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CENTRO UNIVERSITÁRIO FAVENI

POLÍTICA SOCIAL

GUARULHOS – SP

1
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 3

2 Os teóricos do absolutismo ..................................................................................... 4

3 Nicolau Maquiavel e Thomas Hobbes ..................................................................... 7

3.1 Nicolau Maquiavel ................................................................................ 7


3.2 Thomas Hobbes ................................................................................... 9
4.1 Jacques Bossuet ................................................................................ 12
4.2 Jean Bodin ......................................................................................... 14
5 Estado como sociedade política............................................................................ 16

5.1 Formação do Estado .......................................................................... 17


5.2 Teorias naturalistas ............................................................................ 18
5.3 Teorias contratualistas ....................................................................... 19
6 O Estado e os seus papéis ................................................................................... 23

7 O Serviço Social e a divisão de classes ................................................................ 26

8 O materialismo histórico: concepção marxista da história .................................... 29

8.1 A concepção de história de Marx ....................................................... 33


8.2 O que os historiadores devem a Karl Marx? ...................................... 36
8.3 A influência de Marx na historiografia brasileira ................................. 37
9 A Questão Social e os movimentos de resistência ............................................... 41

10.1 Império (1822–1889) .......................................................................... 43


10.2 República Velha (1889–1930) ............................................................ 44
10.3 Era Vargas (1930–1945) .................................................................... 44
10.4 República Populista (1945–1964) ...................................................... 44
10.5 Ditadura Militar (1964–1985) .............................................................. 45
10.6 Nova República ou redemocratização (a partir de 1985) ................... 45
10.7 Formas de exercício do poder ............................................................ 46
11.1 A sociologia e o exercício do poder .................................................... 48
12 Modelos de democracia: democracia direta, representativa e participativa .......... 51

12.1 Democracia direta e as suas principais características ...................... 51


12.2 Modelo da democracia representativa e a sua aplicação ................... 53
12.3 Especificidades da democracia participativa ...................................... 56

2
13 Política contemporânea ........................................................................................ 58

13.1 Liberalismo social ............................................................................... 58


13.2 Neoliberalismo .................................................................................... 60
14 Cenário democrático contemporâneo ................................................................... 62

15.1 A educação como instrumento ideológico do Estado ......................... 64


15.2 Mecanismos adotados pelo Estado para transformar a educação em
um instrumento ideológico......................................................................................... 66
15.3 Os efeitos da transformação da educação no Brasil .......................... 69
BIBLIOGRAFIA BÁSICA: .......................................................................................... 73

bibliografia complementar: ........................................................................................ 73

3
1 INTRODUÇÃO

Prezado aluno!
O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante
ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável -
um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma
pergunta , para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum
é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a
resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas
poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em
tempo hábil.
Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa
disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das
avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que
lhe convier para isso.
A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser
seguida e prazos definidos para as atividades.

Bons estudos!

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2 OS TEÓRICOS DO ABSOLUTISMO

www.todamateria.com.br/absolutismo

Antes de contextualizarmos a produção dos chamados “teóricos do


Absolutismo”, compreendendo suas obras em suas conjunturas de produção e
circulação, acreditamos ser importante buscarmos uma definição de Absolutismo e
entender como esse conceito foi forjado para se referir ao sistema monárquico do
Antigo Regime. Isso porque existe uma diferença entre o emprego historiográfico do
termo e os significados que foram atribuídos ao conceito no vocabulário político de
determinadas conjunturas. Do ponto de vista da historiografia, Silva e Silva (2009, p.
11) apresentam uma síntese do que costuma ser entendido como “Absolutismo” ou
“monarquia absolutista”:

Absolutismo é um conceito histórico que se refere à forma de governo em que


o poder é centralizado na figura do monarca, que o transmite
hereditariamente. Esse sistema foi específico da Europa nos séculos XVI a
XVII. [...]
O surgimento do Absolutismo se deu com a unificação dos Estados nacionais
na Europa ocidental no início da Idade Moderna, e foi realizada com a
centralização de territórios, criação de burocracias, ou seja, centralização de
poder nas mãos dos soberanos. [...]. O Estado centralizado surgiu, assim,
interligado aos conflitos políticos entre nobreza e burguesia, característicos
desse momento histórico, além das disputas políticas entre os príncipes e a
Igreja Católica, visto que o Papado durante toda a Idade Média foi uma
considerável força internacional. [...]Assim sendo, percebemos que o
Absolutismo se liga a um determinado momento da história das nações
europeias, o momento em que uma monarquia fortalecida com os conflitos
políticos internos entre diferentes grupos sociais, e apoiada por justificativas
filosóficas, controla e consolida o Estado nacional.

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O sistema monárquico absolutista foi uma forma de organização política forjada
para conformar as instâncias de privilégios e as relações de poder às novas demandas
econômicas, políticas e sociais, emergentes com as transformações ocorridas nos
séculos XV, XVI e XVII. Ou seja, houve uma exigência de um poder central e soberano
para se adequar às exigências daquele período, marcado por guerras civis,
enfrentamentos entre a burguesia e a nobreza e de mudanças significativas do
aspecto econômico. Lembremos que a definição de “Absolutismo” para as monarquias
do século XVI e XVII não é contemporânea a esses acontecimentos, sendo um termo
difundindo no vocabulário político francês ao final do século XVIII e, na Inglaterra, em
começos do século XIX, em função da adoção de uma nova forma de estado, o liberal:

[...] para se contrapor aos ‘riscos de absolutismo’ – i.e., a concentração do


poder soberano de decisão numa autoridade executiva –, dever-se-ia formar
um sistema cameral permanente (autoridade legislativa) e conferir
independência institucional e poder fiscalizador para a justiça sobre os
demais poderes, de modo que o poder limitasse o poder (VIANNA, 2008,
documento on-line).

Os chamados “teóricos do Absolutismo” procuraram entender e, em certos


casos, justificar, o processo de centralização política e a concentração de poder no
monarca por meio de teorias que opusessem o caos e a ordem, sendo a ordem
entendida como o bom funcionamento da sociedade. Uma corrente procurou explicar
o poder a partir do direito natural, os jusnaturalistas, recuperando ideias da
antiguidade romana. Segundo esses pensadores, existiriam leis universais que
baseariam a relação entre o monarca e seus súditos, bem como a relação entre os
Estados. Outra corrente argumentava sobre o direito divido dos reis, herdeira de
crenças medievais da ligação do monarca com Deus. Ambas as concepções, a do
jusnaturalismo e do contrato social e a assentada no poder divino dos reis, defendem
um Estado unificado na mão do rei, em um sistema autocrático, com poderes
incontestes.
E como podemos definir o contexto de produção das obras dos “teóricos do
Absolutismo”? É preciso lembrar que esses pensadores estavam inseridos em uma
profunda discussão sobre o poder e a política, cujo objetivo era delinear, em diferentes
pontos de vista, o que seria uma sociedade justa, ordenada e virtuosa. A monarquia
era o regime político de predileção (em função da concentração do poder de forma
autocrática), e um dos temas de que se ocuparam foi a ideia de soberania.

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Do ponto de vista das tradições intelectuais, as obras renascentistas que se
dedicam a refletir sobre a política e o poder ainda operam em um mundo cristão, ou
seja, a relação entre a política e a religião está presente de alguma maneira. Conforme
Chauí (2000, documento on-line), as teorias medievais são teocráticas, enquanto as
da renascença buscam outras explicações sore o poder para além da noção do divino;
“[...] no entanto, embora recusem a teocracia, não podem recusar uma outra ideia
cristã, qual seja, a de que o poder político só é legítimo se for justo e só será justo se
estiver de acordo com a vontade de Deus e a Providência divina. Assim, elementos
de teologia continuam presentes nas formulações teóricas da política”. Temos, então,
um pensamento político na modernidade constituído por duas vertentes: aqueles
teóricos que buscavam legitimar a autoridade do soberano a partir de fundamentos
religiosos, tais como o direito divino, e aqueles que se apoiam em argumentos lógicos
e racionais, afastando a moral da política. Tomadas em conjunto, e levando-se em
consideração sua conjuntura de produção, as obras dos “teóricos absolutistas” podem
ser caracterizadas, de acordo com Marilena Chauí (2000), a partir de dois elementos:
 as mudanças ocorridas na cultura, na economia, na política e na
sociedade evidenciaram a existência de grupos (burgueses,
assalariados, camponeses) que não podiam invocar noções de dinastia,
família, linhagem ou sangue para explicar por que existiam e por que
haviam mudado de posição social, mas só podiam invocar a si mesmos
como indivíduos;
 a existência de conflitos entre esses indivíduos e entre eles e os demais
estamentos da sociedade moderna demonstravam que a imagem de
uma comunidade cristã, fraterna, una e indivisível eram uma construção
que não correspondia à realidade.

Essas mudanças na percepção de si mesmo e do mundo fizeram com que os


“teóricos do Absolutismo” precisassem explicar quem eram os indivíduos e por que
existiam os conflitos, bem como propor soluções para esses enfrentamentos e guerras
civis. De acordo com Chauí (2000, documento on-line), “[...] foram forçados a indagar
qual é a origem da sociedade e da política. Por que indivíduos isolados formam uma
sociedade? Por que indivíduos independentes aceitam submeter-se ao poder político
e às leis? A resposta a essas duas perguntas conduz às ideias de Estado de Natureza

6
e Estado Civil”. É nessa grande mudança cultural, que atingiu a Europa Ocidental de
formas e em períodos distintos, que se insere o pensamento de Maquiavel, que, em
sua obra O Príncipe, traz reflexões sobre a possível separação entre moral e política;
de Thomas Hobbes, autor de Leviatã, que lança as bases da teoria contratualista para
a superação do estado de natureza; de Jean Bodin e sua obra, República, teórico da
origem divina do monarca; e de Jacques Bossuet, autor de Política Segundo a
Sagrada Escritura, que afirmava que todo o poder é legítimo e que rebelar-se contra
ele seria um sacrilégio. Vamos estudar um pouco mais sobre o pensamento desses
autores e as diferenças entre eles a seguir.

3 NICOLAU MAQUIAVEL E THOMAS HOBBES

Ainda que Nicolau Maquiavel e Thomas Hobbes tenham vivido em locais e momentos
diferentes, suas preocupações intelectuais são semelhantes no que diz respeito ao
Estado como gestor dos conflitos inerentes à política, evitando as facções políticas,
como no caso de Maquiavel, ou a guerra de todos contra todos, como afirmado por
Hobbes. A seguir, veremos um pouco mais sobre o pensamento de ambos os autores.

3.1 Nicolau Maquiavel

Fonte: filosofianaescola.com/filosofos/maquiavel/

7
Maquiavel nasceu em Florença, em 1469. Naquele momento, a Península
Itálica encontrava-se dividida em uma série de pequenos Estados, com diferenças
signifi cativas em relação à sua cultura e seus regimes políticos e, por consequência,
sujeitos a confl itos e invasões estrangeiras.

Até 1494, graças aos esforços de Lourenço, o Magnífico, a península


experimentou uma certa tranquilidade. Cinco grandes Estados dominavam o
mapa político: ao sul, o reino de Nápoles, nas mãos dos Aragão; no centro,
os Estados papais controlados pela Igreja e a república de Florença, presidida
pelos Médicis; ao norte, o ducado de Milão e a república de Veneza (SADEK,
2011, p. 14).

Contudo, na passagem do século XV para o XVI, essa situação modificou- -se


em função de aspectos internos e externos. Nesse contexto, Maquiavel passou sua
infância e adolescência. Teóricos do Absolutismo 5 Em função de disputas políticas,
principalmente da rivalidade adquirida com a família Médici, Maquiavel é impedido de
exercer cargos públicos, depois de ter trabalhado como chanceler. É torturado, preso
e condenado a pagar multa. Ao ser libertado da prisão, passou a escrever suas obras,
sendo O Príncipe escrita entre 1512 e 1513.

no território da Itália, que se encontrava dividida em ducados, reinos, repúblicas e


convivia com o poder da Igreja. Veja, a seguir, os pontos em que seu pensamento é
inovador, rompendo com a tradição da filosofia política.
 Não existiria um fundamento anterior e exterior à política (como Deus, a
natureza ou a razão). A política nasce das divisões e lutas sociais na
busca de unidade e identidade.
8
 Maquiavel, diferentemente dos pensadores da Antiguidade clássica e
dos cristãos, não concebe a política como uma realização do bem
comum e da justiça, mas como tomada e manutenção do poder.
 A política não seria regida por uma moral cristã, mas por uma virtude
propriamente política, não necessariamente boa ou má. Isso não
significa que o príncipe deva ser odiado, mas temido e respeitado.
 Por fim, Maquiavel rejeita a divisão clássica dos três regimes políticos
(monarquia, aristocracia, democracia) e suas formas corruptas ou
ilegítimas (tirania, oligarquia, demagogia/anarquia), assim como não
aceita que o regime legítimo seja o hereditário e o ilegítimo, o usurpado
por conquista. Qualquer regime político — tenha a forma e a origem que
tiver — poderá ser legítimo ou ilegítimo. O critério de avaliação, ou o
valor que mede a legitimidade e a ilegitimidade, é a liberdade.

3.2 Thomas Hobbes

Fonte: www.arqnet.pt/portal/teoria/hobbes

O pensamento político de Hobbes parte do pressuposto da existência de uma


situação “pré-social”, em que as pessoas vivem em um “Estado de natureza”, isoladas

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em luta permanente, vigorando a guerra de todos contra todos, que deu origem à
expressão “o homem é o lobo do homem”. Nessa situação, o medo é imperativo, já
que a vida não tem garantias, principalmente o medo da morte violenta. Como forma
de cessar essa situação de ameaça, estabelece-se um “contrato” entre os seres
humanos, passando-se à sociedade civil, isto é, ao Estado Civil, criando o poder
político e as leis. O “contrato social” estabelece que os indivíduos renunciam à
liberdade natural e à posse natural de bens, riquezas e armas e concordam em
transferir a um terceiro — o soberano — o poder para criar e aplicar as leis, tornando-
se autoridade política.
O contrato social funda a soberania. Aqui, há um retorno ao direito romano e
ao direito natural, principalmente na ideia de que todo indivíduo, por natureza, tem
direito à vida e à liberdade. “Por natureza, todos são livres, ainda que, por natureza,
uns sejam mais fortes e outros mais fracos. Um contrato ou um pacto, dizia a teoria
jurídica romana, só tem validade se as partes contratantes forem livres e iguais e se
voluntária e livremente derem seu consentimento ao que está sendo pactuado”
(CHAUÍ, 2000, documento on-line).

Outro dos grandes defensores do Estado contratual foi Thomas Hobbes, que
em sua obra Leviatã afirmou que todo Estado nasce do contrato mútuo entre
os homens. Estes, quando em estado de natureza, viveriam em constante
conflito e situação de guerra. Assim sendo, para garantir a ordem,
considerada a única forma de a sociedade prosperar, os indivíduos faziam
um acordo em que todos abdicavam de suas liberdades em favor de um
representante, o rei, que, por sua vez, se encarregaria de garantir a ordem.
Nessas teses, que explicam o Estado a partir de acordos e da concordância
entre reis e povo, todavia, a vontade do rei e do Estado sempre é superior à
do povo e, logo, deve ser obedecida sem resistência. Somente com a
Ilustração, no século XVIII, essas teorias seriam revistas para apresentar o
governo como representante da vontade popular. No Absolutismo, todavia,
rei e Estado se sobrepõem ao povo (SILVA; SILVA, 2009, p. 12).

Assim, para Hobbes, o poder do soberano superaria os indivíduos e as


coletividades, estabelecendo a paz e trazendo segurança para todos. O fundamento
do poder não estaria na tradição (família, linhagens, sangue), mas na conveniência
de se ter um soberano absoluto, para o bem de todos. Ainda que no pensamento de
Hobbes o Estado seja visto como uma forma de superação do medo reinante na
condição de Estado de natureza, o medo não desaparece na constituição da
sociedade civil e da configuração do Estado. A capa da primeira edição de sua obra
Leviatã, publicada em 1651, apresenta a figura ameaçadora de um monarca, e o
próprio nome “Leviatã” foi retirado de um monstro presente na Bíblia (Figura 1). Nessa
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obra, Hobbes mostra os fundamentos e as razões pelas quais o monarca absoluto
deve exercer força, autoridade, influência, juízo, poder sobre os súditos, porque, sem
esse exercício de poder coercitivo pelo Estado, haveria um estado de guerra
constante.

4 JACQUES BOSSUET E JEAN BODIN

Nesta parte, estudaremos dois teóricos do Absolutismo cujas reflexões foram


permeadas por questões religiosas. Seja por aspectos ligados à trajetória de Jacques
Bossuet e Jean Bodin ou por suas convicções e crenças, suas concepções de Estado
e poder estão relacionadas a uma dimensão divina. Vejamos mais sobre suas
biografias e obras a seguir.

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4.1 Jacques Bossuet

Fonte: www.grupoescolar.com/pesquisa/jacques-bossuet

Jacques-Bénigne Bossuet (1627-1704) foi um religioso francês que procurou


na religião católica uma solução para os problemas políticos enfrentados no século
XVII.

Desde a infância e adolescência de Bossuet sua família sempre mostrou


fidelidade absoluta ao rei, e sempre se colocou ao seu serviço. A desordem
e a miséria que assolaram a França, causadas pelas perturbações da Fronda,
ficaram gravadas na memória de um jovem destinado a defender
vigorosamente a soberania indivisível na pessoa do príncipe. Neste sentido,
podemos afirmar que a doutrina de Bossuet formou-se a partir de confrontos
com problemas concretos; constituiu-se em respostas aos fatos reais que
surgiram diante dele (BARBOSA, 2007, documento on-line).

Assim, concebeu sua teoria afirmando que o poder absoluto dos reis remontaria
a Davi e Salomão, que teriam sido ungidos por Deus, ou seja, os monarcas seriam
reis por direito divino. De acordo com seu pensamento, rebelar-se contra o poder do
monarca equivaleria a revoltar-se contra Deus. Bossuet escreveu os seis primeiros
livros da Política de 1677 a 1679, após a Revolução Inglesa de 1640 e a Fronda (1648-
1653). Nessas guerras civis, os revoltosos defendiam a limitação da soberania real a
partir da ideia contratualista e, quando os reis deixavam de agir corretamente, o
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contrato poderia ser anulado. A preocupação de Bossuet, portanto, reside na
condenação das guerras civis, na eliminação de qualquer direito de resistência dos
súditos perante os governantes estabelecidos e no reforço à soberania dos reis.
(OLIVEIRA, 2009) Não somente nas obras em que aborda diretamente as questões
políticas, mas também nas obras de cunho histórico, existe uma justificativa na
fundação do Estado como um ato de Deus de manifestação de sua vontade, e são
citados como exemplos os impérios chinês, egípcio e pérsio. A ideia de providência
divina perpassa toda a obra e o rei é apresentado, ao mesmo tempo, como governador
civil e sumo-sacerdote, representante de Deus na Terra. De acordo com Chevallier
(1999 apud LIMA, 2015, documento on-line):

Ao falar da origem do governo civil, primeiramente Bossuet partiu da tese


aristotélica da natureza política do homem (o homem como animal político),
para depois chegar à tese hobbesiana do homem lobo do homem, que,
segundo ele, teve origem a partir do acontecimento bíblico do pecado original,
praticado por Adão e Eva. Para Bossuet, o pecado original foi o responsável
por ter transformado a vida numa verdadeira anarquia, fazendo prevalecer
àinsociabilidade entre os homens. Desse modo, ele acreditava que apenas
com a constituição de um governo civil seria possível garantir o
estabelecimento da paz e da segurança. Para melhor cumprir esta função,
Bossuet defendeu a monarquia absolutista como a forma mais adequada de
governo, já que qualquer tipo de divisão, no exercício do poder, era
considerado por ele como o principal mal dos Estados. Assim, esta forma de
governo defendida por Bossuet, estava fundamentada inteiramente na
sagrada escritura, com os monarcas reconhecidos como verdadeiros
ministros de Deus, ao deter todo poder necessário a manutenção da ordem
e da paz social.

Ao longo de sua trajetória, Bossuet teve um papel importante na vida e na corte


de Luis XIV — Bossuet foi seu tutor —, realizando diversos cultos realizados no
Palácio Real e proferindo orações fúnebres nas cortes francesa e britânica. A partir
dessa circulação em altos estratos do poder político, elaborou suas reflexões sobre o
Estado, o poder e a política, que serviram como forma de instrução a Luís XIV, e nos
demonstra como construiu a argumentação sobre a origem e o fundamento do poder
divino do rei. Os livros destinados à educação de Luís XVI, escritos entre 1677 e 1679,
“[...] inserem-se nesse movimento de exaltação à glória monárquica. Bossuet dedicou-
os para falar da origem do poder e da autoridade do príncipe. Com isso, a teoria do
direito divino, justificadora do Absolutismo, que se conhece já há tempo, atinge o seu
ponto culminante” (BARBOSA, 2007, documento on-line). Suas obras mais
importantes foram Discurso sobre a História Universal, publicada em 1681, e Política
tirada das Santas Escrituras, lançada em 1708. Bossuet morreu em Paris, em 1704.

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4.2 Jean Bodin

Fonte: www.todamateria.com.br/jean-bodin

Jean Bodin nasceu na França por volta de 1530, em uma família burguesa, de
prósperos artesãos. Formou-se em direito, dedicando-se ao direito civil, e, em Paris,
trabalhou como advogado da corte. Suas obras são reflexões jurídicas, que versam
sobre a separação entre Estado e governo e apresentam como inovação a
sistematização da noção de soberania.

O problema para Bodin estaria na confusão feita até então entre Estado e
governo. O termo “Estado” designa as três formas de ordenamento político
que uma República pode assumir com base no número de pessoas que
detém a soberania. Já o governo indica a maneira pela qual esse poder é
exercido – assumindo as formas legítima, despótica ou tirânica, de acordo
com a relação do soberano com as leis e com seus súditos – e a maneira
pela qual esse poder é conferido – assumindo as formas aristocrática,
democrática ou harmônica, conforme o grau de participação dos súditos nos
cargos públicos. As diversas combinações dessas possibilidades resultariam
na grande variedade de formas de governo que têm sido confundidas com as
formas de Estado (VIANNA, 2010, p. 65-66).

Bodin, no século XVI, foi o primeiro teórico a afirmar que no Estado deve haver
um poder soberano, isto é, um foco de autoridade que possa resolver todas as
pendências e arbitrar qualquer decisão. Sua obra Da República, publicada em 1576,

14
aborda muitos temas de teoria política, incluindo as discussões sobre o direito divino
dos reis e a soberania, temas pelos quais a obra de Bodin costuma ser recuperada
como uma “teoria” sobre o Absolutismo.
Da República costuma ser utilizada para comparar a situação da Inglaterra e
da França absolutista, já que, quando Bodin a escreve, “[...] o reino da França estava
fraturado devido às facções nobiliárquicas das guerras confessionais, cada uma das
quais tentando impor as suas prerrogativas locais ou regionais de poder, respeitando
ou não as deliberações régias conforme os seus interesses e conveniências
particulares e, portanto, estavam desviadas de qualquer princípio de bem comum”
(VIANNA, 2010, documento on-line). Dessa forma, era imperativo ratificar o poder do
rei, acima de qualquer facção.
Diferentemente de Bossuet, Hobbes ou Maquiavel, para Bodin, a centralização
do poder e o fortalecimento da figura do monarca ocorre por meio do direito, com a
entrega pelos indivíduos de seus direitos individuais a um “Deus mortal”, o Estado.
Para ele, esse estado é regido por três conjuntos de leis: a lei moral (ou seja, os
valores do indivíduo), a lei doméstica (aplicada pelo chefe da família) e a lei civil, à
qual todos os membros da sociedade civil devem obediência. De acordo com Barros
(2009, documento on-line):

[...] não basta para Bodin a simples união de vários grupos sociais, nem a
comunhão de bens e de interesses, nem a existência das mesmas leis e de
instituições dirigidas pelo princípio da justiça. São condições necessárias,
sem dúvida, mas não suficientes. É preciso acima de tudo o estabelecimento
de um poder capaz de assegurar a coesão entre os membros da sociedade,
reunindo-os e integrando-os num só corpo.

Contudo, o elemento mais importante do Estado é a soberania, entendida como


o poder supremo e inalienável do soberano sobre os súditos, que era concedida ao
rei por Deus. Para Bodin, ser soberano significava estar acima das leis civis:

[...] soberano deve estar livre diante das leis que estabeleceu, porque
ninguém pode obrigar-se a si mesmo, e das leis que foram estabelecidas por
seus predecessores, porque, se fosse obrigado a cumpri-las, seu poder não
seria absoluto. O soberano deve ter o poder de criar, corrigir e anular as leis
civis de acordo unicamente com sua vontade. Como a lei imposta por Deus à
natureza tem seu fundamento na livre vontade divina, a lei civil, embora possa
estar fundamentada em boas razões, retira também sua autoridade da livre
vontade do soberano (BARROS, 2009, documento on-line).

15
Além da construção dessa definição de soberania, Bodin legou aos seus
contemporâneos uma justificativa para a monarquia como melhor forma de sistema
político para o exercício da soberania, que se fundamenta em três pontos:
 a monarquia é o melhor sistema político para o exercício da soberania a
partir de uma análise histórica, que evidenciou a predileção dessa forma
de governo pelos povos da antiguidade;
 a monarquia é a melhor forma de governo pelas leis de Deus;
 a monarquia, por ter apenas um soberano, facilita o exercício e o direito
à soberania.

5 ESTADO COMO SOCIEDADE POLÍTICA

A origem da sociedade revela que o indivíduo se reúne em torno de


determinados objetivos de forma organizada e, para atingir tais finalidades, aceita ou
se submete a um poder de caráter social. Assim, revelam-se os elementos geralmente
presentes na sociedade: finalidade, ordem e poder social. Em uma perspectiva ampla,
quando a finalidade almejada reside na criação de condições gerais para a realização
dos objetivos individuais, essa sociedade é considerada política (DALLARI, 2013).

Fonte: brasilescola.uol.com

A sociedade política comunga interesses gerais e individuais, na medida em


que proporciona, a um só tempo, a consecução de fins próprios e de objetivos comuns
para todos os seus integrantes. É frequente, inclusive, que se refira à busca do bem
16
comum como a finalidade última de uma sociedade política considerada na
perspectiva mais ampla de participantes. Nessa percepção mais ampla, quando aceita
uma autoridade superior que estabeleça as regras de convivência em torno desse
objetivo comum, surge a primeira concepção de Estado. De fato, o Estado é uma
espécie de sociedade política. A expressão Estado, porém, é reveladora de momento
histórico determinado e específico.
Coube a Maquiavel o seu emprego na obra O príncipe (1513). Diante da
importância da obra, que apontava as características para um governo de sucesso no
contexto político da Itália, o termo se difundiu ao longo do século XVII, superando
concepções mais tradicionais que faziam alusão ao “estado” como grande
propriedade particular (estados na Espanha e states na Inglaterra) (DALLARI, 2013).
Mais adiante, a expressão passou a ser empregada apenas quando estivessem
presentes algumas características específicas. Foi então que surgiu, no século XVIII,
o chamado Estado moderno (DALLARI, 2013).
A dificuldade em identificar uma exata conceituação sobre o que se entende
por Estado deságua em similar desafio para encontrar as suas origens. Assim, uma
primeira corrente defende que a figura do Estado, associada a uma sociedade
organizada, sempre existiu. Não seria concebível uma sociedade sem Estado. Nesse
sentido, o Estado seria justamente o princípio organizador de toda a humanidade. Por
outro lado, uma segunda corrente afirma que o aparecimento do Estado depende das
conveniências e oportunidades de cada grupo social, dependendo das condições
concretas de cada agrupamento em cada localidade. Por fim, uma terceira corrente
destaca que somente pode ser considerado Estado aquela sociedade política com
características próprias e nascida na metade do século XVII. Para essa concepção, a
definição de Estado não é generalizável, mas um produto histórico decorrente do
reconhecimento da ideia de soberania, isto é, a concentração de poder em
determinado território e sobre uma determinada comunidade — o que somente teria
ocorrido no século XVII (MORAIS; STRECK, 2010).

5.1 Formação do Estado

A formação do Estado é tema que suscita divergências. Variadas seriam as


possíveis causas para o surgimento dessa sociedade política, sendo frequente a

17
classificação entre formação originária e formação derivada (AZAMBUJA, 2008). A
primeira estaria relacionada ao avanço na organização de um agrupamento pela
primeira oportunidade, isto é, sem que houvesse uma ordem política anterior. A
segunda diz respeito a situações em que novos Estado surgem a partir de outros já
existentes. Nesse caso, falamos em fracionamento (quando uma parte do território de
um Estado é desmembrada e se constitui um novo Estado) ou em união (quando dois
ou mais Estados se reúnem para formar um novo Estado).

5.2 Teorias naturalistas

As teorias naturalistas buscam explicar a formação originária do Estado a partir


de uma condição espontânea do ser humano. Segundo essas teorias, haveria uma
formação espontânea do Estado, que dispensa qualquer ato voluntário da
comunidade. Assim, o surgimento do Estado não depende de qualquer ato específico
do homem, mas seria produto da sua natural caminhada em sociedade. Trata-se,
portanto, de uma formação natural e, dessa forma, não contratual do Estado.
A formação natural do Estado é assim defendida por Darcy Azambuja:

[...] só um fato é permanente e dele promanam outros fatos permanentes: o


homem sempre viveu em sociedade. A sociedade só sobrevive pela
organização, que supõe a autoridade e a liberdade como elementos
essenciais; a sociedade que atinge determinado grau de evolução passa a
constituir um Estado. Para viver fora da sociedade, o homem precisaria estar
abaixo dos homens ou acima dos deuses, como disse Aristóteles, e vivendo
em sociedade ele natural e necessariamente cria a autoridade e o Estado
(AZAMBUJA, 2008, p. 109).

As principais causas não contratuais para o surgimento do Estado são


sistematizadas por Dalmo de Abreu Dallari da seguinte forma (DALLARI, 2013):
Origem familiar — considera que o núcleo familiar é a célula-mãe da sociedade
política. De fato, a partir da reunião de diversas famílias, a complexidade do grupo
social aumenta e, assim, surge o Estado enquanto figura de reunião da comunidade.
Essa foi a proposta de Fustel de Coulanges ao tratar do surgimento do Estado grego
e do Estado romano.
Origem violenta — considera que o Estado é o resultado da natural
superioridade de força de determinado grupo sobre outro. Assim, lembra Darcy
Azambuja que o Estado é, durante os seus primeiros estágios, uma organização

18
imposta pelo vencedor para manter a dominação do vencido (AZAMBUJA, 2008). É
também denominada teoria da violência ou teoria da conquista.
Origem econômica — considera que a reunião do sujeito em torno de um
aparato de poder organizado decorre de motivos econômicos. Assim, o Estado
proporciona a reunião de variados interesses, já que ninguém é bastante em si. Mais
do que isso, essa teoria destaca que o Estado proporciona a divisão do trabalho e a
integração de diversas atividades diferentes. Alguns autores, como Marx e Engels,
vão ao extremo dessa teoria para explicar as razões pelas quais o Estado autoriza
tantas desigualdades: na sua origem econômica, ele institucionalizou a propriedade
privada, o acúmulo de patrimônio, a divisão de classe e, por consequência, a luta entre
elas. Sobre o tema, confira a crítica de Darcy Azambuja (2008, p. 103):

Quanto à luta de classes, o que a história e a sociologia têm demonstrado é


que ela sempre existiu como também sempre existiu a cooperação entre as
classes; que o Estado possa ser frequentemente instrumento dessa luta é
demonstrável; mas, que ele tenha nela sua origem, é história distorcida e
sociologia para propaganda política.

Origem no desenvolvimento interno — considera que toda sociedade humana


tem um Estado em potencial que surgirá à medida que a sua complexidade aumentar.
Assim, uma sociedade pouco desenvolvida dispensa a figura do Estado, mas uma
sociedade com maior desenvolvimento tem por necessidade o surgimento do Estado.
Há, em razão disso, um surgimento do Estado naturalmente decorrente do progresso
de uma sociedade.

5.3 Teorias contratualistas

As teorias contratualistas buscam explicar a formação originária do Estado a


partir de um ato voluntário do ser humano. Segundo essas teorias, a formação do
Estado depende de uma convenção expressa realizada entre os integrantes de uma
sociedade. Assim, em linhas gerais, o surgimento do Estado dependeria de um ato
concreto de reunião e aceitação, por alguns denominado contrato social. Trata-se,
portanto, de uma formação contratual do Estado.
Para o pensamento contratualista, a sociedade e o Estado são criações
artificiais da razão humana, derivadas de um consenso, tácito ou expresso, da maioria
dos indivíduos para encerrar o estado de natureza e iniciar o estado civil. Assim, a

19
origem e a legitimação do Estado são uma decorrência do contrato entre os indivíduos
(MORAIS; STRECK, 2010). O pensamento contratualista, entretanto, não é uniforme,
merecendo especial atenção as ideias de Hobbes, Locke e Rousseau.

Fonte: conversadeportugues.com.br

Nesse sentido, Hobbes destaca que, antes da vida em sociedade, o homem se


encontrava em uma fase primitiva, caracterizada pela insegurança e incerteza
constantes. No estado de natureza, para ele, haveria uma eterna guerra de todos
contra todos, derivada do caráter eminentemente negativo do homem — que não
possui uma natureza boa. Assim, com o intuito de preservar a própria vida, o ser
humano lança mão de um pacto em que se despoja dos seus direitos em detrimento
de segurança. Entretanto, como a transgressão é ínsita ao homem, para garantir o
cumprimento do pacto social, o grupo entrega o poder social para um novo sujeito,
que é justamente o Estado. Por essa razão, a teoria contratualista de Hobbes justifica,
a um só tempo, o surgimento da sociedade organizada (estado civil) e do Estado.
Curiosamente, a figura é chamada, por Hobbes, de Leviatã (“metade monstro e
metade deus mortal”), ente capaz de garantir a paz e a defesa da vida dos seus
súditos (MORAIS; STRECK, 2010, p. 32).

O pensamento do autor inglês traz amplos poderes para o soberano, já que


não há parâmetros naturais para a ação estatal, uma que pelo contrato o
homem se despoja de tudo, exceto da vida, transferindo o asseguramento
dos interesses à sociedade política, especificamente ao soberano. O Estado
e o Direito se constroem pela demarcação de limites pelo soberano que, por
não ser partícipe na convenção instituidora e, recebendo por todo

20
desvinculado o poder dos indivíduos, tem aberto o caminho para o
arraigamento de sua soberania (MORAIS; STRECK, 2010, p. 34).

Assim, em Hobbes, o Estado “já nasce com poderes supremos” (DINIZ, 2001,
p. 152). Reafirmamos que, para Hobbes, é a manutenção do pacto social que
possibilita a existência de paz entre o grupo social. As condições para o cumprimento
do contrato, por sua vez, são uma providência do soberano — autorizado a “velar para
que o temor ao castigo seja uma força maior que o fascínio exercido pelo desejo de
qualquer vantagem possa esperar de uma violação do contrato” (DINIZ, 2010, p. 161).
Com efeito, para Hobbes, a submissão absoluta é o preço a ser pago pelo súdito pela
salvação trazida pelo Estado (DIAS, 2013). Por essa razão, o seu pensamento é
inspiração do modelo absolutista. Ao pensamento de Hobbes, contrapõe-se Locke —
defensor das liberdades individuais e fervoroso antagonista do modelo absolutista.
Para ele, no estado de natureza, o homem já possui um domínio racional de suas
paixões e seus interesses, de modo que não se pode considerar a existência de uma
guerra potencial. Pelo contrário, nesse estágio inicial da sociedade, há uma paz
relativa que permite ao homem identificar os seus limites e reconhecer a existência de
alguns direitos. De fato, no pensamento de Locke, existem diversos direitos inatos ao
homem, como a vida, a liberdade e a propriedade. Falta, porém, uma força coercitiva
apta a solucionar conflitos que possam surgir (MORAIS; STRECK, 2010).
A necessidade de uma força coercitiva para assegurar a proteção dos direitos
inatos ao homem conduz à elaboração de um pacto entre os integrantes da sociedade.
Surge, então, o contrato social como ferramenta de legitimação do poder e de
manutenção dos direitos naturais. Assim, o pacto se sustenta na necessidade de
proteção de direitos previamente existentes e na sua proteção contra possíveis
conflitos. Surgem, assim, o estado civil e a fonte da autoridade estatal. Verificamos,
nesse panorama, o caráter individualista de Locke: o surgimento do estado civil se dá
para resguardar os direitos naturais de cada sujeito (MORAIS; STRECK, 2010), em
especial, a propriedade (APPIO, 2005). O poder do Estado, nessa linha, já surge
limitado aos direitos naturais antes existentes.
Como podemos perceber, enquanto Hobbes via no Estado um ente
plenipotente, Locke identifica no Estado um ente com poder delimitado. Por essa
razão, defende ele que os sujeitos do contrato podem se opor ao Estado quando
houver violação a direitos naturais. Existe, pois, direito de resistência na sociedade

21
política defendida por Locke (MORAIS; STRECK, 2010). Ainda, para ele, quando já
instaurados a sociedade e o Estado, além do limite inicial decorrente dos direitos
naturais, deverá ser observado o princípio da maioria. Assim, haverá uma
proeminência do Poder Legislativo sobre o Poder Executivo (MORAIS; STRECK,
2010). Além disso, a observância da lei é impositiva, porque é fundada no próprio
contrato social — o deixar de seguir a lei criado pelo Poder Legislativo é o mesmo que
querer retornar ao estado natural (APPIO, 2005).
O pensamento de Rousseau também é digno de referência, já que confirma a
evolução da origem do Estado de um modelo absolutista para um modelo
democrático. Com Rousseau, a tese do estado de natureza apenas facilita o
entendimento da sociedade. Na realidade, a formação de uma sociedade teria maior
caráter histórico. É célebre a sua afirmação de que, quando o primeiro homem
reivindicou propriedade e os demais, ingênuos, aceitaram, teria surgido a sociedade.
Assim, a noção de estado de natureza é emprestada apenas para ilustrar o contrato
social e a legitimidade do poder social.
Na compreensão de Rousseau, para manter a liberdade e a igualdade do
indivíduo, propõe-se que o contrato social seja uma entrega do particular (vontade
individual) para o geral (vontade geral), de modo que, quando ocorre a incursão no
estado civil, não há uma abdicação da liberdade, mas sim uma entrega dela para toda
a comunidade. E, como o sujeito faz parte do grupo social, não há qualquer perda.
Pelo contrário, no pacto social, o indivíduo mantém a sua condição de liberdade e
igualdade. É, pois, no princípio da vontade geral que reside a legitimidade do poder
em Rousseau (MORAIS; STRECK, 2010). Nessa linha de entendimento, o poder não
decorre da submissão a um terceiro, mas da união havida entre iguais. Trata-se de
concepção na qual cada um renuncia a seus interesses particulares em detrimento da
coletividade. Confira:

Enfim, dando-se cada um a todos, não se dá a ninguém, e como não haverá


nenhum associado sobre o qual não se adquira o mesmo direito que se
cedeu, ganha-se o equivalente a tudo que se perde e mais força para se
conservar aquilo que se tem. Se, afinal, retira-se do pacto social aquilo que
não pertence à sua essência, veremos que ele se reduz aos seguintes
termos: cada um põe em comum sua pessoa e todo seu poder sob suprema
direção da vontade geral; e enquanto corpo, recebe-se cada membro como
parte indivisível do todo (ROUSSEAU, 2017, p. 24).

22
A primordial contribuição desse pensamento é o tom democrático: é
indispensável o respeito à vontade geral encarnada na maioria. O poder, nessa
passagem, não mais pertence a um príncipe ou oligarca, mas à própria comunidade.
Traz, por outro lado, a problemática reversa: Rousseau consagra o despotismo da
maioria e sufoca qualquer pensamento político contrário à voz dominante (MORAIS;
STRECK, 2010). Seja como for, no seu pensamento, há uma inegável proposta de
limitação do Estado, já que o soberano não tem o direito de sobrecarregar um
indivíduo em detrimento do outro (DIAS, 2013):

Assim, fica claro que o poder soberano, por mais que seja totalmente
absoluto, sagrado e inviolável, não ultrapassa nem pode ultrapassar os limites
das convenções gerais, e que todo homem pode dispor plenamente dos seus
bens e da sua liberdade naquilo que foi estipulado por essas convenções; de
modo que o soberano nunca tem direito de sobrecarregar mais um súdito que
o outro, uma vez que seu poder não é mais competente, quando o assunto
se torna particular” (ROUSSEAU, 2017, p. 40).

A importância da teoria contratualista da formação do Estado é inegável, já que


não apenas revela a proteção de direitos do indivíduo como também enuncia que o
Estado, desde a sua origem, é limitado.

6 O ESTADO E OS SEUS PAPÉIS

A fim de compreender a formação do Estado na atualidade, você deve refletir


sobre os pressupostos ontológicos que pontuam a constituição dessa instância, que
é um marco na história das sociedades. O homem, em seu estado de natureza, possui
sua liberdade natural e a protege com sua força física. Como disse Thomas Hobbes
(1588–1679) “o homem é o lobo do homem”, ou seja, o homem é seu próprio inimigo.
Essa premissa levou as sociedades primitivas a criarem a ordem em meio ao caos.

23
Fonte: mundoeducacao.uol.com.br/geografia/conceito-estado

A sociedade que surge do estado de natureza se constitui por meio de um


contrato social. Quando a força física já não é mais suficiente para a manutenção da
ordem, é necessária uma força superior. Nesse sentido, o homem sai de seu estado
natural para o estado civil e perde a liberdade natural. Em uma sociedade, existe a
liberdade política, que é garantida pelo Estado e não mais pela força física. Assim, ela
se iguala à liberdade natural — desde que o homem não deixe de exercer as suas
vontades. Rousseau explica que o homem possui duas vontades: uma pública e outra
particular. Sendo a vontade pública uma vontade geral, ela se sobrepõe à vontade
particular de cada um. Em um Estado legítimo, a vontade particular deve se adaptar
à vontade geral. Caso contrário, ocorre o fim do Estado. A vontade geral leva os
homens a se tornarem um só corpo e a terem uma única direção política. O corpo
político possui caráter moral e se torna existente a partir do pacto social. Ele só existe
se todos dispuserem de tudo para toda a comunidade, porque um corpo não pode
denegrir a si mesmo. Veja:

Se a vontade do corpo político é feita, tem-se um Estado legítimo. Estado


esse que é guiado pela vontade geral, e preza pela preservação da liberdade
e dos bens de cada associado. O homem natural, que vivia isolado e bastava
a si mesmo, agora, através do pacto, faz parte de um todo maior, o corpo
político. No corpo político, sua liberdade é ainda mais assegurada, já que não
depende de sua força física. O que limita essa liberdade é a vontade geral,
que, por sua vez, está diretamente ligada à criação e observância das leis
(SILVA; CUNHA, 2013, p. 218).

24
Nesse contexto, é importante você notar a compreensão que se tem das leis,
que são uma declaração geral sobre um interesse comum. Elas existem a fim de
garantir a liberdade e a igualdade entre os homens. Além disso, a lei é sempre justa,
pois o homem não pode ser injusto consigo mesmo. Assim, “Se quisermos saber no
que consiste, precisamente, o maior de todos os bens, qual deva ser a finalidade de
todos os sistemas de legislação, verificar-se-á que se resume nestes dois objetivos
principais: a liberdade e a igualdade [...]” (ROUSSEAU, 1999, p. 127 apud SILVA;
CUNHA, 2013, p. 219). O que fundamenta e garante que a finalidade do Estado se
cumpra é a preservação da liberdade e da igualdade entre os homens. Esse também
é o fundamento da vontade geral, das leis e do corpo político. Segundo Silva e Cunha
(2013, p. 220), “[…] A vontade do corpo político é a vontade geral. Por meio dela o
homem continua a ser livre, e por ser membro deste corpo ele é igual a todos os
demais membros […] o Estado dirigido pela vontade geral é um Estado social legítimo
[...]”. Segundo Pereira (2009), três elementos constituem o Estado. Veja a seguir.
1. Um conjunto de instituições e prerrogativas, entre as quais o poder coercitivo,
que só o Estado possui, por delegação da própria sociedade.
2. O território, isto é, um espaço geograficamente delimitado onde o poder
estatal é exercido. Muitos denominam esse território de “sociedade”, ressaltando a
sua relação com o Estado, embora este mantenha relações com outras sociedades,
para além de seu território.
3. Um conjunto de regras e condutas reguladas dentro de um território, o que
ajuda a criar e manter uma cultura política comum a todos os que fazem parte da
sociedade nacional ou do que muitos chamam de “nação”.
O Estado é um fenômeno histórico e relacional. Portanto, deve ser tratado como
processo. Afinal, ele não existe de forma absoluta nem é inalterável. Veja:

Por ser um processo histórico, que contempla passado, presente e futuro,


bem como a coexistência de antigos e novos elementos e determinações, a
relação praticada pelo Estado tem caráter dialético — no sentido de que
propicia um incessante jogo de oposições e influências entre sujeitos com
interesses e objetivos distintos. Ou, em outros termos, a relação dialética
realizada pelo Estado comporta igualmente antagonismos e reciprocidades
e, por isso, permite que forças desiguais e contraditórias se confrontem e se
integrem a ponto de cada uma deixar sua marca na outra e ambas
contribuírem para um resultado final (PEREIRA, 2009, p. 345).

É nessa relação com a sociedade que o Estado abrange toda a dimensão da


vida social, indivíduos e classes, assumindo diferentes responsabilidades. Entre elas,
25
a de atender às demandas e reivindicações da sociedade como um todo e não apenas
de uma classe. Mesmo possuindo um poder coercitivo, o Estado também exerce
funções protetoras, sendo pressionado e controlado pela sociedade. Pereira (2009)
ainda afirma que o Estado não é uma entidade desgarrada da sociedade. Ele não é a
única força organizada e autossuficiente na sociedade e não é um instrumento
exclusivo da classe dominante. É uma instituição constituída e dividida por interesses
diversos, que possui a tarefa primordial de administrar tais interesses sem
neutralidade. O Estado deve se relacionar com todas as classes para se legitimar e
construir sua base material de sustentação, e não apenas com a classe com que mais
se identifica. O Estado é a expressão de todas as classes. Embora zele pelos
interesses da classe dominante, acata outros interesses para manter a classe
dominada afastada do bloco de poder. Segundo Pereira (2009, p. 346), é
“relacionando-se com todas as classes que o Estado assume caráter de poder público
e exerce o controle político e ideológico sobre todas elas [...]”. Se o Estado se exime
de suas responsabilidades com certos grupos ou classes, pode perder o seu apoio ou
a sua confiança. Isso abre brechas para a sociedade se organizar autonomamente
por meio de movimentos. Além disso, isso põe em risco o bloco de poder e possibilita
o surgimento de poderes paralelos. É por isso que o Estado é, por um lado, uma
relação de dominação (ou a expressão política da dominação de quem está no poder)
e, por outro, um conjunto de instituições mediadoras e reguladoras dessa dominação.
Como você pode notar, o Estado exerce uma forma de controle sobre a
sociedade, mas também possui a função de protegê-la e está estruturado de forma a
garantir o seu poder e a sua autonomia. Na atualidade, se vive sob os mandos do
Estado neoliberal, que interfere de forma parcial na economia e visa a proteger as
classes mais desfavorecidas por meio de políticas sociais paliativas, ofertando o
mínimo para sobreviverem. Em tempos de capital, o que se vê é o Estado atuando a
favor de determinados grupos em vez de cumprir o seu papel de protetor de toda a
sociedade.

7 O SERVIÇO SOCIAL E A DIVISÃO DE CLASSES

Segundo Marx e Engels (2008, p. 8), “A história de todas as sociedades até


agora tem sido a história das lutas de classe [...]”. A concepção de classe social

26
adotada pelo Serviço Social está fundamentada na teoria social de Marx. Ela parte do
pressuposto de que nos primórdios do capitalismo havia duas classes fundamentais:
a dos proprietários e a dos proletários. A primeira detinha os meios de produção e a
segunda vendia a sua força de trabalho em troca de um salário, que em parte também
era apropriado pela primeira classe. A divisão da sociedade em classes permite a
concorrência e a liberdade econômica que geram lucratividade e consumo. Com a
ascensão da burguesia no período do declínio da sociedade feudal, o antagonismo de
classes foi ficando cada vez mais aparente. Nesse contexto, as contradições não eram
eliminadas; pelo contrário, surgiam novas classes e novas condições de opressão.
Para compreender isso melhor, considere o seguinte:

A burguesia não pode existir sem revolucionar constantemente os


instrumentos de produção, portanto as relações de produção e, por
conseguinte, todas as relações sociais. A conservação inalterada dos antigos
modos de produção era a primeira condição de existência de todas as classes
industriais anteriores. A transformação contínua da produção, o abalo
incessante de todo o sistema social, a insegurança e o movimento
permanente distinguem a época burguesa de todas as demais. As relações
rígidas e enferrujadas, com suas representações e concepções tradicionais,
são dissolvidas, e as mais recentes tornam-se antiquadas antes que se
consolidem. Tudo o que era sólido desmancha no ar, tudo o que era sagrado
é profanado, e as pessoas são finalmente forçadas a encarar com serenidade
sua posição social e suas relações recíprocas (MARX; ENGELS, 2008, p. 14).

A burguesia expandiu o mercado por meio dos oceanos a fim de que o comércio
chegasse a todos os cantos do mundo, criando uma interdependência geral entre os
países. Com o passar do tempo, as duas classes fundamentais foram se
estratificando, ganhando novas conotações, mas, em suma, se resumem à burguesia
e ao proletariado. Segundo Marx e Engels (2008, p. 29–30), “[...] a condição essencial
para a existência e a dominação da classe burguesa é a concentração de riqueza nas
mãos de particulares, a formação e a multiplicação do capital; a condição de existência
do capital é o trabalho assalariado [...]”.

27
Fonte: mundoeducacao.uol.com.br/sociologia/classe-social.

Via de regra, a burguesia (ou classe dominante) não se preocupa em retirar da


classe proletária o pouco que ela possui. A burguesia utiliza a propriedade privada, a
apropriação dos meios de produção, a apropriação da riqueza socialmente produzida
e a extração da mais-valia para manter o seu status quo. Entretanto, no decorrer da
história, a classe trabalhadora sempre demonstrou o seu descontentamento com a
condição de vida e de trabalho que lhe foi imposta. Ela tem encontrado nos
movimentos de oposição uma forma de lutar por seus direitos. Toda luta de classes é,
portanto, uma luta política (MARX; ENGELS, 2008). Assim, você pode considerar que
a divisão de classes sociais existe apenas no modo de produção capitalista e que,
portanto, é produto consolidado da lógica capitalista. Segundo Frederico (2009, p. 1),
classes sociais “[...]são entendidas como um componente estrutural da sociedade
capitalista e, ao mesmo tempo, como sujeitos coletivos que têm suas formas de
consciência e de atuação determinadas pela dinâmica da sociedade [...]”. Em suma,
a conformação das classes sociais depende do desenvolvimento da sociedade
capitalista. Nesse sentido, Duriguetto (2013) destaca a relação orgânica entre a
sociedade civil e o mundo das relações sociais de produção. É a partir dela que se
desenvolvem as classes sociais, bem como seus interesses conflitantes, suas
expressões organizativas, suas formas de consciência e até mesmo a função do
Estado. A sociedade é uma esfera em que as classes lutam pela hegemonia, e há
aquelas que transitam na contra hegemonia, buscando aliados, articulando interesses
e necessidades. O Serviço Social, em seu Código de Ética (CONSELHO FEDERAL
DE SERVIÇO SOCIAL, 1993), assume o compromisso de atuar juntamente à classe
28
trabalhadora, lutando pelos interesses dos menos favorecidos. O projeto ético-político
definido no seio da profissão visa ao fortalecimento das lutas a favor da classe
trabalhadora, o que a leva a fazer alianças com os sujeitos coletivos.
Percebe-se que aumenta cada vez mais o nível de divisão entre as classes.
Isso remonta ao conceito de Antunes (2008): “classe que vive do trabalho”. Tal
conceito exprime e dá relevância àqueles que não têm acesso aos bens produzidos
pela sociedade, mas que têm no trabalho o motivo da sua existência e da sua
sobrevivência. Na medida em que o capital vai se complexificando, a divisão de
classes vai ficando também cada vez mais complexa. O Serviço Social, com base nos
pressupostos teóricos da profissão, assume a posição política de voltar suas ações
para a defesa dos direitos da classe trabalhadora. A ideia é fortalecer vínculos,
estreitar laços com as lideranças dos movimentos e contribuir para a construção de
sujeitos coletivos, visando à emancipação política dessa classe. Em seu Código de
Ética, está expressa a “[...] opção por um projeto profissional vinculado ao processo
de construção de uma nova ordem societária, sem dominação/exploração de classe,
etnia e gênero [...]” (CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 2013, p. 24). Além
disso, está prevista a “[...] articulação com os movimentos de outras categorias
profissionais que partilhem dos princípios deste Código e com a luta geral dos
trabalhadores [...]” (CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 1993, p. 24).
Assim, como evidenciam o Código de Ética do Serviço Social, a lei de
regulamentação da profissão e o seu projeto ético-político, o Serviço Social serve
como um mecanismo para a concretização das políticas públicas. Ele atua no
enfrentamento das manifestações da Questão Social e a favor da classe trabalhadora
(CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 1993).

8 O MATERIALISMO HISTÓRICO: CONCEPÇÃO MARXISTA DA HISTÓRIA

Principais conceitos O pensamento marxista se consolidou em torno do


materialismo dialético e do materialismo histórico. Esta última terminologia é, em
geral, a mais empregada para designar a teoria marxista da história. Além disso,
Barros (2011) chama a atenção para que não se confunda ou se sobreponha
materialismo histórico e marxismo, que muitas vezes são utilizados como sinônimos.
Nesse sentido, o autor propõe uma diferenciação entre o marxismo-leninismo, como

29
programa de ação política, e o materialismo histórico, como um paradigma, um
método e uma abordagem teórica para a compreensão dos processos históricos. O
materialismo histórico enquanto paradigma foi forjado por Karl Marx (1818–1883) e
Friedrich Engels (1820–1895) em diálogo com o campo historiográfico e com demais
produções das ciências humanas realizadas ao longo do século XIX. Suas obras
reúnem os conceitos e a teoria que sustentam o materialismo histórico. Além disso,
em diversas análises os autores colocaram em prática essa leitura da realidade.
Para Barros (2011), o materialismo histórico possui um núcleo conceitual
mínimo, composto pelas ideias de dialética, de materialismo e de historicidade, além
de três conceitos incontornáveis (práxis, luta de classes e modo de produção).
Contudo, outros conceitos também aparecem seguidamente na obra de Marx. A
seguir, você vai conhecer algumas definições elaboradas a partir do Dicionário de
Conceitos Históricos (2009).
 Dialética: é um método de análise, fundamentado na contradição, que
organiza o raciocínio para a busca da verdade, analisando uma situação
contraditória de dada realidade. Para comprovar uma tese, o
investigador usa uma antítese, ou seja, a negação da própria tese
original. Mas a negação não é suficiente para a compreensão do
fenômeno investigado, pois toda negação, em si mesma, contém alguma
positividade (não se pode negar sem afirmar alguma coisa). É preciso
então aproveitar as contribuições positivas que existem na tese e na
antítese para se chegar a uma síntese dos dados conseguidos. De forma
simples, a síntese seria o conjunto de conclusões às quais o investigador
chega por meio da análise dialética, mas que não se apresenta como
definitivo, visto que toda realidade está sujeita ao princípio da
contradição. Começa então uma nova situação em que o movimento
tese–antítese–síntese ressurge, dando origem a outra situação, que
pode ser observada pelo movimento tese–antítese–síntese. Marx
construiu uma dialética em torno da matéria, formulando o materialismo
dialético em oposição à dialética dos idealistas Hegel e Fichte.
 Luta de classes: Marx definiu classe social como a posição comum de
um conjunto de indivíduos no interior das relações sociais de produção.
Para ele, classe era um grupo social com uma função específica no

30
processo produtivo. Por exemplo, os proprietários de terra, os
capitalistas e os trabalhadores constituem classes distintas. Cada um
deles ocupa um lugar específico no processo de produção: alguns
possuem a terra, outros, o capital; e os trabalhadores, a habilidade de
trabalho. As diferentes funções dão a cada classe interesses
conflitantes, além de ideias e maneiras de agir diferentes. A história, por
sua vez, seria o relato desses conflitos. Nesse sentido, a tradição
marxista tende a conceituar classe com base no lugar que cada grupo
ocupa na economia. Os estudos de Marx e Engels estiveram voltados
principalmente para as estruturas de classe das sociedades capitalistas,
não dando muita atenção às relações de classe em outras sociedades.
Por um lado, ao afirmarem que a história de todas as sociedades tinha
sido até então a história da luta de classes, os autores deram a entender
que houve classes sociais em vários períodos históricos. Por outro lado,
defenderam que a classe era uma característica específica das
sociedades capitalistas.
 Modos de produção: é uma das formulações do materialismo histórico
que divide a história (sobretudo a história europeia) em épocas distintas
e sucessivas. Para Marx, os modos de produção correspondem a
estágios específicos das forças e relações de produção de dada
formação social. O modo de produção, em linguagem menos teórica,
seria o modo pelo qual determinada sociedade organiza a sua vida
econômica, o trabalho, as estruturas políticas e jurídicas e mesmo as
manifestações culturais. Todos os aspectos da vida em sociedade
(desde os aspectos materiais até os mentais) estariam determinados
pelo modo de produção da vida material. Para o materialismo histórico,
é a maneira concreta de uma sociedade organizar sua produção que dá
forma a todo o edifício social existente nela. Os modos de produção
identificados por Marx correspondem, em linhas gerais, à história do
mundo europeu, desde as comunidades primitivas até a última fase, o
comunismo. As seis épocas históricas ou modos de produção
concebidos por Marx são: comunismo primitivo; sociedade escravocrata
antiga; feudalismo; capitalismo; socialismo e comunismo. O

31
funcionamento da economia, em cada um desses estágios, apresenta
níveis de tecnologia e de relações de produção particulares.
 Materialidade: para o materialismo dialético, as condições materiais de
existência (a economia) são o verdadeiro móvel das ações humanas.
Assim, a dialética seria o método para se perceber e superar as
contradições sociais e históricas frequentes nas diversas sociedades
humanas ao longo da história. O pensamento de Marx consiste em partir
do real (dos homens reais e de suas contradições) e não das ideias ou
da mente, como faz Hegel. De acordo com o materialismo dialético, o
desenvolvimento histórico da humanidade não se dá pela sucessão de
fatos isolados, mas por um processo que envolve movimento e mudança
(que, por sua vez, implicam contradições).
 Práxis: a teoria marxista, de profunda inspiração filosófica, trouxe
inovações para se pensar o homem e o mundo no século XIX. Marx foi
o primeiro a mostrar que o significado de uma teoria só pode ser
compreendido em relação à prática histórica correspondente. Uma teoria
não pode ser pensada e entendida sem correspondência com o contexto
histórico. Toda teoria deve, portanto, estar enraizada na realidade
histórica e dizer alguma coisa que possa transformá-la. Dessa forma,
Marx buscou conciliar reflexão filosófica e prática política, teoria e práxis
(entendida como a ação humana que transforma o mundo e a si mesma).

32
8.1 A concepção de história de Marx

Fonte: www.gazetadopovo.com.br/rodrigo-constantino/artigos

O historiador espanhol Pierre Vilar afirmou, certa vez, que muitos se intitulam
“historiadores marxistas”, mas poucos se dedicam à “[...] estrita aplicação de um
método de análise teoricamente elaborado para a mais complexa das matérias de
ciência: as relações sociais entre os homens e as modalidades de suas mudanças”
(VILAR, 1995, p. 146). Vilar (1995) afirma que Marx se preocupou com a formulação
de uma ciência: coerente, dotada de um esquema teórico sólido; total, do ponto de
vista de recobrir a totalidade de uma análise; e dinâmica, passível de ser debatida a
partir das mudanças que se sucedem. Nesse sentido, os questionamentos levantados
pelo historiador espanhol são bastante pertinentes para você compreender a
concepção de história de Marx: teria sido Marx um historiador marxista? Marx desejou
alguma vez ser historiador, ou tentou alguma vez escrever história? (VILAR, 1995).
Sem dúvidas, em sua vasta produção, Marx escreveu “história” tal como é
concebida nos dias de hoje, mas talvez não como era entendida naquele momento,
em que o campo recém começava a ganhar contornos disciplinares. Seu “raciocínio
histórico” ia da teoria à empiria e vice-versa, questão que foi colocada pela
historiografia apenas na década de 1960. Em seus trabalhos sobre a França, segundo
Vilar (1995), é possível encontrar, além da “aplicabilidade” da leitura da sociedade
33
francesa por meio do materialismo histórico, questões fundamentais para a história,
como reflexões sobre as estruturas da sociedade e as noções de atualidades e de
acontecimentos. Entretanto, Hobsbawm (1998, p. 172–173) adverte que esses
trabalhos não podem ser considerados “históricos”:

O desenvolvimento dessa influência de Marx na literatura histórica não é


evidente por si mesma, pois, embora a concepção materialista da história seja
o cerne do marxismo e embora tudo o que Marx escreveu esteja impregnado
de história, ele próprio não escreveu muita história tal como os historiadores
a entendem. Nesse sentido, Engels era mais historiador, escrevendo mais
obras que poderiam ser razoavelmente catalogadas nas bibliotecas como
“história”. [...] O que chamamos de escritos históricos de Marx consistem
quase exclusivamente de análise política corriqueira e comentários
jornalísticos, associados a um certo grau de contexto histórico. Suas análises
políticas usuais, como Lutas de classes na França e O 18 Brumário de Luís
Bonaparte, são realmente notáveis. Seus volumosos escritos jornalísticos,
ainda que de interesse irregular, contêm análises do maior interesse — entre
os quais seus artigos sobre a Índia — e, em todo caso, são exemplos de como
Marx aplicava seu método a problemas concretos, tanto de história quanto de
um período que depois se converteu em história. Mas não eram escritos como
história, tal como a entendem aqueles que se dedicam ao estudo do passado.
Por fim, o estudo de Marx sobre o capitalismo contém uma quantidade
enorme de material histórico, exemplos históricos e outros materiais
relevantes para o historiador.

Aqui reside uma das grandes diferenças entre a obra de Marx e a daqueles que
se apropriaram dela para conformar o marxismo dogmático: Marx valorava muito a
“fase de investigação” de suas pesquisas, ou seja, a empiria possuía uma importância
muito grande. Assim, a utilização de seu arcabouço conceitual e teórico como uma
“doutrina” é um reducionismo de seu método de análise, pois a empiria está
diretamente em diálogo com as fontes utilizadas por Marx (VILAR, 1995). A
explicitação desse método não está contida em sua obra, mas é realizada por seus
comentadores. Contudo, Marx inaugurou uma leitura da realidade que ele chamava
de sócio histórica, encontrando nas contradições sociais, nas lutas de classe e nos
modos de produção uma interpretação sobre as sociedades.
Assim, o conceito fundamental para compreender a interpretação de história de
Marx é o conceito de modo de produção enquanto estrutura determinada e
determinante das relações sociais. De acordo com Vilar (1995, p. 155), a originalidade
dessa formulação assenta-se em três pontos:

Mas sua originalidade não é a de ser um objeto teórico. É a de ter sido, e


continuar sendo, o primeiro objeto teórico a exprimir um todo especial,
enquanto os primeiros esboços de teoria, nas ciências humanas, se limitavam
ao econômico e tinham visto nas relações sociais dados imutáveis (a
propriedade da terra para os fisiocratas) ou condições ideais a serem
34
preenchidas (liberdade e igualdade jurídicas para os liberais). A segunda
originalidade, como objeto teórico, do modo de produção é ser uma estrutura
de funcionamento e de desenvolvimento, nem formal nem estática. A terceira
é que essa estrutura implica o princípio (econômico) da contradição (social),
contudo a necessidade de sua destruição como estrutura, de sua
desestruturação.

Para analisar, na prática, a compreensão de Marx sobre a história, leia, a


seguir, um trecho de O 18 de Brumário de Luís Bonaparte, que hoje pode ser
considerada uma obra de história do tempo presente, já que Marx a escreveu no calor
dos acontecimentos:

Os homens fazem a sua própria história, mas não a fazem segundo a sua
livre vontade; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob
aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo
passado. A tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo
o cérebro dos vivos. E justamente quando parecem empenhados em
revolucionar- -se a si e às coisas, em criar algo que jamais existiu,
precisamente nesses períodos de crise revolucionária, os homens conjuram
ansiosamente em seu auxílio os espíritos do passado, tomando-lhes
emprestado os nomes, os gritos de guerra e as roupagens, a fim de
apresentar nessa linguagem emprestada. Assim, Lutero adotou a máscara do
apóstolo Paulo, a Revolução de 1789–1814 vestiu-se alternadamente como
a república romana e como o império romano, e a Revolução de 1848 não
soube fazer nada melhor do que parodiar ora 1789, ora a tradição
revolucionária de 1793–1795. De maneira idêntica, o principiante que
aprende um novo idioma traduz sempre as palavras deste idioma para sua
língua natal; mas só quando puder manejá-lo sem apelar para o passado e
esquecer sua própria língua no emprego da nova terá assimilado o espírito
desta última e poderá produzir livremente nela (MARX, 2003, p. 7).

Barros (2011, p. 91) interpretou da seguinte forma o trecho anterior de Marx:

A história [...] mostra suas duas facetas: aquilo que se impõe sobre os
homens a partir de condições objetivas herdadas das gerações anteriores, e
aquilo que vai sendo transformado por sua ação, por seu confronto através
das lutas sociais. A história é para ele espaço de aprisionamentos e de
liberdades. Há épocas em que a história parece se impor tiranicamente sobre
esses homens, deixando-lhes margens estreitas, no interior das quais,
contudo, eles se movimentam; e há épocas em que esses mesmos homens
parecem tomar para si a tarefa de revolucionar seus destinos.

Essas ideias são retomadas por Marx em outra obra, A Ideologia Alemã:

A história nada mais é do que a sucessão das diferentes gerações, cada uma
das quais explora os materiais, capitais e as forças de produção a ela
transmitidos pelas gerações anteriores; ou seja, de um lado prossegue em
condições completamente diferentes a atividade precedente, enquanto de
outro lado modifica as circunstâncias através de uma atividade totalmente
diferente (MARX, 2001, p. 70).

35
8.2 O que os historiadores devem a Karl Marx?

O título desta seção também é o título de um artigo escrito por Eric Hobsbawm
em que o historiador avalia a contribuição da obra de Marx para a história. De acordo
com Hobsbawm, Marx rompe com as práticas historiográficas hegemônicas do século
XIX, dedicadas ao estudo da diplomacia e do político, das guerras e dos grandes
líderes. Ao proporem que a história é a história da luta de classes ou que é a história
dos modos de produção, Marx e Engels sugeriam uma inversão da perspectiva de
análise, deslocando os interesses para as bases econômico-sociais das sociedades.
Para Hobsbawm (1998), é necessário separar o que foi a contribuição de Marx
para a historiografia do que ele chamou de “marxismo vulgar”, uma apropriação sem
critérios de algumas ideias do pensamento do filósofo alemão. Segundo o autor
britânico, o “marxismo vulgar” pode ser compreendido como:

1. A “interpretação econômica da história”, ou seja, a crença de que “o fator


econômico é o fator fundamental do qual dependem os demais”; e, mais
especificamente, do qual dependiam fenômenos até então não
considerados com muita relação com questões econômicas. Nesse
sentido, essa interpretação se superpunha ao
2. Modelo da “base e superestrutura” (utilizado mais amplamente para
explicar a história das ideias). A despeito das próprias advertências de
Marx e Engels e das observações sofisticadas de alguns marxistas, esse
modelo era usualmente interpretado como uma simples relação de
dominância e dependência entre a “base econômica” e a
“superestrutura”, na maioria das vezes mediada pelo
3. “Interesse de classe e a luta de classes”. Tem-se a impressão de que
diversos historiadores marxistas vulgares não liam muito além da
primeira página do Manifesto Comunista, e da frase: “a história [escrita]
de todas as sociedades até agora existentes é a história das lutas de
classes”.
4. “Leis históricas e inevitabilidade histórica”. Acreditava-se,
acertadamente, que Marx insistira sobre um desenvolvimento sistemático
e necessário da sociedade humana na história, a partir do qual o
contingente era em grande parte excluído, de qualquer maneira, ao nível
de generalização sobre os movimentos de longo prazo. Daí a constante
preocupação nos escritos históricos dos primeiros marxistas com
problemas como o papel do indivíduo ou do acidente na história. Por outro
lado, isso podia ser — e em grande parte era — interpretado como uma
regularidade rígida e imposta, como, por exemplo, na sucessão das
formações socioeconômicas, ou mesmo como um determinismo
mecânico que às vezes se aproximava da sugestão de que não havia
alternativas na história.
5. Temas específicos de investigações históricas derivavam dos próprios
interesses de Marx, por exemplo, na história do desenvolvimento
capitalista e da industrialização, mas também, por vezes, de comentários
mais ou menos casuais.
6. Temas específicos de investigação não derivavam tanto de Marx
quanto do interesse dos movimentos associados a sua teoria, por
exemplo, nas agitações das classes oprimidas (camponeses, operários),
ou nas revoluções.
36
7. Várias observações sobre a natureza e limites da historiografia
derivavam principalmente do elemento número 2 e serviam para explicar
as motivações e métodos de historiadores que afirmavam não estarem
fazendo mais que a busca imparcial da verdade [...] (HOBSBAWM, 1998,
documento on-line).

Para Hobsbawm (1998), a contribuição de Marx para a historiografia residiria,


então, em outro âmbito, não nesse do “marxismo vulgar”. O marxismo não seria a
única teoria estrutural-funcionalista da sociedade, embora possa ser considerada a
primeira delas. Ele é distinto de grande parte das outras teorias de duas formas.
Primeiro, porque hierarquiza os fenômenos sociais (tais como infraestrutura e
superestrutura). Depois, porque afirma que toda sociedade vive tensões internas
(contradições) que se contrapõem à tendência do sistema de se manter como um
interesse vigente. Ainda de acordo com Hobsbawm (1998), a relevância desses
aspectos do marxismo se relaciona ao campo da história. Afinal, são tais aspectos
que permitem explicar por que de que maneira as sociedades se alteram, ou seja, os
fatos da evolução social. Portanto, de acordo com o historiador, a força de Marx está
em sua insistência tanto na existência da estrutura social quanto na sua historicidade.
Atualmente, afirma Hobsbawm (1998, documento on-line), “[...] quando a existência
de sistemas sociais é geralmente aceita, mas à custa de sua análise a-histórica,
quando não anti-histórica, a ênfase de Marx na história como dimensão necessária
talvez seja mais essencial do que nunca”. Assim, como você pode notar, a influência
de Marx sobre os historiadores, e não somente os historiadores marxistas, deu-se não
apenas pela concepção materialista da história, mas também em relação a suas
observações sobre aspectos, períodos e problemas específicos do passado. É
importante, dessa forma, não cometer o erro de compreender o pensamento de Marx
a partir de fórmulas concisas que foram popularizadas e frequentemente aceitas como
um “resumo” da teoria marxista.

8.3 A influência de Marx na historiografia brasileira

De acordo com os historiadores Malerba e Jesus (2016), existem alguns


indícios da presença do pensamento de Marx em materiais produzidos no Brasil desde
o final do século XIX. Porém, sua influência se tornou notória nas primeiras décadas
do século XX. Primeiramente, a obra de Marx foi utilizada como um corpo doutrinário
que orientou o ativismo político e funcionou como uma inspiração teórica para
37
reflexões sobre a sociedade, com influências nas ciências humanas e sociais. No
Brasil, a virada do século XIX para o XX, mais precisamente a década de 1930,
representa um momento de elaboração de muitas análises que problematizavam a
realidade nacional. Veja o que afirmam Malerba e Jesus (2016, p. 144):

Neste período decisivo da história brasileira, jovens ativistas e intelectuais de


esquerda que se destacariam como protagonistas do pensamento político e
acadêmico nas décadas seguintes estiveram envolvidos em uma atmosfera
de mudança coletiva quanto à sua percepção sobre o país e, especialmente,
na forma como avaliaram o papel do Brasil no cenário geopolítico global. A
partir de tais diagnósticos, eles produziram diferentes projetos para o futuro
do país.

No conjunto desses pensadores, destaca-se Caio Prado Júnior (1907–1990), a


quem pode ser atribuído o título de “[...] fundador da historiografia marxista no Brasil”
(MALERBA; JESUS, 2016, p. 143). Na impossibilidade de abarcar aqui todos os
historiadores marxistas brasileiros e os debates desenvolvidos por eles, a seguir você
vai conhecer melhor a produção de Caio Prado Júnior e o debate empreendido por
ele sobre o “sentido” da colonização no Brasil. Contudo, você deve ter em mente que
a historiografia marxista brasileira se desenvolveu em diferentes áreas. Entre as
discussões mais intensas, considere:
 aquelas sobre a posição do País no sistema capitalista mundial (desde
o mercantilismo) e as condições para a realização da revolução no
Brasil, correlatas à discussão sobre a colonização brasileira;
 aquelas sobre a historiografia do mundo do trabalho, com ênfase nos
estudos sobre o sistema escravista, a formação da classe trabalhadora
e as mobilizações operárias ao longo do século XX, em sua relação
com o Estado brasileiro.

Trabalhando com noções de “essência” e “sentido”, Caio Prado Júnior, em


Formação do Brasil Contemporâneo, publicado pela primeira vez em 1942, procurou
compreender a gênese da economia e da sociedade brasileiras. Para o autor, ir à
“essência de nossa formação” significava buscar um sentido para a colonização do
Brasil ter-se dado de determinada forma. Tratava-se da busca de um “objetivo exterior,
voltado para fora do país e sem atenção a considerações que não fossem o interesse
daquele comércio [europeu]” (PRADO JUNIOR, 1971, p. 32). Como você pode notar,
Prado Júnior considerava a formação econômico- -social brasileira o resultado de uma
38
intencionalidade de Portugal, uma nação vanguardista disposta a conquistar
mercados e metais, de acordo com a lógica colonial-mercantilista dos séculos XV e
XVI. Assim, para ele, não haveria outra alternativa à colônia brasileira a não ser se
organizar conforme os interesses metropolitanos portugueses, já que, segundo o
autor, os fatos que constituem um país “[...] seguem uma linha mestra e ininterrupta
de acontecimentos que se sucedem em ordem rigorosa, e dirigida sempre numa
determinada orientação” (PRADO JUNIOR, 1971, p. 7). Portanto, a economia e a
sociedade brasileiras dos séculos XVI a XIX organizaram-se a fim de atender a uma
demanda externa. Aqui, pode-se perceber uma referência aos ciclos de produção
brasileiros: primeiramente o cultivo do açúcar, depois a exploração do ouro e, em
seguida, a produção de café. Assim, a economia voltara-se para necessidades
externas, ignorando, ou desprezando pela insigni ficância, a existência e a demanda
do mercado interno. A sociedade formara-se com a hierarquização da propriedade de
bens, da cor e da raça, bem como pela miscigenação populacional dos três séculos
posteriores ao descobrimento. Veja o que afirma Prado Júnior (1971, p. 31–32):

Se vamos à essência de nossa formação, veremos que na realidade nos


constituímos para fornecer açúcar, tabaco, alguns outros gêneros [...] e em
seguida café, para o comércio europeu [...]. Foi com tal objetivo, objetivo
exterior, voltado para fora do país e sem atenção a considerações que não
fossem do interesse daquele comércio, que se organizaram a sociedade e a
economia brasileiras. Tudo se disporá naquele sentido: a estrutura, bem
como as atividades do país.

Como você pode observar, Prado Júnior evidencia a sua concepção da colônia
como uma projeção da economia mercantil. A economia e o mercado internos não
possuíam significância para a análise. Contudo, Malerba e Jesus (2016, p. 146–147)
ressaltam a importância que a obra desse autor possui para a historiografia brasileira:

Formação do Brasil Contemporâneo (1942) é, sem dúvida, até hoje, um dos


livros mais importantes sobre a história do Brasil. Visto em perspectiva, o
impacto da abordagem oferecida por Caio Prado Jr. impressiona por sua
capacidade de criar uma tradição analítica que se renova ao longo de
décadas. Em termos práticos, este livro inaugurou uma espécie de escola de
pensamento sobre o Brasil colonial. Como consequência, é certamente um
dos livros mais lidos por estudantes de história em todo o Brasil. E, o mais
interessante, na maioria das vezes, é lido não apenas como necessário para
compreender a história da historiografia, mas principalmente como um texto
com conteúdo empírico e estrutura conceitual e analítica ainda amplamente
aceita pela comunidade acadêmica.

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Com o desenvolvimento da historiografia sobre a América Portuguesa, as
análises de Prado Júnior se encontram defasadas em inúmeros pontos. Contudo, no
momento da publicação de Formação do Brasil Contemporâneo, a obra representou
uma grande contribuição ao realizar a leitura da sociedade brasileira a partir de uma
perspectiva do materialismo histórico. Contudo, você não pode se esquecer de que
essa leitura está impregnada de um marxismo militante, que, como você viu
anteriormente, levou a algumas deturpações do pensamento de Marx e condicionou
as análises a uma interpretação generalizante e universalista a partir de “etapas”. É
possível perceber isso no seguinte trecho de Evolução Política do Brasil e Outros
Estudos, publicado pela primeira vez em 1933:

[...] em outras palavras, é a superestrutura política da Brasil colônia que, já


não correspondendo ao estado de forças produtivas e à infraestrutura
econômica do país, se rompe, para dar lugar a outras formas mais adequadas
às novas condições econômicas e capazes de conter a sua evolução
(PRADO JUNIOR, 1969, p. 49).

Caio Prado Júnior herdou do pensamento marxista essa concepção “etapista”,


uma deturpação da ideia de totalidade. No momento em que escreveu Evolução
Política, o autor estava preocupado em explicar as desigualdades da sociedade
brasileira. Assim, seu olhar para o passado estava condicionado a encontrar as
origens e os motivos pelos quais a sociedade brasileira da década de 1930 era tão
desigual. Por fim, é importante você notar que o marxismo não foi apropriado por
estudiosos brasileiros somente como o fez Caio Prado Júnior. Nas décadas de 1970
e 1980, foram realizados debates sobre a história da escravidão e a formação da
classe trabalhadora brasileira que possuem grande sofisticação intelectual. Além
disso, é preciso chamar a atenção, como faz Malerba (2002, p. 35–36), para o fato de
que “[...] não há tema ou período da história do Brasil cuja investigação historiográfica
não aponte para alguma matriz marxista fundamental, que tenha resultado em prolixo
debate e com a qual qualquer pesquisador tem que se haver”.

40
9 A QUESTÃO SOCIAL E OS MOVIMENTOS DE RESISTÊNCIA

A Questão Social teve sua origem no século XVIII, em um cenário em que se


desenvolviam as revoluções liberais burguesas. Ao mesmo tempo, o capitalismo se
consolidava, levando à formação do proletariado e, em contraponto, ao surgimento de
ideias anarquistas e socialistas. Assim, a Questão Social é resultado da contradição
existente entre capital e trabalho e consequência do capitalismo que se expandia —
no entanto, não sem sofrer a resistência dos indivíduos que buscava subalternizar
(SEVERINO, 1993). Nessa perspectiva, considere a definição de Questão Social de
Iamamoto (1999, p. 27):

O conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista


madura, que têm uma raiz comum: a produção social é cada vez mais
coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a apropriação
dos seus frutos se mantém privada, monopolizada por uma parte da
sociedade.

As manifestações da Questão Social aparecem na sociedade de múltiplas


formas. Entre elas, desemprego, pobreza, precarização das condições de trabalho,
violências de todos os tipos e trabalho infantil. Assim, segundo Iamamoto (1999, p.
28), “[...] a questão social [...] sendo desigualdade é também rebeldia por envolver
sujeitos que vivenciam as desigualdades e a elas resistem e se opõem [...]”. Nessa
perspectiva, surge outra possibilidade de manifestação, os movimentos de resistência.
Dessa forma, entram em jogo as políticas conquistadas e efetivadas, os movimentos
sociais e comunitários e as organizações populares, que se configuram como espaços
repletos de possibilidades.
Segundo Oliveira e Magalhães (2014), o termo “resistência” foi desenvolvido
por James Scott. Para ele, há diversas formas de dominação nas relações sociais,
compreendidas como relações de poder. Quem estiver em situação de subalternidade
ou de opressão nessas relações tentará resistir. Para tanto, utilizará os mais variados
meios. As condutas dos subordinados diante dos dominantes são chamadas pelo
autor de “discursos públicos”. Tais discursos se referem ao que é hegemonicamente
aceito na sociedade, muitas vezes diferente do que ambos os grupos gostariam de
expressar. Vale destacar ainda que os grupos dominantes, não raras vezes, precisam
atender aos interesses dos subordinados e levá-los a acreditar que estão realizando
algo em seu benefício, ainda que algumas concessões tenham de ser feitas. A
41
resistência, presente em vários movimentos e organizações da sociedade, é uma
forma de luta pela mudança social. Ela confronta diariamente as elites econômicas
brasileiras, cujo projeto aumenta e gera ainda mais desigualdade social. Em síntese,
a resistência tem como meta a conquista de igualdade e de uma vida melhor para os
cidadãos. A Constituição Cidadã, promulgada em 1988, tem como um dos seus
princípios a liberdade para todos os indivíduos. No entanto, esse princípio ainda
permanece apenas no papel.
Assim, segundo Oliveira e Magalhães (2014), a busca pela igualdade prevista
na Constituição passa pelo atendimento de necessidades de grupos específicos em
condições de subalternidade e inferioridade. Os autores apresentam como exemplo
as políticas afirmativas e outras políticas específicas que buscam democratizar a
educação superior. Eles destacam que elas são importantes referências para se
ampliar o alcance da cidadania, já que asseguram direitos sociais e integram a luta
contra a desigualdade. No caso citado, as políticas afirmativas perpassam áreas como
educação e igualdade racial. Assim, várias expressões da Questão Social são alvo de
lutas na tentativa de se estabelecer a igualdade entre os povos. Uma forma bastante
comum de tentativa de luta pelas classes subalternizadas ou em condições de
inferioridade são os movimentos sociais que, segundo Gohn (2011 apud OLIVEIRA;
MAGALHÃES, 2014), se constituem em ações de caráter coletivo, sociopolítico e
cultural. Esses movimentos existem para viabilizar formas de a população se
expressar e se organizar em torno de suas demandas. Para os autores, os
movimentos sociais podem incluir na agenda política a discussão de temas que não
se referem diretamente a questões de sobrevivência imediata, mas que possuem
relação com suas experiências. Portanto, podem favorecer a construção de relações
sociais mais justas e igualitárias e de uma democracia que de fato se efetive.
Ao longo deste capítulo, você viu que diversas lutas ocorrem por meio dos
movimentos sociais, importantes formas de resistência na atualidade. No entanto, as
organizações populares também são espaços relevantes. Você pode considerar que
todos os movimentos de resistência (movimentos sociais ou organizações populares)
atuam em um campo permeado por disputas políticas. Tais disputas estão presentes
no Brasil desde a época da colonização, passando pela escravidão e pela ditadura
militar. O despertar da consciência é um elemento essencial para garantir a
participação da população em movimentos de resistência. Esses movimentos, como

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você viu, se empenham em transformar uma realidade que não é justa. Os
movimentos de resistência, além da sua função de luta por igualdade e direitos,
também contribuem para aumentar a consciência da população. Assim, mostram que
é importante lutar contra qualquer tipo de exploração ou desigualdade, bem como a
favor da população e contra as mais diversas manifestações da Questão Social.

10 SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO NO BRASIL

Os sistemas políticos são um conjunto de instituições e processos políticos que


se articulam e atuam no exercício do poder estatal (BOBBIO; MATTEUCCI;
PASQUINO, 1998). Já os sistemas de governo abrangem mais especifi camente a
relação entre os três poderes: Poder Executivo, Poder Legislativo e Poder Judiciário.
O Brasil é uma república federativa composta por 26 estados e um distrito federal.
Cada estado possui certa autonomia e leis específicas, mas é subordinado à
Constituição Federal de 1988. O Estado é caracterizado como Estado Democrático
de Direito, prezando pela soberania popular e pela cidadania. O Brasil, desde que se
tornou um Estado-nação, ao declarar independência de Portugal, oscilou entre
períodos democráticos e períodos autoritários, com duas ditaduras em sua história.
Veja, a seguir, como o Estado se organizou e como o poder foi exercido em diferentes
regimes políticos.

10.1 Império (1822–1889)

Com a declaração da independência e o estabelecimento de um Estado


Nacional, o Brasil continuou a ser governado por membros da monarquia portuguesa
que se tornaram imperadores do País. Em 1824, foi criada a primeira constituição da
Nação, que assegurou a manutenção do poder estabelecido e os interesses dos
proprietários de terras. A escravidão e o latifúndio eram o centro da economia
nacional, e o Estado não promoveu mudanças radicais no que diz respeito aos direitos
da população. A participação política (tanto para votar como para se candidatar) era
permitida apenas aos latifundiários e donos de escravos que tinham recursos
financeiros para pagar (voto censitário). Como você pode imaginar, poucos indivíduos
atendiam aos requisitos para a participação na política e na tomada de decisões.

43
10.2 República Velha (1889–1930)

Com a proclamação da República e o fi m do regime monárquico, o Brasil


passou a ser regido por uma constituição republicana (a partir de 1891). O voto não
era secreto e era permitido somente aos homens acima de 21 anos. Mulheres e
analfabetos (maioria da população), soldados e sacerdotes também estavam
impedidos de votar, de modo que mesmo num regime republicano o voto era para
poucos. Esse contexto possibilitou o domínio dos fazendeiros durante as eleições,
pois as oligarquias estaduais se organizavam para fiscalizar os votos “prometidos”.
Essa dinâmica ficou conhecida como “voto de cabresto”, uma das principais
características da política nesse período (LEAL, 1986). Apesar da abolição da
escravatura, a limitação de direitos civis dificultou a conquista de direitos sociais e de
um Estado que garantisse a igualdade a toda a população.

10.3 Era Vargas (1930–1945)

O governo do presidente Getúlio Vargas se iniciou com a Revolução de 1930.


Ele trouxe avanços como a Constituição de 1934, que assegurava direitos políticos
para a população e permitia o voto feminino (analfabetos permaneciam impedidos).
Pautado no populismo e na propaganda nacionalista, o governo de Vargas buscou
enfraquecer o poder das oligarquias cafeeiras e se centralizar no Executivo. Além
disso, o Estado investiu no desenvolvimento da indústria nacional — por exemplo,
com a criação da Petrobrás. No entanto, em 1937, iniciou-se a ditadura do Estado
Novo, tirando o poder das instituições e centralizando as decisões políticas nas mãos
do presidente até 1945.

10.4 República Populista (1945–1964)

Durante o período da República Populista, o Estado voltou a reconhecer


direitos políticos como o voto. Além disso, os representantes da população voltaram
a ser eleitos pelo voto popular. A transferência da capital do País para Brasília e as
reformas de base (reforma universitária, reforma agrária, reforma política) prometidas
pelo presidente João Goulart acirraram as tensões políticas. Os setores
conservadores da sociedade, influenciados pelo contexto internacional de disputas
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entre governos capitalistas e governos socialistas, articularam uma reação para
impedir um possível mandato de orientação comunista no Brasil. Deu-se início, em
1964, por meio de um golpe de Estado que impediu o presidente eleito João Goulart
de concluir o seu mandato, a uma ditadura militar no Brasil.

10.5 Ditadura Militar (1964–1985)

Ainda num regime republicano, a Ditadura Militar concentrou o poder nas mãos
do Executivo. O Congresso Nacional foi fechado e o governo foi marcado pela
perseguição a seus opositores, bem como pela censura à liberdade de expressão.
Generais do Exército assumiram a presidência da República e muitos opositores
foram obrigados a se exilar. A tortura foi prática recorrente como meio de desmantelar
organizações políticas de orientações políticas distintas daquela do governo. Os
únicos partidos políticos com permissão de funcionamento eram o Movimento
Democrático Brasileiro (MDB) e a Aliança Renovadora Nacional (Arena), emulando
uma democracia que na prática não existia, as eleições eram manipuladas.

10.6 Nova República ou redemocratização (a partir de 1985)

Com o fim do regime ditatorial, o Brasil passa por um processo de


redemocratização. Partidos políticos voltar a atuar e em 1988 é criada a Constituição
Federal que prevalece até os dias atuais. A Carta Magna foi criada num contexto
político que visava à superação do autoritarismo e à garantia de direitos sociais para
toda a população. Nesse contexto, o presidente da República e os representantes
legislativos voltam a ser escolhidos pelo voto popular, o Congresso volta a funcionar
e os analfabetos passam a ter direito ao voto. O Estado é colocado como o principal
assegurador de direitos básicos como saúde, educação e moradia. Você pode
considerar que, apesar de se caracterizar como um sistema político republicano, o
Brasil passou por períodos em que o Estado Democrático de Direito não prevaleceu.
Durante os seus dois regimes ditatoriais, o poder se concentrou na presidência, e o
Poder Legislativo e o Judiciário foram sufocados.

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10.7 Formas de exercício do poder

Como você observou, o governo de um país pode alternar diversas formas de


exercício do poder dentro de um mesmo regime. A seguir, você vai ver quatro das
principais formas de exercício de poder: autoritarismo, republicanismo, democracia e
anarquismo. Você deve considerar que, entre a definição teórica e a política na prática,
há questões particulares de cada país que assume um tipo de regime. A democracia
efetivada no Brasil possui um contexto histórico e social distinto daquele da
democracia norte-americana, por exemplo. Aqui, você vai ver elementos fundamentais
de cada modelo.
Os governos autoritários se caracterizam, de modo geral, pela despolitização
da população, o fim da soberania popular (por meio do voto) e a ausência de
parlamento. Ainda que apresentem uma roupagem democrática, as instituições
representativas são esvaziadas e o poder político se concentra numa pessoa ou
grupo. São governos antidemocráticos, na medida em que não permitem a livre
manifestação política. Além disso, o poder não é limitado. Atualmente, podem existir
mesmo em regimes com eleições e diversos partidos políticos. O consenso é
sobreposto pela autoridade do governo, que pode se manter utilizando instrumentos
tradicionais da política, como o Exército e a burocracia (BOBBIO; MATTEUCCI;
PASQUINO, 1998).
Já os governos republicanos têm como principal característica sua estrutura
baseada no direito do povo e na soberania popular. Ao contrário dos governos
monárquicos, em que o chefe de Estado tem seu poder legitimado pela tradição e pelo
direito hereditário, na República o chefe é eleito pelo povo de modo direito ou indireto.
O governo é voltado para a coisa pública e o bem comum. A legitimação do poder
pelo voto popular e uma legislação escolhida pelo povo por meio de um parlamento
caracterizam os governos democráticos modernos. O estabelecimento de três
poderes visa a instituir um equilíbrio de forças. O Poder Legislativo é responsável pela
formulação das leis, enquanto o Executivo se encarrega da sua aplicação. A
participação política da população se dá por meio do voto direto ou indireto, pois todos
são iguais perante a lei na escolha de seus representantes legislativos e executivos.
Os mandatos dos políticos possuem um período limitado e as eleições são marcadas
pela disputa de mais de um partido político. Uma vez que é impossível que cada

46
indivíduo vote diretamente em cada questão coletiva, os representantes legislativos
— eleitos pelo povo — assumem a tomada de decisão no parlamento.
Cada regime democrático apresenta uma maneira de organizar seus três
poderes. No presidencialismo, o Executivo (presidente da República) e o Legislativo
são escolhidos pelo voto direito, como no caso do Brasil. Já no parlamentarismo, os
deputados são eleitos pelo voto direto e posteriormente elegem o representante do
Executivo (primeiro-ministro).
No contexto democrático, o indivíduo assume o papel de cidadão. Assim, ele
tem o direito de participar da vida política por meio de mecanismos de participação
direta na tomada de decisões, como em plebiscitos sobre questões em comum, ou
por meio da participação em organizações que influenciam as decisões políticas. Já o
modelo anarquista apresenta uma visão política baseada na negação de toda
autoridade e na liberdade dos indivíduos. O anarquismo implica a libertação de todo
poder superior, seja ele ideológico, político, econômico ou jurídico (BOBBIO;
MATTEUCCI; PASQUINO, 1998). Veja:

A recusa do Estado por parte do Anarquismo está intimamente ligada à sua


concepção de autoridade. O Estado, em toda a sua organização de pirâmide
burocrática, é o órgão repressivo por excelência. Como tal, priva o indivíduo
de toda a liberdade, chamando unicamente para si a capacidade de agir e a
possibilidade de definir a liberdade, impondo uma série de obrigações e de
comportamentos a que o indivíduo não pode fugir. É isto que o Anarquismo
pretende combater. Enquanto órgão de repressão, o Estado é visto pelo
Anarquismo com capacidade de intervenção global na vida do indivíduo, na
sua vida econômica, na sua existência social como também na sua
capacidade de desenvolvimento ético e independente (BOBBIO;
MATTEUCCI; PASQUINO, 1998, p. 95).

Essa perspectiva parte da ideia de que toda autoridade é uma forma de


opressão, por isso há uma negação do Estado e das leis. A burocracia estatal é
fortemente criticada, mas o anarquismo vai mais além. Ele propõe que os indivíduos
também se libertem do domínio religioso, que oprime por meio de doutrinas morais, e
do domínio econômico, considerando o sistema de exploração capitalista como a
perversão da liberdade humana.
Ao mesmo tempo em que o homem, no anarquismo, deve viver sem um
governo que oriente suas ações, os indivíduos devem se organizar socialmente a
partir de ações livres e autônomas. A autogestão aparece como meio de socialização
da propriedade privada e do poder político. Ou seja, o poder não deixa de existir; ele
só deixa de estar concentrado no Estado (em forma de dominação) e passa a se
47
expressar na maior participação de cada indivíduo nas decisões políticas (CORRÊA,
2012).

11 A SOCIOLOGIA E O ESTUDO DA POLÍTICA

A sociologia política estuda os sistemas políticos, as instituições do governo,


as relações de poder que os indivíduos estabelecem entre si, a forma como uma
sociedade delibera coletivamente decisões, entre outras questões relacionadas à
dinâmica do poder e aos fenômenos políticos. A política é uma área de conhecimento
humano que surgiu na Antiguidade Clássica. Até o século XIX, período em que as
disciplinas das ciências sociais passaram a ser divididas, a sociologia, a educação, a
economia e outras ciências estavam inseridas no pensamento político. Na Grécia
Antiga, a política era compreendida a partir das ações dos indivíduos na pólis. Já na
Idade Média, a política estava vinculada às disputas pelo poder, às guerras e à
administração dos bens comuns. A nobreza e o clero compunham a elite social que
tomava decisões. Foi só no século XIX que a política se associou ao debate sobre
constitucionalismo e Estado de Direito.
O estudo da política pela sociologia e pela ciência política se desenvolveu
associando as relações de poder à esfera estatal. Nessa perspectiva, o Estado e as
suas instituições se tornaram o principal objeto de estudo desses campos de
conhecimento. Mas se durante muitos anos o poder foi analisado como fenômeno
indissociável do Estado, com o passar do tempo novos estudos passaram a considerar
que as relações de poder não se restringem ao contexto estatal. Assim, a política
passa a ser considerada também nas relações cotidianas, nas microesferas da
sociedade, bem como nas grandes organizações.

11.1 A sociologia e o exercício do poder

O sociólogo alemão Max Weber (1994) contribuiu com o desenvolvimento da


sociologia e da ciência política ao analisar o poder e as formas de dominação na
sociedade. O exercício do poder, para esse autor, está relacionado à capacidade que
um indivíduo/grupo tem de impor sua vontade aos outros. Já a dominação, uma forma
de expressão do poder, reside na capacidade de se exercer autoridade sem que os

48
dominados resistam. Quem obedece-o faz acreditando ser sua própria vontade.
Weber também apresenta três tipos ideais de dominação. Veja a seguir.
 Dominação tradicional: tem como base de legitimação os costumes e
as tradições de determinada região/sociedade. Por exemplo: o
patriarcalismo.
 Dominação carismática: tem como base de legitimação uma devoção
afetiva a um senhor devido às suas qualidades. Por exemplo: um líder
que é visto como herói, salvador e que tem seus apoiadores como
discípulos.
 Dominação racional legal: tem como base de legitimação um estatuto,
um conjunto de regras. A obediência não se dá a um líder, e sim às
normas e leis estabelecidas. Por exemplo: burocracia e poder conferido
a cada cargo.
Na prática, a dominação pode apresentar características de um ou mais tipos.
Os três conceitos são nomeados como ideais: são uma tipologia, uma ferramenta para
se analisar a complexidade da vida real e para se identificarem as nuances da
autoridade. A dominação racional legal é típica dos Estados modernos, que têm toda
a sua organização baseada na racionalidade burocrática.
O Estado moderno detém o monopólio do uso da força em determinado
território. Ou seja, cada Estado possui os meios e está autorizado a exercer a violência
em seus domínios. No entanto, o fato de o Estado ter esse controle não quer dizer
que o uso da violência seja necessário para que o seu poder seja reconhecido
(WEBER, 1994). O conceito de legitimidade de Weber é a chave para se entender que
nas sociedades modernas a dominação do Estado acontece porque os indivíduos se
submetem às regras sem que o uso da força física seja necessário. O uso potencial,
e não efetivo, da violência confere legitimidade à dominação da sociedade pelo
aparelho estatal. Assim, a noção de sistema político se refere à estabilidade do
exercício do poder em sociedades complexas por meio de mecanismos sofisticados
de dominação. Ao longo do século XX, esses mecanismos tornaram-se cada vez mais
refinados. Os estudos políticos passaram a reconhecer que as estruturas de poder
não estão apenas em órgãos do Estado, mas também em instituições sociais. Dessa
forma, reconheceram que o poder ultrapassa a esfera estatal. O pensamento político
de Weber foi fundamental para o estabelecimento de diversas teorias políticas e de

49
uma sociologia política que investiga, por meio de um olhar qualitativo, o sentido das
ações e as crenças que orientam as formas de poder e dominação na vida moderna.
Os primeiros estudos sociológicos sobre política se concentravam no poder do
Estado. Ao longo do século XX, as análises sobre política consideraram as mudanças
sociais e políticas, o processo de globalização e as questões relacionadas ao poder e
às formas de governo. Foi com o surgimento da ideia de pós-modernidade, no final do
século XX, que o Estado deixou de ser considerado o principal eixo de poder das
sociedades complexas. A sociedade passou a ser vista como uma esfera repleta de
centros de poder.
Esse novo olhar sobre o poder e a política reconhece o peso da dimensão
simbólica nos processos políticos, econômicos e culturais. Em outras palavras, a
comunicação não é apenas um meio de expressão; é uma fonte de poder. O
desenvolvimento da tecnologia, de espaços virtuais, também passou a ser
considerado, visto que uma nova realidade exige novos conceitos.
Ao adotar uma visão sistêmica da política, a sociologia reconhece diversos
elementos que estão relacionados com o exercício do poder, como movimentos não
partidários, sindicatos e grupos de pressão. Os regimes democráticos dão espaço
para a manifestação política de diversos setores da sociedade, que muitas vezes
influenciam as decisões e medidas adotadas pelo Estado. Esses setores buscam
influenciar o poder público para que atenda a seus interesses (GOZETTO, 2008).
Sindicatos e algumas organizações não governamentais (ONGs) realizam esse papel.
Entre os principais grupos de pressão, na perspectiva da sociologia política, estão
aqueles ligados à produção agrária, aos trabalhadores industriais, aos segmentos
empresariais, a questões de gênero, raça, classe, meio ambiente, entre diversas
pautas. (PORTELLA, 2009)
Assim, a sociologia estuda temas como: fenômenos de natureza global, o modo
como as lideranças exercem sua autoridade em diversos países e a maneira como a
política é vista pelos indivíduos. Essa percepção de que o poder e a política se fazem
presentes em diversas esferas da sociedade orienta a sociologia política a investigar
quais mecanismos os indivíduos/grupos utilizam para fazer seus interesses
prevalecerem. As formas de participação política, os movimentos sociais, os atores
sociais que se destacam na esfera política e os processos decisórios, bem como a

50
política e as novas formas de comunicação (as redes sociais, por exemplo), são temas
que estão na agenda de pesquisa da sociologia política contemporânea.

12 MODELOS DE DEMOCRACIA: DEMOCRACIA DIRETA, REPRESENTATIVA E


PARTICIPATIVA

O que você entende por democracia? Alguns a definem como “a presença de


eleições”; outros afirmam que seja “um sistema de acordo com o qual a maioria
decide”, ou um “governo feito pelo povo”. Cada uma dessas respostas tem um fundo
de verdade, mas nenhuma, por si só, define o conceito por completo. Democracia é
um conceito muito complexo, desenvolvido ao longo de séculos até que chegássemos
à definição atual. Por ser proveniente de várias fontes históricas, sofreu inúmeras
mudanças. A etimologia da palavra remonta ao grego: demos, que significa povo, e
kratos, que significa poder. “O poder do povo”, portanto, é a definição mais primitiva.
Define-se o Estado Democrático de Direito com base no respeito à pluralidade de
ideias e no amplo debate. (PORTELLA, 2009)
Na democracia, o governo é descentralizado, as eleições são livres e
periódicas, e é permitido que o cidadão tenha participação política na sociedade,
direito que lhe é assegurado pela própria Constituição Federal, segundo a qual “todos
somos iguais perante a lei”

12.1 Democracia direta e as suas principais características

O sistema segundo o qual os cidadãos debatem em público e deliberam


questões relativas aos seus interesses pessoais ou coletivos pode ser chamado de
democracia direta. A democracia como regime político teve origem na Grécia, mais
precisamente em Atenas, após um período de muitas crises e regime ditatorial.
Naquele tempo, a população se reunia em assembleias populares, que aconteciam
nas ágoras — praças públicas — para discutir e decidir sobre leis e questões de
interesse de todos (Figura 1).

51
Fonte: www.vivadecora.com.br

Algumas correntes defendem o surgimento da democracia já nas organizações


tribais, quando teria sido utilizado para a tomada de decisões. O entendimento
predominante, no entanto, é que tenha surgido na civilização grega. Na visão dos
gregos, o exercício de opinião estava restrito aos membros da mesma cidade-Estado,
reservando, assim, essa deliberação a uma parcela específica da população.
(PORTELLA, 2009)
Em regra, todo cidadão poderia falar ao povo, bastando estar em dia com os
direitos políticos, ou seja, não dever ao tesouro do Estado, ter bons costumes, honrar
os seus pais, obedecer às convocações militares e não ter covardia, ressalvando aqui
a exclusão de mulheres e escravos, por não serem considerados cidadãos. A
democracia ateniense atribuiu ao povo o poder de eleger os governantes e tomar
importantes decisões como instituição de novas leis, declaração de guerra e tratados
de paz. A democracia direta tem como uma das suas principais características o fato
de a população não delegar o seu poder de decisão, pois o cidadão expressa, de
maneira pessoal e direta, a sua opinião. Era assim que aconteciam as assembleias
atenienses nas praças públicas, de forma horizontal. Esse modelo funcionou na
Grécia Antiga da forma como foi criado, pois o seu contingente populacional era
pequeno, permitindo que se reunissem em praça pública, de modo que todos
pudessem participar na assembleia. À medida que as sociedades se avolumavam
numericamente e a organização da sociedade se tornava mais complexa, o sistema
52
da democracia direta foi se tornando inviável. Afinal, como se viabilizaria, por exemplo,
a contabilização dos votos de uma população abundante? Assim, em razão da
impossibilidade de se operacionalizar a democracia direta em grandes sociedades,
surgiu a chamada democracia representativa. Na atualidade, o modelo aplicado na
Suíça é o maior exemplo de democracia semidireta que existe. Ele é assim
classificado porque coexistem dois sistemas democráticos: o direto, em que a
população participa diretamente da tomada de decisões, e o representativo, por meio
dos deputados eleitos. (PORTELLA, 2009)
O sistema suíço prevê uma prática de consulta popular bem intensa, pois ao
menos quatro vezes ao ano os suíços recebem, nas suas residências, envelopes
requerendo a opinião dos cidadãos em determinados assuntos. Ou seja, nesse
modelo, a participação da população sobre a política do País é muito forte,
característica inerente à democracia direta. No Brasil, a democracia direta se
manifesta por meio de instrumentos ainda pouco utilizados, apesar de normatizados
na Constituição Federal, que assim define (BRASIL, 1988):
Art. 14 A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto
direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:
I — plebiscito;
II — referendo;
III — iniciativa popular.

12.2 Modelo da democracia representativa e a sua aplicação

Atualmente, quando falamos em democracia, fazemos referência à democracia


representativa na maioria das vezes. Esse modelo elege os seus governantes por
meio do voto popular por um período de tempo determinado, em que o cidadão delega
o seu poder de decisão para uma pessoa que o representará perante as decisões
políticas, ou seja, legitimado pela soberania popular. De forma bem sucinta, esse seria
um bom conceito para democracia representativa, sem desconsiderar a existência da
democracia direta. No entanto, como visto anteriormente, ela se torna de difícil
operacionalização em grande escala. De forma majoritária, o conceito moderno de
democracia representativa é conhecido pela forma de democracia eleitoral e
plebiscitária existente. Essa noção de democracia está diretamente ligada ao ideal de

53
participação popular que começou a ser difundido ainda na Grécia Antiga. Nas
monarquias absolutistas, durante a Idade Média, a representatividade começou a se
formar, dando início ao que temos hoje como modelo de representação. Naquele
tempo, os reis convocavam grandes assembleias para tomar importantes decisões.
Como a população já era mais numerosa e encontrava-se espalhada, as localidades
enviavam representantes para as assembleias. Essas pessoas corriam a comunidade
buscando reclamações e solicitações endereçadas ao rei. As reclamações e
solicitações eram lidas pelo representante na presença de todos, sendo que o rei
respondia a cada uma das questões propostas e, de posse das respostas, o
representante devolvia o resultado para a comunidade. (Mariana Portella, 2009)
A forma da representatividade evoluiu quando os reis começaram a precisar de
mais recursos para manter a máquina do Estado, que dependia diretamente do
consentimento das pessoas. Foi quando surgiu, mais precisamente na Inglaterra, a
decisão do rei para que os representantes tomassem decisões em nome da
comunidade. Com o passar dos séculos, o poder dos representantes só aumentou, e
a questão dos representantes acabou se associando, de forma definitiva, ao conceito
de democracia que se entende no mundo ocidental. O Brasil é uma democracia
representativa, apesar de possuir instrumentos da democracia direta à disposição.
Podemos depreender essa definição do texto do art. 1º da Constituição Federal, que
trata o Brasil como uma república democrática, em que todo poder pertence ao povo,
que pode exercê-lo diretamente ou por meio dos seus representantes. Para Bonavides
(2000, p. 354), tal modelo tem, hoje, como principais bases:

A soberania popular, o sufrágio universal, a observância constitucional, o


princípio da separação dos poderes, a igualdade de todos perante a lei, a
manifesta adesão ao princípio da fraternidade social, a representação como
base das instituições políticas, limitação de prerrogativas dos governantes,
Estado de Direito, temporariedade dos mandatos eletivos, direitos e
possibilidades de representação, bem como das minorias nacionais, onde
estas porventura existirem.

Um elemento muito importante para a democracia representativa são os


partidos políticos, que, além de mediar os interesses dos órgãos representativos,
também possuem o fator decisivo na intermediação entre os cidadãos eos seus
representantes, pois existe a necessidade, ao menos no Brasil, do mandato partidário.
A Figura 2 mostra um exemplo de plenário.

54
Fonte: adfas.org.br/2020/11/06

Todas as formas de governo têm os seus prós e contras e, com a democracia


representativa, não poderia ser diferente. Podemos começar destacando a vantagem
que a representatividade tem em relação à democracia direta, pois a tomada de
decisão é muito mais simples e rápida, visto estar centralizada em apenas algumas
pessoas, não em todas as pessoas que compõem um país. Devemos considerar
também que, ao delegar o exercício do poder aos seus representantes, o povo entrega
nas mãos de pessoas teoricamente mais preparadas e mais experientes a tomada de
decisões sobre temas importantes e com impacto em toda a sociedade. Esse mesmo
fato de o poder ser entregue nas mãos de poucos pode gerar a dúvida da facilidade
de manipulação na busca de determinados interesses. Nesse tipo de sistema
representativo, são deflagrados os maiores casos de corrupção, chegando o povo, em
algumas situações, a ser prejudicado por aqueles que deveriam defender seus
interesses. (PORTELLA, 2009)
Enfim, para que o regime democrático representativo tenha o efeito esperado,
os representantes que ocupam cargos públicos por meio de voto popular devem ser
constantemente renovados, por isso, existe a previsão de um período específico para
exercício do mandato, cabendo ainda aqui uma reflexão acerca das reeleições.

55
12.3 Especificidades da democracia participativa

A democracia participativa está colocada entre a democracia direta e a


representativa, pois ela se apresenta por meio da manifestação de instrumentos
característicos de cada uma delas (PORTELLA, 2009).

Fonte: www.slideshare.net/gwathsule/democracia-representativa-e-direta

O principal objetivo da democracia participativa é fazer o cidadão participar,


cada vez mais e de forma mais intensa, das questões políticas. Outra importante fi
nalidade é fazer o maior número de pessoas ser ouvido, uma vez que a democracia
representativa possui essa barreira na sua concepção, para que sejam desenvolvidas
ações para atender à necessidade de todos. Ou seja, por meio desse modelo,
aplicável às sociedades modernas e contemporâneas, não se tenta reunir toda a
população em uma assembleia, ao passo que não fi cam todas as decisões por conta
dos representantes do povo. Esse modelo se apresenta como uma alternativa ao
modelo representativo, que, com o passar do tempo, vem dando indícios de que não
consegue mais abranger tantas demandas da sociedade. Cada vez mais, existe na
democracia brasileira o desejo de que a população participe das questões políticas do
País, colocando em prática a definição de democracia, que diz que todo poder emana
do povo, por meio de um modelo que valoriza o princípio básico da democracia,
deixando o povo como protagonista de importantes decisões que impactam a
sociedade. A democracia participativa se utiliza de instrumentos — como referendos,
plebiscitos, iniciativa popular e orçamentos participativos — para engajar a população
nas questões políticas.
56
Para Antonio Lambertucci (2009, p. 71):

A participação social [...] amplia e fortalece a democracia, contribui para a


cultura da paz, do diálogo e da coesão social e é a espinha dorsal do
desenvolvimento social, da equidade e da justiça. Acreditamos que a
democracia participativa se revela um excelente método para enfrentar e
resolver problemas fundamentais da sociedade brasileira.

José Moroni (2009) aponta alguns mitos e desafios relacionados ao modelo


participativo. Observe o Quadro 1.

Atualmente, busca-se a gestão democrática como forma de viabilizar a


participação popular junto às políticas públicas, que devem ser formadas com a
participação direta da sociedade. A gestão democrática se caracteriza pela relação
entre a sociedade e o governo, com base no modelo participativo, valorizando a
função da sociedade também como gestora, colocando em destaque o princípio
fundamental da democracia, que é a participação popular. É importante
mencionarmos que a tecnologia é uma grande aliada da democracia representativa.
As novas tecnologias que possibilitam a informação e a comunicação, especialmente
a internet, prestam um grande favor à sociedade ao disseminar, de forma rápida,
informações relevantes e urgentes, e também ao permitir a reunião de um grande
número de pessoas em torno de uma mesma discussão, mesmo que as pessoas
estejam longe ou espalhadas. (PORTELLA, 2009)

57
13 POLÍTICA CONTEMPORÂNEA

Atualmente, o regime neoliberal é adotado por vários países no mundo. No


entanto, há várias abordagens de liberalismo e o seu maior paradoxo é: como garantir
a liberdade individual e, ao mesmo tempo, combater a desigualdade social?
Todas as correntes de pensamento visam a elaborar uma solução para tal
paradoxo. Há as correntes que defendem que a própria competitividade neoliberal e
a liberdade econômica seriam por si só suficientes para sanar as questões sociais. De
outro lado, há os liberais que defendem que haja alguma regulação do Estado em
relação à economia, mesmo que em um regime neoliberal. Neste capítulo, você
conhecerá as questões que abordam as teorias liberais, bem como a necessidade de
reelaboração do capitalismo clássico.
Verá também como o liberalismo pode ter um aspecto social, de apoio às
questões de condição básicas aos indivíduos. E poderá, ainda, acompanhar como se
deu a adesão ao neoliberalismo por parte de alguns governos. Por fim, poderá
compreender o cenário democrático atual.

13.1 Liberalismo social

Há uma notória diferença entre o liberalismo clássico e o liberalismo social, que


consiste na concepção de liberdade. Contrariamente ao que pensavam os liberais
clássicos — que deve ser garantida a liberdade individual e, consequentemente, um
Estado que não fosse intervencionista —, os liberais sociais defendiam o ideal de
“liberdades positivas”. Assim, no liberalismo social, a falta de condições básicas,
como, por exemplo, educação, alimentação e saúde, poderia ser considerada um risco
à liberdade do indivíduo.
Ou seja, ambas as teorias identificam que o maior foco da teoria liberal deve
ser garantir a liberdade individual, entretanto, discordam sobre o que seja liberdade.
Os principais teóricos dessa corrente social do liberalismo foram os britânicos Leonard
Trelawny Hobhouse (1864-1929) e Thomas Hill Green (1836- 1882) conhecidos como
os “novos liberais”.
O principal argumento desses pensadores é que, para se atingir a liberdade
que a teoria liberal almeja, é necessário que o indivíduo tenha apoio do Estado, dito

58
de outra maneira: é necessário que o Estado intervenha na cultura, na economia e na
sociedade.
Por pensar o liberalismo dessa forma, esse movimento ficou conhecido como
centro-esquerda. Entretanto, essa teoria não defende que o Estado seja responsável
por prover os serviços públicos, mas sim por se responsabilizar para garantir que os
indivíduos tenham acesso.
Dessa forma, o Estado deve estimular a colaboração de instituições privadas
com políticas públicas que visem à melhoria da vida de pessoas que não têm acesso
à cultura, à educação e à saúde, entre outras necessidades básicas. Assim, as
instituições privadas devem estar a serviço da sociedade e promover oportunidades
para que os indivíduos possam ter condições básicas de vida.
Assim, pode-se ver várias pautas que normalmente são vinculadas ao
socialismo, ou política de esquerda, na agenda do liberalismo social. Por exemplo:
apesar de defenderem a economia com base no mercado, os liberais sociais
defendem que o Estado pode intervir na economia, com a finalidade de regulá-la;
defendem que o Estado deve pagar serviços de saúde básica; a existência de um
salário mínimo.
Já em relação ao liberalismo conservador, a discordância principal com o
liberalismo social é sobre o papel do Estado. Para os conservadores, o Estado deve
ser mínimo, ou seja, deve intervir minimamente na economia. Portanto, o indivíduo
teria poder sobre o Estado, e não o contrário.
De outro modo, os liberais sociais não acreditam em um Estado
totalitário/tirano, mas, na medida que as instituições podem entrar em conflito, ou,
ainda, estabelecer uma vantagem absurda sobre a outra, ou mesmo não cumprirem
seu papel de colaboração com a sociedade, deve haver um Estado que possa intervir.
Outro aspecto que é comum é a confusão entre liberalismo social e social- -
democracia.
O liberalismo social defende que o indivíduo deve ter sua liberdade individual
promovida pelo Estado e que este só consegue ser legítimo ao ponto que legitima a
liberdade do indivíduo. Já a socialdemocracia, que parte das ideologias socialistas,
defende que, para o indivíduo atingir a liberdade individual, é necessário que o Estado
seja reformado para uma base comunitária. Nesse sentido, é de extrema importância

59
que o Estado regule a economia, a fim de estabelecer a igualdade entre os indivíduos.
Dessa forma, pode-se sintetizar os ideais do liberalismo social em três fundamentos:
1) liberdade individual, que garante ao indivíduo autonomia e direito à
propriedade privada, tendo direito garantido de divergir dos demais ou concordar, se
reunir em grupos, sindicatos, organizações, desde que essas não limitem a liberdade
de nenhum de seus membros;
2) a regulação do Estado, para que a liberdade de uma instituição e de um
indivíduo seja respeitada e que, portanto, o respeito às divergências e a possibilidade
democrática sejam garantidos;
3) a compreensão sobre a justiça, que prevê igualdade para todos os
indivíduos, bem como diminuição das desigualdades sociais, para que o indivíduo
possa alcançar sua liberdade individual e adentrar no mercado de trabalho, visando
sempre à realização desse indivíduo.

13.2 Neoliberalismo

Neoliberalismo é um termo que designa o ressurgimento de teorias clássicas


do liberalismo por volta dos anos 1970 e 1980. O conceito de capitalismo laissez-faire
é reimplementado ao resgate dessa teoria, ou seja, a liberdade reivindicada ao
mercado econômico passa a se valer da expressão francesa de “deixar fazer”.
Justamente essa noção de “neo” designa a retomada, nesse caso, de alguns
fundamentos presentes no Liberalismo clássico. Pode-se atribuir a origem do
neoliberalismo ao pensador americano Ludwig Heinrich Edler von Mises (1881-1973)
que, em seu livro Ação humana: um tratado sobre a economia (1949), defende uma
concepção de praxeologia, metodologia que visa a explicar a economia como parte
ação humana.
Para Mises (2010), o Estado e suas estruturas de poder não são confiáveis,
principalmente no que compete à garantia dos direitos e das liberdades individuais
dos cidadãos. Ou seja, toda a fundamentação, ainda que de diferentes correntes do
liberalismo, é sempre a garantia de liberdade e, principalmente, individual. É
propriamente na Escola Austríaca, no século XX, que surgem os teóricos mais
importantes do neoliberalismo. Apesar do protagonismo inicial de Mises, outros
pensadores contribuíram significativamente para o desenvolvimento dessa teoria.

60
Friedrich Hayek (1989-1992), um filósofo e economista alemão, foi um dos grandes
responsáveis por adaptar as teorias liberais clássicas ao neoliberalismo do século XX,
e compôs também o conselho da primeira ministra Margaret Thatcher, por indicação
da Rainha Elizabeth II. Em sua obra mais famosa, intitulada O caminho da servidão
(1944), Hayek (1990) defende que a intervenção do Estado leva à total falta de
liberdade, e chega a comparar o intervencionismo, em seu último estágio, com a
ascensão nazista.
Ao longo do século XX, pode-se observar a ascensão e o declínio de alguns
governos que adotaram o neoliberalismo. O de maior destaque é o de Margaret
Thatcher, que conseguiu estabilizar a libra esterlina e reduzir a carga tributária,
entretanto, a desigualdade aumentou, uma vez que os mais ricos aumentaram a
renda, ao passo que os mais pobres, não. Thatcher renuncia, em 1990, quando não
consegue representar o partido dos conservadores. Outro exemplo de adesão ao
neoliberalismo foi o governo de Augusto Pinochet, que, por meio de um golpe militar
contra o presidente Salvador Allende, assumiu a presidência. Suas propostas
neoliberais, que foram elaboradas conspiratoriamente pela oposição ao governo de
Salvador e compiladas em um documento chamado El Ladrillo, propunha a reforma
da economia, contando com a colaboração das instituições privadas chilenas. O
governo Pinochet foi marcado por abusos e violações aos direitos humanos, torturas
e assassinatos.
Em 1988, Pinochet perdeu seu cargo mediante a votação do plebiscito.
Pinochet teve apoio da Escola de Chicago e de Hayeck para a sua reforma econômica.
Outro polo de desenvolvimento das teorias neoliberais foi a Escola de Chicago, que
era dirigida pelo professor Milton Friedman. O envolvimento da escola, bem como de
Friedman, se deu pela crítica ao respaldo intervencionista do Estado na economia no
governo de Roosevelt. Para Friedman, as políticas econômicas de Roosevelt, a fim
de superar a Grande Depressão, acabaram por prejudicar ainda mais o país. Portanto,
Friedman concluiu que qualquer regulamentação econômica sobre as empresas era
algo maléfico para a economia e a produtividade de um país, como, por exemplo, o
estabelecimento de um salário mínimo, que seria, segundo ele, responsável por
distorcer os custos de produção. O modelo neoliberal de governo é constantemente
criticado, principalmente pela separação da economia dos problemas sociais. Ou seja,
o modelo econômico traz consigo todo um enredo de problemas que são alvo de

61
críticos defensores dos direitos humanos, trabalhistas, sociais. Um dos grandes
críticos é o filósofo francês Pierre Brodieu, que defende que esse modelo econômico
é responsável por destruir o coletivo e distanciar a economia dos problemas sociais
de uma sociedade, principalmente por investir totalmente na ideia de consumo acima
de qualquer coletividade. (DIONIZIO,1990)

14 CENÁRIO DEMOCRÁTICO CONTEMPORÂNEO

O cenário democrático contemporâneo é marcado fortemente pelo modelo


neoliberalista. Entretanto, é necessário compreender as diversidades entre os países.
Com forte adesão ao sistema democrático pelo mundo, pode-se ver também as falhas
desse sistema, apesar de ser o melhor entre os outros.

Fonte: www.aryramos.pro.br/democracia

Após a queda do muro de Berlim, em 1989, vários países europeus aderiram


ao sistema democrático. Atualmente, a maioria dos países democráticos têm
apresentado preocupações em relação à onda crescente de conservadorismo e
fascismo. Por exemplo, na Alemanha, recentemente, ocorreram várias manifestações
e conflitos por parte de grupos neonazistas que se opõem à entrada de imigrantes no
país. Do mesmo modo, um tribunal na cidade de Themar, na Alemanha, deliberou a
favor de um festival neonazista. Isso, como apontam alguns teóricos, como Yascha
Mounk, Noam Chomsky, entre outros, é o indício de uma crise democrática que é
possível observar em todo o mundo. Pode-se dizer que, atualmente, o paradoxo

62
democrático é o de se poder eleger um líder autoritário, tal como houve com a
ascensão nazista. A exemplo disso, têm-se a Venezuela, que elegeu o presidente
Hugo Chavez, o qual instaurou uma ditadura que tem continuidade com o governo de
Nícolas Maduro. Outro aspecto ascendente mundialmente, mas fortemente no Brasil,
é a judicialização da política e a politização do judiciário. Ou seja, assim como o
exemplo do tribunal que deferiu um festival nazista, lidamos com um paradoxo em
relação aos três poderes.
No Brasil, vê-se um forte envolvimento do judiciário na arena pública, uma
espécie de ativismo político que faz manobras com a constituição de 1988. Tal
ativismo teve início com a constituinte de 1988, quando se acreditava que o
movimento desse poder poderia significar um favorecimento da democracia.
Atualmente, vê-se uma crise entre os três poderes, de modo que o judiciário ocupa
ampla influência e vantagem em relação ao legislativo e ao executivo e não há lei, ou
controle, que regule a participação e a relação entre tais poderes, o que influencia
totalmente o Estado democrático. Há também a relação com a mídia, que já
demonstrou, desde a campanha nazista, sua eficácia. Com o advento da tecnologia,
os indivíduos têm acesso a informações constantemente.
Os partidos utilizam essa ferramenta, a fim de propagar suas propostas de
campanha, mas nem tudo que chega ao eleitor pode ser tomado como verdade. Há,
atualmente, uma forte rede de produção de conteúdos falsos, chamados de fake
news, sobre opositores em uma eleição. Isso acaba por confundir os eleitores das
reais intenções de seus candidatos. Outra pauta incontornável do cenário democrático
atual são as minorias. Pode-se ver a crescente luta de grupos em busca de direitos,
ao contrário das lutas do início do século, das sufragistas por direito ao voto, temos
hoje vários movimentos de vários grupos em busca de direitos e reconhecimento.
Atualmente, as mulheres, cada vez mais, se manifestam e ganham visibilidade,
reivindicando respeito, salários iguais aos dos homens, a não cultura machista, que
prega a inferioridade, e contra a cultura do estupro. Outro grupo que tem bastante
visibilidade são os grupos LGBT, que reivindicam reconhecimento social, medidas
contra a violência física e discursiva da homofobia, entre outros. A população negra
também luta por maiores repreensões ao racismo e busca por igualdade. O que se
pode concluir é que a democracia, por ser um regime que proporciona escolhas aos
cidadãos, apesar de ser a melhor forma de governo, apresenta falhas, pois há várias

63
demandas que precisam ser supridas, bem como estão constantemente surgindo
outras.
De todo modo, as maiores conquistas de direitos aconteceram em
manifestação e contraposição ao governo vigente. Dessa forma, a democracia
garante a liberdade de oposição, e, por isso, é a melhor entre as formas de governo.
(DIONIZIO,1990)

15 A EDUCAÇÃO COMO INSTRUMENTO DO ESTADO

Para que a sociedade capitalista continue existindo, é preciso reproduzir os


meios de produção. Um deles é o trabalhador assalariado, que é produzido no meio
escolar, onde aprende, além de ler e escrever, a submeter-se à ideologia dominante
na sociedade. O Estado utiliza vários meios para popularizar a ideologia da classe
dominante, e um desses meios é a educação. Neste capítulo, você vai estudar sobre
como o Estado utiliza a educação como aparelho ideológico para ensinar e difundir a
ideologia da classe dominante entre toda a população. Também vai aprender a
respeito dos meios/ferramentas que o Estado utiliza para fazer com que a educação
trabalhe como um instrumento ideológico, e verá como isso impactou na construção
do processo educacional brasileiro. (LOPES, 2014)

15.1 A educação como instrumento ideológico do Estado

Atualmente, a palavra ideologia é definida pelos dicionários como um conjunto


de ideias, princípios e valores de um indivíduo ou de um grupo, sendo a base para a
visão de mundo desse indivíduo ou do grupo. Para Karl Marx, no entanto, na
sociedade capitalista a ideologia é uma falsa ideia, uma ilusão da realidade construída
por uma classe para servir como meio de dominação.

[...] a ideologia tem precisamente por função, ao contrário da ciência, ocultar


as contradições reais, reconstituir, num plano imaginário, um discurso
relativamente coerente que serve de horizonte ao “vivido” dos agentes,
moldando as suas representações nas relações reais e inserindo-as na
unidade das relações de sua formação (POULANTZAS, 1971, p. 31 apud
BARROS, 2009, documento on-line).

64
Essa ideologia da classe dominante não é reconhecida pela classe dominada
como uma deturpação das verdadeiras relações sociais; dessa forma, o proletariado
não consegue identificar e opor-se a isso. Posteriormente, no livro “A Ideologia Alemã”
(2007), Engel e Marx trabalham o conceito de ideologia e chegam à conclusão de que
a ideologia não é uma imagem distorcida da realidade, mas sim uma imagem invertida
da realidade. (LOPES, 2014)
Mais tarde, com Lênin e outros autores marxistas, a ideologia perde a
conotação negativa e passa a ser encarada como um conjunto de ideias de uma
classe, no qual o próprio marxismo é uma ideologia. Esses autores afirmam que existe
a ideologia do proletariado e a ideologia da burguesia. A ideologia burguesa é
legitimada como a ideologia dominante e, por mais que agora o proletariado possa de
ter uma visão de mundo diferente, a ideologia burguesa, por ser dominante, interfere
nas ações do proletariado. Uma classe justamente se transforma em classe
dominante quando impõe a sua ideologia como universal para as outras classes, ou
seja, quando a sua ideologia é apresentada como a forma correta de ver o mundo.

[...] o papel político da ideologia dominante burguesa, dominada pela região


jurídico-política, consiste no fato de tentar impor ao conjunto da sociedade
um “modo de vida” através do qual o Estado será vivido como representante
do “interesse geral” da sociedade, como detentor das chaves do universal,
face a indivíduos privados (POULANTZAS 1971, p. 39 apud BARROS, 2009,
documento on-line).

Assim, segundo Barros (2009), a ideologia não é uma realidade invertida, mas
o entendimento de uma realidade apresentada de maneira invertida e utilizada para
manter a coesão social já estabelecida. Dentro de uma economia capitalista, o Estado
utiliza seus aparelhos para garantir a manutenção e a apresentação da ideologia da
classe hegemônica. (LOPES, 2014)
Existem dois tipos de aparelhos do Estado, os de repressão e os de cunho ideológico,
como explica Santos (1980, p. 24) ao mencionar Althusser:

Os aparelhos de Estado exercem, junto à sociedade, uma ação


eminentemente repressora. Como exemplo, poderíamos lembrar algumas
instituições como: a polícia, a justiça, a burocracia, etc. Já os aparelhos
ideológicos de Estado atuam mais no sentido de inculcar nos indivíduos uma
ideologia “imposta” pela classe dominante, fazendo com que eles a assimilem
naturalmente, isto é, espontaneamente. Poderemos dar alguns exemplos de
aparelhos ideológicos: Igreja, Escola (educação formal), Família, Imprensa,
etc.

65
Portanto, como explicado, o ambiente escolar é um dos aparelhos ideológicos
do Estado utilizado para o ensinamento da ideologia dominante, pois, para a
existência e manutenção dessa classe dominante, é necessário que se ensine a
classe dominada a obedecer e a classe dominante a mandar. Esse ensinamento se
torna mais fácil de digerir quando vem a partir da palavra, e não da coerção. A escola
funciona para o Estado e, consequentemente, funciona para a ideologia dominante.
Ferraro (2014, p. 15) afirma que “A escola é o lugar mais eficaz para inculcação de
uma determinada ideologia por vários motivos”, e um desses motivos é o fato de que
a escola tenha substituído o papel da igreja na nossa sociedade atual. Anteriormente,
o ambiente que dominava o pensamento das crianças e dos jovens era a família e a
igreja; hoje, os ambientes em que a criança e o jovem mais estão suscetíveis a receber
as ideologias são o familiar e o escolar (LOPES, 2014).
Desde a educação primária, ensina-se a criança a reproduzir os princípios, crenças
e valores da sociedade. A criança, na fase escolar, está vulnerável e suscetível a
receber todo ensinamento que lhe é dado.

A escola reproduz a sociedade e a sociedade reproduz a escola. A inculcação


de uma ideologia ou arbitrário cultural passa pela estruturação de um sistema
educativo baseado nos modos de produção capitalista, mesmo que isto
ocorra fora ou acabe por passar ao lado do próprio sistema de produção.
Exatamente no sentido de reforçar e perpetuar tal estrutura (FERRARO,
2014, p. 8).

A escola atua diretamente na formação do indivíduo, como local em que


estudantes passam horas e anos das suas vidas. Por isso, ela é extremamente
adequada para ser um instrumento ideológico do Estado: por meio de disciplinas e
conteúdo, a escola reproduz a lógica dominante da sociedade ao seu corpo discente.

15.2 Mecanismos adotados pelo Estado para transformar a educação em um


instrumento ideológico

Como você pôde ver no tópico anterior, o Estado utiliza a educação como um
instrumento para ensinar e expandir a ideologia da classe dominante. Mas como
efetivamente o Estado faz isso? Quais são os mecanismos que ele utiliza? A partir de
agora é isso que você vai aprender. O primeiro mecanismo que posso apresentar a
você é o currículo escolar, que é o conjunto de diretrizes sobre a aprendizagem na
escola. Essas diretrizes orientam como as atividades educativas devem ser
66
executadas e quais são as suas finalidades. Esse currículo escolar utilizado pelas
escolas está baseado nos comportamentos e costumes dominantes na sociedade. As
crianças e os adolescentes que pertencem às classes dominantes facilmente se
adequam ao currículo escolar das escolas, pois sempre foram expostas e viveram
nessa cultura dominante. O mesmo não ocorre para as crianças e adolescentes das
classes dominadas, pois elas não conhecem e nem vivenciam a cultura da classe
dominante; o currículo escolar para essas crianças é um código que elas não
conseguem decifrar ou compreender. Sendo assim, as crianças das classes
dominantes alcançam sucesso na escola, seguindo para a educação superior, e sua
cultura é reconhecida e fortalecida pela escola. A cultura da classe dominada, por
outro lado, não encontra representatividade. (Jaíza Gomes Duarte Lopes, 2014)
O conteúdo e a estrutura pedagógica oferecidos pelas instituições de ensino
não conseguem alcançar todos os estudantes da mesma forma. Isso acontece porque
cada estudante vive uma realidade diferente e participa de uma classe social diferente,
vivenciando, cada um, uma cultura diferente. Aqueles que, fora do ambiente escolar,
participam de uma cultura diferente da imposta pela escola sofrem um grande choque
cultural e, muitas vezes, não conseguem adaptar-se à realidade imposta, o que os
leva a “fracassar” e a manter a estrutura atual da sociedade. O segundo mecanismo
seria a segregação já no acesso à educação: embora a mesma ideologia seja
repassada a todos, ainda existe uma diferença na educação recebida pelas diferentes
classes, de modo que não há equidade no acesso à educação, o que parece ocorrer
de maneira proposital para perpetuar a distinção das classes sociais.
Existem pessoas que recebem todo o conhecimento de ciências, línguas e
filosofia com a maior qualidade e estão preparadas para assumir posições de
destaque na sociedade; ao mesmo tempo, existem pessoas que recebem esses
conhecimentos de forma básica apenas para se habilitarem a exercer funções
específicas. Dessa forma, a educação também reforça as desigualdades sociais,
como explica Ferraro (2014, p. 9):

[...] o sistema escolar é um formador e reprodutor, mas acaba por atuar no


âmbito da desigualdade. A escola também segrega, não apenas no âmbito
da fragmentação disciplinar, mas também porque faz uma escolha ideológica.
A educação, mais especificamente o acesso à educação, não se dá de igual
maneira aos estudantes de classes sociais diferentes, o que deve ser levado
em conta em termos de formatação do sistema educativo quando
comparamos aspectos da reprodução cultural e social.

67
A formação dos professores também é um mecanismo utilizado: mesmo que
inconscientemente, os professores são formados para representar a classe dominante
dentro das salas de aulas, defendendo e valorizando apenas os trabalhos
“intelectuais” em detrimento dos trabalhos ditos “braçais”. Você não se lembra do
ditado popular brasileiro muito utilizado pelos professores: “a caneta é mais leve que
a pá”? E dos professores que sempre lhe incentivavam a estudar para ser chefe, e
não operário? Por meio de práticas pedagógicas, os professores reforçam a ideia do
mérito, com o que a escola reconhece e incentiva os esforços individuais para a
conquista de algo. Os próprios professores atribuem a si o mérito pessoal sobre a
formação acadêmica que os tornou professores (SAES, 2007). Outro mecanismo que
podemos verificar é a ênfase do Estado, principalmente em países subdesenvolvidos
como o Brasil, no ensino profissional para formar mão de obra para as empresas. A
educação profissionalizante é apresentada à população como um meio de formar
cidadãos, tirar os jovens da marginalidade, impulsionar a promoção social e promover
o desenvolvimento econômico por meio da ajuda mútua entre todos os agentes da
sociedade. (LOPES, 2014)
Esse tipo de educação, no entanto, é incentivado pela burguesia porque é uma
forma de educar, disciplinar e controlar os futuros trabalhadores para a manutenção
dos meios de produção capitalistas. A ideologia é um forte agente educativo na
educação profissional: fortalece a hierarquia no ambiente de trabalho e desestimula a
organização e o fortalecimento dos trabalhadores diante da hierarquia imposta
(BATISTA, 2013). Desenvolver uma cultura de educação técnica e profissional na
sociedade é uma estratégia para que a população de maneira sutil aceite,
inconscientemente, a dominação da ideologia corrente.

68
15.3 Os efeitos da transformação da educação no Brasil

Fonte: site.oatibaiense.com.br

Para entender a transformação da educação em um instrumento ideológico no


Brasil, vamos analisar a formação da educação a partir da década de 1920, com o fim
da República Velha e o início da República Nova – período que foi a base para a
formação do sistema educacional do século XX no Brasil. Nas décadas de 1920 e
1930, a educação brasileira passou por um processo de renovação por meio da
chamada Escola Nova. Foram propostas modernizações nas estruturas de ensino
(administração, conteúdos e métodos) frente às tradicionais formas de ensino vigentes
na época. Os educadores envolvidos nesse movimento acreditavam que a educação
poderia colocar as pessoas em uma nova ordem social. Nesse período, foi
apresentado, pela primeira vez, um programa educacional de forma unificada para
todo o Brasil: em 1924, foi criada a Associação Brasileira de Educação e, em 1930,
foi criado o Ministério da Educação e da Saúde, dando à educação a maior
importância já vista. É claro que essas mudanças na educação são consequências
das mudanças que estavam ocorrendo no Estado brasileiro: a República velha entrava
em crise e o país buscava por modernização em todas as áreas – social, política,
cultura, etc. Ou seja, essas mudanças na educação estavam embasadas por uma
ideologia de Estado. (LOPES, 2014)
Os agentes dessa transformação nas escolas entendiam que a educação deveria ser
feita para responder aos desafios da sociedade de forma crítica e a partir de diálogo.
Gonçalves (2002, p. 142) nos mostra que esse movimento educacional era
69
progressista, mas politicamente ingênuo, porque a maior parte dos educadores
envolvidos nesse projeto pertenciam à elite e sua intenção era educar a população
para que participasse do progresso brasileiro – eles acreditavam que uma educação
universal teria o poder de acabar com as diferenças e construir uma sociedade
brasileira igualitária e unificada. Na verdade, eles estavam contribuindo com governos
autoritários que não tinham o menor interesse em educar para a cidadania. Por trás
do discurso desses educadores progressistas em educar o povo, “[...] o que se queria
da escola, nesse momento, era que ela fosse capaz de refazer o pobre, fazê-lo digno,
laborioso e disciplinado, saudável, ou seja, que fosse outro” (GONÇALVES, 2002, p.
148).
Em 1932, é lançado o Manifesto dos Pioneiros, considerado um marco na
educação brasileira. Esse documento reunia a proposta das principais orientações
sobre sociedade, política, filosofia e educação da Escola Nova, defendendo e
argumentando que a escola não deveria servir ao interesse de uma classe, mas sim
ao interesse das pessoas, e, por isso, a escola deveria estar relacionada ao meio
social.
Observe o que, no entanto, afirma Gonçalves (2002, p. 145-146):

O Manifesto reflete muito mais uma visão dos educadores do que um ato de
efetiva possibilidade de aplicação, já que o Estado publicava, no mesmo ano
em que se reuniam os educadores para a IV Conferência Nacional de
Educação, em dezembro de 1931, importantes reformas da legislação do
ensino. Em apenas dois meses, o governo provisório de Getúlio Vargas
mudou a face da educação, alterando de forma profunda o ensino secundário,
o ensino superior, o ensino comercial, criando o Conselho Nacional de
Educação e, como já falamos, incluindo o ensino religioso nos currículos. Mas
é claro que o Manifesto se colocou contra a divisão da educação, entre a
escola para o pobre, o primário e o profissional e, para a elite, o secundário.
Essa divisão reflete uma valoração do trabalho como “coisa” para pobre e,
para o rico, a divagação de um curso propedêutico. A escola primária e a
profissional serviriam às classes populares, enquanto o secundário e o
superior seriam para a burguesia [...].

Por mais que os educadores da Escola Nova tivessem importância e influência,


eles não conseguiram transformar suas ideias em diretrizes reais para a educação
brasileira, e o Estado continuou a utilizar a escola como meio manutenção da ideologia
burguesa. O governo de Getúlio Vargas montou um sistema educacional estruturado
para formar trabalhadores, de modo que a escola servia ao ideal de industrialização
da economia. (LOPES, 2014)

70
O Estado endossava a exclusão por meio da educação, pois oferecia uma
educação profissional ao pobre, preparava a classe média para o ensino superior e
restringia o acesso da mulher somente a instituições exclusivamente femininas ou em
turmas exclusivamente femininas. A proposta para a educação pública na Era Vargas
era preparar o povo para o trabalho, principalmente para o trabalho na embrionária
indústria brasileira. Não se tinha nenhum objetivo em moldar uma identidade nacional
a partir de uma educação democrática e nem em formar cidadãos capazes de
transformar a sociedade. Ao contrário disso:

O espaço escolar se torna o lugar da educação, mas também, e


principalmente, o lugar da palavra oficial. Não apenas a escola, mas todo o
aparato público estatal se articula no Brasil não para desenvolver e fecundar
a cidadania, mas como lugar de onde se profere a palavra da autoridade, que,
em vez de incorporar a noção de representatividade, torna-se o oráculo da
vontade de grupos privados ou mesmo de vontades individuais. A construção
da educação pública, que representaria uma modernização das estruturas
culturais e políticas no Brasil, torna-se, de um lado, a demonstração de como
o pensamento conservador e a questão nacional trataram a modernidade
como valor em si, sem ser questionada, e de outro, a produção de uma
modernidade marcadamente às avessas, em que as conquistas sociais
advindas de uma forma nova de fazer política não se fizeram presentes até
bem pouco tempo (como exemplo, o acesso à escola pública e sua
democratização) (GONÇALVES, 2002, p. 149).

Em 1964, com a instituição do governo militar, o autoritarismo nas escolas foi


ainda mais reforçado. Os militares realizaram inúmeras reformas na educação, mas
sem escutar os professores e diretores das escolas. O ensino público foi ampliado,
mas os recursos para a educação não acompanharam o mesmo ritmo, o que levou a
educação a péssimos resultados, como a baixa remuneração dos professores, a
evasão escolar e recursos materiais limitados. Em 1968, os militares propuseram uma
reforma universitária, o que apenas acentuou o acesso elitista às universidades
públicas. A crise econômica enfrentada pelo Brasil nas décadas de 1980 e 1990 tornou
o ensino de qualidade ainda mais elitista, e o pouco investimento na escola pública
deixou o ensino, para a população mais pobre, defasado e com menor qualidade.
O governo de FHC continuou a utilizar a escola como um instrumento
ideológico, com a propagação e utilização da educação para seguir a lógica do
mercado, organizando a estrutura escolar para atender a nova divisão internacional
do trabalho:

71
O Governo Fernando H. Cardoso [...] adotou o pensamento pedagógico
empresarial e as diretrizes dos organismos e das agências internacionais e
regionais, dominantemente a serviço desse pensamento como diretriz e
concepção educacional do Estado (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003, p. 108).

Observe o que diz a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB),


promulgada em 1996 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso:
Art. 27. Os conteúdos curriculares da educação básica observarão, ainda, as
seguintes diretrizes:
I - a difusão de valores fundamentais ao interesse social, aos direitos e deveres
dos cidadãos, de respeito ao bem comum e à ordem democrática;
II – consideração das condições de escolaridade dos alunos em cada
estabelecimento;
III - orientação para o trabalho;
IV - promoção do desporto educacional e apoio às práticas desportivas não
formais (BRASIL, 1996).
Essa lei está em vigor até os dias de hoje e rege todos as modalidades da
educação no Brasil, desde a educação infantil até a educação superior, passando pela
educação profissional e especial.
Portanto, constatamos que independentemente do partido político vencedor, da
forma de governo, democrática ou ditatorial ou, ainda, da situação econômica,
próspera ou estagnada, a educação brasileira foi estabelecida para atender os
interesses sociais dominantes. (LOPES, 2014)

72
16 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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