeito à vontade geral encarnada na maioria. O poder, nessa
passagem, não mais pertence a um príncipe ou oligarca, mas à própria comunidade.
Traz, por outro lado, a problemática reversa: Rousseau consagra o despotismo da
maioria e sufoca qualquer pensamento político contrário à voz dominante (MORAIS;
STRECK, 2010). Seja como for, no seu pensamento, há uma inegável proposta de
limitação do Estado, já que o soberano não tem o direito de sobrecarregar um
indivíduo em detrimento do outro (DIAS, 2013):
Assim, fica claro que o poder soberano, por mais que seja totalmente
absoluto, sagrado e inviolável, não ultrapassa nem pode ultrapassar os limites
das convenções gerais, e que todo homem pode dispor plenamente dos seus
bens e da sua liberdade naquilo que foi estipulado por essas convenções; de
modo que o soberano nunca tem direito de sobrecarregar mais um súdito que
o outro, uma vez que seu poder não é mais competente, quando o assunto
se torna particular” (ROUSSEAU, 2017, p. 40).
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Fonte: mundoeducacao.uol.com.br/geografia/conceito-estado
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Nesse contexto, é importante você notar a compreensão que se tem das leis,
que são uma declaração geral sobre um interesse comum. Elas existem a fim de
garantir a liberdade e a igualdade entre os homens. Além disso, a lei é sempre justa,
pois o homem não pode ser injusto consigo mesmo. Assim, “Se quisermos saber no
que consiste, precisamente, o maior de todos os bens, qual deva ser a finalidade de
todos os sistemas de legislação, verificar-se-á que se resume nestes dois objetivos
principais: a liberdade e a igualdade [...]” (ROUSSEAU, 1999, p. 127 apud SILVA;
CUNHA, 2013, p. 219). O que fundamenta e garante que a finalidade do Estado se
cumpra é a preservação da liberdade e da igualdade entre os homens. Esse também
é o fundamento da vontade geral, das leis e do corpo político. Segundo Silva e Cunha
(2013, p. 220), “[…] A vontade do corpo político é a vontade geral. Por meio dela o
homem continua a ser livre, e por ser membro deste corpo ele é igual a todos os
demais membros […] o Estado dirigido pela vontade geral é um Estado social legítimo
[...]”. Segundo Pereira (2009), três elementos constituem o Estado. Veja a seguir.
1. Um conjunto de instituições e prerrogativas, entre as quais o poder coercitivo,
que só o Estado possui, por delegação da própria sociedade.
2. O território, isto é, um espaço geograficamente delimitado onde o poder
estatal é exercido. Muitos denominam esse território de “sociedade”, ressaltando a
sua relação com o Estado, embora este mantenha relações com outras sociedades,
para além de seu território.
3. Um conjunto de regras e condutas reguladas dentro de um território, o que
ajuda a criar e manter uma cultura política comum a todos os que fazem parte da
sociedade nacional ou do que muitos chamam de “nação”.
O Estado é um fenômeno histórico e relacional. Portanto, deve ser tratado como
processo. Afinal, ele não existe de forma absoluta nem é inalterável. Veja:
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adotada pelo Serviço Social está fundamentada na teoria social de Marx. Ela parte do
pressuposto de que nos primórdios do capitalismo havia duas classes fundamentais:
a dos proprietários e a dos proletários. A primeira detinha os meios de produção e a
segunda vendia a sua força de trabalho em troca de um salário, que em parte também
era apropriado pela primeira classe. A divisão da sociedade em classes permite a
concorrência e a liberdade econômica que geram lucratividade e consumo. Com a
ascensão da burguesia no período do declínio da sociedade feudal, o antagonismo de
classes foi ficando cada vez mais aparente. Nesse contexto, as contradições não eram
eliminadas; pelo contrário, surgiam novas classes e novas condições de opressão.
Para compreender isso melhor, considere o seguinte:
A burguesia expandiu o mercado por meio dos oceanos a fim de que o comércio
chegasse a todos os cantos do mundo, criando uma interdependência geral entre os
países. Com o passar do tempo, as duas classes fundamentais foram se
estratificando, ganhando novas conotações, mas, em suma, se resumem à burguesia
e ao proletariado. Segundo Marx e Engels (2008, p. 29–30), “[...] a condição essencial
para a existência e a dominação da classe burguesa é a concentração de riqueza nas
mãos de particulares, a formação e a multiplicação do capital; a condição de existência
do capital é o trabalho assalariado [...]”.
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Fonte: mundoeducacao.uol.com.br/sociologia/classe-social.
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programa de ação política, e o materialismo histórico, como um paradigma, um
método e uma abordagem teórica para a compreensão dos processos históricos. O
materialismo histórico enquanto paradigma foi forjado por Karl Marx (1818–1883) e
Friedrich Engels (1820–1895) em diálogo com o campo historiográfico e com demais
produções das ciências humanas realizadas ao longo do século XIX. Suas obras
reúnem os conceitos e a teoria que sustentam o materialismo histórico. Além disso,
em diversas análises os autores colocaram em prática essa leitura da realidade.
Para Barros (2011), o materialismo histórico possui um núcleo conceitual
mínimo, composto pelas ideias de dialética, de materialismo e de historicidade, além
de três conceitos incontornáveis (práxis, luta de classes e modo de produção).
Contudo, outros conceitos também aparecem seguidamente na obra de Marx. A
seguir, você vai conhecer algumas definições elaboradas a partir do Dicionário de
Conceitos Históricos (2009).
Dialética: é um método de análise, fundamentado na contradição, que
organiza o raciocínio para a busca da verdade, analisando uma situação
contraditória de dada realidade. Para comprovar uma tese, o
investigador usa uma antítese, ou seja, a negação da própria tese
original. Mas a negação não é suficiente para a compreensão do
fenômeno investigado, pois toda negação, em si mesma, contém alguma
positividade (não se pode negar sem afirmar alguma coisa). É preciso
então aproveitar as contribuições positivas que existem na tese e na
antítese para se chegar a uma síntese dos dados conseguidos. De forma
simples, a síntese seria o conjunto de conclusões às quais o investigador
chega por meio da análise dialética, mas que não se apresenta como
definitivo, visto que toda realidade está sujeita ao princípio da
contradição. Começa então uma nova situação em que o movimento
tese–antítese–síntese ressurge, dando origem a outra situação, que
pode ser observada pelo movimento tese–antítese–síntese. Marx
construiu uma dialética em torno da matéria, formulando o materialismo
dialético em oposição à dialética dos idealistas Hegel e Fichte.
Luta de classes: Marx definiu classe social como a posição comum de
um conjunto de indivíduos no interior das relações sociais de produção.
Para ele, classe era um grupo social com uma função específica no
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processo produtivo. Por exemplo, os proprietários de terra, os
capitalistas e os trabalhadores constituem classes distintas. Cada um
deles ocupa um lugar específico no processo de produção: alguns
possuem a terra, outros, o capital; e os trabalhadores, a habilidade de
trabalho. As diferentes funções dão a cada classe interesses
conflitantes, além de ideias e maneiras de agir diferentes. A história, por
sua vez, seria o relato desses conflitos. Nesse sentido, a tradição
marxista tende a conceituar classe com base no lugar que cada grupo
ocupa na economia. Os estudos de Marx e Engels estiveram voltados
principalmente para as estruturas de classe das sociedades capitalistas,
não dando muita atenção às relações de classe em outras sociedades.
Por um lado, ao afirmarem que a história de todas as sociedades tinha
sido até então a história da luta de classes, os autores deram a entender
que houve classes sociais em vários períodos históricos. Por outro lado,
defenderam que a classe era uma característica específica das
sociedades capitalistas.
Modos de produção: é uma das formulações do materialismo histórico
que divide a história (sobretudo a história europeia) em épocas distintas
e sucessivas. Para Marx, os modos de produção correspondem a
estágios específicos das forças e relações de produção de dada
formação social. O modo de produção, em linguagem menos teórica,
seria o modo pelo qual determinada sociedade organiza a sua vida
econômica, o trabalho, as estruturas políticas e jurídicas e mesmo as
manifestações culturais. Todos os aspectos da vida em sociedade
(desde os aspectos materiais até os mentais) estariam determinados
pelo modo de produção da vida material. Para o materialismo histórico,
é a maneira concreta de uma sociedade organizar sua produção que dá
forma a todo o edifício social existente nela. Os modos de produção
identificados por Marx correspondem, em linhas gerais, à história do
mundo europeu, desde as comunidades primitivas até a última fase, o
comunismo. As seis épocas históricas ou modos de produção
concebidos por Marx são: comunismo primitivo; sociedade escravocrata
antiga; feudalismo; capitalismo; socialismo e comunismo. O
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funcionamento da economia, em cada um desses estágios, apresenta
níveis de tecnologia e de relações de produção particulares.
Materialidade: para o materialismo dialético, as condições materiais de
existência (a economia) são o verdadeiro móvel das ações humanas.
Assim, a dialética seria o método para se perceber e superar as
contradições sociais e históricas frequentes nas diversas sociedades
humanas ao longo da história. O pensamento de Marx consiste em partir
do real (dos homens reais e de suas contradições) e não das ideias ou
da mente, como faz Hegel. De acordo com o materialismo dialético, o
desenvolvimento histórico da humanidade não se dá pela sucessão de
fatos isolados, mas por um processo que envolve movimento e mudança
(que, por sua vez, implicam contradições).
Práxis: a teoria marxista, de profunda inspiração filosófica, trouxe
inovações para se pensar o homem e o mundo no século XIX. Marx foi
o primeiro a mostrar que o significado de uma teoria só pode ser
compreendido em relação à prática histórica correspondente. Uma teoria
não pode ser pensada e entendida sem correspondência com o contexto
histórico. Toda teoria deve, portanto, estar enraizada na realidade
histórica e dizer alguma coisa que possa transformá-la. Dessa forma,
Marx buscou conciliar reflexão filosófica e prática política, teoria e práxis
(entendida como a ação humana que transforma o mundo e a si mesma).
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8.1 A concepção de história de Marx
Fonte: www.gazetadopovo.com.br/rodrigo-constantino/artigos
O historiador espanhol Pierre Vilar afirmou, certa vez, que muitos se intitulam
“historiadores marxistas”, mas poucos se dedicam à “[...] estrita aplicação de um
método de análise teoricamente elaborado para a mais complexa das matérias de
ciência: as relações sociais entre os homens e as modalidades de suas mudanças”
(VILAR, 1995, p. 146). Vilar (1995) afirma que Marx se preocupou com a formulação
de uma ciência: coerente, dotada de um esquema teórico sólido; total, do ponto de
vista de recobrir a totalidade de uma análise; e dinâmica, passível de ser debatida a
partir das mudanças que se sucedem. Nesse sentido, os questionamentos levantados
pelo historiador espanhol são bastante pertinentes para você compreender a
concepção de história de Marx: teria sido Marx um historiador marxista? Marx desejou
alguma vez ser historiador, ou tentou alguma vez escrever história? (VILAR, 1995).
Sem dúvidas, em sua vasta produção, Marx escreveu “história” tal como é
concebida nos dias de hoje, mas talvez não como era entendida naquele momento,
em que o campo recém começava a ganhar contornos disciplinares. Seu “raciocínio
histórico” ia da teoria à empiria e vice-versa, questão que foi colocada pela
historiografia apenas na década de 1960. Em seus trabalhos sobre a França, segundo
Vilar (1995), é possível encontrar, além da “aplicabilidade” da leitura da sociedade
33
francesa por meio do materialismo histórico, questões fundamentais para a história,
como reflexões sobre as estruturas da sociedade e as noções de atualidades e de
acontecimentos. Entretanto, Hobsbawm (1998, p. 172–173) adverte que esses
trabalhos não podem ser considerados “históricos”:
Aqui reside uma das grandes diferenças entre a obra de Marx e a daqueles que
se apropriaram dela para conformar o marxismo dogmático: Marx valorava muito a
“fase de investigação” de suas pesquisas, ou seja, a empiria possuía uma importância
muito grande. Assim, a utilização de seu arcabouço conceitual e teórico como uma
“doutrina” é um reducionismo de seu método de análise, pois a empiria está
diretamente em diálogo com as fontes utilizadas por Marx (VILAR, 1995). A
explicitação desse método não está contida em sua obra, mas é realizada por seus
comentadores. Contudo, Marx inaugurou uma leitura da realidade que ele chamava
de sócio histórica, encontrando nas contradições sociais, nas lutas de classe e nos
modos de produção uma interpretação sobre as sociedades.
Assim, o conceito fundamental para compreender a interpretação de história de
Marx é o conceito de modo de produção enquanto estrutura determinada e
determinante das relações sociais. De acordo com Vilar (1995, p. 155), a originalidade
dessa formulação assenta-se em três pontos:
Os homens fazem a sua própria história, mas não a fazem segundo a sua
livre vontade; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob
aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo
passado. A tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo
o cérebro dos vivos. E justamente quando parecem empenhados em
revolucionar- -se a si e às coisas, em criar algo que jamais existiu,
precisamente nesses períodos de crise revolucionária, os homens conjuram
ansiosamente em seu auxílio os espíritos do passado, tomando-lhes
emprestado os nomes, os gritos de guerra e as roupagens, a fim de
apresentar nessa linguagem emprestada. Assim, Lutero adotou a máscara do
apóstolo Paulo, a Revolução de 1789–1814 vestiu-se alternadamente como
a república romana e como o império romano, e a Revolução de 1848 não
soube fazer nada melhor do que parodiar ora 1789, ora a tradição
revolucionária de 1793–1795. De maneira idêntica, o principiante que
aprende um novo idioma traduz sempre as palavras deste idioma para sua
língua natal; mas só quando puder manejá-lo sem apelar para o passado e
esquecer sua própria língua no emprego da nova terá assimilado o espírito
desta última e poderá produzir livremente nela (MARX, 2003, p. 7).
A história [...] mostra suas duas facetas: aquilo que se impõe sobre os
homens a partir de condições objetivas herdadas das gerações anteriores, e
aquilo que vai sendo transformado por sua ação, por seu confronto através
das lutas sociais. A história é para ele espaço de aprisionamentos e de
liberdades. Há épocas em que a história parece se impor tiranicamente sobre
esses homens, deixando-lhes margens estreitas, no interior das quais,
contudo, eles se movimentam; e há épocas em que esses mesmos homens
parecem tomar para si a tarefa de revolucionar seus destinos.
Essas ideias são retomadas por Marx em outra obra, A Ideologia Alemã:
A história nada mais é do que a sucessão das diferentes gerações, cada uma
das quais explora os materiais, capitais e as forças de produção a ela
transmitidos pelas gerações anteriores; ou seja, de um lado prossegue em
condições completamente diferentes a atividade precedente, enquanto de
outro lado modifica as circunstâncias através de uma atividade totalmente
diferente (MARX, 2001, p. 70).
35
8.2 O que os historiadores devem a Karl Marx?
O título desta seção também é o título de um artigo escrito por Eric Hobsbawm
em que o historiador avalia a contribuição da obra de Marx para a história. De acordo
com Hobsbawm, Marx rompe com as práticas historiográficas hegemônicas do século
XIX, dedicadas ao estudo da diplomacia e do político, das guerras e dos grandes
líderes. Ao proporem que a história é a história da luta de classes ou que é a história
dos modos de produção, Marx e Engels sugeriam uma inversão da perspectiva de
análise, deslocando os interesses para as bases econômico-sociais das sociedades.
Para Hobsbawm (1998), é necessário separar o que foi a contribuição de Marx
para a historiografia do que ele chamou de “marxismo vulgar”, uma apropriação sem
critérios de algumas ideias do pensamento do filósofo alemão. Segundo o autor
britânico, o “marxismo vulgar” pode ser compreendido como:
Como você pode observar, Prado Júnior evidencia a sua concepção da colônia
como uma projeção da economia mercantil. A economia e o mercado internos não
possuíam significância para a análise. Contudo, Malerba e Jesus (2016, p. 146–147)
ressaltam a importância que a obra desse autor possui para a historiografia brasileira:
39
Com o desenvolvimento da historiografia sobre a América Portuguesa, as
análises de Prado Júnior se encontram defasadas em inúmeros pontos. Contudo, no
momento da publicação de Formação do Brasil Contemporâneo, a obra representou
uma grande contribuição ao realizar a leitura da sociedade brasileira a partir de uma
perspectiva do materialismo histórico. Contudo, você não pode se esquecer de que
essa leitura está impregnada de um marxismo militante, que, como você viu
anteriormente, levou a algumas deturpações do pensamento de Marx e condicionou
as análises a uma interpretação generalizante e universalista a partir de “etapas”. É
possível perceber isso no seguinte trecho de Evolução Política do Brasil e Outros
Estudos, publicado pela primeira vez em 1933:
40
9 A QUESTÃO SOCIAL E OS MOVIMENTOS DE RESISTÊNCIA
42
você viu, se empenham em transformar uma realidade que não é justa. Os
movimentos de resistência, além da sua função de luta por igualdade e direitos,
também contribuem para aumentar a consciência da população. Assim, mostram que
é importante lutar contra qualquer tipo de exploração ou desigualdade, bem como a
favor da população e contra as mais diversas manifestações da Questão Social.
43
10.2 República Velha (1889–1930)
Ainda num regime republicano, a Ditadura Militar concentrou o poder nas mãos
do Executivo. O Congresso Nacional foi fechado e o governo foi marcado pela
perseguição a seus opositores, bem como pela censura à liberdade de expressão.
Generais do Exército assumiram a presidência da República e muitos opositores
foram obrigados a se exilar. A tortura foi prática recorrente como meio de desmantelar
organizações políticas de orientações políticas distintas daquela do governo. Os
únicos partidos políticos com permissão de funcionamento eram o Movimento
Democrático Brasileiro (MDB) e a Aliança Renovadora Nacional (Arena), emulando
uma democracia que na prática não existia, as eleições eram manipuladas.
45
10.7 Formas de exercício do poder
46
indivíduo vote diretamente em cada questão coletiva, os representantes legislativos
— eleitos pelo povo — assumem a tomada de decisão no parlamento.
Cada regime democrático apresenta uma maneira de organizar seus três
poderes. No presidencialismo, o Executivo (presidente da República) e o Legislativo
são escolhidos pelo voto direito, como no caso do Brasil. Já no parlamentarismo, os
deputados são eleitos pelo voto direto e posteriormente elegem o representante do
Executivo (primeiro-ministro).
No contexto democrático, o indivíduo assume o papel de cidadão. Assim, ele
tem o direito de participar da vida política por meio de mecanismos de participação
direta na tomada de decisões, como em plebiscitos sobre questões em comum, ou
por meio da participação em organizações que influenciam as decisões políticas. Já o
modelo anarquista apresenta uma visão política baseada na negação de toda
autoridade e na liberdade dos indivíduos. O anarquismo implica a libertação de todo
poder superior, seja ele ideológico, político, econômico ou jurídico (BOBBIO;
MATTEUCCI; PASQUINO, 1998). Veja:
48
dominados resistam. Quem obedece-o faz acreditando ser sua própria vontade.
Weber também apresenta três tipos ideais de dominação. Veja a seguir.
Dominação tradicional: tem como base de legitimação os costumes e
as tradições de determinada região/sociedade. Por exemplo: o
patriarcalismo.
Dominação carismática: tem como base de legitimação uma devoção
afetiva a um senhor devido às suas qualidades. Por exemplo: um líder
que é visto como herói, salvador e que tem seus apoiadores como
discípulos.
Dominação racional legal: tem como base de legitimação um estatuto,
um conjunto de regras. A obediência não se dá a um líder, e sim às
normas e leis estabelecidas. Por exemplo: burocracia e poder conferido
a cada cargo.
Na prática, a dominação pode apresentar características de um ou mais tipos.
Os três conceitos são nomeados como ideais: são uma tipologia, uma ferramenta para
se analisar a complexidade da vida real e para se identificarem as nuances da
autoridade. A dominação racional legal é típica dos Estados modernos, que têm toda
a sua organização baseada na racionalidade burocrática.
O Estado moderno detém o monopólio do uso da força em determinado
território. Ou seja, cada Estado possui os meios e está autorizado a exercer a violência
em seus domínios. No entanto, o fato de o Estado ter esse controle não quer dizer
que o uso da violência seja necessário para que o seu poder seja reconhecido
(WEBER, 1994). O conceito de legitimidade de Weber é a chave para se entender que
nas sociedades modernas a dominação do Estado acontece porque os indivíduos se
submetem às regras sem que o uso da força física seja necessário. O uso potencial,
e não efetivo, da violência confere legitimidade à dominação da sociedade pelo
aparelho estatal. Assim, a noção de sistema político se refere à estabilidade do
exercício do poder em sociedades complexas por meio de mecanismos sofisticados
de dominação. Ao longo do século XX, esses mecanismos tornaram-se cada vez mais
refinados. Os estudos políticos passaram a reconhecer que as estruturas de poder
não estão apenas em órgãos do Estado, mas também em instituições sociais. Dessa
forma, reconheceram que o poder ultrapassa a esfera estatal. O pensamento político
de Weber foi fundamental para o estabelecimento de diversas teorias políticas e de
49
uma sociologia política que investiga, por meio de um olhar qualitativo, o sentido das
ações e as crenças que orientam as formas de poder e dominação na vida moderna.
Os primeiros estudos sociológicos sobre política se concentravam no poder do
Estado. Ao longo do século XX, as análises sobre política consideraram as mudanças
sociais e políticas, o processo de globalização e as questões relacionadas ao poder e
às formas de governo. Foi com o surgimento da ideia de pós-modernidade, no final do
século XX, que o Estado deixou de ser considerado o principal eixo de poder das
sociedades complexas. A sociedade passou a ser vista como uma esfera repleta de
centros de poder.
Esse novo olhar sobre o poder e a política reconhece o peso da dimensão
simbólica nos processos políticos, econômicos e culturais. Em outras palavras, a
comunicação não é apenas um meio de expressão; é uma fonte de poder. O
desenvolvimento da tecnologia, de espaços virtuais, também passou a ser
considerado, visto que uma nova realidade exige novos conceitos.
Ao adotar uma visão sistêmica da política, a sociologia reconhece diversos
elementos que estão relacionados com o exercício do poder, como movimentos não
partidários, sindicatos e grupos de pressão. Os regimes democráticos dão espaço
para a manifestação política de diversos setores da sociedade, que muitas vezes
influenciam as decisões e medidas adotadas pelo Estado. Esses setores buscam
influenciar o poder público para que atenda a seus interesses (GOZETTO, 2008).
Sindicatos e algumas organizações não governamentais (ONGs) realizam esse papel.
Entre os principais grupos de pressão, na perspectiva da sociologia política, estão
aqueles ligados à produção agrária, aos trabalhadores industriais, aos segmentos
empresariais, a questões de gênero, raça, classe, meio ambiente, entre diversas
pautas. (PORTELLA, 2009)
Assim, a sociologia estuda temas como: fenômenos de natureza global, o modo
como as lideranças exercem sua autoridade em diversos países e a maneira como a
política é vista pelos indivíduos. Essa percepção de que o poder e a política se fazem
presentes em diversas esferas da sociedade orienta a sociologia política a investigar
quais mecanismos os indivíduos/grupos utilizam para fazer seus interesses
prevalecerem. As formas de participação política, os movimentos sociais, os atores
sociais que se destacam na esfera política e os processos decisórios, bem como a
50
política e as novas formas de comunicação (as redes sociais, por exemplo), são temas
que estão na agenda de pesquisa da sociologia política contemporânea.
51
Fonte: www.vivadecora.com.br
53
participação popular que começou a ser difundido ainda na Grécia Antiga. Nas
monarquias absolutistas, durante a Idade Média, a representatividade começou a se
formar, dando início ao que temos hoje como modelo de representação. Naquele
tempo, os reis convocavam grandes assembleias para tomar importantes decisões.
Como a população já era mais numerosa e encontrava-se espalhada, as localidades
enviavam representantes para as assembleias. Essas pessoas corriam a comunidade
buscando reclamações e solicitações endereçadas ao rei. As reclamações e
solicitações eram lidas pelo representante na presença de todos, sendo que o rei
respondia a cada uma das questões propostas e, de posse das respostas, o
representante devolvia o resultado para a comunidade. (Mariana Portella, 2009)
A forma da representatividade evoluiu quando os reis começaram a precisar de
mais recursos para manter a máquina do Estado, que dependia diretamente do
consentimento das pessoas. Foi quando surgiu, mais precisamente na Inglaterra, a
decisão do rei para que os representantes tomassem decisões em nome da
comunidade. Com o passar dos séculos, o poder dos representantes só aumentou, e
a questão dos representantes acabou se associando, de forma definitiva, ao conceito
de democracia que se entende no mundo ocidental. O Brasil é uma democracia
representativa, apesar de possuir instrumentos da democracia direta à disposição.
Podemos depreender essa definição do texto do art. 1º da Constituição Federal, que
trata o Brasil como uma república democrática, em que todo poder pertence ao povo,
que pode exercê-lo diretamente ou por meio dos seus representantes. Para Bonavides
(2000, p. 354), tal modelo tem, hoje, como principais bases:
54
Fonte: adfas.org.br/2020/11/06
55
12.3 Especificidades da democracia participativa
Fonte: www.slideshare.net/gwathsule/democracia-representativa-e-direta
57
13 POLÍTICA CONTEMPORÂNEA
58
de outra maneira: é necessário que o Estado intervenha na cultura, na economia e na
sociedade.
Por pensar o liberalismo dessa forma, esse movimento ficou conhecido como
centro-esquerda. Entretanto, essa teoria não defende que o Estado seja responsável
por prover os serviços públicos, mas sim por se responsabilizar para garantir que os
indivíduos tenham acesso.
Dessa forma, o Estado deve estimular a colaboração de instituições privadas
com políticas públicas que visem à melhoria da vida de pessoas que não têm acesso
à cultura, à educação e à saúde, entre outras necessidades básicas. Assim, as
instituições privadas devem estar a serviço da sociedade e promover oportunidades
para que os indivíduos possam ter condições básicas de vida.
Assim, pode-se ver várias pautas que normalmente são vinculadas ao
socialismo, ou política de esquerda, na agenda do liberalismo social. Por exemplo:
apesar de defenderem a economia com base no mercado, os liberais sociais
defendem que o Estado pode intervir na economia, com a finalidade de regulá-la;
defendem que o Estado deve pagar serviços de saúde básica; a existência de um
salário mínimo.
Já em relação ao liberalismo conservador, a discordância principal com o
liberalismo social é sobre o papel do Estado. Para os conservadores, o Estado deve
ser mínimo, ou seja, deve intervir minimamente na economia. Portanto, o indivíduo
teria poder sobre o Estado, e não o contrário.
De outro modo, os liberais sociais não acreditam em um Estado
totalitário/tirano, mas, na medida que as instituições podem entrar em conflito, ou,
ainda, estabelecer uma vantagem absurda sobre a outra, ou mesmo não cumprirem
seu papel de colaboração com a sociedade, deve haver um Estado que possa intervir.
Outro aspecto que é comum é a confusão entre liberalismo social e social- -
democracia.
O liberalismo social defende que o indivíduo deve ter sua liberdade individual
promovida pelo Estado e que este só consegue ser legítimo ao ponto que legitima a
liberdade do indivíduo. Já a socialdemocracia, que parte das ideologias socialistas,
defende que, para o indivíduo atingir a liberdade individual, é necessário que o Estado
seja reformado para uma base comunitária. Nesse sentido, é de extrema importância
59
que o Estado regule a economia, a fim de estabelecer a igualdade entre os indivíduos.
Dessa forma, pode-se sintetizar os ideais do liberalismo social em três fundamentos:
1) liberdade individual, que garante ao indivíduo autonomia e direito à
propriedade privada, tendo direito garantido de divergir dos demais ou concordar, se
reunir em grupos, sindicatos, organizações, desde que essas não limitem a liberdade
de nenhum de seus membros;
2) a regulação do Estado, para que a liberdade de uma instituição e de um
indivíduo seja respeitada e que, portanto, o respeito às divergências e a possibilidade
democrática sejam garantidos;
3) a compreensão sobre a justiça, que prevê igualdade para todos os
indivíduos, bem como diminuição das desigualdades sociais, para que o indivíduo
possa alcançar sua liberdade individual e adentrar no mercado de trabalho, visando
sempre à realização desse indivíduo.
13.2 Neoliberalismo
60
Friedrich Hayek (1989-1992), um filósofo e economista alemão, foi um dos grandes
responsáveis por adaptar as teorias liberais clássicas ao neoliberalismo do século XX,
e compôs também o conselho da primeira ministra Margaret Thatcher, por indicação
da Rainha Elizabeth II. Em sua obra mais famosa, intitulada O caminho da servidão
(1944), Hayek (1990) defende que a intervenção do Estado leva à total falta de
liberdade, e chega a comparar o intervencionismo, em seu último estágio, com a
ascensão nazista.
Ao longo do século XX, pode-se observar a ascensão e o declínio de alguns
governos que adotaram o neoliberalismo. O de maior destaque é o de Margaret
Thatcher, que conseguiu estabilizar a libra esterlina e reduzir a carga tributária,
entretanto, a desigualdade aumentou, uma vez que os mais ricos aumentaram a
renda, ao passo que os mais pobres, não. Thatcher renuncia, em 1990, quando não
consegue representar o partido dos conservadores. Outro exemplo de adesão ao
neoliberalismo foi o governo de Augusto Pinochet, que, por meio de um golpe militar
contra o presidente Salvador Allende, assumiu a presidência. Suas propostas
neoliberais, que foram elaboradas conspiratoriamente pela oposição ao governo de
Salvador e compiladas em um documento chamado El Ladrillo, propunha a reforma
da economia, contando com a colaboração das instituições privadas chilenas. O
governo Pinochet foi marcado por abusos e violações aos direitos humanos, torturas
e assassinatos.
Em 1988, Pinochet perdeu seu cargo mediante a votação do plebiscito.
Pinochet teve apoio da Escola de Chicago e de Hayeck para a sua reforma econômica.
Outro polo de desenvolvimento das teorias neoliberais foi a Escola de Chicago, que
era dirigida pelo professor Milton Friedman. O envolvimento da escola, bem como de
Friedman, se deu pela crítica ao respaldo intervencionista do Estado na economia no
governo de Roosevelt. Para Friedman, as políticas econômicas de Roosevelt, a fim
de superar a Grande Depressão, acabaram por prejudicar ainda mais o país. Portanto,
Friedman concluiu que qualquer regulamentação econômica sobre as empresas era
algo maléfico para a economia e a produtividade de um país, como, por exemplo, o
estabelecimento de um salário mínimo, que seria, segundo ele, responsável por
distorcer os custos de produção. O modelo neoliberal de governo é constantemente
criticado, principalmente pela separação da economia dos problemas sociais. Ou seja,
o modelo econômico traz consigo todo um enredo de problemas que são alvo de
61
críticos defensores dos direitos humanos, trabalhistas, sociais. Um dos grandes
críticos é o filósofo francês Pierre Brodieu, que defende que esse modelo econômico
é responsável por destruir o coletivo e distanciar a economia dos problemas sociais
de uma sociedade, principalmente por investir totalmente na ideia de consumo acima
de qualquer coletividade. (DIONIZIO,1990)
Fonte: www.aryramos.pro.br/democracia
62
democrático é o de se poder eleger um líder autoritário, tal como houve com a
ascensão nazista. A exemplo disso, têm-se a Venezuela, que elegeu o presidente
Hugo Chavez, o qual instaurou uma ditadura que tem continuidade com o governo de
Nícolas Maduro. Outro aspecto ascendente mundialmente, mas fortemente no Brasil,
é a judicialização da política e a politização do judiciário. Ou seja, assim como o
exemplo do tribunal que deferiu um festival nazista, lidamos com um paradoxo em
relação aos três poderes.
No Brasil, vê-se um forte envolvimento do judiciário na arena pública, uma
espécie de ativismo político que faz manobras com a constituição de 1988. Tal
ativismo teve início com a constituinte de 1988, quando se acreditava que o
movimento desse poder poderia significar um favorecimento da democracia.
Atualmente, vê-se uma crise entre os três poderes, de modo que o judiciário ocupa
ampla influência e vantagem em relação ao legislativo e ao executivo e não há lei, ou
controle, que regule a participação e a relação entre tais poderes, o que influencia
totalmente o Estado democrático. Há também a relação com a mídia, que já
demonstrou, desde a campanha nazista, sua eficácia. Com o advento da tecnologia,
os indivíduos têm acesso a informações constantemente.
Os partidos utilizam essa ferramenta, a fim de propagar suas propostas de
campanha, mas nem tudo que chega ao eleitor pode ser tomado como verdade. Há,
atualmente, uma forte rede de produção de conteúdos falsos, chamados de fake
news, sobre opositores em uma eleição. Isso acaba por confundir os eleitores das
reais intenções de seus candidatos. Outra pauta incontornável do cenário democrático
atual são as minorias. Pode-se ver a crescente luta de grupos em busca de direitos,
ao contrário das lutas do início do século, das sufragistas por direito ao voto, temos
hoje vários movimentos de vários grupos em busca de direitos e reconhecimento.
Atualmente, as mulheres, cada vez mais, se manifestam e ganham visibilidade,
reivindicando respeito, salários iguais aos dos homens, a não cultura machista, que
prega a inferioridade, e contra a cultura do estupro. Outro grupo que tem bastante
visibilidade são os grupos LGBT, que reivindicam reconhecimento social, medidas
contra a violência física e discursiva da homofobia, entre outros. A população negra
também luta por maiores repreensões ao racismo e busca por igualdade. O que se
pode concluir é que a democracia, por ser um regime que proporciona escolhas aos
cidadãos, apesar de ser a melhor forma de governo, apresenta falhas, pois há várias
63
demandas que precisam ser supridas, bem como estão constantemente surgindo
outras.
De todo modo, as maiores conquistas de direitos aconteceram em
manifestação e contraposição ao governo vigente. Dessa forma, a democracia
garante a liberdade de oposição, e, por isso, é a melhor entre as formas de governo.
(DIONIZIO,1990)
64
Essa ideologia da classe dominante não é reconhecida pela classe dominada
como uma deturpação das verdadeiras relações sociais; dessa forma, o proletariado
não consegue identificar e opor-se a isso. Posteriormente, no livro “A Ideologia Alemã”
(2007), Engel e Marx trabalham o conceito de ideologia e chegam à conclusão de que
a ideologia não é uma imagem distorcida da realidade, mas sim uma imagem invertida
da realidade. (LOPES, 2014)
Mais tarde, com Lênin e outros autores marxistas, a ideologia perde a
conotação negativa e passa a ser encarada como um conjunto de ideias de uma
classe, no qual o próprio marxismo é uma ideologia. Esses autores afirmam que existe
a ideologia do proletariado e a ideologia da burguesia. A ideologia burguesa é
legitimada como a ideologia dominante e, por mais que agora o proletariado possa de
ter uma visão de mundo diferente, a ideologia burguesa, por ser dominante, interfere
nas ações do proletariado. Uma classe justamente se transforma em classe
dominante quando impõe a sua ideologia como universal para as outras classes, ou
seja, quando a sua ideologia é apresentada como a forma correta de ver o mundo.
Assim, segundo Barros (2009), a ideologia não é uma realidade invertida, mas
o entendimento de uma realidade apresentada de maneira invertida e utilizada para
manter a coesão social já estabelecida. Dentro de uma economia capitalista, o Estado
utiliza seus aparelhos para garantir a manutenção e a apresentação da ideologia da
classe hegemônica. (LOPES, 2014)
Existem dois tipos de aparelhos do Estado, os de repressão e os de cunho ideológico,
como explica Santos (1980, p. 24) ao mencionar Althusser:
65
Portanto, como explicado, o ambiente escolar é um dos aparelhos ideológicos
do Estado utilizado para o ensinamento da ideologia dominante, pois, para a
existência e manutenção dessa classe dominante, é necessário que se ensine a
classe dominada a obedecer e a classe dominante a mandar. Esse ensinamento se
torna mais fácil de digerir quando vem a partir da palavra, e não da coerção. A escola
funciona para o Estado e, consequentemente, funciona para a ideologia dominante.
Ferraro (2014, p. 15) afirma que “A escola é o lugar mais eficaz para inculcação de
uma determinada ideologia por vários motivos”, e um desses motivos é o fato de que
a escola tenha substituído o papel da igreja na nossa sociedade atual. Anteriormente,
o ambiente que dominava o pensamento das crianças e dos jovens era a família e a
igreja; hoje, os ambientes em que a criança e o jovem mais estão suscetíveis a receber
as ideologias são o familiar e o escolar (LOPES, 2014).
Desde a educação primária, ensina-se a criança a reproduzir os princípios, crenças
e valores da sociedade. A criança, na fase escolar, está vulnerável e suscetível a
receber todo ensinamento que lhe é dado.
Como você pôde ver no tópico anterior, o Estado utiliza a educação como um
instrumento para ensinar e expandir a ideologia da classe dominante. Mas como
efetivamente o Estado faz isso? Quais são os mecanismos que ele utiliza? A partir de
agora é isso que você vai aprender. O primeiro mecanismo que posso apresentar a
você é o currículo escolar, que é o conjunto de diretrizes sobre a aprendizagem na
escola. Essas diretrizes orientam como as atividades educativas devem ser
66
executadas e quais são as suas finalidades. Esse currículo escolar utilizado pelas
escolas está baseado nos comportamentos e costumes dominantes na sociedade. As
crianças e os adolescentes que pertencem às classes dominantes facilmente se
adequam ao currículo escolar das escolas, pois sempre foram expostas e viveram
nessa cultura dominante. O mesmo não ocorre para as crianças e adolescentes das
classes dominadas, pois elas não conhecem e nem vivenciam a cultura da classe
dominante; o currículo escolar para essas crianças é um código que elas não
conseguem decifrar ou compreender. Sendo assim, as crianças das classes
dominantes alcançam sucesso na escola, seguindo para a educação superior, e sua
cultura é reconhecida e fortalecida pela escola. A cultura da classe dominada, por
outro lado, não encontra representatividade. (Jaíza Gomes Duarte Lopes, 2014)
O conteúdo e a estrutura pedagógica oferecidos pelas instituições de ensino
não conseguem alcançar todos os estudantes da mesma forma. Isso acontece porque
cada estudante vive uma realidade diferente e participa de uma classe social diferente,
vivenciando, cada um, uma cultura diferente. Aqueles que, fora do ambiente escolar,
participam de uma cultura diferente da imposta pela escola sofrem um grande choque
cultural e, muitas vezes, não conseguem adaptar-se à realidade imposta, o que os
leva a “fracassar” e a manter a estrutura atual da sociedade. O segundo mecanismo
seria a segregação já no acesso à educação: embora a mesma ideologia seja
repassada a todos, ainda existe uma diferença na educação recebida pelas diferentes
classes, de modo que não há equidade no acesso à educação, o que parece ocorrer
de maneira proposital para perpetuar a distinção das classes sociais.
Existem pessoas que recebem todo o conhecimento de ciências, línguas e
filosofia com a maior qualidade e estão preparadas para assumir posições de
destaque na sociedade; ao mesmo tempo, existem pessoas que recebem esses
conhecimentos de forma básica apenas para se habilitarem a exercer funções
específicas. Dessa forma, a educação também reforça as desigualdades sociais,
como explica Ferraro (2014, p. 9):
67
A formação dos professores também é um mecanismo utilizado: mesmo que
inconscientemente, os professores são formados para representar a classe dominante
dentro das salas de aulas, defendendo e valorizando apenas os trabalhos
“intelectuais” em detrimento dos trabalhos ditos “braçais”. Você não se lembra do
ditado popular brasileiro muito utilizado pelos professores: “a caneta é mais leve que
a pá”? E dos professores que sempre lhe incentivavam a estudar para ser chefe, e
não operário? Por meio de práticas pedagógicas, os professores reforçam a ideia do
mérito, com o que a escola reconhece e incentiva os esforços individuais para a
conquista de algo. Os próprios professores atribuem a si o mérito pessoal sobre a
formação acadêmica que os tornou professores (SAES, 2007). Outro mecanismo que
podemos verificar é a ênfase do Estado, principalmente em países subdesenvolvidos
como o Brasil, no ensino profissional para formar mão de obra para as empresas. A
educação profissionalizante é apresentada à população como um meio de formar
cidadãos, tirar os jovens da marginalidade, impulsionar a promoção social e promover
o desenvolvimento econômico por meio da ajuda mútua entre todos os agentes da
sociedade. (LOPES, 2014)
Esse tipo de educação, no entanto, é incentivado pela burguesia porque é uma
forma de educar, disciplinar e controlar os futuros trabalhadores para a manutenção
dos meios de produção capitalistas. A ideologia é um forte agente educativo na
educação profissional: fortalece a hierarquia no ambiente de trabalho e desestimula a
organização e o fortalecimento dos trabalhadores diante da hierarquia imposta
(BATISTA, 2013). Desenvolver uma cultura de educação técnica e profissional na
sociedade é uma estratégia para que a população de maneira sutil aceite,
inconscientemente, a dominação da ideologia corrente.
68
15.3 Os efeitos da transformação da educação no Brasil
Fonte: site.oatibaiense.com.br
O Manifesto reflete muito mais uma visão dos educadores do que um ato de
efetiva possibilidade de aplicação, já que o Estado publicava, no mesmo ano
em que se reuniam os educadores para a IV Conferência Nacional de
Educação, em dezembro de 1931, importantes reformas da legislação do
ensino. Em apenas dois meses, o governo provisório de Getúlio Vargas
mudou a face da educação, alterando de forma profunda o ensino secundário,
o ensino superior, o ensino comercial, criando o Conselho Nacional de
Educação e, como já falamos, incluindo o ensino religioso nos currículos. Mas
é claro que o Manifesto se colocou contra a divisão da educação, entre a
escola para o pobre, o primário e o profissional e, para a elite, o secundário.
Essa divisão reflete uma valoração do trabalho como “coisa” para pobre e,
para o rico, a divagação de um curso propedêutico. A escola primária e a
profissional serviriam às classes populares, enquanto o secundário e o
superior seriam para a burguesia [...].
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O Estado endossava a exclusão por meio da educação, pois oferecia uma
educação profissional ao pobre, preparava a classe média para o ensino superior e
restringia o acesso da mulher somente a instituições exclusivamente femininas ou em
turmas exclusivamente femininas. A proposta para a educação pública na Era Vargas
era preparar o povo para o trabalho, principalmente para o trabalho na embrionária
indústria brasileira. Não se tinha nenhum objetivo em moldar uma identidade nacional
a partir de uma educação democrática e nem em formar cidadãos capazes de
transformar a sociedade. Ao contrário disso:
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O Governo Fernando H. Cardoso [...] adotou o pensamento pedagógico
empresarial e as diretrizes dos organismos e das agências internacionais e
regionais, dominantemente a serviço desse pensamento como diretriz e
concepção educacional do Estado (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003, p. 108).
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16 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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